Elio Chaves
Flores (UFPB)
Todavia, deve-se destacar que se ia inventando uma espécie de cultura política da coisa
pública, em oposição Às intimidades governamentais da monarquia decaída. (p.50)
A importância dada a esses modelos explicativos indica que a cultura política vai
brotando dos próprios fatos e se enraizando neles, uma vez que não há história e política
separadas das palavras, sejam elas ditas ou escritas. (p.51)
É importante ressaltar que 67 anos de regime monárquico (1822-1889) não seria tal fácil
de serem removidos com a proclamação da República, daí decorreu violentas discussões
e as disputas políticas entre os anos de 1889 e 1895.
O princípio da Espada
Nas semanas seguintes aos fatos da proclamação do novo regime surgiriam muitas
manifestações que procuravam entender as questões políticas e econômicas que o Brasil
atravessava. (p.52)
O jornal ponderava que o novo governo era tão digno de confiança quanto o antigo e
que, se mantivesse em ordem, não teria problemas para saldar os empréstimos
contraídos em Londres no decorrer da Guerra do Paraguai (1864-1870).
A República da Espada ganhou uma conotação nada positiva acerca da participação dos
militares nos primeiros anos da República.
O militarismo na política advém não precisamente dos quartéis, mas, sobretudo das
raízes autoritárias da estrutura social, do isolamento dos agentes produtivos e da
atomização das classes sociais.
O deodorismo constitucional duraria pouco, de fevereiro a novembro de 1891. As
constantes desavenças entre a autoridade militar do Executivo e as posturas civilistas da
maioria dos congressistas evoluíram para o impasse político e a perda de legitimidade
da governança. De modo que, no decorrer dos oito meses de regime constitucional, o
marechal se sobrepôs ao presidente, com frequentes discussões e deposições de
ministros e apelos para medidas administrativas não condizentes com a República
imaginada pouco tempos antes. (p.56) No entanto, no dia 23 de novembro de 1891, a
República trocaria de presidente depois de uma grave crise institucional que se
prolongaria por mais alguns anos.
A visão dos militares mesmo após a queda de Deodoro demonstra que, eles
continuavam acreditando que a proclamação da republica foi um ato de ‘’vingança’’
após a guerra do Paraguai, já que uma elite bacharelesca com interesses próprios
comandava o Brasil e manchava o status quo militar da época.
A legalidade do Florianismo
O mês de abril seria ainda mais quente no termômetro da política. No dia 6, 13 generais,
nove oficiais superiores do Exército e quatro da Armada enviam carta, datada de 31 de
março, na qual pediam eleições pesidenciais. Eles reclamavam da substituição dos
administradores dos estados, da morte de inúmeros cidadãos e do ‘’estado de
desorganização geral do país’’. No mesmo dia, os signatários foram demitidos dos
cargos comissionados, reformados nas carreiras, passando para a reserva, isto é,
militares aposentados e, portanto, sem tropo para comandar. Em manifesto à nação,
datado do dia 7 de abril, o Executivo afirmava ‘’deixar, por um momento, o caminho da
tolerância benévola, que tem sido a norma’’ (Monteiro, 1986, p.55). No dia 9 de abril
surge, na imprensa oposicionista do Rio de Janeiro, a convocação para manifestação de
homenagem a Deodoro a se realizar no dia seguinte. O evento implicava, mesmo que
seus organizadores negassem uma atitude pública antiflorianista, e assim foi entendida
pelo governo, que a dissolveu como sedição contra a República. Floriano Peixoto
decreta o estado de sítio no Distrito Federal por 72 horas, tempo suficiente para a
detenção dos envolvidos e suspeitos, definindo-se suas penas nos presídios militares ou
desterro no interiro amazônico. (p.61)
Ocorreu uma alta abstenção no pleito eleitoral do Distrito Federal e que a historiografia
trata de passar como um período florianista, onde o apoio recebido por Floriano das
camadas populares, em função da alta acelerada do custo de vida. De fato, o florianismo
passou a simbolizar, para os estratos sociais médios e baixos, a luta contra os
monopólios, a especulação e os altos lucros. Os latifundiários e os grandes comerciantes
atacadistas, que controlavam a economia do país desde o Império, desconfiavam do
jacobinismo florianista, que, de certa forma, não hesitava em levar adiante a República à
revelia dos grupos parlamentares tradicionais, conservadores e liberais. (p.64)
O mês de agosto também não seria dos mais esperançosos: no dia 23, a morte de
Deodoro da Fonseca não consegue dar trégua aos descontentes; e, no, dia 27, boatos
diziam que o ministro da Fazenda, Rodrigues Alves, pedira demissão por discordâncias
com o presidente, assumindo em seu lugar o político Serzedelo Correia. Os
parlamentares discutiam se Deodoro tinha sido fundador da República, a imprensa
também divergia, e a batalha simbólica pela fundação do regime acirraria ainda mais os
ânimos, já alterados por espaços políticos e repartições públicas. (p.64)
No início de 1893, a situação no Brasil meridional evolui para a guerra civil, com a
invasão do Rio Grande do Sul pelas tropas federalistas que se haviam exilado no
Uruguai. No Distrito Federal, a oposição dentro do próprio Executivo se torna pública.
A situação de crise política se acentua com a demissão do almirante Custódio José de
Melo do cargo de ministro da Marinha. (p.66)
Nos três primeiros meses de 1894, a situação dos revoltosos na baía de Guanabara
torna-se cada vez mais desgastada. O governo intensifica o discurso legalista,
empurrando os revoltosos para o campo da ilegalidade e da sedição. Impedidos de
desembarcar e de atracar nos portos começam a faltar munição e água potável nos
navios da esquadra. (p.71)
A revolução federalista
Nos primeiros três meses do ano de 1893, a situação somente agravaria a radicalização:
em janeiro, Júlio de Castilhos toma posse na presidência do estado, prometendo salvar a
República dos federalistas e, em fevereiro e março, ocorre a mobilização militar,
ocasião em que grupos rebeldes armados, organizados nas fronteiras do Uruguai e da
Argentina, invadem o estado para o enfrentamento com as tropas legalistas.
Os principais líderes militares da revolta são João Nunes da Silva Tavares (Joca
Tavares) e Gumercindo Saraiva, antigos próceres políticos da Monarquia e vinculados
ao Partido Liberal. A expressão civil dos revolucionários é Silveira Martins, a liderança
dos liberais no estado e que teve destacada atuação nos últimos anos da Monarquia
como senador imperial. (p.75)
Com efeito, até o fim de 1893, o avanço das tropas federalistas foi impressionante: em
outubro passam pelo planalto e serra rio-grandenses; em novembro, atravessam o rio
Pelotas, penetram em Santa Catarina e juntam-se aos revoltosos da Armada, que haviam
tomado Desterro e instituído a cidade como capital de uma república provisória até a
deposição do florianismo; no mês seguinte, avançam sobre o Paraná e instala outro
governo provisório na capital, Curitiba. O objetivo passou a ser São Paulo, e chegaram
mesmo à divisa deste na cidade de Castro, ainda em território paranaense. (p.76)
A violência seria também discursiva, em que a fala não se descola da prática e se torna
mesmo sua evocação legitimadora.
Por fim, consolidava-se assim, uma república oligárquica com cidadania exclusiva para
os grandes proprietários, os barões do café e os coronéis, com seus vastos domínios
privados.