O estudo da lei penal no tempo no remete ao estudo de alguns princípios específicos que
se destacam no Direito Penal. Mostram-se garantidores de que o cidadão só pode ser alcançado
pelo Estado (titular do monopólio do poder punitivo) se a sua conduta considerada infratora,
estiver previamente estabelecida em lei.
1.1. LEGALIDADE
Código Penal.
Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia
cominação legal.
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Alguns autores indicam que sua origem remonta à Magna Carta Inglesa, de 1215, editada
ao tempo do Rei João Sem Terra, cujo art. 39 vinha assim redigido:
Art. 39. Nenhum homem livre será detido, nem preso, nem despojado de sua
propriedade, de suas liberdades ou livres usos, nem posto fora da lei, nem exilado,
nem perturbado de maneira alguma; e não poderemos, nem faremos pôr a mão sobre
ele, a não ser em virtude de um juízo legal de seus pares e segundo as leis do País.
Mas foi Paul Johann Anselm Ritter Von Feuerbach, quem, no início do Séc. XIX resgatou o
princípio da legalidade. Em seu Tratado de Direito Penal, publicado em 1801, o autor assevera
que:
“I) Toda imposição de pena pressupõe uma lei penal (nullum poena sine lege).
II) A imposição de uma pena está condicionada à existência de uma ação cominada
(nulla pena sine crimine).
III) O fato legalmente cominado (o pressuposto legal) está condicionado pela pena
legal (nullum crimen sine poena legali).
Portanto, a conduta tida como criminosa, só pode assim ser considerada pela lei. Não se
pode impor ou proibir condutas senão por meio de lei.
Por intermédio da lei existe a segurança jurídica do cidadão de não ser punido se não
houver uma previsão legal criando o tipo incriminador, ou seja, definindo os tipos penais
incriminadores, mandamentais ou proibidas, comissivas ou omissivas, sob a ameaça de sanção.
Boa parte da doutrina entende que o princípio da Legalidade contempla diversos outros, ou
melhor, se desdobra em diversos outros princípios. são eles:
Ensina Nucci,
Não se pode, na atualidade, contentar-se com a mera legalidade, pois nem todo tipo
penal construído pelo legislador obedece, como deveria, ao princípio da taxatividade. O
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ideal é sustentar a estrita legalidade, ou seja, um crime deve estar descrito em lei,
mas bem detalhado (taxativo), de modo a não provocar dúvidas e
questionamentos intransponíveis, bem como sendo possível visualizar uma
ofensa a bem jurídico tutelado, agindo o autor com dolo ou culpa.
2) Vigência e Validade: O conceito de vigência da lei penal estaria para a legalidade formal
assim como o conceito de validade estaria para a legalidade material.
a) Vigência: uma lei penal, depois de seguir o devido processo legislativo e transcorrido o
período de vacatio legis, entra em vigor (vigência – legalidade formal):
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pois é considerada válida. Portanto, a mera vigência é insuficiente para conferir-lhe o status de
validade, ou seja, de legalidade material.
Não haveria real garantia se a lei penal incriminadora não tivesse que ser anterior à
conduta. Obrigatoriamente deve haver a prévia existência da lei penal incriminadora, seja ela
proibitiva ou mandamental, para que o Estado possa exercer o jus puniendi.
Constituição Federal
Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de:
I - emendas à Constituição;
II - leis complementares;
III - leis ordinárias;
IV - leis delegadas;
V - medidas provisórias;
VI - decretos legislativos;
VII - resoluções.
Parágrafo único. Lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e
consolidação das leis.
Em direito penal é diferente. Somente a lei formal, em seu sentido mais estrito, fruto do
processo legislativo, pode definir crimes e cominar penalidades.
Em regra, uma lei é aplicada durante o período que em estiver vigente, ou seja, a partir do
momento em que entrar em vigor até o momento em for revogada (atividade), a lei terá
aplicabilidade.
Como decorrência dos princípios da legalidade e da anterioridade, aplica-se, em regra, a
lei penal vigente ao tempo da realização do fato criminoso, por ser esta dotada de atividade -
tempus regit actum - e, consequentemente, a lei penal é também, em regra, irretroativa.
LINDB
Art. 1º Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e
cinco dias depois de oficialmente publicada.
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(...)
Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a
modifique ou revogue.
Parágrafo único. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se
aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em
julgado.
Ocorre quando várias leis se sucedem regulando a mesma matéria. Quando há uma
efetiva sucessão de leis penais, o eventual conflito entre as leis é superado por meio de algumas
regras específicas.
A partir da previsão constitucional do Art. 5º, inciso XL e do previsto no Art. 2º do CP,
podemos estabelecer algumas regras.
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1ª REGRA – IRRETROATIVIDADE:
a) Lei Nova Incriminadora: NÃO RETROAGE.
b) Lei Nova Mais Gravosa / Novatio legis in pejus ou lex gravior (prejudicial):
NÃO RETROAGE.
Exemplos, os arts. 217, 220 e 240, todos do CP, foram abolidos, suprimidos.
- Mesmo que a sentença condenatória esteja em fase de execução, prevalece a lex mitior
que, de qualquer modo, favorece o agente.
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OBSERVAÇÕES IMPORTANTES
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3ª REGRA - ULTRA-ATIVIDADE: Poder que a lei tem, de mesmo não estando mais em
vigor, avançar no tempo e ser aplicada aos crimes praticados durante a sua vigência.
a) Lei Mais Benéfica (lex mitior): a lei mais benéfica tem esse poder. Na verdade, a lei
mais benéfica, tanto é retroativa quando posterior, quanto é ultra-ativa quando anterior. Mas além
desta, o CP destaca outras duas leis portadoras do poder da ultra-atividade. São elas as leis
excepcionais e as leis temporárias.
OBSERVAÇÕES IMPORTANTES:
b) Segunda Corrente: Rogério Greco entende não ter sido o Art. 3º do CP recepcionado
pela CF/88. Defende o seguinte pensamento:
“deve prevalecer o entendimento no sentido de que o art. 3º do Código Penal, em tema
de sucessão de leis no tempo, não foi recepcionado pela atual Carta Constitucional,
para fins de aplicação da lei anterior em prejuízo do agente. Assim, portanto, havendo
sucessão de leis temporárias ou excepcionais, prevalecerá a regra constitucional da
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extra-atividade in mellius, ou seja, sempre que a lei anterior for benéfica, deverá gozar
dos efeitos da ultra-atividade; ao contrário, sempre que a posterior beneficiar o agente,
deverá retroagir, não se podendo, outrossim, excepcionar a regra constitucional”
2) Crimes permanentes e a lei mais gravosa: Crimes permanentes são aqueles cuja
consumação se prolonga no tempo. Ex, art. 159. CP.
Código de Processo Penal
Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito
enquanto não cessar a permanência.
3. TEMPO DO CRIME
Saber definir-se o tempo do crime é aspecto relevante quando estuda a lei penal no tempo
e principalmente a sucessão de leis penais no tempo.
Seguindo orientação do código penal português, a reforma penal de 1984 definiu
expressamente a tempo do crime.
Algumas teorias se apresentam com o intuito de apontar o que seria o “tempo do crime”.
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O Código Penal adotou a teoria da atividade, conforme redação de seu art. 4º:
Tempo do Crime
Art. 4º Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que
outro seja o momento do resultado.
IMPORTÂNCIA PRÁTICA DA ANÁLISE DO
TEMPO DO CRIME:
QUESTÕES DE PROVA:
1. Assinale a alternativa correta:
a) A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou
cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado após a sua
vigência.
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b) Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o
momento do resultado.
c) A pena cumprida no estrangeiro não atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo
crime, quando diversas.
d) O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o
resultado se produza, não responde pelos atos já praticados.
d) equidade.
e) jurisprudência.
5. (TJ/SP-FCC) JOSÉ foi vítima de um crime de extorsão mediante sequestro (art. 159 do
C. Penal), de autoria de CLÓVIS. O Código Penal, em seu art. 4º, com vistas à aplicação da
lei penal, considera praticado o crime no momento da ação omissão, ainda que outro seja
o momento do resultado. No curso do crime em questão, antes da liberação involuntária
do ofendido, foi promulgada e entrou em vigor uma lei nova, agravando as penas. Assinale
a opção correta.
a) A lei nova, mais severa, não se aplica ao fato, frente ao princípio geral da
irretroatividade da lei.
b) A lei nova, mais severa, não se aplica ao fato, porque sua vigência é anterior à cessação
da permanência.
c) A lei nova mais severa, é aplicável ao fato, porque sua vigência é anterior à cessação da
permanência.
d) A Lei nova, mais severa, não se aplica ao fato, porque o nosso ordenamento, considera
como tempo do crime, com vistas à aplicação da lei penal, o momento da ação ou omissão
e o momento do resultado, aplicando-se a sanção da lei anterior, por ser mais branda.
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