Estudos da Tradução Resenha: Capítulo 1 – Questões fundamentais
O texto Questões fundamentais está dividido em sete subcapítulos, os quais abordam
questões relativas à tradução, como: o sentido, a intraduzibilidade, a equivalência e uma teoria da tradução. No primeiro subcapítulo, Língua e Cultura, a tradução é reconhecida como uma atividade linguística, de caráter semiótico, pois, pode ser compreendida como a transferência do sentido de um conjunto de signos linguísticos a outro, sem negar os critérios extralinguísticos. E ainda traz a tese de Sapir, a qual afirma que não há duas línguas totalmente equivalentes, na medida em que estão inscritas em diferentes realidades sociais e culturais. Ou seja, o texto inicia esclarecendo os leitores (provavelmente, tradutores e futuros tradutores) sobre a preocupação em ser totalmente fiel ao objeto traduzido. Muitas vezes, caberá ao tradutor decidir entre preservar o sentido original da Língua de Partida (LP) ou adequá-lo ao contexto cultural da Língua de Chegada (LC). Não se quer com isso afirmar uma possível superficialidade do trabalho do tradutor, mas, sim, destacar de imediato que existem limitações inerentes ao processo tradutório. E para atender as necessidades linguísticas e culturais (extralinguísticas) dos objetos traduzidos, desenvolveu-se distintos Tipos de tradução, abordados no segundo subcapítulo. Neste são identificadas três categorias de tradução: a intralinguística, a interlinguística e a intersemiótica. A tradução intralinguística dedica-se a descrever o processo de transferência da LP para a LC; a interlinguística recorre a uma combinação de códigos que interpreta signos verbais de uma língua por meio de outra; e a intersemiótica interpreta signos verbais através de signos não-verbais. Aqui também é destacado que uma completa equivalência entre a LP e a LC não ocorre em nenhuma das categorias de tradução. Dessa forma, percebe-se que um importante elemento do processo tradutório são as decisões do tradutor, tanto sobre os aspectos linguísticos quanto os aspectos extralinguísticos. Assim, mais uma vez, o texto busca tranquilizar o tradutor acerca da impossibilidade de correspondência total entre o original e o traduzido. Acredito, porém, que é nessa impossibilidade que reside a probabilidade de o tradutor deixar sua marca pessoal. No terceiro subcapítulo é aprofundada a ideia de que a tradução vai além dos critérios linguísticos. Ocorre, dessa forma, um processo de Descodificação e Recodificação dos signos, os quais devem manter o sentido da “informação invariante”. Uma informação invariante é, por exemplo, a noção de saudação da palavra hello, e de afirmação da palavra yes. Nesse sentido, a compreensão sobre o contexto no qual determinados signos estão inseridos, mostra-se fundamental para a preservação da relação semântica entre as línguas. Ou seja, “é a função que se traduz e não as palavras em si” (p. 47). Muitas vezes, porém, é preciso que o tradutor aceite a intraduzibilidade. Por exemplo, Bon appetit é incompatível com Good appetite, uma vez que não existe uma convenção social equivalente entre os termos. Em casos como esse, o tradutor deve optar por um equivalente semântico e cultural da LC, pois, o seu alvo é o leitor ou ouvinte da LC. Neste subcapítulo percebemos a importância da manutenção do sentido e a relevância do destinatário da tradução. Ao tradutor, cabe respeitar o original tanto quanto o receptor de seu produto. Porém, ao tomar decisões acerca da fidelidade com o original ou a adaptação ao contexto do destinatário, a prioridade recai sobre este, o que, muitas vezes, gera controvérsias entre estudiosos da área. O quarto subcapítulo aborda os Problemas de Equivalência tradutória de expressões idiomáticas e trocadilhos, uma vez que são determinados pela cultura. Também nesses casos, o tradutor deve optar pela preservação da “função” dessas expressões e termos, mantendo-se a “identidade expressiva” entre as línguas. Aqui também são identificadas as equivalências formal e dinâmica. Enquanto a primeira se dedica a buscar correspondência de frase para frase, conceito para conceito, a segunda baseia-se no “princípio equivalente” em que a relação entre a mensagem e o receptor da LC equivale àquela entre o receptor e a mensagem da LP. Como é possível observar, a tradução é uma atividade complexa, que envolve conhecimentos linguísticos e extralinguísticos das LP e LC, além de aspectos como a criatividade e a prática sistematizada. Quanto mais a teoria e a prática caminharem juntas, maiores serão a probabilidade de o tradutor tomar decisões acertadas nas inúmeras situações de incompatibilidade linguística e cultural. No quinto subcapítulo são discutidas as Perdas e Ganhos. Como sugerido pelo título, perde-se muito tempo debatendo as perdas do processo tradutório e ignoramos o que é possível ganhar com ele. Muitas vezes, o tradutor pode enriquecer ou esclarecer determinados aspectos de um original, como acontece, por exemplo, nas traduções da bíblia, as quais clarificam o significado social das parábolas em diferentes culturas. Este item engrandece o trabalho do tradutor, destacando os possíveis ganhos que uma tradução pode trazer em relação ao original. Ainda sobre a impossibilidade de equivalência total entre duas línguas, há de se aceitar que as perdas também é um elemento inerente ao processo tradutório. Todavia, mais vale exaltar os ganhos advindos das decisões tomadas pelo tradutor, pela falta de equivalência entre as línguas, que lamentar-se pela perda inevitável, geralmente, marcada pela intraduzibilidade. A Intraduzibilidade é uma questão tão relevante que o sexto subcapítulo é dedicado a ela. Em nível linguístico, corresponde a ausência de signos linguísticos equivalentes e, em nível cultural, deve-se a ausência de um traço situacional semelhante na LC. A intraduzibilidade é um aspecto inerente à tradução. Como já mencionada, um tradutor deve aceitar a impossibilidade de equivalência total entre duas línguas e buscar alternativas que atendam ao contexto cultural da LC através de “atos criativos”. Ou seja, o tradutor deve buscar a melhor solução possível. Aqui a criatividade ganha destaque. Criatividade esta que será desenvolvida somando- se teoria, prática e experiências socioculturais das LP e LC, sejam vindas de vivências e/ou de pesquisas acerca de determinado tema ou lugar. Um tradutor é um curioso por natureza. Por fim, no sétimo subcapítulo questiona se a tradução é uma Ciência ou ‘Atividade Secundária’. E logo afirma não haver dúvidas quanto a existência de uma “ciência da tradução”, a qual não se dedica a fornecer uma fórmula normativa pronta, mas, tem como objetivo “chegar a um entendimento dos processos implicados no ato da tradução” (p. 71). Além disso, a partir do momento em que se aceita a existência da relação entre autor, tradutor e leitor (receptor), desfaz-se o mito da tradução enquanto atividade secundária. O texto finaliza afirmando já existir uma “teoria da tradução” bem fundamentada, a qual, se ainda não está consolidada, deve-se a expectativa de uma “receita de bolo”, que nada tem a ver com o objetivo descrito acima. Além disso, no que se refere a atividade do tradutor, esta pode ser compreendida como uma dupla atividade de comunicação, pois, acumula as funções de receptor e emissor. A tradução facilita o processo comunicativo. As Questões Fundamentais abordadas neste texto, trabalham no sentido de elucidar ao tradutor aspectos controláveis e não controláveis do processo tradutório. Com isso, busca valorizar os primeiros e afirmar que as soluções para os segundos serão alcançadas por meio da de decisões criativas, as quais serão adquiridas por meio da teoria, da prática e de vivências socioculturais. Todo o capítulo deixa clara a impossibilidade de equivalência total entre as LP e LC, nos levando a perceber a responsabilidade e grandeza que reside no trabalho do tradutor. Por isso, trata-se de uma importante leitura para aqueles que estão atuando ou querem adentrar na área da tradução.