CURSO DE LETRAS
DISCIPLINA: LITERATURA PORTUGUESA III
PROFª SARA DIVA
Fortaleza
2004
OTÁVIA MARQUES DE FARIAS
Trabalho de aproveitamento da
Disciplina Literatura Portuguesa III do Curso
de Letras da Universidade Estadual do Ceará.
Fortaleza
2004
1. CONSIDERAÇOES SOBRE A METÁFORA DO MAR NA POESIA
DE FERNANDO PESSOA.
1
Todas as citações são retiradas da Obra Poética, cf. Bibliografia Consultada.
pelos métodos usuais da técnica poética; as imagens podem ter significado específico
ou interagir umas sobre as outras.
Ao fazer comparações, a ”fenda” entre objeto e imagem pode variar; se a fenda é
pequena, exigindo o mínimo esforço imaginativo, a imagem logo se torna “morta” ou
ineficaz, como os ditos populares ou provérbios (por exemplo, negro como breu,
preciso como uma agulha, tolo como um boi). Se a fenda é muito larga, a imaginação
se recusa a fazer uma ponte, e a comparação falha em seus objetivos.
A boa imagética envolve uma fenda larga o bastante para frustrar o esforço
imaginativo. A imagética de má qualidade, por outro lado, pode tornar-se ineficaz por
ser a comparação remota demais, fantasiosa, ou indevidamente cerebral em sua
origem. Tanto a boa quanto a má comparação incluem-se no termo “conceito”,
significando qualquer comparação inatingível.
Os aspectos previsíveis da imagem poética podem ser ilustrados por citações de
vários graus de complexidade. O tipo mais comum de símile ocorre nos versos:
Muitas metáforas são usadas para o corpo humano, tais como veste de lama,
casinha escura da alma, o calabouço onde a alma está aprisionada. Mas também pode
ser vista como algo “tecido” ou “atado”, como em John Donne:
Depois de iniciada nossa pesquisa, tivemos notícia da existência de um ensaio sobre o assunto, assinado pelo Prof.
Linhares Filho (UFC), mas não tivemos acesso ao texto.
Pode-se dizer que, na obra de Fernando Pessoa, o criador se identifica e se
torna uno com sua obra. O aparente distanciamento entre autor e obra, tão evidente em
outros poetas, é em Pessoa uma postura de superfície e cultivada como necessária à
projeção de sua poesia, a partir de um universo vivencial interiorizado. Há disto
testemunhos copiosos em sua poemática ortônima, e não menos na complexa
heteronímia, altamente polemizada pelos estudiosos.
Achamos por bem dirigir nossa pesquisa ao extrato profundo da mensagem
literária pessoana, embora o presente estudo careça de respaldo teórico para
“aprofundar essa profundidade”. Limitaremos nossas considerações a um panorama
dos arquétipos centrais, entendidos aqui como aqueles em que se revelam as
qualidades metafísicas da obra literária, levando a uma transmutação da sensibilidade
ou elevação do nível da consciência poética.
Nosso trabalho pretende explorar, ainda que superficialmente, o estrato
metafísico da obra de Pessoa, com suas aderências temáticas, no que ela encerra de
mais representativo a esse respeito.
Em Pessoa, o estrato metafísico aflui sensivelmente, de forma patente e clara; o
poeta fala ou pela voz dos heterônimos ou por si mesmo, e sua matéria-prima é o si-
mesmo, em relação ao mundo, em imagens simples, pois essencialmente poéticas,
apesar da temática complexa. Nem por isso deixa de ser épico e lírico, ao mesmo
tempo, numa perplexidade ante o mistério da existência, que perpassa toda a sua obra:
3
“Quero a consangüinidade com o mistério das coisas”
“ O mistério de tudo
Aproxima-se tanto do meu ser,
Chega aos olhos meus d’alma tão (de) perto,
Que me dissolvo em trevas e universo...”
3
PESSOA, Fernando. Obra poética. 17ª reimpressão da 3ª edição, Editora Nova Aguilar, Rio de Janeiro:1999.
Álvaro de Campos, tão paradoxal quanto o próprio Pessoa, admite a insuficiência
da linguagem para dizer-se e falar do mundo:
No magistral poema ódico que começa com o verso “Afinal, a melhor maneira de
viajar é sentir”, o mesmo Álvaro de Campos faz uma exaltada descoberta:
Estes versos simbolizam também o que está para além do visível, em dimensão
que transcende o relativo e o efêmero. É o que vemos em muitas passagens, como
nesta outra, da Ode Marítima:
Depois do que foi dito, vejamos agora alguns exemplos do que se pode citar em
imagens, na obra pessoana, envolvendo como símbolo global, o mar:
Símbolo do mundo e da vida:
Silêncio e solidão, dois símbolos que aderem à metáfora do mar, também podem
ser vistos em Pessoa:
È claro que a vivência portuguesa do mar tinha que estar presente de forma
poderosa na alma lusitana, e portanto não poderia estar ausente no destino poético de
um gênio como Fernando Pessoa, que chegou a cruzar mares (fisicamente) e viveu
debruçado sobre o Atlântico, cheio de nostalgia, ansioso pelo regresso, imerso na
intraduzível “saudade” lusitana. Nostalgia e saudade, enquanto relacionadas ao mar, se
bifurcam em dois vetores na obra de Fernando Pessoa: o da Mensagem e o de Álvaro
de Campos, que é “tomado pelas coisas marítimas”.
Por seu mar interior, Pessoa “viajou” mais do que pelo oceano físico, e chegou a
todos os portos, de certa forma realizando o “impossível” na reduzida escala humana,
que era, afinal tudo o que ele queria.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA