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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2019.0000520536

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


1024726-88.2018.8.26.0002, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes NORMAN
DA SILVA MARTINS e JULIANA JACOB FEET, são apelados TAM - LINHAS
AÉREAS S/A e ALITALIA SOCIETA AEREA ITALIANA S.P.A.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 24ª Câmara de Direito Privado


do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento em
parte ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores DENISE ANDRÉA


MARTINS RETAMERO (Presidente) e SALLES VIEIRA.

São Paulo, 1º de julho de 2019.

Jonize Sacchi de Oliveira


Relator
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

APELAÇÃO N.: 1024726-88.2018.8.26.0002


COMARCA: SÃO PAULO
APELANTES: NORMAN DA SILVA MARTINS E JULIANA JACOB FEET
APELADAS: TAM LINHAS AÉREAS (ATUAL LATAM) E ALITALIA COMPAGNIA AEREA
ITALIANA S.P.A.

VOTO N. 7359

APELAÇÃO Ação indenizatória por danos materiais e morais


Transporte aéreo internacional - Sentença de improcedência
Apelação dos autores - ATRASO DE VOO e EXTRAVIO DE
BAGAGEM EM VOOS INTERNACIONAIS Responsabilidade
civil da transportadora confirmada, seja à luz do entendimento
firmado pelo Supremo Tribunal Federal com repercussão geral no
Recurso Extraordinário n. 636331 e Recurso Extraordinário com
Agravo (ARE) n. 766618, seja em atenção aos ditames da
legislação consumerista ATRASO DE VOO - Perda de conexão
e diária de hotel em Roma Trecho operado unicamente pela corré
LATAM Falha técnica da aeronave que se enquadra no conceito
de fortuito interno - Ré que não logrou comprovar causa
excludente de responsabilidade - DANOS MORAIS
Caracterização - Atraso de mais de 14 horas - Dano moral in re
ipsa Quantum indenizatório adequado às peculiaridades do caso
Montante de R$ 5.000,00 a cada autor - Limitação tarifária
devida apenas em casos de danos materiais DANOS
MATERIAIS Fatura do hotel Perda da primeira diária do hotel
em Roma O valor postulado (R$ 164,00) guarda consonância
com o limite indenizatório disposto no art. 22, item 1, da
Convenção de Montreal: 4.150 “DES” (Direito Especial de Saque)
a cada passageiro EXTRAVIO DEFINITIVO DE BAGAGENS
Resposabilidade solidária entre as companhias aéreas rés pela
perda da bagagem no trajeto Madri Roma, operado pela
ALITALIA em sistema “code share” com LATAM -
Responsabilidade única da ALITALIA pelo extravio da bagagem
no trajeto Bruxelas Roma, porquanto o voo era operado somente
por ela DANOS MORAIS Configuração - O descaminho de
bagagem com pertences pessoais é fato que transcende o mero
aborrecimento Quantum de R$ 8.000,00 a cada autor é
adequado às peculiaridades do caso, na medida em que duas

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bagagens se perderam, ou seja, tanto a de ida como aquela


contendo os itens adquiridos durante a viagem para suprir os
pertences desaparecidos Importância de R$ 15.000,00, almejada
pelos recorrentes, que se mostra exacerbada e causaria
enriquecimento sem causa - DANOS MATERIAIS - Notas fiscais
que atestam a compra de bens em diversas cidades da Europa
dentro do período em que os recorrentes lá estiveram a turismo -
Irrelevante a língua estrangeira - Passageiros que se viram
obrigados a a adquirir tais bens e peças de vestuário Ausência de
impugnação específida das rés Valor pretendido pelos autores
que não ultrapassa a indenização tarifada de 1.000 Direitos
Especiais de Saque (DES), a cada passageiro, prevista no art. 22,
item 2 da Convenção de Montreal - Sentença reformada -
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Trata-se de recurso de apelação interposto por NORMAN DA SILVA


MARTINS e JULIANA JACOB FEET contra a r. sentença de fls. 244/246, que julgou
improcedente a ação indenizatória por danos materiais e morais ajuizada por em face de
TAM LINHAS AÉREAS (atual LATAM) e ALITALIA COMPAGNIA AEREA ITALIANA S.P.A.
Em razão da sucumbência, condenou os autores ao enfrentamento das custas, despesas
processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa,
montante a ser repartido entre os patronos de cada uma das requeridas.

Os requerentes apelam às fls. 249/247, aduzindo que: 1. o voo de São


Paulo com destino à cidade de Roma foi cancelado e o outro a que ambos foram
relocados atrasou, acarretando a perda de uma diária de hotel; 2. sofreram prejuízos de
ordem moral e material em razão do extravio de suas malas tanto no trajeto aéreo
realizado pela LATAM (São Paulo Roma) como naquele operado pela ALITÁLIA (Roma
Bruxelas); 3. o relatório de fls. 66/67 indica de forma pormenorizada os danos morais
enfrentados, com a conversão dos valores para a moeda local; 4. a tradução dos diversos
recibos acostados à exordial era desnecessária.

Contrarrazões às fls. 279/288 e 289/300.

É o relatório.

Em recente julgamento conjunto do Recurso Extraordinário n. 636.331 e

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do Recurso Extraordinário com Agravo n. 766.618, o Supremo Tribunal Federal


determinou a prevalência da Convenção de Varsóvia, complementada pela Convenção
Montreal, sobre o Código de Defesa do Consumidor nos casos de intercorrências em
transporte aéreo internacional de passageiros, fixando a seguinte tese sobre o tema 210:

“Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as


normas e os tratados internacionais limitadores da
responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros,
especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm
prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor”
(STF, RE n o 636.331/RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar
Mendes, j. 25.05.2017).

Pois bem; o transporte internacional vem definido pela Convenção de


Montreal (art. 1º, “2”), como “todo transporte em que, conforme o estipulado pelas
partes, o ponto de partida e o ponto de destino, haja ou não interrupção no transporte, ou
transbordo, estão situados, seja no território de dois Estados Partes, seja no território de
um só Estado Parte, havendo escala prevista no território de qualquer outro Estado, ainda
que este não seja um Estado Parte. O transporte entre dois pontos dentro do território de
um só Estado Parte, sem uma escala acordada no território de outro Estado, não se
considerará transporte internacional, para os fins da presente Convenção”.

Analisando-se o Informativo n. 866 do Pretório Excelso, verifica-se que o


Colegiado limitou a aplicação das aludidas convenções a prejuízos de ordem material,
excluindo, portanto, a sua incidência no que tange à pretensão de indenização por danos
morais.

A seguir, o trecho do informativo que versa sobre a mencionada


limitação:

“Por tratar-se de conflito entre regras que não têm o mesmo


âmbito de validade, sendo uma geral e outra específica, o

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Colegiado concluiu que deve ser aplicado o § 2º do art. 2º da


Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (6).
Ademais, frisou que as disposições previstas nos aludidos
acordos internacionais incidem exclusivamente nos contratos
de transporte aéreo internacional de pessoas, bagagens ou
carga. Assim, não alcançam o transporte nacional de
pessoas, que está excluído da abrangência do art. 22 da
Convenção de Varsóvia. Por fim, esclareceu que a limitação
indenizatória abarca apenas a reparação por danos
materiais, e não morais”.

Feitas tais observações, tem-se que, constatada a culpa do


transportador, a empresa aérea deve indenizar o passageiro, de acordo com as
prescrições concernentes à sua responsabilidade civil objetiva, contidas tanto nos arts.
19, 17, itens “2” e “3”, e 22, itens “1” e “2”, todos da Convenção de Montreal, como no
art. 14, “caput” e § 3º, do Código de Defesa do Consumidor.

Eis os conteúdos dos citados dispositivos:

“Artigo 17 Morte e Lesões dos Passageiros Dano à


Bagagem

(...)

2. O transportador é responsável pelo dano causado em caso


de destruição, perda ou avaria da bagagem registrada, no
caso em que a destruição, perda ou avaria haja ocorrido a
bordo da aeronave ou durante qualquer período em que a
bagagem registrada se encontre sob a custódia do
transportador. Não obstante, o transportador não será
responsável na medida em que o dano se deva à natureza, a
um defeito ou a um vício próprio da bagagem. No caso da
bagagem não registrada, incluindo os objetos pessoais, o
transportador é responsável, se o dano se deve a sua culpa
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ou a de seus prepostos.

3. Se o transportador admite a perda da bagagem


registrada, ou caso a bagagem registrada não tenha
chegado após vinte e um dias seguintes à data em que
deveria haver chegado, o passageiro poderá fazer valer
contra o transportador os direitos decorrentes do contrato de
transporte”;

“Artigo 19 - O transportador é responsável pelo dano


ocasionado por atrasos no transporte aéreo de passageiros,
bagagem ou carga. Não obstante, o transportador não será
responsável pelo dano ocasionado por atraso se prova que
ele e seus prepostos adotaram todas as medidas que eram
razoavelmente necessárias para evitar o dano ou que lhes foi
impossível, a um e a outros, adotar tais medidas”;

“Artigo 22. Limites de Responsabilidade Relativos ao Atraso


da Bagagem e da Carga

1. Em caso de dano causado por atraso no transporte de


pessoas, como se especifica no Artigo 19, a responsabilidade
do transportador se limita a 4.150 Direitos Especiais de
Saque por passageiro.

2. No transporte de bagagem, a responsabilidade do


transportador em caso de destruição, perda, avaria ou
atraso se limita a 1.000 Direitos Especiais de Saque por
passageiro, a menos que o passageiro haja feito ao
transportador, ao entregar-lhe a bagagem registrada, uma
declaração especial de valor da entrega desta no lugar de
destino, e tenha pago uma quantia suplementar, se for
cabível. Neste caso, o transportador estará obrigado a pagar
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uma soma que não excederá o valor declarado, a menos que


prove que este valor é superior ao valor real da entrega no
lugar de destino”. (Convenção de Montreal).

“ Art. 14. O fornecedor de serviços responde,


independentemente da existência de culpa, pela reparação
dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos
à prestação dos serviços, bem como por informações
insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

(...)

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado


quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito
inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro”
(CDC).

No caso em testilha, restou incontroverso o atraso no primeiro trecho


da viagem aérea seguido do extravio permanente das bagagens dos autores.

De acordo com o relato inicial, os postulantes adquiriram da corré


LATAM passagens prevendo partida de São Paulo, no dia 31.07.2017, às 22h50, além de
conexão na cidade de Madrid e decolagem para Roma, Itália, em 01.08.2017, às 18h20.
Por sua vez, o retorno estava programado para o dia 23.08.2017, às 12 horas, com saída
de Roma e conexões nas cidades de Madrid e Londres, bem como volta rumo a São Paulo,
no dia 25.08.2017, às 05h55.

Em continuidade, a exordial aduz que, com o cancelamento do voo


relacionado ao primeiro trecho (São Paulo Madrid) e a realocação em outro, os
postulantes perderam a primeira diária do hotel de Roma (Kolping Hotel Casa Domitilla
fls. 62), que estava reservada para o dia 01.08.2018. Afinal, tal fato acarretou atraso de
ao menos 14 horas.

Para piorar a situação, ao desembarcarem no destino final (Roma) em


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02.08.2017, foram surpreendidos com a notícia de que as suas bagagens haviam sido
extraviadas no trajeto Madrid ROMA, realizado pela ALITALIA.

Em virtude dos gastos adicionais com itens de higiene pessoal e


vestuário, viram-se obrigados a alterar o roteiro de suas férias a fim de readequá-lo para
algo mais econômico.

Não bastassem esses infortúnios, tiveram suas bagagens extraviadas


uma vez mais, ou seja, durante o itinerário Bruxelas Roma, operado pela ALITALIA,
agora com os produtos adquiridos durante a viagem para substituir o conteúdo das
bagagens de origem (fls. 36).

Nesse contexto, requerem a procedência da ação para que as


companhias aéreas rés sejam condenadas à reparação por danos materiais
correspondentes aos itens que tiveram que comprar a fim de se manterem em país
estrangeiro (R$ 11.245,30) e à diária do hotel perdida em Roma (R$ 164,00), bem como
ao ressarcimento danos morais no valor de R$ 15.000,00 para cada autor.

A r. sentença guerreada entendeu ser indevida a condenação das


companhias aéreas à indenização por dano moral e material, haja vista que: (i) “ainda que
se reconheça ter a parte autora sofrido dissabor e desgaste com o fato que compõe a
causa de pedir, especialmente pelo descumprimento contratual por parte das requeridas,
quanto ao atraso no voo e ao extravio de sua bagagem, de se notar que tal desconforto
não foi suficiente para aviltar os direitos da personalidade dos autores”; (ii) “não há nos
autos prova, em língua portuguesa, da realização dos dispêndios narrados em petição
inicial, não há prova do dano material suportado pelos autores, o que impõe a
improcedência do pedido”

A irresignação recursal merece prosperar em parte.

Restou incontroverso nos autos que os requerentes sofreram danos


morais decorrentes da inaceitável aflição que lhes foi imposta, tanto no momento em que
perderam o seu voo de conexão em Madri com destino à cidade de Roma, em razão do

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atraso na decolagem concernente ao primeiro trecho da viagem (São Paulo Madrid),


quanto nos dois instantes em que se viram privados de seus pertences em virtude da
perda de suas malas.

Igualmente, não há dúvidas quanto aos prejuízos de ordem patrimonial.

Para facilidade de compreensão, os ilícitos serão analisados


separadamente.

I. DO ATRASO DO VOO NO TRECHO SÃO PAULO - MADRI

De início, curial ressaltar que o voo relativo ao trecho São Paulo


Madrid foi operado unicamente pela LATAM, com tripulação e aeronave próprias,
conforme se depreende do “boarding pass” de fls. 24, de sorte que não se pode falar em
“code-share” (acordo no qual duas ou mais companhias aéreas compartilham o mesmo
voo, os mesmo padrões de serviço e os mesmos canais de venda) com a companhia
ALITALIA.

A corroborar a ausência de participação da ALITALIA na delonga em


comento, verifica-se que o documento de fls. 33/34, elaborado pela própria corré LATAM,
é no sentido de que “na data de 31.07.2017, o voo 8064, trecho GRU MAD, operado por
esta companhia, com decolagem prevista para às 22:50 horas ocorreu um desvio em
relação ao planejado. A previsão é de embarque na data de 01.08.2017, voo 9664, trecho
GRU MAD, operado pela LATAM, com decolagem prevista para às 11:00. Motivo do
desvio: 'Maintenance/manutencion'”.

Assim sendo, a responsabilidade de tal ato deve recair unicamente


sobre a LATAM, haja vista que, conforme bem pontuado pela ALITALIA, ela não teve
nenhuma participação na aludida morosidade.

A LATAM, por sua vez, sustenta que o cancelamento ocorreu em virtude


de “manutenção emergencial não programada na aeronave”, evento capaz de excluir o
dever de indenizar no caso concreto, em linha com o art. 14, §3º, II, do Código de Defesa

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do Consumidor. Entretanto, limitou-se a trazer prints do seu sistema interno (fls. 178).

Ora, a simples alegação unilateral da companhia aérea ré não tem o


condão de atestar eventual adversidade capaz de ocasionar o cancelamento do voo
contratado pelos demandantes.

Ainda que assim não fosse, não poderia a LATAM eximir-se de sua
responsabilidade civil, pois eventual falha técnica na aeronave, noticiada nos autos,
caracteriza-se como fortuito interno, inerente ao risco da atividade profissional, inapto,
portanto, a romper o nexo causal ensejador do dever de ressarcir os danos suportados
pelos autores.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já concluiu:

“CONSUMIDOR. CONCESSÃO DE SERVIÇOS AÉREOS. RELAÇÃO


HAVIDA ENTRE CONCESSIONÁRIA E CONSUMIDORES.
APLICAÇÃO DO CDC. ILEGITIMIDADE DA ANAC. TRANSPORTE
AÉREO. SERVIÇO ESSENCIAL. EXIGÊNCIA DE CONTINUIDADE.
CANCELAMENTO DE VOOS PELA CONCESSIONÁRIA SEM
RAZÕES TÉCNICAS OU DE SEGURANÇA. PRÁTICA ABUSIVA.
DESCUMPRIMENTO DA OFERTA. 1. A controvérsia diz
respeito à pratica, no mercado de consumo, de
cancelamento de voos por concessionária sem comprovação
pela empresa de razões técnicas ou de segurança. 2. Nas
ações coletivas ou individuais, a agência reguladora não
integra o feito em litisconsórcio passivo quando se discute a
relação de consumo entre concessionária e consumidores, e
não a regulamentação emanada do ente regulador. 3. O
transporte aéreo é serviço essencial e, como tal, pressupõe
continuidade. Difícil imaginar, atualmente, serviço mais
'essencial' do que o transporte aéreo, sobretudo em regiões
remotas do Brasil. 4. Consoante o art. 22, caput e parágrafo

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único, do CDC, a prestação de serviços públicos, ainda que


por pessoa jurídica de direito privado, envolve dever de
fornecimento de serviços com adequação, eficiência,
segurança e, se essenciais, continuidade, sob pena de ser o
prestador compelido a bem cumpri-lo e a reparar os danos
advindos do descumprimento total ou parcial. 5. A partir da
interpretação do art. 39 do CDC, considera-se prática abusiva
tanto o cancelamento de voos sem razões técnicas ou de
segurança inequívocas como o descumprimento do dever de
informar o consumidor, por escrito e justificadamente,
quando tais cancelamentos vierem a ocorrer. 6. A malha
aérea concedida pela ANAC é oferta que vincula a
concessionária a prestar o serviço nos termos dos arts. 30 e
31 do CDC. Independentemente da maior ou menor
demanda, a oferta obriga o fornecedor a cumprir o que
ofereceu, a agir com transparência e a informar
adequadamente o consumidor. Descumprida a oferta, a
concessionária viola os direitos não apenas dos
consumidores concretamente lesados, mas de toda a
coletividade a quem se ofertou o serviço, dando ensejo à
reparação de danos materiais e morais (inclusive, coletivos).
7. Compete ao Poder Judiciário fiscalizar e determinar o
cumprimento do contrato de concessão celebrado entre
poder concedente e concessionária, bem como dos contratos
firmados entre concessionária e consumidores (individuais e
plurais), aos quais é assegurada proteção contra a prática
abusiva em caso de cancelamento ou interrupção dos voos.
Recurso especial da GOL parcialmente conhecido e, nesta
parte, improvido” (REsp 1469087/AC, Rel. Min. Humberto
Martins, Segunda Turma, j. 18.08.2016, DJe 17.11.2016);

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“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO.


PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANS-PORTE
AÉREO. PROBLEMAS TÉCNICOS. FORTUITO INTERNO. RISCO
DA ATIVIDADE. VALOR DA INDENIZAÇÃO. MODERAÇÃO.
REVISÃO. SÚMULA N. 7/STJ. 1. A ocorrência de problemas
técnicos não é considerada hipótese de caso fortuito ou de
força maior, mas sim fato inerente aos próprios riscos da
atividade empresarial de transporte aéreo (fortuito interno),
não sendo possível, pois, afastar a responsabilidade da
empresa de aviação e, consequentemente, o dever de
indenizar.2. É inviável, por força do óbice previsto na Súmula
n. 7 do STJ, a revisão do quantum indenizatório em sede de
recurso especial, exceto nas hipóteses em que o valor fixado
seja irrisório ou exorbitante.3. Agravo regimental desprovido
por novos fundamentos” (AgRg no Ag 1310356/RJ, Rel. Min.
João Otávio se Noronha, Quarta Turma, j. 14.04.2011, DJe
04.05.2011).

Mas não é só, pois, afora não ter evidenciado o motivo do


cancelamento, não demonstrou ter prestado assistência alguma aos passageiros, que,
inclusive, chegaram a embarcar, a permanecer aproximadamente uma hora dentro da
aeronave e, depois, a desembarcar para, então, esperarem por 14 horas o próximo voo
que os levaria a Madri.

O cancelamento de voo, a exemplo do configurado na hipótese


vertente, em que os passageiros são submetidos a estresse psicológico, constrangimento,
cansaço e desconforto, constitui causa suficiente a gerar a obrigação de indenizar por
danos morais, cuja prova conforma-se com a mera demonstração do ilícito, haja vista
que, na espécie, a responsabilização do agente causador opera-se por força do simples
fato da violação (damnum in re ipsa).

Em suma, resultando incontroversa a considerável demora, tratando-se


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de dano que prescinde de comprovação e não tendo a empresa aérea demonstrado haver
tomado, em tempo hábil, todas as medidas ao seu alcance para minimizar o sofrimento
dos passageiros (vide art. 19 da Convenção de Montreal), tampouco provado causa
excludente de sua responsabilidade (art. 14, §3º, do CDC), de rigor o acolhimento da
pretensão indenizatória.

No tocante aos danos morais, não se olvida de que a justa reparação


deve abranger três vertentes: a primeira, de caráter punitivo, objetivando penalizar o
causador da lesão pela ofensa que praticou; a segunda, de caráter compensatório, que
proporciona ao ofendido algum bem em contrapartida ao mal sofrido, e a terceira, de
caráter dissuasório ou preventivo, que busca dissuadir o responsável pelo dano a cometer
novamente a mesma modalidade de violação e prevenir que outra pessoa pratique ilícito
semelhante.

Ainda sobre tal questão, Maria Helena Diniz ensina que:

"A fixação do 'quantum' competirá ao prudente arbítrio do


magistrado de acordo com o estabelecido em lei, e nos casos
de dano moral não contemplado legalmente, a reparação
correspondente será fixada por arbitramento (CC, art. 1553,
RTJ 69/276, 67/277). Arbitramento é o exame pericial tendo
em vista determinar o valor do bem, ou da obrigação, a ele
ligado, muito comum na indenização dos danos. É de
competência jurisdicional o estabelecimento do modo como
o lesante deve reparar o dano moral, baseado em critérios
subjetivos (posição social ou política do ofendido,
intensidade do ânimo de ofender: culpa ou dolo) ou objetivos
(situação econômica do ofensor, risco criado, gravidade e
repercussão da ofensa). Na avaliação do dano moral o órgão
judicante deverá estabelecer uma reparação equitativa,
baseada na culpa do agente, na extensão do prejuízo
causado e na capacidade econômica do responsável. Na
Apelação Cível nº 1024726-88.2018.8.26.0002 -Voto nº 13
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reparação do dano moral, o juiz determina, por equidade,


levando em contra as circunstâncias de cada caso, o quanto
da indenização devida, que deverá corresponder à lesão e
não ser equivalente, por ser impossível tal equivalência".
(Maria Helena Diniz in Curso de Direito Civil Brasileiro, São
Paulo, Saraiva, 1990, vol. 7, "Responsabilidade Civil", 5ª
edição, p. 78/79).

Em outros termos, deve-se levar em conta o bem jurídico lesado, a


magnitude do dano, as condições da vítima, o perfil do ofensor, o seu grau de culpa assim
como os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Há que prevalecer, em meio à análise de todos esses elementos, o


prudente arbítrio do julgador, a quem cabe evitar que a condenação, por um lado,
represente enriquecimento ilícito e, por outro, perca a sua tríplice finalidade.

A respeito, merece destaque o pensamento do Exmo. Ministro Sálvio


Figueiredo Teixeira:

“Recomendável que o arbitramento seja feito com


moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível
socioeconômico dos autores e, ainda, ao porte econômico
dos réus, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela
doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-
se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da
vida e às peculiaridades de cada caso” (Resps. números
214.381-MG; 145.358-MG e 135.202- SP).

Calcando-se em tais balizas, infere-se que o montante indenizatório de


R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a cada autor guarda razoabilidade com os percalços e
dissabores vivenciados, sobretudo com a estafante espera dos requerentes e com a perda
de um dia de viagem.

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Ademais, ainda que o Supremo Tribunal Federal consagrasse orientação


no sentido de que a Convenção de Montreal abarcaria tanto os prejuízos materiais
quanto os morais, o certo é que o montante indenizatório, ora arbitrado por esta Colenda
24ª Câmara de Direito Civil, continuaria a manter paridade com os lindes definidos nos
arts. 19 e 22, “1”, da referida Convenção (4.150 DES)1, a saber:

“Artigo 19 Atraso

O transportador é responsável pelo dano ocasionado por atrasos

no transporte aéreo de passageiros, bagagem ou carga. Não

obstante, o transportador não será responsável pelo dano

ocasionado por atraso se prova que ele e seus prepostos

adotaram todas as medidas que eram razoavelmente necessárias

para evitar o dano ou que lhes foi impossível, a um e a outros,

adotar tais medidas“

“Artigo 22 Limites de Responsabilidade Relativos ao Atraso


da Bagagem e da Carga

1. Em caso de dano causado por atraso no transporte de


pessoas, como se especifica no Artigo 19, a responsabilidade
do transportador se limita a 4.150 Direitos Especiais de
Saque por passageiro2”.

Por sua vez, os danos materiais relativos à diária perdida no hotel de


Roma em que os autores passariam a primeira noite de viagem também restaram
configurados.

A fatura do hotel de Roma (Kolping Hotel Casa Domitilla fls. 62) bem
1
De acordo com o site da Empresa de Correios e Telégrafos, em 03.06.2019, a cotação do “DES” Direito Especial de
Saque é de R$ 5,4287 (disponível em: http://www2.correios.com.br/sistemas/efi/consulta/cotacaomoeda/).
2 Segundo definição do Banco Central do Brasil, entende-se “Direito Especial de Saque” como “Ativo de reserva

internacional emitido pelo Fundo Monetário Internacional. O Direito Especial de Saque (DES) é composto por uma cesta
de moedas que inclui o dólar, o euro, a libra e o iene. O DES pode complementar as reservas oficiais dos países-
membros. Esses países também podem efetuar entre si trocas voluntárias de DES por moedas”.
Apelação Cível nº 1024726-88.2018.8.26.0002 -Voto nº 15
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ilustra o desconto da diária que estava agendada para o dia 01.08.2017. Conquanto a
referida fatura esteja em língua estrangeira, é possível identificar o número da reserva, o
nome dos hóspedes e as datas das diárias.

Afora isso, tal documento não foi objeto de impugnação específica da


LATAM.

Mesmo se considerando a indenização tarifada para a hipótese de


danos materiais, a verdade é que o montante indenizatóriao pleiteado em razão do
atraso do voo (R$ 164,00) também é inferior aos limites definidos no art. 22, “1” da
indigitada Convenção (4.150 DES)3.

A LATAM, por conseguinte, no que diz respeito à demora constatada,


deve a cada um dos autores, seus passageiros, indenização por danos morais no
“quantum” de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigido monetariamente a partir do
arbitramento e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação, afora o
ressarcimento conjunto por danos materiais no importe de R$ 164,00 (cento e sessenta e
quatro reais) relativo à diária perdida no hotel de Roma em que os autores passariam a
primeira noite de viagem, o qual deverá ser corrigido monetariamente a partir do
desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês desde a citação.

I. DO EXTRAVIO DAS BAGAGENS

Os documentos de fls. 35 e 36 atestam que as bagagens dos autores


foram extraviadas tanto no trecho de ida realizado no dia 02.08.2017, entre Madri e
Roma, como no trajeto de volta concretizado aos 22.08.2017.

A corré ALITALIA não nega o referido extravio, limitando-se a defender


que as bagagens foram devolvidas sem nenhuma violação aos pertences dos passageiros.
Todavia, não esclareceu após quantos dias as referidas malas foram entregues aos
requerentes nem provou tê-las efetivamente devolvido.

3
Em 01.08.2018 (data da diária perdida), a cotação do “DES” Direito Especial de Saque era de R$4,3986,
conforme https://www.bcb.gov.br/conversao
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A LATAM, por sua vez, nem sequer trata do tema relativo a extravio,
dando a entender que não teria responsabilidade alguma pelo desaparecimento das
bagagens.

Entretanto, diferentemente do atraso do voo, em que a aeronave e a


tripulação pertenciam unicamente a LATAM, que vendeu as respectivas passagens, o
extravio das bagagens no trecho Madri Roma é de responsabilidade solidária de ambas
as companhias aéreas, haja vista que a ALITALIA realizou o transporte dos recorrentes no
regime de code-share com a LATAM.

Por meio do acordo de cooperação denominado “code-share”, as


companhias aéreas, consoante outrora dito, compartilham o mesmo voo, oferecendo,
assim, mais destinos aos passageiros. Justamente por isso, no documento de fls. 35, o
campo destinado ao voo faz referência tanto ao IATA (“International Air Transport
Association”) da LATAM (JJ 9664) como da ALITALIA (AZ 0059-02).

A propósito da responsabilidade solidária das empresas aéreas que


operam em code-share, eis precedentes deste Egrégio Tribunal de Justiça:

“Ação de indenização por danos materiais e morais


decorrentes de extravio temporário de bagagem e atraso de
voo internacional Compra das passagens aéreas junto ao
réu Trechos da viagem operados por companhias distintas
Prática de 'Code Share' Responsabilidade solidária do réu
pelos prejuízos ocorridos no trecho realizado pela outra
empresa Precedentes do Superior Tribunal de Justiça
Incidência dos arts. 7.º, Parágrafo Único e 25, § 1.º, do
Código do Consumidor Prejuízos materiais comprovados,
art. 373, I, do Código de Processo Civil Inaplicabilidade da
Convenção de Montreal em relação aos danos morais pela
falta de regulamentação expressa nesse sentido Incidência
das regras previstas no Código do Consumidor Prejuízo

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extrapatrimonial Adequação do arbitramento em quantia


suficiente, proporcional e razoável com as circunstâncias e
peculiaridades da hipótese fática Procedência da ação
Recurso provido” (TJSP; Apelação Cível
1021619-36.2018.8.26.0002; Relator (a): César Peixoto;
Órgão Julgador: 38ª Câmara de Direito Privado; Foro
Regional II - Santo Amaro - 5ª Vara Cível; Data do
Julgamento: 22/11/2018; Data de Registro: 22/11/2018);

“Ação de indenização por dano moral. Impossibilidade de


embarque em voo agendado. Chegada ao destino com um
dia de atraso. Sentença de procedência. Apelo da ré.
Inaplicabilidade da Convenção de Montreal. Voo
internacional. Tese fixada pelo Superior Tribunal Federal no
RE 336.631. Aplicação da Convenção de Varsóvia (Decreto nº
5.910/2006), em casos de reparação por dano material,
decorrente de voo internacional, em sobreposição ao Código
de Defesa do Consumidor. Tese que não se aplica a
reparação por dano moral'. Interpretação do Supremo
Tribunal Federal que restringe a aplicação da Convenção à
esfera dos danos materiais. Possibilidade de ajuizamento de
ação de indenização por dano moral, com base no Código de
Defesa do Consumidor. Legitimidade passiva. Voo operado
em code-share. Acordo comercial entre empresas aéreas.
Nos termos dos artigos 7º e 25º do Código de Defesa do
Consumidor. Todas as empresas envolvidas na cadeia de
serviços têm legitimidade passiva para responder pela ação.
Precedentes TJSP E STJ. Denunciação da lide. Vedação
expressa do art. 88 do Código de Defesa do Consumidor.
Eventual direito de regresso que não justifica a denunciação

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da lide diante da responsabilidade solidária da ré. Atraso em


voo. Autores que chegaram ao seu destino com 24 horas de
atraso e tendo que pernoitar no Peru. Fatos que ultrapassam
o mero aborrecimento. Dano moral reconhecido.
Precedentes. Valores arbitrados com razoabilidade. Sentença
mantida. Recurso desprovido. Embarque em voo posterior
com destino diverso ao contratado. Ação procedente. Apelo
da ré. Inteligência do Art. 14 c.c. o Art. 6º, VII, do CDC.
Relação jurídica consolidada. Responsabilidade objetiva.
Dever de reparação independente de culpa. Dano moral 'in
re ipsa'. 'Quantum' indenizatório fixado em R$ 10.000,00.
Impossibilidade de redução do valor indenizatório. Sentença
confirmada. Recurso desprovido” (TJSP; Apelação Cível
1057249-90.2017.8.26.0002; Relator (a): Virgilio de Oliveira
Junior; Órgão Julgador: 21ª Câmara de Direito Privado; Foro
Regional II - Santo Amaro - 1ª Vara Cível; Data do
Julgamento: 18/05/2018; Data de Registro: 18/05/2018);

No mesmo sentido é a jurisprudência do Tribunal da Cidadania:

“APELAÇÕES CÍVEIS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E


MATERIAIS. EXTRAVIO E PERDA DE OBRAS ARTÍSTICAS EM
VOO INTERNACIONAL. MAJORAÇÃO DO QUANTUM
NECESSIDADE. MÁCULA IRRETORQUÍVEL À CARREIRA E
IMAGEM DA AUTORA. DISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS
SUCUMBENCIAIS. NECESSIDADE DE CORREÇÃO.
INAPLICABILIDADE DA CONVENÇÃO DE MONTREAL EM
DETRIMENTO DO CDC. PARCERIA (CODE SHARE) ENTRE
EMPRESAS AÉREAS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA.
MANIFESTA FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. JUROS E
CORREÇÃO MONETÁRIA. ÍNDICES E DATAS DE INCIDÊNCIA.

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FIXAÇÃO DE OFÍCIO. QUESTÕES DE ORDEM PÚBLICA. I. (...) II.


(...) III. (...) IV. As empresas aéreas contratadas pelo sistema
code share respondem solidariamente por danos causados
aos passageiros (art. 25, do CDC), sendo que qualquer delas
tem legitimidade para ocupar o polo passivo da demanda
indenizatória. (...)” (AREsp 388975 / MA, Rel. Min. Marco
Buzzi, j. 23/09/2013).

Já a responsabilidade pelo sumiço das malas no trajeto Bruxelas Roma


é somente da ALITALIA, pois o documento de fls. 36 acusa apenas o seu código “AZ”
diante dos números do voo e do bilhete aéreo, a indicar ter sido o trajeto operado
unicamente por essa companhia aérea.

Ora, no tocante aos danos morais, tem-se que o desaparecimento de


bagagem é ocorrência que transcende o que se convencionou denominar de mero
aborrecimento.

A simples circunstância de o passageiro ver frustrada sua legítima


expectativa de ter acesso à sua bagagem causa inegável transtorno, sendo o suficiente
para dar azo à condenação ao pagamento de indenização por danos morais, como forma
de compensá-lo pela aflição suportada, punir as companhias aéreas pelo inconveniente e
incentivá-las a repensar a sua postura perante os consumidores.

Ademais, é irrelevante o fato de a ALITALIA haver alegado que o


descaminho foi temporário, máxime porque não comprovou que as bagagens foram
restituídas aos passageiros, de sorte que prevalece a versão dos autores, no sentido de
que foram extraviadas e não apenas entregues com atraso.

Ora, ficar privado dos pertences pessoais em outro país, seja pelo
interregno de tempo que for, já é o bastante para acarretar sensível frustração, isso sem
contar a sensação de insegurança e impotência que naturalmente acomete quem se vê
nessa indesejável situação.

Apelação Cível nº 1024726-88.2018.8.26.0002 -Voto nº 20


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Em casos análogos, este Egrégio Tribunal de Justiça entendeu pela


configuração de danos morais:

“AÇÃO INDENIZATÓRIA - TRANSPORTE AÉREO - EXTRAVIO


TEMPORÁRIO DE BAGAGEM - QUEBRA CONTRATUAL -
RESPONSABILIDADE OBJETIVA - INTELIGÊNCIA DO ART. 14
DA LEI 8.078/90 - DANO MORAL - CONFIGURAÇÃO -
ARBITRAMENTO - VALOR - ATENÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA
RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE - SENTENÇA -
REFORMA NESSE PONTO (...) ”(Apelação n.
1013380-21.2015.8.26.0011; Relator(a): Antonio Luiz
Tavares de Almeida; 11ª Câmara de Direito Privado; Data do
julgamento: 18/05/2017);

“Indenização Transporte aéreo internacional Extravio


temporário de bagagem Dano moral Caracterização,
pois só extravio da bagagem com pertences pessoais é fato
que transcende o mero aborrecimento de qualquer viagem
Indenização fixada em R$ 30.000,00 Redução para R$
10.000,00 que se mostra necessária Recurso parcialmente
provido” (Apelação n. 0062694-59.2011.8.26.0506;
Relator(a): Souza Lopes; 23ª Câmara Extraordinária de
Direito Privado; Data do julgamento: 27/04/2017);

“Transporte Aéreo Internacional. Danos morais. Extravio


temporário de bagagem, nos dois trechos da viagem (ida e
volta). Aplicação do artigo 14 do Código de Defesa do
Consumidor, com inversão do ônus da prova. Aplicação,
ademais, do disposto no artigo 6º, inciso VIII, do mesmo
estatuto. (...) DANO MORAL. Reconhecimento. Falha na
prestação de serviços. Transtornos e aflições decorrentes do

Apelação Cível nº 1024726-88.2018.8.26.0002 -Voto nº 21


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fato. Danos morais devidos. Sentença mantida. QUANTUM


INDENIZATÓRIO. Redução. Cabimento. Observância aos
princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Sentença
reformada” (Apelação n. 1029716-27.2015.8.26.0100;
Relator(a): Fernando Sastre Redondo; 38ª Câmara de Direito
Privado; Data do julgamento: 19/04/2017).

A verba indenizatória decorrente de dano moral, na hipótese sub judice,


tem como objetivo minimizar o dissabor vivenciado pelos demandantes em decorrência
da falha na prestação dos serviços das companhias aérea rés, que perderam as bagagens
em duas ocasiões, deixando os autores sem seus pertences ao longo de uma viagem que
estava prevista para durar mais de vinte dias. Não bastasse, as referidas malas nem
sequer lhes foram devolvidas.

Frente às peculiaridades do caso em tela, entende-se que a importância


de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), pretendida pelos autores, individualmente, é
exacerbada, levando ao enriquecimento indevido. Fixa-se, então, a quantia de R$
8.000,00 (oito mil reais) a cada postulante, por ser condizente com a perturbação
oriunda do lapso noticiado, não se mostrando, igualmente, capaz de causar
locupletamento sem causa.

Afinal, consoante a própria narrativa dos autores, embora


inquestionáveis os percalços decorrentes dos extravios das malas, isso não os impediu de
desfrutar de sua viagem planejada com tanta antecedência. Tampouco relatam os
demandantes que as vestes compradas às pressas tenham sido inadequadas a algum
passeio anteriormente agendado.

A bem da verdade, a alegação de que o desaparecimento dos pertences


da autora Juliana teria piorado a sua doença autoimune, em decorrência da
impossibilidade de utilização de xampus específicos para o seu couro cabelo e de calçados
ortopédicos indicados a sua escoliose, não restou comprovada.

Portanto, as requeridas devem ser condenadas, de forma solidária, ao


Apelação Cível nº 1024726-88.2018.8.26.0002 -Voto nº 22
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pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a
cada autor, cabendo a LATAM suportar 1/3 dessa importância, pela responsabilidade
compartilhada com ALITALIA no trajeto Madri Roma, e a ALITALIA enfrentar os 2/3
remanescentes, devido também à sua responsabilidade única no trajeto Bruxelas Roma.
O referido quantum deverá ser corrigido monetariamente a partir do arbitramento e
acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação.

Os danos materiais, outrossim, restaram inequívocos.

Com todo devido respeito ao entendimento perfilhado pelo nobre


magistrado a quo, o simples fato de as notas fiscais de fls. 37/62 estarem em língua
estrangeira é incapaz de afastar os prejuízos patrimoniais suportados pelos apelantes,
máxime porque comprovam a compra de bens em diversas cidades da Europa e dentro
do período em que os recorrentes lá estiveram a turismo.

A planilha de fls. 66/67 também indica de forma pormenorizada o nome


da loja, o produto, o valor em euro e a sua respectiva conversão para o real.

Afora isso, tais documentos não foram objeto de impugnação específica


das companhias aéreas rés.

Em caso similar, este Egrégio Tribunal de Justiça assim decidiu:

“RESPONSABILIDADE CIVIL Extravio temporário de


bagagem ocorrido no trajeto de ida, que foi entregue após
aproximadamente três dias depois da chegada ao destino
internacional. Responsabilidade da ré que se assenta no
acordo de cooperação existente entre as companhias, que
compartilham a mesma cadeia de consumo, respondendo
solidariamente perante o consumidor. Responsabilidade
solidária e objetiva. Dano material. Comprovação por notais
fiscais, nas quais se pode verificar a data, horário e valor da
compra, compatíveis com os fatos discutidos nos autos.

Apelação Cível nº 1024726-88.2018.8.26.0002 -Voto nº 23


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Irrelevante a língua estrangeira. Passageiro que se viu


obrigado a adquirir tais bens e peças de vestuário. Danos
morais. Configuração. Inequívoco o transtorno, a irritação, o
desconforto e o sentimento de impotência e descaso em
relação a grave falha da companhia de transporte aéreo.
Desgaste físico e mental. Indenização fixada em
R$10.000,00. Valor que se revela adequado ao propósito de
compensar a autora sem enriquecê-la, atentando-se à
capacidade financeira da parte ofensora e ao escopo de
evitar a reiteração do ilícito. Indenização que não está
limitada pelo julgamento dos RE 636.331-RJ e ARE 766.618-
SP, pelo STF, e assim ao disposto na norma internacional,
aplicável apenas a reparação de danos materiais.
Precedentes. Termo inicial dos juros de mora. Citação. Ilícito
contratual. Art. 405 do Código Civil. Valor concedido a título
de indenização por danos materiais que se encontra dentro
do limite de 1.000 DES Direito Especial de Saque,
estabelecido no art. 22 da Convenção de Montreal. -
RECURSO DESPROVIDO” (TJSP; Apelação Cível
1016441-06.2018.8.26.0003; Relator (a): Ramon Mateo
Júnior; Órgão Julgador: 18ª Câmara de Direito Privado; Foro
Regional III - Jabaquara - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento:
09/04/2019; Data de Registro: 10/04/2019).

O ressarcimento é devido, uma vez que os apelantes se viram obrigados,


em virtude da perda de suas malas, a comprar peças de vestuário, calçados bem como
itens de toucador e de higiene pessoal, visando ao atendimento de suas necessidades
básicas durante aproximadamente 20 dias. Uma vez realizadas as compras, foram
novamente despojados de seus bens, de sorte que os itens adquiridos não foram
incorporados ao seu patrimônio.

Apelação Cível nº 1024726-88.2018.8.26.0002 -Voto nº 24


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Por derradeiro, cumpre igualmente observar que a importância


pleiteada a título de danos materiais (R$ 11.245,30), diante dessa situação (perda da
bagagem de ida e de volta, esta última contendo produtos adquiridos durante a viagem
para manutenção de duas pessoas durante cerca de vinte dias na Europa, região em que
os gastos costumam ser altos, máxime em agosto, época em que o turismo encontra-se
em alta temporada), não se afigura desarrazoada. Ao contrário, chega a ser módica. Além
do mais, não ultrapassa o limite de 1.000 DES estabelecido no art. 22, “2” da Convenção
de Montreal, que corresponde a R$ 4.416,10 na data do primeiro extravio (02.08.2017), e
R$ 4.442,10 na data do segundo (22.08.2017), valores estes que devem ser computados a
cada um dos passageiros.

Frise-se que as rés não impugnam a conversão da moeda estrangeira


(euro) para a brasileita realizada pelos autores ao arrolarem os seus gastos às fls. 66/67.

Portanto, a indenização por danos materiais, decorrente de extravio de


bagagens, deverá ser na importância de R$ 11.245,30 (onze mil, duzentos e quarenta e
cinco reais e trinta centavos), atualizada desde os desembolsos e acrescida de juros
legais de mora a contar da citação.

Dessa importância, LATAM ficará incumbida de enfrentar 1/3 e


ALITALIA, os 2/3 restantes, pelos motivos outrora expendidos.

Em suma, a r. sentença deve ser julgada parcialmente procedente para


condenar: (i) a corré LATAM ao pagamento de: (a) indenização por danos morais
decorrentes do atraso do voo no valor R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a cada autor,
corrigido monetariamente a partir do arbitramento e acrescido de juros de mora de 1%
ao mês a partir da citação; (b) indenização por danos materiais no importe de R$ 164,00
(cento e sessenta e quatro reais) relativo à diária perdida no hotel de Roma em que os
autores passariam a primeira noite de viagem, o qual deverá ser corrigido
monetariamente a partir do desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês
desde a citação; (ii) as rés LATAM e ALITALIA, de forma solidária e segundo os
percentuais já definidos, ao pagamento de: (a) indenização por danos morais no valor de

Apelação Cível nº 1024726-88.2018.8.26.0002 -Voto nº 25


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R$8.000,00 (oito mil reais) a cada autor, corrigido monetariamente a partir do


arbitramento e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação; (b)
indenização por danos materiais no importe de R$ 11.245,30 (onze mil, duzentos e
quarenta e cinco reais e trinta centavos), corrigido monetariamente desde as datas dos
respectivos desembolsos e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação.

Ante a sucumbência mínima dos autores, caberá às rés o enfrentamento


das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 20% sobre o
valor da condenação, já considerada a majoração decorrente dos honorários recursais.

Para fins de prequestionamento, enfatiza-se que toda matéria devolvida


no apelo se encontra prequestionada, com a ressalva de que o juiz não está obrigado a
mencionar expressamente todos os pontos suscitados pelas partes, tampouco a citar as
normas aventadas, bastando que o recurso tenha sido fundamentadamente apreciado.

Ante o exposto, dá-se parcial provimento ao recurso.

Desembargadora Jonize Sacchi de Oliveira

Relatora

Assinatura Eletrônica

Apelação Cível nº 1024726-88.2018.8.26.0002 -Voto nº 26

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