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POR UMA PÓS-MODERNIDADE MENOS VULGAR

Lucas Costa Oliveira 1

INTRODUÇÃO:

O presente trabalho tem como objetivo analisar criticamente a posição de


Boaventura de Sousa Santos frente ao Marxismo e o papel que este representa em seu
complexo sistema epistemológico e societal. É sabido que referido sistema através do recurso
da Tradução, que se subdivide em sociologia das ausências e das emergências, busca analisar
perspectivas que poderiam servir de posições contra hegemônicas ignoradas pela razão,
propriamente dita moderna, aliada ao capital, e a partir da identificação daquelas verificar o
quão cabíveis ao universo atual podem ser.

Diante desse quadro, o texto que se segue foi dividido em três seções distintas em
que serão retratados respectivamente: o que seria a condição do presente para Boaventura de
Sousa Santos enquanto padrão avaliativo contemporâneo; a analise do método da Tradução
realizado no segundo capítulo de Pela mão de Alice. O social e o político na Pós-
modernidade, seguida das críticas e incongruências observadas por Santos a cerca da tradição
marxiana e sua adequação à realidade atual; uma leitura crítica a partir de referênciais
marxistas e do próprio Marx sobre as asserções feitas a sua tradição teórica.

Por fim, o trabalho conclui-se, com ares de crítica, porém com esperança de que o
conhecimento independente de suas origens possa ser dialeticamente reorganizado e nunca
excluído, mas sempre superado.

1 - Boaventura de Sousa Santos e a condição do presente:

A modernidade ocidental, em vez de significar o abandono do estado de


natureza e a passagem à sociedade civil, significa a coexistência de
sociedade civil e estado de natureza separados por uma linha abissal com
base na qual o olhar hegemônico, localizado na sociedade civil, deixa de ver
e declara efetivamente como não-existente o estado de natureza. (SANTOS,
2007, p. 73)

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Mestrando em Direito e Inovação pela Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF
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A separação abissal citada traz um retrato da nossa era. O domínio incontestável


da ciência e seus métodos formais de verificação da verdade. Dessa forma, comunga-se que o
conhecimento “real” só pode se estabelecer por vias do método científico, obtendo deste sua
validade. O cumprimento de tal requisito encontra-se no cerne do pensamento ocidental dos
últimos séculos. Servindo tanto de arma epistemológica, como ideológica, para a justificação
da ocidentalização do mundo através dos discursos universais empregados pelo capitalismo.
No estágio evolutivo atual, o conhecimento científico racional permanece sendo
visto hegemonicamente como a única verdade possível, deixando relegados ao limbo do
esquecimento e indiferença quaisquer outras formas do saber – ignorando não só aquilo que
se produz para além do conhecimento científico, mas também os sujeitos que lhe produzem,
bem como seus desejos e aspirações – mantendo-se um jogo de dominação entre Homens
através da colagem de etiquetas de exclusão social.
Como expõem Santos e Chaui a predominância da regulação sob o colapso da
emancipação vem sendo também propiciada pela racionalidade científica, de modo que:

[...] a predominância da racionalidade cognitivo-instrumental em relação às


demais formas de racionalidade fez com que o intelecto moderno se tornasse
uma razão “metonímica” (toma “a parte” da cultura científica e filosófica do
ocidente pelo “todo”, concebendo-a como forma ultima da organização dos
saberes) e “proléptica” (pretende possuir o conhecimento do futuro no
presente, concebido como progresso sem limites). Porque pressupõe, assim,
um destino melhor e inexorável para a humanidade, fundado no progresso
infinito proporcionado pelo conhecimento científico e porque não abre
campos de pensamento e de ação para o advento de formas diferentes de ser
e de saber, a razão moderna tornou-se impotente para suportar o desafio de
interrogar alternativas à ideologia do fim da história (no duplo sentido do
termino e do telos). Estamos, pois, diante da hegemonia de uma razão
indolente, incapaz de pensar o presente, desperdiçando a experiência e por
isso mesmo insuficiente para alçar-se a novas possibilidades de futuro.
(SANTOS; CHAUI, 2013, p. 27-28)

Face a esse cenário de crise da modernidade, Boaventura de Sousa Santos propõe


uma transição paradigmática, Santos e Chaui (2013, p. 28-30), que conceba formas
alternativas de sociabilidade em busca de novos padrões sociais, políticos, jurídicos e também
cognitivos. Esse paradigma a ser construído pelo procedimento da Tradução perpassa pela
analise de duas sociologias (Sociologia das ausências e Sociologia das emergências), a
primeira delas identifica as experiências de saber desperdiçadas pela razão indolente
indagando-se como tais experiências poderiam ser utilizadas como alternativas contra
hegemônicas. Por outro lado, a Sociologia das emergências investiga como tais alternativas
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contra hegemônicas podem ser inseridas no contexto contemporâneo. Propõe-se uma utopia
cognitiva capaz de propiciar na realidade a concretização de uma utopia política em ação
contra o contexto globalizado Hegemônico.

2 - O lugar do marxismo na transição paradigmática pós-moderna:

A construção desse novo paradigma pós moderno, como se crê a partir da leitura
de Pela Mão de Alice. O social e o político na Pós-modernidade, em especial pelo capítulo
segundo da obra, perpassa pela analise da Teoria Marxista. No capítulo intitulado: Tudo que é
sólido se desfaz no ar: o marxismo também?, Santos (1999, p. 25-46) realiza procedimentos
de verificação da atualidade de tal corrente teórica frente aos problemas cotidianos. O que só
pode ser feito segundo a aplicação das duas analises sociológicas destacadas no paragrafo
anterior. Em sendo assim o requisito da sociologia das ausências é cumprido primeiramente
quando o referido capítulo se encontra sobre uma unidade maior do livro intitulada
“Referências”, em que levado o contexto em que o sociólogo lusitano pretende a transição
paradigmática, as referências que usa para isso evidentemente cumprem o requisito de
evidenciarem práticas contra hegemônicas. Não bastasse essa caracterização global enquanto
referências, assevera o autor:

Não estamos, pois, perante uma moda teórica dos anos sessenta que, como
muitas outras modas do mesmo período, não é moda estarem agora em
moda. Estamos antes perante um dos pilares das ciências sociais da
modernidade e tudo o que nele ocorrer não pode deixar de repercutir no
conjunto destas. E, reciprocamente, as transformações por que as ciências
sociais houverem de passar nos próximos anos não pode deixar de produzir
efeitos mais ou menos profundos nos seus pilares. (SANTOS, 1999, p. 33)

Santos (1999, p. 35-36) prossegue afirmando que no plano epistemológico, o


marxismo pouco tem a contribuir para a transição paradigmática proposta, uma vez que Marx
demonstrou uma fé incondicional na ciência moderna, bem como no progresso e na
racionalidade geradas por ela. Entretanto no plano sócio-político não se pode dizer o mesmo.
Santos afirma que insere-se dentro do Pós-modernismo de Oposição, o qual se faz ciente de
que as promessas modernas não foram e nem podem ser cumpridas depois que reduziu suas
possibilidades às do Capitalismo. Logo tais promessas não podem ser consubstanciadas em
termos modernos ou se quer pelos mecanismos estruturados pela Modernidade. Desta forma,
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para referida versão do pós-modernismo é essencial a ideia tal qual a formulada por Marx de
uma alternativa radical à sociedade capitalista.
Cumprido o requisito da sociologia das ausências, passa-se à segunda etapa do
procedimento de tradução: a sociologia das emergências. Dessa forma, pergunta-se: “Qual é,
pois, a condição do presente e que contributo podemos esperar do marxismo para a
compreender e para a transformar? “ (SANTOS, 1999, p. 34). Referida avaliação do
potencial marxista nestes termos se dá sob três frentes principais: ( i ) Processos de
determinação social; ( ii ) Ação coletiva e identidade; ( iii ) Direção da transformação social.
Adiante-se ao leitor que a doutrina marxista falha, na interpretação que Boaventura de Sousa
Santos, desfazendo-se no ar frente a atual condição de nossa sociedade necessitando de ser
severamente atualizada.
Na analise do primeiro eixo, Santos (1999, p. 36) afirma que Marx não se limitou
somente a apresentar uma macro análise do capitalismo, tendo também formulado uma nova
teoria da historia, o Materialismo-histórico, segunda a qual as sociedades evoluem necessária
e deterministicamente por meio de leis em que o desenvolvimento das forças produtivas
determina e explica a estrutura econômica da sociedade, que por conseguinte determina e
explica as formas políticas, jurídicas e culturais (superestrutura). Santos prossegue,
informando que fortes críticas têm sido feitas ao materialismo quanto ao seu determinismo e
evolucionismo, bem como de um reducionismo economicista. Entretanto as primeiras críticas
são deixadas de lado quanto ao seu desenvolvimento, pois, para o autor, o determinismo de
Marx só poderia ser analisado frente ao contexto sócio-político em que estava inserido e não
frente à “condição do presente”.
Santos (1999, p. 37-38) prossegue então na crítica do reducionismo econômico,
afirmando que a manutenção do mesmo se faz insustentável, primeiramente porque a
explicação pelas lentes econômicas transforma fenômenos políticos e culturais em
epifenômenos, e portanto derivados de um outro, o que impede de pensa-los autonomamente.
Não bastasse essa asserção, reforça o Pós-modernista que a impossibilidade do reducionismo
econômico resulta do fato de que ao avançarmos pelo período de transição paradigmática que
vivemos, torna-se cada vez mais difícil distinguir entre o econômico, o político e o cultural.
Quanto ao eixo da Ação coletiva e identidade, a análise foca na primazia
explicativa e transformativa dada por Marx as classe sociais. Quanto a essa primazia, Santos
(1991, p. 39) aponta o que considera suas deficiências: primeiramente a evolução das classes
não seguiu a previsão marxista, em muitos países a classe operária tornou-se mais
heterogênea e não homogênea, assim como a burguesia que fragmentou-se com o surgimento
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de classes médias; além disso, outras formas de opressão baseadas na raça, etnia, religião e no
sexo mostraram-se tão importantes quanto as que se sustentam na divisão de classes; de
mesmo modo, surgiram facções de classes sem uma base nacional, classes transnacionais;
bem como lutas de classes ocorridas no decorrer dos séculos assumiram contornos não
previstos por Marx, as revoluções operárias não ocorreram nos países centrais, e nos países
periféricos em que se deram revoluções de orientação socialista, a participação do operariado
quando não foi inexistente foi problemática. Santos (1999, p. 40) dá continuidade, dizendo
que nas ultimas três décadas os movimentos e as lutas políticas mais importantes ocorridas,
quer sejam em países centrais ou periféricos, foram protagonizados por grupos sociais de
estudantes, mulheres, grupos étnicos e religiosos, por pacifistas e grupos ecológicos que estão
marcados por identidades que não são diretamente classistas. E sendo assim, verifica-se a
própria história indo a encontro à primazia transformadora das classes sociais.
Quanto à primazia explicativa, Boaventura de Sousa Santos limita-se a exprimir a
sua própria conclusão sobre o debate gerado em torno daquela:

Em primeiro lugar, as classes são um fator de primeira importância na


explicação dos processos sociais, mas tal importância só é aferível em
analises concretas e não necessita, para se sustentar, da estipulação abstracta
da primazia explicativa. Em segundo lugar, é errôneo reduzir a identificação,
formação e estruturação das classes à estrutura econômica da sociedade. As
classes são uma forma de poder e todo poder é político. O valor explicativo
das classes depende das constelações de diferentes formas de poder nas
praticas sociais concretas. Uma família operaria da periferia de Lisboa sofre
simultaneamente o poder de classe, o poder sexual, o poder estatal e até, se
forem imigrantes africanos, o poder étnico. (SANTOS, 1999, p. 41)

No que concerne ao terceiro e ultimo eixo de avaliação da sociologia das


emergências, direção da transformação social, vale citar as palavras do Sociólogo lusitano:

Marx acreditou, sem reservas, no desenvolvimento neutro e infinito das


forças produtivas, no progresso como processo de racionalização científica e
técnica da vida, na exploração sem limites da natureza para atender as
necessidades de uma sociedade de abundancia para todos. Em suma, a utopia
de Marx é, em tudo, um produto da modernidade e, nessa medida, não é
suficiente para nos guiar num período de transição paradigmática.
(SANTOS, 1999, p. 42)

Para Boaventura de Sousa Santos (1999, p. 42-43) a única utopia realista em finais
de século XX é a utopia ecológica e democrática que se assenta num princípio partilhado da
realidade que consiste na contradição entre o ecossistema do planeta que é finito e a
acumulação do capital que visa o infinito. Assim sendo a analise que Marx faz da contradição
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social, que assegura a exploração do trabalho no capitalismo, permanece válida. Entretanto,


frisa o autor que, Marx não foi capaz de enxergar a articulação entre a exploração do trabalho
e a destruição da natureza e as consequentes contradições que uma produz sobre a outra. Por
fim, em encerramento do capítulo, o autor apoiado em O‟Connor e Polanyi considera que o
capitalismo se estrutura em duas contradições. A primeira, já tratada por Marx diz respeito à
exploração do trabalho. Já a segunda diz respeito às condições de produção em que tudo é
tratado como mercadoria, até mesmo a natureza, que não foi produzida como mercadoria.
Logo, a partir dessa dupla contradição o capital apropria-se da força de trabalho, do espaço,
da natureza e do meio ambiente em geral.

3 - Para além do Marx de Sousa Santos:

Nessa sessão em específico o presente trabalho apoia-se nas considerações feitas


por José Paulo Neto, no apêndice de seu livro Marxismo Impenitente, em que analisa o
capítulo de Pela Mão de Alice. O social e o político na pós-modernidade que trata
especificamente da doutrina marxista. Em assim sendo, cumpre citar passagem que resume a
avaliação feita por Netto (2004, p. 223-241).

Nas paginas de Pela Mão de Alice... o que é fundante na analise que Sousa
Santos faz da teoria marxiana (e da tradição marxista) é uma concepção
convencionalíssima da obra de Marx, que teria criado, “ainda que de modo
não sistemático, uma nova teoria da história, o materialismo histórico”, a
partir do qual se viabilizariam cortes científicos e ideais particulares – donde
Sousa Santos possa referir-se à „sociologia” e à “utopia” de Marx, como
poderia referir-se a uma “filosofia”, a uma “economia” etc. Ou seja: a
concepção de Sousa Santos projeta sobre a obra marxiana a divisão das
ciências sociais oitocentistas, apanhando nela os recortes teórico-científicos
que mais lhe convêm (no caso, a ênfase numa “sociologia”). Está claro que,
com este procedimento, o que não se resgata da teoria social de Marx é
justamente aquilo que lhe é mais visceral e medular: seu caráter unitário e
totalizante/totalizados, embasado numa ontologia do ser social – a partir da
crítica da economia política – historicamente construído no mundo do
capital. (NETTO, 2004, p. 239).

A avaliação da teoria marxiana, frente à condição do presente, que Boaventura de


Sousa Santos realiza através do procedimento da sociologia das emergências não é capaz de
fundar uma interpretação do marxismo que seja suficiente para uma avaliação dos contributos
de referida teoria para os desafios mundanos que a realidade atual nos apresenta, Netto (2004,
p. 238). Diante dessas constatações realizar-se-á um tratamento crítico, sob referenciais
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marxistas, do procedimento avaliativo de tal empreitada sociológica realizada nas poucas


paginas que Boaventura de Sousa Santos dedica a tradição marxiana no referido livro.
Partindo do começo – processo de determinação social – e do que parece ser a
principal fonte de críticas ao marxismo e ao materialismo histórico, tem-se que para Santos
(1999, p. 37), o reducionismo econômico transforma os demais fenômenos sociais em
epifenômenos da economia. Ademais, assevera o lusitano que à medida que avançamos na
transição paradigmática maiores são as dificuldades em distinguir o econômico, o político e o
cultural isoladamente.
A crítica de Boaventura desconsidera aquilo que Lukács (2003, p. 105), já em
História e Consciência de classe, tinha claro como a luz. Isto é, o fato de que não é o
predomínio dos motivos econômicos que diferencia o marxismo da filosofia burguesa. Tal
tarefa é realizada pela categoria da Totalidade, do domínio do todo sobre as partes. Esse fator
é o que faz da ciência proletária revolucionária, pois introduz caracteres até então
ignorados/camuflados pela filosofia burguesa.

O método dialético em Marx visa ao conhecimento da sociedade enquanto


totalidade. Enquanto a ciência burguesa confere uma “realidade” com um
realismo ingênuo, ou certa autonomia com espirito “critico”, àquelas
abstrações que, para uma ciência não pertence ao âmbito da filosofia, são
necessárias e uteis do ponto de vista metodológico e resultam, de um lado,
da separação pratica dos objetos da investigação e, do outro, da divisão do
trabalho e da especialização científicas, o marxismo supera essas separações
elevando-as e rebaixando-as à categoria de aspectos dialéticos. [...] Para o
marxismo, em ultima analise, não há, portanto, uma ciência jurídica, uma
economia política, e uma história etc. autônomas, mas somente uma ciência
histórico-dialética, única e unitária, do desenvolvimento da sociedade como
totalidade. (LUKÁCS, 2003, p. 106-107)

Meszáros (2008, p. 94), corrobora com a alegação sobre a ilegitimidade ciências


parcelares no modelo cientificista marxiano, ao contrário do exaltado pela filosofia burguesa.
De acordo com ele, Marx negava totalmente a legitimidade de uma filosofia livre e auto-
orientada. Isso se dava pelo mesmo fato que também negava tal status a economia, a política,
ao direito e demais ramos do conhecimento tido como autônomos. Fato este que consistia em
que todas essas áreas deveriam ser vistas como uma parte integrante da realidade social.
Logo, compreendidas em relação ao desenvolvimento objetivo das forças produtivas e as
relações de produção.
Compreender a utilização das categorias econômicas na obra de Marx, demanda
compreender que todos os seus enunciados concretos, se interpretados fora da vulgaridade,
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são entendido como afirmações diretas sobre um certo tipo de ser e portanto são afirmações
ontológicas, Lukács (2012, p.11). Marx exige uma investigação ontológica das entidades
sociais e ao mesmo tempo rechaça o método hegeliano de expor as conexões mundanas sob
esquemas lógicos. Lukács (2012, p. 14-15) ressalta que tais tendências na obra marxiana se
expressam pela primeira vez adequadamente nos Manuscritos Economico-filosóficos, em que
categorias econômicas aparecem como categorias de produção e reprodução da vida humana,
o que torna possível uma avaliação ontológica do ser social sob bases materialistas. Assevere-
se que o fato de a economia ter primazia na ontologia de Marx não significa que sua obra
esteja fadada ao economicismo como faz crer Boaventura de Sousa Santos, interpretação que
só é credível àqueles que perderam de vista o método filosófico de Marx, bem como o
discurso filosófico que o leva ao Materialismo.
A possibilidade de separações autônomas entre o econômico o político e o social é
comum à concepção burguesa de ciências particulares e não às “obras econômicas” de Marx,
Lukács ( s/n, p. 20). Assim diante do quadro da condição do presente apresentada por Santos
em que a cada momento se faz mais difícil se diferenciar o econômico, o político e o cultural,
parece-nos que, ao contrario do que o sociólogo português afirma, a teoria marxiana é, de
todas as construções teóricas elaboradas até o presente, a mais apita a captar as direções
tomadas a partir do ser social, uma vez que não deixa de lado as conexões reais existentes na
totalidade deste ser.

Esse tipo de apresentação é característico das obras do Marx da maturidade.


É uma estrutura de caráter totalmente novo: uma cientificidade que no
processo de generalização nunca abandona esse nível, mas que, apesar disso,
em toda a verificação de fatos singulares, em toda reprodução ideal de uma
conexão concreta, tem sempre em vista a totalidade do ser social e utiliza
esta como metro para avaliar a realidade e o significado de cada fenômeno
singular; uma consideração ontológico-filosófica da realidade em-si, que não
se põe acima dos fenômenos considerados, coagulando-os em abstrações,
mas se coloca, ao contrario – crítica e autocriticamente –, no máximo nível
da consciência, com o único objetivo de poder captar todo ente na plena
concreticidade da forma de ser que lhe é própria, que é especifica
precisamente dele. Lukács (2012, p. 27)

Quanto ao eixo da ação coletiva e identidade, que tematiza a questão da primazia


explicativa e transformadora da divisão de classes. Seguindo o norte argumentativo desta
sessão, acolhemos a posição de Netto (2004, p.235-236) – por faltar-nos um conhecimento
mais aprofundado do tema cujo suporte teórico ainda esta a ser desbravado – o qual afirma
que as constatações realizadas por Boaventura no referido ponto são inegavelmente legítimas
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e muito instigantes, principalmente por tocarem em um ponto real em que o marxismo


precisa, antes de tudo, analisar as novas realidades existentes no final do século passado e na
virada daquele para este.
Passando ao ultimo eixo analisado pela sociologia das emergências, como
colocado acima, para Boaventura a única possibilidade de respostas ao problema ecológico
advém de uma utopia ecológica e democrática que deve ter em mente a inter-relação entre as
contradições advindas da exploração do trabalho e as contradições advindas pelas condições
de produção, especialmente no tocante à natureza sendo tratada como mercadoria enquanto
não o é.
Como não podia ser diferente devido ao caráter onto-pratico de seus escritos Marx
ao abordar questões sobre a filosofia da natureza, Lukács ( s/n, 15-16), rechaçou cada vez
mais a separação entre natureza e sociedade, considerando os problemas da natureza sempre
em vistas de sua inter-relação com a sociedade, tratando a questão da natureza sob uma base
ontológica inovadora. Quando Marx faz da reprodução da vida humana o seu eixo central de
analise, tanto no homem como em todos os objetos que este se relaciona – donde se encontra
obviamente a natureza – surge uma dupla determinação de uma insuperável base natural e de
uma constante transformação social dessa base. Nessa relação o Trabalho é também categoria
central enquanto formador de valores de uso e enquanto condição de existência do homem
devido a sua função de mediatizador do intercâmbio orgânico entre o homem e a natureza.
Essa relação de reciprocidade entre homens e a natureza é descrita nos
Manuscritos econômico-filosóficos de 1844:

O ser humano vive da natureza significa que a natureza é seu corpo, com o
qual ele precisa estar em processo contínuo para não morrer. Que a vida
física e espiritual do ser humano está associada à natureza não tem outro
sentido do que afirmar que a natureza está associada a si mesma, pois o ser
humano é parte da natureza. (ANDRIOLI, 2009, p. 01 apud MARX, 1968, p.
516)

Há inclusive uma passagem de O Capital que demonstra-nos quão falha é a


interpretação feita por Santos (1999, p. 43) de que o marxismo não da conta da contradição
existente no tocante a exploração dos recursos naturais/materiais. De fato a posição de
observação em que Marx se encontrava a seu tempo, não lhe permitia vislumbrar os
problemas ecológicos específicos que encontramos hoje na ”condição do presente” nem
mesmo em uma mera previsão. Entretanto já naquele tempo Marx foi capaz de constatar que:
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Com toda sua mesquinhez a produção capitalista desperdiça completamente


material humano, assim como para distribuir seus produtos através da troca,
e em sua forma de competição, desperdiça também recursos materiais, assim
quem perde é a sociedade (riqueza pública) e quem ganha é o capitalista
individual (riqueza privada). (FOSTER, 2012, p. 89 apud MARX, 1981, p.
180).

4 – CONCLUSÃO:

A conclusão primeira a que se pode chegar quanto ao papel que o Marxismo


representa na construção teórica do novo paradigma pós-moderno de Boaventura de Sousa
santos é que aquele pouco tem a lhe servir. O pós-modernismo de oposição, empossado pelo
sociólogo, como as demais vertentes da pós-modernidade, rechaça-o nos três âmbitos
estabelecidos para analise de sua congruência com o cotidiano. Ao menos essa é a síntese que
se pode chegar através do trabalho analítico realizado em Pela Mão de Alice.
Ocorre que como se viu no decorrer da terceira sessão do presente artigo,
Boaventura em sua analise “sinóptica” do marxismo não leva em conta característica
essencial da tradição marxista e do legado deixado a nós por Marx, qual seja o aspecto
ontológico de sua teoria ancorada sempre na totalidade do ser social. Se analisado desta
perspectiva, a tradição marxiana ultrapassa a largos passos a visão vulgar como a que foi
analisada por Santos.

[...] a leitura de Marx por Sousa Santos, aparentemente sofisticada e


reveladora de interesses analíticos renovados, apresenta resultados
extremamente similares aos já centenariamente divulgados pela grossa
maioria dos cientistas sociais que, entre outras coisas, notabilizam-se pela
sua plena integração ao establishment. Correndo orisco de cometer uma
indelicadeza formal, a leitura de Marx por Sousa Santos pode ser
caracterizada como uma receita nova – com ingredientes como Modernidade
e Paradigma etc. – o que culmina na feitura de um pudim cujo gosto se
conhece há muito – determinismo, evolucionismo, reducionismo econômico.
(NETTO, 2004, p. 237)

A consequência e conclusão final que se pode chegar até aqui é que, sim, a
tradição marxista tem muito a oferecer para a virada paradigmática enunciada pelo pós-
modernismo de oposição e consequentemente servir de verdadeira referência à proposição
teórica desse autor. Bastando, para que isso ocorra, uma leitura menos simplória ou talvez
mais despida de prévios preceitos ideológicos acerca de tal tradição secular.
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REFERÊNCIAS

Santos, Boaventura de Sousa; Chaui, Marilena. Direitos humanos, democracia e


desenvolvimento. São Paulo: Cortez Editora, 2013.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Para além do Pensamento Abissal: Das linhas globais a
uma ecologia de saberes, Revista Novos Estudos Cebrap, 79, 71-94, 2007.

_______. Pela mão de Alice. O social e o político na Pós-modernidade. Porto: Edições


Afrontamento, 1999.

LUKÁCS, György. Os princípios ontológicos fundamentais de Marx. São Paulo:


Boitempo, 2012.

LUKÁCS, György. História e Consciência de Classe. Estudos sobre a dialética Marxista.


São Paulo: Martins Fontes, 2003.

MÉSZÁROS, István. Filosofia, Ideologia e Ciência Social. Ensaios de negação e afirmação.


São Paulo: Boitempo, 2008.

NETTO, José Paulo. Lukács e a crítica da filosofia burguesa. Lisboa: Seara Nova, 1978.

_______. Marxismo Impenitente. Contribuição à história das ideias marxistas. São Paulo:
Cortez, 2004.

ANDRIOLI. Antônio Inácio. A atualidade de Marx para o debate ambiental. Revista


espaço acadêmico. V.9, n 98, 2009, p. 01-08

FOSTER. John Bellamy. A Ecologia da Economia Política Marxista. Revista Lutas Sociais,
São Paulo, n.28, p. 87-104, 1º semestre 2012.

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