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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES


CURSO DE GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL

THIAGO NUNES DA SILVA

IMPACTOS DO PÓS-GOLPE NA POLÍTICA HABITACIONAL NO GOVERNO


TEMER

JOÃO PESSOA
2019
THIAGO NUNES DA SILVA

IMPACTOS DO PÓS-GOLPE NA POLÍTICA HABITACIONAL NO GOVERNO


TEMER

Trabalho de Conclusão de Curso - TCC,


apresentado ao Departamento de Serviço
Social da Universidade Federal da
Paraíba como parte dos requisitos
necessários à obtenção do Título de
Bacharel em Serviço Social.

Orientadora: Prof.ª Dra. Edna Tânia


Ferreira da Silva.

JOÃO PESSOA

2019
THIAGO NUNES DA SILVA

IMPACTOS DO PÓS-GOLPE NA POLÍTICA HABITACIONAL NO GOVERNO


TEMER

Trabalho de Conclusão de Curso - TCC,


apresentado ao Departamento de Serviço
Social da Universidade Federal da
Paraíba como parte dos requisitos
necessários à obtenção do Título de
Bacharel em Serviço Social.

Data de aprovação: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________
Profª. Drª. Edna Tania Ferreira da Silva - UFPB
Orientadora

___________________________________________________
Me. Dalliana Ferreira Brito Grisi
Examinadora

___________________________________________________
Me. Ingridy Lammonikelly da Silva Lima
Examinadora
A Deus, meu apoio e amparo nas
dificuldades. A minha mãe, pelo apoio e
luta pela minha educação, pelo cuidado e
preocupação que tornou possível este
momento. Ao meu pai, por se dedicar a
me proporcionar sempre o melhor.
AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, pelo dom da vida e pela capacidade de compreender


e discernir sobre a realidade em que estamos inseridos.
A minha mãe, Fátima Nunes, a quem sempre deverei meus estudos e
vivências, respeito e caráter, por sua dedicação e edificação do meu ser.
Ao meu pai, Antônio Pereira, pelas condições geradas e apoio dado, onde
sem seu apoio não conseguiria ter concluído isto, me fazendo perceber os privilégios
que tenho e conhecer o suor necessário para adquiri-los.
A minha noiva, Wanessa Santos, que me apoiou e me deu forças para
continuar, me incentivou e despertou o potencial que eu mesmo não conhecia.
A minha orientadora, Drª Edna Tânia, pelo conhecimento transmitido e pela
dedicação no ensino, possibilitando este feito.
As minhas turmas de Serviço Social, a original com qual ingressei e me
desenvolvi e a final, com quem criei laços e concluí o curso.
A toda equipe do Trabalho Social da SEMHAB, que me acolheu e foi atuante
na minha formação profissional.
A todos os professores da UFPB que estiveram diretamente ligados a minha
formação, por todo o conhecimento transmitido.
Agradeço a todos que direta ou indiretamente se fizeram presente na
conclusão da minha jornada acadêmica, que me impulsionaram e incentivaram, seja
com apoios ou desafios, cada participação me fez ser o que sou hoje e auxiliaram na
conclusão deste trabalho.
RESUMO

O presente estudo consiste em uma pesquisa bibliográfica sobre a política


habitacional no Brasil, com foco no Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV). Foi
construído a partir da experiência no Estágio Supervisionado I e II vivenciados na
Secretaria Municipal de Habitação Social (SEMHAB), do município de João Pessoa -
PB, responsável pela execução do Trabalho Técnico Social (TTS) com as famílias
beneficiárias. Nesse contexto profissional e institucional e em contato com o
desenvolvimento do PMCMV foi observado que enquanto política de governo,
embora seja desde a sua concepção uma medida anticrise, desenvolveu e
popularizou a política habitacional no governo, garantido o atendimento de
necessidades sociais. Desse modo, as conjunturas de retomada neoliberal no
segundo semestre de 2016, aliados com a crise política e econômica do governo
Dilma, acabaram por depor a presidente em torno do impeachment. Ao assumir o
governo, seu vice Michel Temer (2016-2018), acelerou o desenvolvimento e a
consolidação de uma política econômica de ajuste fiscal, e cortou orçamento em
diversas áreas de interesse social, inclusive a habitação. O Estudo realizado, que
discute a política habitacional e o direito à habitação no Brasil, teve como objetivo
analisar os impactos na atual política habitacional durante o governo Temer, cuja
condução diminuiu os investimentos financeiros e os subsídios para a área,
colocando em patamares mais elevados os riscos de acesso à moradia para as
famílias de baixa renda e a precarização do PMCMV que há duas décadas se
constitui na única política habitacional no Estado brasileiro. Este estudo foi
desenvolvido através de pesquisa bibliográfica, para construir a fundamentação
teórica, utilizando conceitos, variáveis e aspectos históricos analisados na literatura
clássica e contemporânea, complementados com o levantamento da produção de
textos, livros, dissertações, além da identificação de documentos e sistematização
de dados secundários resultante de investigações realizadas em torno do PMCMV
nos Estados brasileiros, que foram agrupados e analisados em torno do objeto
construído. Desse modo, apresenta uma abordagem qualitativa, sendo a mesma
complementada pela dimensão quantitativa. O Estudo ressalta os avanços no
tocante à legislação social na Constituição Federal do Brasil de 1988 e leis
complementares. Considera que o PMCMV foi um investimento importante na
política habitacional, com subsídios para a classe de menor renda. No entanto, o
governo vem impondo uma agenda de orientação neoliberal de caráter radical, cuja
inclinação é transformar o Estado brasileiro e os princípios da constituição de 1988.
Ao aplicar celeridade às reformas, impossibilita ao Estado o cumprimento da
garantia dos direitos sociais, atingindo o PMCMV.

Palavras-chave: Programa Minha Casa Minha Vida, Temer, Precarização, Política


da Habitação.
ABSTRACT

The present study consists of a bibliographic research about the housing policy in
Brazil, focusing on the Minha Casa Minha Vida Program (PMCMV). It was built from
the experience in Secretaria Municipal de Habitação Social (SEMHAB), in the
municipality of João Pessoa - PB, responsible for implementing the Social Technical
Work (TTS) with the beneficiary families. In this professional and institutional context
and in contact with the development of the PMCMV, it was observed that as a
government policy, although it was an anti-crisis measure from its conception, it
developed and popularized the housing policy in the PT government, guaranteeing
the fulfillment of social needs. Thus, the conjunctures of neoliberal resumption in the
second half of 2016, allied with the political and economic crisis of the Dilma
government, ended up deposing the president around impeachment. By assuming
the government, her vice Michel Temer (2016-2018), accelerated the development
and consolidation of an economic policy of fiscal adjustment, where the budget was
cut in several areas of social interest, including housing. The study, which discusses
the housing policy and the right to housing in Brazil, aimed to analyze the impacts of
the current housing policy during the Temer government, which reduced financial
investments and subsidies to the area, placing the risks of access to housing higher
for low-income families and precarizing the PMCMV, which for two decades
constituted the only housing policy in the Brazilian State. This study was developed
through a bibliographic research, to build the theoretical foundation, using concepts,
variables and historical aspects analyzed in the classic and contemporary literature,
complemented with the survey of the production of texts, books, dissertations,
besides document identification and systematization of secondary data resulted from
investigations carried out around the PMCMV in the Brazilian states, which were
grouped and analyzed around the constructed object. In this way, it presents a
qualitative approach, being complemented by the quantitative dimension. The study
identified advances in social legislation in the 1988 Brazilian Federal Constitution and
complementary laws. It considers that the PMCMV was an important investment in
the housing policy, with subsidies for the lower income class. However, the
government has been imposing a radical neoliberal orientation agenda, whose
inclination is to transform the Brazilian state and the principles of the 1988
constitution. By applying speed to reforms, it makes it impossible for the State to fulfill
the guarantee of social rights, PMCMV.

Keywords: Minha Casa Minha Vida Program. Temer. Precariousness. Housing


Policy.
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Adequação do tamanho da moradia segundo percepção dos moradores,


por tamanho da família, 2013. ………………………………………………………...... 71
Tabela 2 - Avaliação do atendimento por serviços na moradia atual, em comparação
com a anterior. Serviços cujo atendimento melhorou, 2013. …………………….......72
Tabela 3 - Avaliação do atendimento por serviços na moradia atual, em comparação
com a anterior. Serviços cujo atendimento piorou, 2013. ………………………........72
LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Operações de créditos habitacionais .....................................................60


Gráfico 2 - Desenvolvimento da pobreza no Brasil...................................................65
LISTA DE SIGLAS

ANSUR Articulação Nacional do Solo Urbano


BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
BNH Banco Nacional de Habitação
CAPS Caixas de Aposentadoria e Pensões
CEF Caixa Econômica Federal
CFESS Conselho Federal de Serviço Social
COHAB Campanhas de Habitação
EO Entidades Organizadoras
FAR Fundo de Arrendamento Residencial
FCP Fundação Casa Popular
FDS Fundo de Desenvolvimento Social
FGHab Fundo Garantidor da Habitação Popular
FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
FNA Federação Nacional dos Arquitetos
FNHIS Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social
FNRU Fórum Nacional da Reforma Urbana
HBB Programa Habitar Brasil
IAP Institutos de Aposentadoria e Pensão
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INOCOOP Institutos de Orientação às Cooperativas Habitacionais
MNRU Movimento Nacional de Reforma Urbana
MTST Movimento dos Trabalhadores Sem Teto
ONU Organização das Nações Unidas
PAC Programa de Aceleração do Crescimento
PAIH Programa de Ação Imediata para a Habitação
PASEP Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público
PEHP Programa Especial de Habitação Popular
PEP Programa Empresário Popular
PIDESC Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
PIS Programa Integração Social
PlanHab Plano Nacional de Habitação
PMCMV Programa Minha Casa Minha Vida
PNDU Plano Nacional de Desenvolvimento Urbano
PNH Plano Nacional de Habitação
PNH Política Nacional de Habitação
PNHR Programa Nacional de Habitação Rural
PNHU Programa Nacional de Habitação Urbana
SBPE Sistema Brasileiro de Poupanças e Empréstimos
SFH Sistema Financeiro de Habitação
SNDU Sistema Nacional de Desenvolvimento Urbano
SNHIS Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social
SNH Sistema Nacional de Habitação
TTS Trabalho Técnico Social
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 12
CAPÍTULO 1 - QUESTÃO URBANA E QUESTÃO SOCIAL NO CAPITALISMO ............... 15
1.1- A formação do espaço urbano e a questão da moradia: uma análise histórica ............. 15
1.2- A questão urbana na contemporaneidade .................................................................... 28
CAPÍTULO 2 - A POLÍTICA HABITACIONAL NO BRASIL ................................................ 36
2.1 - A política social da habitação nos governos do Brasil .................................................. 36
2.2 - A reforma urbana e o direito à moradia ........................................................................ 44
2.3 - Os governos Lula-Dilma e a política urbana ................................................................ 50
CAPÍTULO 3 - A EXPANSÃO DA FINANCEIRIZAÇÃO DA MORADIA NO BRASIL ......... 57
3.1 - Antecedentes: a política habitacional nos governos Lula-Dilma e o PMCMV ............... 57
3.2 - A política neoliberal do governo Temer e a progressiva destruição do acesso à moradia
para os pobres ..................................................................................................................... 64
3.3 - Aspectos que configuram a precarização do PMCMV pelo estado brasileiro ............... 68
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................. 77
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 82
12

INTRODUÇÃO

O presente estudo é resultado da vivência do Estágio Supervisionado I e II na


Secretaria Municipal de Habitação Social (SEMHAB), do município de João Pessoa -
PB, no setor social, responsável pela execução do Trabalho Técnico Social (TTS)
com as famílias beneficiárias do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV).
O período vivenciado junto a SEMHAB possibilitou o acompanhamento da
equipe do Trabalho Social no processo da execução do Programa Minha Casa
Minha Vida (PMCMV) no município de João Pessoa-PB, assim como a aproximação
a realidade dos beneficiários do Programa.
A experiência no processo de formação, realizada na SEMHAB, permitiu
conhecer as requisições e a intervenção profissional do Serviço Social na política da
habitação, que no âmbito da profissão e o seu desenvolvimento acompanha a
trajetória da política habitacional nos governos no Brasil, conformando uma
instrumentalidade da profissão e suas especificidades nas políticas setoriais.
Nesse contexto profissional e institucional e em contato com o
desenvolvimento do PMCMV foi observado que enquanto política de governo,
embora seja desde a sua concepção uma medida anticrise, desenvolveu e
popularizou a política habitacional no governo do PT, garantido o atendimento de
necessidades sociais. Desse modo, as conjunturas de retomada neoliberal no
segundo semestre de 2016, aliados com a crise política e econômica do governo
Dilma, acabaram por depor a presidente pela articulação golpista em torno do
impeachment.
Ao assumir o governo, seu vice Michel Temer (2016-2018), teve-se início o
desenvolvimento e a consolidação de uma política econômica de ajuste fiscal à
financeirização, onde se cortou orçamento em diversas áreas de interesse social,
inclusive a habitação. A partir dessas observações preliminares e questionamentos
foi elaborada uma hipótese que constituiu a linha de direção do estudo, qual seja:
com a política de ajustes do governo Temer um novo ciclo se abre para o PMCMV,
que mesmo tendo continuidade enquanto política de governo, a condução irá
precarizar o acesso à habitação para as famílias de baixa renda. Assim sendo, a
problemática foi formulada e discutida neste estudo por meio de pesquisa com
dados secundários publicizados.
13

O Estudo realizado teve como objetivo analisar os impactos da atual política


habitacional, o PMCMV, durante o governo Temer, cuja condução diminuiu os
investimentos financeiros e os subsídios para a área, colocando em patamares mais
elevados os riscos de acesso à moradia para as famílias de baixa renda e a
precarização do PMCMV que há duas décadas se constitui na única política
habitacional no Estado brasileiro.
Desse modo, o estudo foi conduzido por meio de uma análise crítica sobre as
condições de precarização da política habitacional agravadas pela política neoliberal
do governo Temer, através da redução do investimento em políticas sociais e
ataques aos trabalhadores, causando um agravamento no déficit habitacional e
perda de investimento no PMCMV. Este estudo contempla as tendências de
desmonte social do governo, com base de comparação aos governos anteriores com
foco no governo petista na qual se realizou um maior desenvolvimento dessa política
e apontar as mudanças exercidas por Temer.
Este estudo foi desenvolvido através de pesquisa bibliográfica, para construir
a fundamentação teórica, utilizando conceitos, variáveis e aspectos históricos
analisados na literatura clássica e contemporânea, complementados com o
levantamento da produção de textos, livros, dissertações, além da identificação de
documentos e sistematização de dados secundários resultante de investigações
realizadas em torno do PMCMV nos Estados brasileiros, que foram agrupados e
analisados em torno do objeto construído. Desse modo, apresenta uma abordagem
qualitativa, sendo a mesma complementada pela dimensão quantitativa.
Nesse cenário, ressalta-se a relevância da temática, pois dela emerge a
importante discussão sobre o direito social à habitação e como vem sendo o
investimento do Estado na política e seus rebatimentos para a população de baixa
renda.
Desse modo, este estudo foi estruturado em três capítulos apresentados da
seguinte forma:
No primeiro capítulo, discute-se a questão urbana e a questão habitacional no
movimento mais universal do capital em sua relação com a cidade, compreendendo
o desenvolvimento do espaço urbano e suas contradições, intrinsecamente
relacionadas à divisão social do trabalho, assim como o desenvolvimento das forças
produtivas. Entende-se que a moradia é indissociável do fenômeno urbano na
14

sociedade capitalista em seus processos de acumulação e da pauperização da


classe trabalhadora.
No segundo capítulo, analisaram-se o desenvolvimento da política
habitacional nos governos brasileiro para compreender a ação do Estado Brasileiro,
destacando à formulação da política habitacional, necessárias para o entendimento
das demandas habitacionais. Deu-se enfoque ao importante momento histórico da
Reforma Urbana que trouxe avanços significativos no que diz respeito ao marco
legal da Política Nacional de Habitação.
No terceiro capítulo, partindo da compreensão adquirida dos capítulos 1 e 2,
procede-se, com maior foco, ao objeto, caracterizando o PMCMV e analisando o
desenvolvimento da política habitacional no fim do governo petista, trazendo o
entendimento da conjuntura “neodesenvolvimentista”, seguindo para a análise da
“readequação” neoliberal praticada por Temer e a desestruturação da política social.
Por fim, seguem as considerações finais e as referências bibliográficas.
15

CAPÍTULO 1 - QUESTÃO URBANA E QUESTÃO SOCIAL NO CAPITALISMO

1.1 - A formação do espaço urbano e a questão da moradia: uma análise histórica

Ao discutir a política habitacional para a classe trabalhadora, enquanto uma


necessidade e um direito humano, referencia-se neste estudo o amplo debate sobre
o urbano, situando o significado sócio histórico e os seus desdobramentos enquanto
expressão da “questão social” na particularidade urbana. Entende-se que não são
fenômenos recentes e o seu desenvolvimento segue a movimentação do processo
de acumulação do capital, as configurações da política social assumida pelo Estado
e as lutas sociais.
Contudo, analisar o movimento mais universal do capital em sua relação com
a cidade, exige a compreensão do desenvolvimento do espaço urbano e suas
contradições, intrinsecamente relacionadas a divisão social do trabalho, assim como
o desenvolvimento das forças produtivas e a exploração do trabalho, a questão
agrária, a propriedade privada, a mercadoria, entre outros.
Ainda que a existência das cidades preceda o capitalismo (MARICATO,
2015), ela se desenvolve pela ação do capital e sua urbanização. Assim como o
desenvolvimento das condições de empobrecimento e precarização de vida da
classe trabalhadora.
Desse modo, enquanto processo histórico, nos séculos XVIII e XIX,
desenvolveu-se o incremento do capitalismo industrial e a eclosão do fenômeno
urbano que alterou o modo de vida da classe trabalhadora e as instituições sociais.
Nesse período, verificou-se uma crescente desigualdade e pauperização dos
trabalhadores em diferentes contextos que vão marcar a complexidade das
expressões da questão social no espaço urbano.
Inicialmente, tem-se a lenta passagem do modo feudal para o modo de
acumulação capitalista e a acumulação primitiva do capital, com destaque para a
formação das cidades e a expropriação dos trabalhadores do campo.
O advento da Revolução Industrial e seu maquinário impactou diretamente os
tecelões-agricultores uma vez que todo o processo de produção era feito de forma
16

artesanal. “A mulher e os filhos fiavam e, com o fio, o homem tecia - quando o chefe
da família não o fazia, o fio era vendido.” (ENGELS, 2010, p. 45)
As relações de trabalho impostas pelo emergente sistema capitalista, na
forma da industrialização, negavam condições de sobrevivência e sociabilidade aos
trabalhadores, que deixavam suas casas no campo em busca de emprego.
Assim, passando a trabalhar inteiramente para sobreviver, se desvirtuou a
origem do seu trabalho, pois não obtinham mais que o suficiente para se sustentar e
nem tinham tempo em suas atividades recreativas. Engels (2010), afirma que antes
do trabalho assalariado, os trabalhadores:

Ganhavam para cobrir suas necessidades e dispunham de tempo para um


trabalho sadio em seu jardim ou em seu campo, trabalho que para eles era
uma forma de descanso; e podiam, ainda, participar com seus vizinhos de
passatempos e distrações – jogos que contribuíam para a manutenção de
sua saúde e para o revigoramento de seu corpo (p. 46).

Engels (2010), ressaltou que a vida e o trabalho no campo se estabeleciam


de forma diferente ao que se encontrava nas emergentes cidades, assim como as
relações sociais. Ao migrar para as cidades os trabalhadores se submeterem ao
regimento industrial. “Sentiam-se à vontade em sua quieta existência vegetativa e,
sem a revolução industrial, jamais teriam abandonado essa existência, decerto,
cômoda e romântica, mas indigna de um ser humano.” (p. 47)
Desse modo, evidencia-se as formas de exploração capitalista à medida que
está exposta a incapacidade da classe operária se sustentar pelo próprio trabalho
em vantagem à acumulação de seus empregadores, ao passo que trabalhadores
rurais são levados a deixarem seu espaço e antigas formas de trabalho para a
implementação de máquinas, e é ao fazer isso que o capital se reproduz em seu
estágio de acumulação.
Engels (2010), explica que com a Revolução Industrial, os trabalhadores são
forçados ao êxodo rural devido ao surgimento de máquinas que os expropriaram de
suas funções laborativas pela incapacidade de concorrência. Esses trabalhadores,
advindos da expansão industrial, se viram compelidos a adentrar na realidade
urbana a qual não eram habituados para a servitude operária.

Eram máquinas de trabalho a serviço dos poucos aristocratas que até então
haviam dirigido a história; a revolução industrial apenas levou tudo isso às
suas consequências extremas, completando a transformação dos
17

trabalhadores em puras e simples máquinas e arrancando-lhes das mãos os


últimos restos de atividade autônoma – mas, precisamente por isso,
incitando-os a pensar e a exigir uma condição humana (ENGELS, 2010, p.
47).

A população urbana cresceu com o adensamento da classe operária,


impulsionados pela oportunidade de sobrevivência, “surgiram assim as grandes
cidades industriais e comerciais [...] onde pelo menos três quartos da população
fazem parte da classe operária e cuja pequena burguesia se constitui de
comerciantes e de pouquíssimos artesãos.” (Engels, 2010, p. 59).

O centro principal dessa indústria é o Lancashire, onde, aliás, ela começou


– revolucionando completamente o condado, transformando esse pântano
sombrio e mal cultivado numa região animada e laboriosa: decuplicou, em
oitenta anos, sua população e fez brotar do solo, como por um passe de
mágica, cidades gigantescas como Liverpool e Manchester, que juntas têm
700 mil habitantes, e cidades secundárias como Bolton (60 mil habitantes),
Rochdale (75 mil habitantes), Oldham (50 mil habitantes), Preston (60 mil
habitantes), Ashton e Stalybridge (40 mil habitantes) e uma miríade de
outros centros industriais. A história do Lancashire meridional, embora
ninguém a mencione, compreende os maiores milagres dos tempos
modernos, todos eles operados pela indústria do algodão. O segundo centro
têxtil, situado no distrito algodoeiro da Escócia (Lanarkshire e Renfrewshire),
é Glasgow, cuja população, desde a instalação dessa indústria, passou de
30 mil para 300 mil habitantes (ENGELS, 2010, p. 51-52).

O crescimento populacional devido à migração em busca de trabalho na


indústria nascente moldou o espaço urbano de forma a dividir socialmente as
classes, relegando os mais pobres das áreas nobres. Impunham a construção de
suas moradias em áreas fora do interesse imediato do capital, as áreas mais
precárias.
Desta forma, Engels (2010) afirma que a burguesia está diretamente
relacionada ao crescimento da população pobre no espaço urbano, assim como o
enriquecimento e crescimento industrial através do empobrecimento dessa
população.
O fator agravante da exploração do trabalhador pelo capitalismo emergente
se torna evidente ao serem incapazes de, com seus próprios ganhos, custear suas
necessidades básicas de subsistência, dentre elas a moradia.
A moradia é um fator constitutivo das cidades, pois o desenvolvimento
industrial, de acordo com Engels (2010), mostra que o operário é apenas mais uma
ferramenta à disposição do capital. Desta forma, sendo necessário estar facilmente
ao seu alcance. Com isto, sempre que se construía uma fábrica de médio porte,
18

rapidamente se levantava uma vila operária nas proximidades para os seus


funcionários.

A tendência centralizadora da indústria, contudo, não se esgota nisso.


Também a população se torna centralizada, como o capital – o que é natural
porque, na indústria, o homem, o operário, não é considerado mais que uma
fração do capital posta à disposição do industrial e a que este paga um juro,
sob o nome de salário, por sua utilização. O grande estabelecimento
industrial demanda muitos operários, que trabalham em conjunto numa
mesma edificação; eles devem morar próximo e juntos – e, por isso, onde
surge uma fábrica de médio porte, logo se ergue uma vila (ENGELS, 2010,
p. 64).

A parcela mais pobre de trabalhadores, ocupava áreas fora do interesse do


capital, instalava-se em condições insalubres e manter tal parcela nestas condições
era funcional, a fim de manter os salários baixos.
Dentro desta produção de moradias, surgem suas necessidades imediatas de
satisfação por terceiros (artesãos, alfaiates, sapateiros, padeiros, pedreiros e
marceneiros) onde se multiplica o número de trabalhadores que residem em tais
localidades.
Esses trabalhadores, que se reproduzem em seus costumes tal qual no
campo, ensinam os filhos sua profissão, ou seja, os filhos dos operários aprendiam a
ser operários.
O crescimento da mão de obra disponível, especialmente mais jovem, têm-se
um excedente de trabalhadores em busca de empregos do qual não se pode suprir a
demanda, forçando os salários a caírem e consequentemente estimulando a
instalação de novas fábricas, reproduzindo o crescimento urbano.

Os habitantes da vila, especialmente a geração mais jovem, habituam-se ao


trabalho fabril, familiarizam-se com ele e quando a primeira fábrica, como é
compreensível, já não os pode empregar a todos, os salários caem – e, em
consequência, novos industriais ali se estabelecem. Assim, da vila nasce
uma pequena cidade e da pequena, uma grande cidade (ENGELS, 2010, p.
64).

O desenvolvimento do capital industrial e seus empregadores polarizou cada


vez mais a divisão social das cidades, suprimindo as características originárias dos
seus habitantes que se habituaram a nova realidade. Disto só restando “uma classe
rica e uma classe pobre, desaparecendo dia a dia a pequena burguesia” (Engels,
2010, p. 65).
19

Desse modo, na forma de ocupação do espaço urbano industrial, formam-se


os “bairros de má fama” onde habita a classe operária, longe das áreas mais nobres,
quanto longe da visão da classe abastada, agrupando as piores construções e feitas
irregularmente.

Todas as grandes cidades têm um ou vários “bairros de má fama” onde se


concentra a classe operária. É certo ser freqüente a miséria abrigar-se em
vielas escondidas, embora próximas aos palácios dos ricos; mas, em geral,
é-lhe designada uma área à parte, na qual, longe do olhar das classes mais
afortunadas, deve safar-se, bem ou mal, sozinha. Na Inglaterra, esses
“bairros de má fama” se estruturam mais ou menos da mesma forma que
em todas as cidades: as piores casas na parte mais feia da cidade; quase
sempre, uma longa fila de construções de tijolos, de um ou dois andares,
eventualmente com porões habitados e em geral dispostas de maneira
irregular. Essas pequenas casas de três ou quatro cômodos e cozinha
chamam-se cottages e normalmente constituem em toda a Inglaterra,
exceto em alguns bairros de Londres, a habitação da classe operária.
Habitualmente, as ruas não são planas nem calçadas, são sujas, tomadas
por detritos vegetais e animais, sem esgotos ou canais de escoamento,
cheias de charcos estagnados e fétidos. A ventilação na área é precária,
dada a estrutura irregular do bairro e, como nesses espaços restritos vivem
muitas pessoas, é fácil imaginar a qualidade do ar que se respira nessas
zonas operárias – onde, ademais, quando faz bom tempo, as ruas servem
aos varais que, estendidos de uma casa a outra, são usados para secar a
roupa (ENGELS, 2010, p. 70).

As características das moradias dos operários estavam marcadas pela falta


de aparelhos de uso comum à população, tanto na construção da sua moradia como
nas condições objetivas das ruas e vielas onde instalavam-se.

As casas são habitadas dos porões aos desvãos, sujas por dentro e por fora
e têm um aspecto tal que ninguém desejaria morar nelas. Mas isso não é
nada, se comparado às moradias dos becos e vielas transversais, aonde se
chega através de passagens cobertas e onde a sujeira e o barulho superam
a imaginação: aqui é difícil encontrar um vidro intacto, as paredes estão em
ruínas, os batentes das portas e os caixilhos das janelas estão quebrados
ou descolados, as portas – quando as há – são velhas pranchas pregadas
umas às outras; mas, nesse bairro de ladrões, as portas são inúteis: nada
há para roubara. Por todas as partes, há montes de detritos e cinzas e as
águas servidas, diante das portas, formam charcos nauseabundos. Aqui
vivem os mais pobres entre os pobres, os trabalhadores mais mal pagos,
todos misturados com ladrões, escroques e vítimas da prostituição. A maior
parte deles são irlandeses, ou seus descendentes, e aqueles que ainda não
submergiram completamente no turbilhão da degradação moral que os
rodeia a cada dia mais se aproximam dela, perdendo a força para resistir
aos influxos aviltantes da miséria, da sujeira e do ambiente malsão
(ENGELS, 2010, p. 71).

Os operários moravam em ruas e vielas, não tinham acesso à educação ou


moradias decentes, faltava acesso à saúde e condições higiênicas para sua
20

sobrevivência, não era incomum morrer-se de fome ou se constatar as condições


insalubres de moradia. Não havia cômodos para abrigar todos os moradores da
“casa” tendo que se abrigar junto com animais, pois os trabalhadores não
conseguiam custear o aluguel em melhor estado ou simplesmente não existiam
outras próximas às fábricas, sendo estas de posse do empregador, e este só
emprega aqueles que aceitam viver em tais condições (ENGELS, 2010).

Em ruas como Long Acre e outras, não propriamente espaços de luxo, mas
bastante convenientes, incontáveis porões são usados como habitações,
dos quais saem à luz do dia silhuetas de crianças doentes e mulheres
esfarrapadas, meio mortas de fome. Nas vizinhanças do teatro de Drury
Lane – o segundo de Londres – encontram-se algumas das ruas mais
degradadas da cidade (Charles Street, King Street e Parker Street), cujas
casas são habitadas, dos porões aos desvãos, por famílias paupérrimas.
Nas paróquias de St. John e St. Margaret, em Westminster, segundo o
JournaloftheStatistical Society, em 1840, 5.366 famílias de operários viviam
em 5.294 “habitações” (se é que a palavra pode ser usada): homens,
mulheres e crianças, misturados sem qualquer preocupação com idade ou
sexo, num total de 26.830 indivíduos – e três quartos do total dessas
famílias dispunham de um só cômodo. Na aristocrática paróquia de St.
George (Hanover Square), de acordo com a mesma fonte, 1.465 famílias de
operários, totalizando cerca de 6 mil pessoas, viviam nas mesmas
condições – e, delas, mais de dois terços das famílias amontoavam-se num
só cômodo. E a esses infelizes, entre os quais nem sequer os ladrões
esperam encontrar algo para roubar, as classes proprietárias, por meios
legais, como os exploram! Pelos horrorosos alojamentos de Drury Lane,
acima referidos, pagam-se os seguintes aluguéis semanais: dois cômodos
no porão, 3 shillings (1 táler); um cômodo no térreo, 4 shillings, no primeiro
andar, 4,5 shillings, no segundo, 4 shillings, no sótão, 3 shillings. Os
famélicos habitantes da Charles Street pagam aos proprietários dos imóveis
um aluguel anual de 2 mil libras esterlinas (14 mil táleres) e aquelas 5.336
famílias de Westminster, um total de 40 mil libras esterlinas (270 mil táleres)
(ENGELS, 2010, p. 71-72).

A análise feita por Engels (2010), retrata que os bairros operários não tinham
condições de habitabilidade, desta forma emergindo os problemas urbanos
derivados da falta de infraestrutura urbana, assim como também afirma Hobsbawm
(apud SANTOS, 2012, p. 37-38).

As cidades e as áreas industriais cresciam rapidamente, sem planejamento


ou supervisão, e os serviços mais elementares da vida da cidade
fracassavam na tentativa de manter o mesmo passo: a limpeza das ruas, o
fornecimento de água, os serviços sanitários, para não mencionarmos as
condições habitacionais da classe trabalhadora [...] cortiços onde se
misturavam o frio e a imundice, ou os extensos complexos de aldeias
industriais de pequena escala. [...] O desenvolvimento urbano foi um
gigantesco processo de segregação de classes, que empurrava os novos
trabalhadores pobres para as grandes concentrações de miséria alijadas
dos centros de governo e dos negócios, e das novas áreas residenciais da
burguesia. A consequência mais patente dessa deterioração urbana foi o
21

reaparecimento das grandes epidemias de doenças contagiosas


(principalmente transmitidas pela água), notadamente a cólera. [...] Só
depois de 1848 quando as novas epidemias nascidas nos cortiços
começaram a matar também os ricos, e as massas desesperadas que aí
cresciam tinham assustados os poderosos com a revolução social, foram
tomadas providências para um aperfeiçoamento e uma reconstrução urbana
sistemática.

Existiam ainda bairros que não eram ocupados pela burguesia por questões
diferentes, não relacionadas às condições de moradia ou higiene. Deixava-se de
ocupar determinadas regiões pela incidência de ventos frequentes vindos das
fábricas carregando poluição. Deste modo, desvalorizando a propriedade, sendo
apenas os operários aqueles que se interessavam em tais moradias. Para a
burguesia, se alguém tiver que viver em condições insalubre, na poluição das
fábricas que “sejam os operários os únicos a respirá-la” (Engels, 2010, p. 101).
As consequências do crescimento da industrialização do capitalismo via
revolução industrial atingiam diretamente o proletariado à medida que se retirava o
valor gerado pelas mercadorias por eles produzidas, mas não consumidas.
Submetidos aos meios de reprodução de sua força de trabalho impostos pelos seus
empregadores, o trabalhador se tornava não apenas uma ferramenta de produção
ao capitalismo como ele mesmo, e não apenas sua força de trabalho, se
configurando como propriedade do capital. Propriedade esta que ao gerar valor,
perde o seu próprio em concorrência aos outros operários que buscam da mesma
forma a sobrevivência, submetendo-se à desvalorização da sua força de trabalho.
Assim, ainda que o operário estivesse em sua plena forma e capacidade, não
havia segurança que este não seria posto na multidão de operários ociosos, já que o
desemprego é tido como forma de controle sobre a classe de forma a estimar tal
competição para sua sobrevivência.
Todas as suas condições objetivas de subsistência (moradia, saúde,
alimentação, etc.) se combinam de modo que se força a aceitação de tal realidade,
pois existem aqueles que estão em situações piores.

A classe operária das grandes cidades oferece-nos, assim, uma escala de


diferentes condições de vida: no melhor dos casos, uma existência
momentaneamente suportável – para um trabalho duro, um salário razoável,
uma habitação decente e uma alimentação passável (do ponto de vista do
operário, é evidente, isso é bom e tolerável); no pior dos casos, a miséria
extrema – que pode ir da falta de teto à morte pela fome; mas a média está
muito mais próxima do pior que do melhor dos casos. E essa escala não se
compõe de categorias fixas, que nos permitiriam dizer que esta fração da
22

classe operária vive bem, aquela mal, enquanto as coisas permanecem


como estão; ao contrário: se, no conjunto, alguns setores específicos gozam
de vantagens sobre outros, a situação dos operários no interior de cada
segmento é tão instável que qualquer trabalhador pode ter de percorrer
todos os degraus da escala, do modesto conforto à privação extrema, com o
risco da morte pela fome – de resto, quase todos os operários ingleses têm
algo a dizer sobre notáveis mudanças do acaso (ENGELS, 2010, p. 116).

Todavia, muitos séculos se passaram e reafirmam as ideias de Engels, para o


qual a falta de moradia para a classe trabalhadora é um problema inerente a lógica
capitalista de reprodução e impossível de ser resolvida nesse modo de produção.
Tal fato pode ser observado na medida em que as condições históricas de
pauperização dos trabalhadores ainda são mantidas em tempos atuais. A
precarização da moradia e a incapacidade de obtê-la por meio do trabalho
demonstram o desenvolvimento deste processo.
A Inglaterra apresentada por Engels (2010) é um estágio deste processo que
se expandiu e se reproduziu pelos séculos em todo o mundo. A segregação
espacial, o déficit habitacional e as condições precárias de habitação são formas de
subsunção do trabalho ao capital, de relações de classe, representando o baixo
custo da força de trabalho, reproduzindo a desigualdade das classes sociais.
Ao referenciar o debate e as condições de moradia à realidade brasileira, na
expansão do trabalho livre e do desenvolvimento urbano, entende-se que a questão
da moradia se relaciona ao crescimento da metrópole, com destaque para a cidade
de São Paulo, com traços similares aos apresentados por Engels (2010) na
Inglaterra, porém, o Brasil não foi o berço da industrialização e esta não se
desenvolveu plenamente e no mesmo período dos países da Europa.
O Brasil era um país agrário, abolindo a escravidão apenas no fim do século
XIX, a mão de obra estrangeira se consolidava na produção agrícola do café para a
exportação. Após a crise sofrida pelos cafeicultores, a infraestrutura montada para o
escoamento da produção passou a ser utilizada pela indústria (LIMA, 2017a).
Ainda que a industrialização tenha acontecido tardiamente no país, as
condições de pauperização dos trabalhadores e a substituição do modelo agrário
se formaram com o desenvolvimento urbano-industrial, impulsionando a questão
urbana.

O desenvolvimento da industrialização foi tardio e não estimulou o processo


competitivo; sequer, as reformas capitalistas aconteceram, como é o caso
da reforma agrária, a qual expressa grande concentração de terra nas mãos
23

dos proprietários capitalistas. Portanto, esses processos econômicos e


políticos com essas características e funcionalidades marcam o crescimento
urbano no Brasil, redimensionando a questão social, as relações de classes,
os processos democráticos e os direitos sociais (LIMA, 2017a, p. 28).

Contudo, as relações sociais expressas pela divisão social do trabalho,


separando o campo da cidade, demonstra formas de exploração social e econômica.
Para Kowarick (1979), São Paulo se caracterizava como o centro dinâmico do País.
Discutir este fenômeno é limitar-se apenas ao desempenho econômico, deixando de
lado a relação do crescimento econômico com a pauperização da classe
trabalhadora.
Desta forma, nota-se o aumento da ocupação dos espaços urbanos de
maneira irregular e desconexa, o crescimento dos bairros periféricos, cortiços e
favelas sugerem o crescimento da população operária no século XX, sendo nestas
áreas onde se concentra a pobreza da cidade (KOWARICK, 1979).
A industrialização trouxe a urgência de suprimento de moradia para os
operários, alijando os trabalhadores que não estão no mercado de trabalho do
acesso a produção e aos meios de vida. Desta forma, um número reduzido de
habitações necessárias, pois “o fornecimento de moradia pela própria empresa
diminuía as despesas dos operários com sua própria sobrevivência, permitindo que
os salários fossem rebaixados.” (KOWARICK, 1979, p. 30).
O crescimento do número de trabalhadores inflige pressão direta na procura
por habitações populares, aumentando a valorização dos terrenos próximos às
fábricas, somado ao aumento dos operários que buscam o emprego, colaboram de
forma geral para a precarização do seu trabalho. Este exército de reserva que se
constitui à maneira que não se absorve toda a mão de obra disponível, estimula a
desvalorização do trabalhador e torna inviável e “antieconômica” a produção de vilas
operárias, culminando no processo de autoconstrução (KOWARICK, 1979).

[...] o preço do progresso traduz e ao mesmo tempo justifica o crescimento


caótico da metrópole. Indica inicialmente a incapacidade do poder público
de programar formas mais racionais de ocupação do solo. Ademais,
fundamenta uma forma de expansão que, devido à fragilidade das
organizações populares para interferir nos processos decisórios, confere
grande liberdade de ação aos grupos privados inteiramente voltados para a
obtenção de lucro (KOWARICK, 1979, p. 33).

O processo de retenção de terras para valorização se formava como um


grande aliado à perpetuação desta realidade, os lotes retidos localizavam-se em
24

áreas próximas aos centros, expulsando os mais pobres às áreas mais distantes de
seus interesses. Esta retenção, de forma indireta, gerou o que foi denominado de
“periferia1” (KOWARICK, 1979).
O distanciamento das moradias e o crescimento populacional, devido a
industrialização e seus impactos no desenvolvimento da região, entre os anos de
1960-1970 chegou a 5,5% ao ano, segundo Kowarick (1979), este crescimento teve
sua distribuição dada em cidades vizinhas à capital paulista de forma que se
tornaram “cidades dormitório”, já que se era insustentável a moradia desses
trabalhadores nas áreas mais caras.
Porém, os fatores agravantes da especulação, nos anos 20 do século XX,
que causam o aumento da questão habitacional em São Paulo não se dão apenas
pelas áreas centrais e pontos de interesse dos trabalhadores, Kowarick (1979)
afirma que:

Ela se apresenta também com imenso vigor dentro das próprias áreas
centrais, quando zonas estagnadas ou decadentes recebem investimentos
em serviços ou infra-estruturas básicas. O surgimento de uma rodovia ou
vias expressas, a canalização de um simples córrego, enfim, uma melhoria
urbana de qualquer tipo, repercute imediatamente no preço dos terrenos (p.
37).

Trabalhadores mais pobres que se mudam em busca de melhores condições


de habitabilidade na cidade se veem impossibilitados, a terra se valoriza em certas
regiões de tal maneira que os trabalhadores não a conseguem custear.
Esses trabalhadores, ainda que consigam instalar-se em condições
degradantes de habitação em áreas mais centrais, sofrem a imposição de
adequações do poder público, que “higienizam” a área, expulsando a população
pobre dos locais que vão se valorizando pelo interesse do mercado (KOWARICK,
1979).

Após intensos “desfavelamentos” que ocorreram na capital nos anos 60, as


favelas tenderam a seguir o fluxo do desenvolvimento econômico que
ocorreria nas áreas mais industrializadas da grande São Paulo. Apesar de
inexistirem dados precisos acerca da população favelada sabe-se que ela é
numerosa em certos municípios - Guarulhos, Osasco, Diadema, São
Bernardo do Campo - e que apresentam características sócio econômicas
semelhantes às da Capital (KOWARICK, 1979, p. 38).

1
Aglomerados distantes dos centros, clandestinos ou não, carentes de infra-estrutura, onde passa a
residir crescente quantidade de mão de obra necessária para fazer girar a maquinaria econômica
(Kowarick, 1979, p. 31).
25

Somado a tal realidade, existem ainda as obras de urbanização que buscam


a melhoria do espaço urbano pelo poder público, exigindo a transferência da
população alvo do local, forçando sua transferência para a periferia.

A periferia como fórmula de reproduzir nas cidades a força de trabalho é


consequência direta do tipo de desenvolvimento econômico que se
processou na sociedade brasileira das últimas décadas. Possibilitou, de um
lado, altas taxas de exploração de trabalho; e de outro, forjou formas
espoliativas que se dão ao nível da própria condição urbana de existência a
que foi submetida a classe trabalhadora (KOWARICK, 1979, p. 41).

Situações como esta a que estão expostas a classe operária no Brasil, a


desigualdade social, o valor da terra, a não viabilização do valor moradia incluído no
salário recebido, faz com que o trabalhador construa com as suas próprias
condições um lugar para morar, nos fins de semana e nas horas livres.
Estes por não acessarem a terra ocupam espaços irregulares e constroem os
barracos, formam as favelas, gerando a condição de submoradia agregado ao
salário insuficiente para sua subsistência, que não refletem a capacidade de
sustento para o indivíduo, muito menos de sua família (KOWARICK, 1979).
Desse modo, de acordo com Kowarick (1979):

Favelas, casas precárias da periferia e cortiços abrigam a classe


trabalhadora, cujas condições de alojamento expressam a precariedade dos
salários. Essa situação tende a se agravar, na medida em que se vêm
deteriorando os salários. Para os gastos básicos de uma família - nutrição,
moradia, transporte, vestuário, etc. - aquele que em 1975 ganhava um
salário mínimo deveria trabalhar 466 horas e 34 minutos mensais, isto é,
cerca de 16 horas durante 30 dias por mês (p. 41-42).

O crescimento econômico na região paulista atraía moradores, apenas a sua


fixação na Grande São Paulo já representava uma melhoria sócio econômica, mas
isto não se dava sem a interferência do capital nas relações sociais que os
obrigavam a isto.
A saída do território originário tinha em vista um suprimento de consumo que
não era possível anteriormente. Kowarick (1979), denomina de “mercado de ilusões”
o subterfúgio utilizado para atrair a massa operária ao fetichismo do capital e seu
consumo, e é a atração pelo consumo que trouxe o exército necessário para a
reprodução da exploração e precarização da sua mão de obra.
26

Ainda que este crescimento e direcionamento do consumo, ilusório para as


massas, tenha se dado às classes média e alta, se dilapidou ainda mais a sociedade
aumentando a disparidade social, de forma que, ao se buscar sempre mais lucro,
transpassou-se das empresas privadas e se reproduziu nos financiamentos públicos
da construção civil, onde:

80% dos empréstimos do Banco Nacional da Habitação foram canalizados


para os estratos de renda média e alta, ao mesmo tempo que naufragavam
os poucos planos habitacionais voltados para as camadas de baixo poder
aquisitivo. É contrastante neste sentido que as pessoas com até 4 salários
mínimos constituam 55% da demanda habitacional ao passo que as
moradias colocadas no mercado pelo Sistema Financeiro de Habitação
raramente incluíam famílias com rendimento inferior a 12 salários
(KOWARICK, 1979, p. 50).

O “preço do progresso”, recaindo sempre sobre as massas, obrigando a


reinvenção de sua subsistência, ao mesmo tempo que abre oportunidades de novas
formas de expropriação do capital, reforça as formas de precarização da moradia do
trabalhador que, lidando com as necessidades de poupar, vê na autoconstrução a
subsistência que não encontra nos bens de consumo negados pelo Estado, fator
contraditoriamente responsável pela sua aquisição.

Portanto, os investimentos públicos também sob este ângulo aparecem


como fator determinante no preço final das moradias, constituindo-se num
elemento poderoso que irá condicionar onde e de que forma as diversas
classes sociais poderão se localizar no âmbito de uma configuração
espacial que assume, em todas as metrópoles brasileiras, características
nitidamente segregadoras (KOWARICK, 1979, p. 57).

A péssima condição de subsistência do trabalhador é uma condição inerente


a expropriação da mão de obra e a precarização do seu trabalho. As habitações são
planejadas para aqueles que têm poder aquisitivo, e não incorporam àqueles que
delas necessitam. A ausência do Estado e a resultante exclusão expressa o que
Kowarick (1979), denomina de “problema” habitacional, marcado por dois processos
interligados:

O primeiro refere-se às condições de exploração do trabalho propriamente


ditas, ou mais precisamente às condições de pauperização absoluta ou
relativa a que estão sujeitos os diversos segmentos da classe trabalhadora.
O segundo processo, que decorre do anterior e que só pode ser plenamente
entendido quando analisado em razão dos movimentos contraditórios da
acumulação do capital, pode ser nomeado de espoliação urbana: é o
somatório de extorsões que se opera através da inexistência ou
27

precariedade de serviços de consumo coletivo que se apresentam como


socialmente necessários em relação aos níveis de subsistência e que
agudizam ainda mais a dilapidação que se realiza no âmbito das relações
de trabalho (KOWARICK, 1979, p. 59) (grifos do autor).

A ausência do Estado em relação a implementação de política sociais conduz


as espoliações decorrentes deste processo, de maneira que não há interesse em
melhorias das condições habitacionais dos bairros que não circulam os bens de
consumo. A infraestrutura estatal se acopla ao processo de expansão industrial
responsável pela questão da moradia, ou seja, o Estado age como o fiador da
indústria, e ao mesmo tempo controla a população com seu aparato autoritário,
potencializado a estrutura necessária ao capitalismo.

O papel do Estado é fundamental. Em primeiro lugar, por criar o suporte de


infraestrutura necessário à expansão industrial, financiando a curto ou a
longo prazo as empresas e por agir diretamente enquanto investidor
econômico. Ademais, por ser o agente que tem por encargo gerar os bens
de consumo coletivo ligados às necessidades da reprodução da força de
trabalho. Em segundo lugar por manter a ‘ordem social’ necessária à
realização de um determinado ‘modelo’ de acumulação (KOWARICK, 1979,
p. 59).

O processo de espoliação urbana que se desenvolve nas cidades,


ocasionado pelas relações sociais capitalistas e legitimado pelo Estado, é a
culminância das práticas de precarização da vida da classe trabalhadora. Ao se
retirar o aparato necessário para a reprodução da mão de obra e ao mesmo tempo
financiar o crescimento do modo de exploração capitalista, o Estado se ausenta da
questão habitacional, precarizando ainda mais a vida das classes de menor renda.
Embora sejam apresentados programas habitacionais para o financiamento
de moradias, estas foram feitas com o objetivo do lucro, resultando na exclusão da
massa pobre da população que não dispõe das condições de pagamento. Ainda que
se desenvolvam programas para a demanda de “interesse social”, estas não
adquirem a expressão necessária nem a população beneficiária consegue custeá-la
(KOWARICK, 1979).

O resultado é que as habitações ou ficam vazias ou acabam sendo


transferidas para os grupos de renda mais elevada enquanto que as
pessoas a quem se destinavam os programas subsidiados pelo poder
público acabam voltando às suas condições originais de moradia, que, aliás,
são aquelas que imensa parcela da classe trabalhadora precisa adotar para
continuar se reproduzindo nas cidades (KOWARICK, 1979, p. 60).
28

Contudo, observa-se que o processo formativo das cidades e o seu


crescimento social pela ação do capitalismo transformou-a em um amplo campo de
expropriação de mão de obra, traçando visivelmente as linhas de divisão salarial
pela geografia da região como apresentaram Engels (2010) e Kowarick (1979).
O Estado, ao sustentar as formas de exploração do capital, se compromete e
o representa, minando à condição de apresentar políticas sociais capazes de
atender à realidade dos trabalhadores. A reprodução deste processo, com a
reinvenção do capital a cada crise vivenciada, molda as relações sociais e impactam
a cidade constantemente.
A contemporaneidade desta questão urbana e a sociabilidade do trabalhador
será tratada no item seguinte.

1.2 - A questão urbana na contemporaneidade

É nesse cenário, de desenvolvimento do capitalismo, no qual emergem as


contradições e os antagonismos de classe, onde a luta da classe trabalhadora pelo
acesso à cidade e os projetos urbanos de interesses econômicos se reproduzem,
que se move a questão urbana e de moradia.
Considerando as reconfigurações do capital e do trabalho no contexto do
século XX e XXI, a compreensão da questão urbana e da moradia contém a
referência a esse movimento dialético que inclui os estágios de acumulação e no
qual a questão da terra, da propriedade e da moradia são uma condição estrutural
desse processo.
É sabido que o capital vivencia crises, e é a partir destas crises, inerentes ou
orgânicas, que ele se reformula para se adequar e formar novos estágios de
acumulação. Harvey (2005), afirma que as manifestações de crise impõem
racionalidade ao desenvolvimento econômico capitalista. Esta imposição acontece
pelos custos sociais adversos à classe trabalhadora. A periodicidade destas crises
se dá pelas contradições do processo de acumulação do capital, pelas “relações que
os homens estabelecem entre si na produção da riqueza material” (TONET, 2009, p.
1).
29

Desta forma, “os capitais, em cada momento histórico, buscam moldar as


cidades aos seus interesses, ou melhor, aos interesses de um conjunto articulado de
diferentes forças que podem compor uma aliança.” (MARICATO, 2015, p. 18).
Como o alvo do capitalismo é sempre o lucro a todo custo, e seu crescimento,
qualquer obstáculo que se oponha a tal crescimento gera uma crise. É neste cenário
de crise que o capitalismo se reinventa e se reestrutura para continuar prosseguindo
ao seu objetivo, culminando em transformações produtivas e do papel do Estado.
Assim, ao se recompor, extrai e reinventa as condições de mercado, desfavoráveis
ao trabalhador.
Tonet (2009), explica que a reestruturação produtiva representou a
reformulação pós-crise estrutural do capital no século XX, onde a flexibilização e
descentralização da produção tomaram força ao encontrarem nos países periféricos
força de trabalho mais barata e propensa à exploração e desregulamentação dos
direitos trabalhistas, sendo assim um terreno fértil para o crescimento do capital
central.
O período de crise que se inicia nos anos 1970 conduziu a uma
reestruturação produtiva com implicância nas condições objetivas e subjetivas da
sociabilidade, que se reflete na vida social, urbana, agrária, ambiental, em
circunstâncias desfavoráveis ao trabalho.

A manipulação reflexiva ou a “captura” da subjetividade tornou-se


efetivamente o modo de operar do controle sociometabolico do capital. A
luta de classes e as derrotas das forças políticas do trabalho na década de
1970 conduziram a reestruturação política do capital, constituindo o Estado
neoliberal e as políticas de liberalização comercial e desregulamentação
financeira; e o pós-modernismo e o neopositivismo permearam a
reestruturação cultural. Nos “trinta anos perversos”, o capitalismo
financeirizado, toyotista, neoliberal e pós-moderno levou a cabo uma das
maiores revoluções culturais da história (ALVES, 2012, p. 1).

A produção de riqueza neste modo de produção necessita diretamente da


reprodução da pobreza, uma vez que se busca sempre a redução do custo de
produção onde capital, financeirizado e globalizado, não encontra obstáculos ao seu
crescimento.
Tonet (2009), afirma que há um aspecto central da crise estrutural do capital,
a contradição da produção e apropriação da mercadoria, sendo a produção capaz
de suprir toda a demanda expressa na sociedade, contraditoriamente em meio a
escassez das necessidades sociais.
30

O capitalismo necessita da escassez como um elemento vital para a sua


reprodução. Uma produção abundante - tornada possível pela atual
capacidade tecnológica - simplesmente assinaria a sentença de morte
desse sistema social. Isso porque uma oferta abundante rebaixaria tanto os
preços que os capitalistas simplesmente deixariam de ganhar dinheiro. O
que, obviamente, não interessa a nenhum deles. Assim, o sistema
capitalista tem que manter a escassez, mesmo que milhões de pessoas
sofram as mais terríveis consequências, uma vez que o seu “objetivo” é a
sua reprodução e não o atendimento das necessidades humanas (TONET,
2009, p. 4).

A potencialização dos efeitos de mercado na sociabilidade, em sua fase


financeira e globalizada, agrava os problemas sociais, “pela falta de acesso (em
quantidade e qualidade adequadas) aos bens materiais necessários à manutenção
de uma vida digna”. (TONET, 2009, p. 5)
Grande parte dos trabalhadores tendem a viver nas cidades sob
circunstâncias de pobreza, favelização, violência urbana, migração, destruição do
meio ambiente e superpopulação, já que as condições necessárias à sua
subsistência não são ofertadas de maneira acessível.

Milhões de pessoas são obrigadas a viver em condições subumanas porque


não têm acesso ou têm um acesso precaríssimo à alimentação, à saúde, à
habitação, ao vestuário, ao saneamento, ao transporte, etc. Outros milhões
de pessoas se deslocam de regiões e países mais pobres para outros
lugares onde se concentram melhores possibilidades de ganhos e de vida,
com todas as consequências - econômicas, sociais, políticas e ideológicas -
que esse deslocamento traz consigo (TONET, 2009, p. 6).

Desta forma, como explanado pelo autor e abordado no item anterior, os


deslocamentos da população de regiões pobres para os centros capitalistas são
fomentados pelo crescimento econômico urbano e as possibilidades de venda da
sua força de trabalho, igualmente pela reprodução desigual dos espaços urbanos.
O crescimento populacional e as desmedidas ações do capital para continuar
gerando as necessidades de consumo forjam traços urbanos que agravam o
contexto das cidades com o inexorável desenvolvimento do capital, produzindo
efeitos e agravos nas condições de vida do trabalhador. As lutas sociais
historicamente forçam o desmembramento das condições de proteção ao trabalho.
Neste patamar de expropriação do trabalho, a riqueza produzida por muitos e
apropriadas por poucos é causa da pobreza vivida por eles, resultando em
31

desemprego, precarização do trabalho, retorno de formas primitivas de trabalho e


até escravismo. (TONET, 2009)
Embora a pobreza seja condição de reprodução da riqueza, seu excesso a
longo prazo torna danosa a reprodução do capital que através do Estado ou
instituições não diretamente governamentais, elaboram modos de assistência à
população desprotegida. Desta necessidade de manutenção social, estruturam-se
as chamadas políticas sociais e programas sociais, que não tem como objetivo
erradicar os problemas urbanos e sociais gerados pelo capitalismo, mas apenas
minimizar seus efeitos mais graves. (TONET, 2009)
Com o desenvolvimento da mercantilização da vida, através do avanço do
neoliberalismo do Estado, os bens de uso público necessários à população também
se tornam mercadorias à serviço do capital. O acesso à saúde, educação, habitação
e etc, se tornam via de lucro ao mercado.
Assim como a produção de mercadorias, a produção do espaço urbano se faz
voltada ao atendimento das necessidades do capital. Áreas direcionadas à
população com maior poder aquisitivo que se beneficia da infraestrutura urbana
proporcionada pelo Estado, com equipamentos sociais adequados, comparado às
áreas ocupadas pela classe trabalhadora carente de infraestrutura e serviços.

Tais diferenciações baseiam-se no fato de que a cidade é antes de mais


nada uma concentração de pessoas, exercendo em função da divisão social
do trabalho, uma série de atividades concorrentes ou complementares,
desencadeando uma disputa de usos. No caso do uso produtivo do espaço,
este será determinado pelas características do processo de reprodução do
capital; é o caso da localização das indústrias apoiadas pelas atividades
financeiras, comerciais, de serviços e de comunicação (NEVES, 2009, p. 3).

O processo de urbanização e a reprodução das desigualdades derivadas do


processo capitalista ampliam a crise urbana, o crescimento da demanda
populacional pelo espaço urbano e pelos aparelhos sociais.
A cidade age como uma grande linha de produção de valor de troca, sendo o
ambiente urbano moldado segundos as necessidades e interesses do capitalismo, e
a habitação o seu produto mais caro.

A habitação é uma mercadoria especial que tem produção e distribuição


complexas. Entre as mercadorias de consumo privado (roupas, calçados,
alimentos, e etc.) ela é a mais cara. Seu preço é muito maior do que os
salário médios, e por isso o comprador demora muitos anos para pagá-la ou
32

para juntar o valor que corresponde ao seu preço (MARICATO apud LIMA,
2017a, p. 37).

Neste contexto socioeconômico de reestruturação neoliberal, as


necessidades da classe trabalhadora, em especial a moradia, se tornam “invisíveis”
ao Estado devido à perda da força dos partidos de esquerda e dos sindicatos, como
afirma Maricato.

De fato, essa invisibilidade é maior a partir da globalização neoliberal (após


a década de 1970, nos países centrais), quando se enfraquece o poder dos
sindicatos e dos partidos de esquerda, e ao capital financeiro se torna
hegemônico. Mas, nos países capitalistas periféricos, sobretudo essa
invisibilidade é histórica. [...] nesses países a habitação dos trabalhadores
não é problema para o capital e na maior parte das vezes nem para o
Estado. Por isso, os bairros de moradias dos trabalhadores são construídos
por eles mesmos nos seus horários de descanso. E também por isso, as
favelas fazem parte da reprodução de força de trabalho formal. Foi assim
durante o processo de industrialização por substituição de importações e é
assim atualmente nas cidades conhecidas como globais (MARICATO, 2015,
p.19-20).

Sendo a cidade o lugar por excelência de reprodução da força de trabalho,


seu crescimento gera necessidades que não suportam soluções individuais, ou seja,
o Estado é necessário cada vez mais. (MARICATO, 2015)
As condições de habitabilidade necessárias para o desenvolvimento urbano,
tanto em sua infraestrutura de abastecimento de água e luz ou transporte e
equipamentos sociais, refletem a reprodução ampliada da força de trabalho, que não
só depende do seu salário para sobreviver. As condições macro societárias da vida
do trabalhador dependem da relação do Estado, pois “um aumento de salário pode
ser absorvido pelo alto custo do transporte ou da moradia, por exemplo”
(MARICATO, 2015, p. 22).
O crescimento urbano acontece pela disputa de duas forças contraditórias,
segundo Maricato (2015). De um lado a classe trabalhadora, responsável pelo
crescimento urbano e populacional de uma cidade, e vê nela o seu valor de uso,
buscando moradia e serviços públicos bons e baratos, e do outro lado o capital, que
age na cidade de acordo com seu valor de troca, ou seja, a cidade é simplesmente
uma mercadoria.
Devido a incapacidade de custear a construção ou pagamento, ainda que
através de endividamento, de uma moradia, a classe trabalhadora vê na
33

autoconstrução a saída obrigatória para a obtenção do bem necessário a sua


sobrevivência e reprodução.
O fenômeno da autoconstrução representa mais uma forma de extração de
valor do trabalhador, que construindo em seus horários de folga, aos poucos e de
forma irregular e informal, não seguindo normas urbanísticas ou leis ambientais,
expropria mais ainda o seu salário.
Este fenômeno representou explicitamente a acumulação capitalista pelo
processo de autoconstrução, já que no período de 1940 a 1980 a taxa de
crescimento no Brasil foi de cerca de 7% ao ano, enquanto que o processo de
urbanização cresceu cerca de 5,5% ao ano (IBGE) (MARICATO, 2015).
A partir deste período, as altas taxas de desemprego recorrente das relações
capitalistas e da desestruturação do mercado de trabalho (LIMA, 2017a), acabam
por impossibilitar o acesso à moradia para a classe trabalhadora.

A luta “dos sem-terra” se realiza questionando a propriedade que permite


“deixar a terra vazia” enquanto uma parcela crescente não tem terra para
plantar, logo para viver. Ambas as lutas revelam o processo de deterioração
e desintegração da vida colocando em cheque o direito da propriedade
privada e as formas de apropriação do espaço enquanto condição de
realização da vida seja para a produção do alimento, seja enquanto moradia
e tudo o que esta atividade implica para a vida. Revelam, como a luta, a
produção segregada do espaço; a privação enquanto produto, as condições
da alienação e a luta ambos produto do modo como se realiza a reprodução
das relações sociais no Brasil (CARLOS apud LIMA, 2017a, p. 46-47).

A autoconstrução das moradias implica numa das expressões da questão


urbana. Essas moradias não recebem o acesso ao saneamento, se localizam em
áreas fora da cobertura do sistema de transporte público ou mesmo da rede básica
de saúde, em alguns casos em locais insalubres e em conflito com o meio ambiente.
Sendo assim, a autoconstrução aparece como algo externo ao capital, sendo
inerente e funcional ao seu modo de reprodução, predominantemente nos países
periféricos. Segundo Santos (1982, p. 66-67), se apresenta como: “um problema ou
conjunto de problemas sociais específicos criado fora do mundo do trabalho e da
produção e que, como tal, não é ao capital mas sim à sociedade no seu todo e,
portanto, ao Estado que compete resolver.”
Segundo Santos (1982), o Estado capitalista desassocia os aparelhos sociais
da relação econômica produzida socialmente. Os investimentos em tais meios de
consumo coletivo são em períodos desfavoráveis ao capital improdutivos.
34

Ao separar a questão urbana das contradições do modo de produção


capitalista que estão na sua base, o Estado converte-a num conjunto de
“problemas sociais” ou “tensões sociais” susceptíveis de serem resolvidos
dentro dos limites estruturais e de compatibilidade funcional impostos pela
lógica do capital. Uma vez formulada a questão urbana ao nível da estrutura
de superfície da sociedade, é também ao nível desta estrutura que a sua
resolução deve ser planeada e executada. O objetivo não é resolver as
contradições mas antes dispersá-las, mantendo-as em níveis toleráveis e
funcionais perantes as exigências da acumulação capitalista no momento
histórico e na conjuntura dados (SANTOS, 1982, p. 68).

O autor afirma que as políticas urbanas são um conjunto de mecanismos de


dispersão variáveis e de variável articulação de acordo com diversos fatores
estruturais e conjunturais, ou seja, se configurando como um aparato de controle de
massas, utilizado nas capacidades e necessidades do Estado.
A prática de autoconstrução e a falta de espaços apropriados para a
construção de moradia para os trabalhadores representa o problema gerado pela
articulação do capital flexibilizado, que segundo Boulos (2012), os trabalhadores em
suas camadas mais pobres encontram dificuldades para se sustentar de maneira
digna e autônoma, recorrendo às ocupações, coabitação familiar ou aluguel em
ambientes sem habitabilidade.
O número de casas desocupadas excede o número de moradores sem teto,
sem falar nos terrenos ociosos sem edificações, que pertencem ao capital e são
utilizados para manter o preço dos imóveis alto, ou seja, a especulação imobiliária
sustenta o déficit habitacional.
Assim, a formação das cidades acompanha a lógica da acumulação e
formação do capitalismo. Nessa sociedade, a moradia é uma expressão do
mercado, submetido as regras do capital imobiliário, e de nada vale o direito formal
se não há políticas sociais para garantir o acesso à classe trabalhadora.
O surgimento dos movimentos de luta por moradia, em especial o MTST em
1997, representou um passo na luta pela conquista de moradia para a classe
trabalhadora, afirma Boulos (2012). O embate do MTST com o capital imobiliário se
caracteriza como uma expressão da questão social, pois suas ações e
reivindicações são respondidas com repressão, despejos violentos e ausência de
concessões dos governos.
As desigualdades e o investimento em políticas sociais em caráter seletivo,
permite que a questão urbana tome patamares cada vez maiores no Brasil. Aliado à
35

conjuntura neoliberal mundial de orientação para o mercado, culmina no crescimento


da pobreza e precarização da vida da classe trabalhadora. No Brasil, as conquistas
sociais e o direito à cidade se deram pela luta da classe trabalhadora, em todas as
suas formas.
No próximo capítulo discute-se a trajetória da política habitacional nos
governos no Brasil, história e fundamentos sócio-políticos, para compreender o
caminho traçado para o acesso à habitação mediado pelo Estado.
36

CAPÍTULO 2 - A POLÍTICA HABITACIONAL NO BRASIL

2.1 - A política social da habitação nos governos do brasil

A política de habitação no Brasil tem suas raízes históricas presentes no


excludente processo de urbanização e industrialização do século XX - conforme
discutido no capítulo I deste estudo - contudo, tem-se como ponto de partida da
questão habitacional o processo iniciado com a Lei 601/1850, conhecida como a “Lei
de Terras” segundo Holz e Monteiro (2008).
As autoras explicam que esta lei determinava a forma de aquisição de terras
única e exclusivamente por compra, criminalizando ocupações exatamente no
período precedente à abolição da escravatura no Brasil, desta forma, desordenando
o crescimento das cidades diante da população recém liberta que não tinha uma
política pública para recorrer.

Os escravos libertos que não permaneceram nas áreas rurais foram em


busca de sobrevivência nas cidades. Todo este quadro faz com que as
cidades cresçam com um flagrante despreparo em termos de políticas
públicas que atendessem essa população, formando cidades
desordenadas. Portanto, percebe-se que desde o início do processo de
construção das cidades e da sociedade brasileira, houve um descompasso
entre o acesso à moradia e o crescimento populacional (HOLZ;
MONTEIRO, 2008, p. 2).

O aumento populacional, devido a estes fatores ainda contou com o grande


número de imigrantes que aportavam no Brasil, exigindo das cidades, especialmente
de São Paulo e do Rio de Janeiro, uma grande demanda por moradia, transporte e
demais serviços urbanos que não existiam na época (MOTTA, 2014).
O processo de higienização das cidades no Brasil entre os séculos XIX e XX,
de base europeia, inicia-se a partir da uma reformulação das grandes cidades com o
alargamento de ruas e implantação do saneamento básico, conforme as demandas
do capital industrial da época, tornando assim as habitações populares que
conseguiram se construir nas áreas centrais das cidades alvo deste processo,
impedindo que se instalassem novos moradores nas construções já existentes,
como também impediam novas construções e algumas vezes as demolindo. estas
construções.
37

A classe trabalhadora, assim como os escravos recém libertos, se amontoava


em construções conhecidas como cortiços. Estas construções abrigavam
trabalhadores em áreas centrais, consequentemente de interesse do capital, onde
além de serem ilegais e conflitarem com os interesses, eram locais de propagação
dos vícios e má condições de higiene, sendo sua proximidade um fator de
desvalorização, como explica Sobrinho (2013).

Os cortiços representam, portanto, uma ameaça à noção de civilidade; as


greves, uma ameaça à ordem burguesa de cidade limpa, disciplinada e livre
das imundícies e de manifestações turbulentas dos operários; a rua será
objeto da disciplina devido à ameaça à própria ordem que mantém
desigualdades. As doenças que se espalhavam pela urbe, do ponto de vista
ideológico, teriam como foco de proliferação justamente as áreas pobres (p.
214).

As reformas higienistas, ao atenderem os interesses do capital, não tinham a


intenção de realocar essa população pobre para outras áreas centrais, embora
tenham criado algumas habitações populares, estas não foram o suficiente para
suprir a demanda da população, obrigando sua remoção às periferias e a ocupação
de novas áreas ilegais para moradia, o que culminou na “favelização”.

Percebe-se que não existia nenhuma política que pudesse dar garantia a
classe trabalhadora, o que existia na verdade era a vontade do Estado em
afastar da classe média o perigo das epidemias e consequentemente a
expansão desses cortiços, como também os interesses mercantis de
empresários ligados a construção civil, que viam nesse aspecto de
destruição dos cortiços, uma forma de lucrar, a partir do momento em que
passaram a impor um novo modelo de construções de casas, oportunizando
lucros, pois a população seria obrigada a ter que adequar-se a esse novo
padrão de edificação, e que de fato houvesse a efetividade dessas vontades
(LIMA, 2017a, p. 59).

A industrialização agregou-se a este processo, inserindo mais e mais pessoas


às cidades e, ao não conseguirem adquirir suas condições de moradia, agravou-se
mais os problemas sociais urbanos e consequentemente o crescimento das áreas
ilegais.
Contudo, o governo brasileiro disponibilizou crédito para as empresas
privadas no intuito de que produzissem habitações.

Todavia, os empresários não obtiveram lucros com a construção de


habitações individuais, devido à grande diferença entre os preços delas e
das moradias informais; alguns passaram a investir em loteamentos para as
classes altas, enquanto outros edificaram prédios para habitações coletivas,
38

que passaram a figurar como a principal alternativa para que a população


urbana pobre pudesse permanecer na cidade, especificamente no centro,
onde estariam próximos das indústrias e de outras possibilidades de
trabalho (PECHMAN & RIBEIRO apud MOTTA, 2014, p. 1-2).

A pressão social na crescente demanda por moradias evidenciou a


incapacidade do setor privado do suprimento de tal demanda, sendo assumida pelo
Estado, que passou a ser cobrado tanto pelos trabalhadores como pelo
empresariado, pois o valor em alta dos aluguéis demandava a reivindicação de
maiores salários (MOTTA, 2014).
Têm-se o início do esboço do que seria uma política habitacional, Motta
(2014), afirma que começou com a proposição do financiamento pelos Institutos de
Aposentadoria e Pensão (IAPs) para casas de aluguel, destinada apenas aos
associados dos institutos, ou seja, a classe média. Também se construiria novas
habitações, ao mesmo tempo que o governo da época tratava a favelização como
“caso de polícia”, agravando a questão urbana, realizando remoções e uma política
de erradicação de favelas.

Antes de discutirmos os IAPs, é importante destacar que a lei Elói Chaves


(Decreto 4.682, de 24/01/1923) foi a primeira legislação a regular a
previdência do país, quais sejam as Caixas de Aposentadoria e Pensões
(CAPs). As CAPs eram administradas por um colegiado composto de
empregados e empregadores e sua estratégia de contribuição era tripartite:
empregador, empregado e Estado. As supracitadas caixas foram referência
para a criação dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs)
(BARBOSA, 2016, p. 23).

Com isto, nos anos 1940 têm-se início a atuação do Estado na habitação
popular, mesmo que sem expressão. O surgimento da Fundação Casa Popular
(FCP) em 1946, embora ineficaz por falta de recursos e regras para seu
financiamento, resultou em poucas unidades entregues, tendo existido “para
funcionar como uma resposta social a um contexto de fortes pressões dos
trabalhadores e de crescimento do Partido Comunista.” (MOTTA, 2014, p. 3).

Todavia, o problema da escassez de moradia e a inconstância de recursos


sempre persistiram, uma vez que o Estado era o principal financiador e a
verba para esse órgão dependia da distribuição interna dos recursos e da
situação econômica do país (AZEVEDO & ANDRADE, 1982). Outro grave
problema eram as relações clientelistas e o autoritarismo, combinação
característica do período populista, que determinavam as regiões onde
seriam construídos os conjuntos e os critérios de seleção dos candidatos. A
postura autoritária também se fazia presente após a entrega dos
apartamentos nos conjuntos: técnicos da FCP visitavam os apartamentos
39

para avaliar e orientar o comportamento social e individual dos moradores,


que poderiam ter seus contratos rescindidos caso tivessem conduta nociva
‘‘à ordem ou à moral do Núcleo Residencial, ou criarem embaraço à sua
Administração” (AZEVEDO & ANDRADE apud MOTTA, 2014, p. 4).

Nos anos 1940 o Estado ainda cria o Decreto-Lei do Inquilinato, que


congelava o valor dos aluguéis e regulamentou as relações entre proprietário e
inquilino, vigorando por 22 anos.
Houveram outras tentativas de desenvolvimento na política de habitação
como a do Banco Hipotecário em 1953 e a formulação do Plano de Assistência
Habitacional, assim como a criação do Instituto Brasileiro de Habitação, ambos em
1961, que não chegaram a ser implementadas (MOTTA, 2014).
O golpe militar de 1964 extinguiu a FCP, dando lugar ao Plano Nacional de
Habitação (PNH), que “buscava a dinamização da economia, o desenvolvimento do
país (geração de empregos, fortalecimento do setor da construção civil etc.) e,
sobretudo, controlar as massas, garantindo a estabilidade social.” (MOTTA, 2014, p.
4).
Juntamente ao PNH, têm-se também o surgimento do Banco Nacional de
Habitação (BNH), a extinção dos IAPs e a instituição do Sistema Financeiro de
Habitação (SFH), que juntamente ao BNH, “[...] promoveu a construção e aquisição
da casa própria, especialmente para as famílias de baixa renda e intensificou o
processo de desenvolvimento urbano através de saneamento básico, infraestrutura
e outras ações” ( LIMA, 2017a, p. 60).
De acordo com Behring e Boschetti (2006), os governos militares introduziram
os mecanismos para o desenvolvimento da política social, sem o pacto social
democrata, alimentou o sonho da casa própria para os segmentos médios e de
trabalhadores do mercado formal. Para as autoras, a ditadura impulsionou uma
política Nacional de habitação com a criação do Banco Nacional de Habitação.
Para Behring e Boschetti (2006, p.137), "[...] aqui tratava-se de uma estratégia
tipicamente keynesiana de impulsionar a economia por meio do incremento da
construção civil na construção de moradias populares." Contudo, esse foi um
período de forte crescimento das empreiteiras, das imobiliárias, dos incorporadores,
no contexto de nenhuma transparência e controle dos gastos públicos, dada a
obscuridade do Estado ditatorial.
40

Afirmam Behring e Boschetti (2006), que combinava-se a essa política a


criação de fundos de indenização dos trabalhadores (FGTS, PIS e PASEP), que
constituíram mecanismos para o financiamento da política habitacional.
O BNH, por meio das Campanhas de Habitação (COHABs) e dos Institutos de
Orientação às Cooperativas Habitacionais (INOCOOPs), financiadas pelo Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), atuava na construção de conjuntos
habitacionais para a população de baixa renda, somando-se ao Sistema Brasileiro
de Poupanças e Empréstimos (SBPE) se tornou o principal órgão da política
habitacional e uma das principais organizações financeiras do país.

A trajetória do SFH e do BNH não foi linear e pode ser dividida em três
fases. A primeira delas, de 1964 a 1969, foi a de implantação e expansão do
BNH e das COHABs, com um considerável financiamento de moradias para
o “mercado popular” (40% dos investimentos), convergindo com o objetivo
do governo de se legitimar junto às massas. A segunda fase, de 1970 a
1974, consistiu em um esvaziamento e uma crise do SFH, sobretudo devido
à perda do dinamismo das COHABs, que se tornavam financeiramente
frágeis devido à inadimplência causada, principalmente, pela perda do
poder de compra do salário mínimo, situação que atingia seus principais
mutuários, oriundos das camadas pobres. Isso fez com que os
financiamentos passassem a ser, cada vez mais, destinados às famílias de
classe média, uma vez que os juros para essa camada eram mais altos e o
índice de inadimplência, se comparado com o das classes mais pobres, era
menor. Inicia-se, então, a terceira fase do SFH (1975 a 1980), caracterizada
pela reestruturação e pelo revigoramento das COHABs, com aumento do
número de moradias produzidas, a grande maioria destinada à classe média
(MOTTA, 2014, p. 5).

Desta forma,

[...] apesar do discurso do poder público de que a implantação do SFH e do


BNH seria para melhorar as condições de habitabilidade da classe
trabalhadora, o que se viu foi o forte investimento em obras que favoreciam
o desenvolvimento do capital monopolista (BARBOSA, 2016, p. 33).

O desenvolvimento da política habitacional no governo militar, ainda que


demonstrasse um crescimento de investimentos na política, se direcionava aqueles
com ligações com o governo, sendo das classes média e alta.
Ao servir os interesses da burguesia, não havia melhorias para a classe
trabalhadora, os recursos do FGTS não foram suficientes para mudar este cenário.
Esta adição ao montante financeiro do BNH não alterou a realidade da crise
habitacional da ditadura militar, mas endossou sua capacidade financeira (LIMA,
2017a).
41

O BNH desde a sua constituição teve uma lógica que fez com que todas as
suas operações tivessem a orientação de transmitir as suas funções para a
iniciativa privada. O banco arrecadava os recursos financeiros e em seguida
os transferia para os agentes privados intermediários. Algumas medidas
inclusive demonstravam que havia ao mesmo tempo uma preocupação com
o planejamento das ações de urbanização aliada aos interesses do capital
imobiliário. Exemplo disto foi à medida que obrigou as prefeituras a elaborar
planos urbanísticos para os seus municípios, o que era positivo, mas a
condição de serem qualificadas para a obtenção de empréstimos junto ao
Serviço Federal de Habitação e Urbanismo era de que estes deveriam ser
elaborados por empresas privadas. Até mesmo as cobranças das
prestações devidas estavam a cargo de uma variedade de agentes
privados, companhias habitacionais, iniciadores, sociedades de crédito
imobiliário, entre outros, que 'além de reterem uma parte dos juros,
conservavam os recursos financeiros provenientes das prestações
recebidas durante um ano antes de o devolverem ao BNH'. (BOTEGA,
2007, p. 68) (grifos do autor)

O resultado desta política foi o direcionamento das famílias pobres para as


favelas, não sobrando alternativa a não ser a formulação de loteamentos
clandestinos nas periferias das capitais e regiões metropolitanas. A possibilidade do
acesso à moradia se dava na forma de compra de lotes ilegais e irregulares, por
serem mais baratos, com a autoconstrução das moradias (MOTTA, 2014).
No período dos anos 1970, o BNH passou a dar importância para a questão
do saneamento básico com a criação de programas focalizados nas famílias mais
pobres, o que resultou no encarecimento das regiões periféricas.

Nos últimos anos, os programas e projetos que constituem a política


habitacional envolvem além de aspectos relativos à construção e ao
financiamento da moradia, o contexto social onde esta se insere. Isto é,
abordam questões relativas ao saneamento básico, à drenagem e à
pavimentação das ruas, aos equipamentos sociais (escola, posto de
saúde, posto policial e outros) que devem existir na sua abrangência
(GONÇALVEZ apud LIMA, 2017a. p. 63).

O agravamento da inflação da época ocasionou a queda de produção e


compra desses lotes, impulsionando ainda mais o crescimento das favelas.

O Programa de Financiamento de Lotes Urbanizados (PROFILURB) foi


criado para “oferecer uma alternativa habitacional dentro do Sistema
Financeiro de Habitação àquelas pessoas marginalizadas dos programas
habitacionais das COHABs” e, para tentar controlar o aumento das favelas.
Criado em 1975, tinha como finalidade “fornecer condições de saneamento
e infraestrutura básica, reservando ao mutuário a responsabilidade de
construir sua habitação de acordo com suas disponibilidades financeiras e
prioridades pessoais”. No entanto o Programa foi fortemente ignorado em
razão de os lotes serem muito afastados dos centros urbanos o que
42

complicava o acesso às cidades (AZEVEDO & ANDRADE apud SOUZA;


OLIVEIRA, 2018, p. 46).

Os anos 1980 trouxeram o agravamento da crise do modelo


desenvolvimentista do governo militar, causando altos índices de inflação,
desemprego e pobreza, gerando a insatisfação popular.

O reclamo maior partiu dos mutuários da classe média-alta, financiados


através do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), pois,
além de ter seus salários corroídos violentamente pela crise do início dos
anos 80, pagavam maiores prestações em função do alto preço dos imóveis
produzidos pelo mercado. O reajuste das prestações em 1983, normalmente
superior ao aumento real dos salários desses setores, engendrou a criação
de inúmeras entidades de defesa dos mutuários e a entrada maciça, na
justiça, de processos contra as agências financiadoras. Outro setor muito
afetado foi o dos mutuários de cooperativas, pois, formado por uma clientela
com nível de renda não muito superior ao das Cohab, participa de um
programa com menores subsídios e que, por motivo de deformações
advindas do formato institucional, passou a produzir habitações com preços
finais relativamente mais caros que os previstos em seus objetivos iniciais.
Em suma, as unidades habitacionais produzidas pelas Cohab
apresentavam, em relação às construídas pelas cooperativas, maior
competividade. Isto fez com que os mutuários das primeiras tivessem
melhores condições de enfrentar a crise do que os destas últimas
(AZEVEDO, 1988, p. 115).

O autor completa afirmando que:

A reação ao aumento de 1983, capitaneada pelos mutuários do SBPE com


poder relativamente alto de mobilização da opinião pública e pressão sobre
o governo, fez com que o BNH terminasse por oferecer, após várias outras
medidas (mudança do sistema de amortização, extensão de financiamento,
etc.), um abono de emergência e uma indexação extremamente favorável
para aqueles que optassem pelo reajuste semestral. Estes subsídios, que
beneficiaram enormemente todos os mutuários, tornaram as prestações das
casas populares bastante acessíveis. Em contrapartida, isto significou um
agravamento violento do déficit do Sistema Financeiro da Habitação. O
BNH, que vinha sendo, ao longo de sua trajetória, questionado sobre seu
desempenho social, com o desastre financeiro do Sistema, entrou em
profunda crise institucional (AZEVEDO, 1988, p. 115).

O SFH e o BNH não resistiram ao crescente aumento inflacionário dos anos


1980, que reduziram drasticamente o poder de compra do brasileiro, e em especial a
classe média.

[...] o SFH/BNH não resistiu a grave crise inflacionária vivenciada pelo Brasil
principalmente nos primeiros anos da década de 1980, onde a inflação
atingirá índices de 100% ao ano em 1981 e em 1982 (a partir de então não
cessará de crescer mais chegando aos 1770% em 1989). Esta crise levou a
uma forte queda do poder de compra do salário, principalmente da classe
43

média, o público que havia se tornado alvo das políticas habitacionais deste
sistema (BOTEGA, 2007, p. 70).

A inadimplência foi um dos pontos responsáveis para a ineficiência do


SFH/BNH, explicando o fenômeno do Movimento dos Mutuários da casa própria,
que buscava a renegociação das dívidas, onde mesmo não constituindo um
movimento social organizado, marcou os anos 1980.
Com o fim da ditadura militar, o governo seguinte, presidido por Sarney,
decidiu por uma medida que se mostrou ineficaz, tentando sustentar um sistema já
falido, concedendo subsídios elevados para os mutuários do sistema (BOTEGA,
2007).

Portanto, esta foi a conjuntura vivenciada no Brasil, no tocante à habitação,


quando, a partir do Decreto nº 2.291 de 21 de novembro de 1986, o
presidente José Sarney decretou o fechamento do Banco Nacional de
Habitação. Este acabou sendo incorporado pela Caixa Econômica Federal,
tornando a questão habitacional uma mera política setorial para esta
instituição que não possuía qualquer tradição com relação ao tema
(BOTEGA, 2007, p. 70).

A culminância da crise econômica e política do país resultou na queda da


ditadura, e com a extinção do BNH, sendo suas funções transferidas para a Caixa
Econômica Federal (CEF). Ainda que mais de quatro milhões de casas tenham sido
financiadas durante os seus 22 anos, o BNH não obteve expressão na área de
interesse social.
O crescimento dos movimentos contrários à ditadura militar e ao BNH são
destaque neste período, os movimentos de mobilização da sociedade a favor da
democracia, eleições diretas e Constituintes são a marca da abertura para a
redemocratização e possibilidade de mudanças nas políticas sociais (LIMA, 2017a).
A nova conjuntura que se expande com o ocaso da ditadura e com a abertura
política, criada a partir da redemocratização, abre espaço para o desenvolvimento
de movimentos sociais em favor das políticas sociais urbanas e de garantia de
direitos, inclusive de moradia, possibilitando o surgimento do Movimento Nacional
de Reforma Urbana (MNRU), que será analisado no item seguinte.
44

2.2 - A reforma urbana e o direito à moradia

Durante regime autoritário brasileiro, não houve o desenvolvimento de pautas


sobre reformas agrárias ou urbanas, impulsionando o modelo concentrador de renda
e gerador de desigualdades que já marcava a industrialização baseada no capital
internacional e focalizado na camada média urbana (RIBEIRO, 2003).
Com a abertura à redemocratização e o desmanche da política federal de
habitação, até então estruturada pelo BNH e SFH, os movimentos sociais urbanos e
os partidos de esquerda, antes na ilegalidade, emergiram e tomaram visibilidade em
suas reivindicações.
O Movimento Nacional de Reforma Urbana reunia profissionais (arquitetos e
urbanistas, engenheiros, advogados, assistentes sociais, geógrafos), entidades
sindicais (urbanitários, sanitaristas, setor de transportes), lideranças de movimentos
sociais, ONGs, etc. recuperando pautas urbanísticas interrompidas pela ditadura.

Contrastando com a pouca importância dada pelo executivo federal à


questão urbana, nesse mesmo período consolidou-se um forte movimento
social que, sob a bandeira da Reforma Urbana, reuniu profissionais,
lideranças sociais, sindicalistas, ONGs, integrantes da igreja católica
(egressos do movimento religioso denominado Teologia da Libertação) e
servidores públicos. Os primeiros passos desse movimento foram dados
ainda nos estreitos espaços de participação política existentes na vigência
do regime militar. Nos anos 80 esse movimento cresceu acompanhando a
exigência generalizada na sociedade por liberdades políticas. Uma de suas
vitórias mais expressivas foi a apresentação de uma emenda de iniciativa
popular à Constituição Federal de 1988 e a inclusão na carta magna da
função social da propriedade e da função social da cidade (MARICATO
apud LIMA, 2017a, p. 66).

O MNRU, transformado depois em Fórum Nacional da Reforma Urbana


(FNRU), conquistou o estabelecimento de um arcabouço jurídico progressista para o
desenvolvimento urbano (KLINTOWITZ, 2016).
O ideal da reforma urbana surge dos reformistas anteriores ao golpe militar,
sendo fundado em diagnósticos dos problemas urbanos como resultado da relação
de forças que ocorrem nas cidades brasileiras pela apropriação privada das terras
com acesso aos aparelhos sociais providos pela cidade. Esta visão conflita com o
diagnóstico demográfico da ditadura, o qual afirma que os problemas urbanos
vividos pela população se derivam do crescimento populacional da região (RIBEIRO,
2003).
45

Em 1986, o Movimento Nacional pela Reforma Urbana define o conceito da


reforma urbana como uma nova ética social, que condena a cidade como
fonte de lucros para poucos em troca da pobreza de muitos. Assume-se,
portanto, a crítica e a denúncia do quadro de desigualdade social,
considerando a dualidade vivida em uma mesma cidade: a cidade dos ricos
e a cidade dos pobres; a cidade legal e a cidade ilegal. Condena a exclusão
da maior parte dos habitantes da cidade determinada pela lógica da
segregação espacial; pela cidade mercadoria; pela mercantilização do solo
urbano e da valorização imobiliária; pela apropriação privada dos
investimentos públicos em moradia, em transportes públicos, em
equipamentos urbanos e em serviços públicos em geral (JÚNIOR; UZZO,
2011. p. 260-261).

O contexto de formulação da Constituinte de 1987 abriu as portas para as


reivindicações dos movimentos populares, a luta pela reforma urbana se dá por uma
participação nacional em torno da nova Constituição que incorpora o acúmulo
teórico da questão urbana e o avanço político dos movimentos populares (GRAZIA,
2003).

Vários eventos contribuíram, posteriormente, para que o ideário da reforma


urbana se difundisse na sociedade: a elaboração da proposta de emenda
popular à Constituição Federal encabeçada pelo Fórum Nacional da
Reforma Urbana, parcialmente incorporada no capítulo sobre a política
urbana; as reformas das constituições estaduais e das leis orgânicas dos
municípios, bem como a eleição em 1990 de várias alianças municipais de
forças populares comprometidas com o ideário reformista (RIBEIRO, 2003,
p. 14).

A partir disso, o MNRU se propõe a enfrentar o desafio pela concepção do


direito à cidade, visando melhorias na qualidade de vida pelas políticas públicas
voltadas para o conjunto da população. (GRAZIA, 2003)
Júnior e Kuzzo (2011), afirmam que a proposição de emenda popular
defendida pelo MNRU para a Reforma Urbana tinha o apoio de seis entidades
nacionais: Articulação Nacional do Solo Urbano (ANSUR), Federação Nacional dos
Arquitetos (FNA), Federação Nacional dos Engenheiros, Coordenação Nacional das
Associações de Mutuários do BNH, Movimento em Defesa do Favelado, Instituto dos
Arquitetos do Brasil, contando ainda com o apoio de 48 entidades estaduais e locais.

É nesse contexto que a Emenda Popular da reforma urbana, de iniciativa


popular ganhou forma, incorporando a reivindicação da função social da
cidade e da propriedade e da gestão democrática das cidades. A Emenda
Popular, com forte mobilização popular, foi encaminhada pelo Movimento
Nacional de Reforma Urbana e dirigida pelo Fórum Nacional da Reforma
Urbana, que foi parcialmente incorporada no capítulo sobre a política urbana
46

na Constituição de 1988. Após tramitar por longos 11 anos, é que foi


aprovada pelo Congresso Nacional e sancionado pelo presidente da
república, regulamentando os Art. 182 e 183 da Constituição Federal de
1988 (LIMA, 2017a, p. 67).

Grazia (2003), explica que a Reforma Urbana enfatiza uma vida urbana com
urbanidade capaz de favorecer as necessidades coletivas na construção das
políticas públicas. Os princípios elaborados pelo MNRU exigem que o Estado retome
sua função social e assegure os direitos urbanos e acesso aos aparelhos sociais de
forma igualitária, ou seja, garanta o direito à cidade para todos.
Após a efetivação da Constituição de 1988 e das reivindicações sociais pela
reforma urbana, temos que,

os municípios se constituíram em unidades da Federação Brasileira com


maior capacidade política e financeira para atuar no campo das políticas
públicas. No início dos anos 1990, com o processo de elaboração das
Constituições Municipais – que tratam da organização política e
administrativa dos municípios e das políticas públicas locais (Leis Orgânicas
dos Municípios) –, as articulações locais de entidades e movimentos ligados
ao FNRU tiveram uma atuação importante nas principais cidades brasileiras.
Foram decisivos para a incorporação da plataforma da reforma urbana e da
cultura do Direito à Cidade no campo das políticas urbanas e habitacionais
locais (JÚNIOR; KUZZO. 2011, p. 263).

No governo Collor 1990-1992, têm-se um agravante para a elaboração e


execução de políticas habitacionais, com a extinção do Ministério do Interior, sendo
o controle assumido pelo Ministério da Ação Social. Os recursos necessários para a
execução de tais políticas pelo SFH eram provenientes das poupanças, que foram
bloqueadas.
A conjuntura político econômica do país na década de 1990 era de desmonte
do Estado, a postura neoliberal do governo brasileiro diminuía cada vez mais os
gastos com a política habitacional e social em geral.

Infere-se que a política habitacional desse governo se reduziu ao


financiamento habitacional a fundo perdido, aprofundando a crise
econômica e contribuindo para a alta inflação. De igual forma, não se teve
uma política habitacional centralizada e com objetivos previamente definidos
que buscassem atender as demandas da classe trabalhadora. Serviu,
eminentemente, como uma proposta clientelista que buscava o apoio da
população beneficiária para a manutenção do atual governo. Em termos
quanti-qualitativos pouco foi realizado (BARBOSA, 2016, p. 46-47).

Somado a isto, vimos que:


47

Nessa gestão os programas habitacionais passaram a ser controlados pela


Secretaria Nacional de Habitação, com quatro programas operados pela
CAIXA com o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) como fonte
de recursos, tais como: Programa de Ação Imediata para a Habitação
(PAIH); Programas Cooperativos; Programa Empresário Popular (PEP); e o
Programa de Habitação Popular que contava com: PROHAP Público;
PROHAP Privado; PRODURB e PROAREAS (LIMA, 2017a, p. 67).

O governo de Itamar Franco (1992-1994) ainda apresentou algumas


mudanças nesse cenário. A política de habitação passou a ser administrada pelo
Ministério do Bem-Estar Social e aplicando mudanças no SFH e CAIXA, onde se
gerou uma maior participação popular através de conselhos, o que ocasionou mais
transparência na gestão do programa (LIMA, 2017a; SOUZA; OLIVEIRA, 2018).
O governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) ainda abarcava o
caráter neoliberal dos governos pós ditadura, o enfrentamento da crise econômica
do Brasil fez com que se reforçasse ainda mais esta política.
O foco no enfrentamento da crise fez com que se deixasse de lado o social
para trazer de volta o crescimento econômico do país, sendo efetuada a “reforma do
aparelho do Estado”, que embora tenha sido iniciada por Collor, não achou
“legitimidade política para conduzir esse processo” (SOUZA; OLIVEIRA, 2018).
A Constituição Federal e o seu capítulo sobre política urbana não
demonstravam força suficiente para gerar mudanças reais nas cidades, não estando
definido os dispositivos de regulamentação e instrumentos para aplicação jurídica,
sendo necessário uma Lei complementar. A Lei Federal nº 10.257, de nome Estatuto
da Cidade, foi aprovada ainda em 2001 no governo de FHC (LIMA, 2017a).
A partir deste Estatuto, estabelecem-se as:

Diretrizes gerais da política urbana e elenca uma série de instrumentos que


deverão ser cumpridos pelo poder público, atribuindo-lhe um conceito que
dialoga com os desafios postos pela cidade sustentável, indicando o direito
de todos os citadinos ao usufruto da cidade. No ponto de vista da política
fundiária importantes instrumentos foram inclusos no Estatuto, visando à
garantia da função social da propriedade e à moradia, a começar pelo
reconhecimento dos direitos dos ocupantes de áreas informais ou
irregulares e mecanismos legais para melhorar o acesso à terra urbanizada
pela população de baixa renda (NALIN, 2013, p. 46).

O Estatuto das Cidades, atuando com base jurídica, tinha a proposta da


definição dos direitos urbanos, onde o Estado tinha ligação direta na garantia da
48

reprodução social e na defesa de uma nova concepção de democracia (LIMA,


2017a).

Com a aprovação do Estatuto da Cidade, o estágio da luta pela reforma


urbana passou a ter dois grandes desafios. O primeiro foi capacitar os
atores sociais sobre o significado e as perspectivas abertas pelo Estatuto da
Cidade para a promoção de políticas urbanas com base na plataforma da
reforma urbana nas cidades brasileiras. Neste caso, atores sociais devem
ser compreendidos de forma ampla: lideranças populares, profissionais,
acadêmicos, parlamentares, gestores públicos (JÚNIOR; UZZO, 2011, p.
266).

Desta forma, provendo a regulamentação das ocupações em áreas centrais


das cidades e contendo o avanço do processo especulativo imobiliário do Brasil,
trazendo uma nova concepção de cidade, além da forma como se é utilizada. Com
isto, “a população passa a ter ‘voz’ no contexto das decisões de interesse público,
porquanto o Estado se omitia da obrigação de legislar sobre a Política Urbana [...]”
(LIMA, 2017a, p. 69).

O tema central do EC é a função social da propriedade. Em síntese, a lei


pretende definir como regular a propriedade urbana de modo que os
negócios que a envolvem não constituam obstáculo ao direito à moradia
para a maior parte da população, visando, com isso, combater a
segregação, a exclusão territorial, a cidade desumana, desigual e
ambientalmente predatória. O EC trata, portanto de uma utopia universal: o
controle da propriedade fundiária urbana e a gestão democrática das
cidades para que todos tenham o direito à moradia e à cidade (MARICATO,
2010, p. 7).

O processo democrático de participação nas políticas públicas é um ponto


chave nesta articulação por direitos, a utilização do solo de forma participativa visava
a regularização do solo e uma gestão participativa da população.

Mas não reside apenas na regulamentação deste conjunto de instrumentos


a importância do Estatuto da Cidade. Na verdade, pela primeira vez em
nossa história, temos uma regulação federal para a política urbana que se
pratica no país, definindo uma concepção de intervenção no território que se
afasta da ficção tecnocrática dos velhos Planos Diretores de
Desenvolvimento Integrado, que tudo prometiam (e nenhum instrumento
possuíam para induzir a implementação do modelo idealizado proposto!).
De acordo com as diretrizes expressas no Estatuto, os Planos Diretores
devem contar necessariamente com a participação da população e de
associações representativas dos vários segmentos econômicos e sociais,
não apenas durante o processo de elaboração e votação, mas, sobretudo,
na implementação e gestão das decisões do Plano (JÚNIOR; ROLNIK,
2001, p. 7).
49

Segundo Grazia (2003), a retomada do planejamento urbano através do


Plano Diretor, fortalece este instrumento que estava em desuso. O foco deste
planejamento é o enfrentamento das desigualdades sociais pela distribuição dos
recursos sociais da cidade. Assim, intervindo em questões estruturais que busquem
a ampliação do acesso aos bens, distribuição dos recursos, fragmentação das
políticas e o desenvolvimento da integração de questões do cotidiano tanto urbano
como rural.

O planejamento que em décadas passadas representava a racionalidade


tecnocrata ou o desejo de alcançar a beleza do padrão europeu de cidades
é recuperado no Estatuto como instrumento importante para aproximar a
população dos governantes no intuito de realizar uma gestão que modifique
o nível e qualidade de vida urbana para o conjunto da população (GRAZIA,
2003, p. 65).

Desta forma, o Plano Diretor se torna obrigatório nas cidades que abrigam
mais de 20 mil habitantes, consistindo em regras que articulam a ação dos agentes
públicos e privados sobre a utilização da cidade. Com a definição destas regras, a
sua materialização se dá através da chamada Lei Orgânica do Município, que
estabelece os procedimentos, mecanismos e prazos para a elaboração e aprovação
do Plano Diretor, onde deve obedecer a coletividade das prerrogativas estabelecidas
pelas leis federais e municipais, como diz a Constituição Federal e o Estatuto da
Cidade (NALIN, 2013).

Assim, mais do que um documento técnico, normalmente hermético ou


genérico, distante dos conflitos reais que caracterizam a cidade, o Plano
passa a ser um espaço de debate dos cidadãos e de definição de opções,
conscientes e negociadas, por uma estratégia de intervenção no território.
Não se trata aqui da tradicional fase de consultas que os planos diretores
costumam fazer a seus interlocutores preferenciais, clientes dos planos e
leis de zoneamento que dominam sua linguagem e simbolização. O desafio
lançado pelo Estatuto incorpora o que existe de mais vivo e vibrante no
desenvolvimento de nossa democracia a participação direta (e universal)
dos cidadãos nos processos decisórios. Audiências públicas, plebiscitos,
referendos, além da obrigatoriedade de implementação de orçamentos
participativos são assim mencionados como instrumentos que os municípios
devem utilizar para ouvir, diretamente, os cidadãos em momentos de
tomada de decisão sobre sua intervenção sobre o território (JÚNIOR;
ROLNIK, 2001, p. 7).

O Estatuto da Cidade representava uma ferramenta essencial para o


enfrentamento do déficit habitacional, e poderia tirar cerca de 40% da população da
ilegalidade que residiam em favelas e loteamentos irregulares. Ao assegurar os
50

direitos urbanos, garante direito às cidades sustentáveis, a moradia, a condições de


saúde e infraestrutura, além de impactar a degradação ambiental (GRAZIA, 2003).
As propostas dos governos pós ditadura para a política urbana não obtiveram
êxito em suas implementações, sem expressão, estas políticas não conseguiram o
suporte necessário para se manter e consequentemente foram canceladas
rapidamente.
Embora a Constituição Federal de 1988 tenha sido um marco da
redemocratização e do desenvolvimento de leis para as políticas urbanas e o direito
à moradia, só com o Estatuto da Cidade é que se tem o reforço jurídico necessário
para a sua execução.
O governo de FHC, embora tenha desempenhado estes avanços políticos,
aplicou uma política neoliberal que não dava suporte para a implementação de tais
políticas. Este patamar político econômico só sofre mudanças com o fim do seu
mandato e chegada do Partido dos Trabalhadores ao poder, que será analisado no
item seguinte.

2.3 - Os governos Lula-Dilma e a política urbana

A chegada do PT ao poder pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-


2010), seguido por Dilma Rousseff (2011-2016), trazia consigo a esperança da
abertura do governo às políticas públicas que sofreram duras perdas nos governos
anteriores.
Pontuando o debate, Rodrigues (2013), afirma que a política urbana no
governo Lula tem igualdades e diferenças. As igualdades sendo a legislação de uso
do solo, políticas de habitação, saneamento, acessibilidade e transporte coletivo que
não estabelecem vínculos com o Plano Nacional de Desenvolvimento Urbano
(PNDU), e as diferenças se identificam através da abertura à participação social e
subsídios para as classes de menor renda na formação de políticas urbanas.
Esta participação ocorreu através do Ministério das Cidades, criado em 2003,
que se torna responsável pela política de desenvolvimento urbano, elaboração e
implementação das políticas setoriais de habitação, saneamento ambiental,
transporte, mobilidade urbana e programas urbanos (CFESS, 2016).
51

Barbosa (2016), explica que o Ministério das Cidades trouxe o aumento dos
canais governamentais para a participação democrática, como a Conferência
Nacional das Cidades e o Conselho Nacional das Cidades, com destaque para a
presença dos movimentos sociais urbanos em todos os níveis do governo.

Em outubro de 2003 foi realizada a 1ª conferência Nacional das Cidades,


com 2.500 delegados eleitos num processo de mobilização social em mais
de 3 mil municípios, que consolidou as bases da atuação do governo e
propôs a criação do Conselho Nacional de Habitação, instalado em 2004.
(BONDUKI, 2009, p. 10).

A organização destes aparelhos institucionais para a execução da política


urbana permitiu ao governo, em seus diversos níveis, avançar na participação
democrática, que trazia as preocupações e propostas da população para a
resolução dos problemas.

A conferência das cidades emerge de um contexto de participação popular,


e se torna uma ferramenta para a gestão municipal democrática. Com os
mais diversos enfrentamentos municipais, até decorrentes de um sistema
político, limitou-se o debate sobre os problemas em âmbito local, em que o
caminho do desenvolvimento e as políticas urbanas nos governos foram
diferentes em momentos de investimentos e de desenvolvimento não
participativo. Assim, as conferências municipais surgem das demandas em
movimentos sociais de reforma urbana, e com a finalidade de se tornarem
uma ferramenta de interlocução entre a sociedade, os movimentos e os
governos locais, estadual e federal, frente às políticas públicas. (HERMANY;
AMARGO apud LIMA, 2017a, p. 75)

Ao atender as pautas dos movimentos sociais, o governo Lula, segundo Lima


(2017b), adapta estas demandas pela Reforma Urbana de modo que se encaixem
aos desejos da Indústria da Construção, sendo criada “uma proposta de política
voltada às cidades, tomando prioridade a questão da habitação” (p. 93).
Este diálogo entre os interesses do social e do capital imobiliário, promovido
por Lula, foi a base da construção da sua política habitacional, onde a criação do
Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS) e o Sistema de
Habitação de Mercado foram medidas utilizadas para o aumento na produção de
habitações em ambos os interesses (ROLNIK, 2015).
Ao desenvolver a política urbana, o governo Lula cria em 2004 o Programa
Especial de Habitação Popular (PEHP), sob a Lei 10.840, visando o acesso a
moradia para a população com até 3 salários mínimos. No mesmo ano foi aprovada
a Política Nacional de Habitação (PNH), pelo Conselho Nacional de Cidades.
52

A nova PNH, de modo coerente com a constituição Federal e com o


Estatuto da Cidade, reconhece a função social da propriedade e a habitação
como questão do Estado e direito básico do cidadão, determinando-a como
atribuição corrente dos três níveis de governo e preconizando a inclusão
social e a gestão participativa e democrática. (BONDUKI; ROSSETTO apud
LIMA; ZANIRATO, 2014, p. 8)

Junto à PNH, desenvolve-se também o Plano Nacional de Habitação


(PlanHab), que direciona o planejamento das políticas públicas a curto, médio e
longo prazo, onde se propunha “grande diversidade de soluções habitacionais em
acordo com os distintos tipos de municípios, diferenciando regiões metropolitanas,
grandes, médias e pequenas cidades” (LIMA; ZANIRATO, 2014, p. 8).
A PNH visa “promover as condições de acesso à moradia digna a todos os
segmentos da população, especialmente o de baixa renda, contribuindo, assim para
a inclusão social” (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2004, p. 29).

Nessa perspectiva, a Política Nacional de Habitação pressupõe a


concepção de um conjunto de instrumentos que propiciarão a sua
implementação. Quais sejam: o Sistema Nacional de Habitação (SNH), o
Desenvolvimento Institucional, o Sistema de Informação, Avaliação e
Monitoramento da Habitação, e o Plano Nacional de Habitação.
(MINISTÉRIO DAS CIDADES apud BARBOSA, 2016, p. 58)

A democratização da política urbana no governo Lula, com sua participação e


elaboração, em sua 2ª Conferência (2005), trouxe avanços na integração de
políticas de habitação, saneamento, mobilidade e transportes coletivos que não
convergiam entre si, onde definiu o marco regulatório do saneamento e aprovou a
regulamentação do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS) e do
seu Conselho Gestor (RODRIGUES, 2013).
Em sua 3ª Conferência (2007), segundo Rodrigues (2013), também foram
aprovadas 22 diretrizes, dentre elas a proposta de criação de um Sistema Nacional
de Desenvolvimento Urbano (SNDU), que inclui Conselho das Cidades em nível
Estadual e Municipal para agregar a política urbana nos diversos níveis da
federação, definiu formas de implementação do saneamento básico ambiental,
aprovou a criação do Programa de Habitação de Interesse Social no âmbito do
Conselho Gestor - FNHIS e propôs formas para a atuação dos governos na
mediação e prevenção de conflitos fundiários.
53

Na 4ª Conferência (2009/2010), avaliou-se a atuação do ConCidades e a


implementação das políticas propostas anteriormente, constatando-se que diversas
propostas aprovadas não foram levadas à prática (RODRIGUES, 2013).

Os avanços importantes estão relacionados com a ampliação da


participação social por meio das conferências das cidades e dos conselhos
da cidade em níveis nacional, estaduais e municipais. Porém há entraves
que ainda precisam ser contornados ou removidos como o fato do Conselho
Nacional das Cidades não ter caráter deliberativo. Além disso, é
fundamental para haver avanços que os movimentos populares urbanos não
fiquem atrelados aos conselhos e que sua pauta de reivindicação vá além
da que é definida pelos governos. Outra questão fundamental diz respeito
ao significado de participação, pois apesar de ser um tema debatido está-se
muito longe de se esclarecer o que ele significa enquanto formulador de
políticas. (RODRIGUES, 2013, p. 76)

O crescimento das receitas do governo em 2007 impulsionou a formulação de


um programa de investimentos que, de acordo com Bonduki e Rossetto (2018), o
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que incluiu uma vertente social, o
Programa de Urbanização de Assentamentos Precários, que já era uma antiga
reivindicação dos movimentos sociais e do MNRU, onde se alcançou uma dimensão
inédita com impacto em áreas excluídas das regiões metropolitanas.
O desenvolvimento do PlanHab, inserido nesta conjuntura econômica
favorável, tinha a oportunidade de implementação de uma política urbana avançada
com uma política massiva de habitação. O seu objetivo era de proporcionar em 15
anos as necessidades habitacionais do país, propondo ações estratégicas em quatro
eixos: o financeiro, o institucional, o urbano-ambiental e a cadeia de construção civil
(BONDUKI; ROSSETTO, 2018).

Em 2008 as condições pareciam muito favoráveis para o enfrentamento da


questão habitacional. Os novos marcos institucionais e legais relacionados à
política urbana e habitacional haviam sido aprovados; com o apoio do
MCidades, os municípios estavam ampliando suas capacidades
institucionais, inclusive com a elaboração dos planos diretores e de planos
locais de habitação; os recursos disponíveis para investimento em
habitação, que já haviam aumentado significativamente desde 2003, tinham
espaço para um crescimento ainda maior, tanto de recursos fiscais como do
FGTS e do SBPE, lastreados no bom desempenho da economia; o PlanHab
tinha estabelecido uma estratégia de equacionamento do problema e o
governo, com forte apoio popular, parecia estar comprometido com o
enfrentamento da questão. (BONDUKI; ROSSETTO, 2018, p. 171)

Entretanto, a decomposição da equipe ministerial impediu a progressão do


plano, entre outros problemas. O enfraquecimento político e as mudanças no
54

Ministério com uma nova equipe que não desempenhava compromisso com uma
nova política habitacional se apoderaram dos setores da pasta e de suas estruturas
administrativas com o argumento de distribuição facilitada da União para os Estados
e municípios.

Assim, o PlanHab, que foi elaborado no âmbito do governo pela SNH,


acabou sendo atropelado pelo lançamento em 2009, sem grande debate
público, do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), sem que sua
estratégia tenha sido considerada. O programa foi proposto pelo Ministério
da Fazenda e Casa Civil, sob forte pressão dos setores da construção civil e
promoção imobiliária, assustados com a crise imobiliária internacional.
(BONDUKI; ROSSETTO, p. 172)

Com isto, “cabe reconhecer que o Governo Lula retomou investimentos em


habitação e saneamento após, aproximadamente, 25 anos de descaminhos da
administração federal em relação a essas áreas” (MARICATO, 2011, p. 28)
A execução de medidas anticrise no Brasil através dos programas
“desenvolvimentistas” do governo visando à ampliação do investimento em
infraestrutura e consumo não estava isento do alinhamento do capital de exploração
do trabalho.
A criação de novos postos de trabalho dentro desta conjuntura permitiu a
precarização do trabalho na categoria de profissionais de construção, marcado pela
alta rotatividade e exploração, assim como a sua participação no circuito produção-
circulação-consumo-distribuição, para o consumo e crédito, aumentando o
endividamento das famílias. (LIMA, 2017b)
Vale ainda “ressaltar que a questão urbana ou metropolitana não está entre
os avanços do Governo Lula, ao contrário do que pode fazer crer a euforia
decorrente da ampliação do mercado imobiliário, das obras e dos empregos.”
(MARICATO, 2011, p. 28-29)
Ao assumir o governo, Dilma mantém as políticas habitacionais promovidas
por Lula. O bom desempenho macroeconômico mantido desde a elaboração do
Plano Real por FHC e mantido por Lula, foi o combustível necessário para aquecer a
economia brasileira na crise mundial de 2008, enfrentada por Lula com o PAC.

O governo Dilma Rousseff deu sequência à fase anterior e se propôs a


manter um regime de política voltado a acelerar o crescimento. Os discursos
iniciais da presidente e de seus ministros deixaram evidentes os indícios de
existência de uma meta de crescimento e de que as ações teriam como foco
este objetivo (LOPREATO, 2015, p. 23).
55

Embora sob críticas e pressão dos movimentos sociais, o governo Dilma deu
continuidade aos programas iniciados por Lula, mas ainda aliando os interesses da
classe trabalhadora com frações da burguesia. (LIMA, 2017b)
A segunda fase do PAC fortalece a indústria de construção nacional, sendo
uma forte ferramenta de combate à crise, assim como de governabilidade, trazia
consigo a segunda fase do PMCMV, voltado em programas do direito à moradia e
nos aparatos de incentivo à produção e aquisição de novos mecanismos de
produção.

O PMCMV 2 se inseria no PAC, que iniciava sua segunda fase apoiando-se


no planejamento estratégico, prevendo mais recursos e mais parcerias com
estados, municípios e empresas privadas, para execução de obras
estruturantes (e habitacionais), expandindo o volume de crédito. Com o
lançamento da segunda fase do PAC (que foi de junho de 2011 a dezembro
de 2014), sob o mote “A gente faz um Brasil de oportunidades”, o governo
federal dava continuidade “ao maior programa de infraestrutura do Brasil
desde a redemocratização”, assumindo o “compromisso de implantar um
novo modelo de desenvolvimento para o País, combinando
desenvolvimento com distribuição de renda e redução das desigualdades
regionais” (BRASIL, 11º Balanço do PAC 2011-2014, 2014, p. 02). Ou seja,
o primeiro mandato de Dilma Rousseff (2011-2014) assumia o projeto
neodesenvolvimentista na orientação da prática governamental (LIMA,
2017b, p. 114-115).(grifos do autor)

A crise urbana ainda trazia reivindicações da classe trabalhadora, que


ampliaram suas lutas e suas articulações para realização de ocupações de forma a
denunciar as infrações cometidas nas obras para a Copa do Mundo FIFA (inseridas
no PAC 2).
O crescimento do PMCMV foi enorme, em cinco anos (2009-2014), contratou-
se 4,9 milhões de imóveis, equivalente a 80% das unidades financiadas pelo BNH
em mais de 20 anos, embora tenham sido entregues apenas 2,6 milhões de casas
(LIMA, 2017b), cerca de 50% do total.
A escala econômica do PMCMV se tornou mais forte com o seu crescimento,
a política habitacional se tornou um produto da indústria da construção que
continuava a se beneficiar deste programa.
Em meio a pressões de todos os lados e em um momento de efervescência
política, o governo Dilma lança a terceira fase do PMCMV em 2016, que tinha como
proposta a ampliação da faixa de renda e a diminuição do subsídio, para controlar a
crise política que o governo enfrentava. (LIMA, 2017b)
56

O modo de governo petista continuou basicamente o mesmo em seus


mandatos, no qual os avanços sociais tinham que dar espaço às demandas do
capital, o governo Dilma ampliou o PMCMV e buscou atender as reivindicações dos
movimentos sociais por moradia, ao mesmo tempo em que aumentou os gastos
públicos e focou no incentivo à indústria imobiliária, o que desagradou opositores.
Mesmo com tanto investimento na área de habitação de interesse social, os
governos petistas não obtiveram êxito no enfrentamento ao déficit habitacional.
Onde, em 2009 no lançamento do PMCMV se encontrava em 5,99 milhões e em
2014 se encontrava em 6,2 milhões de unidades habitacionais (LIMA, 2017b).
O Programa Minha Casa Minha Vida é, ainda hoje, o maior programa
habitacional realizado no País, e mesmo com todo o seu crescimento e importância
social e econômica, sofreu duras perdas nos governos subsequentes. A
caracterização, discussão e análise do PMCMV, assim como a precarização que
estes governos causaram neste programa, serão feitas no capítulo a seguir.
57

CAPÍTULO 3 - A EXPANSÃO DA FINANCEIRIZAÇÃO DA MORADIA NO BRASIL

3.1 - Antecedentes: a política habitacional nos governos Lula-Dilma e o PMCMV

Ao se discutir a política habitacional e Urbana pós-constituição de 1988,


destacando o marco regulatório jurídico, político e a política social desse período, no
governo petista, destaca-se indispensavelmente, o Programa Minha Casa Minha
Vida (PMCMV), razões já analisadas nos capítulos anteriores, em relação aos
investimentos realizados, subsídios, e considerando ser esse Programa, carro chefe
dos mandatos assumidos, porém, sua concepção, além disto, extrapola a realidade
nacional.
A crise mundial de 2008 no sistema financeiro imobiliário dos Estados Unidos
abalou as estruturas econômicas mundiais. A recessão e o desemprego gerados
ecoaram pelo globo, demandando contrapartidas dos outros países afetados.
No caso do Brasil, no governo Lula, criou-se o PAC em 2007 para aquecer a
economia no país e impulsionar o crescimento e o desenvolvimento de
infraestrutura.
O PAC, em seu oportuno momento, tornou-se uma ótima resposta à crise,
originando o PMCMV como uma medida anticrise. Embora sua aparência seja de
política habitacional para o desenvolvimento sócio urbano, têm-se em seu objetivo a
geração de emprego e rotatividade da mão de obra, garantindo a reprodução do
capital em um contexto de crise internacional (LIMA, 2017b).

O Minha Casa Minha Vida é, na origem, um programa econômico. Foi


concebido pelos ministérios de “primeira linha” – Casa Civil e Fazenda – em
diálogo com o setor imobiliário e da construção civil, e lançado como Medida
Provisória (MP 459) em março de 2009, como uma forma declarada de
enfrentamento da chamada crise dos subprimes americanos que
recentemente tinha provocado a quebra de bancos e impactado a economia
financeirizada mundial. (AMORE, 2015, p. 15)

A pretensão era clara, investir no setor da construção civil para a construção


de habitações em massa, como uma fábrica, gerar empregos neste setor e
indiretamente aumentar o consumo dos outros setores da economia associados à
58

construção civil, desde a indústria de extração de material de construção até a de


movelaria e de eletrodomésticos.
Tinha-se a promessa de construção de 1 milhão de casas inicialmente,
através de um investimento de 34 bilhões de reais direcionados do orçamento da
União e do FGTS, além dos recursos para financiamento da infraestrutura e do
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) (AMORE, 2015).
O direcionamento do PMCMV seria o de redução do déficit habitacional, de
acordo com Amore (2015), de 7,2 milhões de moradias na época, sendo 90% destas
inseridas numa faixa de renda inferior a três salários mínimos.

Havia ainda a intenção de distribuição regional, concentrando a produção


nos estados do Sudeste e do Nordeste, com prioridade para municípios com
mais de 100 mil habitantes e excluindo aqueles com menos de 50 mil,
acompanhando a distribuição do déficit. O Programa fazia uma leitura
bastante simplificada do “problema habitacional”, que, por exemplo, o
PlanHab pretendia atacar por meio de uma grande diversidade de
programas e produtos habitacionais, adequados para as onze tipologias de
municípios que o Plano havia organizado em função das características
demográficas e das dinâmicas econômicas. (AMORE, 2015, p. 17)

Em 2009, o PMCMV é oficialmente lançado sob a Medida Provisória nº


456/2009 e posteriormente convertida na Lei 11.977, de 7 de julho de 2009, tendo
por finalidade “criar mecanismos de incentivo à produção e à aquisição de novas
unidades habitacionais pelas famílias com renda mensal de até 10 (dez) salários
mínimos, que residam em qualquer dos Municípios brasileiros”.
O PMCMV buscava resolver, de acordo com D’Amico (2011, p. 47)

a) Os problemas de infraestrutura e saneamento básico das residências


existentes, ao combater o déficit por reposição de estoque, via concessão
de subsídios às famílias.
b) Regularizar a questão fundiária das moradias em terrenos invadidos ou
em áreas públicas, pela diminuição do valor de custas/emolumentos
cartorários ou da exigência de legalização de matrículas nos cartórios de
registro de imóveis, com a preferência pelo registro do imóvel no nome da
mulher.
c) Aumentar a oferta de unidades habitacionais, facilitando o acesso aos
recursos do BNDES e dos fundos instituídos pelo PMCMV por parte das
construtoras, visando diminuir o déficit por incremento de estoque.
d) Eliminar a “elitização” dos financiamentos imobiliários ao conceder
subsídios às classes sociais mais pobres, sobretudo aquelas com renda
mensal de até três salários mínimos e que em geral não têm acesso aos
recursos do FGTS.
e) Resolver os aspectos técnicos da construção de novas moradias, ao
determinar padrões de construção, impor limites para a construção de
unidades habitacionais por empreendimento e exigir uma infraestrutura
urbana mínima para aprovação dos projetos e liberação dos recursos.
59

No PMCMV estão inseridos dois subprogramas: o Programa Nacional de


Habitação Urbana (PNHU) e o Programa Nacional de Habitação Rural (PNHR). O
PNHU tem foco nas famílias com renda mensal de até dez salários mínimos, sendo
aquelas com até seis beneficiárias aos subsídios do PMCMV, as famílias que
excedem os seis salários mínimos recebem condições especiais de financiamento
imobiliário com os recursos do FGTS. O PNHR concede subsídios aos agricultores
para a construção em área rural, por meio da compra de material de construção
(D’AMICO, 2011).
Sobre o funcionamento do PMCMV, Moreira et al (2017, p. 597), explicam
que:

A formulação, nesse sentido, traz o conjunto de estratégias, objetivos e


metas para que no estágio da implementação, o Ministério das Cidades
(gestor do Programa), a Caixa Econômica Federal (gestora dos fundos que
alimentam o Programa), governos locais, empresas construtoras e os
beneficiários possam atuar, conjuntamente, na execução das atividades
necessárias para provimento habitacional.

Um dos aspectos do PMCMV, segundo D’Amico (2011), é a identificação do


déficit habitacional a ser atingido pelos dois programas, o PNHU opera tanto na
aquisição de moradia como em sua requalificação, enquanto o PNHR trabalha
somente na compra de material para reforma dos imóveis já existentes. Desta forma,
há um impacto diferente do déficit das duas áreas, a reposição do estoque nas áreas
rural e urbana e o incremento do estoque na área urbana.
O aporte destinado pelo governo para o funcionamento dos dois
subprogramas foi de R$ 2,5 bilhões para o PNHU e R$ 500 milhões para o PNHR,
destacando-se ainda outros recursos disponibilizados pela União como o Fundo
Garantidor da Habitação Popular (FGHab), de origem privada e patrimônio próprio
que pode ser adquirido pelo SFH, onde, por lei, a União poderá utilizar este fundo
para o pagamento de inadimplentes que porventura venham a perder seu emprego
ou reduzam sua capacidade de pagamento, o que reduz os riscos para as
instituições financeiras (D’AMICO, 2011).
Da mesma forma, D’Amico (2011), explica que também foi destinado ao
Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) R$14 bilhões e ao Fundo de
Desenvolvimento Social (FDS) R$500 milhões, onde o FAR tem o objetivo de
60

financiar os empréstimos para famílias com renda de até três salários, enquanto o
FDS tem foco nas famílias com renda de até R$1.395,00, desde que estejam
organizadas sob as Entidades Organizadoras (EO). Autorizou-se ainda a
transferência de até R$1 bilhão para os municípios com até 50 mil habitantes,
totalizando cerca de R$25 bilhões nos programas, fundos e agentes do PMCMV,
que também engloba aspectos institucionais sobre o papel dos municípios diante à
regularização fundiária e a disponibilização de terrenos para os empreendimentos
habitacionais, que devem estar munidos de condições de infraestrutura urbana,
saneamento e sustentabilidade ambiental.
A política anticrise aplicada pelo governo através do PMCMV, produz
resultados através da evolução das operações de créditos dos bancos públicos e
privados, como demonstrado no Gráfico 1.

Gráfico 1 - Operações de créditos habitacionais

Fonte: D’Amico2 (2011)

Em sua primeira fase (abril de 2009 a junho de 2011), tinha-se a meta de


construção de 1 milhão de unidades habitacionais através de 3 faixas de divisão de
beneficiários de acordo com sua renda. A faixa 1 contemplava famílias com renda
mensal de até R$ 1.395,00, a faixa 2 atendia a renda familiar de até R$ 2.790,00 e a
faixa 3 atendia aqueles com renda familiar de até R$ 4.650,00 (AMORE, 2015).

2
D’AMICO, Fabiano. O Programa Minha Casa, Minha Vida e a Caixa Econômica Federal. IN:
COSTA, J. C. et al. O desenvolvimento econômico brasileiro e a Caixa: trabalhos premiados.
Rio de Janeiro: Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento: Caixa
Econômica Federal, 2011. Disponível em:
http://www.centrocelsofurtado.org.br/arquivos/image/201111291655290.LivroCAIXA_T_0.pdf#page=3
3. Acesso em 04 de abr. 2019.
61

De acordo com Amore (2015), a segunda fase do programa (junho de 2011 a


dezembro de 2014) foi lançada com a meta de contratação de mais 2 milhões de
unidades habitacionais. Havendo mudanças e revisões nos limites das faixas de
renda e a incorporação de especificações de exigências de acessibilidade e padrões
de acabamento. A faixa 1 passou a atender famílias com renda de até R$ 1.600,00,
a faixa 2 atende as rendas de até R$ 3.100,00 e a faixa 3 atende rendas de até R$
5.000,00.
A terceira fase do programa (março de 2016 a previsto para terminar em
2018) contava com a inserção de uma nova faixa, a faixa 1,5. Nesta fase, foram
revisadas novamente as faixas de renda, onde a faixa 1 passou a contemplar
àqueles que recebem até R$ 1,800.00 de renda mensal, a faixa 1,5 recém
adicionada contempla as famílias que recebem até R$ 2,600.00 de renda mensal, a
faixa 3 atende as famílias com renda até R$ 4,000.00 e a faixa 4 atende famílias
com renda de até R$ 9,000.00, demonstrando o desenvolvimento do programa
habitacional, têm-se o desenvolvimento das faixas de financiamentos que ao longo
dos anos abarcou um contingente crescente da população brasileira.
Acompanhando o desenvolvimento do programa com os proponentes e
beneficiários, para dar acesso às estas moradias, como requisito para a
operacionalização, têm-se o Trabalho Técnico Social (TTS), cujo processo se dá
trabalhando nas camadas mais baixas do programa a questão organizativa,
comunitária, ambiental, inclusão produtiva, dentre outras, tendo em vista o contexto
e a renda ao quais os indivíduos beneficiários desta faixa estão inseridos.
Tendo recursos destinados exclusivamente a isto, o TTS se desenvolve na
perspectiva de deslocamento dos usuários para as unidades habitacionais de
maneira que se tome ciência das questões de inserção e “adequação” legais e de
direito na área urbana, já que muitos usuários são oriundos de assentamentos
irregulares ou ocupações.

O Trabalho Técnico Social (TTS) é um dos componentes do PMCMV e


conta com financiamento específico. Os estados, municípios e Distrito
Federal que aderirem ao PMCMV serão responsáveis pela execução do
TTS dos empreendimentos implantados em cada local, a partir da normativa
aprovada em 2011 (CARDOSO et al. apud LIMA, 2017a, p. 88)

No novo marco regulatório, através da Portaria nº 21/2014, o TTS é integrante


da PNH, com a obrigatoriedade definida pelo Ministério das Cidades com base no
62

Programa Habitar Brasil/BID (HBB/BID). Contudo, o TTS foi constituído inicialmente


nos governos militares, para o desenvolvimento com trabalhadores sindicalizados,
onde ocorria seleção de demanda, organização comunitária e acompanhamentos de
custos de moradia popular (LIMA, 2017a). Atualmente amplia suas funções e
objetivos na perspectiva de garantia de direitos sociais.

O Trabalho Social [...] compreende um conjunto de estratégias, processos e


ações, realizado a partir de estudos diagnósticos integrados e participativos
do território, compreendendo as dimensões: social, econômica, produtiva,
ambiental e político institucional do território e da população beneficiária,
além das características da intervenção, visando promover o exercício da
participação e a inserção social dessas famílias, em articulação com as
demais políticas públicas, contribuindo para a melhoria da sua qualidade de
vida e para a sustentabilidade dos bens, equipamentos e serviços
implantados. (BRASIL, 2014, p. 5)

O TTS é desenvolvido pelo poder público local e estadual através de


parcerias entre entes públicos em programas ou ações de moradia e
desenvolvimento urbano.

O trabalho social deverá ser executado junto às famílias beneficiárias ou


comunidades sujeitas à intervenção do poder público (PMCMV,
Regularização Fundiária ou Reassentamento, ou outro) em sintonia com as
obras físicas e dando continuidade, por determinado período, no término
das obras (normalmente de nove a 12 meses pós-obras) (NALIN apud
LIMA, 2017a, p. 89).

O Trabalho Técnico Social tem por objetivo:

2.1 Promover a participação dos beneficiários nos processos de decisão,


implantação, manutenção e acompanhamento dos bens e serviços previstos
na intervenção, a fim de adequá-los às necessidades e à realidade local e
estimular a plena apropriação pelas famílias beneficiárias.
2.2 Fomentar processos de liderança, a organização e a mobilização
comunitária, contribuindo para a gestão democrática e participativa dos
processos implantados.
2.3 Estimular o desenvolvimento da cidadania e dos laços sociais e
comunitários.
2.4 Apoiar a implantação da gestão condominial quando as habitações
forem produzidas sob essa modalidade.
2.5 Articular as políticas de habitação e saneamento básico com as políticas
públicas de educação, saúde, desenvolvimento urbano, assistência social,
trabalho, meio ambiente, recursos hídricos, educação ambiental, segurança
alimentar, segurança pública, entre outras, promovendo, por meio da
intersetorialidade, a efetivação dos direitos e o desenvolvimento local.
2.6 Fomentar processos de inclusão produtiva coerentes com o potencial
econômico e as características culturais da região, promovendo capacitação
profissional e estímulo à inserção no ensino formal, especialmente de
mulheres chefes de família, em situação de pobreza extrema, visando à
63

redução do analfabetismo, o estímulo a sua autonomia e à geração de


renda.
2.7 Apoiar processos socioeducativos que englobem informações sobre os
bens, equipamentos e serviços implantados, estimulando a utilização
adequada destes, assim como atitudes saudáveis em relação ao meio
ambiente e à vida.
2.8 Fomentar o diálogo entre os beneficiários e o poder público local, com o
intuito de contribuir para o aperfeiçoamento da intervenção e o
direcionamento aos demais programas e políticas públicas, visando ao
atendimento das necessidades e potencialidades dos beneficiários.
2.9 Articular a participação dos beneficiários com movimentos sociais,
redes, associações, conselhos mais amplos do que os das áreas de
intervenção, buscando a sua inserção em iniciativas mais abrangentes de
democratização e de participação.
2.10 Fomentar a constituição de organizações representativas dos
beneficiários e fortalecer as já existentes.
2.11 Contribuir para a sustentabilidade da intervenção, a ser alcançada por
meio da permanência das famílias no novo habitat, da adequada utilização
dos equipamentos implantados, da garantia de acesso aos serviços básicos,
da conservação e manutenção da intervenção física e, quando for o caso,
do retorno dos investimentos.
2.12 Gerir ações sociais associadas à execução das obras e dos
reassentamentos, quando houver. (BRASIL, 2014, p. 5-6).

Com isto, as intervenções do TTS devem promover a inclusão da população


de baixa renda, promovendo ações de acesso à cidade e seus serviços, com caráter
educativo e informativo, de forma a desenvolver a sustentabilidade das unidades
habitacionais, com ações divididas nos eixos Mobilização e Organização
Comunitária, Educação Sanitária e Ambiental e Geração de Trabalho e Renda.
(LIMA, 2017a)
O Trabalho Social norteia-se nas relações construídas com a população,
devendo conhecer as famílias, movimentos sociais e organizações, assim como as
disputas e conflitos já ocorrentes e gerados a partir dele.
O Programa Minha Casa Minha Vida, como um todo, embora seja desde sua
concepção uma medida anticrise, desenvolveu e popularizou a política habitacional
no governo do PT. As conjunturas de retomada neoliberal no segundo semestre de
2016, aliados com a crise política e econômica do governo Dilma, acabaram por
depor a presidente pela articulação golpista em torno do impeachment.
Ao assumir o governo, seu vice Michel Temer (2016-2018), retoma-se o
desenvolvimento e a consolidação de uma política econômica de ajuste fiscal à
financeirização, onde se perdeu orçamento em diversas áreas de interesse social,
inclusive a habitação, precarizando o acesso à habitação através do PMCMV, sendo
essa a problemática formulada e discutida neste estudo.
64

Sofrendo duras perdas, o PMCMV perdeu força e investimento e sua


continuidade foi posta em risco, a ofensiva neoliberal do governo Temer e seus
ataques à política de habitação serão desenvolvidas no item seguinte.

3.2 - A política neoliberal do governo Temer e a progressiva destruição do acesso à


moradia para os pobres

O processo de articulação político econômico, que levou à queda de Dilma e


elevou Temer ao cargo de presidente da república, tinha a pretensão de realizar
reformas no Estado para o atendimento e ampliação de demandas do mercado.
Com o objetivo de recuperar o crescimento econômico através de políticas
neoliberais, o governo Temer desmanchou políticas públicas e causou retrocessos
sociais.
Esta reorientação da política de governo acaba por extinguir ministérios da
política social, como o Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos
Humanos, o que acaba por interferir na formulação, execução, monitoramento e
difusão e o crescimento da política social (JOAQUIM, 2018).
Com a mentalidade de favorecimento do mercado, de orientação neoliberal,
são realizados duros ataques ao enfrentamento à pobreza, Temer, em seu governo,
desenvolve a política de retomada da economia através da geração de empregos
com foco em investimentos privados.
Este desenvolvimento neoliberal do Estado se deu de forma rápida, a criação
da PEC 241/2016 caracterizou de forma clara esta proposta. Ao congelar as
despesas do Governo Federal por 20 anos, o governo Temer defendeu que estariam
regularizando as contas públicas. Ao fazer isto, cortou gastos com saúde, educação
e assistência social (JOAQUIM, 2018).
Com o apoio da elite, continuaram-se os ataques aos direitos sociais com a
Reforma Trabalhista e a diminuição da proteção aos trabalhadores, de forma a
fortalecer a exploração. As alterações aprovadas pela Lei 13.467/2017 neste
governo ampliaram a precarização do trabalho através de sua flexibilização e
terceirização, assim como a jornada de trabalho, o salário e regulamentação de
férias.
65

O resultado destas medidas não foi o esperado pelo governo, somando uma
crescente nos indicadores de pobreza do Brasil, com um acréscimo de mais 3
milhões de pessoas nesta estatística, resultado aquém do apresentado nos
governos do PT que conseguiu uma redução significativa nesta realidade como
demonstra o gráfico abaixo.

Gráfico 2 - Desenvolvimento da pobreza no Brasil

Fonte: Pochmann (2018)3

O resultado apresentado deve-se, entre tantos fatores, ao aumento da taxa


de desemprego e o crescimento do salário mínimo abaixo da inflação neste governo.
A taxa de desemprego em 2018 chegou a 12,3%, o equivalente a 12,9 milhões de
pessoas desocupadas, enquanto em 2014 vivenciou-se a menor taxa de
desemprego da história, 4,9%. O salário mínimo contabilizou um crescimento inferior
à inflação, sendo um aumento de 1,81% em relação à inflação de 2,07%, algo que
não acontecia desde 2003, onde no período do PT contabilizou-se um aumento de
70% acima da inflação, onde a política de valorização do salário mínimo se tornou lei
em 2011 (LULA, 2018).
A redução de gastos, sob a justificativa de regularização das contas públicas,
surtiu efeitos também sobre a política habitacional. Tendo suas contratações
suspensas para reavaliações, o PMCMV foi abandonado por Temer sob a alegação
de problemas orçamentários. (SANTOS, 2017)

3
Pochmann, Marcio. Neoliberalismo do governo Temer trouxe a nova segregação social. 2018.
Disponível em: https://www.redebrasilatual.com.br/blogs/blog-na-rede/2018/05/neoliberalismo-e-a-
nova-segregacao-social. Acesso em 07 de abr. 2019.
66

A focalização na não rentabilidade do programa, em sua dimensão de


interesse social, causou duras perdas à população mais pobre. Sendo encerrados
os benefícios concedidos à faixa 1 do PMCMV, revelando o descaso de Temer com
a habitação popular (SANTOS, 2017).

O Ministério das Cidades revogou a contratação de 10 mil moradias do


MCMV Entidades, modalidade criada para atender comunidades que vivem
em condições vulneráveis, anunciando também a suspensão da meta de
dois milhões de novas contratações da terceira etapa, anunciada por Dilma.
(GABINETE DE LIDERANÇA DO PT, 2017, p. 3)

Ao reagirem a tais mudanças, os movimentos sociais reivindicaram o


retrocesso destas mudanças, o que foi atendido pelo governo, porém de forma bem
reduzida. Temer anunciou a previsão de 170 mil novas unidades habitacionais para
a faixa 1 do programa, o que ainda foi entendido pelos movimentos sociais de forma
negativa, tendo em vista as necessidades da população e o crescente déficit
habitacional em conjunto com as mudanças no FGTS que financia o programa e a
falta de garantia do cumprimento do prometido. (SANTOS, 2017)
Após a reformulação do programa, foi anunciada a nova meta para 2017 em
610 mil unidades habitacionais com mudanças de regras para o financiamento nas
faixas 1,5, 2 e 3 do PMCMV. Segundo Santos (2017, p. 44), as regras passaram a
ser:

1. Para se enquadrar na faixa 1,5, a renda total da família precisa ser de


até R$ 2.600.
2. Para faixa 2, a renda pode ser de até R$ 4 mil.
3. Na faixa 3, o teto de enquadramento subiu para R$ 9 mil.
4. Para as operações com uso do Fundo de Garantia do Tempo de
Serviços (FGTS), o teto do valor de avaliação dos imóveis, que antes era
de até R$ 225 mil, aumentou para R$ 240 mil.

A progressiva perda de investimentos na faixa 1 do PMCMV escancarou o


desinteresse e ataque do governo Temer às pautas sociais, embora esta diminuição
não tenha se dado exclusivamente em seu governo. Ainda no governo Dilma, que
viveu o auge e o declínio do programa, houveram 537 mil contratações em 2013,
número que decaiu drasticamente para 16,9 mil em 2015 e até setembro de 2016
somou apenas 32,5 mil unidades contratadas. (SCHREIBER, 2016)
O peso causado pelo financiamento da faixa 1 ao governo é bem maior que
as outras faixas, tomando ainda em consideração seu lucro para as construtoras,
67

que na faixa 1 é inexistente, não se tem incentivo a construção destas unidades


habitacionais pela sua falta de rentabilidade.
As reduções e congelamentos nos orçamentos destinados às políticas
sociais, assim como os sucessivos ataques ao estado provedor constituído desde a
Constituição Federal de 1988 são as características fundamentais do governo
Temer, a negação do social e a legitimação das dificuldades ao acesso à moradia
garantido por lei explicitam o caráter antidemocrático do governo Temer.
O descumprimento da meta estabelecida pelo próprio governo Temer de
entrega de 170 mil unidades habitacionais para a faixa 1 era prevista pelos
movimentos sociais, contudo, a realidade se tornou mais cruel ao se cumprir apenas
13,5% desta meta, sendo entregues apenas 23 mil moradias em 2017 4.
O foco direcionado à nova faixa 1,5 do PMCMV, que não conta com um
subsídio tão alto como o da faixa 1, com a contratação de 50 mil novas unidades
habitacionais exclusivamente para esta faixa, demonstra o direcionamento tomado
neste governo. A diminuição progressiva do enfrentamento ao déficit habitacional
pela concessão de subsídios à faixa 1, que cresceu em 2018 para 7,7 milhões de
unidades habitacionais em relação às 6 milhões de 20095 quando o programa foi
criado, se dá pelo desenvolvimento da política de redução de gastos, sendo pagas
parcelas maiores para a redução do subsídio custeado pela União.
A importância adquirida pelo PMCMV em seus 10 anos de criação é inegável,
sendo responsável em 78% dos lançamentos imobiliários desde 2008, um total de
6,3 milhões de unidades neste período. É notável o sucesso econômico do
programa enquanto medida anticrise, sendo responsável pela criação de 1,9 milhão
de empregos entre 2010 e 2017, tendo seu pico em 2014 com a geração de 2,5
milhões de vagas (MELLO, 2017).
Porém, as condições de precarização das unidades habitacionais para a
população mais pobre demonstram que o enfrentamento à questão habitacional e
seu déficit habitacional não são o foco do programa.
Os problemas estruturais de construção dos imóveis de interesse popular são
graves e corriqueiros, 56,4% das unidades habitacionais inspecionadas
apresentaram falhas como infiltrações, trincas e vazamentos (BRASIL, 2017). Leva-

4
Segundo o jornal Exame de 19 de maio de 2018: https://exame.abril.com.br/economia/falta-de-
recursos-ameaca-o-programa-minha-casa-minha-vida/
5
Segundo o jornal Folha de São Paulo de 12 de fevereiro de 2019:
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2019/02/o-que-fazer-do-minha-casa-minha-vida.shtml
68

se em consideração ainda o uso de materiais de baixa qualidade na construção


destes imóveis para que representem o menor gasto possível às construtoras.
Todas as condições de crescimento da pobreza e precarização da vida da
população pobre se desenvolveram apenas com o foco no lucro. Desde a
paralisação de programas até cortes nos programas sociais, têm-se o cuidado no
fortalecimento da política neoliberal e o enriquecimento contínuo das elites.
É certo que o PMCMV não foi criado com o investimento social que se é
divulgado, desde o governo “neodesenvolvimentista” do PT, têm-se o ideal de
fortalecimento da indústria e o crescimento financeiro do país. Ainda que como
medida anticrise, o programa teve seu auge nos governos petistas, que conseguiu
conceder acesso à moradia às famílias mais pobres, contratando 1,7 milhão de
unidades de 2009 até 2015. (BRASIL, 2015)
As condições de precarização ao acesso das moradias não são de
exclusividade do governo Temer, pois desde a sua concepção o PMCMV teve como
foco o mercado, o favorecimento do lucro. Desde o governo do PT, a financeirização
do mercado imobiliário penalizou as famílias que mais necessitam de habitação e o
PMCMV foi o método usado para esta financeirização, sendo apenas potencializado
com as reformas realizadas por Temer, conforme é problematizado no objeto deste
estudo, demonstrando a contradição da política social que atende demandas das
necessidades sociais, o que é discutível, mas o faz preservando a lógica do
mercado. A problematização da precarização desse programa pelo Estado
brasileiro, desde a sua criação, aprofundada ao longo da implementação e do
avanço da política neoliberal, será trabalhada no item seguinte.

3.3 - Aspectos que configuram a precarização do PMCMV pelo estado brasileiro

Conforme apresentado na análise dos capítulos, e de acordo com Rolnik


(2015), constata-se que a formulação e implementação da política habitacional pelo
Estado vêm tendo um direcionamento e uma opção de combater o déficit
habitacional fazendo de cada brasileiro um "proprietário", pautado na ideia da "casa
própria", a ser construída pelo mercado. Trata-se de uma lógica que privilegia o
mercado e não atende às necessidades sociais dos trabalhadores de baixa renda
para garantir o direito de morar e o direito à cidade.
69

Desse modo, o PMCMV transformou-se na política de habitação e durante os


anos passou a ser encarado como a única solução para o problema da habitação no
Brasil. Essa condição implica no fortalecimento do mercado.
Contudo, de acordo com Rolnik (2015), o programa delega aos agentes
econômicos parte das decisões, entre elas o poder de decidir sobre a localização, o
desenho do projeto, os materiais, a aquisição da terra, entre outros. Assim, observa-
se que o critério é o da rentabilidade do empreendedor, mediante a economia dos
custos no processo de construção das habitações. Essa economia é efetivada por
meio da padronização, na rapidez da aprovação e no menor custo do terreno.
Assim, para Rolnik (2015), tem-se a construção de grandes condomínios
padronizados, nas piores localizações das cidades, ou em periferias consolidadas,
sem equipamentos sociais.
Considerando que na maior parte das cidades brasileiras, os empregos, os
serviços, as oportunidades econômicas se concentram em algumas partes das
cidades, essas moradias construídas para as classes de menor renda pelo PMCMV
são desprovidas de garantias de sobrevivência. Essa condição gera uma série de
problemas sociais, que se repetem, entre eles, a reprodução da periferização. São
os "efeitos colaterais", denominados por Rolnik (2018), no modo em que o Estado
legitima a construção de moradias para os pobres.
Nessa racionalidade há um desacordo entre a Política Nacional de Habitação
(PNH), o Estatuto da Cidade e o PMCMV. Enquanto os dois primeiros defendem o
direito a cidade, O PMCMV, que embora garanta o acesso a habitação, conduz na
execução dos projetos a aspectos de fragmentação e precarização da política e da
vida do trabalhador.
Embora caracterize um avanço, a garantia do acesso a habitação para
aqueles que mais necessitam, através do PMCMV, é perpetuada no dia a dia no
Brasil uma concepção restrita de direito a cidade e de direito à moradia.
O conceito de direito à moradia se desenvolve e foi proclamado desde a
Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e reafirmado pelo Pacto
Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), onde se define
o direito a um padrão de vida adequado, em que a moradia deva suprir as
necessidades para um pleno desenvolvimento social, econômico e cultural daqueles
que nela habitam (ROLNIK et al, 2015).
70

O direito à moradia ganha efetivamente concretude a partir da orientação


estabelecida pelo Comentário Geral nº 4 do Comitê de Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais da ONU (1991). Primeiramente, para o Comitê, este
direito não pode ser interpretado de forma restrita, como um abrigo
composto apenas por um teto e quatro paredes. O documento define, então,
sete elementos considerados essenciais para sua real efetivação:
habitabilidade; disponibilidade de serviços, infraestrutura e equipamentos
públicos; localização adequada; adequação cultural; acessibilidade;
segurança da posse; e custo acessível (ROLNIK et al, 2015, p. 392).

Estudo apresentado por Rolnik et al (2015), integra uma pesquisa realizada


em sete Estados brasileiros, analisando o PMCMV, no qual identificou-se que o
programa é contraditório, apresentando restrições quanto a perspectiva da moradia
adequada. Ao investigar em que medida o PMCMV atende as necessidades
habitacionais das famílias de baixa renda, os resultados apontam uma precarização
da moradia.
Sobre a habitabilidade, requer a questão das condições físicas, sanitárias, de
conforto e de salubridades oferecidas aos proponentes, dentre outros aspectos.
Devem-se considerar as necessidades espaciais da família contemplada (ROLNIK et
al, 2015).
O Estudo indica que as variações dos arranjos familiares não são levadas em
consideração na elaboração das unidades habitacionais, com uma média de 42m²
as unidades visitadas seguem um padrão de sala, cozinha e dois dormitórios,
descaracterizando as condições necessárias para o atendimento das diversas
condições de habitabilidade.

Foi possível identificar nos empreendimentos estudados essa variedade,


com situações em que havia apenas um residente na unidade (4% dos
entrevistados), ou outras em que havia apenas 2 moradores (20%), com
diferentes arranjos (casal, mãe e filha, duas irmãs etc.). No cômputo geral,
77,6% das unidades eram habitadas por até 4 pessoas e 22,4%, por 5 ou
mais moradores, ou seja, no mínimo 2,5 moradores por dormitório, o que já
pode ser considerado uma situação inadequada de moradia (ROLNIK et al,
2015, p. 394).

Com isto, a produção massificada de moradias é moldada para apenas um


modelo de família, fazendo com que o produto ofertado não seja de acordo com a
demanda, definido apenas após a construção do empreendimento, e que acima de
tudo a família pode alterar a sua composição, seja por adição ou subtração de
membros ao arranjo familiar (ROLNIK et al, 2015).
71

A inadequação do espaço oferecido pelos moldes do PMCMV as famílias é


confirmado pelos próprios usuários em sua insatisfação, que afirmam que o tamanho
da unidade é insuficiente ou menor que sua antiga moradia, ainda que uma maioria
julgue o espaço como adequado, têm-se o contraste com a visão dos arranjos
familiares de 5 ou mais pessoas como demonstra a tabela abaixo.

Tabela 1: Adequação do tamanho da moradia segundo percepção dos moradores, por tamanho da
família, 2013.

Fonte: Rolnik et al, 2015, p. 395

Foram relatados problemas relativos à construção em relação a


habitabilidade, onde famílias reportam problemas com barulho, umidade, problemas
hidráulicos, problemas com conforto térmico, abastecimento de água e construção
em geral.

Mais de 48% das famílias apontaram que o apartamento já apresentou


problemas com excesso de barulho, 43% com umidade, 42% com questões
hidráulicas (vazamentos, infiltração, entupimento etc.), 38% com conforto
térmico, 35% com abastecimento de água e 30% com problemas
construtivos em geral (piso, rachaduras, portas, janelas etc.). Apenas 10%
dos entrevistados afirmaram não ter identificado qualquer tipo de problema
com o imóvel (ROLNIK et al, 2015, p. 395).

Os empreendimentos devem ser conectados às redes de água, esgoto e


eletricidade, assim como devem ser cobertas pelas redes de serviços públicos e
equipamentos sociais básicos ao cotidiano da população como educação, saúde,
esporte e lazer, devendo ainda estar disponíveis os serviços de transporte público e
coleta de lixo como em outras regiões da cidade. Sobre este tópico, tem-se a
seguinte tabela sobre o que melhorou ou piorou para os moradores usuários do
PMCMV.
72

Tabela 2: Avaliação do atendimento por serviços na moradia atual, em comparação com a anterior.
Serviços cujo atendimento melhorou, 2013.

Fonte: Rolnik et al, 2015, p. 397

Embora os moradores recebam as casas com infraestrutura, como mostra o


gráfico acima, comparando em relação às antigas moradias, todavia, constitui um
problema para os beneficiários custear água, energia, condomínio, entre outros, com
a renda que recebem. Contudo, por outro lado, constatou-se uma piora significativa
quanto ao acesso aos equipamentos sociais, onde a nova localidade dificulta o
acesso ao comércio, trabalho, entre outros.

Tabela 3: Avaliação do atendimento por serviços na moradia atual, em comparação com a anterior.
Serviços cujo atendimento piorou, 2013.

Fonte: Rolnik et al, 2015, p. 398

A localização destes empreendimentos deve propiciar oportunidades de


desenvolvimento para os moradores, contudo, constata-se que as construções são
73

localizadas em regiões distantes do tecido urbano e com condições precárias de


urbanidade. As novas moradias representam um aumento do tempo de
deslocamento, assim como o acréscimo nos gastos, obrigando o deslocamento para
outras regiões da cidade para a execução de suas atividades habituais como
compras ou simplesmente estudar. Não podendo ser ignorado a origem dos
moradores e suas condições iniciais, a nova localização, ainda assim, representou a
melhoria para diversas famílias em condições de risco.

Aproximadamente 65,5% das famílias afirmaram que são obrigadas a se


deslocar para outros bairros para fazer compras ou utilizar serviços, e 6%
têm que se deslocar para outros municípios. Apenas 48,7% dos
entrevistados afirmaram que conseguem fazer compras no seu próprio
bairro. [...] Entre os estudantes, 45% freqüentam escola no mesmo bairro
de residência, 50% estudam em outros bairros e 5% estudam em outros
municípios. O tempo médio neste deslocamento é de menos de 30
minutos para 70,5% dos respondentes, um parâmetro considerado bom.
Apenas em dois dos empreendimentos, Mongaguá e Guarujá (no bairro de
Cidade Tiradentes, São Paulo), é preocupante ainda a situação de uma
parcela dos estudantes (17,8%) que leva mais do que uma hora no
deslocamento entre casa e escola, sendo que praticamente a metade
destes leva mais do que duas horas (ROLNIK et al, 2015. P. 398).

Quanto à adequação cultural, deve-se expressar a identidade cultural dos


habitantes, o que Rolnik et al (2015), constataram na pesquisa realizada com os
moradores não acontecer. O molde de construção habitacional praticado na política
habitacional é uma estratégia de redução de custos de produção pelas construtoras.
Ressalta-se que a uniformidade dos projetos também se deve ao próprio modelo
desenvolvido, que define a metragem e os materiais utilizados, não havendo
margem para diversidade na sua elaboração.

Dentre os entrevistados, 68,8% sentem falta de algum espaço ou ambiente


que possuíam na moradia anterior. Essa ausência é sentida mais
fortemente pelos moradores reassentados (74,5%), que acessaram o
Programa não por meio de inscrição voluntária e sorteio, mas porque
sofreram remoção de seu lugar de moradia anterior. Do total de moradores,
70,5% apontaram que sentem falta de um quintal, 18,3% sentem falta de um
área de serviço, e 15,5%, de espaços externos, como varanda, sacada etc.
A falta “de um lugar pras crianças brincarem” ou “pra estender as roupas” é
sentida por 71,1% dos moradores que afirmam preferir a moradia anterior
do que a atual, e por 69,7% dos que afirmaram pensar em mudar de casa
(ROLNIK et al, 2015, p. 403).

A segurança de posse representa o maior avanço para as famílias, segundo a


garantia de não remoção do local habitado e sem ameaças inesperadas de despejo.
74

Ainda que sejam financiadas pelo FAR, as famílias não adquirem a garantia da
moradia no acesso a casa, somente ocorre de fato, o direito à propriedade do
proponente após a quitação dos pagamentos.

[...] 37% dos respondentes afirmaram que o que mais gostavam na casa era
o fato de ela ser própria, sendo a principal razão de satisfação apontada.
Isso parece estar diretamente relacionado com a situação de insegurança
que viviam anteriormente, tendo em vista que mais de 43% das famílias
entrevistadas provinham de favelas e, muito provavelmente, não tinham
seus direitos possessórios formalmente reconhecidos, embora o marco
internacional do direito à moradia já lhes garantisse o direito à posse segura
[...] (ROLNIK et al, 2015, p. 405).

Embora o sentimento seja de seguridade de posse, existem perigosas


brechas no contrato assinado que podem causar a rescisão, “dentre elas a falta de
pagamento e apresentação, quando solicitado, de recibos de impostos, taxas ou
outros tributos, encargos previdenciários, securitários e condominiais que incidam ou
venham a incidir sobre o imóvel” (ROLNIK et al, 2015, p. 406).
Por conseguinte, não se considera a realidade socioeconômica da população
alocada nestes empreendimentos, tendo em vista a sua grande parcela viver da
informalidade. Não existe uma garantia genuína de que estas conseguirão arcar com
os pagamentos das parcelas do seu financiamento, ou mesmo das taxas
condominiais.
Soma-se ainda a atuação de grupos ligados ao tráfico de drogas ou milícias,
tanto territorial, no sentido da localidade geográfica em que o empreendimento foi
instalado, já havendo a atuação de tais grupos, como propriamente dentro dos
condomínios, exercendo uma ação autoritária de controle habitacional, decidindo
quem irá morar ou não nas unidades. O que condiciona a violência empregada de
forma passiva nos condomínios, aumentando a periculosidade da região (ROLNIK et
al, 2015).

[...] é possível ver alguns indícios dessa situação se levarmos em


consideração que 38,4% das famílias consideram o seu condomínio
violento/perigoso e 45,8% consideram-no mais violento/ perigoso do que a
moradia anterior, sendo que das 494 famílias que já pensaram em se mudar
(53% do total), aproximadamente 49,6% apontaram a violência como causa.
Tais dados demonstram como a violência está fortemente presente nos
empreendimentos analisados, relacionada à existência dos grupos
mencionados, mesmo que não expressamente declarada (ROLNIK et al,
2015, p. 407)
75

Quanto ao custo acessível, direciona-se a sustentabilidade econômica da


moradia e sua família. Desta forma, os pagamentos direcionados ao custeio da
habitação não devem comprometer a renda familiar, devendo permitir o acesso às
demais necessidades objetivas, tornando-se diretamente relacionada à capacidade
laborativa dos indivíduos inseridos na política. Com isto, Rolnik et al (2015, p. 408)
explica:

Com relação à situação de trabalho dos moradores com mais de 18 anos


(1995 pessoas), 1.259 (63,1%) possuíam trabalho à época da entrevista e
729 (36,5%) não se encontram trabalhando. Esse índice pode ser
considerado alto frente à taxa de desemprego, a qual, segundo a Pesquisa
Mensal de Emprego do IBGE, atingiu apenas 4,3% da população
economicamente ativa no mês de dezembro de 2013. Mesmo assim, a
renda média mensal familiar entre as 930 famílias entrevistadas foi de R$
1471,84, encontrando-se a menor renda média (R$ 1188,76) no
empreendimento Residencial Árvores, de Itanhaém, e a maior, no
empreendimento Iguape (R$ 1567,01), situado na cidade de São Paulo,
seguindo, assim, a dinâmica geral de renda familiar vigente nos respectivos
municípios.

Quanto à acessibilidade dos condomínios, a pesquisa realizada nos Estados


no Brasil revela positividade, já que se constata a adequação aos grupos
socialmente vulneráveis, sendo mulheres, idosos, deficientes etc. levando em
consideração suas necessidades.
Neste quesito, o PMCMV determina medidas para a garantia do acesso desta
parcela, designando que uma parcela das unidades seja adaptada para deficientes e
outra para idosos. No beneficiamento das mulheres, existe a priorização da
demanda para famílias chefiadas por elas, ainda que estas não o sejam, a
formalização dos contratos é feita com a mulher como proponente.

Dados colhidos nas entrevistas revelam que o Programa está conseguindo


atingir um número significativo de mulheres beneficiárias – dentre nossos
entrevistados, 33% dos chefes de famílias são mulheres. Com relação aos
idosos, eles correspondem a 2,6% do total de moradores dos
empreendimentos estudados, e 5,5% dos beneficiários (ROLNIK et al, 2015,
p. 413).

Desse modo, de acordo com os dados da pesquisa, infere-se que as parcelas


mais pobres da população a que se destinam tais empreendimentos da faixa 1 são
as que mais sentem as mudanças no que tange a política de moradia do Estado no
Brasil.
76

Contudo, se o programa apresenta essas condições, consolidando moradias


que não são adequadas, com serviços precários ou fragmentados, ou esses "efeitos
colaterais", como denomina Rolnik (2015), com o fim do governo Dilma, um ciclo se
fecha e abre-se outro para o PMCMV, para essa política de governo.
As medidas tomadas pelo governo Temer aprofundam as contradições e a
viabilização econômica do programa, ampliando o grau de precarização da política e
acrescendo o lucro das construtoras, chegando a 109,8%6 em 2018 e não
atendendo as metas estabelecidas pelo próprio governo, já encurtadas em relação
aos governos anteriores.
Como já discutido, os aspectos de precarização não surgem no governo
Temer, porém, na conjuntura política e econômica e frente a uma crise econômica
ampliam esta realidade, onde se desenvolve e se acentua o desemprego, a pobreza
e o déficit habitacional que cresceu 7%7 de 2007 para 2017, sendo agora 7,78
milhões de unidades habitacionais, impactando diretamente a continuidade do
programa e a garantia de sobrevivência e posse das famílias beneficiadas.
Observa-se variados cortes financeiros e de investimentos e uma
desaceleração no PMCMV durante o governo Temer. Sem investimento no
programa, menor repasse dos subsídios, a população ficará prejudicada. Não há nos
municípios recursos para investir em moradia. Esse é o quadro da moradia no Brasil
nos aos de 2018 e 2019.

6
Segundo o jornal Exame de 8 de novembro de 2018: https://exame.abril.com.br/negocios/tenda-
lucro-liquido-vai-a-r-644-milhoes-no-3o-tri-expansao-de-1098/
7
Segundo o site Rede Brasil Atual de 8 de janeiro de 2019:
https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2019/01/deficit-habitacional-bate-recorde-e-movimento-
de-moradia-ve-futuro-com-preocupacao
77

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O debate em torno do direito à moradia tem sido, de modo dialético,


compreendido pelo desenvolvimento do capitalismo urbano. Diferentes abordagens
teórico-metodológicas evidenciam historicamente a indissociabilidade entre a
questão da habitação, o espaço urbano, o direito a cidade, a propriedade privada e a
mercadoria que constituem as principais mediações desse processo. A moradia é
uma mercadoria.
Sem dúvidas, as contradições serão sempre constitutivas dessas relações: o
direito de morar na cidade e a lucratividade do capital. O Estado tem efetiva
participação na administração da infraestrutura urbana direcionando recursos para
esse fim. Há de se considerar as relações sociais estabelecidas entre os capitalistas,
às classes trabalhadoras e a ação do Estado através das políticas sociais.
Desse modo, as diferentes formas de entender a questão habitacional
remetem aos estudos sobre a cidade, a conformação do espaço urbano nos
diferentes movimentos da acumulação e, portanto, de absorção da mão de obra. A
superexploração da classe trabalhadora é uma expressão desse processo, cujo
custo revela a privação a que está submetida no atendimento das suas
necessidades básicas. A habitação é um direito social e humano.
O desdobramento analítico se desenvolve no entendimento de que as
contradições urbanas e as necessidades habitacionais da classe trabalhadora são
decorrentes das desigualdades sociais no acesso a bens e serviços que
materializam o direito a cidade.
O estudo realizado, que discute a política habitacional e o direito a habitação
no Brasil, teve como objetivo analisar os impactos da atual política habitacional
durante o governo Temer, cuja condução diminuiu os investimentos financeiros e os
subsídios para a área, colocando em patamares mais elevados os riscos de acesso
à moradia para as famílias de baixa renda e a precarização do PMCMV que há duas
décadas se constitui na única política habitacional no Estado brasileiro.
Trata-se de governos que vem impondo uma agenda de orientação neoliberal
de caráter radical, cuja inclinação é transformar o Estado brasileiro e os princípios da
constituição de 1988. Ao aplicar celeridade às reformas, impossibilita ao Estado o
cumprimento da garantia dos direitos sociais.
78

Ao discutir a política habitacional para a classe trabalhadora, enquanto uma


necessidade e um direito humano, este estudo sistematizou o debate sobre o
urbano, o significado sócio histórico e os seus desdobramentos enquanto expressão
da “questão social” na particularidade urbana. Compreende-se que esta não é uma
problemática nova e o seu desenvolvimento acompanha os diversos estágios da
acumulação do capital, a formulação e execução da política social pela intervenção
do Estado e as lutas sociais, bem como as ações do mercado.
Contudo, analisar o movimento mais universal do capital em sua relação com
a cidade, exige a compreensão do desenvolvimento do espaço urbano e suas
contradições, ao longo dos processos históricos.
Reafirma-se, como foi dito ao longo da pesquisa bibliográfica, que ainda que
a existência das cidades preceda o capitalismo (Maricato, 2015), ela se desenvolve
pela ação do capital e sua urbanização. Assim como o desenvolvimento das
condições de empobrecimento e precarização de vida da classe trabalhadora.
Desse modo, enquanto processo histórico, nos séculos XVIII e XIX
desenvolveu-se o incremento do capitalismo industrial e a eclosão do fenômeno
urbano que alterou o modo de vida da classe trabalhadora e as instituições sociais.
Nesse período, verificou-se uma crescente desigualdade e pauperização dos
trabalhadores em diferentes contextos que vão marcar a complexidade das
expressões da questão social no espaço urbano e o aparecimento das legislações
sociais e políticas sociais de proteção ao trabalhador.
A realidade desta questão no Brasil, explicada por Kowarick (1979) e outros
autores citados, demonstra o desenvolvimento capitalista nas cidades com traço
semelhante aos observadas na Inglaterra por Engels (2010), estimulando a saída
dos trabalhadores do campo para as cidades que se urbanizavam, em busca de
trabalho e subsistência.
A massa de habitantes gerada pela industrialização provocou o
abarrotamento das cidades, que não foram concebidas para o suprimento das
necessidades desta população. Assim, provoca-se a espoliação urbana, pois não há
a instalação nem o desenvolvimento dos serviços necessários à demanda da classe
trabalhadora, ampliando as expressões da “questão social”, polarizada nas periferias
formadas por estas condições de espoliação (KOWARICK, 1979).
O enfrentamento a esta questão se deu pela higienização das cidades e dos
pontos de interesse do capital. As políticas sociais de habitação desenvolvidas a
79

partir de então apresentaram o foco apenas na realocação da população pobre,


visando o embelezamento das cidades industrializadas do século XX (KOWARICK,
1979).
O desenvolvimento desta política sempre se deu através dos interesses do
capital, que ao conseguir alocar a população mais pobre para as periferias, também
se tornaram a única saída possível a elas. A negação de um salário que
expressasse condições de conquista de moradia fortalecia este patamar de
periferização e permitiu o crescimento do lucro pela autoconstrução da moradia
desses trabalhadores.
Os ensaios de uma política habitacional ocorreram pelo agravamento da
“questão social” sob uma visão de “caso de polícia”, onde se criminalizava a pobreza
e se esboçava um financiamento para os trabalhadores cobertos pelos IAPs.
Dentro de uma conjuntura desenvolvimentista e de alto endividamento, houve
investimentos para o desenvolvimento da política habitacional nos governos
militares, contudo, beneficiaram-se apenas aqueles inseridos no mercado formal de
trabalho, com o poder aquisitivo necessário para custear os pagamentos do
financiamento, não havendo interesses no atendimento da população mais pobre.
O desenvolvimento da política de habitação permanecia até então focalizada
na classe trabalhadora formal, onde havia uma rede de financiamento por trás dos
impostos recolhidos, todavia, a população miserável permanecia a margem desta
realidade e negligenciada pelo governo.
A negligência dos governos à questão habitacional para a população de baixa
renda gerou fomento aos movimentos sociais, que desde o fim da ditadura
movimentavam-se e organizavam-se para expressar suas demandas e pleitear uma
reforma urbana que garantisse moradia (BOULOS, 2012). Ainda que a Constituição
Federal de 1988 tivesse a aparência de provedora de direitos, estes não foram
obtidos.
A Constituinte de 1987 recebeu as reivindicações dos movimentos populares
agregando-os à luta pela reforma urbana, sendo incorporado no capítulo sobre
política urbana da Constituição de 1988, exigindo a função social do Estado na
garantia dos direitos urbanos, acesso aos aparelhos sociais e o direito à cidade
(GRAZIA, 2003).
A crise instaurada desde o fim da ditadura manteve-se até os anos 1990,
prejudicando o desenvolvimento de políticas sociais. Iniciando-se um desmonte do
80

Estado e uma postura neoliberal no governo brasileiro. A postura de enfrentamento


à crise no Brasil não permitia a focalização em programas sociais.
Contudo, a criação do Estatuto da Cidade em 2001 provia forças à política
urbana prevista na Constituição de 1988, até então sem aparato jurídico para sua
legitimação. Regulamentando ocupações, contendo o processo especulativo
imobiliário do Brasil e trazendo a função social da propriedade, permitiu a gestão
democrática das cidades fundamentando o direito à moradia.
A política habitacional e urbana a partir de então conseguiu se desenvolver,
em um governo que defendia o social. Teve-se a criação do Ministério das Cidades
em 2003, para a gestão e execução da política urbana. Porém, o desenvolvimento
da política permaneceu em um patamar contraditório. A criação do PAC em 2007,
através de um pacto com o setor privado, reforçava a política
“neodesenvolvimentista” deste governo, com a ampliação da infraestrutura das
cidades, mas a política habitacional concebida em 2009 com o PMCMV era na
verdade também uma medida anticrise (AMORE, 2015).
Isto posto, o PMCMV demonstrou ser, contraditoriamente, um grande plano
econômico viabilizado pelo PAC com o viés de política anticrise. Atendendo as
demandas do capital financeiro e construtor, gerando empregos, dava rotatividade a
mão de obra e aquecia a economia. Não ofuscando os avanços sociais obtidos em
sua execução, a viabilização da conquista de uma casa para a população mais
pobre representou um avanço na política habitacional.
O sucesso do programa, em seu patamar econômico e social, torna-o o maior
programa habitacional do país, agregando fortemente características do lulismo de
conciliação de classes ainda que de forma desigual, atendendo primeiramente ao
capital e seus investidores, e só depois atendendo demandas sociais por moradia.
Embora tenha vivido o auge do programa em seu governo, Dilma também
viveu seu declínio e a instauração de uma crise econômica e política, onde em uma
articulação golpista para a retomada neoliberal a dispuseram da presidência. Esta
articulação política que culminou no impeachment, levou Temer ao poder, alinhando
o governo às medidas requisitadas pelo mercado em uma conjuntura de crise
econômica do país. Os ataques de Temer às políticas sociais e aos direitos
trabalhistas resultaram na piora dos indicadores sociais, aumentando o desemprego,
pobreza e ampliando as dificuldades no acesso à moradia (POCHMANN, 2018).
81

O desenvolvimento da política neoliberal de Temer, com congelamento do


orçamento para as políticas, retirada de direitos trabalhistas e favorecimento do lucro
das elites, ocasionaram a diminuição progressiva do PMCMV, havendo cada vez
menos acesso às faixas mais carentes da população, onde há um maior
investimento do governo e menor lucro das empreiteiras.
Dessa forma, sabendo que a produção de novas unidades habitacionais não
diminui o déficit habitacional, entende-se a existência de aspectos da precarização
do programa pelo não atendimento das necessidades adjacentes à moradia, o que é
agravado pela política de desmonte do Estado executada no governo Temer. Apesar
de seu declínio ter se iniciado no governo Dilma, as condições socioeconômicas
aplicadas pelo governo Temer causaram mais danos à política habitacional e social
do que apenas a crise econômica anterior.
No mais, apesar da conjuntura desfavorável, considera-se fundamental a
garantia do direito de morar na cidade, e que a luta social e a resistência dos
trabalhadores potencializem a defesa do direito a uma moradia digna, que enfrente o
desmonte do Estado e a ofensiva do capital que se dá no governo Bolsonaro.
82

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