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OLIVEIRA, Joevan.

ME AME MENOS, MAS ME AME POR MAIS TEMPO: AUTOPERFORMAÇÃO COMO


PROCEDIMENTO DE SUBJETIVAÇÃO DO ATOR. Introdução da Monografia apresentado ao Curdo de Licenciatura em
Teatro, da Universidade Federal da Paraíba, como pré-requisito para a qualificação de TCC (Trabalho de Conclusão de
Curso) sob a orientação da profª. Drª Marcia Chiamulera no período 2018.2.
1

SOBRE A QUESTÃO METODOLÓGICA

“Se a pessoa que conduz a investigação é indissociável da produção


de pesquisa, porque, então, não observar o observador? Porque não
olhar a si mesmo e escrever a partir de sua própria experiência?”
(FORTIN, 2009, p. 82).

Como o artista, professor-artista, pedagogo teatral podem refletir sobre suas próprias
práticas? É possível pensar num pretenso distanciamento do objeto de pesquisa quando esse
se configura como experiência do próprio pesquisador? Que tipo de episteme ajuda a teoriza a
experiência, o corpo e o fazer teatral em seus próprios modos, sem interesse em respostas
universalizantes? Esses questionamentos iniciais são pontos de partida para problematizar as
possibilidades metodológicas que contribuíram para o desenvolvimento deste trabalho, tendo
em vista que se trata de uma pesquisa no campo da arte.
Com o presente trabalho proponho uma pesquisa em Teatro, de caráter qualitativo, na
modalidade etnográfica, a partir de uma abordagem pós-moderna, tendo em vista seu caráter
híbrido, de bricolagem teórico-metodológica que abre espaço para outras modalidades de
composição no processo de produção da informação. Uma perspectiva que me parece se
adequar ao tema desta pesquisa que, também, se propõe a pensar novas grafias, só que no
contexto da cena contemporânea.
Em se tratando de um trabalho relativo ao processo de criação de um pesquisador na
área do Teatro, minhas reflexões serão formuladas a partir de um conhecimento experiencial
construído por um sujeito inserido num contexto variável e contingente. Esse caráter mais
subjetivo, processual e relacional na pesquisa implica numa série de desafios epistemológicos
e metodológicos referentes à descrição, compreensão e problematização da experiência que,
mais favorece o levantamento de questões do que oferece respostas.
Nesse sentido, parto do pressuposto que um método baseado na prática artística, não
precisa reivindicar garantias epistemológicas ancoradas na crença de uma pretensa
imparcialidade e confiabilidade resultantes de um olhar externo e objetivo, até porque o
conhecimento, antes de ser uma descoberta se configura como uma construção. Por isso,
explicitar os saberes operacionais implícitos à produção de uma obra ou situação artística
permite a visibilidade e a legitimidade do conhecimento que emerge da experiência. Não
podemos esquecer que não se trata de um pesquisador desincorporado, se é que é possível que
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PROCEDIMENTO DE SUBJETIVAÇÃO DO ATOR. Introdução da Monografia apresentado ao Curdo de Licenciatura em
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Curso) sob a orientação da profª. Drª Marcia Chiamulera no período 2018.2.
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haja algum, em alguma área. Mas é inegável que, na área artística, há um redimensionamento
da experiência incorporada.
Nesse contexto, o território da prática artística, ou seja, ateliês, salas de aula, espaços de
ensaio, teatros e demais lugares de interação entre artistas e público funcionam como espaço-
tempo de problematização da experiência porque é onde se dá o processo de criação, ponto de
partida para empreender os diálogos, reflexões e articulação da formação de conceitos. Nesse
sentido, “a prática artística será melhor compreendida se colocada em relação ao pensamento
e ao agir dos praticantes” (FORTIN, 2009, p. 78).
Essa nova perspectiva de negociação entre corpo e conceito, fazer e conhecer no campo
da prática artística desloca sobremaneira a relação entre prática e teoria que torna possível
pensar numa prática de conceitos em sala de ensaio, assim como em teorias que emergem de
um fazer.
O uso sistemático de processos de criação artística como meio principal de
entendimento e verificação da experiência de artistas pesquisadores, e demais sujeitos
envolvidos em seus estudos, possivelmente, reflete uma mudança metodológica no campo da
arte e, em específico, no campo teatral. No que tange este trabalho, indico que este uso
sistemático de processos me permite refletir sobre minha experiência pessoal em relação à
experiência de outros. Da mesma forma, me possibilita contrapor meus achados ao que consta
na literatura publicada sobre o assunto. Esse tipo de protocolo, enquanto alternativa para a
pesquisa artística, pode contribuir para a superação da dicotomia entre pesquisa científica e
prática.
Partindo do pressuposto que a arte, em nosso atual contexto sócio histórico, vem se
hibridizando com diferentes áreas do conhecimento, linguagens e dispositivos como estratégia
de resistência ou, melhor seria, sobrevivência o que nos impede de pensar em processos de
pesquisa e ensino, igualmente, híbridos?
Se, como coloca a teórica francesa Beatrice Piccon-Vallin, a ideia de ensinar poderia,
muito bem, ser substituída por experimentar, acredito que a pesquisa em artes e, mais
especificamente, na área teatral, poderia se basear na experimentação prática e teórica como
estratégia de visibilização das inúmeras possibilidades de solução para o mesmo problema.
Convertida em ambiente de diálogo entre prática e teoria que se relacionam de modo
complementar, a pesquisa pode possibilitar o estabelecimento de um lugar de problematização
de práticas, modelos e leituras. E a criação de uma atmosfera propícia ao desenvolvimento
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desse tipo de comportamento parece dar-se pelo estímulo às trocas de experiências,
percepções e discussões, tendo em vista os interesses e realidades específicas de cada um.
Segundo a pesquisadora canadense, na área de dança, Sylvie Fortin (2009), a maioria
das pesquisas pós-positivistas possuem naturalmente caráter etnográfico, uma vez que
assumem o ponto de vista dos participantes. Nesse contexto, a autoetnografia, permite uma
abordagem menos universalizada do fazer artístico, além de se tratar de uma escrita do eu que
possibilita o ir e vir entre a experiência pessoal, singular e suas dimensões culturais e sociais.
Ou seja, a autoetnografia, assim como o saber da experiência de que fala o professor espanhol
Jorge Larrosa Bondía, trata de “um saber particular, subjetivo, relativo, contingente, pessoal”
(BONDÍA, 2002, p.28). Por esses motivos, escolhi a autoetnografia como abordagem
metodológica para esse trabalho, uma vez que me possibilita articular as noções de sujeito e
objeto, no contexto das práticas artísticas contemporâneas, deslocadas de qualquer referência
fixa ou estável. Característica que, como bem coloca Fortin (2009), possibilita a bricolagem
metodológica do pesquisador em prática artística, por meio da interação de elementos vindos
de horizontes múltiplos.
Neste trabalho, me coloco em primeira pessoa, como estratégia de evidenciação do
caráter singular dessa teia de reflexão que remete ao meu olhar sobre um processo criativo.
Não podemos perder de vista que, quando narramos, ordenamos experiências e procuramos
dar um sentido aos acontecimentos. No caso de processos auto narrativos como esse, a
escritura e reflexão se dão quase simultaneamente. Por isso, enquanto abordagem
metodológica, eu optei por uma sistematização que me possibilita o compartilhamento dos
possíveis caminhos e articulações empreendidos no processo de criação. Nesse percurso,
procurei levar em consideração os traços, vozes, procedimento, sujeitos e seus consequentes
desdobramentos estéticos sem perder de vista suas potencialidades pedagógicas emergentes.
Enquanto etapas da pesquisa, há uma revisão teórica, uma prática artística e uma
reflexão a partir dos rastros1 autoetnográficos. A parte prática está sendo desenvolvida na sede
do Grupo Lavoura, entendido como campo de atualização da teatralidade, ou como coloca
Fortin (2009), “campo da prática artística” onde se dão os fenômenos, processos e
procedimentos em seu espaço tempo e com seus sujeitos agentes. Nesse contexto, a reflexão
resulta da articulação dos rastros do processo em relação a minha percepção do fenômeno e

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Termo criado pelo filósofo franco-argelino Jacques Derrida, assume o caráter de indeterminação do
pensamento, ao propor a substituição do conceito tradicional de signo e sua inerente repartição entre significado
e significante pelo quase-conceito de rastro, unidade de significação, sempre em processo de diferenciação.
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em diálogo com os aportes teórico-metodológicos. Ou seja, desde como surgiu esse projeto
cênico até as conexões, agenciamentos e articulações dos desejos, nele envolvidos.
Os rastros a que me refiro são as memórias e registros de situações no processo de
criação e na encenação em si, os fenômenos são as reflexões acerca do conjunto de rastros
suscitados e articulados pela prática. Os aportes teórico-metodológicos são as teorias do
teatro, da performance, das ciências humanas, da filosofia.
A recuperação dos rastros está se dando por meio dos documentos produzidos, registro
escrito e audiovisual. A análise está suscitando reflexões acerca de determinadas situações do
processo. Como consequência, estou efetivando um esforço de teorização e sistematização do
trabalho em desenvolvimento por meio do diálogo com teorias e reflexões externas à poética.
Não posso deixar de pontuar o caráter inacabado e em movimento deste trabalho teórico,
porque, assim como a prática, vem se mostrando provisório à medida que o olhar sobre os
rastros vão ganhando outras dimensões por meio da contribuição de outras vozes a esse
processo.
A metodologia de criação do espetáculo parte da possibilidade de assimilação prática de
materiais e ideias que foram surgindo e sendo trazida para a sala de ensaio e que foram dando
direcionamento ao processo criativo. Esses materiais, rastros do processo criativo, são os mais
diversos, desde artistas contemporâneos como Marina Abramovic, Orlan, até referências da
cultura pop como a família Kardashian, Rupaul‟s Drag Race, Botched, passando por extratos
textuais dramáticos de Shakespeare, não dramáticos como Cecília Meireles, Oscar Wild,
textos publicitários, textos teóricos como do filósofo Jean Baudrillard, autoanálises, conversas
com amigos, peças musicais creative commons e vídeos da internet.
As cenas foram sendo criadas a partir do processo de manipulação, articulação e
experienciação dos materiais acima citados tendo como base a utilização de parâmetros
concretos de tempo espaço, como proposto pela metodologia dos Viewpoints e da
Composição, ambos desenvolvidos pela encenadora estadunidense Anne Bogart.
Essas duas técnicas, que se complementam no trabalho criativo proposto por Bogart,
partem de um mesmo princípio que é propiciar autonomia de ação ao sujeito no processo
criativo, o que lhes confere um caráter horizontalizado. Sequências, físicas e vocais foram
criadas num processo de esboçar ideias rapidamente, enquanto ações concretas que vão sendo
transformadas em cena. O processo de composição parte da premissa de que decisão e
escolhas devem ser tomadas sem muita elaboração prévia, para não incorrer no compromisso
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de um resultado motivado pela necessidade de significação, o que me levou a um método de
escolha de materiais muito mais intuitiva.
Cada cena foi pensada segundo a lógica do rastro, no sentido de que representa uma
singularidade, ou seja, possui autonomia em relação ao conjunto, mas mantém relações com
as demais. A proposta era tornar o processo de construção mais complexo, buscando fugir de
oposições dialógicas. Nesse sentido, parti da lógica de que “eu” sou “vários” em situações
singulares que se interconectam. Relações que foram se estabelecendo no próprio processo de
construção das mesmas. Cada cena funciona como um ensaio e, assim como o gênero textual
tem um caráter opinativo, em que exponho ideias, críticas, reflexões, impressões, a partir de
um ponto de vista pessoal procurando problematizar os temas que estão sendo abordados.
Reflexões e considerações apenas provisórias, sem pretensão de guardar verdades absolutas e
que, portanto, vão mudando, se contradizendo ou se reafirmando.
As cenas foram pensadas dessa forma porque meu desejo inicial foi o de criar um
dispositivo interacional que pudesse intensificar a polifonia no processo de construção do
experimento evidenciando a relação eu-outro (plateia), assim como, também, eu-outro (eus)
da forma mais dinâmica e móvel possível dentro do meu contexto de trabalho. Nesse sentido,
o processo de composição do experimento foi pensado para ser realizado de modo
horizontalizado, ou seja, pelo conjunto dos agentes envolvidos, no momento mesmo da
apresentação do experimento, aumentando a complexidade do processo de subjetivação
proposto pelo experimento. Apesar das cenas já estarem prontas a priori, o processo de
organização das mesmas, ou seja, a narrativa geral responsável pela concretização da minha
identidade no experimento, se torna móvel, uma vez que as cenas apresentadas e sua
sequência será determinada pelas escolhas do público.
Partindo do pressuposto que as construções identitárias se dão em processos de
interação, o presente experimento propõe verificar as características dessa construção de
identidade (de si em relação ao outro) num processo de construção narrativa conjunta. Se,
como coloca Bondía, “o sentido do que somos depende das histórias que contamos a nós
mesmos (...), das construções narrativas nas quais cada um de nós é, ao mesmo tempo, o
autor, o narrador e o personagem principal” (BONDÍA, 1999, p. 22), em se tratando de uma
escrita de si, a narrativa auto reflexiva, possibilita a observação dos modos como o narrador
constrói, para o outro, a forma como gostaria de ser visto.
Nesse sentido, apesar das cenas se estruturarem de forma a criar uma imagem específica
do atuante, a organização dessas falas no discurso, antagonicamente não cabe ao ator, mas sim
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ao público. Como resultado, sempre haverá uma nova perspectiva, um ponto de vista diferente
em relação à constituição da escrita de si do ator em cena, ou seja, de sua identidade, seja em
relação ao público, ou mesmo em relação ao ator. Este último vai assumindo novas condições
de desenvolvimento de sua narrativa auto reflexiva, ou seja, de construção da sua identidade
dentro do experimento. Por isso, a metodologia de desenvolvimento do trabalho prático teve
como objetivo evidenciar o processo de autoperformação do ator. Termo que utilizo no
sentido de processo de “escritura do eu”, parafraseando Foucault (2004), no qual o ator, ao se
autoficcionalizar em cena, vai assumindo máscaras, personas, selves2, com os quais se
identifica temporariamente, num processo de constante transformação.
Com esse procedimento, o atuante problematiza a noção de identidade que, sem o
caráter de estabilidade, se mantém em constante formação. É por meio do diálogo entre o ator
e uma multiplicidade de outras vozes, num processo contínuo de disseminação, que se
constrói o texto da cena entendido enquanto construção, relacional e em fluxo.
A autoperformance remete às mudanças que a noção de sujeito e representação tem
sofrido, mais especificamente, desde a década de 70. A escrita do eu, antes relacionada à
autobiografia, torna-se autoficção pela constatação de que a noção de sujeito pleno é
substituída pela de fragmento em constante processo de criação.
Esse sujeito fragmentado, ao escrever sobre si em cena, torna-se escritura e assume o
caráter de indeterminação proposto pela desconstrução. O próprio sujeito num entre lugar,
enquanto indecidível3 porque está na esfera da différance4, caracteriza a autoperformance
como processo de escritura de um eu que se configura como espaço sem centro ou mesmo
estrutura determinada, passível de conexões e reconexões que propiciam um processo
contínuo de construção do eu.
Na autoperformance, as identificações e posições do sujeito, flexíveis e provisórias, se
tornam marcadores de uma peça que tem como objetivo questionar os processos de
representação e, por consequência, o que está em jogo no espetáculo em termos de
sexualidade, gênero, etnicidade, por exemplo. Há um jogo de remetimentos em que o atuante
questiona a si mesmo e ao outro, tendo como parâmetros aspectos pessoais, sociais, políticos,

2
Plural de self , tem o sentido de “eu”.
3
Elemento ambivalente sem natureza própria que não se deixa compreender nas oposições binárias. Sem um
referente permanente está sempre “entre”, “no meio” oscilando ente dois termos sem, no entanto resultar em
sínteses.
4
Neografismo criado por Derrida ao acrescentar a letra “a” à palavra différence, com quem mantém semelhança
fonética e alteridade gráfica. Trata do próprio ato de diferir, anterior á qualquer diferença determinada, porque
assim como a lógica do rasto não “é” diferente, “está” diferenciando um termo de outro em determinado tempo
(provisório) e de acordo com as relações que se estabelecem (alteridade) num dado contexto.
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culturais, num processo de negociações que não perde de vista a impossibilidade da
alteridade.
Minha proposta é transpor a mesma lógica utilizada na construção da metodologia de
criação do discurso cênico, para o de criação do discurso acadêmico, enquanto uma escritura
do eu onde diferentes vozes possam ser empregadas junto a diferentes momentos da minha
trajetória pessoal e meus múltiplos selves no contexto de execução desse trabalho.
Nesse sentido, procurei me apoiar numa metodologia voltada para a categoria das
escritas de si levando em conta a inserção social, histórica e identitária do próprio
pesquisador, no caso, eu mesmo, o que me levou a modalidade auto etnográfica, por se
apresentar como uma ferramenta conceitual alternativa pertinente à pesquisa artística e, mais
especificamente, a esta proposta de trabalho..
A relação entre teatro, e as artes performativas em geral, e a antropologia não é uma
novidade, o encenador polonês Jerzy Grotowski, por exemplo, desenvolveu estudos culturais
com seus atores, o antropólogo e teatrólogo estadunidense Richard Schechner, estabeleceu as
bases para seus estudos de Performances Culturais a partir de suas parceria com o antropólogo
britânico Victor Turner, o encenador italiano Eugênio Barba empreendeu um estudo
comparativo entre diferentes bases técnicas de interpretação a partir de matrizes culturais
diversas para cunhar o termo Antropologia Teatral e o pesquisador marroquino Jean Marie
Pradier, ao lançar um olhar diferenciado sobre práticas e comportamentos humanos
organizados e espetaculares criou uma base de investigação que ele denominou
etnocenologia.
Assim como os processos de autoperformação nos termos, por mim defendidos, a
autoetnografia, parte de uma problematização que a antropologia empreende dos processos de
construção dos selves na contemporaneidade, tendo em vista o caráter cada vez mais móvel e
complexo de sujeitos inscritos em contextos multiculturais.
Assim como a crítica literária questiona o status da autobiografia pela constatação da
impossibilidade de sustentação da crença na plena representação de subjetividades que
cristalizam discursivamente o sujeito como unívoco e estável, a antropologia questiona o
status da etnografia tradicional, entendida como um discurso auto reflexivo que trata da
experiência pessoal do antropólogo baseada em critérios científicos. Problema evidenciado
pelo

[...] uso do tempo presente e da terceira pessoa, impessoal e distanciada do


objeto, de modo tal que „a realidade das situações discursivas e dos
interlocutores individuais é filtrada‟ e „os aspectos dialógicos, situacionais,
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da interpretação etnográfica tendem a ser banidas do texto representativo
final‟ (CLIFFORD, 1998, p. 42 apud VERSIANNI, 2002, p. 66).

A pesquisadora brasileira Daniela Beccaccia Versianni (2002) indica que a discussão


relacionada às escritas de si no campo da antropologia, está associada a uma discussão maior,
de alcance epistemológico relativo ao emprego de uma perspectiva pós-moderna aos estudos
antropológicos e que evidencia uma atitude de não negação da experiência pessoal
observável. Trata do entendimento de que textos auto reflexivos devem ser tratados em sua
complexidade, historicidade e singularidade de selves resultantes de um conjunto de
subjetividades (vozes) que dialogam em um texto (textura) coletivo.
A etnografia tem origem nas ciências sociais e é entendida como método de pesquisa
que valoriza a dimensão sociocultural dos acontecimentos estudados. Como característica,
“não consiste apenas em coletar, através de um método estritamente indutivo uma grande
quantidade de informações, mas em impregnar-se dos temas obsessionais de uma sociedade,
de seus ideais, de suas angústias” (LAPLANTINE, 1996, p.149), o que justifica o fato de o
método ser significativamente utilizado por antropólogos. A partir dessa compreensão inicial
sobre o método etnográfico, Versianni (2005) escreve acerca do neologismo possivelmente
vislumbrado na palavra autoetnografia, o qual teria sido proposto para caracterizar uma forma
diferente de etnografia em que, segundo o autor, o prefixo auto serviria para

Impedir a tendência à supressão das diferenças intragrupos, enfatizando as


singularidades de cada sujeito – autor, enquanto o termo etno localizaria,
parcial e pontualmente, estes mesmos sujeitos em um determinado grupo
cultural. Assim poderíamos pensar em autoetnografias como espaços
comunicativos e discursivos através dos quais ocorre o „encontro de
subjetividades‟, a interação de subjetividades em diálogo. (VERSIANNI,
2005, p. 87)

Logo, observação e descrição seguem presentes. Contudo, o pesquisador passa a


compreender-se também como parte do seu foco de estudo. Ou seja, a autoetnografia “[...] se
caracteriza por uma escrita do “eu” que permite o ir e vir entre a experiência pessoal e as
dimensões culturais a fim de colocar em ressonância a parte interior e mais sensível de si”
(FORTIN, 2009, p. 83). Trata-se de uma narrativa formada sobre as bases de uma experiência
singular e sensível que considera o caráter múltiplo da realidade em construção e expõe as
diversas vozes que atravessam e constituem essa experiência procurando, necessariamente,
confrontá-la com um olhar crítico.
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Nesse sentido, podemos dizer que a investigação autoetnográfica, ao combinar
elementos da autobiografia e da etnografia, metodologicamente, procura entender a
experiência (individual) narrada como uma experiência culturalmente inscrita. Com esse
objetivo, o pesquisador lança um olhar analítico sobre sua experiência, de modo a confrontá-
la com os atravessamentos culturais que nela se dão, a partir de relatos próprios, entrevistas
com terceiros, fotografias ou documentos.
Não podemos esquecer que o processo de construção da identidade de si e do outro se
dá por meio da interação dos sujeitos consigo, com o outro e com o meio e que compreende
os sentidos e significados de suas ações e atividades culturais. Jogo que envolve as dimensões
teórico-metodológica, ética, política e, no caso da arte, estética. Ao se posicionar no processo
de construção do discurso, o sujeito, necessariamente, se engaja na criação de significações.
Isso acontece porque, quando interagimos nos posicionamos e posicionamos o outro a partir
da nossa perspectiva, como estratégia de construção da realidade e desejo de controlar o modo
como o outro o vê.
Lugar fronteiriço, a autoetnografia surge no próprio ato investigativo, à medida que o
pesquisador, ao investir no registro e na sistematização, realiza suas auto narrativas, analisa e
interpreta os fenômenos reconhecidos no universo em estudo. Seu caráter dinâmico possibilita
a construção de uma rede de reflexões de um sujeito singular, em determinado contexto sobre
abordagens, processos e fenômenos específicos. Reflexões e considerações apenas provisórias
porque não tem a pretensão de guardar verdades absolutas, apenas ampliar possibilidades de
discussão acerca dos processos de criação em arte. Ainda segundo Fortin (2009, p.83), isso se
dá porque contribui para o entendimento de que “a história pessoal deve se tornar o trampolim
para uma compreensão maior”. Ou seja, é preciso que haja um cuidado para que a pesquisa
não se reduza apenas à experiência do pesquisador, tornando-se um discurso egocêntrico e
esvaziado, que poderia empobrecê-la. Ao contrário, a experiência deve ser uma forma de
potencializar a pesquisa, apresentando outras perspectivas sobre um tema, ao mesmo tempo
em que a autora lembra que não há como um discurso ser neutro, afinal, o pesquisador o
desenvolve, também, a partir de suas percepções.
As questões metodológicas relacionadas ao processo de criação em arte são importantes
porque apontam para a reflexão acerca da necessidade do artista pesquisador-experimentador
tomar para si a responsabilidade pela construção de sua própria episteme, no sentido de
esforço na elaboração de instrumentos práticos e teóricos capazes de lidar com as questões
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pertinentes aos seus processos e procedimentos sem reduções dicotômicas, mas de modo
complexo e processual.
A busca por modelos alternativos, elaborados a partir da ideia de subjetividade
construída de modo relacional e dialógica pode deslocar o foco da “autoridade” (pesquisador,
artista, encenador) para a produção de saberes plurais, que abrangem e negociam com
diferentes visões de mundo.
Neste trabalho, me proponho a problematizar os procedimentos que envolvem meus
processos de subjetivação no experimento, assim como do dispositivo elaborado para esse fim
e que se configura como a própria encenação, com suas metodologias e finalidades. Estratégia
adotada para procurar entender a construção da subjetividade e do próprio conhecimento
como relacionais, intersubjetivos e dinâmicos.
Assim espero contribuir com as reflexões voltadas para a construção de uma episteme
do conhecimento prático e teórico no campo da arte e, especificamente do teatro, que seja
singular, de cada sujeito, tendo em vista os processos cada vez mais fragmentados e
multirreferenciais da arte, o que evidencia pelo seu caráter experimental, singular, contextual.

REFERÊNCIAS

BONDÍA, Jorge LARROSA. Pedagogia profana: danças, piruetas e mascaradas. Belo


Horizonte: Autêntica, 1999.
______. Notas sobre a experiência e o saber da experiência. Revista Brasileira de Educação,
Rio de Janeiro, n. 19, p. 20-28, jan./abr. 2002.
FORTIN, Sylvie. Contribuições possíveis da Etnografia e da Autoetnografia para a pesquisa
na prática artística. In: Revista Cena. Porto Alegre: Programa de Pós Graduação em Artes
Cênicas – Instituto de Artes da UFRGS, n.7, 2009.
FOUCAULT. Michel. “A escrita de si”. Ditos e escritos. Vol. V. Ética, sexualidade e
política. Rio de Janeiro: Forense, 2004.
LAPLANTINE, F. Aprender antropologia. São Paulo: Brasiliense, 1996.
PICON-VALLIN, B. Teatro híbrido, estilhaçado e múltiplo: um enfoque pedagógico. Sala
Preta, v. 11, n. 1, dez. 2011. p. 193-211
VERSIANNI, Daniela Beccaccia. Autoetnografia: uma alternativa conceitual. Letras de hoje.
Porto Alegre, v.37, nº 4, p. 57-72, dezembro 2002.
______. Autoetnografias: conceitos alternativos em construção. Rio de Janeiro: 7Letras,
2005.

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