Anda di halaman 1dari 16

VI Encontro Nacional sobre o Ensino de Sociologia na Educação Básica

06 a 08 de julho de 2019

Grupo de Trabalho: Percepções, representações e situações de violências no


ambiente escolar e seu entorno social

Título do Trabalho “E se me chamarem de bichinha?! E se me chamarem de


sapatão?!” O bullying homofóbico na sala de aula

Thales do Amaral Santos – Escola Estadual Nossa Senhora do Belo Ramo

Vitória Beatriz de Araújo – Escola Estadual Cândido Portinari de Belo


Horizonte

Paulo Henrique de Queiroz Nogueira - Universidade Federal de Minas Gerais


“E se não me autorizarem a utilizar o banheiro feminino?“
“Você vai colocar no mural a bandeira desse tamanho?!”
O bullying LGBTfóbico no ambiente escolar e uma proposta de intervenção
nas aulas de Sociologia

Resumo
A escola tem se tornado cada vem mais um espaço para o encontro das diferenças,
entretanto não está preparada para lidar com todas as diversidades que se encontram
em seu espaço, em destaque as identidades LGBTQIA+. Este texto não se propõe a
debater profundamente sobre a LGBTfobia em sala de aula, nem trazer uma receita
pronta para que educadoras/es implementem. Aqui nos propomos a sensibilizar, a
problematizar, a instigar, a mobilizar educadoras/es, principalmente da área da
sociologia, a partir da construção da nova BNCC para que trabalhem a temática e
oferecer algumas ferramentas. Apesar do contexto em que vivenciamos, ameaça da
perda de direitos de pessoas LGBTQIA+, queremos pensar em como nos
instrumentalizar, inclusive juridicamente, para que a escola seja um espaço de luta,
em que nós, professoras e professores possamos resistir e trabalhar temáticas tão
importantes e que podem inclusive salvar vidas. As nossas e de nossas/os alunas/os.

“E se não me autorizarem a utilizar o banheiro feminino?”

Estudante 1: ...estava faltando esses dias pois estava fazendo as coisas pra […] começar
minha terapia hormonal.
Professor: Que sucesso! Parabéns!
Estudante 1: Obrigada, Professor... aquele dia que você me referiu no feminino na sala,
aquilo me fortaleceu mais pra continuar com isso. […] Irei dar um tempo na escola, para
me entender melhor, então creio que não me verá mais na escola... preciso de tempo
para lidar comigo mesma e toda a transição que vem pela frente. […] penso em dar um
tempo [...] e voltar ano que vem, pois até lá eu vou está com muita coisa resolvida, agora
na escola não sei como as pessoas iram lidam (sic) comigo usando um banheiro feminino,
prevejo muito preconceito e muita intolerância, isso são os motivos no qual tem mais de
3 semanas que não vou a aula. Mas vou pensar bem sobre, no momento os nervos estão
à flor da pela, mas irei optar para o que favorecer minha saúde mental e física.

Esta é uma conversa que se deu pelas redes sociais entre uma aluna transgênero do
2º ano do Ensino Médio e eu, professor de sociologia, de uma escola pública da rede
estadual de Minas Gerais. A aluna relata sobre seus medos e a necessidade em se
distanciar da escola no início do processo de transição, marcado pela hormonização.
A partir do diálogo nos chama a atenção a escola sendo apresentada, ao mesmo
tempo enquanto um ambiente que pode ser extremamente violento para algumas
pessoas, por não aceitar sua identidade de gênero e que, por outro lado, um espaço
acolhedor, e que não só aceita as diferenças, como as valoriza e estimula que
alunas/es sigam seu caminho, em liberdade. Quando a aluna comenta sobre a
importância do professor se referir a ela no feminino, identidade de gênero com a qual
ela se identifica, nos mostra como um ato simples da escola pode trazer consigo um
grande significado de apoio e cuidado para estudantes.

Contudo, a aluna demonstra que por medo de não saber como a escola lidará com
sua transição, por prever preconceito e intolerância está a mais de 3 semanas
afastada da sala de aula. Infelizmente essa é a realidade de muitas pessoas que
nasceram em um corpo lido pela sociedade por um gênero com o qual não se
identificam. É importante destacar que a transição a que a aluna se refere está
associada aos procedimentos físicos, psicológicos e sociais na construção do gênero
com o qual a pessoa se identifica, podendo estar associado ao manejo de hormônios
e bloqueadores hormonais, processos cirúrgicos como a neofaloplastia, a
histerectomia, a mastectomia, implante de silicones, entre outros...

No intuito de apoiar ainda mais essa aluna e pensar em uma solução para que ela
não se prive de seu direito a estudar, a estar na escola e concluir seus estudos,
busquei junto a outras alunas trans possíveis respostas, o que dizer, como apoiar.
Uma das respostas recebidas me chamou muita atenção:

Ex aluna trans: Pergunto isso pois por mais que queremos nos tornar quem somos, o
sistema educacional ainda não está bem preparado pra gente (pessoas trans). Se ela tiver
em reta final do ensino médio (que imagino pela idade) eu esperaria um pouquinho mais
e terminaria a escola e após esse período acabar, colocaria em prática o amor próprio e
de fato faria a transição que foi exatamente o que eu fiz. Professor eu queria ter feito a
minha transição desde mais nova, quando já me identificava enquanto trans mas o mundo
não são um mar de rosas, ele é cruel, ainda mais quando se refere a uma população
minoritária. Eu fiz um alto sacrifício em esperar a transição e deixar para depois do ensino
médio. O processo de mudança durante o ensino médio vai ser um misto de sensações
e tudo irá fluir positivamente dependendo do meio em que ela vive. A família aceita? Os
amigos a entendem e lidariam bem com isso? A escola respeitaria o nome social? Poderei
usar o banheiro de acordo com o meu gênero? Como vou lidar com as modificações
corporais? Será que vou suportar toda a carga emocional acarretada pelo uso de
hormônios (vai mudar e muito não só o físico, mas o mental também) para suportar tudo
isso e estudando? Eu decidi esperar um pouquinho e iniciei após o meu ensino médio e
não me arrependo muito por isso pois eu já imaginava pelo que eu passaria o que não
seria tão legal. Mas nesse caso, acho que não devemos apontar/dizer o que ela deve ou
não e sim apoiá-la qualquer que seja a sua decisão.
A resposta traz em si uma importante forma de educadoras/es responderem a
situações em que estudantes apresentam questões complexas e delicadas: apoiar
qualquer que seja a sua decisão. Ao mesmo tempo que ela nos chama a atenção ao
fato de que para a ex aluna, foi necessário esperar a conclusão para colocar em
prática o amor próprio e iniciar a transição.

Esse é um debate extremamente importante, mas este texto não se propõe a discutir
de forma profunda sobre a LGBTfobia em sala de aula. Nem trazer uma receita pronta
para que educadoras/es de todo o Brasil implementem no seu ambiente de trabalho
com o intuito de construir escolas abertas às diversidades de gênero e sexuais. Aqui
nos propomos a sensibilizar, a problematizar, a instigar, a mobilizar educadoras,
principalmente da área da sociologia, a partir da construção da nova BNCC para que
trabalhem a temática e oferecer algumas ferramentas. Apesar do contexto em que
vivenciamos a ameaça da perda de direitos de pessoas LGBTQIA+, queremos pensar
em como nos instrumentalizar, inclusive juridicamente, para que a escola seja um
espaço de luta, em que nós, professoras e professores possamos resistir e trabalhar
temáticas tão importantes e que podem inclusive salvar vidas. As nossas e de
nossas/os alunas/os.

O caso relatado na abertura deste artigo é apenas um dos vários casos sobre
violências contra pessoas LGBTQIA+ dentro das escolas de todo o Brasil. Em 2016
a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais –
ABGLT publicou um relatório com os resultados da Pesquisa Nacional sobre
Estudantes LGBT e o Ambiente Escolar, desenvolvida a partir de 1016 pessoas
respondentes. A pesquisa foi realizada em cinco países latino-americanos, além do
Brasil: Uruguai, Argentina, Chile, Peru e Colômbia, por meio de questionários
preenchidos online, com o intuito de coletar informações para fundamentar projetos
educacionais e políticas públicas, possibilitando construir ambientes mais seguros e
acolhedores para estudantes LGBTQIA (ABGLT, 2016). Os resultados, de uma forma
geral, nos lembram sobre o fato já amplamente divulgado em redes sociais e na mídia
como um todo de que vivemos no país que mais se mata pessoas LGBTQIA no
mundo (BRASIL DE FATO, 2019). É uma pesquisa que merece uma leitura atenta
por todos profissionais que lidam direta ou indiretamente com estudantes, mas
gostaria de destacar alguns dados que nos auxiliam na construção deste trabalho.
Apenas 30,9% das/os estudantes responderam que nunca ouviram comentários
LGBTIfóbicos feitos por professoras/es ou funcionários da instituição educacional em
que estavam matriculadas/os. Isso significa dizer que em cada três estudantes
brasileiras/os (69,1%), dois relatam ouvir violências verbais contra pessoas
LGBTQIA+ com as frequências raramente, frequentemente, às vezes ou sempre,
como nos mostra o Gráfico 1, sendo que, na maior parte das vezes na presença de
um/a professora/or ou funcionaria/o da escola presente. Um total de 65,0% relatou
que as violências ocorreram na presença de um/a profissional da escola.

GRÁFICO 1: FREQUÊNCIA COM QUE FORAM OUVIDOS COMENTÁRIOS


LGBTFÓBICOS FEITOS POR PROFESSORAS/ES OU FUNCIONÁRIAS/OS DA
ESCOLA

GRÁFICO 2: FREQUÊNCIA COM QUE PROFESSORAS/ES OU


FUNCIONÁRIAS/OS DA ESCOLA ESTAVAM PRESENTES QUANDO
COMENTÁRIOS LGBTFÓBICOS FORAM FEITAS NA INSTITUÇÃO

Nos chama a atenção o fato de que mais da metade das/os alunas/os (53,9%)
afirmaram que não houve nenhuma intervenção de profissionais da escola, e 36,2%
disse que nenhum/a outra/o estudante interveio quando comentários lgbtfóbicos
foram feitos.

Esses dados estatísticos nos impactam, entretanto acho importante compartilhar um


dos registros de Francisco Cláudio Gonçalves em sua pesquisa intitulada Homofobia
na escola: desvelando olhares, revelando vozes. O pesquisador, buscando mapear a
representação de educadores sobre as violências em relação a estudantes LGBTQIA
questionou algumas/alguns professoras/es sobre determinadas cenas, uma delas um
menino sendo vítima de homofobia por outras/os colegas. Uma das falas nos chamou
muito a atenção:

Interpelado, o professor Camilo classificou a cena como ridícula, afirmando


que os alunos não devem hostilizar o colega em razão de sua opção
sexual, pois foi o jeito que ele escolheu para viver. Aduziu o professor que
caso se deparasse com situação análoga na escola onde trabalha somente
interviria se fosse solicitado pela possível vítima, uma vez que ela optou
por viver daquela forma, pois não acredita que a homossexualidade
decorra de fatores genéticos e sim de opção, conforme reproduzimos na
íntegra. (GONÇALVES, 2014, p. 90)

Nas palavras do próprio professor entrevistado:


Ridículo, não se pode fazer isso. É a maneira que ele escolheu de viver,
pois não será eu e nem outra pessoa que irá determinar o que ele deve
escolher. Caso me perguntasse se está certa ou errada quanto a sua
prática. Com relação ao comportamento dos demais alunos, só me
pronunciaria se solicitado, pois eu acredito que isso (homossexualidade)
não é genética e sim escolha de viver desse jeito. (Camilo, Escola “A”,
intervenção: 08 mar. 2014. (GONÇALVES, 2014, p. 90)

A partir desta fala, ao analisar termos como opção sexual, se referindo a orientação
sexual do estudante, o professor demonstra desconhecimento sobre a temática, além
de que desconhece as consequências e motivações para o bullying com motivação
homofóbica.

Dentre as pessoas respondentes, 11,9% destacaram que nenhum/a professora/or ou


outras/os funcionárias/os acolhem estudantes LGBTQIA+ dentro da instituição de
ensino, nos mostrando que um número significativo de estudantes se sente
desamparada/o. Outro dado que nos alerta sobre a importância em se abrir espaços
mais acolhedores dentro das instituições de ensino para as pessoas LGBTQIA+ é o
fato de que a maioria das/os estudantes (57,6%) nunca denunciaram incidentes de
agressão e violência para profissionais da escola.
GRÁFICO 3: FREQUÊNCIA DA INTERVENÇÃO POR PROFISSIONAIS DA
ESCOLA OU ESTUDANTES QUANDO COMENTÁRIOS LGBTFÓBICOS FORAM
FEITOS

Na sessão seguinte, nos propomos a apresentar a professoras e professores de


sociologia uma proposta de intervenção nas aulas, ao mesmo tempo em que
apresentamos ferramentas importantes para apoiar o nosso trabalho, no caso de
alguma pessoa lgbtfóbica nos oportunar.

“Você vai colocar no mural a bandeira desse tamanho?!”

O fundamental é que alguém faça algo. Que drible a razão com o seu fazer, como o frango
sem cabeça. O frango começa a correr tarde demais, quando já cortaram a cabeça dele.
De que servia ter a cabeça se ele se deixou agarrar e agora, quando o decapitaram, corre
feito um condenado? Se a sua cabeça faz você perder a cabeça, corta e cai fora antes
que te peguem. Se o poder usar a razão como mecanismo de controle, eles vão te
decapitar em nome da razão; se a homofobia for te decapitar para você não perder a
cabeça, você mesmo deve cortá-la e atirar neles (VIDARTE, 2019, p 121).

Em 2018, as escolas já vivenciavam as previas das eleições presidenciais, com


estudantes acompanhando discursos legitimamente homofóbicos de diversos
candidatos e candidatas a cargos políticos, inclusive à presidência da república.
Eu, enquanto professor de sociologia de uma escola pública da capital mineira,
estado da tradicional família mineira, trabalhei com estudantes um projeto
denominado Projeto Orgulho LGBT, no mês de junho, em comemoração ao dia
Internacional do Orgulho LGBTI (28 de junho). Como finalização das nossas
atividades, estudantes deveriam expor mensagens construídas no intuito de
responder à frases homofóbicas. Construímos o mural com as cores da bandeira
LGBTQIA+. A supervisora do Ensino Integral, do Ensino Médio, ao ver o mural e
saber que se tratava da bandeira do orgulho LGBTQIA+ questionou: “Você vai
colocar no mural a bandeira desse tamanho?! Estamos em uma escola com uma
comunidade evangélica muito grande. Isso vai nos trazer muitos problemas”.

Mesmo com o projeto pré-aprovado pela direção da instituição em que eu


trabalhava, tivemos que cancelar a construção do mural. Chamaram uma reunião
com toda a equipe pedagógica e indicaram que seria um projeto a ser
implementado futuramente, em conjunto com toda a escola “por causa da
importância do projeto”. Nunca mais o assunto fora trabalhado pela coordenação.

Tal acontecimento me trouxe dois importantes aprendizados: a importância em se


repensar a forma como apresentamos temas polêmicos para a escola, ao mesmo
tempo que precisamos, enquanto professoras/es de sociologia nos equipar com
legislações e outras ferramentas que possam legitimar o nosso trabalho.

No caso das estratégias em como apresentar temas polêmicos de forma a serem


bem vindos no ambiente escolar, podemos pensar as temáticas LGBTIQ dentro do
contexto do bullying, palavra já aceita e amplamente divulgadas. Dan Olweus foi o
primeiro pesquisador a apresentar o conceito bullying. Ao perceber um elevado
número de crianças e jovens se suicidando dentro do ambiente escolar, percebeu
que tais acontecimentos estavam associados a ações repetitivas de preconceito.
Ações contra uma mesma vítima, agressões num período contínuo, com
desequilíbrio de poder entre a pessoa agressora e a vítima. Esteves (2015, p.41)
diz ainda que:

O bullying é um tipo específico de violência escolar entre pares, caracterizado por


comportamentos violentos que envolvem atitudes hostis. Essas atitudes podem violar
a integridade física e psicológica dos estudantes, mediante práticas agressivas,
intencionais, repetitivas e assimétricas. As motivações para o bullying não são
racionalmente justificáveis e exprimem sentimentos de intolerância a diferença. Por
essas singularidades não podem ser confundidas como simples brincadeiras.

Tal conceituação chama a atenção para a necessidade de se destacar as causas e


consequências do bullying diferenciando-o de outros tipos de agressões e
brincadeiras eventuais, possibilitando entendê-lo como um processo que pode trazer
resultados indesejados para a formação humana, tanto do agressor quanto da vítima
e das testemunhas envolvidas.
Pensá-los enquanto categoria específica de uma violência relacionada as agressões,
sejam elas físicas, verbais ou psicológicas, dentro do ambiente escolar se mostra
importante para que se pense no problema e em suas soluções específicas para a
escola. É importante este debate, uma vez que em determinados momentos
pesquisadores/as e pessoas envolvidas com a escola possam defender a ideia de
que o bullying é apenas um novo nome que tem sido utilizado para as diferentes
formas de preconceito e discriminação, um novo nome para uma violência presente
há muito tempo na sociedade. Infelizmente temáticas como a violência contra a
orientação sexual de estudantes, identidade de gênero e outros assuntos polêmicos
encontram grande dificuldade em entrar na escola e estar presente nas salas de aula,
entretanto, enquanto categorizado enquanto bullying, tem uma maior facilidade e
abertura no espaço escolar.

Outro aprendizado com a fala da supervisora, reprimindo o mural LGBT, está


associado às ferramentas legais que auxiliam o nosso trabalho enquanto professoras
e professores de sociologia. O documento que orienta o trabalho de educadoras e
educadores de sociologia atualmente é a Base Nacional Comum Curricular (BNCC),
com suas habilidades e competências.

Conforme definido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei nº


9.394/1996), a Base deve nortear os currículos dos sistemas e redes de ensino das
Unidades Federativas, como também as propostas pedagógicas de todas as escolas
públicas e privadas de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, em todo
o Brasil. A Base estabelece conhecimentos, competências e habilidades que se espera
que todos os estudantes desenvolvam ao longo da escolaridade básica. Orientada pelos
princípios éticos, políticos e estéticos traçados pelas Diretrizes Curriculares Nacionais da
Educação Básica, a Base soma-se aos propósitos que direcionam a educação brasileira
para a formação humana integral e para a construção de uma sociedade justa,
democrática e inclusiva. (Ministério da Educação, 2019)

Sendo assim, ao analisar a BNCC, identificamos enquanto habilidade que responde


a importância em se trabalhar a temática LGBT nas aulas de sociologia:
(EM13CHS502) Analisar situações da vida cotidiana, estilos de vida, valores, condutas
etc., desnaturalizando e problematizando formas de desigualdade, preconceito,
intolerância e discriminação, e identificar ações que promovam os Direitos Humanos, a
solidariedade e o respeito às diferenças e às liberdades individuais. (BRASIL, 2019)
Dessa forma, torna-se legítimo a temática LGBT dentro das aulas de sociologia. E
ao mesmo tempo:
A Constituição Federal de 1988 dedica oito princípios constitucionais ao ensino,
fundamentais e imutáveis (cláusulas pétre-as), dois dos quais são essenciais na defesa
de professoras, professores, escolas e universidades contra a pretensão de censura de
qualquer tipo: liberdade acadêmica e o pluralismo de ideias.
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: (...)
II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamen- to, a arte e o saber;
III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições
públicas e privadas de ensino;

É preciso que educadoras/es conheçam tais ferramentas e as utilizem em espaços


institucionais. Em momentos como o qual vivenciamos, a repressão de temas
importantes por uma questão ideológica deve ser respondida a partir da legislação,
da conquista de direitos resultado da luta de muitos movimentos sociais.

Por quê os movimentos conservadores se incomodam tanto com o fato de


trabalharmos identidade de gênero e orientação sexual nas aulas? Eu acredito que
a resposta está na reflexão apresentada por Judith Butler, em seu livro “Corpos em
aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de Assembleia”: a
realidade das identidades de gênero e orientação sexual dissidentes do padrão cis
hetero normativo questiona a existência da norma, a colocam como falsa, como algo
que não consegue ser alcançado (BUTLER, 2018). E existe um grande problema em
realidades que ocorrem fora da norma estabelecida, percebemos que a norma é um
constructo social, passível de ser questionada e derrubada, o que é uma grande
questão para movimentos conservadores.

As pessoas que trabalham na escola, como um todo, estão acostumadas a um jeito


de fazer heteronormativo, ou seja, guiado por normas e regras que reproduzem a
ideia de que homens e mulheres são diferentes, chegando a oposição, e por isso se
complementam e precisam estar juntos/as sexualmente, desqualificando outras
possibilidades. Esse fenômeno se materializado dentro da escola pelo uso constante
de vocábulos sempre no masculino: alunos, professores, diretores, administradores,
mesmo em um ambiente majoritariamente ocupado por mulheres. Outra
exemplificação se dá pelos discursos discentes, pelos livros didáticos e materiais
pedagógicos, sempre apresentando experiências heterossexuais. A
homossexualidade é apresentada como um exemplo específico quando se fala em
homossexualidade, ou em diversidades, nunca como o normal, cotidiano (BRAGA,
2014).

Na pesquisa da ABGLT (2016) apresentada anteriormente, uma das perguntas


destaca a falta de conteúdos LGBTQIA+ dentro do ambiente escolar. Entre as
pessoas entrevistadas que afirmaram identificar em docentes o trabalho da temática
LGBT de forma positiva, sociologia foi a matéria mais frequente, seguida de história
e português, Tabela 1.

TABELA 1 – Matérias em que discentes aprenderam sobre temas LGBT1

Aprenderam coisas positivas Temas LGBT foram


(n=270) abordados (n=1016)
Sociologia 65,6% 17,4%
História 43,3% 11,5%
Português 31,1% 8,3%
Biologia 19,3% 5,1%
Artes 16,7% 4,4%
Filosofia 11,9% 3,2%
Língua Estrangeira 11,1% 3,0%
Ciências 9,3% 2,5%
Educação Física 8,5% 2,3%
Psicologia 7,0% 1,9%
Matemática 5,9% 1,6%
Música 3,3% 0,9%
Outras 14,1% 3,7%

Dessa forma, com todas as informações apresentadas, acreditamos que está


negritada a importância da sociologia em se trabalhar temáticas LGBTQIA+ nas
salas de aula. Gostaríamos de sugerir uma oficina para que seja utilizada enquanto
apoio ao trabalho de educadoras/es da sociologia.

Objetivos da oficina: - Identificar as diferentes manifestações de bullying com


motivação homofóbica no ambiente escolar. – Compreender o bullying com
motivação homofóbica como um tipo de violência presente na escola – Propor
estratégias para que a escola seja um ambiente agradável para pessoas LGBTs.

1º momento – Sensibilização (45 min): Construção de Personagem

Esta atividade permite que alunas/os reflitam sobre a construção social das
identidades de gênero masculina e feminina a partir de situações concretas,
tradicionalmente associadas aos homens ou às mulheres em nossa sociedade. A
partir dela, pretende-se desvelar o caráter de cultural do gênero, produzido a partir de

1Visto que os/as entrevistados/as puderam selecionar várias respostas, as categorias não são
mutuamente exclusivas. Portanto, os porcentuais não somam 100%.
lógicas machistas e sexistas que transformam as diferenças sexuais entre homens e
mulheres em desigualdades de gênero.

Materiais

• bonecos de tamanho humano desenhados em papel kraft


• Fichas contendo afirmações/comportamentos/expectativas sobre os sujeitos
• Fita adesiva para fixar as fichas

Estudantes são divididos em grupos de no máximo 6 pessoas. Cada grupo recebe a


representação de uma pessoa e um grupo de palavras. A orientação a ser repassada
é a de que cada grupo deverá criar uma pessoa, escolher quais palavras entram ou
não definindo suas características. A ideia é que produzam esse sujeito a partir das
informações disponíveis. Podem, inclusive, escolher nomes para as pessoas.

- gosta de futebol - é pegadorx - bebe muito - bissexual


- gosta de cozinhar - é agressivx - tem ótimo raciocínio - homossexual
lógico
- quer ter filhxs - explode por qualquer - assexual
coisa - gosta muito de ler
- não quer ter filhxs - cisgênerx
- gosta de dançar - é inteligente
- trai com frequência - transgênerx
- é delicadx - é esforçadx
- é sensível - pênis
- quer ser policial - faz ginástica
- chora à toa - vagina
- quer ser enfermeirx - heterosexual
- é muito ágil

Construção de Personagem Personagem construído por alunas/os Personagem construído por alunas/os

Cada grupo é convidado a apresentar suas pessoas. Neste momento é importante a


escuta da/o professor/a para que consiga perceber o momento correto em intervir
sobre a construção dos conceitos de identidade de gênero e orientação sexual. Ao
mesmo tempo que é importante trazer para a roda, o debate sobre a construção do
gênero a partir de determinadas características. Vale a pena estar atenta/o na posição
em que as palavras foram apresentadas nas/os personagens, para entender se o
grupo associa o gênero ao órgão genital, ao coração, ao pensamento, por exemplo.
São informações que nos chamam atenção e importantes para intervenções.

2º momento – Aprofundamento (45 min): Esta etapa pode ser trabalhada tanto
com um texto redigido no quadro, como um texto impresso. É importante definir os
conceitos de Identidade de Gênero, Cisgênera/o, Transgênera/o, Não binária,
Queer, Orientação Sexual, Homossexual, Heterossexual, Bissexual, Assexual, caso
apareçam outros conceitos entre estudantes, é importante não silenciá-los, e
apresentá-los no quadro/texto, e destacar que se trata de uma construção de
identidades, novas identidades e orientações podem surgir, e consequentemente,
novas nomenclaturas. Não é uma aula fácil, por se tratar de uma temática que
carregada de preconceitos entre estudantes, é importante inclusive que toda
expressão preconceituosa que aparecer seja problematizada. Caso você tenha
alguma dificuldade em trabalhar esses dois conceitos, sugerimos consultar o livro
Diversidade sexual na escola, trabalho coordenado por Alexandre Bortolini e
publicada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Outra sugestão é trabalhar
com o biscoito do gênero:
3º momento – Compromisso (45 min): Cada grupo deverá confeccionar dois
cartazes para serem colocados nos espaços da escola, inclusive na sala das/os
professoras/es com uma mensagem para uma escola/educação menos LGBTfóbica.
Indicamos 25 minutos para confeccionar os cartazes e 20 minutos para apresenta-
los à turma e afixá-los na escola.

Uma outra atividade a ser construída, enquanto compromisso, é a criação de uma


cruzadinha com os conceitos trabalhados nas aulas sobre a temática LGBTQIA+.
A/o professora/or apresenta um exemplo no quadro, para que estudantes possam
conhecer a metodologia. Depois cada estudante cria sua própria cruzadinha:

4º momento – Avaliação (45 min): A/o professora/or deverá questionar as/aos


participantes quais foram os principais aprendizados com a oficina e o que será
levado para a trajetória pessoal. Caso seja necessário a construção de uma
avaliação, sugerimos utilizar uma das cruzadinhas confeccionadas pelas/os
estudantes e inclui-las enquanto avaliação.

A metodologia utilizada para a construção deste ciclo de aulas está associada às


Oficinas Pedagógicas. Indicamos a leitura do artigo “E se me chamarem de bichinha?! E
se me chamarem de sapatão?! O bullying homofóbico em sala de aula, escrito por Thales do
Amaral Santos e Marília Soares Nascimento.

A sociologia tem o privilégio de trabalhar com temas importantes para a construção


de identidade de nossas alunas e alunos. Silenciar determinadas temáticas no
ambiente escolar é uma violência para as juventudes. É um trabalho desafiador com
um retorno extremamente gratificante. Não estamos sozinhas/os nessa luta e temos
várias ferramentas e profissionais para nos auxiliar. De alguma forma, é um
compromisso na construção de uma sociedade melhor, de um mundo com mais
respeito às diferenças.

“o que eu posso te dizer com minha experiência dentro da minha escola, é


que eu sofro mais homofobia com os funcionários públicos que trabalham
diariamente dentro da escola, do que com os próprios alunos, é muito difícil
achar algum aluno ou colega da minha idade vim com comentários ou
qualquer coisa abusiva para ofender, mas dentro da escola os funcionários
que trabalham diariamente lá com a gente sempre tem algum tipo de
comentário ofensivo opressor, às vezes faz aqueles comentários bem
homofóbicos "discretos" tipo: "não é só você que eu xingo" "eu não tenho
nada contra mas Mantenha se preservado" "se Preserve mais" umas
coisas assim, fala que vai chegar até da ocorrência alguma suspensão
dentro da escola, por estar tendo algum tipo de afeto com alguém do
mesmo sexo” Aluna do 3 ano do Ensino Médio de uma escola pública de
Belo Horizonte

Bibliografia

ABGLT. Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e


Transexuais. Secretaria de Educação. Pesquisa Nacional sobre o Ambiente
Educacional no Brasil 2015: as experiências de adolescentes e jovens lésbicas,
gays, bissexuais, travestis e transexuais em nossos ambientes educacionais.
Curitiba, 2016.
BORTOLINI, Alexandre. (Coord.). Diversidade sexual na escola. Rio de Janeiro:
Pró-Reitoria de Extensão/UFRJ, 2008.
BRAGA, Keith Daiani da Silva. Homofobia na escola: análise do Livro de Ocorrência
Escolar. 2014.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular: Brasília, DF:
MEC, 2017. Disponível em:< http://basenacionalcomum.mec.gov.br/>. Acessado em
29 de Junho de 2019.
BRASIL DE FATO. Ano após ano, Brasil segue na lista dos países que mais mata
LGBT's. Recife (PE). Disponível em:<
https://www.brasildefato.com.br/2019/06/28/editorial-or-ano-apos-ano-brasil-segue-
na-lista-dos-paises-que-mais-mata-lgbts/>. Acessado em 29 de Junho de 2019.
BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria
performativa de assembleia. Editora José Olympio, 2018.
ESTEVES, Pamela Suélli da Motta. “A escola não é um ligar fácil... não mesmo!:
bullying, não reconhecimento da diferença e banalidade do mal. 268 f. Tese
(Doutorado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio
de Janeiro. 2015.
GONÇALVES, Francisco . Claudio. Homofobia na escola: desvelando olhares,
revelando vozes. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade do Estado do
Rio Grande do Norte. Programa de Pós-Graduação em Educação. 2014.
OLWEUS, Dan. Bullying among school children. In K. Hurrelmann & F. Loesel
(Eds.), Health hazards in adolescence (pp. 259–297). Berlin, Germany: Walter
De Gruyter. 1990.
SANTOS, Thales Amaral; NASCIMENTO, Marília Soares. “E se me chamarem de
bichinha?! E se me chamarem de sapatão?!” O Bullying homofóbico em sala de
aula. SCIAS. Direitos Humanos e Educação, v. 1, n. 1, p. 134-147, 2018.
VIDARTE, Paco. Ética Bixa: Proclamaçoes libertárias para uma militância LGBTQ.
1ª Edição. São Paulo: N-1 edições, 2019.

Anda mungkin juga menyukai