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Das Excelências do Voto Vencido

I– O critério da verdade sabemos todos que não é o número, senão


a qualidade. Os méritos de um só não raro podem suprir ou
compensar a deficiência de muitos. Isto de ser único ou singular não
desmerece; tampouco serve sempre de bitola de louvor o copioso.
Onde há unanimidade (e talvez maioria) aí também se acha, em
princípio, o melhor e o mais digno de estimar. É a regra geral.
Advirta-se muito, porém, que às vezes o singular é o que triunfa do
coletivo, e o indivíduo o que avulta na multidão.

II – Na linguagem forense bem se conhece a expressão voto vencido,


designativa daquele que “é dado em desacordo com os votos vitoriosos, ou que
decidem a questão”(1). É “o voto que não acompanha a maioria do tribunal”(2).
As deliberações, nos tribunais, são tomadas por maioria simples
de votos. O voto majoritário é, pois, o prevalecente. De o ser, não
procede, todavia, deva considerar-se livre de erro ou engano.
Da mesma sorte que na emenda pode estar o erro, também não
será de estranhar seja o voto vencido o que alguma vez encerre a
verdade e o acerto. Daqui por que, longe de arguir a ideia de
manifestação inferior do espírito, representa, rigorosamente falando,
benéfica oportunidade de efetivação de justiça(3). Além disso, qual
pedra de toque, ele serve sempre a contrastar o voto vencedor,
fazendo-lhe subir de ponto os primores. É que os fundamentos do
voto singular, quando não abalam os do voto vencedor, como que
operam este prodígio: acrescentam-lhe a solidez e a segurança. Assim
como a sombra dá maior relevo à luz, também o voto vencido sói
confirmar as eminências do voto vencedor.
Do muito préstimo que ostenta o voto vencido escreveram
insignes juristas páginas de peregrina formosura.
Eliézer Rosa, talentoso e provecto magistrado, fez-lhe a
apologia com estas formais palavras: “E uma das belezas desses corpos
coletivos de homens que pensam e estudam está no voto vencido. Isso revela que
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nem sempre todos estão de acordo com tal ou qual corrente de opinião. O voto
vencido não é uma rebeldia, é uma semente”(4). À guisa de coroa e remate de
seus louvores, reproduziu a eloquente sentença do ex-ministro Luiz
Gallotti: “Um bom acórdão é o que traz um voto vencido”(5).
Já o proclamara o excelso Rui, por ocasião do julgamento, no
Supremo Tribunal Federal, do célebre “Habeas Corpus” nº 300: “Um voto
me basta para a vitória moral desta causa”(6). Este voto (vencido) obteve-o
do ministro Pisa e Almeida, que, por isso, mereceu ao ínclito jurista
pregão imortal(7).
Assim, nem porque “solus peregrinus”, é o voto vencido menos de
apreciar e enaltecer.

III – É desse lote o voto vencido que, em julgamento de “habeas


corpus”, proferiu o distinto e culto juiz do Tribunal de Alçada Criminal
do Estado de São Paulo Márcio Bartoli. A tese a que Sua Excelência deu
curso, posto não fosse a vencedora, fez-lhe contudo muita honra, pelo
vigor de seu raciocínio, a que se não podem contrapor mais valentes
argumentos, e por seu benigno influxo de equidade.
Foi o caso que, tendo-lhe sido negada fiança para apelar em
liberdade, à conta de seus maus antecedentes, certo indivíduo —
condenado por estelionato à pena de dois anos de reclusão —
encomendara-se à proteção da Justiça, que lhe pusesse cobro ao
constrangimento ilegal.
O colendo Tribunal, pelos votos de dois de seus ilustres juízes,
não se mostrou propício ao clamor do paciente, salvo o eminente
subscritor do voto vencido, que lhe deferia a ordem para o fim
colimado.
Era este seu teor: “Se, contudo, o réu tiver maus antecedentes e se a
custódia for necessária para o exercício do recurso, ainda assim poderá apelar, sem
se recolher à prisão, que pode ser substituída pela fiança, se, pela quantidade da
pena aplicada, o crime for afiançável e, se não for reincidente, porque o dispositivo
do art. 594 do Cód. Proc. Penal, nessa hipótese, deve ser interpretado em
conjugação com as regras dos incisos I e II do art. 323 do mesmo estatuto”(8).
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No caso, embora maus seus antecedentes, era primário o réu, e


a pena mínima, cominada a seu crime (art. 171 do Cód. Penal), não
superior a dois anos, como prescreve o art. 323, nº I, do Código de
Processo Penal.
De claro e persuasivo, o r. voto vencido já bastara para forçar o
assentimento. Seu diligente subscritor, no entanto, ainda invocou a
lição do renomado processualista Fernando Tourinho Filho, que
tratara a matéria “ex professo”(9).
Indisputável, por conseguinte, seu valor jurídico, em nada
inferior ao do venerando acórdão.
Forte argumento é este de que o voto, que o estilo forense
apelida de vencido, bem pudera, à luz da razão e do direito, reputar-se
vencedor.

IV – À derradeira, faz ao nosso propósito prevenir uma objeção, e é


que, sendo comum vir escoteiro ou solitário o voto vencido, tinha
contra si aquela formidável advertência: “Ai do que está só, porque quando
cair não tem quem o levante”(10)! A questão resolve-a o profundo Vieira:
“Não é necessário ser Salomão para refutar este inconveniente. Se o só não terá
quem o levante, também não terá quem o derrube”(11).
Faz ao propósito, por fim, este belo pensamento de autor
desconhecido: “Um homem só, com Deus, é maioria!”(12)

Notas

(1) De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, 3a. ed., vol. III, p. 1.667.
(2) Leib Soibelman, Enciclopédia do Advogado, 3a. ed., p. 370.
(3) Uma de suas virtudes extrínsecas: render azo à oposição de
embargos infringentes, pelos quais poderá o réu alegar de sua
justiça (art. 609, parág. único, do Cód. Proc. Penal).
(4) A Voz da Toga, 2a. ed., p. 50.
(5) Idem, ibidem, p. 51.
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(6) Obras Completas, vol. XIX, t. III, p. 296.


(7) Em verdade, escrevendo sobre as circunstâncias do julgamento
do “habeas corpus” que impetrara a favor de presos políticos, o
egrégio Advogado burilou esta memória eterna: “Eu me cheguei,
depois da sessão, quase sem voz, ao Sr. Pisa e Almeida, pedindo-lhe que
me permitisse o consolo de beijar a mão de um justo” (Idem, ibidem).
(8) Cf. Boletim da AASP nº 1907, p. 227.
(9) In Revista Brasileira de Ciências Criminais, nº 7, p. 76 (Da Prisão e da
Liberdade Provisória).
(10) Ecl 4,10.
(11) Sermões, 1959, t. IV, p. 41.
(12) Elcias Ferreira da Costa, Deontologia Jurídica, 1997, p. 215.

Carlos Biasotti
Desembargador aposentado do TJSP e ex-presidente da Acrimesp

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