M. P. Cordão Neto.
Universidade de Brasília, Brasília, Brasil, mporfirio76@gmail.com
E. Romero
UniversidadePolitécnica da Catalunha, Barcelona, Espanha, enrique.romero-morales@upc.edu.
RESUMO: O trabalho desenvolvido neste artigo tem como objetivo o estudo da relação entre a
microestrutura e o comportamento hidro-mecânico de solos não saturados. Assim, foram realizados
ensaios de porosimetria por injeção de mercúrio (MIP) para a obtenção de distribuição de poros do
solo e ensaios de Dewpoint Potentialmeter (WP4) e edômetro com sucção controlada para a
obtenção das curvas características. Esses ensaios foram executados em amostras com distintos
valores de índices de vazios, sendo avaliada a influência das deformações no comportamento
hidráulico e microestrutural deste solo. Além disso, foi testada a proposta de Prapaharan et al.
(1985), no qual as curvas características do solo podem ser determinadas a partir de sua distribuição
estrutural, obtidas por meio do MIP. O material estudado é uma argila siltosa natural, com alta
porosidade e comportamento colapsível, localizado na cidade de Nogueira, na Espanha. Este estudo
permitiu verificar a pouca influência das deformações no comportamento hidráulico deste solo,
devido á manutenção da distribuição estrutural dos poros quando submetido a trajetórias de carga e
umedecimento. Além disso, os resultados evidenciam a importância do uso da técnica testada para a
determinação das curvas características, permitindo um melhor entendimento do comportamento
hidráulico de solos não saturados.
1
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ua-uw (kPa)
F
relação entre a estrutura do solo e este 10
E
1
a possibilidade de determinação de B
propriedades hidráulicas do solo a partir de 0,1
técnicas para a obtenção de sua distribuição 0 100 200 300 400 500
σ1-ua (kPa)
estrutural
a)
1000 C D
F
H
O solo estudado é uma argila siltosa natural,
ua - uw (kPa)
E G
100 J
com alta porosidade e comportamento
I
colapsível Este material foi retirado da região 10
B
na qual foi construído o canal Algerri-Balaguer,
localizado na cidade de Nogueira, na Espanha. 1
M L
A Tabela 1 apresenta a caracterização
0,1
geotécnica deste material, onde wL é o limite de 0 200 400 600 800 1000
σ1 - ua (kPa)
liquidez, wP é o limite de plasticidade, IP é o
índice de plasticidade, e é o índice de vazios, γd b)
é o peso específico seco, γs é o peso específico
Figura 1. Trajetórias de tensões dos ensaios oedométricos
dos sólidos, w é a umidade e Sr é o grau de com controle de sucção: a) ECC; b) Eescalonado (modificado
saturação. O solo é classificado, segundo o de Mascarenha, 2008).
Sistema de Classificação Unificada dos Solos
(SCUS), como uma argila siltosa de baixa Com o intuito de verificar a influência do
plasticidade (CL-ML). índice de vazios, também foi obtida a curva
característica em trajetória de secagem
Tabela 1. Caracterização geotécnica do solo pesquisado (trajetória GH na Figura 1a), após a amostra ter
(Mascarenha, 2008).
wL wP IP γd γs w Sr
sido submetida a carregamentos e
e
(%) (%) (%) kN/m3 kN/m3 (%) (%)umedecimento (trajetória CDEFG na Figura1a).
22 15 7 0.71 15.5 26.5 4 15 Para a obtenção de dados intermediários no
% que passa SCUS estudo sobre a interação entre índices de vazios
#40 #200 2µm e a curva característica do solo, foi realizado um
CL-ML
100 82 16 ensaio oedométrico com alternância de
carregamento e umedecimento, conforme a
Para a determinação da curva característica trajetória apresentada na Figura 1b.
desse solo foram utilizados os equipamentos O WP4 foi utilizado para a obtenção da
Dewpoint PotentialMeter (WP4) e edômetro curva característica do solo natural para valores
com sucção controlada. de sucção superiores a 1 MPA, em trajetórias de
O edômetro com sucção controlada foi umedecimento e secagem.
utilizado para a determinação da curva Para verificar a influência do índice de
característica do solo para valores de sucção vazios na curva característica, foi executado
inferiores a 1 MPa, em trajetórias de mais um ensaio WP4, em trajetória de secagem,
umedecimento e secagem (trajetória ABC na para uma amostra obtida a partir de um ensaio
Figura 1a). oedométrico, cuja trajetória é apresentada na
Figura 2.
2
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16
Equação 2, definindo o diâmetro dos poros
14 A
B dominantes na amostra.
12
− de
10 PSD = (2)
d (log D)
Sr (%)
4
10000
A B
2 D
C A
0 1000
0 50 100 150 200 250
σv (kPa) 100 C
B
ua-uw (kPa)
10
Figura 2. Trajetória de tensões do ensaio oedométrico
E
para obtenção de amostras para realização de ensaios de
WP4 (Mascarenha, 2008). 1 D
D C
0,1
Essa trajetória foi escolhida de forma a obter
0 200 400 600 800 1000
uma amostra com o mesmo valor de índices de σ1 - ua (kPa)
vazios no qual foi determinada a curva
característica do ensaio oedométrico ECC, em Figura 3. Trajetórias de tensões dos ensaios oedométricos
trajetória de secagem, após a trajetória CDEFG para obtenção de amostras para realização de ensaios de
da Figura 1a. MIP.
Com o intuito de compreender o
comportamento estrutural do solo e verificar as A porosimetria por injeção de mercúrio
alterações estruturais ocorridas devido a também é utilizada para o estudo do
mudanças de índices de vazios e/ou colapso comportamento hidráulico do solo. Segundo
foram realizados ensaios de porosimetria por Prapaharan et al. (1985), o porosímetro por
injeção de mercúrio (MIP). injeção de mercúrio (MIP) pode ser utilizado
Os ensaios foram realizados em amostras em para determinar a curva característica de um
seu estado natural e em amostras submetidas a solo, em trajetória de secagem, uma vez que a
distintas trajetórias de tensões, conforme pressão com que o mercúrio é injetado no solo
apresentadas na Figura 3. Os valores de sucção pode ser relacionada a um incremento externo
inicial das amostras de solo foram obtidos por de pressão de ar em uma amostra saturada.
meio de psicrômetros. Conforme Romero (1999), a injeção de
No ensaio de MIP, a relação entre os mercúrio na amostra com um ângulo de 140º
diâmetros dos poros com a pressão aplicada é (φhg) é equivalente à expulsão de água com um
obtido por meio da Equação 1. ângulo de 180º (φw) para poros de mesmo
diâmetro. Dessa forma, a Equação 1 é
1 extrapolada para a sucção (ua – uw), obtendo-se
D=− 4γ hg cos φ hg (1)
P as Equações 3, 4 e 5.
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onde wmáx é a umidade de saturação da amostra, Para a representação matemática dos dados
wr é a umidade de correção devido aos vazios experimentais da curva característica, obtidos
não penetrados pelo mercúrio e Snw é obtido por meio dos ensaios WP4 e edômetro, utilizou-
pela Equação 6. se a equação proposta por Romero (1999). Esse
autor modificou a expressão para a curva
enw característica de Van Genuchten (1980),
S nw = (6) acrescentando um fator de correção dependente
e
da sucção, o qual faz a curva tender a uma
relação linear a altos valores de sucção. A nova
onde enw é o valor do índice de vazios penetrado equação proposta é apresentada a seguir.
pelo mercúrio e e é o índice de vazios da
amostra.
⎧ ⎡ ua − uw ⎤ ⎫
⎪ ln ⎢1 + a ⎥⎦ ⎪⎪ ⎧⎪ ⎫⎪
m
⎪ ⎣ 1
w = wsat ⎨1 − ⎬ ⎨ n ⎬
3 ANÁLISES DOS RESULTADOS ⎪ ln 2 ⎪ ⎪⎩1 + [α (u a −u w )] ⎪⎭
⎪⎩ ⎪⎭
w
(7)
Em relação ao comportamento microestrutural
do solo, a Figura 4 mostra a relação entre o PSD onde wsat é a umidade do solo quando saturado;
e o diâmetro dos poros. Verifica-se que houve a é o valor de sucção para umidade
poucas alterações na estrutura do solo após o
higroscópica e n, m e α são os mesmos
colapso, ocorrendo apenas uma diminuição da
parâmetros de van Genuchten (1980), sendo o
densidade dos poros na macroestrutura, com
último relacionado ao valor de entrada de ar da
pequena variação do valor dos diâmetros dos
curva.
poros dominantes.
Devido à relação existente entre o
1
comportamento hidráulico e estrutural do solo,
Microestrutura Macroestrutura torna-se possível a obtenção da curva
0,9
e = 0,71
característica por meio de técnicas de obtenção
0,8
e = 0,53 de distribuição de poros, conforme a proposta
0,7
e = 0,45 de Prapaharan et al. (1985) comentada
0,6
anteriormente.
PSD
0,5
Dessa forma, as curvas características
0,4
obtidas pelo MIP (Equações 3, 4, 5 e 6) e as
0,3
curvas determinadas pela equação de Romero
0,2
(1999), ou seja, Equação 7, em trajetórias de
0,1 secagem e de umedecimento, são apresentadas
0 na Figura 5.
1 10 100 1000 10000 100000 1000000
Diâmetro dos poros (nm) As curvas apresentam uma razoável
concordância em relação à forma, conforme o
Figura 4. Relação entre o PSD e os diâmetros dos poros verificado por Prapaharan et al. (1985), Romero
da amostra no estado natural. (1999) e Buenfil (2007), o que evidencia a
relação existente entre o comportamento
Observa-se que praticamente não houve microestrutural e hidráulico do solo.
alterações na distribuição de poros da Em termos de valores de sucção, observa-se
microestrutura do solo após a carga e o que a curva obtida por meio do MIP apresenta
umedecimento, independente da trajetória uma melhor concordância com a trajetória de
seguida, do nível de colapso e do valor de umedecimento, a altos valores de sucção, e com
índices de vazios final. Vale ressaltar que, a trajetória de secagem, a baixos valores de
segundo Romero e Vaunat (2000), a sucção. Romero (1999) obteve resultados
microestrutura é a parte do solo não afetada por similares. Ressalta-se que, na obtenção dessas
trajetórias de carregamentos. curvas características, são utilizadas distintas
4
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10000
1000000
e = 0,71
1000 e = 0,61
100000
ua - uw (kPa)
100
10000
uw-ua (kPa)
Trajetória de secagem
10 Outras técnicas
1000
1
100
0 10
0 5 10 15 20 25
w (%) 1
secagem umedecimento MIP
0 5 10 15 20 25 30
w (%)
Figura 5. Curva característica do solo (equação e MIP).
100000
Considerando-se a rapidez da obtenção da e = 0,71
curva característica por meio desse ensaio, o 10000 e = 0,53
intervalo de medidas de sucção permitido e a MIP e = 0,45
1000
não ocorrência de alteração considerável nos
ua - uw (kPa)
5
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curvas características obtidas por meio dos Nesse sentido, os ensaios de MIP são
ensaios de MIP. bastante úteis, uma vez que permitem verificar
a relevância da utilização de modelos mais
1000000 sofisticados , tais como os propostos por
e = 0,71
e = 0,61 Wheeler et al. (2003), Gallipoli et al. (2003),
100000 Vaunat et al. (2000), dentre outros, antes da
10000 execução de ensaios laboratoriais mais
uw-ua (kPa)
Trajetória de secagem
Outras técnicas
complexos.
1000
100
4 CONCLUSÕES
10
1
A utilização da porosimetria por injeção de
0 20 40 60 80 100
Sr (%) mercúrio para a determinação das curvas
características dos solos apresentou resultados
satisfatórios, surgindo como uma boa
100000 alternativa às demais técnicas e evidenciando o
e = 0,71
acoplamento entre o comportamento estrutural e
10000 e = 0,53 hidráulico do solo.
MIP
1000
e = 0,45 As curvas características do solo utilizado
ua - uw (kPa)
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REFERÊNCIAS