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Estudos organizacionais e desenvolvimento sustentável: em busca de

uma coerência teórica e conceitual


Organizational studies and sustainable development: towards a theoretical
and conceptual coherence
Études organisationnelles et le developpement durable: vers une coherence
theorique et conceptuel
Estudios organizacionales y el desarrollo sostenible: hacia uma coherencia teórica
y conceptual

Luciano Munck*
Rafael Borim de Souza**
André Luis Silva***
Recebido em 2/3/2011 revisado e aprovado em 29/7/2011; aceito em 19/9/2011

Resumo: Por este artigo, intentou-se alcançar dois objetivos: (1) investigar e propor uma conceituação para o termo
desenvolvimento sustentável que melhor dialogue com a área de estudos organizacionais; e, (2) apresentar uma
contribuição teórica viabilizadora da aproximação relacional entre o desenvolvimento sustentável e os estudos or-
ganizacionais. Foram investigadas posturas epistemológicas e categorizações para o desenvolvimento sustentável,
as quais foram unidas as contribuições da teoria do agir organizacional de Maggi (2006).
Palavras-chave: Desenvolvimento sustentável. Estudos organizacionais. Teoria do agir organizacional.
Abstract: This article has two objectives: (1) investigate and propose a definition for the expression sustainable
development that better contribute to the organizational studies; and, (2) present a theoretical contribution that
shows a link between sustainable development and organizational studies. Some epistemologies perspectives and
some categorizations for the sustainable development have been researched, which have been related to the Maggi’s
(2006) theory of organizational act.
Key words: Sustainable development. Organizational studies. Theory of organizational act.
Résumé: Pour cet article, amené à atteindre deux objectifs: (1) étudier et de proposer un concept pour le dévelo-
ppement durable à long terme qu’un meilleur dialogue avec le domaine des études organisationnelles, et (2) ap-
porter une contribution théorique de l’approche relationnelle facilitateur du développement durable et des études
organisationnelles. Postures épistémologiques et catégorisations pour le développement durable ont été étudiés,
qui ont été les contributions de la théorie organisationnelle de l’action Maggi (2006).
Mots-clés: Développement durable. Études organisationnelles. Théorie organisationelle de l’action.
Resumen: Este artículo tiene dos objetivos: (1) investigar y proponer un concepto de desarrollo sostenible a largo
plazo que un mejor diálogo con el área de estudios organizacionales, y (2) hacer un aporte teórico del enfoque rela-
cional facilitador del desarrollo sostenible y los estudios organizacionales . Posturas epistemológicas y clasificaciones
para el desarrollo sostenible fueron investigados, que estaban juntos los aportes de la teoría de la organización de
la acción Maggi (2006).
Palabras clave: Desarrollo sostenible. Estudios organizacionales. Teoría de la organización de la acción.

Introdução a seu respeito. Não são raros os estudos em


que se encontra um conceito desvinculado do
A demasiada utilização do termo ‘de- contexto sobre o qual a pesquisa foi desenvol-
senvolvimento sustentável’ junto aos con- vida. Sabe-se que o fenômeno em perspectiva
textos organizacionais tem gerado confusões é de interesse de muitas disciplinas, e, por
epistemológicas, paradigmáticas e teóricas essa razão, a disseminação de contribuições

* Vice-Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Administração e professor na Universidade Estadual de


Londrina (UEL). Professor na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Doutor em Administração pela
Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC). Graduado em Administração de Empresas pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). E-mail: munck@uel.br
** Doutorando em Administração na linha de Administração de Tecnologia, Qualidade e Competitividade pelo
Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Paraná (PPGADM-UFPR). Mestre
em Administração pelo Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Estadual de Maringá em
Consórcio com a Universidade Estadual de Londrina (PPA-UEM /UEL). Especialista em Controladoria e Finanças
pela PUCPR e em Gestão Empresarial pela Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação
Getúlio Vargas (EBAPE/FGV). Bacharel em Administração pela PUCPR. E-mail: rafaborim@yahoo.com
*** Doutorando em Administração pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo / Fundação Getúlio
Vargas (EAESP/FGV). Mestre em Administração pelo PPA-UEM/UEL. Graduado em Processamento de Dados
pela Universidade Norte do Paraná (UNOPAR). E-mail: emailspara@gmail.com

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relacionadas aos seus preceitos tem se elevado uma relação entre ele e uma das teorias orga-
gradativamente. nizacionais. Optou-se pela escolha de apenas
Quando relacionado aos estudos organi- uma teoria para que esta possa ser apresen-
zacionais, o desenvolvimento sustentável ge- tada de maneira coerente e relacionada por
ralmente é tratado por abordagens radicais e vias consistentes com o conceito do termo
isoladas, por meio das quais não é possível ‘desenvolvimento sustentável’.
efetivar muitas considerações pluralistas. O A fim de que o exercício de pesquisa
monoculturalismo dos pesquisadores que em questão fique mais claro para o leitor,
têm abordado o tema em pesquisas organi- optou-se por estruturar o artigo em nove
zacionais tem empobrecido o seu conceito e, tópicos principais: introdução; metodologia;
muito mais, tem causado um atraso quanto posturas epistemológicas para a definição do
as potenciais contribuições a serem geradas desenvolvimento sustentável; categorizações
pelas ciências organizacionais. para análise do construto desenvolvimento
Em face desse cenário, apresenta-se sustentável; uma análise entre as posturas
o presente artigo que tem dois objetivos epistemológicas e as categorizações para
principais a serem alcançados: (1) investigar análise do construto desenvolvimento sus-
e propor uma conceituação para o termo tentável; o conceito de desenvolvimento
‘desenvolvimento sustentável’ que melhor sustentável; a teoria do agir organizacional;
dialogue com a área de estudos organizacio- a relação entre a teoria do agir organizacional
nais; e, (2) apresentar uma contribuição teó- e o desenvolvimento sustentável; e, conside-
rica viabilizadora da aproximação relacional rações finais.
entre o desenvolvimento sustentável e os
estudos organizacionais. 1 Metodologia
Para tanto serão consideradas algumas
posturas epistemológicas, as quais serão ana- Foi realizado um ensaio teórico, qualita-
lisadas em conjunto com três categorizações tivo, exploratório e bibliográfico (MARTINS;
para análise do construto desenvolvimento THEÓPHILO, 2007). O quadro 1 elenca quais
sustentável. Dessa análise se extrairão as os principais temas em análise neste artigo, o
características que devam estar presentes no que se desejou investigar em cada um deles,
conceito em investigação. Uma vez investi- os principais autores que contribuíram em
gado um significado coerente para com as relação à análise deles e os procedimentos
abordagens organizacionais, será proposta técnicos utilizados para abordá-los.

Temas O que investigar? Principais Autores Procedimentos


Possíveis posturas epistemológicas que Denzin; Lincoln (2006)
Posturas propiciem um melhor relacionamento Martins; Theóphilo Pesquisa
Epistemológicas entre o desenvolvimento sustentável e (2006) bibliográfica
os estudos organizacionais Schwandt (2006)
Fergus; Rowney (2005)
Categorizações Categorizações que classifiquem o
Gladwin; Kenelly;
para Análise do desenvolvimento sustentável e o Pesquisa
Krause (1995)
Desenvolvimento analisem por diferentes abordagens e bibliográfica
Lélé (1991)
Sustentável qualificações.
Mebtratu (1998)
Conceito de Um conceito que ofereça ao termo
Gladwin; Kenelly; Pesquisa
Desenvolvimento coerência para ser ele pesquisado nos
Krause (1995) bibliográfica
Sustentável estudos organizacionais
Uma teoria que viabilize a aplicação
A Teoria do Agir Pesquisa
do conceito investigado nos estudos Maggi (2006)
Organizacional bibliográfica
organizacionais
Quadro 1 – Estrutura de investigação temática e procedimentos de pesquisa
Fonte: elaborado pelos autores

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2 Posturas epistemológicas para a Lincoln (2006) e Schwandt (2006): positivis-


definição do desenvolvimento sustentável mo e empirismo lógico, interpretativismo e
o construcionismo social.
Nesta seção, serão abordadas discus- Em sentido amplo a epistemologia é
sões que englobem considerações sobre pos- conceituada como o estudo metódico e refle-
turas epistemológicas que venham a auxiliar xivo da ciência, de sua organização, de sua
no processo de definição do termo ‘desenvol- formação, do seu funcionamento e produtos
vimento sustentável’. Ressalta-se que o que intelectuais. O papel e a contribuição de uma
se investiga é um significado coerente com instância epistemológica para a pesquisa
as proposições das ciências organizacionais. podem ser considerados a partir de duas
De acordo com Denzin e Lincoln (2006), funções: por um lado, assume a condição de
um paradigma é um conceito macro composto metaciência, porque vem após e diz respeito
por quatro micro conceitos, a saber: a ética, a às ciências e, por outro, revela um caráter
epistemologia, a ontologia e a metodologia. intracientífico e representa uma instância
intrínseca à produção científica. Etimologi-
A ética questiona: como serei enquanto
pessoa moral no mundo? A epistemologia:
camente, epistemologia significa discurso
como conheço o mundo? Qual a investi- (logos) sobre a ciência (episteme) (MARTINS;
gação entre o investigador e o conhecido? THEÓPHILO, 2007).
[...] A ontologia levanta questões básicas Em relação ao desenvolvimento sus-
a respeito da natureza da realidade e da tentável, segundo Fergus e Rowney (2005),
natureza do ser humano no mundo. A me- nota-se um discurso dominante, sobre o qual
todologia concentra-se nos melhores meios o mundo é objetivo, mensurável e compreen-
para a aquisição do conhecimento sobre o sível. A verdade, portanto, se torna atingível
mundo. (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 163). por meio de metodologias já existentes e
Desse conceito extrai-se a parte referida comunicadas por regras já institucionaliza-
a epistemologia, mais em específico a pergun- das. Não existe espaço para o conhecimento
ta: Como conheço o mundo? O que se intenta baseado em uma visão subjetiva do mundo,
por essa seleção é investigar como o desen- na qual a intuição e a experiência do mundo
volvimento sustentável, enquanto fenômeno natural representariam os principais elemen-
de interesse aos estudos organizacionais pode tos para a geração de novos conhecimentos.
assumir uma postura epistemológica coerente Para tanto se apresenta, no quadro 2, uma
às pesquisas relacionadas às organizações. síntese das posturas epistemológicas mencio-
Mediante esse recorte, incia-se uma in- nadas de acordo com Denzin e Lincoln (2006)
vestigação sobre o conceito do termo ‘desen- e Schwandt (2006) e seus possíveis desmem-
volvimento sustentável’ por três posturas bramentos. Em seguida, uma análise de suas
epistemológicas apresentadas por Denzin e intersecções e divergências.

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Os defensores do positivismo se mantêm fiéis à ideia de que a finalidade de qualquer ciência é


oferecer explicações causais de fenômenos sociais, comportamentais e físicos. As filosofias do
positivismo lógico e do empirismo lógico tinham como principal preocupação a reconstrução
Empirismo Lógico

racional do conhecimento científico por meio da análise semântica e sintática de dois tipos
Positivismo e

de declarações científicas (as declarações que explicam, isto é, as teorias e as hipóteses, e


as declarações que descrevem, ou seja, as observações). Para os positivistas as dimensões
sociais, culturais e históricas da compreensão eram consideradas extracientíficas e, por isso,
irrelevantes para qualquer relato epistemológico válido do que constitui o conhecimento
científico genuíno e sua justificação. O empirismo lógico trabalhava a partir de uma concepção
do conhecimento como representação correta de uma realidade independente, e seu interesse
era, e é, quase que exclusivamente voltado à questão do estabelecimento da validade das
alegações de conhecimento.
Identificação Empática. Essa postura interpretativista (também chamada de intencionalismo)
descreve o que constitui o conhecimento histórico, encontrando-se também ao centro do que
é conhecido como hermenêutica objetivista ou conservadora. Essas duas abordagens têm em
comum a ideia geral de que é possível transcender as circunstâncias históricas, ou escapar
delas, a fim de reproduzir o significado.
Sociologia Fenomenológica. A análise fenomenológica interessa-se principalmente em
compreender a constituição do mundo intersubjetivo, cotidiano. Dois instrumentos conceituais
Interpretativistas

geralmente empregados nessa reconstrução são a indexicalidade e a reflexividade. A primeira


indica que o significado de uma palavra ou enunciado é dependente de seu contexto de
Filosofias

utilização. A segunda direciona a atenção para o fato de que os enunciados não são apenas
sobre algo, mas também fazem algo; um enunciado compõe, em parte, um ato de fala.
Hermenêutica Filosófica. Esta perspectiva desafia, de diversas maneiras, o retrato
epistemológico cartesiano defendido pelas demais vertentes da filosofia interpretativista. Seus
defensores sustentam que a compreensão não é, em primeiro lugar, uma tarefa controlada por
procedimentos ou regras, mas, sim, justamente, uma condição do ser humano. A compreensão
é a interpretação. Nessa perspectiva entende-se que a tradição não é algo externo, objetivo
e pertencente ao passado, ela requer o engajamento das tendenciosidades do indivíduo. A
compreensão é participativa, convencional e dialógica, assim, se assume uma visão não-
objetivista do significado. Em outras palavras, o significado é negociado mutuamente no ato
da interpretação, e não simplesmente descoberto.
Em um sentido quase imperceptível, todos os seres humanos são construtivistas, caso acreditem
Construcionismo

que a mente está ativa na construção do conhecimento. Na epistemologia contemporânea,


esse senso comum do construcionismo é também chamado de perspectivismo. É a visão de
Social

que todas as alegações de conhecimento e a avaliação destas ocorrem dentro de um esquema


conceitual através do qual o mundo é descrito e explicado. As filosofias do construcionismo
social rejeitam a visão realista e ingênua da representação, mas geralmente avançam muito
mais na negação de todo que qualquer interesse em uma ontologia do real.

Quadro 2 – As quatro posturas epistemológicas para a definição do desenvolvimento sustentável


Fonte: SCHWANDT (2006, p. 195-202).

Essas posturas epistemológicas repre- da realidade, bem por isso havia uma acepção
sentam diferentes maneiras de como um fe- nas pesquisas de uma mistura de gêneros, as
nômeno de pesquisa percebe o mundo a sua quais caracterizavam os avanços científicos.
volta. Elas se aliam em alguns pontos, mas Assim, diversos modelos e interpretações
divergem completamente em outros. teóricas dos objetos e dos métodos resistiam
A hermenêutica objetivista e a herme- lado a lado e, a partir deles, os pesquisadores
nêutica filosófica iniciaram-se como movi- assumiam o poder de escolher e comparar
mentos simultâneos na Alemanha, no início diferentes formas de se observar o mundo,
dos anos 1980. Nessa época, a pesquisa qua- tal como o interacionismo simbólico, a
litativa era cada vez mais aceita como um etnometodologia, a fenomenologia, a semió-
processo contínuo de construção de versões tica e o feminismo. Por esse contexto, as

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‘hermenêuticas’ surgiram com o intuito de vimento sustentável. Estas permitirão o


investigar se tais avanços teóricos poderiam encontro dos pilares fundamentais de um
ser vistos como modismos, tendências ou significado condizente com o propósito deste
recomeços (FLICK, 2009). artigo. Na próxima seção serão exploradas
Para a hermenêutica objetivista, tam- temáticas que deem conta dessa proposição.
bém denominada de hermenêutica estrutural,
as intenções subjetivas relacionadas às pes- 3 Categorizações para análise do construto
quisas são consideradas como irrelevantes, desenvolvimento sustentável
enquanto que para a hermenêutica filosófica
o que interessa é a subjetividade da constru-
ção social do conhecimento (FLICK, 2009). A As categorizações para análise do
hermenêutica objetivista, então, compartilha construto desenvolvimento sustentável serão
de uma mesma epistemologia com o interpre- apresentadas separadamente e, posterior-
tativismo, ao passo que a hermenêutica filo- mente, unidas por uma análise integrativa. A
sófica rejeita completamente essa vertente nomeação de cada uma dessas categorizações
(SCHWANDT, 2006). tem como intuito final alcançar uma definição
A hermenêutica filosófica e as filosofias para o desenvolvimento sustentável que seja
dos construcionistas sociais (assim como as coerente com os estudos organizacionais.
abordagens desconstrucionistas, da teoria Em face dessa busca, toma-se o discurso
crítica e algumas feministas e neopragmáti- de Morgan (1980) que antecipadamente avi-
cas) têm precedentes no amplo movimento sou sobre o fato de os cientistas organizacio-
de afastamento do relato empírico, lógico nais estarem aprisionados em uma série de
atomístico, designativo, representacional do constrições equivocadas a respeito do status
significado e do conhecimento (SCHWANDT, ontológico da realidade social e da natureza
2006). Os construcionistas rejeitam o positivis- humana, e, em razão dessa realidade, percebe-
mo e se preocupam em analisar a relação com se a necessidade de se adotar uma perspectiva
a realidade ao tratarem os processos constru- mais cosmopolita nas teorizações organiza-
tivos de suas abordagens (FLICK, 2009). cionais, buscando alcançar avanços efetivos.
Os construcionistas sociais comparti- Gladwin, Kenelly e Krause (1995) con-
lham com a hermenêutica filosófica questões cordam com Morgan (1980) ao afirmarem
relacionadas à crítica geral do significado que o domínio organizacional, para tratar dos
enquanto objeto, revelando uma afinidade problemas relacionados ao desenvolvimento
com a noção do nascimento do significado. No sustentável, está isolado e fraturado por uma
entanto a similaridade termina nesse ponto. profunda crise epistemológica provocada
Embora seja construcionista em sua negação pela simples ação de dissociar a humanidade
a uma teoria objetivista do significado, a (com suas respectivas organizações) do res-
hermenêutica filosófica confia no potencial tante da realidade, também amparada pelo
da linguagem para revelar o significado e a mundo natural.
verdade enquanto que os construcionistas No intuito de averiguar tais críticas,
sustentam que não existe nenhuma verdade foram investigadas algumas categorizações
em relação à questão da interpretação. Pela para análise do construto desenvolvimento
força da hermenêutica filosófica, alguns auto- sustentável. Sabe-se da existência de inúmeras
res já a consideram um movimento separado delas, mas, para que a viabilidade do presente
da filosofia interpretativista. E pela persistên- estudo fosse garantida, optou-se por três con-
cia do positivismo, ele permanece como uma tribuições específicas, sendo elas: as correntes
epistemologia isolada sem qualquer relacio- paradigmáticas abordadas por Gladwin,
namento com as demais posturas (DENZIN; Kenelly e Krause (1995), a análise conceitual
LINCOLN, 2006; SCHWANDT, 2006). de Mebratu (1998) e a estrutura semântica
Uma vez apresentadas essas posturas do termo conferida por Lélé (1991) e Fergus
epistemológicas, passa-se para as categori- e Rowney (2005), as quais são abordadas em
zações para análise do construto desenvol- sequência.

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3.1 As correntes paradigmáticas abordadas oferecer uma base sobre a qual o desenvol-
por Gladwin, Kenelly e Krause (1995) vimento sustentável possa ser investigado.
Ambos os paradigmas, ao promoverem suas
Gladwin, Kenelly e Krause (1995), em premissas por métodos radicais e isolados,
uma tentativa de estabelecer um paradigma não conseguem sequer promover o desenvol-
que viabilizasse o tratamento do desenvolvi- vimento e, muito menos, preservar a natureza
mento sustentável por abordagens organiza- (GLADWIN; KENELLY; KRAUSE, 1995).
cionais, realizaram um exercício comparativo O paradigma centrado na sustentabili-
entre três correntes, sendo que duas delas, o dade assume uma responsabilidade de arti-
tecnocentrismo e o ecocentrismo, são aborda- cular o conhecimento e as discussões por uma
gens extremamente opostas, enquanto que a abordagem interdisciplinar, por meio da qual
terceira, o sustaincentrism (paradigma cen- deve ser estabelecido um diálogo entre essas
trado na sustentabilidade), representa uma duas fortes perspectivas científicas e opera-
proposição de compreensão de mundo mais cionalizado um modelo que melhor entenda
flexível e aberta. Essas correntes paradigmá- e promova o desenvolvimento sustentável.
ticas, sintetizadas por Gladwin, Kenelly e
Krause (1995) são apresentadas com maiores 3.2 A análise conceitual de Mebratu (1998)
detalhes a seguir:
• O tecnocentrismo. As origens deste para- Desde que a definição do desenvol-
digma podem ser remetidas à revolução vimento sustentável concedida pela World
científica do século XVII, com a emer- Comission on Environment and Development
gência de uma teoria social liberal, da (WCED) – abordada posteriormente neste
racionalidade da mão invisível proposta artigo – em 1987 se popularizou, inúmeros
por Adam Smith e da tendência de privi- esforços têm sido realizados por diversos
legiar os seres humanos sobre a natureza. grupos de pesquisa, organizações e movi-
Essa perspectiva ainda se faz dominante mentos sociais com o intuito de capturar a
contemporaneamente, uma vez que suas verdadeira essência deste conceito. Embora
proposições são mais convidativas aos seja uma tarefa complexa dar conta de todas
sistemas econômicos e aos modelos de as definições, Mebratu (1998) as categorizou
gestão organizacionais. em três versões principais: a versão institucio-
• O ecocentrismo. Os adeptos deste para- nal, a versão ideológica e a versão acadêmica.
digma provêm de uma filosofia que apre- Todas mais bem exploradas em sequência
goa um estilo de vida que se conforme (MEBRATU, 1998):
com a ordem da natureza, com a reverên- • Versão institucional. Esta versão se preo-
cia ao planeta, assim como os movimentos cupa em analisar definições concedidas
transcedentalistas e preservacionistas. por instituições tais como a WCED, o
Esse paradigma é marcado por uma eco- International Institute of Environment
logia profunda, a qual rejeita qualquer and Development (IIED) e a World Busi-
dominação humana sobre a natureza. ness Council for Sustainable Development
• O sustaincentrism. A noção de um para- (WBCSD). Os adeptos desta versão con-
digma interessado com o desenvolvimen- sideram que a comparação das definições
to sustentável pode ser compreendida concedidas por tais instituições partici-
como um esforço dialético. Embora os pam de uma mesma essência, a de se pre-
paradigmas tecnocêntrico e ecocêntrico ocupar com a satisfação das necessidades.
possuam uma longa história, o paradigma Esta versão, em síntese, afirma que um
da sustentabilidade ainda é embrionário. crescimento econômico saudável, respon-
A articulação de um olhar de mundo cen- sável e limpo ainda é o principal desafio
trado na sustentabilidade deve ser vista para um desenvolvimento efetivamente
como uma tentativa de se buscar uma sustentável.
reconciliação entre posições científicas • Versão ideológica. Predominam nesta
tão radicais. versão as ideologias clássicas tais como
É possível vislumbrar que tanto o tecno- teoria da libertação, o feminismo radical e
centrismo quanto o ecocentrismo falham em o marxismo. Inseridos nesta versão estão

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Estudos organizacionais e desenvolvimento sustentável: em busca de uma 111
coerência teórica e conceitual

os movimentos ecofeministas, ecossocia- reducionistas e fracas. Para o autor, cada


listas e ecoteológicos. O ecofeminismo é abordagem assume, consciente ou inconscien-
considerado como a conjuntura conceitual temente, a tentativa de obrigar a sociedade a
que une os quatro pilares da teoria da aceitar suas proposições como uma verdade
libertação: aqueles relacionados às opres- inquestionável.
sões de gênero, raça, classe e natureza. O
ecossocialismo é alicerçado na afirmativa 3.3 A estrutura semântica do termo
de que um desenvolvimento sustentável e conferida por Fergus e Rowney (2005) e
ecológico jamais poderá ser alcançado por Lélé (1991)
meio de ações inseridas em um sistema
capitalista. A ecoteologia fundamenta-se Este modelo se preocupa em investigar
na crença de que a humanidade ignorou as raízes semânticas do termo ‘desenvolvi-
a importância dos patrimônios ecológicos mento sustentável’ uma vez que esse exercício
em suas tradições religiosas. auxilia a explicar os entendimentos contradi-
• Versão acadêmica. Na versão acadêmica, tórios referentes a essa expressão. Lélé (1991)
as concepções econômicas, ecológicas e nota que o termo é interpretado de maneira
sociológicas refletem a responsabilidade inconsistente, assim como um crescimento
da comunidade científica diante do de- sustentável, ou como uma forma de mudança
safio da crise ambiental. Os economistas, social que, junto aos objetivos desenvolvi-
por consequência da abordagem neo- mentistas atuais, tem o objetivo adicional de
clássica dominante, querem transformar alcançar uma sustentabilidade ecológica.
o ambiente em uma commodity para que Embora Fergus e Rowney (2005) dis-
assim ele possa ser analisado em termos cordem quanto a algumas etapas oferecidas
monetários. Para os ecologistas, duas por Lélé (1991) em referência ao processo de
premissas precisam ser identificadas para estruturação semântica do termo ‘desenvol-
o acontecimento da sustentabilidade: vimento sustentável’, eles não se contrariam.
primeira, a natureza, se não invadida, Resumidamente esses autores partem do
é um sistema auto-organizado que se princípio que a soma das palavras sustentar
transforma e responde a diversas con- (conservar ou prorrogar) e desenvolver (partir
dições quase estáveis; segundo, os seres de resultados anteriores ou transformar o uso
humanos dependem desse sistema pela de algo) formam a expressão ‘desenvolvimen-
necessidade de suprimento de alguns to sustentável’ (manter os resultados passa-
recursos para a produção de alimentos e dos ou transformar o uso dos recursos). Esse
demais artigos de uso imprescindível para termo, para os autores, representa a direção
a humanidade. A sociologia se aproxima futura do progresso humano, por meio de
das contribuições da ecologia. processos que ativem três esferas principais:
Existe um “pré-conceito” concedido à a economia, a ecologia e a sociedade. Quando
versão acadêmica. Redclift e Benton (1994) a economia se alia à ecologia, o desenvolvi-
consideram que, por promover a interdiscipli- mento sustentável é aceito como um objetivo
naridade tão aceita em relação ao desenvolvi- e definido como um meio para o progresso
mento sustentável, ela pode ser a culpada por humano, por uma abordagem integrativa e
essa miscelânea de definições equivocadas inclusiva para as gerações contemporâneas
encontradas em diversos trabalhos científicos. e futuras. Quando as perspectivas ecológicas
Os mesmos autores consideram que essa ver- se somam às sociais, o desenvolvimento
são possui fundamentações epistemológicas sustentável é assumido como um fenômeno
reducionistas, traduzidas por suas proposi- processual e entendido como um discurso
ções equivocadas. que integra conhecimentos, filosofias e fer-
Já Tryzna (1995) não hesita em dizer ramentas de mensuração altamente eficazes.
que a fonte dessa discriminação está no fato Se colocado sob uma lente amparada pelo
de cada abordagem racional participar de paradigma dominante (tecnocentrismo) o de-
um movimento radical próprio, por meio do senvolvimento sustentável como objetivo é in-
qual existe uma tendência de se menosprezar terpretado como um crescimento sustentável,
as demais abordagens ao qualificá-las como enquanto que, como processo, é interpretado

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como um debate sobre os processos científicos próprios autores afirmam que uma epistemo-
e as metodologias, nos quais o sucesso é men- logia fundamental dentro da qual operam go-
surado por retornos financeiros, tidos como vernos, organizações e sociedade possui uma
referências para a tomada de qualquer decisão parcialidade, uma vez que a racionalidade
(FERGUS; ROWNEY, 2005; LÉLÉ, 1991). econômica prioriza a mensuração monetária
Em sequência, realiza-se uma análise da ética de valores.
que integra as posturas epistemológicas Gladwin, Kenelly e Krause (1995) fi-
previamente discutidas e as categorizações nalizam o debate ao admoestarem que, se
analíticas abordadas. realmente deseja adotar o desenvolvimento
sustentável como um princípio organizador,
4 Uma análise entre as posturas epistemo- a sociedade, logo, deve admitir que o para-
lógicas e as categorizações para análise do digma tecnocêntrico se torna um paradigma
construto desenvolvimento sustentável em crise. A partir de uma perspectiva dialé-
tica, o tecnocentrismo apresenta uma série de
Nesta seção será estabelecida uma contradições, como incentivos a metodologias
análise integrativa entre as três posturas políticas que privilegiam poucos e ameaçam
epistemológicas abordadas no item 3 e as três muitos e o uso de modelos de gestão inconce-
categorizações analíticas do desenvolvimento bíveis para um desenvolvimento sustentável.
sustentável, para que assim se estabeleça o Essas inconsistências são simultaneamente
que se espera do significado em investigação. razões de destruição e de reconstrução do pa-
O tecnocentrismo falha gravemente em radigma, o qual, segundo os autores, precisa
um possível relacionamento com o desenvol- reexaminar as fundamentações que o regem.
vimento sustentável. Suas argumentações O tecnocentrismo, por seus alicerces e
desassociam patologicamente ou repreendem por suas críticas, relaciona-se ao positivismo,
categoricamente muitos componentes críticos epistemologia também presente na versão
dessas discussões, os quais são de extrema institucional exposta por Mebratu (1998).
importância para a manutenção da vida no Essa interligação se confirma pelo fato de
planeta. Por suas proposições, os tecnocên- os adeptos desta versão defenderem que o
tricos se isolam e impedem qualquer tipo crescimento é tarefa indispensável para as
de ligação com as premissas do desenvolvi- organizações alcançarem o desenvolvimento
mento sustentável. Esse paradigma falha em sustentável, porém, eles defendem a valoriza-
se relacionar adequadamente com questões ção de estratégias de maior valor adicionado
vinculadas a uma justiça intergeracional, aos produtos, para que se reduza a quantida-
intrageracional e interespécies. De maneira de de recursos naturais e energia consumidos
um tanto arrogante, suas pesquisas depositam nos processos produtivos.
falsas esperanças sobre um futuro incerto. O paradigma ecocêntrico diminui de-
Finalmente, apesar de produzir riquezas ma- masiadamente a representação do ser huma-
teriais e poder para uma minoria privilegiada, no, ao ignorar relacionamentos fundamentais
ele ampara um sistema que produz riscos e que garantem a segurança da humanidade e
ameaças que poderão complicar o futuro de a integridade ecológica do planeta. Suas con-
todas as comunidades humanas (GLADWIN; tribuições estão inseridas em níveis filosóficos
KENELLY; KRAUSE, 1995). que não podem ser efetivamente implemen-
Fergus e Rowney (2005), ao discorrerem tados nas condutas humanas. Apesar de sua
sobre esse paradigma dominante e sobre a atratividade ideológica e admiráveis intentos,
representação das organizações, admitem assim como o tecnocentrismo, o econcentris-
que o lucro, por si só, não é o problema, e os mo possui contradições internas como a
processos econômicos, em si, criam benefícios tendência de desvalorizar demasiadamente
para a sociedade. Porém, quando estes tomam a representatividade do ser humano para
lugares de relevância junto aos procedimen- com a sociedade e, bem por isso, falha em
tos e estruturas políticas, ambos alicerçados integrar diferentes culturas, e estas, a natureza
em uma racionalidade instrumental, aí sim (GLADWIN; KENELLY; KRAUSE, 1995).
gera-se uma parcialidade influenciável por Stead e Stead (2000) argumentam que
lucros financeiros e interesses pessoais. Os uma sociedade, já que organizada como tal,

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 13, n. 1, p. 105-120, jan./jun. 2012.


Estudos organizacionais e desenvolvimento sustentável: em busca de uma 113
coerência teórica e conceitual

deveria ter metas orientadas para um desen- Esse paradigma aceita a contribuição
volvimento que sustentem valores preocupa- das organizações, mas por uma ótica diferente
dos em refletir o valor do progresso nas rela- da utilizada pelos tecnocêntricos. Para ele
ções humanas, na preservação dos ambientes (sustaincentrism) as responsabilidades orga-
naturais e desenvolvimentos que contribuam nizacionais devem incluir uma atuação por
para melhores condições de vida dos seres uma abordagem responsável com os termos
humanos. Estes, para o paradigma ecocêntri- ambientais e sociais, por meio dos quais a
co, importam pouco. Fergus e Rowney (2005) geração de riqueza não seja encarada como
comentam que, muito mais prejudicial que os um fim em si mesma. Em síntese, as organi-
seres humanos, é a dominação da epistemolo- zações devem auxiliar o desenvolvimento
gia social por uma racionalidade econômica, estrutural das sociedades com valores mais
pois é essa estrutura que enfatiza os ganhos inclusivos, oriundos de um balanceamento de
individuais. O benefício para a sociedade, de contribuições vindas de uma epistemologia
acordo com o paradigma dominante, é um simultaneamente instrumental e intuitiva
efeito consequencial dos ganhos individuais. (FERGUS; ROWNEY, 2005). Esse paradigma
Por essas admoestações, acredita-se que a defende a interdisciplinaridade, logo adere
representatividade humana para o alcance aos princípios da versão acadêmica proposta
do desenvolvimento sustentável deve ser por Mebratu (1998). Por ser interdisciplinar,
mantida como relevante. sua postura epistemológica tende a ser plu-
O paradigma ecocêntrico, por negar ralista e conflitante, uma vez que aborda a
toda e qualquer visão realista e por se des- necessidade de oferecer explicações causais
vincular de qualquer interesse relacionado a aos fenômenos sociais (positivismo), conside-
uma perspectiva ontológica mais real, assume ra a importância da evolução histórica desses
uma epistemologia construcionista, também fenômenos (identificação empática), por abor-
implícita a versão ideológica proferida por dagens que sejam objetivas em resolução, mas
Mebratu (1998). Em verdade, o construcio- subjetivas em compreensão (fenomenologia),
nismo defende o papel do ser humano como as quais tenham o indivíduo como partici-
portador de uma mente ativa para a constru- pante e integrante do processo (hermenêutica
ção do conhecimento, mas fica aquém da her-
filosófica) e que aceite a realidade de o ser
menêutica filosófica, que tem o sujeito como
humano ter a ciência de todos os fatos sociais
participante e influenciador do processo.
que o circundam (construcionismo social).
O sustaincentrism explora uma dimen-
Em verdade, esse paradigma é o que
são na qual os monismos tecnocêntricos e
mais depende da estrutura semântica ofereci-
ecocêntricos devem ser rejeitados em favor
da pela interligação das contribuições de Lélé
de um pluralismo moral. Esse paradigma é
(1991) e Fergus e Rowney (2005). A análise
observado pelos tecnocêntricos como radical,
semântica desses autores obedece à recons-
ingênuo e utópico. Mas não radical, modesto
trução racional do conhecimento científico
e transformativo o suficiente para resolver a
por meio da análise semântica apregoada
crise ecológica aos olhos dos ecocêntricos. Es-
sas considerações são rejeitadas pelos adeptos pelos positivistas; valoriza o conhecimento
do paradigma centrado na sustentabilidade, histórico tão relevante para os interpretati-
por acreditarem que elas levam a um engessa- vistas da identificação empática; admite que
mento epistemológico e teórico, ou seja, a um o significado de uma palavra ou enunciado é
pragmatismo indesejado. Seus pesquisadores dependente do contexto no qual é utilizado
acreditam que esse corpo paradigmático assim como os sociólogos fenomenologistas;
transcende e desbanca os demais paradigmas entende que a compreensão é uma condição
de uma só vez, ao negar o que é visto como do ser humano, participativa, convencional
disfuncional pelo tecnocentrismo e rejeitar a e dialógica e, por isso, adepta às proposições
preservação de polos discursivos alienados da hermenêutica filosófica; e, enfatiza que o
proposta pelo ecocentrismo. O sustaincentrism mundo é simultaneamente descrito e expli-
é alicerçado, portanto, na premissa maior de cado assim como para os construcionistas
que o desenvolvimento humano, por vias sociais.
sustentáveis é algo desejável (GLADWIN; Os outros paradigmas também neces-
KENELLY; KRAUSE, 1995). sitam dessa estrutura semântica, mas por

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 13, n. 1, p. 105-120, jan./jun. 2012.


114 Luciano Munck; Rafael Borim de Souza; André Luis Silva

sua ampla contribuição importa mais ao abordagens organizacionais, cabe apenas a


sustaincentrism. No entanto, para uma defi- tarefa árdua de encontrá-lo.
nição em que se vinculem as abordagens Mas antes uma pergunta instigante: por
organizacionais, observa-se a necessidade que não somente aceitar o conceito comum
de se mesclar as raízes semânticas propostas adotado pela Comissão de Brundtland? A
por Fergus e Rowney (2005) e Lélé (1991). resposta exige a apresentação de tal conceito:
Percebe-se que o desenvolvimento sustentá- segundo relatório apresentado em 1987 na
vel para uma organização é tanto um ob- WCED, documento este organizado pela Dra.
jetivo quanto um processo, ou seja, é uma Gro Harlem Bruntland e sua comissão, o de-
meta maior constituída de inúmeros passos senvolvimento sustentável é compreendido
menores a serem alcançados em prazos espe- como aquele que não compromete a sobrevi-
cíficos. Se o fenômeno (desenvolvimento vência das gerações futuras por meio da ex-
sustentável), enquanto objetivo, relaciona ploração responsável dos recursos naturais no
economia e ecologia e, enquanto processo, presente (WCED, 1987). Esse conceito, embora
interliga ecologia e sociedade, enquanto meta merecedor de todos os reconhecimentos,
organizacional vincula economia, ecologia e uma vez que foi um dos responsáveis pela
sociedade. disseminação mundial do termo, é muito
Por meio de toda essa análise conferida criticado e combatido por pesquisadores
até o momento, considera-se que se chegou à de diferentes áreas. De acordo com Fergus
qualificação que melhor expressa o conteúdo e Rowney (2005), esta definição não é nada
do significado do termo ‘desenvolvimento mais do que ambígua, pois retira o foco do
sustentável’ para que ele ganhe contornos que que realmente precisa ser feito por meio de
melhor o aproximem de ser um fenômeno de um discurso inclusivo, e coloca as prioridades
investigação dos estudos organizacionais. Na mundiais em simples processos técnicos. Os
busca por um conceito para o termo ‘desen- autores consideram que essa definição é a
volvimento sustentável’, pode-se dizer que o responsável por inviabilizar o agir em relação
que se procura é uma definição que dê conta ao alcance do desenvolvimento sustentável,
de colocar o paradigma tecnocêntrico em diá- já que houve uma opção de se continuar
com ações limitadas a esforços políticos im-
logo com o paradigma ecocêntrico, por meio
pregnados por inúmeros conflitos e por uma
das proposições apresentadas pelo sustain-
tecnocracia dogmática incapaz de abrir os
centrism (GLADWIN; KENELLY; KRAUSE,
olhos das nações para novas proposições do
1995). Também se espera por um significado
funcionamento econômico em vigência.
que valorize a instrumentalidade da versão
Para Ralston Saul (2001) a definição de
institucional e as ideologias da versão ideoló-
um termo é concebida com o intuito de que
gica, ambas unidas pela interdisciplinaridade
as ideias sejam esclarecidas, e que os seres
da versão acadêmica (MEBRATU, 1998). E,
humanos sejam libertados para ações mais
finalmente, que consiga tratar o desenvol-
coerentes; mas o que se observa na sociedade,
vimento sustentável junto ao contexto das
em relação ao conceito de desenvolvimento
organizações como objetivo e processo, e sustentável, é que ele se tornou um meio de
que ressalte a importância da relação entre as controle e um método forte para retrair forças
partes e o todo, e da relação entre o todo e o reacionárias.
ambiente (FERGUS; ROWNEY, 2005; LÉLÉ, Com a ideia de combater a definição
1991; MEBRATU, 1998). Um conceito que res- de 1987, inúmeras foram as denominações
ponda a todas estas premissas é apresentado alternativas ao termo que surgiram, mas todas
no tópico seguinte. elas representando uma tentativa de conce-
der novo nome a um mesmo fenômeno. A
5 O conceito de desenvolvimento sustentável imprecisão do conceito desse termo, somada
com sua respectiva importância nas políticas
Encontrados os alicerces epistemológi- nacionais, internacionais e organizacionais
cos, a posição paradigmática e as relações que levou a uma grande batalha política a res-
importam para a aquisição de um significa- peito de quanto as gerações futuras pode-
do do termo ‘desenvolvimento sustentável’ riam afetar o desenvolvimento das gerações
de modo que possibilite tratá-lo dentro de contemporâneas. Essa realidade resultou em

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 13, n. 1, p. 105-120, jan./jun. 2012.


Estudos organizacionais e desenvolvimento sustentável: em busca de uma 115
coerência teórica e conceitual

uma grande variedade de definições distorci- Esses autores definem o desenvolvi-


das, todas elas criticadas por pressões sociais mento sustentável como o processo que obje-
e institucionais (MEBRATU, 1998). tiva o desenvolvimento humano por ações de
Entende-se assim, de acordo com Fergus inclusão, integração, igualdade, prudência e
e Rowney (2005) que a oportunidade para se segurança. A inclusão implica o desenvolvi-
definir coerentemente o desenvolvimento mento humano dentro de um determinado
sustentável, ou seja, como um fenômeno de período de tempo e em um certo espaço. A
análise inclusivo em propostas e integrador integração admite a existência de uma inter-
em processos, uma mudança epistemológica dependência entre as esferas ecológicas,
precisa ocorrer nos processos cognitivos de sociais e econômicas. A igualdade busca
geração do conhecimento. Esta é a ideia defen- uma justiça intergeracional, intrageracional
dida por este artigo e, por consequência das e interespécies. A prudência investiga os
premissas levantadas ao longo de todo este meios de cuidados e prevenção em referência
estudo, chegou-se à consideração de que o aos atos tecnológicos, científicos e políticos.
conceito que se vincula intensamente aos con- E a segurança demanda proteção contra
textos organizacionais foi concedido no artigo ameaças crônicas e contra acontecimentos
Shifting paradigms for sustainable development: nocivos (GLADWIN; KENELLY; KRAUSE,
implications for management theory and research 1995). Cada parte desse conceito é mais bem
escrito por Gladwin, Kenelly e Krause (1995). explorada no quadro 3.

A compreensão da dimensão humana da sustentabilidade deve abordar as forças que provocam


Inclusão

as transformações globais ambientais e antropogênicas: aumento populacional, crescimento


econômico, inovações tecnológicas, instituições políticas e econômicas, atitudes e crenças
sociais. A sustentabilidade, portanto, precisa ir além de uma eficiência ecológica e buscar uma
suficiência social.
A sustentabilidade requer que a compreensão dos problemas mundiais ocorra de maneira
sistêmica e interdependente. O conceito de desenvolvimento sustentável deve basear-se no
Integração

reconhecimento de que uma nação, instituição e organização não pode alcançar seus objetivos
econômicos, sem que preocupações sociais e ambientais sejam levadas em conta, assim
como acesso universal à educação, oportunidades iguais a todas as camadas sociais, acesso
aos serviços de saúde para todos, acesso justo aos recursos de sobrevivência, e uma base de
recursos naturais sustentável.
Os imperativos morais das igualdades intrageracionais e intergeracionais não podem ser
Igualdade

encontrados empiricamente, e, sim, intersubjetivamente. A ausência de critérios objetivos


leva o estudo da sustentabilidade para um caminho da ciência normativa, pela qual as regras
serão discutidas por meio da confrontação de crenças pessoais e debates morais. Em suma,
as atividades humanas não devem promover custos ambientais e apropriar-se de recursos
naturais sem justificativas plausíveis.
Muitas análises reivindicam prudência e humildade nos processos de alcance ao
Prudência

desenvolvimento sustentável, dada a massiva incerteza, imprevisibilidade, a não linearidade


entre os componentes do sistema, limites desconhecidos e as dinâmicas complexas dos sistemas
sociais e ecológicos. Esse quadro da realidade demanda precaução, preempção, proteção, ações
reversíveis, margens de segurança e preparo para acontecimentos inesperados.
No mínimo, a sustentabilidade prevê a não perda de (a) sistemas sociais e ecológicos saudáveis
(capacidades dos sistemas naturais e sociais de proverem suportes essenciais a vida humana;
(b) capital natural crítico (estoques de recursos naturais incapazes de serem repostos, tal como
Segurança

diversidade biológica, a camada de ozônio e os ciclos bioquímicos); (c) auto-organização


(capacidade dos sistemas de seres vivos a continuarem ou a se renovarem, automanutenção
e autotransformação, os quais proveem o contexto para todas as atividades humanas); (d)
capacidade de suporte (capacidades dos sistemas biofísicos e sociais de suportarem os impactos
físicos das empresas); e, (e) liberdade humana (uma sociedade civil, com democracia e plena
atenção aos direitos humanos, participação social, transparência contábil, reciprocidade e
transparência), além do suprimento das necessidades básicas dos seres humanos.

Quadro 3 – Uma melhor exploração do conceito de desenvolvimento sustentável


Fonte: elaborado pelos autores a partir das proposições de Gladwin, Kennelly e Krause (1995).

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116 Luciano Munck; Rafael Borim de Souza; André Luis Silva

Introduzido o conceito, resta a escolha proposições e diferencia-se das outras teorias.


de uma teoria organizacional que viabilize Por ser concebida dessa maneira, ela se situa
sua introdução junto aos estudos organizacio- segundo uma perspectiva, uma maneira de
nais. Esta análise é feita no próximo tópico. ver, em outras palavras, ela exprime uma
opção epistemológica.
6 A teoria do agir organizacional A epistemologia da teoria do agir
organizacional rejeita o positivismo e o an-
tipositivismo. Assume como base de suas
Como verificado nas seções anteriores,
contribuições a terceira via indicada por Max
o conceito concedido ao desenvolvimento sus-
Weber (apud MAGGI, 2006).
tentável, enquanto fenômeno de análise junto
Para Weber as ciências históricas e sociais
às organizações, exigiu antes a explanação das
são caracterizadas por uma orientação em
possíveis posturas epistemológicas a serem direção da singularidade; elas devem antes
assumidas, bem como a apresentação de três de mais nada compreender o sentido dos
categorizações analíticas do termo. Ao longo eventos humanos, mas essa compreensão
dessas análises, ficou claro que o filtro para o não é mais um ato de intuição imediato, uma
significado esteve centrado no sustaincentrism, simples participação empática; ela exige uma
uma vez que esse paradigma assume uma validação racional e subjetiva, a reconstrução
identidade acadêmica interdisciplinar, como dos elementos do agir em seu contexto de
foi exposto no item 5. significação. (MAGGI, 2006, p. 18).
Com o intuito de validar a vinculação Logo, a teoria do agir organizacional é
do conceito apresentado no item 6 com os es- tanto uma teoria do agir social quanto uma
tudos organizacionais, introduz-se a teoria do teoria do agir racional. O agir social indica
agir organizacional. Desde já ressalta-se que um agir do qual o sentido intencionado,
a escolha dessa teoria não foi aleatória, mas de um ou mais sujeitos, se dirige ao agir de
sim realizada após a análise de uma série de outros sujeitos. Assim, o agir organizacional
abordagens teóricas, amplamente divulgadas concerne tanto aos processos de ação de um
e debatidas em estudos organizacionais, que sujeito singular quanto aos processos de ação
não caberia no escopo deste trabalho. Além coletiva e, por outro lado, que todo processo
disso, conforme demonstrado a seguir, Maggi organizacional está em relação com outros
(2006) fundamenta sua teoria em consagrados processos. O agir racional valida a ideia de
clássicos dos estudos organizacionais. que o agir organizacional ordena as ações
Maggi (2006), o representante maior do processo em direção a um objetivo per-
dessa proposição teórica, afirma que o proces- seguido, mas esse agir racional é intencional
so de construção de uma teoria é apoiado em e limitado como a razão humana (MAGGI,
teorias já existentes, das quais a que está em 2006). No quadro 4, constam as influências
construção se utiliza ou retrabalha conceitos e teóricas dessa teoria.

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 13, n. 1, p. 105-120, jan./jun. 2012.


Estudos organizacionais e desenvolvimento sustentável: em busca de uma 117
coerência teórica e conceitual

A epistemologia weberiana considera a compreensão como o ponto de partida da análise científica;


contudo ela exige que se proceda a uma explicação do agir social sobre bases empiricamente verificáveis,
Max Weber às quais a compreensão possa se referir para não naufragar no arbitrário. A compreensão concerne ao
sentido da ação; a explicação serve para dar conta da dimensão causal – em causalidade adequada – das
condições empíricas da ação. Segundo essa abordagem, a avaliação da possibilidade objetiva das relações
causais entre as ações ou os eventos individuais ao longo de um processo se apoia sobre a comparação dos
processos reais com processos de ação hipotéticos idealmente construídos.
Para Pareto, a classe das ações lógicas, aquela guiada por uma racionalidade objetiva, constitui apenas
uma parte marginal do agir humano, sendo a maior parte composta por ações não-lógicas. Encontra-se
em Barnard a mesma concepção da ação quando ele fala do equilíbrio da organização: os indivíduos não
Pareto e Barnard

participam da organização com base apenas em cálculos econômicos. De modo mais geral, pode se dizer
que a existência da organização formal se apoia sobre a tendência natural dos indivíduos a cooperar. Um
sistema cooperativo se define para Barnard como um conjunto de componentes físicos, biológicos, pessoais
e sociais que estão numa relação específica graças à cooperação de duas ou mais pessoas para um ou
mais fins. Na obra de Barnard, encontra-se sempre uma tensão contínua entre uma concepção do sistema
caracterizado por uma tendência à cooperação e a ideia de que um sistema cooperativo durável é sempre
governado por processos intencionais de decisão. Desse modo, Barnard acrescenta à referência de Pareto a
noção de processo, para caracterizar a ação organizacional, aproximando-se assim da concepção weberiana.
Construir uma teoria do agir organizacional significa aprofundar o conceito de racionalidade do sujeito agente.
Para Simon o processo de decisão se dá segundo a racionalidade intencional e limitada, em que as informações
são imperfeitas e, portanto, o conhecimento das alternativas de ação é sempre incompleto; o conhecimento
Simon

das consequências da ação é fragmentário; as preferências não são perfeitamente ordenáveis e sua variação
no tempo não é previsível. Assim, a decisão pode ser, no melhor dos casos, satisfatória. A organização é
vista por Simon como um conjunto de programas de ação nos quais os fins que se quer atingir se encadeiam
com os meios dos quais se dispõe. Da mesma forma que Barnard, Simon destaca também a importância das
comunicações informais, pelo fato de que o processo de ações e decisões se dá numa modificação contínua.
Para Thompson, a organização é compreendida como um sistema indeterminado e que enfrenta a incerteza,
mas que, ao mesmo tempo, está sujeito aos critérios da racionalidade e, portanto, pede certeza. A tipologia
Thompson

de Thompson considera também as situações em que as preferências dos resultados são incertas enquanto
os conhecimentos instrumentais são certos, e aquelas em que são as escolhas dos meios adotados que são
incertas, enquanto as preferências dos resultados são certas. Ele abre caminho para a interpretação de todas
as situações nas quais certeza e incerteza se mesclam em diferentes níveis de ação e decisão. O que é quase
sempre o caso, na realidade organizada.
Para Touraine, a organização é um conjunto de atividades geridas para obtenção de objetivos específicos nos
quais se reproduzem, com amplas margens de autonomia, relações de dominação presentes na sociedade
num dado contexto histórico. As relações de poder interiores e exteriores à organização podem, desse modo,
ser interpretadas no quadro de um sistema de dominação mais amplo que provém sobretudo do conflito
de classes e que encontra sua legitimidade no sistema político-institucional. Por meio das considerações
Touraine

de Thompson e Touraine, pode-se conceber o agir organizacional como o encontro de três linhas distintas
de ação: a ação institucional, através da qual se produzem as relações de dominação legitimadas pelo
sistema político-institucional (implica certas escolhas em termos de objetivos de relações de autonomia/
dependência do processo organizacional em relação ao outros processos); a ação técnica orientada para a
obtenção dos objetivos (no plano exterior, ela toma a forma da trona e no plano interior, a do equilíbrio do
processo); e a ação estrutural constituindo o conjunto de regras que ordenam os elementos do processo e
suas interdependências com o ambiente.
Para Reynaud nenhum sistema social preexiste a suas regras, nem produz regras às quais os sujeitos tenham
que se adaptar. Ao contrário, o ator social, assim como o sistema social, são constituídos pela produção de
um processo de regulação que traça as regras do jogo da ação. A ação social é finalizada, no sentido em que
produz suas próprias regras e define seus fins. Em direção a essa finalização autoproduzida, a regulação,
Reynaud

também ela autoproduzida, guia a ação. Em relação à perspectiva da teoria do agir organizacional, um
aspecto importante da proposição reynaudiana diz respeito à racionalidade da regulação social. Longe
de ter como objetivo uma maximização qualquer, essa racionalidade pode apenas procurar vantagens
satisfatórias e ao longo do tempo, pelo fato de que, por um lado, ela pressupõe um engajamento e um
consentimento e, por outro, pressupõe o conflito e a negociação. Ela é, portanto, efetivamente uma
racionalidade intencional e limitada.
Giddens põe em evidência que a estrutura é teorizada de maneira diferente segundo as diversas escolhas
epistemológicas e ontológicas no que tange à relação entre sujeito humano e sociedade. Por um lado, as
abordagens funcionalistas e estruturalistas compartilham uma visão de preeminência do sistema social
sobre o sujeito humano; por outro lado, as abordagens hermenêuticas, interacionistas e fenomenológicas,
Giddens

destacam a subjetividade do indivíduo e sua experiência singular. No primeiro caso, a estrutura é definida
como um modelo de ação pré-determinado ao qual o sujeito é frequentemente sem dele ter consciência; no
segundo caso, o sujeito constrói a sociedade, e a noção de estrutura perde sua relevância, chegando até a ser
descartada. Por um lado, a discussão epistemológica de Giddens remete à terceira via indicada por Weber e
por outro lado, seus conceitos sobre estruturação e dualidade da estrutura ajudam a compreender a relação
entre processos de ação e sua auto-organização.
Quadro 4 – As contribuições teórico-científicas que alicerçam a teoria do agir organizacional
Fonte: organizado pelos autores por meio das contribuições de Maggi (2006).

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118 Luciano Munck; Rafael Borim de Souza; André Luis Silva

A teoria do agir organizacional, então, micros, sendo eles internos e externos à


exprime uma maneira de ver, de conceder organização. Esses processos, para serem
os fenômenos organizacionais. Esse corpo efetivamente realizados, precisam ser com-
teórico possui uma concepção da organização preendidos pelos indivíduos que os realiza-
como agir social, como processo de ações e rão e participarão deles. Essa compreensão é
decisões. Ele não separa a organização dos admitida como a ação principal de qualquer
sujeitos agentes que atuam e desenvolvem procedimento organizacional. O compreen-
o processo. A racionalidade do processo é der, no entanto, precisa ser comprovado,
intencional e limitada. A interpretação abran- caso contrário torna-se uma adversidade para
ge a compreensão do sentido do agir e sua toda a cadeia de ações dependentes. Essa
explicação em termos de causação adequada validação está relacionada em parte com o
no desenrolar do processo ao longo do tempo empirismo organizacional, mas também se
(MAGGI, 2006). relaciona com a riqueza da subjetividade das
Por meio das contribuições científicas relações organizacionais. A causalidade dos
que alicerçam a teoria do agir organizacional, relacionamentos organizacionais, portanto,
já é possível afirmar sua essência interdiscipli- somente acontece pela compreensão das ações
nar, assim como o sustaincentrism e o conceito individuais, as quais comungam de um espa-
de referência adotado para o presente artigo. ço organizacional simultaneamente hipotético
Segundo Maggi (2006, p. 41): e real. Entre essa interligação do que existe,
Numerosas disciplinas estão envolvidas ou seja, do que é tangível, e do que se deseja,
no estudo dos fenômenos organizacionais; ou seja, do que é intangível, alcança-se um
em primeiro lugar, a sociologia, a econo- coletivo de ações organizacionais, traduzido
mia, a psicologia e o direito; enquanto como o agir organizacional.
que muitas outras disciplinas se ocupam Sendo a teoria do agir organizacional
das realidades organizadas, às vezes, até uma teoria do agir social (MAGGI, 2006),
mesmo sem qualquer referência à reflexão
também é imprescindível a compreensão
teórica sobre a organização. Isto poderia
levar a se considerar a organização como
deste agir social. O agir social é emanado por
um campo multidisciplinar e como soma de uma humanidade cujas ações são em grande
conhecimentos separados. Essa perspectiva parte não lógicas, ou até mesmo, reflexivas.
parece efetivamente prevalecer no nível da Essa distância do concreto não classifica o agir
definição institucional dos saberes disci- humano como irreal, pois é pelos momentos
plinares. No entanto, nos fundamentos da de abstração que se alcançam considerações
teoria do agir organizacional, proposições de como agir ou decidir algo. Decisão e ação
teóricas sólidas, como as de Weber, Simon são atos findos, mas não finitos, ou seja, a
ou Thompson, reivindicam explicitamente realização destes, ainda que reversível, deixa
sua interdisciplinaridade.
um histórico, bem por isso almejam ser pro-
Uma vez apresentada essa teoria como feridos por uma certeza indubitável. Certeza,
a que aproxima e viabiliza a relação entre o de acordo com essa teoria, nada mais é do
conceito de desenvolvimento sustentável pro- que uma incerteza reduzida sobre uma rea-
posto e os estudos organizacionais, passa-se lidade observável, totalmente influenciável
para a análise que interligará o significado do pelos indivíduos que procuram estabelecer
termo à teoria do agir organizacional. suas posições de confiança em processos de
negociação. Se o processo é influenciável
7 A relação entre a teoria do agir organiza- também é conflituoso, e tal conflito, ainda
cional e o desenvolvimento sustentável que dentro de uma organização, representa
a desordem social de uma dimensão social
Como a própria teoria se proclama, an- maior. Considera-se como maior dimensão
tes de qualquer análise existe a necessidade a sociedade, que, para conter seus conflitos e
de se compreender a constituição de um agir adversidades, procura por regras, as quais são
organizacional. Por meio das proposições de impostas ou negociadas. As regras, normas e
Maggi (2006), é possível compreender que demais meios de regulação são tendenciosos,
o agir organizacional é um acontecimento uma vez que constituem uma ação racional
macro e consequente de inúmeros processos tomada e decidida por alguns indivíduos que

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Estudos organizacionais e desenvolvimento sustentável: em busca de uma 119
coerência teórica e conceitual

visam a um benefício social ou individual com a qual se relaciona (os stakeholders inter-
futuro. Essa lógica de ação, qualificadamente nos e externos). Com uma cadeia de relacio-
complexa, ainda que estruturada com os mais namento saudável, a organização observará
profundos detalhes, é intencional (uma vez o desenvolvimento sustentável como uma
que os indivíduos sabem o que querem) e competência organizacional maior a ser alcan-
limitada (assim como a razão humana). Essa çada pelas subcompetências organizacionais
mesma lógica é compreendida como o agir identificadas no próprio conceito, sendo elas:
social. inclusão, integração, igualdade, prudência e
Definidos o agir organizacional e o agir segurança.
social, admite-se que não há como definir qual De acordo com Chen e Nakin (2006),
participa de maior relevância. Esses ‘agires’ as competências organizacionais são amplas,
são simultâneos e interdependentes. Logo, logo descritas em formas coletivas e abstratas,
admite-se que as sociedades estão impregna- enquanto as subcompetências representam
das pelo agir organizacional e que as organi- os fatores de suporte das competências, uma
zações estão infestadas pelo agir social. Um vez que são mensuráveis e específicas. O de-
alimenta ou destrói o outro, de acordo com senvolvimento sustentável em um contexto
a intencionalidade do sistema e da força da organizacional, pela lógica das competências,
comunicação informal das dimensões sociais. é observado como um construto a ser avalia-
O sistema apenas alia o agir organizacional do, e as respectivas subcompetências que o
ao agir social, e vice-versa, quando a coope- compõem são as variáveis que propiciarão
ração se manifesta nas realidades sociais. A sua avaliação.
cooperação influencia o poder das ações, que, Essa lógica é defendida pelo próprio
por consequência, influencia a efetividade das Maggi (2006), que enxerga, no desenvolvimen-
decisões, que, por sua vez, influencia as estra- to de competências organizacionais, a possibi-
tégias organizacionais e os relacionamentos lidade de a organização alcançar um patamar
sociais. Por meio desse raciocínio, entende- aceitável e propício para mudanças, e o desen-
se quando Ramos (1983) admite que o agir volvimento sustentável, enquanto fenômeno
organizacional é um agir social circunscrito. de interesse aos estudos organizacionais,
Nesse contexto, o desenvolvimento sus- requer, acima de tudo, mudanças internas e
tentável, junto aos estudos organizacionais, externas.
pode ser compreendido como um agir orga-
nizacional, ou seja, um agir social circunscrito. Considerações finais
Trata-se de um fenômeno social com intensa
relevância junto às organizações. Ele promove Mediante as já discutidas e analisadas
o interesse das organizações em alcançá-lo ideias ao longo do texto, cabe aqui destacar as
por vias de regulação ou por pró-atividade. principais. Chegou-se à consideração de que o
E trata-se de um fenômeno organizacional conceito do termo ‘desenvolvimento susten-
com elevada importância junto à sociedade. tável’ que mais se alinha aos propósitos dos
A sociedade passa a exigir mecanismos de estudos organizacionais foi apresentado por
gestão orientados para o desenvolvimento Gladwin, Kenelly e Krause (1995), os quais
sustentável por parte das organizações e as definem esse fenômeno como um processo
próprias empresas optam por tecnologias que objetiva o desenvolvimento humano por
sustentáveis mais rentáveis. A teoria do agir ações de inclusão, integração, igualdade, pru-
organizacional, sendo ela também do agir dência e segurança. Essa definição foi adotada
social, lança em rosto essa complexa rede de como referência por acolher em seus propó-
raciocínio, mas viabiliza um debate de ope- sitos uma integração entre o tecnocentrismo
racionalização. e o ecocentrismo, por meio do sustaincentrism
O conceito de Gladwin, Kenelly e Krause (GLADWIN; KENELLY; KRAUSE, 1995);
(1995) integra-se à teoria do agir organizacio- por dialogar com as versões institucionais e
nal, pois Maggi (2006), por meio de suas ideológicas ao valorizar as contribuições da
pro posições, assevera que a organização versão acadêmica (MEBRATU, 1998); e, por
alcançará o desenvolvimento sustentável defender o termo em perspectiva, simultanea-
primeiramente por valorizar a figura humana mente, como objetivo e processo, uma vez

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 13, n. 1, p. 105-120, jan./jun. 2012.


120 Luciano Munck; Rafael Borim de Souza; André Luis Silva

que, enquanto meta organizacional, ele alinha um inter-relacionamento epistemológico, ad-


em iguais níveis de relevância as esferas mitido como imprescindível para a compre-
econômicas, sociais e ecológicas (FERGUS; ensão de um fenômeno altamente complexo
ROWNEY, 2005; LÉLÉ, 1991). como o desenvolvimento sustentável.
Como o sustaincentrism é a corrente pa-
radigmática que melhor sustenta o conceito Referências
adotado, vale lembrar que este é reconhecido
por seu caráter interdisciplinar, logo, tende a CHEN, H. C.; NAQUIN, S. S. An integrative model
assumir uma postura epistemológica plura- of competency development, training design, assess-
ment center, and multi-rater assessment. Advances in
lista e conflitante, por abordar a necessidade Developing Human Resources, v. 8, n. 2, p. 265-282, 2006.
de ofertar explicações causais aos fenômenos
DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. Introdução: a disci-
sociais (positivismo), considerar relevante plina e a prática da pesquisa qualitativa. In: ______. O
as evoluções históricas destes (identificação planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens.
empática), em abordagens objetivas em reso- Porto Alegre: Artmed, 2006. p. 15-42.
lução e subjetivas em compreensão (fenome- FERGUS, A. H. T.; ROWNEY, J. I. A. Sustainable de-
nologia), que tenham o indivíduo como par- velopment: lost meaning and opportunity? Journal of
ticipante e integrante dos processos sociais e Business Ethics, v. 60, p. 17-27, 2005.
organizacionais (hermenêutica filosófica) e FLICK, U. Introdução à pesquisa qualitativa. 3. ed. Porto
Alegre: Artmed, 2009.
que aceitem a realidade dos seres humanos
estarem cientes quanto aos fatos sociais que GLADWIN, T. N.; KENELLY, J. J.; KRAUSE, T. S. Shift-
ing paradigms for sustainable development: implica-
os circundam (construcionismo social). tions for management theory and research. Academy of
No intuito de suprir a necessidade de Management, v. 20, n. 4, p. 874-907, 1995.
alinhar essa complexidade epistemológica, o LÉLÉ, S. M. Sustainable development: a critical review.
conceito adotado como referência e os estudos World Development, v. 19, n. 6, p. 607-621, 1991.
organizacionais, foi observado que a teoria MAGGI, B. Do agir organizacional: um ponto de vista
do agir organizacional (MAGGI, 2006) cons- sobre o trabalho, o bem-estar, a aprendizagem. São
tituía um corpo teórico, comprovadamente Paulo: Edgard Blücher, 2006.
interdisciplinar, alicerçado em clássicos da MARTINS, G. A.; THEÓPHILO, C. R. Metodologia da
administração, que, por meio de suas prin- investigação científica para ciências sociais aplicadas. São
Paulo: Atlas, 2007.
cipais proposições, leva o desenvolvimento
sustentável a ser admitido, nos contextos or- MEBRATU, D. Sustainability and sustainable develop-
ment: historical and conceptual review. Environment
ganizacionais, como um agir organizacional, Impact Assessment Review, v. 18, p. 493-520, 1998.
ou seja, um agir social circunscrito (RAMOS,
MORGAN, G. Paradigms, metaphors, and puzzle
1983), possível de ser operacionalizado pela solving in organization theory. Administrative Science
lógica das competências: em que a macrocom- Quarterly, v. 25, p. 605-622, 1980.
petência é o desenvolvimento sustentável, e as RALSTON SAUL, J. On equilibrium. Toronto: ON, 2001.
subcompetências são as partes que compõem RAMOS, A. G. Administração e contexto brasileiro: esboço
o conceito investigado: inclusão, integração, de uma teoria geral da administração. 2. ed. Rio de
igualdade, prudência e segurança. Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1983.
Portanto sugere-se que o construto REDCLIFT, M.; BENTON, T. Social theory and the global
desenvolvimento sustentável, enquanto fenô- environment. London: Routledge, 1994.
meno de interesse aos estudos organizacionais, SCHWANDT. T. A. Três posturas epistemológicas para
requer uma postura epistemológica híbrida, a investigação qualitativa. In: DENZIN, N. K.; LIN-
próxima à da terceira via adotada como COLN, Y. S. O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias
e abordagens. Porto Alegre: Artmed, 2006, p. 193-217.
referência para as proposições vinculadas
à teoria do agir organizacional apresentada STEAD, J. H.; STEAD, E. Eco-enterprise strategy: stand-
ing for sustainability. Journal of Business Ethics, v. 24, n.
pela vernácula de Maggi (2006). Essa hibri- 4, p. 313-329, 2000.
dização é considerada como relevante pelos
TRYZNA, T. C. A sustainable world. Sacramento: IUCN,
autores deste artigo, pois por ela os pontos de 1995.
discordância são confrontados a fim de que WORLD COMISSION ON ENVIRONMENT AND DE-
aperfeiçoamentos epistemológicos sejam rea- VELOPMENT (WCED). Our common future (the Brundt-
lizados. Essa característica dialógica permite land report). Oxford: Oxford University Press, 1987.

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 13, n. 1, p. 105-120, jan./jun. 2012.

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