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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Jales-SP

Nº Processo: 1001663-59.2018.8.26.0414

Registro: 2019.0000019631

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado nº


1001663-59.2018.8.26.0414, da Comarca de Palmeira D Oeste, em que é recorrente LAUDIMAR
PEREIRA DA SILVA, é recorrido BANCO BMG S/A .

ACORDAM, em 1ª Turma Cível e Criminal do Colégio Recursal - Jales, proferir a


seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator,
que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos MM. Juízes JOSÉ PEDRO GERALDO


NÓBREGA CURITIBA (Presidente) e REINALDO MOURA DE SOUZA.

Jales, 28 de fevereiro de 2019.

Fernando Antonio de Lima


RELATOR

Recurso nº: 1001663-59.2018.8.26.0414


Recorrente: Laudimar Pereira da Silva
Recorrido: Banco BMG S/A

Voto.

EMENTA: EMPRÉSTIMO CONSIGNADO, COM RESERVA DE


MARGEM CONSIGNADA MEDIANTE A IMPOSIÇÃO DE
CARTÃO DE CRÉDITO – Instituição financeira que, no âmbito de
empréstimo consignado em benefício previdenciário, libera o
empréstimo via despesa contraída em cartão de crédito – Autor que
pretendia contratar apenas empréstimo consignado - Inexistência de
prova de que houvera o saque de dinheiro, para fins de cobrança das
faturas mensais de Cartão de Crédito, a título de Reserva de Margem
Consignável – Indicativo claro de que o consumidor não pretendia
contratar esse produto, mas, apenas, o empréstimo consignado –
Cobrança de valores mensais a título de cartão de crédito, pensando,
o consumidor, que estava pagando as prestações mensais do

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empréstimo consignado – Encargos financeiros que seriam


infinitamente menores, caso se aplicassem apenas os encargos
pertinentes ao empréstimo consignado – Contrato de Adesão ao
Cartão de Crédito assinado apenas em sua última folha pelo
consumidor – Prática, em apuração pelo País, que revela expediente
que engana o consumidor, o qual, pensando que está a contratar
empréstimo consignado, está contratando a Reserva de Margem
Consignável, mediante a imposição ilegal de cartão de crédito –
Instrução Normativa nº 28/2008, do INSS, em cujo art. 15, inciso I
se observa que não basta a contratação da Reserva de Margem
Consignável, impondo-se que o consumidor solicite formalmente o
cartão de crédito. Exigência, ainda, pela citada Instrução nº 28/2008,
de que, nas operações de cartão de crédito no seio dos empréstimos
consignados, sejam informados o valor, número e periodicidade das
prestações, a soma total a pagar com o empréstimo pessoal ou cartão
de crédito, bem assim a data do início e fim do desconto (art. 21,
incisos IV a VI) – Inexistência dessas informações, de tal sorte que o
beneficiário se torna cativo da instituição financeira, tornando
impagável a dívida e eternos os descontos das parcelas – Cartão de
crédito travestido de Empréstimo Consignado – Valor mínimo da
fatura – Pagamentos debitados em contracheque – – Transferência,
bancária que não se coaduna com a modalidade CRÉDITO –
TED que não diz respeito a operação de cartão de crédito - Falha
na prestação do serviço – Violação aos princípios da confiança, da
boa-fé objetiva, da transparência, da cooperação, da informação
qualificada e, também, do fim social do contrato – Aplicação dos
artigos 4º e 6º do Código de Defesa do Consumidor – Vedação em
condicionar um serviço ao fornecimento de outro (venda casada),
bem assim de prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do
consumidor, em razão da idade, condição social, saúde ou
conhecimento deste para impingir-lhe produtos ou serviços –
Proibição de exigir, do consumidor, vantagem manifestamente
excessiva, iníqua ou abusiva – Inteligência dos artigos 39, incisos I,
IV e V, 51, inciso IV, e 52, do Código de Defesa do Consumidor -
Violação ao direito básico do consumidor em ter informações claras
e adequadas sobre os produtos e serviços (Código de Defesa do
Consumidor, art. 6º, inciso III) – Relativização do pacta sunt
servanda pelo Código de Defesa do Consumidor - Respeitável
sentença de improcedência, que se baseou na existência de
contratação expressa, sem considerar, porém, com a devida vênia, a
ilegalidade do expediente adotado – Descontos indevidos, a título de
despesas de cartão de crédito, em benefício previdenciário -
Existência de liminar, em ação civil pública, para que o recorrido, e
outras instituições financeiras, cesse o expediente ilegal – Dano
moral caracterizado – Indenização no valor de R$ 10 mil –
Capacidade econômica do recorrido – Devolução em dobro dos
valores descontados indevidamente – Má-fé caracterizada –
Inteligência do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do
Consumidor – Precedentes - Respeitável sentença objeto de reforma
– Recurso provido.

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Relatório dispensado, na forma de entendimento do Fórum Nacional


dos Juizados Especiais.

Trata-se de demanda, em que a parte-autora pleiteia a repetição, em


dobro, do valor de R$ 1.475,58, e dos valores descontados indevidamente no curso da ação. Pleiteia,
também, que se libere a Reserva de Margem Consignada averbada no cadastro do INSS pelo sistema
DATAPREV. Requer, por fim, a reparação por danos morais no valor de R$ 10 mil.

A respeitável sentença julgou improcedentes os pedidos formulados


na petição inicial.

A parte-autora interpôs recurso inominado, devidamente respondido


pela parte-requerida.

O recurso inominado comporta PROVIMENTO.

Os autos revelam que a parte-autora contratou um empréstimo com


descontos automáticos em benefício previdenciário (empréstimo consignado).

No entanto, a instituição financeira embutiu ao empréstimo um


cartão de crédito, no que se configura a chamada RESERVA DE MARGEM CONSIGNADA.

Nos termos da Lei nº 13.172/2015, os servidores públicos,


empregados privados e aposentados poderão contratar empréstimos consignados. A reserva admitida
é de até 35%, com a possibilidade de desconto em folha.

No entanto, nos termos da citada lei, desses 35%, apenas 5% poderão


ser utilizados para: a) amortização de despesas contraídas com cartão de crédito; ou b) utilização
com a finalidade de saque por meio de cartão de crédito.

No preâmbulo da Lei nº 13.172/2013, está escrito o seguinte: "Altera


as Leis nos
10.820, de 17 de dezembro de 2003, 8.213, de 24 de julho de 1991, e 8.112, de 11 de
dezembro de 1990, para dispor sobre desconto em folha de pagamento de valores destinados ao
pagamento de cartão de crédito".

É possível, portanto, que, dos 35% vinculados ao pagamento na folha


de pagamento, 5% sejam utilizados para o pagamento de cartão de crédito ou para a finalidade de
saque por meio de cartão de crédito.

Logo, em havendo autorização contratual, poderia a instituição


permitir que, dentro do limite dos 5%, o contraente pudesse sacar dinheiro, por meio do cartão de
crédito.

No entanto, diante de determinações, Brasil afora, do Judiciário e do


Ministério Público, por vários abusos na concessão indiscriminada dos cartões de créditos
consignados, é que o INSS editou várias Instruções Normativas.

Por meio da Instrução Normativa INSS/PRES nº 28, de 16 de maio


de 2008, exigiu-se que a taxa de juros, no tocante às operações de cartão de crédito, não superem
3.06%:

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"Art. 16. Nas operações de cartão de crédito serão considerados,


observado, no que couber, o disposto no art. 58 desta Instrução
Normativa:
(...)
III – a taxa de juros não poderá ser superior a 3,06% (três vírgula
zero seis por cento) ao mês, de forma que expresse o custo efetivo".

No caso dos autos, há, realmente, contrato juntado pela parte-


requerida (fls. 52 a 55).

O que muito tem acontecido é que, ao emprestar o dinheiro, a


instituição financeira estaria a cobrar como se fosse pela utilização do cartão de crédito. Os juros do
cartão de crédito são infinitamente maiores do que os juros do empréstimo consignado.

Em linha de princípio, não haveria, em tese, ilegalidade, na


contratação da Reserva de Margem Consignável. Assim, 5% poderiam ser utilizados para o
pagamento das despesas com cartão de crédito, ou, mesmo, para saque, pelo consumidor, valendo-se,
também neste último caso, do cartão de crédito.

A ilegalidade surge, isto sim, quando o empréstimo consignado em


folha se traveste de operação não realizada de compra via cartão de crédito. Ou, ainda, quando a
instituição financeira deixa o dinheiro à disposição do consumidor, como se este último tivesse
sacado mediante a utilização de cartão de crédito.

Nesses casos, o contraente poderia ficar eternamente preso ao


pagamento das parcelas. Os juros maiores, dos cartões de créditos, tornariam praticamente perpétuo
o vínculo.

Em outras palavras, a instituição financeira não poderia liberar o


dinheiro do empréstimo, como se o consumidor estivesse sacando o cartão de crédito, ou pagando
despesas decorrentes do cartão – quando é a própria instituição financeira, sem pedido expresso do
consumidor, que coloca à disposição o dinheiro ao contraente.

Uma coisa seria o empréstimo consignado em si mesmo considerado.


Outra coisa, a efetiva utilização do cartão de crédito.

A propósito, há liminares, pelo Brasil, em ações civis públicas,


proibindo a aplicação da Reserva de Margem Consignável. O argumento é de que os contraentes
supõem a contratação de um empréstimo consignado, quando, na verdade, acabam surpreendidos
com a contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável1.

Repita-se: as instituições financeiras estariam autorizadas, por lei, a


cobrar pela utilização efetiva do cartão de crédito, dentro da Reserva de Margem Consignável, de
5%. Há previsão legal, portanto, em se contratar a Reserva de Margem Consignável, que, em seu
âmago, caracteriza-se pela utilização mesma do cartão de crédito pelo consumidor.

No caso de cobrança dessa Margem Consignável, não pela utilização


do cartão de crédito pelo consumidor, mas, sim, pela manobra em transformar o empréstimo
consignado em operação de cartão de crédito, estamos diante de flagrante ilegalidade.

Por isso é que a Defensoria Pública do Estado do Maranhão, por


1 Confira-se: http://www.tjma.jus.br/cgj/visualiza/publicacao/408552.

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meio do seu Núcleo de Defesa do Consumidor, constatou que "inicialmente, foram registradas quatro
reclamações de consumidores relatando haver realizado um empréstimo consignado e que, apesar de
longos anos de pagamento, as parcelas não cessavam (...) Todos os demais casos que acompanhamos
evidenciam a mesma prática abusiva. Reforça esse quadro o fato de a maior parte dos consumidores
contratantes ser de baixa renda e, normalmente, de baixa escolaridade, além disso, há um valor da
parcela descontada em folha, o que leva a crer que o cliente está sanando gradativamente sua
dívida"2.

Os descontos mensais no contracheque, a título de cartão de crédito,


acabam levando o contraente a acreditar que está pagando as parcelas do empréstimo consignado. As
parcelas são baixas. Apenas ao longo dos anos ele percebe que já pagou três ou quatro vezes a
dívida, não havendo previsão para cessarem os pagamentos3.

Para evitar esse expediente malicioso da instituição financeira, é que


a Instrução Normativa nº 28, de 16 de maio de 2008, do INSS determina não bastar a assinatura do
aposentado, pensionista ou servidor no contrato. É necessária a solicitação expressa firmada pelo
titular do benefício:

"Art. 15. Os titulares dos benefícios previdenciários de aposentadoria e


pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão constituir RMC
para utilização de cartão de crédito, de acordo com os seguintes critérios,
observado no que couber o disposto no art. 58 desta Instrução Normativa:
I- a constituição de RMC somente poderá ocorrer após a solicitação formal
firmada pelo titular do benefício (sublinhei), por escrito ou por meio
eletrônico, sendo vedada à instituição financeira: emitir cartão de crédito
adicional ou derivado; e cobrar taxa de manutenção ou anuidade".

A instituição financeira apenas inseriu a cláusula contratual, para


enganar o consumidor, que, acreditando estar pagando por um empréstimo consignado, estava, em
verdade, jungido, eternamente, a pagar prestações de cartão de crédito.

Não cuidou, além disso, o banco de informar o consumidor acerca do


valor, número e periodicidade das prestações. Também não o fez quanto à soma total a pagar com o
cartão de crédito, nem a data do início e fim do desconto. Esses deveres estão previstos no art. 21 da
Instrução Normativa nº 28, de 16 de maio de 2008, do INSS:

Art. 21. A instituição financeira, ao realizar as operações de


consignação/retenção/constituição de RMC dos titulares de benefícios
deverá, sem prejuízo de outras informações legais exigidas (art. 52 do
Código de Defesa do Consumidor - CDC), observar a regulamentação
expedida pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil,
em especial as disposições constantes da Resolução nº 2.878, de 26 de julho
de 2001, e alterações posteriores, bem como dar ciência prévia ao
beneficiário, no mínimo, das seguintes informações:

2Disponível em: http://www.contrafcut.org.br/noticias/bancos-sao-acusados-de-enganar-aposentados-


e-pensionistas-no-maranhao-5cbc.
3 Essa a conclusão a que chegou a Defensoria Pública do Estado do Maranhão. Disponível em:

http://www.contrafcut.org.br/noticias/bancos-sao-acusados-de-enganar-aposentados-e-pensionistas-
no-maranhao-5cbc.

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I - valor total com e sem juros;

II - taxa efetiva mensal e anual de juros;

III - todos os acréscimos remuneratórios, moratórios e tributários que


eventualmente incidam sobre o valor do crédito contratado;

IV - valor, número e periodicidade das prestações (grifei);

V - soma total a pagar com o empréstimo pessoal ou cartão de crédito


(grifei); e

VI - data do início e fim do desconto (grifei).

Ao contrário, há o desconto de valores mensais, no que toca à


Reserva de Margem Consignável. Sem a indicação da periodicidade desse débito, nem do número de
parcelas, nem do total da dívida, dúvida não há que o beneficiário acaba vinculado, por tempo
indeterminado, ao pagamento do débito. Eis o expediente malicioso, que a instituição financeira
emprega, conforme já revelado em linhas anteriores.

Já prevendo essas ilegalidades, é que a Instrução Normativa nº


28/2008 determinou, em seu capítulo XI, uma série de providências, à disposição do beneficiário, em
virtude de operações irregulares ou inexistentes.

Diante disso, é possível visualizarmos várias ofensas a dispositivos e


princípios do Código de Defesa do Consumidor. Passemos a enumerá-los, com base na
jurisprudência.

Antes disso, é preciso deixar claro que a mistura entre empréstimo


pessoal e cartão de crédito consignado, com a cobrança de valor mínimo da fatura, redundou em
falha na prestação do serviço. O consumidor pretendia contratar empréstimo consignado, mas se
surpreendeu com a oferta de produto relacionado a crédito rotativo de cartão de crédito.

Nesse cenário, com as cobranças em valores pequenos, o saldo


devedor veio a aumentar injustamente, o que aponta a insuficiência ou ausência de informação
quanto às parcelas que acreditava estar quitando.

Com isso, a instituição financeira faltou com os princípios da


confiança, além da inobservância ao princípio da transparência, cooperação, informação qualificada,
boa-fé objetiva e fim social do contrato – catalogados nos artigos 4º e 6º do Código de Defesa do
Consumidor.

Além disso, o fornecedor não pode condicionar a contratação de um

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serviço (no caso, empréstimo consignado) à contratação de outro serviço (cartão de crédito), sob
pena de incorrer em prática abusiva, nos termos do art. 39, inciso I, do Código de Defesa do
Consumidor.

Também constitui prática abusiva "prevalecer-se da fraqueza ou


ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para
impingir-lhe seus produtos ou serviços" (CDC, art. 39, inciso IV). Como se sabe, são, geralmente,
pessoas de baixa renda e pouca instrução, ou mesmo pessoas de idade avançada, que acabam
contratando esse tipo de serviço.

Outra prática abusiva consiste em "exigir do consumidor vantagem


manifestamente excessiva" (CDC, art. 39, inciso V). O cartão de crédito, sem que o consumidor
perceba, acaba tornando cativo o vínculo, porquanto as prestações mensais, embora pequenas, não
cessam nunca. Daí porque as cláusulas contratuais que prevejam esse tipo de obrigação tornam-se
abusivas e iníquas, colocando o consumidor em desvantagem exagerada, tornando-se, portanto, nulas
de pleno direito (CDC, art. 51, inciso IV).

O expediente é malicioso, imbuído de evidente má-fé, dada a


confusão intencional que se produz no espírito do consumidor. Daí o direito à devolução em dobro,
das parcelas indevidamente cobradas, nos termos do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa
do Consumidor.

Por tudo isso, não assiste razão a quem invoque a cláusula do pacta
sunt servanda, porquanto a função social de que se constitui a relação de consumo relativiza essa
cláusula.

Nesse sentido, invocando todos esses fundamentos, temos um


brilhante acórdão, assim ementado, do egrégio TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO
DE JANEIRO, a espelhar situação idêntica à ventilada nestes autos:

1ª Ementa Des(a). MARIO ASSIS GONÇALVES - Julgamento:


18/05/2016 - TERCEIRA CÂMARA CÍVEL Relação de consumo.
Contrato. Empréstimo pessoal. Cartão de crédito consignado. Valor
mínimo da fatura. Pagamentos debitados em contracheque. Falha na
prestação do serviço. Cancelamento de contrato. Pedido implícito.
Cobrança indevida. Repetição de indébito. Consumidor que afirma ter
sempre visado contratar empréstimo consignado, vindo a receber da
instituição financeira oferta de produto vinculado ao crédito rotativo de
cartão de crédito. A parte ré se apresenta como fornecedora de serviços,
nos termos do art. 3º, caput e §2º, do Código de Defesa do Consumidor,
sendo o autor considerado consumidor por força do art. 2º do mesmo
diploma legal. Ação de obrigação de fazer cumulada com repetição de
indébito ajuizada pelo rito sumário, pelo consumidor, objetivando o

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reconhecimento de abusividade na cobrança de "encargos rotativos" e


"tarifa de emissão de fatura", afirmando sempre ter sido a sua vontade
celebrar contrato de empréstimo consignado, vindo a se surpreender,
contudo, quando se deparou com a cobrança daquelas rubricas,
inerentes ao cartão de crédito, que se dera unilateralmente, o que viria
a aumentar injustamente o seu saldo devedor, assinalando a ausência de
informação nos descontos efetuados sobre a parcela que pensava quitar,
isso implicando em falta de transparência quanto à verdadeira relação
jurídica firmada entre as partes. Sentença de procedência parcial voltada
apenas para a devolução da "tarifa de emissão de fatura". Apelo do autor,
reprisando as razões já expostas e aduzindo que a sentença teria se firmado
apenas no fato de que utilizara o cartão de crédito, sem fazer o pagamento
total da fatura. Acrescenta que não obstante o desconto em folha, o
pagamento efetuado acaba apenas amortizando o débito minimamente,
fazendo parecer que não houve pagamento algum, sendo a abusividade
cristalina, pois sequer consigna a quantidade de parcelas restantes na
folha de pagamento do autor, como ocorre com os empréstimos
consignados tradicionais. Notoriedade do fato de que o Banco BMG se
vale de contrato que junge empréstimo compulsório e cartão de crédito,
efetuando a cobrança no âmbito deste último. Isso pode ser vislumbrado no
"Termo de Adesão / Autorização para Desconto em Folha de Empréstimo
Consignado e Cartão de Crédito" (fls. 81/85). Quebra dos princípios da
confiança e boa-fé. Falha na prestação dos serviços. Serviço prestado
pela ré sem observância das cautelas que a hipótese recomenda, em
detrimento do dever de proteção dos interesses econômicos do autor
que resulta da regra contida no art. 4º do CDC, que trata da Política
Nacional das Relações de Consumo. Violação dos princípios da
confiança, transparência, cooperação, informação qualificada, boa-fé
objetiva e fim social do contrato como deveres anexo. Falta da devida
informação ao consumidor. Inteligência do art. 6º, inciso III, do CDC.
Responsabilidade objetiva. Art. 14 do CDC. Evidente o descaso da
instituição financeira com o consumidor, constatando-se que o saldo
negativo decorre de cobrança, por longo período, de encargos cobrados
no âmbito do cartão. É dever da instituição financeira comunicar
previamente ao consumidor, em atendimento aos princípios da boa-fé e da
informação, quanto a ausência de margem consignável suficiente para o
desconto das parcelas e liquidação do débito, do que não diligenciando,
assume o risco de ver consumada a hipótese de abuso de direito, o que
extrapola os limites do mero inadimplemento contratual. Deveres de
informação e transparência violados, configurando-se a falha prestação
de serviço. Restituição dos valores cobrados indevidamente que, diante
da má-fé do réu, deverá ser realizada em dobro. Este Tribunal de
Justiça vem entendendo que não se vê outra utilização ou cobrança do
cartão, senão as do financiamento do saldo devedor do mútuo bancário,
acrescidos dos encargos do cartão, tornando a dívida excessiva,
infindável, eis que o débito se gera através de saque consignado, com o
pagamento apenas do mínimo mensal da fatura, descontado
diretamente dos vencimentos do consumidor, por tempo indeterminado,
o que o torna excessivamente oneroso, além transformar o consumidor
em devedor cativo. O conjunto probatório confirma o fato de que o
consumidor, imaginando estar contratando um empréstimo consignado com
juros mais baixos, aderiu a negócio jurídico diverso, revelando-se a conduta
abusiva com o nítido propósito de burlar o limite estabelecido para margem
consignável. Exegese dos art. 104, 138, 147 e 166 do Código Civil. O CDC
veda, expressamente, o condicionar-se o fornecimento de produto ou de
serviço ao de outro, bem assim que se valha o fornecedor da fraqueza
ou ignorância do consumidor, tendo em vista a sua idade, saúde,
conhecimento ou condição social para impingir-lhe seus produtos ou

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serviços, ou que exija do consumidor vantagem manifestamente


excessiva. Também assim quanto à denominada "venda casada",
prática abusiva, repudiada pelo sistema de proteção ao consumidor e
que impõe a declaração de nulidade do contrato. Inteligência dos art.
30, 39, incisos I, IV e V, 51, inciso IV, e 52, do CDC. Relativização do
"pacta sunt servanda" pela legislação consumerista, a qual confere a
condição de ordem pública e de interesse social ao arcabouço protetivo
do destinatário final do produto ou serviço (grifos meus). Recurso
provido. Reforma integral da sentença para julgar procedente o pedido,
determinar que prevaleçam apenas os empréstimos consignados, aí
incluídos os valores obtidos e pagos em parte através do cartão, com a
aplicação da taxa média de juros apurada pelo BACEN para negócios
similares (empréstimos consignados), apurando-se em liquidação de
sentença, o encontro de contas entre os valores tomados por empréstimo
pelo autor e os descontos verificados no seu contracheque, sendo os valores
que foram cobrados segundo os termos do cartão, incorporados ao seu
crédito, na forma do parágrafo único do art. 42 do CDC, seguindo o
contrato, que assim remanesce, mediante a realização de descontos na forma
dos verbetes nº 200 e 295 da súmula deste Tribunal de Justiça, até que
quitado eventual débito que permaneça. Condenado o réu ao pagamento das
custas processuais e da verba honorária, esta que se arbitra em 10% (dez por
cento) sobre o valor da condenação. Recurso a que se dá provimento.

Assim também já decidiu o egrégio TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO


ESTADO DE SÃO PAULO (6ª Câmara Extraordinária de Direito Privado, Apelação nº
00745286620108260224, Relator THIAGO DE SIQUEIRA, julgamento proferido no dia 16 de
outubro de 2014):

EmentaCartão de crédito - Pedido de parcelamento de débito e de


cancelamento de reserva de margem de consignação feita perante o INSS,
relativamente ao benefício previdenciário auferido pela autora
Improcedência Alegação de bloqueio de parte do benefício em valor
mínimo da fatura e ausência de emissão de fatura para oportunizar o
pagamento total do débito Abusividade (grifei), nos termos do Código de
Defesa do Consumidor, que deve ser reconhecida - Ocorrência de dano
moral também configurada Demandante que também faz jus à indenização
por danos morais, conforme postulado, igualmente, na presente ação -
Parcelamento do débito não especificado pela demandante e que dependeria
de aceitação pelo réu Ação que deve ser julgada parcialmente procedente
Recurso da autora provido em parte.

A propósito, notável julgamento proferido pelo egrégio TRIBUNAL


DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO:

AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO


COM PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO E
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – Autora que alegou ter
aderido a sistema de cartão de crédito consignado, por meio do
qual ocorre mensalmente o desconto em folha referente ao
pagamento mínimo da fatura, sendo que as cobranças
perduraram até o ajuizamento da ação, mesmo sem a utilização
do referido cartão e sem o recebimento das faturas – Pedido de
declaração de inexigibilidade do débito, restituição dos valores em

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dobro e indenização por dano moral – Sentença de parcial


procedência, com a condenação a repetição do indébito e
indenização por danos morais, arbitrada em R$10.000,00-
RECURSO DE APELAÇÃO DO BANCO PANAMERICANO –
Erro na cobrança e má prestação de serviços que autoriza o
reconhecimento do dano moral e respectivo dever de indenizar –
Quantum fixado em sentença, de R$10.000,00, arbitrado com
equilíbrio e proporcionalidade, diante das circunstâncias do caso
concreto, e que cumpre suas finalidades indenizatória e
sancionatória (grifos meus) – Redução que poderia esvaziar a
finalidade do instituto –– RECURSO NÃO PROVIDO.
(Relator(a): Spencer Almeida Ferreira; Comarca: Laranjal Paulista;
Órgão julgador: 38ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento:
23/02/2017; Data de registro: 23/02/2017)

Outros precedentes brilhantes do egrégio TJSP:

Obrigação de fazer c/c indenização por danos morais. Autora que se


dirigiu à instituição financeira, com intuito de obter empréstimo
consignado, mas lhe foi disponibilizado cartão de crédito - reserva
margem consignado - com liberação do limite estabelecido de forma
imediata. A partir de então, passou-se aos descontos em folha de
pagamento do valor mínimo, contudo sem realizar qualquer cobrança
acerca do principal. Contrato estabelecido que pereniza a dívida e deve
ser reputado nulo, com apoio no artigo 51, inciso IV, do CDC (grifei).
Dano moral caracterizado e arbitrado em R$ 8.000,00, com correção do seu
arbitramento (Súmula 362 do STJ), e acrescido de juros de mora de 1% ao
mês a contar da citação. Sucumbência de responsabilidade do Réu, que
arcará também com o pagamento das custas, despesas processuais e verba
honorária no patamar de 15% sobre o valor da condenação. Recurso do Réu
não provido e provido em parte o recurso da Autora.
(Relator(a): João Pazine Neto; Comarca: Tanabi; Órgão julgador: 37ª
Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 22/11/2016; Data de
registro: 22/11/2016)

APELAÇÃO – BANCÁRIO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE


INEXIBILIDADE DE DÉBITO C/C INDENIZATÓRIA POR DANOS
MORAIS - SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
1. CARTÃO DE CRÉDITO – Ausência de prova de efetivo uso de cartão
de crédito, bem como do envio regular de faturas – Dever de
informação violado relativamente ao fato de haver desconto do valor
mínimo da fatura em folha de pagamento, com a cobrança do
remanescente por outros meios, gerando débito ora considerado
inexigível (grifei).
2. DANOS MORAIS – Descontos abusivos em folha de pagamento e
cobranças relativos a débito indevido – Desassossego extrapatrimonial
relevante que comporta reparação – Indenização bem fixada em R$
10.000,00 (dez mil reais) (grifei).
SENTENÇA MANTIDA– RECURSO DESPROVIDO.
(Relator(a): Sergio Gomes; Comarca: Laranjal Paulista; Órgão julgador: 37ª
Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 08/11/2016; Data de
registro: 09/11/2016)

Como se vê, atualmente a legislação permite que a instituição

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Jales-SP

Nº Processo: 1001663-59.2018.8.26.0414

financeira disponha a reserva de margem consignável mediante cartão de crédito. O consumidor


pode até sacar o valor a esse título.

Para tanto, cumpre ao fornecedor informar adequadamente o


beneficiário.

Diferente seria se a instituição financeira tivesse apenas liberado o


valor a título de empréstimo consignado.

Mas, não.

O banco liberou o valor e cobra os encargos como se o consumidor


estivesse usando o cartão de crédito. Perceba-se que, nas faturas juntadas pela própria parte-
requerida, não há movimentação no cartão de crédito.

O expediente é malicioso, porquanto os encargos financeiros


incidentes sobre cartões de crédito são inúmeras vezes maiores do que os encargos ordinariamente
cobrados no empréstimo consignado.

O consumidor acaba sendo levado a erro. Isso porque, pensando que


está a contratar apenas um empréstimo consignado, é levado a contrair, também, um contrato de
cartão de crédito.

Sobre a ilegalidade do expediente, temos precedentes vários, além do


brilhante acórdão, acima citado, do egrégio TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO. Um deles, colhido em AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com liminar proferida pelo eminente
Magistrado DOUGLAS DE MELO MARTINS, para fins de que várias instituições financeiras –
entre as quais o recorrido -, suspendam cobranças desses empréstimos com MARGEM
CONSIGNADA de cartão de crédito (disponível em:
http://www.tjma.jus.br/cgj/visualiza/publicacao/408552).

É que, no caso, o fornecedor falta com o direito básico dos


consumidores em obter informação clara e adequada sobre os serviços, nos termos do art. 6º, inciso
III, do Código de Defesa do Consumidor.

Para piorar, o expediente ilegal reduz a MARGEM CONSIGNADA


do aposentando, impedindo a contratação de novos empréstimos consignados.

O problema, como dito, não é a contratação em si, desde cercada com


as cautelas que o Código de Defesa do Consumidor e a Instrução Normativa nº 28/2008 do INSS
impõem.

O problema não é esse. O problema, isto sim, é que a instituição


financeira inseriu um cartão de crédito, para cobrar encargos financeiros maiores, de uma operação,
em verdade, que era apenas um empréstimo consignado.

Anote-se que a prática da instituição financeira resvalou para a má-


fé, porquanto criou ilícito subterfúgio para enganar o consumidor. De rigor, portanto, a devolução
em dobro dos valores indevidamente cobrados, nos termos do art. 42, parágrafo único, do Código de
Defesa do Consumidor.

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Jales-SP

Nº Processo: 1001663-59.2018.8.26.0414

Os danos morais são evidentes. A instituição financeira se aproveitou


dos descontos em benefício previdenciário, para saldar ilegais encargos financeiros pertinentes a
cartão de crédito. Violou o direito à sobrevivência digna do consumidor. Daí os danos morais.

Diante da plêiade de ilegalidades cometidas, bem assim em razão do


elevado capital econômico do recorrido, é que se fixa a reparação por danos morais no valor de R$
10 mil. Assim se satisfazem as finalidades de compensar a vítima e punir o ofensor, de tal sorte que
condutas semelhantes não tornem a repetir-se.

Por fim, não é caso de determinar-se à recorrente que devolva o valor


do empréstimo. Isso porque o empréstimo continua válido, devendo a instituição financeira valer-se
dos instrumentos legais a seu dispor para cobrar pelo empréstimo consignado, desconsiderando-se o
cartão de crédito.

Posto isso, DÁ-SE PROVIMENTO ao recurso da parte-autora, de


tal sorte que se JULGA PROCEDENTE o pedido, de modo que se: a) condena o recorrido a
devolver, em dobro, os valores descontados ilegalmente a título de cartão de crédito, ou seja, o total
de R$ 1.475,58, mais o dobro dos valores descontados, a esse título, a partir do ajuizamento da
demanda, com atualização monetária e juros de mora de 1% ao mês a partir dos descontos indevidos;
b) condena o recorrido na indenização por danos morais, no valor de R$10.000,00, atualizado a
partir deste julgamento, com juros de mora de 1% ao mês a partir da citação; c) libere a Reserva de
Margem Consignada averbada no cadastro do INSS pelo sistema DATAPREV, providência, essa, a
ser tomada pelo recorrido, no prazo de 15 dias, sob pena de multa diária de R$ 500,00.

Sem condenação em custas e despesas processuais, bem como em


honorários advocatícios, nos termos do art. 55, caput, da Lei nº 9.099/95.

Fernando Antônio de Lima


Juiz Relator

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