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1. INTRODUÇÃO
Valorar a omissão sempre foi tarefa difícil ao legislador. Dar sentido ao nada, à
não ação, gerou dúvidas e requereu uma reestrutura da dimensão ontológico-
normativa do conceito de ação, para então identificar a natureza da omissão.
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cogitationes poenam nemo patitur ou nullum crimen sine actione. É dizer – vigora
o princípio da materialidade, segundo o qual o delito sempre exige um fato
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humano – uma ação ou omissão .
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De acordo com a previsão legal, o crime omissivo próprio seria aquele cuja lei já
declara a modalidade de omissão, por exemplo, que o delito de omissão de socorro
(art. 135 do CP).
No entanto, tal diferenciação seria falha, pois não resolveria casos como delitos de
facilitação de contrabando ou descaminho (art. 318 do CP), pois os critérios
poderiam levar a classificá-los tanto como omissivos próprios quanto impróprios.
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Na obra de Fábio Roberto D’Ávila , haveria outros critérios para a diferenciação
entre delitos omissivos próprios e impróprios, dentre os quais o normológico; de
Hertzberg; do dever de garante; lógico-objetivo de Schünemann. No entanto,
como o intuito do presente trabalho reside em apenas abordar breves noções a
respeito do tema, referimos ao mestre, explicando que os dois principais critérios
seriam o do resultado (tradicional) e o do tipo penal.
4. DA POSIÇÃO DE GARANTIDOR
De acordo como o Código Penal Brasileiro, em seu art. 13, §2º: “A omissão é
penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o
resultado. O dever de agir incumbe a quem: a) tenha por lei obrigação de cuidado,
proteção ou vigilância; b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir
o resultado; c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do
resultado”.
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Quando o legislador de 1984 , na reforma da Parte Geral do Código Penal
estabeleceu a redação acima referida, estabeleceu a figura do chamado
“garantidor” no nosso sistema. Antes, pela redação original de 1940, a previsão de
tal figura era apenas doutrinária, sem qualquer respaldo normativo, em franco
ferimento ao princípio da legalidade. Com tais mudanças, deixou-se de lado a
chamada teoria das funções, em prol de um critério normativo, tornando possível
que delitos previstos tão somente na modalidade ativa também fossem imputados
aos seus autores, por meio de uma adequação típica, quando o resultado dos
mesmos fosse também alcançado por meio de uma omissão.
Na lição de Greco:
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Sendo omisso, o garantidor deve responder pelo resultado típico como se tivesse
realmente causado o prejuízo com uma conduta comissiva.
Para Tavares:
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Figueiredo Dias ainda ressalta que os crimes de omissão puros são aqueles
descritos na parte especial do código expressamente, sendo a omissão forma de
integração típica, descrevendo os pressupostos fáticos de onde deriva o dever
jurídico de atuar, em todo o caso, referindo aquele dever e tornando o agente
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garante do seu cumprimento .
As omissões puras, próprias, são aquelas omissões típicas, que não guardam
correspondência com um delito de ação, ou seja, são aquelas em que o delito
correspondente de ação não existe.
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O doutrinador Luiz Régis Prado descreve os delitos omissivos como aqueles que se
consumam com a simples infração da ordem ou do comando de agir,
independentemente do resultado. Transgride-se a mera obrigação de atuar. É
delito comum e de mera atividade, visto que não exige um resultado como
elemento do tipo de injusto (ex.: art. 135 – omissão de socorro; art. 168-A-
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apropriação indébita previdenciária ; art. 244 – abandono material ; art. 246 –
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abandono intelectual ; art. 269 – omissão de notificação de doença ; art. 359-F –
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não cancelamento de restos a pagar ; todos do CP) .
Entre seus requisitos, cabe mencionar: situação típica; não realização de uma ação
cumpridora de mandato; capacidade concreta de ação, que, por sua vez, exige
conhecimento da situação típica e dos meios ou formas de realização da conduta
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devida .
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O direito penal atual é delineado pela teoria da proteção aos bens jurídicos, ou
seja, dentro do Estado Democrático de Direito em que vivemos, não há como se
pensar no direito penal que não estabelecido na ofensividade, no desvalor de
resultado que esta ofensa exprime na concepção material de crime como ofensa a
bens jurídicos.
Nestes termos:
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Dessa forma, extraímos a lição de que o dever de agir, delineado dentro do tipo
penal dos crimes omissivos próprios denota mais que um simples dever de auxílio
e solidariedade e sim um dever de evitar o resultado que levaria a uma lesão ou
um perigo aos bens jurídicos. A ofensa ou a potencial ofensa ao bem jurídico torna
a omissão mais que um dever de mera atividade e sim um dever absoluto de evitar
o resultado danoso ao bem juridicamente tutelado.
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que impõe um dever de agir, para impedir que processos alheios ao sujeito
venham a ocasionar um resultado lesivo, enquanto que a norma proibitiva dirigir-
se-ia a todos aquele que porventura pudessem ser sujeitos do crime.
Ainda, resta observar que o poder de agir seria correlato ao dever imposto ao
agente, pois somente ser-lhe-ia imputada responsabilidade se o mesmo sujeito,
devendo agir, pudesse faticamente, fisicamente fazê-lo, ainda que com risco
pessoal. Exemplifica-se com a coação física irresistível, onde não existe conduta
punível, pois o agente não podia agir, não sendo considerado omitente. A
evitabilidade do resultado traria para o contexto a relação de causalidade ou
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relação de não impedimento , sob a qual não se pode imputar ao sujeito omissão
que, realizado juízo hipotético de eliminação, não evitaria o resultado. Já o dever
de impedir o resultado refere-se à terceira condição do delito omissivo impróprio,
na qual o agente é o garantidor da não ocorrência do resultado, sendo imputado
pela sua ocorrência quando se omitir.
Por fim, observa-se que a doutrina atual afirma que a criação ou incremento da
utilização de delitos omissivos, especificamente os impróprios, vem a ser uma das
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consequências da nossa sociedade de risco . O número de omissões jurídico-
penalmente relevantes terá tendência para aumentar, em número e em
significado, diante das mudanças cíclicas e de grande celeridade, que acabam por
criar novos deveres aos cidadãos. Todavia, na mesma proporção, há autores que
defendem que nos delitos omissivos impróprios, necessariamente, deveriam ser
computadas atenuantes, pois segundo tal doutrina, o apenamento de um delito
omissivo não poderia ser idêntico ao de um crime comissivo.
Em que pese não ser pacífico, no âmbito do direito brasileiro poder-se-ia imaginar
atenuante genérica para pena de delito omissivo, conforme o Código Penal: “Art.
66 - A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante,
anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei”.
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Para aqueles que creem que não poderia fazer a mesma assimilação dos delitos
mediante ação do sujeito, sustenta-se que na conduta omissiva, a omissão não
causa o resultado, ou seja, a finalidade do agente não dirigiria a causalidade,
porém, para a doutrina pela qual nos norteamos, poder-se-ia falar em verdadeira
finalidade nos delitos omissivos, sendo o dolo fundado na previsão da causalidade.
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Quanto à culpa, também segundo a doutrina acima referida, seu conceito geral
deve ser aplicado aos delitos omissivos, pois seu elemento principal residirá na
violação de um dever de cuidado.
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No entanto, o referido dever não é apontado para toda e qualquer pessoa, mas
somente àqueles que estejam aptos a agir e se situam diante de uma situação
típica. Depois, infere-se que aqueles que tenham condições concretas de impedir a
concretização de um resultado, tenham vinculação especial com a vítima ou para
com a fonte produtora do perigo, estejam assim em situação de garantidores da
não ocorrência do resultado.
Neste entendimento cada agente e omitente responde pelo seu delito, pois para
que haja concurso de pessoas, é imprescindível que os agentes partícipes estejam
subordinados aos mesmos critérios de imputação.
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Entretanto, a doutrina de Figueiredo Dias vai mais além, estabelecendo
diferenças quanto ao concurso de agentes. Primeiramente, quando se trata de
participação ou coautoria por ação em um crime omissivo, segundo o autor, seria
possível em razão de serem válidas também para os delitos omissivos as mesmas
regras dos delitos comissivos. Em segundo ponto, para tal doutrina seria
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11. REFERÊNCIAS
Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1. São Paulo.
Editora Saraiva.
Callegari, André Luís. Teoria geral do delito e da imputação objetiva. Porto Alegre.
Editora Livraria do Advogado. 2009.
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Dias, Jorge de Figueiredo. Direito Penal – Parte Geral. Coimbra. Coimbra Editora/
Revista dos Tribunais. 2007.
Greco, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Geral. Rio de Janeiro. Editora
Impetus, 2002.
Prado. Luiz Régis. Curso de Direito Penal Brasileiro. São Paulo. Revista dos
Tribunais. 2013.
NOTAS
2 Ibid. p. 188/189.
3 Prado. Luiz Régis. Curso de Direito Penal Brasileiro. São Paulo. Revista dos
Tribunais. 2013. p. 326.
4 Ibid. p. 328.
5 Ibid. p. 329.
6 Ibid. p. 354.
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11 Greco, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Geral. Rio de Janeiro. Editora
Impetus, 2002, p.251.
12 Greco, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Geral. Rio de Janeiro. Editora
Impetus, 2002, p. 252.
17 Ibid. p. 37.
18 Não confundir a garantia que decorre dos crimes omissivos próprios em que o
agente se torna garante devido a sua conduta de não fazer o que é devido conforme
a lei com o dever de garantia e função de garante dos crimes omissivos
impróprios.
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22 Abandono material - art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência
do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou
de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando
os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia
judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer
descendente ou ascendente, gravemente enfermo.
23 Abandono intelectual - art. 246 - Deixar, sem justa causa, de prover à instrução
primária de filho em idade escolar.
26 Prado. Luiz Régis. Curso de Direito Penal Brasileiro. São Paulo. Revista dos
Tribunais. 2013. p. 357.
29 Ibid. p. 242/243.
30 Ibid. p. 276.
31 Ibid. p. 277.
33 Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1. São Paulo.
Editora Saraiva, p. 251.
35 BITENCOURT, Cezar. Tratado de Direito Penal. Parte Geral. 14ª. Edição. Porto
Alegre: Editora Saraiva, 2009, p. 250.
36 Ibid., p. 250.
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38 Para a doutrina portuguesa: “No direito penal atual, continua a ser, tanto na lei
como na vida, muito maior o número de ações do que de omissões jurídico-
penalmente relevantes. Mas, como bem se compreende, o número de omissões
jurídico-penalmente relevantes terá tendência para aumentar, em número e em
significado, no seio da “sociedade do risco”. Sem dever, todavia, esquecer-se que
uma punição generalizada ou demasiado alargada da omissão conduzirá
seguramente a uma sistemática, inadmissível e insuportável intromissão – tanto
mais insuportável quanto maior for, precisamente, a complexidade social – de
cada um na esfera jurídica dos outros, para assim não incorrerem na possibilidade
de serem jurídico-penalmente responsabilizados por omissões.” Dias, Jorge de
Figueiredo. Direito Penal. Parte Geral. Tomo I. 2ª edição. Portugal. Coimbra.
2012. Coimbra Editora. p. 908.
41 Ibid., p. 519.
44 Ibid, p. 86.
47Ibid., p. 91.
Autores
Ayrton Figueiredo Martins Júnior
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