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Apollyon

Covenant 04
Jennifer L. Armentrout

O destino não é algo com que se deva mexer... e agora, nem é


Alex.

Alex sempre temeu duas coisas: perder-se durante o Despertar e


ser colocada no Elixir. Mas o amor sempre foi mais forte do que o
destino e Aiden St. Delphi está disposto a fazer guerra aos deuses
- e a própria Alex - para trazê-la de volta.

Os deuses mataram milhares de pessoas e poderiam destruir


cidades inteiras em sua missão de parar Seth de tomar o poder de
Alex e se tornar o todo-poderoso Assassino de Deuses. Mas
quebrar a ligação de Alex com Seth não é o único problema.
Existem algumas pequenas falhas irritantes em toda a teoria do
"um Apollyon não pode ser morto", e a única pessoa que pode
saber como parar a destruição esteve morta durante séculos.

Encontrar o seu caminho pelas barreiras que protegem o


submundo, procurar uma alma entre os incontáveis milhões, e, em
seguida, de alguma forma voltar vai ser difícil o suficiente. Alex
pode ser capaz de evitar que Seth se torne o assassino de
Deuses... ou ela pode tornar-se a assassina de Deuses ela própria.
Um
Meu sangue coçava por uma luta. Meu músculos gritando por ação. Meus
pensamentos estavam cobertos de uma inebriante névoa âmbar de poder. Eu
era o Apollyon. Eu exercia controle sobre os quatro elementos e o quinto e
mais poderoso - akasha. Eu alimentava o Assassino de Deuses. Eu era a sua
energização - o ás na manga. Eu era o começo e ele era o fim. E juntos, nós
éramos tudo.

No entanto, tudo o que eu podia fazer era ir para frente e para trás.
Enjaulada e impotente pelas marcações gravadas no cimento em cima de
mim e por barras criadas por um deus.

— Alex.

Claro, eu não estava sozinha. Oh, não. Meu próprio inferno pessoal era
uma festa para dois. Bem, era realmente um trio... talvez um quarteto. Soava
mais divertido do que era. Vozes... havia muitas vozes na minha cabeça.

— Você se lembra?

Eu inclinei minha cabeça para a direita, sentindo os músculos esticarem


e ossos fundirem. Então eu repeti os movimentos para a esquerda, os dedos
movendo - mindinho, médio, indicador... uma e outra vez.

— Alex, eu sei que você pode me ouvir.

Olhei por cima do meu ombro, meu lábio curvando com o que vi. Rapaz,
eu tinha um osso do tamanho de um T-Rex para lidar com o puro-sangue.
Aiden St. Delphi estava do outro lado das grades. Lá, ele era uma força
imóvel. Mas, sem as proteções de Hefesto ou Apolo entre nós, ele se tornaria
um nada insignificante.

Não. Não. Não.

Minha mão voou para a rosa de cristal levantando-se com vontade


própria, sentindo as bordas lisas e delicadas. Ele era tudo.

Dor aguda cortou entre minhas têmporas, e rosnei. Enviando-lhe um


olhar de ódio, eu enfrentei a parede de cimento nu.

— Você deveria ter me mantido no Elixir.


— Eu nunca deveria ter te colocado no Elixir — ele respondeu. — Esse
não era o caminho para chegar até você.

Eu ri com frieza.

— Oh, você pensa muito bem de mim.

Houve uma pausa.

— Eu sei que você ainda está aí, Alex. Debaixo dessa conexão, você ainda
é você. A mulher que eu amo.

Abri a boca, mas não havia palavras - apenas memórias de estar de pé no


riacho e dizer a Aiden que eu o amava, e, em seguida, um fluxo interminável
de pensamentos e ações centradas nele. Meses, senão anos, passando uma e
outra vez até que eu não podia distinguir entre o passado, o presente e o que
viria a ser o meu futuro.

Como se sentisse para onde meus pensamentos tinham divagado, ele


disse:

— Há alguns dias você disse que me amava.

— E alguns dias atrás eu estava alta como uma pipa e me escondendo no


armário, graças a você — Eu me virei, bem a tempo de vê-lo recuar. Bom. —
Você me colocou no Elixir.

Aiden tomou fôlego, mas não desviou o olhar de vergonha ou culpa. Ele
encontrou e segurou o meu olhar, trancando os seus com olhos que eu sabia
que ele odiava com cada fibra do seu ser.

— Coloquei.

Eu tomei um fôlego profundo, pesado.

— Eu vou sair daqui eventualmente, Aiden. E eu vou te matar.


Lentamente.

— E você vai matar todo mundo com quem eu me preocupo. Eu sei. Nós
estivemos aqui antes — Ele se inclinou contra as grades. Não havia um
indício de barba em seu rosto suave desta vez. Ele estava usando seu
uniforme de Sentinela, todo preto. Mas havia sombras escuras sob os olhos
marcantes dele.
— Eu sei que você não vai me machucar se você sair — continuou ele. —
Eu acredito nisso.

— Triste.

— O que?

— Que alguém tão bonito como você seja tão incrivelmente estúpido —
Sorri quando seus olhos se estreitaram. No momento em que brilhou prata,
eu sabia que tinha atingido um nervo. Isso me deixou morna e distorcida por
cerca de três segundos, e então eu percebi que eu ainda estava em uma
maldita gaiola. Provocar Aiden ajudava a passar o tempo, mas isso não
mudava nada.

Havia melhores coisas que eu poderia estar fazendo.

Eu só precisava esperar e procurar a altura certa. O baixo nível estático


estava na minha cabeça. Constante. Tudo o que eu precisava fazer era segui-
lo, mas no momento que Aiden sequer pensava que eu estava fazendo isso,
ele começava a falar.

Indo para o colchão no chão, me sentei e coloquei os joelhos embaixo do


meu queixo. Eu assisti Aiden me observar. E eu tentei manter tranquila a
voz que aparecia quando ele estava por perto. Eu não gostava ou
compreendia essa voz.

Aiden passou a mão pelo cabelo, e depois empurrou para trás das grades.

— Você sabe o que está acontecendo lá fora, agora?

Eu dei de ombros. Eu deveria me importar? Tudo que eu queria era sair


daqui e me conectar com meu Seth. Então, se meu pai ainda estivesse
escravizado no Catskills, iríamos libertá-lo. Meu Seth me havia prometido.

— Você se lembra do que Poseidon fez com a Ilha Divindade?

Como diabos eu deveria esquecer isso? Poseidon tinha dizimado o


Covenant de lá.

— Bem, isso vai piorar, Alex. Metade dos Doze olimpianos querem fazer
guerra ao Seth e Lucian. — Continuou ele. — E eu tenho certeza que ele sabe
disso. Talvez seja isso que ele quer, mas é isso que você quer? Sabe quantas
vidas inocentes serão perdidas? Ambos mortais e mestiços? É algo com o que
você pode viver?

Eu realmente não estava vivendo agora, considerando que eu estava em


uma gaiola.

— Porque eu sei que no fundo você não poderia viver com você mesma,
sabendo que ajudou a causar a morte de milhares, se não milhões -
especialmente daqueles mestiços. Você estava questionando se tornar uma
Sentinela por causa de como eles estavam sendo tratados. Se Seth continuar
com isso, eles vão morrer. — A convicção em sua voz era irritante. Assim era
a paixão que alimentava as palavras. — Caleb - você se lembra como você se
sentiu depois de Caleb…

— Não fale sobre ele!

Suas sobrancelhas escuras se ergueram. Choque estampou em seu rosto e,


em seguida, ele correu em direção a essas malditas barras, agarrando-as.

— Sim, Caleb, Alex! Lembra-se de como você se sentiu quando ele


morreu? Como você culpou a si mesma?

— Cale a boca, Aiden.

— Você se lembra de estar tão rasgada que você ficou na cama por cinco
dias? Seu coração foi quebrado quando você o perdeu. Você acha que ele
gostaria de vê-la fazer isso para si mesma? Sua morte foi por estar em um
lugar errado na hora errada, mas isso? Haverá milhares de Calebs, mas vai
ser culpa sua.

Eu pressionei minha cabeça contra meus joelhos e apertei minhas mãos


sobre meus ouvidos. Mas isso não fez nada para parar a crescente onda de
emoção batendo em mim ou a dor nas têmporas, que estava rapidamente se
transformando em uma acentuada dor lancinante. E isso não o impediu.

— E a sua mãe, Alex?

— Cale a boca! — Eu gritei.

— Isso não era o que ela queria! — As barras tremeram quando ele as
atingiu com o que eu imaginei que eram os punhos.

Isso tinha que doer. — Esse não é o motivo pelo qual ela morreu para
protegê-la. Como você ousa apenas rolar e deixá-lo fazer isso…

Meu corpo inteiro estalou como um elástico puxado com muita força.
— Cale a…
O zumbido rugiu nos meus ouvidos, abafando Aiden e tudo mais. Em um
instante, ele estava lá, deslizando pelas minhas veias, como mel rico e
quente.
Ouça-me. As palavras estavam em meus pensamentos, acalmando como o
ar ameno de verão. Ouça-me, Alex. Lembre-se o que vamos fazer juntos uma
vez que nos conectarmos. Libertar os mestiços e seu pai.
— Alex, — Aiden estalou.
Bons deuses, ele não tem nada melhor para fazer? O suspiro exasperado
de Seth estremeceu pelo meu corpo. Ignore-o. Ele não é importante. Nós
somos.
Meus dedos apertaram no meu cabelo.
— Ele está ai agora, não é? — Raiva aprofundou a voz de Aiden. As barras
agitaram novamente. No ritmo em que ele estava indo, seus dedos estariam
massacrados. Assim como meu cérebro. — Não dê ouvidos a ele, Alex.
A risada de Seth era como lascas de gelo. Ele está entrando aí? Acabe
com ele, Anjo. Em seguida, fuja. Ninguém será capaz de pará-la.
Eu puxei meu cabelo até agulhas minúsculas esfaquearem no meu couro
cabeludo.
— Alex, olhe para mim. — O tom desesperado na voz de Aiden alcançou
uma parte de mim que eu não estava totalmente familiarizada. Meus olhos se
abriram e me apeguei a ele. Eles eram prateados, como o luar. Lindos olhos.
— Juntos podemos quebrar o vínculo entre você e Seth.
Diga a ele que você não quer quebrar o vínculo.
Incrível... e assustador quanto o meu Seth podia ver e ouvir quando
estávamos conectados. Era como ter uma outra pessoa vivendo dentro de
mim.
— Alex, — disse Aiden. — Mesmo se você for ter com ele, ele vai drenar
você exatamente como um daimon faria. Talvez ele não queira, mas ele fará.
Meu coração disparou. Eu tinha sido avisada antes - por minha mãe,
meses atrás. Era uma das razões pelas quais ela queria me transformar em
um daimon. Uma razão confusa cheia de lógica falha, mas ainda...
Eu nunca faria isso com você, Alex. Tudo que eu quero é mantê-la
segura, te fazer feliz. Libertar o seu pai é o que você quer, não é? Juntos,
podemos fazer isso, mas apenas em conjunto.
— Eu não vou desistir, — disse Aiden. Um bendito silêncio se estendeu
por alguns instantes. — Você ouviu isso, Seth? Não vai acontecer.
Ele é irritante.
Vocês são irritantes. Então eu disse em voz alta:
— Não há nada para desistir, Aiden.
Seus olhos se estreitaram.
— Há tudo.
Aquelas palavras me pareceram estranhas. “Tudo” era um fantasma do
que foi e nunca poderia ser. Tudo mudou no momento em que eu tinha me
ligado com o meu Seth. Era difícil de explicar. Meses atrás, quando eu tinha
problemas para dormir, e a conexão entre nós tinha facilitado o meu corpo e
mente? Bem, isso era assim, uma centena de vezes maior.
Não havia nada meu nisso. Mais ou menos como tinha havido nenhum
Seth nisto antes de eu ter Despertado. Eu entendia isso agora. O quanto ele
se esforçou estando em torno de mim, lutando para não ser sugado para o
que eu tinha em curso. Agora havia apenas nós - um único ser existente em
dois corpos distintos. Uma alma separada. Solaris e o Primeiro…
Dor aguda explodiu atrás dos meus olhos.
Não. Seu sussurro entrou em minhas veias. Não pense sobre eles.
Eu fiz uma careta.
E então meu Seth continuou conversando. Assim como Aiden. Mas ele
não era estúpido o suficiente para entrar na cela. Mesmo cansada e retida
pelas paredes, eu tinha certeza que eu poderia derrubá-lo. Minutos se
passaram, talvez horas, enquanto os dois abatiam minhas células cerebrais.
Quando tudo acabou, eu caí contra o colchão. Um inferno de uma dor de
cabeça me bateu. Aiden só saiu porque alguém - o meu tio? - abriu a porta de
cima, o que geralmente significava que algo estava acontecendo. Rolei para
o meu lado, lentamente me esticando.
Finalmente, Seth suspirou.
Eu soltei meus dedos. As articulações doíam. Ele não vai ficar fora por
muito tempo.
Nós não precisamos de muito, Anjo. Nós só precisamos descobrir onde
você está. E então nós vamos estar juntos.
Um leve sorriso curvou os meus lábios para cima. Se eu me concentrasse
bastante, eu podia sentir meu Seth na extremidade da corda como se
estivesse sempre presente. Às vezes, ele se escondia de mim, mas não agora.
Minha memória puxou junto a sua imagem. Sua pele dourada e
sobrancelhas ligeiramente arqueadas se formaram em meus pensamentos. A
curva forte de sua mandíbula pedia para ser tocada, e o sorriso maroto nos
lábios cheios se espalhava. Deuses, seu rosto era sobrenatural - frio e duro
como as estátuas de mármore que eram utilizadas para forrar o edifício do
Covenant.
Mas não... não havia mais estátuas na Ilha Divindade. Não havia nada.
Poseidon tinha rasgado tudo isso e puxou de volta ao oceano. Edifícios,
estátuas, areia, e as pessoas, tudo isso desapareceu.
Eu perdi a imagem do meu Seth.
Mal-estar formou-se na boca do meu estômago. Aiden estava certo antes –
mais ou menos. Algo sobre toda essa situação me incomodava, fazia eu me
sentir impotente, e eu não podia fazer nada.
Eu era o Apollyon.
Volte a pensar sobre o quão bom eu pareço. Eu gosto disso.
Algumas coisas nunca mudam. O ego do meu Seth estava tão grande
como nunca.
Mas a minha imagem de Seth floresceu na minha frente. Seu cabelo era
crespo ao redor de suas têmporas e a core de fios de ouro. Lembrou-me as
pinturas de Adonis. Mas Adonis não era loiro. Através do conhecimento dos
Apollyons anteriores, eu sabia que seu cabelo tinha sido marrom.
Onde você está? Eu perguntei.
No norte, Anjo. Você está no norte?
Eu suspirei. Eu não sei onde estou. Há bosques ao redor de mim. Um
riacho.
Não é útil. Houve uma pausa, e eu imaginei a sensação de sua mão no
meu rosto, traçando a curva do osso. Eu tremi. Eu sinto sua falta, Anjo.
Essas semanas quando estava escondida de mim me deixaram louco.
Eu não respondi. Eu não tinha sentido falta do meu Seth. Enquanto eu
estava sob a influência do Elixir, eu nem sabia que ele existia.
Seth riu. Você pode fazer maravilhas para a minha autoestima. Você
deveria dizer que sentiu minha falta, também.
Rolando para as minhas costas, eu tentei trabalhar a torção na perna. O
que vai acontecer quando eu transferir o meu poder para você?
Houve uma pausa, e eu comecei a ficar nervosa. Não vai doer, sua voz
sussurrou. Será como quando nos tocávamos antes, quando as runas
apareceram. Você gostava disso.
Eu gostava.
Haverá algumas palavras ditas, nada enorme, e então eu vou tomar o seu
poder. Eu não vou drenar você, Alex. Eu nunca faria isso.
E eu acreditava nele, então relaxei. Qual é o plano, Seth?
Você sabe qual é o plano.
Ele queria eliminar os Doze Olimpianos antes que eles encontrassem uma
maneira de nos eliminar. A lenda dizia que nós éramos apenas vulneráveis a
outro Apollyon, mas nenhum de nós estava seguro na crença. Lacunas e
mitos menos conhecidos eram algo que todos os Apollyons tinham procurado
descobrir. Mas uma vez que os deuses estivessem fora do quadro, iríamos
governar. Ou Lucian iria governar. Eu não sabia ou me importava. Tudo que
eu queria era estar perto do meu Seth. Eu estava tendo um caso louco de
ansiedade de separação.
Não. Qual é o plano para que possamos estar juntos?
A aprovação de Seth tomou conta de mim como se eu tivesse acabado de
sair para o sol do verão. Eu me deleitei com ela, como um bom cachorrinho
com uma barriga cheia. Eventualmente, eles vão mostrar uma fraqueza. Eles
sempre fazem. Especialmente St. Delphi. Você é a fraqueza dele.
Eu me contorci. Eu sou.
E quando te for apresentada uma chance de escapar, pegue. Não reprima,
Anjo. Você é a Apollyon. Uma vez livre, eles não podem pará-la. Confie nisso.
E no momento em que você tiver uma ideia de onde você está, eu estarei lá.
Eu confiava em meu Seth.
Houve aquela névoa agradável e inebriante de novo, me invadindo. Você
já viu Apolo ou qualquer outro deus recentemente?
Não. Não desde que eu tinha saído do efeito do Elixir, e isso era estranho.
Apolo tinha estado na minha cola desde o momento em que eu tinha
Despertado, mas eu não o tinha sentido ou visto – ou qualquer outro deus.
Abri os olhos e olhei para as barras. Será que Hefesto necessitaria de
reforçar as barras em breve? Deuses, eu esperava que sim. Se elas
enfraquecessem, então as proteções também enfraqueceriam. Então eu
poderia sair.
Seth disse algo que fez com que os meus dedos enrolassem para me fazer
prestar atenção nele novamente. Aonde você foi?
Mostrei-lhe as barras e os meus pensamentos. Ele estava duvidoso. Um
trabalho de Hefesto raramente era enfraquecido, mas eu estava
esperançosa... por um segundo quente. Este... este vínculo não era o negócio
real. Mesmo que o meu Seth estivesse dentro de mim, ele realmente não
estava aqui. Eu estava sozinha - sozinha em uma cela.
Ele nunca vai me deixar sair. Aiden nunca vai me deixar perto de você.
Lágrimas queimaram meus olhos como um abismo sem fim de desesperança.
Eu nunca vou ver o meu pai.
Sim, você vai. Não importa o que ele fizer. Vou chegar até você. Os
deuses dizem que só pode haver um de nós, mas eles estão errados. Um
enrolamento estranho, e depois relaxamento me encheram. Você é minha,
Alex - sempre foi e sempre será. Nós fomos criados para isso.
Parte de mim aqueceu em resposta. E parte de mim, a fonte da outra voz
que aparecia sempre que Aiden estava por perto, aninhada e escondida do
meu Seth, recuou quando eu toquei o cristal rosa em volta do meu pescoço.
Dois
Algum tempo depois eu não tinha ideia se era noite, dia, ou quanto
tempo eu havia dormido - eu estava sozinha. Não havia Aiden sentado na
cadeira me olhando. Nenhum Seth na extremidade da corda. Isto era um
presente.

Minha cabeça estava mais clara.

Levantei-me e caminhei em direção às barras. Elas pareciam normais -


titânio prateado - mas era a malha fina circulando-as que era o problema.

A cadeia de Hefesto era uma verdadeira cadela.

Respirando fundo, eu peguei as barras e apertei. Um flash de luz azul saiu


delas ondulando ao longo do teto e sobre a marca como uma fumaça cheia de
brilho.

— Droga, — eu murmurei, me afastando.

Tentei acender o akasha. Nada se moveu dentro de mim, nem mesmo um


lampejo. Levantando a minha mão, optei por algo menor. Bem, menor para
mim.

Invoquei fogo.

Eeeeee... não houve nada.

Quando eu tinha Despertado, o poder que tinha me invadido e inundado


minhas veias tinha sido emocionante - algo tão grande que eu poderia ter
lambido o teto, uma força sem igual. Eu entendi porque daimons ansiavam
por éter. Eu tinha acabado de ter um gosto disso. E eu não sentia isso desde
que Apolo tinha me batido na semana anterior com um maldito raio de deus.

Idiota.

Ele também estava na minha lista para matar.

Eu fui para o banheiro e me limpei. Recém-banhada e vestida, voltei a


testar as barras. A luz azul cintilante era de certo modo bonita. Pelo menos
era algo para olhar.
Eu suspirei, prestes a colocar minha cabeça na parede. Procurei meu Seth
no final da corda - ainda desaparecido. Eu poderia chamá-lo e ele iria
responder, mas eu tinha certeza que ele estava ocupado tentando me
libertar. Sem nada para fazer, voltei a testar as seções das barras.

No que parecia horas depois, uma porta se abriu no andar de cima. Havia
vozes. Uma deles era Aiden, mas a outra...

— Luke? — Eu gritei.

— Vá embora, — Foi a resposta áspera de Aiden.

A porta se fechou, e um conjunto pesado de passos desceu as escadas. Eu


juro aos deuses que o som que saiu da minha garganta foi um grunhido
animalesco.

Aiden apareceu, segurando um prato de plástico com ovos e bacon. Uma


sobrancelha se arqueou.

— Você realmente acha que eu vou permitir que um mestiço chegue perto
de você?

— Uma garota pode ter esperança. — Mestiços eram mais suscetíveis a


compulsões, e eu agora embalava uma com esteroides.

Ele segurou o prato através do espaço nas barras. A última vez que eu
tinha feito a coisa toda de não-comer, não tinha funcionado. Eu
praticamente morri de fome e acabei no Elixir por causa disso. Comida era
minha amiga desta vez.

Estendi a mão para o prato.

A mão vazia de Aiden serpenteou fora e enrolou no meu braço. Sua mão
era tão grande que engoliu meu pulso. Ele não disse nada, mas seus olhos me
imploravam para fazer alguma coisa. O quê? Lembrar de nós juntos?
Lembrar o quanto ele tinha consumido os meus pensamentos? Como eu
ansiava por estar com ele? Será que ele queria me lembrar de como era
quando ele me contou sobre a noite em que os Daimons atacaram e
massacraram sua família? E como era estar em seus braços, ser amada por
ele?

Eu me lembrava de todas essas coisas em detalhes.


Mas as emoções que pertenciam a esses acontecimentos e lembranças
não estavam lá. Elas foram cortadas completamente. Desaparecidas com os
caprichos do passado... Aiden era o meu passado.

Não. Não. Não. Essa pequena voz estava de volta. Aiden era o futuro. Por
alguma razão pensei no maldito oráculo - Vovó Piperi. Saiba a diferença
entre necessidade e amor, ela havia dito. Não havia diferença. Ela não
poderia ter tentado me ensinar sobre como sair dessas barras?

Aiden me soltou, seus olhos tão duros como essas paredes de cimento. Ele
se afastou enquanto eu levava minha comida para o colchão.
Surpreendentemente, ele me deixou comer em silêncio.

Depois disso, nem tanto.

Hoje Aiden queria falar sobre a nossa primeira sessão de treinamento e o


quanto eu tinha, aparentemente, o irritado para caramba porque eu não
tinha parado de falar. Quando ele chegou à parte em que eu imitava a voz
dele, eu comecei a sorrir. Ele tinha estado irritado e inseguro sobre como
lidar comigo.

Os olhos de Aiden queimaram no mesmo momento em que meus lábios


tremeram.

— Você disse que eu parecia um pai.

Eu tinha dito.

— Você também disse que ia largar esse hábito quando eu falei sobre as
regras. — Aiden sorriu.

Meus lábios quase responderam na mesma moeda. E eu não gostei disso.


Hora de mudar o tema.

— Eu não quero falar sobre isso.

Aiden recostou-se na cadeira dobrável de metal. A coisa devia ser


desconfortável.

— Sobre o que você quer falar, Alex?

— Onde o Apolo tem estado? Uma vez que ele é o meu tataravô ou assim,
estou me sentindo não amada.
Ele cruzou os braços.

— Apolo não vai estar por perto.

Oh, desenvolvimento interessante. Minhas pequenas e antigas orelhas se


ergueram.

— E por que não?

Seu olhar estava afiado.

— E você realmente acha que eu vou lhe dizer quando você vai correr
para dizer a Seth?

Eu coloquei meus pés descalços no chão frio e me levantei.

— Eu não vou dizer uma palavra.

Aiden me lançou um olhar brando.

— Chame-me de louco, mas eu não acredito em você.

Fazendo meu caminho para as barras, eu mantive um olho em sua


expressão. Quando me aproximei, ele perdeu o olhar insípido. Sua mandíbula
se endureceu como se ele pressionasse seus molares. Seus olhos ficaram mais
nítidos, os lábios finos. Quando eu toquei nas barras, o clarão da luz estava
fraco. De alguma forma ela sabia a diferença entre quando eu estava apenas
tocando-a e quando eu estava tentando escapar. Cadeia inteligente.

— O que você está fazendo? — Perguntou Aiden.

— Se você me deixar ir agora, eu juro que você e todos aqueles com quem
se preocupa não serão tocados.

Ele não disse nada por um instante.

— Mas eu me preocupo com você, Alex.

Inclinei a cabeça para o lado.

— Mas eu estarei a salvo.

— Não. Você não estará a salvo. — Tristeza penetrou em seus olhos antes
de ele fechá-los.
Meu estômago se deslocou em advertência. Recordando os pedaços de
informação que eu tinha pegado sob o Elixir, eu sabia que havia mais que ele
não tinha dito.

— O que você sabe, Aiden?

— Se você sair daqui ainda ligada a Seth... você vai morrer. — A última
parte saiu irregular.

Eu ri.

— Você está mentindo. Nada pode prejudicar... — Mitos e lendas, Alex.


Duh. O que eu tinha pensado antes? Havia sempre freios e contrapesos. Foi
por isso que o Apollyon tinha sido criado em primeiro lugar. — O que você
sabe?

Seus cílios levantaram, revelando surpreendentes olhos de prata.

— Isso não importa. Tudo o que você precisa saber é que é a verdade.

Minha boca se abriu, mas fechou. Aiden estava tentando me irritar. Era
isso. Se Thanatos e sua Ordem não tinham encontrado o calcanhar de
Aquiles dos Apollyons em todos os seus séculos de tentativas, um puro-
sangue não teria conseguido. A Ordem não tinha...

Ou tinha?

Mas eles não contavam. Meu Seth e seus Sentinelas tinham os tirado
sistematicamente da Terra.

Eu levantei meu olhar e encontrei Aiden me encarando. O desejo


inexplicável de mostrar minha língua era difícil de negar.

— Posso te perguntar uma coisa?

Eu dei de ombros.

— Se eu disser que não, você ainda perguntaria.

— É verdade. — Houve um sorriso apertado. — Quando você estava com


Lucian antes da reunião do Conselho? Ele te levou para a sua casa contra a
sua vontade, não foi?
— Sim, — eu disse lentamente, ficando desconfortável.

— Como isso te fez sentir?

Minhas mãos apertaram as barras.

— O que é você? Um psicólogo agora?

— Só responda a pergunta.

Fechando os olhos, encostei-me nas grades. Eu poderia mentir, mas


realmente não havia motivo.

— Eu odiei. Eu tentei matar Lucian com uma faca. — Obviamente não


tinha saído como o planejado. — Mas então eu não entendia. Eu entendo
agora. Não tenho nada a temer.

Silêncio, e então Aiden estava bem na minha frente, sua testa tocando a
minha através das grades. Suas mãos eram maiores que as minhas e, quando
ele falou, sua respiração estava quente. Eu não fui para trás, e eu não
entendia o porquê. Estar tão perto dele não estava certo em tantos níveis.

— Nada mudou, — disse ele calmamente.

— Eu mudei.

Aiden suspirou.

— Você não mudou.

Abri os olhos.

— Você nunca vai ficar entediado com isso? Você tem que ficar,
eventualmente.

— Nunca, — disse ele.

— Porque você não vai desistir de mim, não importa o que eu te disser?

— Exatamente.

— Você é incrivelmente teimoso.

Os lábios de Aiden inclinaram-se em um meio sorriso.


— Eu costumava dizer a mesma coisa sobre você.

Minhas sobrancelhas se uniram.

— E você não pode agora?

— Às vezes eu nem sei o que dizer. — Ele chegou através das barras e as
pontas de seus dedos roçaram minha bochecha. Um momento depois, ele
colocou toda a palma da mão contra a minha bochecha. Eu vacilei, mas ele
não tirou a mão dele. — E há momentos em que eu duvido de tudo o que
faço.

Ele inclinou a cabeça para trás para que meus olhos encontrassem os
dele.

— Mas eu não duvido por um segundo que o que estou fazendo agora é a
coisa certa.

Muitas réplicas vieram à tona, mas elas desapareceram quando uma


vozinha dentro de mim saltou. Eu daria tudo por você...

Um nó se formou no fundo da minha garganta. De repente, essa cela


estava muito pequena. O porão encolheu e a pequena distância entre Aiden e
eu me sufocou. Com o coração virando muito, procurei a corda...

— Não, — Aiden sussurrou. — Eu sei o que você está prestes a fazer. Não
faça isso.

Eu recuei, quebrando o contato entre nós.

— Como você sabe o que eu estou fazendo?

Sua mão estava estendida, como se ele ainda pudesse sentir meu rosto.

— Eu só sei.

A raiva subiu, impulsionada pela frustração e uma boa mistura de “como


assim?”.

— Bem, você não é especial?

Balançando a cabeça, Aiden abaixou a mão. Ele me viu pisar até o


colchão e cair para baixo. Eu olhei de volta para ele, desejando quase todo
mal dele que eu conseguia pensar. E havia coisas que eu sabia que eu poderia
dizer que iriam machucá-lo, tirá-lo fora de seu controle e jogá-lo para baixo
em pequenos pedaços. Coisas que meu Seth sussurrava e coisas que eu disse
a ele que eu queria fazer. Eu poderia atacá-lo, oh sim, eu poderia destruir
Aiden. Mas quando eu abri a minha boca, todas aquelas coisas destrutivas
ficaram presas ao redor do caroço na minha garganta.

Sentada aqui, eu não me sentia bem na minha pele, como se eu


realmente não fosse uma parte dela. E a única altura que me sentia
confortável, era quando eu estava ligada ao meu Seth. Sem ele, eu queria
perder essa pele, ou rasgá-la até sangrar.

Eu queria bater em alguma coisa. Muito.

Tomando uma respiração superficial, me concentrei na marca no teto.


Haviam duas luas desenhadas, interligadas. Uma vez que muitos deuses
estavam associados à lua, eu não sabia o que representava ou como tinha o
poder de tirar o meu próprio.

— O que é isso? — Eu perguntei, apontando para o teto.

Parte de mim não esperava que Aiden respondesse, mas ele fez.

— É o símbolo de Phoebe.

— Phoebe? Obviamente, não significa a Encantada.

Ele bufou.

Whoa, tinham trazido as grandes armas. Senti todos os tipos de especial


quando eu olhei para as marcas. Elas tinham um tom azulado e vermelho
estranho.

— Então, uma Titã...

— Sim.

— E isso é o sangue de uma Titã, não é? — Inclinei a cabeça para Aiden.


— Importa-se de explicar como é possível que o sangue de um Titã esteja
neste teto? Os Olimpianos apenas mantêm frascos por perto?

Aiden soltou uma risada seca.


— Quando os Olimpianos derrubaram os Titãs, a maioria foi presa no
Tártaro. Phoebe não foi um deles. E ela tem um carinho por seus filhos.

Quebrando a cabeça para saber quem eram, eu encontrei o vazio.

— Quem?

— Leto, — ele respondeu. — Que por sua vez, deu à luz Apolo e Artemis.

Eu gemi.

— Claro. Por que não? Então Apolo pediu sua avó um pouco de sangue?
Ótimo. Mas eu não entendo como ele funciona. — Fiz um gesto em torno de
mim. — Como pode negar os meus poderes?

— Sangue Titã é muito poderoso. Você sabe que as lâminas mergulhadas


em sangue de Titã podem matar um Apollyon. — Quando eu enviei-lhe um
olhar duh, seu sorriso foi apertado. — Misture isso com o sangue de sua
própria linhagem, bem, ele tem a capacidade de evitar que você se
machuque.

— Ou de ferir você, — eu respondi.

Aiden deu de ombros.

Raiva bombeou através de meu sangue como um veneno; com nenhuma


maneira de expulsá-la, eu estava seriamente a segundos de ficar louca.
Estiquei as pernas, depois os braços. Na minha cabeça, eu me imaginei
correndo e chutando Aiden na canela.

Houve um suspiro do outro lado das barras.

Às vezes eu me perguntava se ele tinha a habilidade de ler mentes.

— Eu odeio isso, — admitiu Aiden tão baixinho que eu não tinha certeza
se tinha ouvido realmente. Ele virou-se, dando-me as costas. — Eu odeio que
Seth não faça nada além de jogar com você - mentir para você - e você
confia nele. Eu odeio que essa conexão é mais importante do que tudo que
está acontecendo lá fora.

Eu estava prestes a discutir, mas o meu Seth havia mentido para mim.
Ele provavelmente jogou comigo desde o momento em que ele descobriu que
eu era a segunda Apollyon. Sem dúvida, Lucian o tinha feito. Desconforto
deslizou pela minha espinha, deixando calafrios em seu rastro.

— Isso... não importa agora, — eu disse.

Aiden virou na minha direção.

— O que não importa?

Eu encontrei seu olhar.

— Isso de Seth mentir para mim. Não importa. Porque o que ele quer, eu
quero. Se eu...

— Cala a boca, — Aiden rosnou.

Surpresa, eu pisquei. Eu não conseguia lembrar um momento em que


Aiden tinha me dito para calar a boca. Uau. Eu não gostei por uma
infinidade de razões.

Os olhos de Aiden brilhavam em um tom de prata feroz.

— Você não quer o que Seth quer porque não há você em nada disso.
Existe apenas ele.

Choque me percorreu, roubando qualquer resposta que eu poderia dar.


Não havia eu. Havia apenas nós. Essa maldita vozinha dentro de mim gritou
em fúria, em seguida, fez-se ouvir.

Não havia eu.


Três
Quando meu Seth decidiu aparecer do outro lado do arco-íris, eu estava
mal-humorada e ele estava... bem, estava ofendido. Havia, uh, coisas que ele
disse através da conexão que simplesmente não estavam certas.

Uma distração? Sim.

Aceitáveis no humor que eu estava? Não.

Eu quero sair daqui, eu disse-lhe, mentalmente sacudindo-o. Eu não


aguento mais. Aiden... ele...

A desaprovação de Seth era como lâminas de barbear batendo em volta do


meu crânio. Aiden o que?

O que eu poderia dizer ao meu Seth? Que Aiden estava me fazendo


pensar? Aiden fala muito.

Seu riso fez cócegas na minha nuca. Ele fala. Anjo, não será por muito
mais tempo. Lucian nos fez um grande favor.

Com quem? Manto Branco do Mês?

Outra risada agradável enrolou através de mim. Vamos apenas dizer que
ele me deu uma fonte infinita de isca e manobra.

Dei-lhe um rolar de olho mental. Sim, eu não entendo.

Houve uma pausa, e eu podia sentir o que Seth estava querendo pelo
vínculo. Ele estava em um clima de brincadeira, mas a conversa era muito
importante para brincar. Finalmente, ele respondeu. Os puros que estiveram
contra nós têm provado ser úteis.

Como assim?

Você se lembra como Telly recusou-se a aceitar que os daimons


poderiam jogar bonito e trabalhar em conjunto para formar um ataque
coeso contra os Covenants?

Sim... e Marcus não acreditava que eram só eles trabalhando contra


nós.

E nem eu tinha acreditado. Na reunião do Conselho de emergência que


Lucian tinha convocado antes que meu Seth tivesse destruído membros do
Conselho, eu tinha suspeitado que Lucian estivesse por trás dos ataques
daimon de alguma forma, mas não havia nenhuma prova real. Além disso,
meu ódio por Lucian provavelmente levou a essa ideia.

Bem, Telly estava, obviamente, meio certo. Sem a motivação certa -


digamos, uma fonte infinita de éter - eles são suscetíveis a se contentar
com o primeiro puro que conseguirem pegar.

Havia uma outra lacuna e a intensidade do que ele estava sentindo, o que
ele queria, rugiu através da conexão. Por um momento, eu realmente
acreditei que eu podia senti-lo e a emoção me inundou, drenando os meus
pensamentos e me enchendo com a alegria da conexão.

Alex. Sua voz estava repreendendo, auto satisfeita. Você está prestando
atenção?

Sim. Daimon... éter... coisas...

Bom. Deixe-me lhe fazer uma pergunta, Anjo. Você realmente acha que
daimons orquestraram os ataques sozinhos?

Um pouco do lindo nevoeiro que meu Seth estava criando desapareceu


como se o vento gelado tivesse soprado para baixo na minha nuca. O quê? O
que quer dizer?

Mesmo daimons razoáveis não poderiam orquestrar o que eles fizeram


no Catskills. Eles tinham que ter ajuda, você não acha?

Eu não conseguia pensar quando o meu pulso batia tão forte. Então eu
tinha razão? Um gosto amargo encheu o fundo da minha garganta.

Não fique chateada, Anjo. Lucian necessitou criar a discórdia para


tudo isso acontecer.

Pensando de volta ao ataque no Catskills, eu tentei lembrar onde Lucian


tinha estado no caos. Eu tinha presumido que havia sido no salão de baile
com o resto dos puros, mas eu não o tinha visto. Tudo o que eu sabia era que
meu Seth o havia contatado...
Todos aqueles servos mestiços mortos, os guardas e sentinelas... todos
inocentes... Eu me levantei, quase perdendo a conexão com o meu Seth.

Anjo, como você acha que os Daimons entraram em Catskills, em


primeiro lugar? Você viu a segurança de lá. E o salão de festas? Havia
apenas duas entradas, e ambas estavam guardadas. Uma das portas
pertencia à guarda de Lucian.

Suspeitar que Lucian tivesse estado por trás desses ataques era uma coisa
- eu não esperava nada menos daquele homem - mas o meu Seth? Ele não
poderia estar bem com isso. Acreditar que ele era uma parte de todas as
pessoas inocentes que morreram era aceitar algo horrível. O que o meu Seth
queria, eu queria, mas os Daimons... eles eram e sempre seriam o inimigo.

Inimigos podem ser aliados na guerra, Anjo.

Oh, meus deuses. Uma enorme e assustadora parte do tamanho de uma


cratera em mim não poderia processar o que meu Seth estava dizendo. Eu
lutei contra o impulso de suas emoções, ressurgindo como se eu estivesse me
afogando, em seguida, engolindo o ar.

Havia tantas pessoas inocentes, eu raciocinei. Imagens terríveis do


massacre vieram uma após a outra - os servos na sala com suas gargantas
rasgadas, os Sentinelas e Guardas que tinham sido eviscerados e depois
jogados pelas janelas.

Eles não importam, Anjo. Só nós importamos, só o que queremos


importa.

Mas essas pessoas me importavam. Nós poderíamos ter sido mortos,


Seth. Meu pai poderia ter sido morto.

Mas ele não foi, e eu nunca iria deixar que nada acontecesse com você.
Nada aconteceu.

Nós tínhamos sido separados durante o ataque. E se eu me lembrava


corretamente, eu tinha chegado muito perto de ser pisoteada até a morte. Já
para não falar que eu tive que lutar contra as fúrias sozinha. Não tenho
certeza como ele impediu exatamente a minha morte, em tudo isso.

Anjo, precisávamos que isso acontecesse. Os Daimons vão me ajudar a


chegar até você. Você não quer isso? Que possamos estar juntos?
Sim, mas...

Então, confie em mim. Nós queremos as mesmas coisas, Anjo.

As palavras de Aiden voltaram para mim e eu me contorci na minha


própria pele. Seth? Você... você não está me fazendo querer nada, certo?
Você não está me influenciando?

Ele não respondeu de imediato, o que fez o meu coração tropeçar em si.
Eu poderia, Anjo, se eu quisesse. Você sabe disso, mas eu não estou. Nós só
queremos as mesmas coisas.

Mordi o lábio. Nós queremos as mesmas coisas, exceto a coisa com os


Daimons... Parei esses pensamentos. Como se dois braços fortes estivessem
empurrando para baixo em meus ombros, eu estava deitada de costas. E
então eu estava me afogando no que Seth estava sentindo novamente.

***

Aiden voltou com a comida, e ele trouxe companhia com ele desta vez,
meu tio Marcus. O homem estava realmente sendo meio decente para mim
agora. Irônico. Eu comi e bebi minha água como uma boa prisioneira.

E eu nem sequer gritei qualquer coisa ofensiva.

Achei que merecia uma recompensa, como um tempo fora da cela ou algo
assim, mas isso era pedir demais. Em vez disso, Marcus saiu para ir ver o que
os outros estavam fazendo. Assim que a porta se fechou no andar de cima,
Aiden se sentou com as costas pressionadas contra as grades.

Homem corajoso... ou realmente estúpido - era um total sorteio. Eu


poderia facilmente transformar o lençol em uma corda e colocá-lo em torno
de seu pescoço antes de ele ter a chance de reagir.

Mas eu me sentei, minhas costas quase contra as dele. O surto de azul


das cadeias apareceu mais fraco. O silêncio se estendeu, estranhamente
reconfortante. Minutos se passaram e os músculos tensos em minhas costas
relaxaram. Antes que eu percebesse, eu estava encostada nas barras... e nas
costas de Aiden.

Minha conversa anterior com o meu Seth havia deixado um gosto


estranho na garganta e uma bola de nós no meu estômago. Talvez por isso eu
não estivesse fazendo minhas intenções assassinas com o lençol no pescoço
de Aiden? Oportunidade perdida, eu acho.

Abaixando meu queixo, eu suspirei. O que o meu Seth queria, eu queria,


mas... daimons? Eu esfreguei minhas mãos sobre os joelhos dobrados e
suspirei novamente - mais alto, como uma criança petulante.

As costas de Aiden torceram quando ele virou a cabeça.

— O que foi, Alex?

— Nada, — eu murmurei.

— Há alguma coisa. — Ele se inclinou para trás, inclinando a cabeça


contra a barra. — Você tem aquele tom.

Eu fiz uma careta para a parede.

— Que tom?

— O tom de 'eu tenho algo que eu quero dizer, mas não deveria'. — Um
pouco de humor infiltrou em sua voz. — Estou bem familiarizado com ele.

Bem... droga. Meu olhar caiu para minhas mãos. Os dedos estavam bem,
eu acho. Mas minhas unhas estavam lascadas e curtas. Mãos de um
Sentinela - um Sentinela que matava daimons. Eu empurrei a manga da
minha blusa. Marcas de mordida branco-pálidas cobriam o meu braço direito.
As marcas em forma de lua crescente eram difíceis de esconder e elas
estavam em ambos os braços, bem como no meu pescoço. Elas eram tão
feias, um lembrete vil de ser presa por eles.

E não importa o quanto eu tentasse, eu não conseguia tirar os rostos de


todos aqueles mestiços abatidos no Catskills da minha cabeça... ou esquecer
o olhar no rosto de Caleb, quando ele viu a lâmina embutida em seu peito -
uma lâmina que tinha sido enfiada por um daimon.

Caleb estaria tão... decepcionado nem sequer resumia, se eu não dissesse


nada.

Mas o meu Seth iria ficar puto. Ele ia bisbilhotar nas minhas memórias, e
eu queria que ele estivesse feliz comigo. Eu queria...

Eu não queria trabalhar com daimons. Isso era um tapa na cara de todos
aqueles que haviam morrido em suas mãos - minha mãe, Caleb, os servos
inocentes - e as minhas cicatrizes.

Meu Seth... ele só tinha que entender isso. Ele iria, porque ele me amava.

Com a opinião formada, eu respirei fundo.

— Só para você saber, eu não estou dizendo isso por causa de alguma
coisa a ver com você. Ok?

Ele riu sombriamente.

— Eu nunca pensaria uma coisa tão louca.

Eu fiz uma careta.

— Eu só estou dizendo isso porque eu não acho que isso está certo. Vai
contra alguma coisa... inerente em mim. Eu tenho que dizer alguma coisa.

— O quê, Alex?

Fechando os olhos, respirei fundo.

— Você se lembra como Marcus achava que havia mais sobre os ataques
daimon, especialmente o do Catskills?

— Sim.

— Eu meio que pensei que era Lucian, especialmente em sua reunião do


Conselho. Fazia sentido. Criando o caos e tudo o que torna mais fácil para as
pessoas derrubarem e assumirem o controle. — Eu corri um dedo sobre a
marca na parte carnuda do meu cotovelo. — De qualquer forma, os ataques
daimon aparentemente foram orquestrados por Lucian e... Seth.

A espinha de Aiden endureceu contra a minha. Não houve resposta. Ele


ficou em silêncio por tanto tempo que me virei.

— Aiden?

— Quantos? — Sua voz estava rouca.

— Todos eles, eu acho, — eu disse, a culpa mastigando minhas


entranhas. Eu estava traindo meu Seth, mas eu não conseguia ficar quieta.
— Eles encontraram uma maneira de controlar os daimons.

Sua cabeça baixou e seus ombros largos rolaram.

— Como?

Ficando de joelhos, agarrei as barras e ignorei o pulso fraco de luz azul.

— Eles... eles estão usando os puros como motivação. Os que são contra
eles, nós, eu quero dizer nós.

Aiden virou tão rápido que eu soltei as barras e me afastei. Seus olhos
ardiam em prata.

— Você sabe onde eles estão mantendo esses puros?

Eu balancei minha cabeça.

Seus cílios mergulharam.

— Você sabe por que eles fariam algo assim?

O desgosto em sua voz era compreensível. Eu esfreguei minhas mãos


sobre minhas coxas. Por que eles estavam fazendo isso? Para criar discórdia,
era óbvio. Com daimons atacando à esquerda e à direita, o Conselho tinha
estado distraído. Os deuses tinham desenvolvido dúvidas sobre a capacidade
dos puros para controlar as hordas daimon e mandaram fúrias como
resposta. E agora, isso serviria como uma distração para eu escapar. Como é
que isso ia acontecer eu não sabia. E se a luz azul desaparecendo fosse
qualquer indicação, não seria necessário.

— Não. Eu não sei.

Seus olhos encontraram os meus e os nossos olhares se encontraram. —


Por que você me contou isso? Tenho certeza de que Seth não irá apreciar.

Eu desviei o olhar.

— Eu disse a você. Não está certo. Esses puros...

— São inocentes?

— Sim, e Caleb... ele foi morto por um daimon. Minha mãe foi
transformada por um. — Minha respiração transbordou através de mim e eu
congelei. — Eu quero o que Seth quer, mas eu não posso apoiar isso. Ele vai
entender.

Aiden inclinou a cabeça para trás.

— Será que ele vai? Você sabe que eu vou passar essa informação adiante.
Isso irá dificultar seus planos.

Eu passei meus braços em volta da minha cintura.

— Ele vai entender.

Tristeza fluiu em sua expressão e seus olhos se voltaram para baixo.

— Obrigado.

Por alguma razão, a raiva borbulhou e eu queria atacar.

— Eu não quero o seu agradecimento. É a última coisa que eu quero.

— Você tem isso. — Ele levantou em um movimento fluido. — E você tem


o meu agradecimento mais do que você imagina.

Confusa, eu olhei para ele.

— Eu não entendo.

O sorriso de Aiden foi apertado, tingido com a sempre presente tristeza


quando ele olhava para mim, como se eu fosse uma criatura infeliz que
provocava tristeza onde quer que eu fosse. Por trás dessa tristeza, porém,
havia determinação de aço.

— O quê? — Eu disse, quando ele não respondeu.

— Você me deu a esperança de que eu preciso.

***

Meu Seth não estava louco por que eu tinha tagarelado. Eu não tinha
sequer tentado esconder isso dele. Assim que ele nos conectou, eu disse a ele
o que eu tinha feito. Na verdade, ele parecia ter esperado por isso. O que eu
não entendia, mas de qualquer forma, ele não queria falar sobre isso.
Me contando sobre sua infância, ele era um Seth diferente - um lado dele
que eu raramente tinha visto. Quando ele começou a falar sobre sua mãe, a
vulnerabilidade atravessou o vínculo, como se estar falando sobre sua mãe o
deixasse nervoso.

Qual era o nome dela? Eu perguntei.

Callista.

Bonito.

Ela era muito bonita. Alta e loira, régia como uma deusa. Suas
palavras se afastaram por um momento. Considerando a referência verbal no
passado, eu achava que ela tinha morrido. Mas ela não era amável, Anjo.
Ela era fria e inacessível, e acima de tudo, quando ela olhava para mim,
havia sempre o ódio em seus olhos.

Eu vacilei quando as minhas suspeitas foram confirmadas, e eu queria


fazê-lo se sentir melhor. Tenho certeza que ela não te odiava. Ela...

Ela me odiava. Sua resposta afiada era como ser encharcada com água
gelada. Eu era um lembrete constante de sua vergonha. Ela conseguiu
provar do fruto proibido, e depois se arrependeu. Mestiços e puros eram
proibidos de se misturar. Só recentemente eu tinha descoberto que o
primogênito de um mestiço masculino e uma pura feminina era um Apollyon.

Quando voltou a falar, sua voz estava suave como um cobertor. Ela não
era nada como sua mãe, Anjo. Não houve um grande caso de amor. Ela
costumava me dizer que a única razão pela qual ela ficava comigo era
porque um deus a tinha visitado depois do meu nascimento. O homem
mais bonito que ela já vira, ou então ela disse. Que o deus lhe disse que
ela tinha que me proteger a todo custo, que eu me tornaria um grande
poderoso um dia.

Enquanto ele falava, lembrei-me dos vislumbres do passado de Seth que


eu tinha visto quando eu tinha Despertado. De Seth como uma pequena
criança, a pele dourada e cachos loiros, jogando por um riacho ou debruçado
sobre um brinquedo em uma grande sala cheia de móveis parecendo
desconfortável. Ele estava sempre sozinho. Noites quando ele acordou
chorando de um sonho ruim e ninguém veio para confortá-lo. Dias em que a
única pessoa que ele viu foi uma babá que era tão indiferente como sua mãe.
Ele nunca conheceu seu pai. Até hoje, ele nem sabia o nome dele.

Meu coração chorou por ele.

Em seguida, aos oito anos, ele foi levado perante o Conselho para
determinar se ele iria entrar no Covenant. Sua experiência não foi nada
parecida com a minha. Ninguém o cutucou ou beliscou. Ele não chutou um
ministro. Eles tinham dado uma olhada nele e pareciam saber o que ele iria
se tornar.

Eram os olhos.

Os olhos cor de âmbar que detinham a sabedoria que não pertencia a


nenhuma criança - olhos de um Apollyon.

As coisas melhoraram para ele uma vez que ele foi enviado para o
Covenant, na Inglaterra, e depois para o de Nashville. Tão estranho que
tínhamos estado tão perto um do outro por muitos anos e nunca termos nos
cruzado.

Mas algo estava errado. Quando eu tinha Despertado, eu aprendi tudo o


que os Apollyons anteriores haviam descoberto durante suas vidas, como
estar conectado a um computador e ligá-lo. E nenhum deles tinha nascido
com os olhos do Apollyon. Todos os olhos se tornaram dourados depois de
terem Despertado.

Meu Seth tinha sido diferente.

Mas agora, a dor no peito o estava comendo por dentro. Onde você
nasceu? Eu perguntei, na esperança de levar o tema para longe de sua mãe.
Você nunca me disse.

Ele riu e eu sorri. Seth feliz era um Seth melhor. Você não vai acreditar,
mas você sabe como o destino gosta de mexer com as pessoas?

Rapaz, eu já sei disso.

Nasci na ilha de Andros.

Um arrepio dançou pela minha espinha. Que... irônico. Nenhum grande


salto de fé para considerar já que os meus antepassados também havia
saudado aquela ilha, já que muitos tomavam o nome de onde eles nasceram.
Ou, em alguns casos, as ilhas eram nomeadas após as famílias fundadoras.

De qualquer maneira, isso era irônico. E uma onda de náusea me abateu.


Andros era um colossal de 147 milhas quadradas. Você não acha que nós
somos parentes?

O quê? Seth caiu na gargalhada. Não.

Como você pode ter tanta certeza? Porque se nós somos como Luke e
Leia, eu vou vomitar.

Minha família não está ligada à sua de qualquer forma. Além disso,
sua linhagem é Apolo.

E qual é a sua? Não houve resposta, só uma riqueza de silêncio


arrogante. Por que esconder isso de mim?

Seth suspirou. Vou contar quando estivermos juntos. Eu vou te mostrar


tudo, Anjo. E todas as perguntas que você tem, você terá suas respostas.
Quatro
Após o almoço que foi servido no dia seguinte, eu vaguei na minha cela
sozinha. Alguma coisa estava acontecendo lá em cima - as portas se abrindo
e se fechando, pés batendo e gritos alegres.

Curiosa, eu fui para as barras e esforcei-me para ouvir mais. A conversa


estava muito abafada para fazer cara ou coroa de quem era, mas alguém
tinha chegado. E não era um deus. Eu saberia se fosse. Sua essência era
forte, algo que eu podia sentir dentro de mim.

Tocando nas barras, eu medi a resposta. O brilho azul estava sumindo.


Tome isso, Seth. Isso significava que a marca acima também iria desaparecer
sem um reforço? Bons deuses, eu esperava que sim. Procurei a corda,
querendo falar com ele sobre o novo desenvolvimento. Seth estava lá, mas
não comunicativo. Ele estava com Lucian, pelo menos eu acho. O que quer
que estivesse sendo discutido era mudo para mim.

Antipatia imediata subiu em resposta à presença de Lucian. Eu,


obviamente, tinha que superar isso, mas ia ser difícil. Eu nunca seria uma fã
do meu padrasto.

Desenganchando da conexão, eu me perguntei o que Aiden estava


fazendo. Ele geralmente passava grande parte de seu dia sentado naquela
cadeira dobrável, me guardando.

Você me deu a esperança de que eu precisava.

Esperança para o quê? Para um ‘felizes para sempre’ para nós?

Eu encontrei-me no banheiro minúsculo, olhando para o espelho de


plástico em cima da pia. A coisa estava praticamente cimentada na parede,
plástico a leve, então eu não podia transformá-lo em algum tipo de arma.

Encostada na pia, eu quase colei meu rosto contra o espelho. Meu reflexo
estava ondulado, distorcido pela qualidade barata, mas meus olhos estavam
me olhando.

Eles eram âmbar, assim como todos os outros Apollyons depois que
tinham Despertado. Era meio estranho ver os meus olhos assim, mas
também me senti bem. Como se eu tivesse entrado em algo que eu estava
destinada a me tornar. Duh, eu tinha.

Inclinei minha cabeça para o lado. O que acharia o meu Seth quando ele
finalmente me visse - realmente me visse – depois que eu Despertei? Ele
ficaria satisfeito, tão diferente de Aiden, que odiava os meus olhos...

Um sentimento súbito espetou meu peito. Puta merda... Eu estava tonta


enquanto segurei a pia. Isso não era uma dor física, mais parecido como se o
mundo saísse de debaixo dos meus pés. Ou quando há realmente más
notícias.

Era a sensação de um coração que está sendo aniquilado, sem


possibilidade de reparo.

A respiração que eu tomei foi estridente. O sentimento não fazia sentido.


Meu coração não estava quebrado. Estava completo e pertencia ao meu Seth.
E ele me amava. Ele nunca me disse que ele amava, mas ele tinha que amar.
Estávamos destinados um ao outro, e uma vez juntos, seríamos perfeitos.
Iriamos governar tanto o Olimpo quanto o mundo mortal.

— Seremos deuses, — eu sussurrei.

— Oh, Alex, ainda estou impressionado pela forma como o seu ego se
tornou inflado. Deuses, se eu fosse totalmente corpóreo, eu totalmente
chutaria o seu traseiro agora.

Eu me virei, esperando encontrar Caleb em pé no banheiro, porque essa


era a sua voz. Mas ninguém estava lá. Com o coração acelerado, eu espreitei
para dentro da cela. Vazia.

— Caleb?

Não houve resposta.

Eu avancei para dentro da cela, disposta a fazer Caleb aparecer se ele


estivesse realmente aqui. O silêncio se estendeu, e quando eu estava prestes
a admitir que eu poderia ter perdido minha maldita mente, um calor passou
por mim.

Será que Caleb acabou de... caminhar através de mim?

— Uh...
Houve um riso suave atrás de mim. Chicoteando ao redor, eu só... eu só
podia olhar.

Caleb estava ali, sobrancelhas arqueadas de um loiro escuro de uma


maneira tão dolorosamente familiar. Ele estava vestindo uma camisa - do
estilo de túnica – branca e calças de linho. Era Caleb, mas... não era.

Eu podia ver totalmente as barras através dele. Muito louco.

— Caleb?

Ele olhou para si mesmo.

— Sim, sou eu, em forma de sombra para seu prazer.

— Você está realmente aqui ou eu enlouqueci?

Um lento e fácil sorriso puxou os lábios pálidos.

— Eu estou aqui. Bem, tão aqui como eu posso estar.

Eu respirei, mas ela ficou presa.

— Posso tocar em você? — Minhas pernas estavam me avançando em


movimentos bruscos. Sem Apollyon graciosa aqui. — Posso te abraçar?

Suas sobrancelhas abaixaram.

— Não, Alex, você não pode. Você iria passar direto através de mim. —
Ele sorriu. — Embora você parecesse gostar da primeira vez.

Eu ri, parando antes de tocá-lo.

— Deus, eu quero tanto abraçá-lo.

— Eu sei. — Seu sorriso desapareceu. — Mas não temos muito tempo.

Nós nunca tínhamos. Eu balancei para trás em meus calcanhares,


sorrindo.

— Você está aqui para me libertar, não é?

— Ah, não, eu não estou aqui para libertá-la.


Meu sorriso escorregou do meu rosto.

— Por quê? Não estou entendendo. Eu preciso sair daqui. Meu Seth
precisa...

— Estou aqui como um último esforço, Alex. — Ele estendeu a mão como
se quisesse me tocar, mas parou. — Apolo me enviou.

Eu cruzei os braços e fiz uma careta.

— O que ele tem a ver com isso?

— Ele espera que eu possa chegar até você, Alex.

— Você sabe que ele me acertou com um raio de deus?

Caleb fez uma careta.

— Sim, eu ouvi. Todo mundo no submundo ouviu, mas Alex, você meio
que mereceu. — Quando eu abri a minha boca, ele me silenciou. — Apolo
estaria aqui se pudesse.

— E por que não pode? — Eu me virei, tentando empurrar para baixo a


minha raiva, que era como pressionar uma tampa sobre uma caixa – o que
não estava funcionando. — Ele está com medo de mim, não é? Ele deveria
estar. Apolo está totalmente na minha lista de merda.

— Você ouve a si mesma? Um deus com medo de você? — Ele parecia


aturdido. — Apolo não está aqui porque Aiden, o amor de sua vida, o proibiu
de vir aqui.

Eu me virei, os olhos se estreitando.

— Ele não é o amor da minha vida.

Caleb balançou a cabeça.

— Ele sempre foi, Alex. E você sempre foi o dele.

Minha boca enrugou como se eu tivesse provado algo azedo.

— É por isso que você veio do além? Para falar sobre a minha vida
amorosa?
— Bem, o amor de sua vida proibiu Apolo de entrar na casa porque ele
tem medo de que Apolo possa machucá-la. — Oh, sim, Caleb ganhou um
olhar cheio de choque. — E Apolo fez uma de suas ninfas descerem ao
submundo, me puxando para fora debaixo do nariz de Hades para ajudá-la.
Ambos - Aiden e Apolo - estão fazendo coisas malucas para salvá-la.

— Mas... eu não preciso que ninguém me salve.

— Exatamente! — Caleb jogou seus braços no ar. — Isso é o que eu disse!

Ok, eu não estava entendendo esta conversa.

— Então por que você não está me ajudando a escapar? Você poderia ir
até onde estão as chaves. Eu tenho certeza que Aiden as tem.

Ele revirou os olhos e desapareceu por um instante. Caramba.

— Você pode salvar a si mesma. Você e só você precisa dar um basta


nisso.

Meus lábios apertaram. Caleb era o meu melhor amigo - meu melhor
amigo morto - mas eu não o tinha visto no que parecia ser para sempre, e
nós estávamos discutindo. Eu não queria discutir com ele.

— O que você está fazendo, Alex? Isto não é você. Não é isto o que você
sempre quis.

Eu tomei uma respiração profunda.

— É o que eu quero agora.

Caleb rosnou baixo em sua garganta. Ele parecia querer me estrangular.

— O que você está fazendo está levando você e Seth a serem


assassinados. Sim, isso mesmo - você não é invencível. Nenhum de vocês é!
E há uma guerra se formando no Olimpo e vai chover todos os tipos de
inferno para a Terra. Você quer ser responsável por isso?

Apertando as mãos em punhos, eu olhei para ele.

— Nós queremos mudar as coisas, Caleb! Você de todas as pessoas tem


que entender isso! Juntos, Seth e eu podemos libertar os servos – o meu pai!
Nós podemos derrubar o Conselho. Nós podemos...
Ele soltou uma espécie de risada louca. O que geralmente significava que
ele estava perto de me empurrar para um canto.

— Você realmente acha que isso é o que vai acontecer depois que você
conseguir aniquilar todos do Conselho? Lucian vai libertar os mestiços e
todo mundo vai amar uns aos outros?

Eu abri minha boca, mas ele continuou.

— E vamos fingir que não é um absurdo e todos nós vamos ser elevados
em pílulas da felicidade. Os deuses nunca vão permitir isso. Eles vão arriscar
expor-se a todo o mundo mortal para pará-lo. Pessoas inocentes vão morrer.
Você vai morrer.

Meu coração disparou um pouco.

— Então eu não deveria fazer nada?

— Não. Você não sabe? A suprema arte da guerra é subjugar o inimigo


sem lutar.

— E quem inventou isso era um idiota completo e absoluto. Para ganhar


a guerra, o inimigo deve ser despojado de seus ossos nus e destruído.

Seus olhos se estreitaram.

— Você é uma idiota.

Meus lábios tremeram.

— Cale a boca.

Caleb afastou-se de mim.

— Alex, você tem que quebrar o vínculo com Seth. Quebre-o e você vai
entender tudo.

— Não. — Eu me afastei, passando minhas mãos ao longo de meu quadril.


— Você me disse para não abandonar Seth. E agora você quer?

— Eu não quero que você o abandone, — disse ele, a voz tomando um


tom suplicante. — Ainda há esperança para ele, mas só se você realmente
puder alcançá-lo. E ser a cabeça do fã-clube de Seth não está ajudando.
Eu ri em seguida.

— Era assim quando você estava... você sabe, vivo. Você era totalmente
um menino apaixonado por ele.

— E eu ainda sou. Ele é muito legal, mas agora ele está no alto da
energia. Como uma cabeça com metanfetamina. Não. Melhor ainda. Como
uma cabeça com crack e metanfetamina juntos. Ele está fora de controle.
Bons deuses, ele está trabalhando com daimons! E se você sair daqui e se
conectar com ele - transferir seu poder para ele? Está tudo acabado, Alex.
Ele irá drená-la, mesmo sem querer.

Engoli em seco.

— Ele nunca faria isso.

— Ele não quer fazer, Alex. Mas ele o faria. E uma vez que ele fizer, ele
vai se tornar o Assassino de Deuses e ninguém precisará de você. — Ele
balançou a cabeça tristemente. — Isto é, se você viver o suficiente para se
conectar com ele. Apolo vai parar você. Cada deus vai descer aqui para pará-
la.

Balançando a cabeça, eu me recusei a acreditar nisso. Meu Seth nunca


me drenaria. Ele precisava de mim, como eu precisava dele. E juntos, nós
seríamos invencíveis. Nós poderíamos mudar as coisas. Como a Apollyon, eu
não iria perder as pessoas como eu tinha perdido Caleb e minha mãe.

Eu balancei minha cabeça.

— Alex, — suplicou ele suavemente.

— Não. Não! Porque eu sou forte o suficiente agora, ninguém que eu amo
vai morrer de novo!

— Alex...

Estúpidas lágrimas fracas queimaram meus olhos.

— Se eu tivesse sido o Apollyon quando fomos atacados, eu poderia ter te


salvado!

Sua forma brilhou.


— Não, Alex, você não poderia.

— Não diga isso. Nunca diga isso. — Meu peito estava muito apertado. Ele
diminuiu um pouco. — O que está acontecendo?

— Eu tenho que ir. — Caleb parecia ferido. — Quebre a ligação, Alex. É a


única maneira de salvar vocês dois.

Eu balancei minha cabeça tão rápido que meu cabelo bateu no meu rosto.
Antes que eu pudesse dizer uma palavra, ele apagou e foi embora. Fiquei ali
por alguns minutos, talvez horas, olhando para o local onde ele esteve de pé,
lutando contra as lágrimas e tudo o que ele tinha dito. Eu não - não podia
acreditar no que ele tinha dito.

Caleb não entendia. Ele nunca tinha perdido as pessoas como eu perdi -
pessoas como ele. Enquanto ele estava no submundo jogando Mario Kart, eu
estava aqui, até os joelhos na dor e angústia de perdê-lo e minha mãe. Eu
estava lidando com o fato de que meu pai era um servo.

Ele não entendia!

Estar conectada com o meu Seth era a única maneira de nos salvar. No
momento em que o meu Seth e eu terminássemos, não haveria mais dor.
Cinco
Eu tive a impressão distinta que o Caleb havia falhado de alguma forma
depois que ele fora embora, e eu esperava que ele não fosse ser punido. Eu
não pensei que o Apolo faria alguma coisa com ele, mas, no entanto, o que
eu sabia?

A visita do Caleb me deixou esfarrapada. Tensa e sem nenhuma maneira


de expulsar a energia nervosa, eu caminhei pela cela. Parte de mim queria se
enfurecer e gritar. Toda a outra parte de mim queria sentar-se e chorar como
um bebezinho. Ver o Caleb era como um presente, mas tudo o que fizemos foi
discutir. Isso deixou uma pedra no meu estômago que só continuava me
puxando cada vez mais para baixo.

Quando o Aiden apareceu com uma sacola de comida para viagem, eu


quase a joguei nele, mas eu estava faminta. E eu... tive a vontade mais
estranha de contar a ele sobre o Caleb.

— Quem está aqui? — eu perguntei com a boca cheia da carne misteriosa


e pão amolecido.

Ele não respondeu.

Eu revirei meus olhos, terminando o meu sanduíche. Remexendo na


sacola, eu tirei um pedido extragrande de batatas fritas. Com o pouco
exercício que eu estava fazendo, minha fuga teria que envolver eu sair daqui
rolando.

— Eu sei que alguém apareceu.

Uma mão cheia de fritas foi até a minha boca, e então outra. Sal e
gordura revestiam meus dedos. Hum.

— Você não vai falar? Apenas sentar aí e me encarar como um


pervertido?

Aiden mostrou um meio sorriso.

— Você já me chamou disso uma vez antes.

— Sim, porque você é um pervertido. — Eu fiz uma careta para a caixa


quase vazia. Nunca havia fritas o bastante.

— Na verdade, eu vinha observando para me certificar que você não


fugisse da ilha.

Eu me lembrei. Tinha sido na noite da festa na casa do Zarak, na época


quando as coisas pelo menos pareciam mais simples. Zarak... eu me pergunto
o que havia acontecido com o Zarak. Eu não achava que ele estava na ilha
quando o Poseidon tinha atacado, mas eu não sabia.

Terminadas as batatas, eu lambi o sal do meu dedo enquanto levantava


meu olhar.

Os olhos do Aiden ficaram prateados, e algo quente se soltou em minha


barriga. Eu coloquei meu outro dedo nos meus lábios...

Santos bebês daimons em todo o lugar, o que eu estava fazendo? Eu


peguei um guardanapo, limpando furiosamente os meus dedos. A minha
frente, calor saía em ondas de Aiden.

Quando eu finalmente olhei para Aiden novamente, ele estava totalmente


composto... o mestre da impassividade. Ele até mesmo arqueou uma
sobrancelha para mim. Bom para ele. Que seja. Ele havia totalmente me
comido com os olhos, mas agora que eu sabia quem estava no andar de
cima... Laadan e Olivia. Eu me lembrei de quando eu ainda estava sob o
efeito do Elixir, Deacon havia contado ao Aiden que elas estavam vindo.
Então eu havia me escondido no armário porque o Aiden havia erguido a voz.

Eu me escondi em um armário, de verdade.

— Você parece feliz, — Aiden comentou enquanto ele desembrulhava um


sanduíche de frango.

Cara, quem tirava a maionese e apenas comia um sanduíche com uma


fatia? Aiden. Esse era quem.

— Ah, eu estava apenas me lembrando sobre como eu aprendi a jogar


xadrez e me esconder em armários.

Ele havia dado apenas duas mordidas, mas jogou o restante em sua
sacola. Um músculo pulou em sua mandíbula.
— Alex, eu odiei te ver daquele jeito. Por mais que eu odeie te ver desse
jeito. Então se você quer que eu me sinta culpado, eu me sinto. Se você quer
que eu me odeie por tomar aquela decisão, eu me odeio.

Eu deveria estar fazendo uma dança de comemoração ou algo assim,


porque eu havia conseguido acertar um pequeno golpe, mas os meus ombros
caíram. As palavras estavam na ponta da minha língua, palavras que eu não
deveria dizer. Então eu não disse nada. Nós passamos o restante das horas do
dia em silêncio. Quando ele foi embora, eu não tentei alcançar o Seth. Entre
a visita surpresa do Caleb e o negócio com Aiden, eu estava muito cansada.

Algum tempo depois, talvez umas duas horas, eu ouvi a porta abrir e
fechar rapidamente... muito rapidamente e silenciosamente para ser o Aiden,
que sempre descia as escadas como um guerreiro se preparando para a
batalha.

Eu pulei do colchão, segurando a minha respiração.

Duas pernas finas vestidas com jeans vieram à vista, e então uma
camiseta branca larga enfiada na frente do jeans. As botas da altura dos
joelhos entregaram o meu visitante. Elas eram botas lindas.

Olivia.

A oportunidade tinha acabado de chegar.

Ela parou no final da escadaria, seus cachos presos atrás de seu rosto. A
pele cor de caramelo de Olivia era linda, mesmo quando ela estava pálida.
Ela parecia estar olhando para uma horda de daimons agora.

— Alex, — ela sussurrou, engolindo em seco.

Lentamente, para eu não mandá-la correndo de volta pelas escadas, eu


me aproximei das grades. Eu percebi no momento em que ela conseguiu ver
bem os meus olhos, porque ela se afastou, atingindo o degrau de baixo.

— Não vá, — eu disse, segurando as barras. Uma pálida luz azul brilhou. —
Por favor, não vá.

Sua garganta se mexeu novamente e ela olhou atrás dela rapidamente


antes de seu olhar voltar para mim.
— Queridos deuses, é verdade. Seus olhos...

Eu sorri ironicamente.

— Demora-se um pouco para se acostumar.

— Sem dúvidas. — Ela respirou fundo e se aproximou. — Aiden... ele vai


me matar se ele descobrir que eu estou aqui embaixo, mas eu apenas tinha
que te ver por mim mesma. Ele... eles estão dizendo que você tem que ficar
aqui embaixo... que você é perigosa.

Pela primeira vez, a impulsividade de alguém foi um benefício para mim.

— Eu não sou perigosa.

— Eles falaram que você ameaçou fazer uma coroa com as costelas do
Deacon.

Ah, infernos...

— Eu não fiz nada.

Ela parecia duvidosa.

— Ok. Você me conhece. Eu digo coisas más quando eu estou brava.

Os lábios dela tremeram.

— Sim, você diz. Alex... — Seu olhar passou pelas barras. — Droga...

Eu tinha que proceder com cautela, mas eu tinha que fazer isso
rapidamente. Vai saber quanto tempo eu tinha antes que Aiden percebesse
que a Olivia estava aqui embaixo e arruinasse minha diversão? Usar
compulsão seria muito fácil e a maneira mais fácil de lidar com isso, mas...
mas uma parte de mim, aquela parte estúpida de mim, queria conversar com
ela... minha amiga.

E havia algo que eu não tinha tido a chance de contar a ela, algo
importante.

Olivia se aproximou da cela.

— Você está... você está horrível.


Fiz uma careta.

— Eu estou?

— Você está dormindo? — Seu olhar passou por mim. — Você perdeu peso.

Um pouco aliviada de ouvir que eu não havia ganhado peso, eu dei de


ombros.

— Você está ótima.

Ela tocou a bochecha.

— Eu não me sinto ótima. Você não tem ideia do que está acontecendo lá
fora. Todo mundo está enlouquecendo, por causa do...

— Por nossa causa.

— Nossa?

— Seth e eu. — Eu inclinei minha cabeça contra as barras. — Você foi


para Nova Iorque, certo?

Olivia balançou a cabeça.

— Nós íamos, mas está muito ruim lá. Eles não estão deixando ninguém
entrar lá. O lugar está bloqueado, mas há muita luta acontecendo lá dentro,
eu ouvi dizer.

O Elixir havia parado de funcionar lá, cortesia de Lucian, e o meu pai...


meu pai estava lá.

— Os deuses, eles tem esses negócios cercando os Covenants, — ela


estremeceu e colocou os braços ao redor de sua fina cintura.

Meu interesse aumentou.

— Que negócios?

— Eu não sei. Eles são meio touros, meio homens... mas máquinas. Nós
os encontramos quando nós estávamos indo para Nova Iorque. Minha mãe
continuou, mas ela não me queria lá. Ela me mandou para cá com a Laadan.
Uma memória nebulosa ressurgiu, uma do Apolo e do Aiden conversando
sobre essas criaturas. Eu me perguntava se o meu Seth sabia sobre elas.
Provavelmente. Eu larguei das barras e coloquei meu cabelo embaraçado para
trás. As pontas se curvavam pelo meu peito e provavelmente estavam
precisando ser cortadas. Perto de Olivia, eu não podia evitar a comparação.

— Alex, as coisas vão ficar piores. Você...

— Eu vi o Caleb.

A boca dela se escancarou, e seja o que for que ela iria falar foi esquecido.

— O quê?

— Eu tenho visto o Caleb desde que ele... morreu. — Eu precisava falar


isso, e então eu faria o que eu tinha que fazer. O meu Seth chamaria isso de
fraqueza, e era, porque estava desperdiçando tempo precioso, mas Olivia
precisava saber. Eu havia prometido ao Caleb que eu contaria a ela, e depois
que eu escapasse eu não tinha ideia de quando a veria novamente. — A
Ordem me atacou enquanto eu ainda estava no Covenant. Um de seus
membros me matou. Eu fui até o Mundo dos Mortos...

— Você morreu?

Eu estremeci com o som estridente.

— Sim, eu estava morta, e então eu não estava mais. Longa história. Mas
eu vi o Caleb.

A mão dela escorregou até seu peito.

— Você está brincando comigo, porque eu juro pelos deuses, Alex, eu vou
te machucar.

Bonitinho, considerando que ela não podia me tocar, mas eu sorri.

— Caleb está bem. Ele realmente está bem. Ele passa a maior parte do
tempo dele jogando Wii, e ele estava com uma aparência ótima. Nada como...
— A parte de trás da minha garganta ardeu. - Ele está realmente bem.

Seus olhos brilharam sob a luz fraca.

— Você realmente o viu?


Eu assenti.

— Ele queria que eu te contasse algo. Eu não consegui, com tudo que
aconteceu.

— Compreensível. — Ela sufocou uma risada. — O quê... o que ele te


contou?

Olivia sempre tinha as mãos feitas, mas o esmalte estava quebrado e


velho. Eu mantive meus olhos nelas.

— Eu não sei o que significa, mas ele disse para te contar que ele teria
escolhido Los Angeles.

Houve uma inspiração afiada, e o silêncio se esticou por tanto tempo que
eu eventualmente tive que olhar, e quando eu o fiz, eu quase desejei não ter
feito.

Lágrimas riscavam as bochechas da Olivia, passando por cima dos dedos


que agora eram pressionados a sua boca. Uma emoção em resposta subiu pela
minha garganta e eu mordi meu lábio. Los Angeles deve ter significado algo
realmente importante. Eu queria estar do outro lado dessa cela, não para
escapar, mas para abraçá-la. Mas eu precisava estar do outro lado dessa cela,
e eu precisava escapar. Não havia mais tempo.

— Olivia, — eu disse, e minha voz estava diferente, até para os meus


próprios ouvidos... mais suave, lírica. O poder zumbia.

Ela ficou tensa, e então suas mãos deixaram sua boca quando seus olhos
encontraram os meus. Lágrimas se prendiam aos cílios grossos, mas não
eram elas que deixavam os olhos dela agora vítreos. Era a compulsão na
minha voz, uma habilidade que havia se tornado inata ao Despertar. Parte de
mim abominava o que eu estava fazendo. Olivia era minha amiga. Usar
compulsão nela era errado, mas não havia outro jeito. Eu tinha que chegar
ao meu Seth. Ela eventualmente iria entender.

— Você sabe onde estão as chaves, Olivia?

Ela assentiu lentamente.

— Bom. Isso é realmente bom. — Eu passei o braço pelas barras, fazendo


um sinal para ela se aproximar de mim. Quando ela colocou sua mão fria na
minha, eu a apertei gentilmente. — Onde elas estão?

— Com o Aiden. — Suas palavras eram lentas.

Droga. Isso não era bom.

— E onde o Aiden está?

— Ele está com o seu tio e a Laadan. — Um suave suspiro escapou de seus
lábios.

Merda. De jeito nenhum ela conseguiria pegar as chaves. Meu olhar


deslizou para a porta da jaula e uma ideia se formou. Soltando da mão dela,
eu agarrei as barras e observei o clarão de luz. Ele estava fraco e não atingia
a marca do Titã no teto.

— Olivia, você pode me ajudar? — eu joguei o máximo de poder que eu


tinha na minha voz, e seus olhos se arregalaram. — Você vai me ajudar,
certo?

— Sim.

— Ótimo. — Eu sorri enquanto eu me apressava para a porta. O ponto


mais fraco era onde a fechadura estava; se nós duas trabalhássemos nela ao
mesmo tempo, poderia ser suficiente. — Eu preciso que você puxe essa porta,
Olivia, com a maior força que você puder.

Ela caminhou até a porta em transe, obedientemente colocando as mãos


na maçaneta.

— Coloque toda a sua força nisso, — eu pedi suavemente. — Puxe. Puxe


com força.

E ela o fez. Mestiços eram incrivelmente fortes, e o chão de metal e as


barras se agitaram. Olivia se inclinou até a cintura, fazendo força com as
suas botas. Eu me afastei, desejando que eu estivesse de sapatos, porque isso
realmente iria doer.

— Continue puxando, — eu comandei e coloquei meu calcanhar nas


barras do outro lado da fechadura.
A dor estilhaçou o meu pé enquanto a luz azul cintilava e sumia
rapidamente. Uma lacuna de mais ou menos cinco centímetros de largura
apareceu entre a porta e as barras.

— Puxe com bastante força, Olivia.

Ela grunhiu, puxando.

Caleb ia me assombrar por causa disso.

Me inclinando para trás, eu bati na porta novamente. Outra lacuna


apareceu. Com o meu pé ficando dormente, eu dei mais um chute. O metal
gemeu e cedeu. A força repentina mandou a Olivia para o chão e a porta...
estava aberta.

Sem perder tempo, eu pulei pela lacuna, meio esperando ser cortada por
algum tipo de defesa desconhecida, mas em seguida eu estava do outro lado
das barras.

Eu queria fazer uma dança da vitória e gritar, mas eu me abaixei e peguei


as bochechas da Olivia. Ela olhou dentro dos meus olhos, completamente sob
o meu controle.

— Fique aqui, ok? Fique aqui até que alguém venha te buscar.

Olivia assentiu.

Eu comecei a soltá-la, mas parei.

— Você não vai se culpar por isso. Você irá me culpar.

— Ok, — veio a resposta baixinha e sonolenta.

Eu a larguei e comecei a ir em direção às escadas. Um sabor amargo


estava na minha boca quando eu olhei por cima do meu ombro. Olivia havia
permanecido no chão, seus olhos fixos no local onde eu estive.

— Obrigada, — eu disse, não que importasse. Ela não me ouviu ou


entendeu. Ela não faria nada até que alguém viesse aqui embaixo, e então
seria como acordar de um sonho.

Eu a veria novamente. Uma vez que eu e o meu Seth mudássemos as


coisas, eu a veria novamente e eu pediria perdão.
Tranquilizada por isso, eu caminhei pela escadaria estreita, parando na
porta. Não havia vozes do outro lado. Demorando um segundo, eu testei a
ligação com o Seth. Ele não estava lá, e eu não tinha tempo para esperar que
ele aparecesse. Logo que eu estivesse do lado de fora e eu soubesse onde eu
estava, eu o chamaria.

Abrindo a porta lentamente, eu verifiquei o corredor. Vazio. Era estreito,


e pinturas estavam penduradas nas paredes. Ele se dividia em dois caminhos.
À direita, luz natural entrava através de uma pequena janela, me chamando.
Eu deslizei pela porta, fechando-a atrás de mim em silêncio enquanto eu
observava a minha volta. Eu estava sob efeito do Elixir da última vez em que
eu estive no andar de cima... a única vez, na verdade... e eu vagamente me
lembrava de que esse corredor levava para a cozinha e um tipo de sala de
estar. Fora da cozinha havia o terraço, que levava para o lado de fora. Uma
sensação estranha se desfraldou dentro de mim, e um lampejo meu e do
Aiden apareceu naquele terraço.

Eu empurrei isso para fora da minha cabeça e me arrastei pelo resto do


corredor. Eu seriamente desejei que alguém tivesse deixado um punhal ou
algo jogado por aí. Sem sorte. Pensando nisso, eu deveria ter perguntado para
a Olivia onde nós estávamos. Eu revirei meus olhos. Deus, eu era uma burra
às vezes, mas eu estava mais preocupada em ficar livre.

Quando eu me aproximei de uma das portas fechadas, eu pensei ter


ouvido o Deacon rindo, e então Luke. Mordendo o meu lábio, eu contornei a
escadaria que levava para o andar de cima... A porta abriu repentinamente e
eu fiquei cara a cara com Lea. Merda.

Com a boca escancarada, Lea piscou e deu um passo para trás, ficando
contra a parede.

— Não...

Seu grito agudo de batalha e estridente me cortou, e então ela me atacou.


Ela realmente me atacou. Deuses. Sem tempo para compulsão, eu desviei de
seu golpe com outro brutal que a mandou espiralando. Ela se segurou na
parede e resmungou. Antes que ela pudesse restituir seu equilíbrio, eu passei
a perna embaixo dela na mesma hora que o rosto do Deacon apareceu na
porta.

— Ah, merda, — Deacon disse, e ele se afastou rapidamente enquanto


Luke se lançou para frente.

Luke tentou me agarrar, mas eu era mais rápida.

— Alex, você não quer fazer nada...

No final do corredor, a última porta se abriu, batendo contra a parede. Eu


peguei um relance de calça preta.

Sentinela. Sem pensar duas vezes, eu ergui meu braço e o mais próximo
de mim pegou a maior parte do elemento de ar.

Luke voou para trás, seus olhos arregalados e atordoados. Ele atingiu a
Lea, que havia se movido para frente do Deacon como que para protegê-lo.
Havia vários resmungos, um grito de dor, e então alguém gritou o meu nome.
Virando-me, eu segui em direção à cozinha. Meus pés descalços batiam no
chão enquanto eu fazia a volta na mesa e entrei no solário. Eu alcancei a
porta em segundos, puxando-a e então percebendo que ela estava trancada.

Xingando baixinho, eu destranquei a maldita coisa e abri a porta. Aiden


passava pela cozinha.

— Alex! Não!

Ele estava atrasado. Eu estava do lado fora. Eu estava livre.


Seis
No momento em que a luz do sol tocou a minha pele, eu hesitei um
passo. Parecia que anos haviam se passado desde que eu senti o calor da luz
natural. Meus sentidos retornaram à vida. A grama estava fria embaixo dos
meus pés, e úmida. Olmos altos e grossos ficavam turvos enquanto eu corria
por uma pequena estrada de terra, contornando um Hummer, e entrando na
floresta densa que cercava a cabana.

Braços e pernas bombeando, eu continuei correndo. Meu cabelo fluindo


atrás de mim, e eu me forcei, prestando atenção, procurando por qualquer
sinal de onde eu estava. Não havia nada.

Uma semente de pânico tomou raiz. Eu me escondi atrás de uma árvore


caída, meus pés deslizando por cima das agulhas afiadas de pinheiro.

Como eu iria contar ao meu Seth onde eu estava quando eu não tinha
nada a não ser árvores...

— Alex! Pare!

Minha respiração falhou e eu ousei olhar para trás.

Era ele... Aiden.

— Merda, — eu disse, ganhando velocidade.

Mais à frente, havia um riacho... o riacho. Eu me lembrava disso.


Milhares de anos de Apollyons e suas habilidades percorriam através de mim.
Acionar essa habilidade era muito fácil, como entrar em jeans já bem usados,
o que era irritante considerando o treinamento hediondo que eu havia feito
na preparação para o Despertar, e claro, o meu Seth teria sabido disso.
Idiota.

Estendendo um braço, eu convoquei a água, fazendo com que ela


respondesse a mim.

A água se agitou, e então um fluxo se lançou pelo ar, arqueando bem alto
acima de mim. A parede de água continuou vindo, drenando o riacho raso
dentro de segundos. Ela girou em funil, batendo na terra atrás de mim. Um
palavrão foi abafado. Isso deve ter me comprado mais algum tempo.
Correndo para o leito do riacho, lama salpicava meus pés e jeans. Galhos
baixos passavam pelo meu cabelo, arrancando fios e rasgando minha
camiseta. Mesmo com roupas rasgadas, eu continuei seguindo. A luz do sol
espiava por dentre os galhos grossos enquanto eu seguia ainda mais afundo
pela floresta, longe do chalé... longe dele.

Sem aviso, a ligação se tornou viva. Alex?

Estou fora. Eu pulei por uma pedra sobre um pequeno buraco e cai
agachada. Correndo, eu saí fora. Eu não sei onde estou, mas estou fora.
Seth, eu...

Eu podia ouvir Aiden. Ele estava perto e rápido, alimentado por algo mais
forte que o éter e eu sabia, mesmo eu sendo rápida, que não seria capaz de
correr mais do que ele essa distância se uma parede de água não o tinha
impedido. Eu teria que lutar. Mas eu não estaria sozinha. Meu Seth estava
aqui.

Parando repentinamente, eu virei. O vento soprava meu cabelo para trás


enquanto eu respirava o ar fresco da montanha. O Aiden passou pelo pequeno
buraco, pousando em um agachamento ágil a diversos metros de mim. A
água caía das mechas escuras onduladas grudadas em sua cabeça, e sua
camiseta preta estava agarrada aos músculos duros de seu peito e barriga.
Embaixo daquele material fino e encharcado, seus ombros ficaram tensos.

Nossos olhos se encontraram.

Ele se levantou graciosamente, mãos abertas em suas laterais.

— Você não quer fazer isso, — eu avisei. — Vá embora.

Aiden veio para frente.

— Eu não vou te deixar. Eu nunca faria isso.

Houve um aperto no meu peito que não pertencia ali. Eu dei um passo
para trás, sentindo um calor radiando dos meus dedos.

A voz do meu Seth zunia através da ligação e eu sabia o que ele queria
que eu fizesse, portanto, eu entendi o porquê eu tinha que fazer isso.

Eu inspirei fracamente e ergui o meu queixo.


— Então é o seu funeral.

— Que seja.

Eu me lancei em Aiden.

Ele estava preparado para isso. Ele correu para a esquerda, evitando o
meu ataque. Ele era rápido e também muito habilidoso. Eu sabia, porque ele
havia me treinado, mas eu era melhor que ele. Eu era outra coisa.

Movendo-me à velocidade de um relâmpago, eu mergulhei e mirei nas


pernas dele. Aiden pulou, e eu me atirei para cima, batendo o meu punho no
estômago dele. Ele deu um passo tropeçado para trás, mas rapidamente
recuperou o seu passo. O meu próximo soco foi desviado. O terceiro acertou o
queixo dele, lançando sua cabeça para trás.

A luz do sol refletia nas adagas presas às suas coxas, e eu fui atrás delas.

Aiden se virou para a esquerda no último segundo, e os meus dedos


apenas roçaram o cabo de uma. Ele pegou o meu pulso, torcendo apenas o
suficiente para eu gritar e soltar. Minha cabeça virou-se com a surpreendente
explosão de dor, e ela refletiu nos meus olhos metálicos. Por alguma razão,
eu não esperava que ele fosse me machucar. Eu acho... eu não sei o que
achava.

Ele me empurrou para trás como se pudesse ler os meus pensamentos e


disse,

— Eu não quero fazer isso.

Fúria explodiu através de mim como um foguete.

— Você não pode me machucar.

Aiden se empurrou para fora do caminho, enquanto eu lançava para


frente. Eu girei, chutando os rins dele. Eu me movimentei para acertar outro
chute, mas o Aiden pegou minha perna e me jogou para trás. Eu atingi o
chão e me ergui, jogando minha cabeça para trás.

A energia bateu em mim. Akasha fervia embaixo da superfície, esperando


para ser chamado, exigindo.

Eu voei no Aiden e nós lutámos... brutalmente. Principalmente da minha


parte, porque o Aiden estava mais na defensiva do que na ofensiva, mas as
contusões foram trocadas, uma depois de outra.

Memórias de treinamentos juntos vieram à tona. Eu não tinha certeza se


isso era benéfico para nenhum de nós, porque nós antecipávamos os
movimentos um do outro e nenhum de nós conseguia ser superior. Eu
golpeava e lá estava ele desviando. Ele tentava a submissão e eu escapava
antes que ele pudesse me bloquear. Golpe por golpe nós fomos, e na parte de
trás da minha cabeça, eu sabia que eu poderia ter invocado os elementos,
mas eu não o fiz. Talvez fosse toda a raiva acumulada de estar enjaulada por
tanto tempo, e eu precisava da luta física. Talvez fosse outra coisa. Sangue
descia pelo lábio de Aiden. Uma marca vermelha florescia em sua mandíbula.
Sua camiseta estava rasgada ao longo do meio, expondo uma fileira de
abdômen duro, mas ele não mostrava sinais de abrandamento.

Frustrada, eu me empurrei de uma árvore, ganhando um pouco de ar e


virei, percebendo o meu erro um instante depois que foi tarde demais.
Enquanto eu me girava, Aiden entrou no meio, pegando-me pela cintura e me
girando. No treinamento, eu nunca tinha sido capaz de passar por ele desse
jeito. Eu deveria ter sabido.

Eu inclinei o meu peso para frente e nós dois caímos de joelhos. Eu senti
o gosto de sangue, mas Aiden não havia me atingido. Nem uma vez. Mas o
meu rosto tinha conectado com o rosto dele mais do que algumas vezes.

— Desista, — eu grunhi, jogando minha cabeça para trás.

Os braços dele se apertaram ao meu redor.

— Você já deveria saber que eu não vou desistir de você. Você não é tão
estúpida assim.

— Não posso dizer o mesmo sobre você. — Eu abri minhas pernas e juntei
minha força. — Você não pode ganhar.

A respiração dele dançava sobre minha bochecha.

— Você quer apostar nisso?

Eu apertei minha mandíbula.

— Você não pode me ter. Eu não...


— Você não é dele, Alex. Você não pertence a ninguém a não ser você
mesma!

Ele estava errado, tão errado. Eu pertencia ao meu Seth. Eu fui criada
para ele, apenas ele, e Aiden estava no caminho.

Balançando para frente, eu coloquei bastante espaço entre nós e forcei


meus pés, quebrando seu abraço. Jogando o meu braço para trás, eu o acertei
na bochecha com um punho fechado. O impacto machucou minhas juntas.

Aiden caiu sobre um joelho e cuspiu uma boca cheia de sangue.

— Deuses.

Me virando, eu comecei a correr, ignorando as pedras afiadas afundando


na sola dos meus pés.

Eu consegui correr cerca de cinco metros antes de eu ser atacada por


trás.

Aiden me puxou para cima para que as minhas costas estivessem presas
em seu peito.

— Indo embora tão rápido? Quando a diversão está apenas começando?

— Eu te odeio! — Eu lutei descontroladamente, tentando cavar o chão.


Sujeira solta subiu enquanto eu me debatia, tornando-me mais como um
animal preso em uma rede. Horas de treinamento se desvaneceram. — Eu te
odeio!

— Você pode me odiar o quanto quiser, mas isso não muda nada. — Ele
conseguiu ficar de pé e começou a me arrastar para trás, e eu sabia que ele
me arrastaria o caminho todo até o chalé, até a jaula. — Eu não vou deixar
você fazer isso consigo mesma.

Eu me mexi e atirei-me para os lados, mas estávamos de volta no


aglomerado de árvores dentro de segundos.

— Você não pode me impedir! Você não pode fazer isso!

— Você não entende, Alex. Você não pode ficar aqui fora.

Eu dei uma cotovelada nele.


Ele resmungou, mas não soltou.

— Eles vão te matar. Você entende? — Ele me balançou. — Eles virão para
te matar!

— Eu não me importo! — eu gritei até ficar rouca. — Eu preciso ir. Eu


preciso estar com ele.

Aiden respirou fundo e seu aperto afrouxou-se uma fração.

Usando minha força interior, eu empurrei minhas pernas para cima e a


força combinada nos derrubou.

Aiden atingiu o chão primeiro e rolou antes que eu pudesse me soltar,


enfiando suas mãos nas minhas costas, forçando-me para baixo. Minha boca
ficou cheia de lama e grama.

— Para! — ele sibilou em meu ouvido. — Isso não vai funcionar, Alex.
Você pode não se importar em morrer, mas eu me importo o suficiente por
você.

— Eu não me importo! Tudo que importa é o Seth. Se eu não posso estar


com ele, então eu prefiro estar morta.

— Você está se ouvindo? — As mãos dele apertaram meus ombros. — Você


preferia morrer a não estar com ele? Você sabe o quão fraco isso soa? A Alex
que eu conheço nunca teria sentido algo assim!

O que ele disse atingiu profundamente e algo quebrou dentro de mim.


Enraivecida, eu plantei minhas mãos no solo rico e senti a terra tremer. Um
grande rugido começou abaixo, e o chão cedeu sob nós, rolando como um
mar tempestuoso. Nós fomos jogados para longe. Eu bati numa árvore e
atingi o chão com as minhas mãos e joelhos.

Um relâmpago cruzou o céu, me cegando por um instante. Nuvens


chegaram, bloqueando o sol, e a escuridão caiu. Os céus se abriram e uma
chuva torrencial nos atingiu.

Eu não sei se era eu ou outra coisa. Eu estava além de me importar. Uma


bola gigante de emoção turbulenta se acomodou em meu estômago, se
desenrolando a velocidades nauseantes. Raiva. Frustração. Medo. Tudo isso
passava por mim.
O ar me chicoteou e eu levantei do chão. O ar estava estático. Faíscas
voaram.

O mundo estava colorido em tons de âmbar. Eu não era eu. Eu não era
nada mais.

Aiden estava parado de pé a alguns metros, seus olhos prateados fixados


em mim. Um olhar de terror e espanto delineava suas características
marcantes.

Eu era uma deusa, assim como Seth havia dito. Nós éramos deuses.

Faça. O sussurro do Seth penetrou o meu sangue. É hora.

Meus pés tocaram o chão e eu dei um passo para frente... um, e então
outro. E Aiden não se mexeu. Ele esperou. Estava naqueles olhos dele, a
finalidade disso. Ele não iria ganhar, ele não conseguiria e ele sabia disso.
Aiden tinha aceitado. Enquanto eu o alcançava, a chuva parou e as nuvens
se dissiparam. O sol seguiu os meus passos.

— Alex. — A voz de Aiden estava quebrada.

Como uma serpente atacando, eu acertei as pernas de Aiden, derrubando-


o, e ele estava de costas antes que outra respiração pudesse ser dada.
Sentando em cima dele, eu coloquei minhas mãos em seus ombros. As
marcas do Apollyon brilhavam um azul cintilante e corriam em minha pele.

Eu me inclinei para frente, colocando os lábios acima dos dele, e as


palavras que saíram da minha boca eram minhas... mas não eram.

— Todos os momentos acabam, St. Delphi. E o seu terminou agora. — Eu


pressionei meus lábios no canto do dele e ele recuou. — Você é fraco porque
você ama.

Aiden me encarou, sem piscar.

— Amar não é ser fraco. O amor é a coisa mais forte que existe.

Meus lábios se curvaram em um sorriso. Idiota.

Akasha correu para a superfície. Minha pele estava pegando fogo, eu


estava pegando fogo. Uma luz azul brilhante se formou sobre o meu braço
direito, circulando-o enquanto ela subia pelos meus dedos. A luz brilhou,
intensa e linda na mesma proporção que era destrutiva.

A luz do sol caía sobre nós, e eu recuei. Akasha cobria minha mão direita.
Quando eu a soltasse, ela iria extinguir a vida de tudo em seu caminho.
Havia morte naquela beleza. E Aiden não fez nenhum movimento para
defender sua vida.

Seus olhos se fixaram nos meus e ele estendeu a mão lentamente. As


pontas de seus dedos, calejados de anos de treinamento e luta, roçaram
minha bochecha com ternura.

— Eu te amo, Alex. Eu sempre vou te amar.

Eu pisquei. O meu coração titubeou. Eu não conseguia entender como ele


podia dizer uma coisa assim, tão tocante... tão amorosamente, a segundos de
morrer.

Faça, Alex, e então nós poderemos ficar juntos. Nós libertaremos os


mestiços... o seu pai. Nós mudaremos o mundo. Você e eu, Anjo, nós
ficaremos juntos para sempre.

O meu olhar caiu entre nós. O colar de rosa havia deslizado para fora,
exposto pela gola rasgada da minha camiseta. Um raio de luz pegou as
bordas do cristal vermelho da rosa florescida... uma coisa tão delicada,
trabalhada pelas mãos de um verdadeiro guerreiro. O ar deixou os meus
pulmões e o meu braço começou a tremer.

Nós estamos nisso juntos, Alex, até o fim. Aquelas palavras não eram de
Seth, mas esse era o fim. Os meus olhos queimavam como se estivesse
chovendo ácido, mas o céu estava claro. Eu estava a segundos da liberdade...
mas tanta coisa, tantas memórias começaram a passar pela minha cabeça.

Eu não conseguia parar de olhar a rosa.

Imagens da primeira vez em que eu havia visto o Aiden enquanto eu


estava treinando com Caleb, e então de novo quando ele tinha passado por
uma parede de fogo e me salvado... salvado a minha vida.

Memórias da paciência dele, o seu apoio, até mesmo sua frustração


comigo.

Seth me chamou, mas eu o dispensei. Aquelas memórias eram


importantes. Elas significavam algo – tudo - para mim, certo? Não haviam
quaisquer sentimentos ligados a elas antes, mas agora elas estavam
embebidas em emoção. Eu me concentrei nelas, lembrando-me de como ele
cuidou de mim depois de Gatlinburg, como ele havia cuidado de mim quando
eu tive um colapso depois que a minha mãe... minha mãe. A primeira vez
que ele me abraçou - me beijou. Nunca houve qualquer tipo de julgamento
nos olhos de Aiden, como se eu fosse sua igual.

Eu sempre estaria em pé de igualdade com Aiden.

O meu peito subiu subitamente. O dia no zoológico tomou conta de mim,


e então o Dia dos Namorados. O amor que nós tínhamos dividido. Isso tinha
que significar algo.

Eu não conseguia respirar.

Eu desistiria de tudo por você.

Seth me chamou novamente, mas eu estava me despedaçando.


Quebrando. Tudo estava se desfazendo. Pedaços de quem eu costumava ser,
eram repelidos por quem eu havia me tornado. O passado e o presente não
podiam coexistir com o futuro.

Eu estava dividida em duas.

Seth gritou agora, sua voz rugindo na minha cabeça, e não havia como
escapar dele. Ele estava em todo lugar, em cada célula e pensamento, me
puxando. Mas eu não conseguia respirar e embaixo de mim, ele estava
debaixo de mim, e eu não conseguia pensar direito. Havia tantas vozes
novamente. Tantas vozes diferentes, algumas eram minhas... e eu não
conseguia pensar.

Eu me concentrei nos escudos mentais que o Seth havia me ensinado. Eu


precisava de um momento, apenas um segundo de silêncio para pensar nisso,
para entender por que ele não estava se defendendo e como ele poderia me
amar.

Seth estava furioso. A dor atravessou o meu crânio como se alguém


tivesse pegado um picador de gelo e começado a bater na minha cabeça, e eu
sabia que ele odiava isso, mas eu precisava de tempo. Ele gritou por mim,
mas eu imaginei aqueles muros. Eles eram de um rosa néon, pedras
preciosas, e elas subiam alto, tornando-se cada vez mais altos. Eu os fiz
espessos e cheios de titânio, e no topo havia arame farpado e uma bela cerca
elétrica em cima do arame, e tudo isso era apoiado pelo poder dos deuses.
Uma camada de luz azul cintilante cobria os muros.

A corda estalou dentro de mim, recuando como um chicote e então ela


havia sumido.

Exceto por um leve zumbido, havia silêncio, e era apenas eu agora,


sozinha com tudo o que eu tinha feito.

Inclinando minha cabeça para trás, eu gritei.

Liberado das profundezas da minha alma, o grito continuou vindo e


vindo. Eu não conseguia parar. Eu não conseguia compreender o que eu
havia me tornado... as coisas que eu havia feito. E quando eu parei, era
apenas porque minha garganta estava em carne viva.

Eu saí de cima de Aiden, incapaz de olhar para ele, porque eu... as


coisas... Com o corpo tremendo, eu me arrastei para o chão lamacento e me
enfiei contra uma árvore. Pressionando meu rosto nos meus joelhos, eu puxei
o fôlego, mas o meu peito doía e a pressão continuou aumentando.

— Alex? — Aiden chamou, sua voz rouca e áspera.

Eu o evitei, querendo que ele fosse embora. Ele precisava me deixar,


correr para longe o mais rápido que ele pudesse.

Mãos fortes pousaram em meus ombros e então deslizaram sobre os meus


braços, gentilmente envolvendo os meus pulsos. Ele puxou minhas mãos
para longe, e embora eu não aguentasse olhar para ele, meus olhos abriram.

Foi como ver Aiden depois de meses de separação. Ele estava claro para
mim. A curva larga das maçãs de seu rosto, as covinhas, e a forte linha de
sua mandíbula - características que eu havia guardado na memória eras
atrás. Ondas escuras se enrolavam sobre sua pele naturalmente bronzeada -
uma pele marcada por contusões e manchas vermelhas. Machucados que eu
tinha feito nele, mas ele ainda possuía aquela beleza masculina que sempre
me desfazia.

Aiden estremeceu, e então segurou minhas bochechas. Seus olhos


prateados procuraram algo nos meus. Eles estavam cobertos com uma fina
camada - como lágrimas, mas o Aiden nunca chorava.
— Alex... oh, deuses, Alex, você está aí?

Eu explodi em lágrimas.
Sete
Sim, eu não ia parar de chorar tão cedo. Estes eram os tipos de soluços
grandes, embaraçosos e de tremer o corpo inteiro. Aqueles dos quais eu não
conseguia pensar ou enxergar... Diabos, até mesmo respirar.

Aiden me abraçou durante tudo isso, seus braços um contato estranho e


encorajador. Ele murmurou palavras em grego antigo. Eu entendi agapi mou
diversas vezes, e o resto fazia tanto sentido quanto as palavras que eu
tentava falar durante os soluços. Eu sabia que eu seria capaz de entender as
palavras agora se eu não estivesse engasgando nas minhas lágrimas, mas eu
mal podia entender o inglês nesse momento.

Eu inundei a camiseta do Aiden.

E ele ainda me segurou contra o seu peito enquanto ele se inclinava


contra a árvore, alisando o meu cabelo, pressionando sua bochecha contra o
topo da minha cabeça. Ele nos balançou. Nós dois precisávamos disso, eu
acho.

Havia passos e vozes em algum momento e eu fiquei tensa em seus


braços. Eu não sabia quem tinha vindo, mas eu senti o Aiden balançar a
cabeça, e então os passos recuaram.

Deuses, eu conseguia pensar - realmente pensar - depois do que parecia


ser uma eternidade. Mas cada pensamento era ofuscado pelo dor dentro de
mim. A dor aguda que eu havia sentido no banheiro... eu a entendia agora. O
meu coração e a minha alma estavam gritando, tentando me alcançar.
Aquela dor estava em todo o lugar agora, me reprimindo por todos os lados.

Eu não podia escapar de todas as coisas que eu havia dito desde que eu
havia Despertado. Desde o momento em que eu havia me conectado ao Seth,
eu havia me transformado em uma personificação viva e respirando do meu
maior medo e eu nem tinha percebido isso. Seth e o que ele queria me
consumiram até não haver mais nada, e eu pensei que eu seria mais forte
que isso.

Oh deuses, as coisas que eu disse ao Aiden me horrorizavam e me


enojavam. As coisas que Seth disse que queria fazer comigo - que eu queria
que ele fizesse, na época em que tínhamos estado conectados... Agora eu
queria sair da minha pele, tomar um banho por anos, e eu acredito que
nunca me sentiria a mesma mesmo assim.

Como o Aiden ainda podia me abraçar estava além da minha


compreensão. Eu claramente me lembrava de ameaçar matar Deacon umas
vinte vezes. O meu comportamento havia o forçado a fazer o impensável -
me colocar no Elixir. Eu sabia que isso deve ter matado uma parte dele.

Eu me lembrava das mínimas coisas. Meu Seth? Ah, eca. Eu queria


esfregar o meu cérebro com detergente. E aquelas coisas que eu havia gritado
quando eu lutei com o Aiden - eu realmente lutei com o Aiden? Esfregar o
meu cérebro? Acrescente a boca e a alma nessa lista da lavanderia.

— Shh, — Aiden murmurou, alisando a mão ao longo das minhas costas.


— Está tudo bem. Tudo está bem, agapi mou. Você está aqui agora e eu
estou contigo.

Eu agarrei o colarinho de sua camiseta rasgada com minhas mãos


doloridas.

— Eu sinto tanto. Eu sinto muito, Aiden. Sinto muito.

— Pare. — Ele se inclinou para trás, mas eu o segui, mantendo o meu


rosto pressionado ao seu peito. — Alex.

Eu balancei minha cabeça, minha respiração pegando outro soluço.

— Olha para mim.

Lágrimas escorriam pelo meu rosto, e ele cuidadosamente embalou meu


rosto, forçando-me a olhar para cima. Eu queria fechar meus olhos, mas eu
também precisava vê-lo, mesmo que fosse apenas o seu rosto embaçado
agora.

— Como você pode olhar para mim? — eu perguntei. — Como você


suporta me tocar?

Suas sobrancelhas franziram e ele ficou muito sério. — Como eu não


poderia, Alex? Eu não te culpo pelo que aconteceu. As coisas que você fez e
disse não era você. Eu sei disso. Eu sempre soube disso.

— Mas era eu.


— Não. — A voz dele era firme, seus olhos de prata pura. — Era uma
casca sua, Alex. Você estava lá, ao fundo, mas não era você. Não era a Alex
que eu amo, mas você está aqui agora, e é só isso que importa. Só isso. Nada
mais.

A fé cega dele em mim, a sua aceitação e perdão, trouxeram uma nova


rodada de lágrimas. Eu chorei tanto que eu não achei que fosse chorar um
dia novamente, e quando finalmente acabou, eu não conseguia levantar a
cabeça do peito dele.

O sol estava começando a se por, e a temperatura estava caindo quando o


Aiden pressionou seus lábios contra o topo da minha cabeça.

— Você está pronta?

Não, eu queria dizer, porque eu não tinha certeza de que alguma vez
estaria pronta para encarar todo mundo. Além de me transformar na Alex
Má, eu também havia sido a Alex drogada e que se escondia nos armários.
Mas eu respirei fundo e eu me senti ok, bem até.

— Ok.

— Ok, — ele repetiu, e ficou de pé, mantendo-me situada perto de seu


peito, minha bochecha descansando em seu ombro.

Aiden deu um passo, e uma fissura de energia não-natural rolou pela


minha espinha - energia dos deuses. As marcas do Apollyon rugiram para a
vida, chicoteando a minha pele. Os braços dele ficaram tensos ao meu redor
quando ele se virou, erguendo sua cabeça para o céu. Deuses podiam proteger
sua presença se eles quisessem - Apolo tinha feito isso por meses - mas nós
dois sentimos a onda de poder.

— Isso não é bom, — eu disse mexendo-me em seus braços.

Ele me colocou de pé, suas mãos nos meus quadris. Um olhar em seus
olhos preocupados e eu sabia que ele estava pensando a mesma coisa.

Antes que ele pudesse abrir a boca, um gemido agudo sacudiu os ramos
acima. O ar ao nosso redor parou, e então o som de asas batendo tirou o
fôlego dos meus pulmões em uma saída dolorosa.

Aiden me empurrou para trás dele – realmente me empurrou atrás dele.


— Volte para a casa agora, Alex. As proteções vão mantê-los para fora.

O quê? E deixá-lo? Ele estava insano. Com o coração pulando na minha


garganta, eu balancei minha cabeça.

— Não. Não...

Outro grito transformou meu sangue em gelo. Então um grande uivo


passou pelas árvores, soprando o meu cabelo para trás.

As fúrias chegaram, correndo pela terra como mísseis procurando o alvo


de nome ‘Alex’ em todas elas. Cada uma atingiu o chão e se agachou,
fazendo subir terra e pequenas pedras.

Elas eram lindas - as duas fúrias. As duas eram pálidas com uma pele
translúcida e cachos longos e loiros que fluíam enquanto elas subiam
simultaneamente, seus corpos movendo sinuosamente enquanto uma dava
um passo para frente, seus pés descalços afundando profundamente no solo.

Um trovão quebrou o ar e um relampejo de luz ofuscante explodiu.


Jogando o meu braço para cima, eu tropecei para trás e tentei alcançar o
Aiden. Com o pulso batendo forte, os meus dedos envolveram o seu forte
antebraço.

Quando a luz diminuiu, um deus estava entre as duas fúrias, e o meu


coração pareceu parar bem naquele instante. Eu já havia o visto antes. Oh,
deuses, eu o tinha visto.

Com o cabelo cor de mel roçando em seus ombros, emoldurando uma


mandíbula desafiadora e quadrada, e características que eram angelicais e
puras - pacíficas até.

Thanatos.

Eletricidade despertava de seus olhos totalmente brancos.

— Eu posso não ser capaz de te matar, Apollyon, mas eu posso me


certificar de que você não consiga alcançar o Primeiro.

— Espera! — Aiden gritou, com uma mão envolvendo o punho da adaga.


— Ela quebrou...

As fúrias voaram para frente, pele luminosa se dissolvendo para revelar a


tez cinzenta horrível que pareciam cadáveres que estiveram flutuando na
água há muuuuito tempo. Cabelos longos e brilhantes se encolhendo e se
transformando em bobinas apertadas que batiam contra o ar com presas
ferozes em seus rostos esqueléticos.

Garras se formaram - garras que podiam arrancar osso e tecido como se


fosse papel.

Aiden deu uma guinada para o lado e se virou em minha direção.

— Alex! — Ele jogou uma das adagas.

Pulando, eu peguei a adaga quando a primeira fúria alcançou o Aiden,


suas unhas afiadas como lâminas mirando diretamente no pescoço dele. Ele
se virou, sacando uma lâmina de foice. Em um movimento suave e elegante,
ele trouxe a borda afiada da lâmina para baixo, cortando o braço da fúria.

Ela gemeu uma mistura de grito de bebê e uma hiena enquanto ela se
arqueava segurando seu toco ensanguentado.

Droga.

Com absolutamente tempo nenhum para correr até o Aiden eu fiz um


high-five com ele, e girei e mergulhei enquanto a segunda fúria tentava
agarrar o meu cabelo. Erguendo-me no mesmo momento que a fúria tentou
me atingir, eu enfiei a lâmina profundamente em seu estômago afundado.

Seu rosto distorcido estava a centímetros do meu, a fúria abriu a boca,


revelando uma fileira de dentes serrilhados, e riu.

Eu engoli o enjoo.

— Deuses, a sua respiração está nojenta. — Eu puxei a lâmina, revoltada


com o som de sucção. — De verdade.

Inclinando sua cabeça para o lado, ela piscou.

— Nojenta?

— Sim. — Virando-me, eu plantei o meu pé esquerdo e chutei, acertando


o estômago da fúria.

Ela voou para trás, acertando uma árvore.


— Viu? Nojenta.

A outra fúria estava indo no Aiden com o seu braço bom remanescente,
encurralando-o enquanto ela evitava a foice perigosa. Ele olhou para mim e
aquele pequeno momento custou a ele.

Ela arrancou a foice da mão dele com uma gargalhada.

— Puro-sangue bonito...

Esquecendo-me sobre o deus e a outra fúria, esquecendo sobre tudo que


não fosse o Aiden, eu corri para a frente, ignorando a dor que crescia nas
minhas pernas.

Aiden passou por debaixo do braço da fúria, aparecendo atrás dela, mas
ela se virou muito rapidamente e atacou, atingindo o Aiden ao longo do peito
com a parte mais larga de seu braço.

Ele caiu em um joelho, cambaleando por causa do golpe.

Tirando a foice do chão, eu gritei o nome dele e devolvi o favor ao jogar a


foice para ele. Aiden a pegou do ar e rolou, por pouco não atingindo a fúria.
Ela voou e girou por cima dele, estendendo o braço para baixo, agarrando
uma mão cheia com o cabelo dele. Ela puxou sua cabeça para trás.

— Não! — O meu coração parou - o meu mundo parou.

Akasha surgiu sob a minha pele e as marcas se iluminaram. Todas e cada


uma delas queimavam e vibravam com o poder do quinto elemento.

Algo estourou dentro de mim; minha visão escureceu, e então se


iluminou. Eu não ouvi nada a não ser o meu próprio coração estrondoso e o
zumbido na parte de trás da minha cabeça.

Jogando meu braço para frente, uma rajada de luz azul intensa surgiu na
minha palma aberta e arqueou. A minha mira estava ruim já que eu estava
tentando acertar a cabeça da biscate, mas a rajada de energia atingiu a asa
da fúria, fazendo-a girar.

Insanidade absoluta estourou.

Thanatos rugiu sua raiva. A fúria disparou para o ar, mas engasgou com
uma asa e voltou para baixo espiralando. Aiden correu para o lado, mas não
rápido o bastante. Cansada de lutar contra mim como eu estava exausta da
nossa batalha, ela bateu nele e os dois rolaram em um emaranhado de
braços, lâminas, e garras mortalmente afiadas.

Pelo canto do olho, formas alcançam o topo do vale - Solos e Marcus


armados com foices. Marcus? O que...?

Eu me atirei em direção às formas lutando diante de mim.

Thanatos se virou e estendeu um braço. Ele não tocou Solos fisicamente,


mas ele voou como se tivesse sido atingido por uma bala de canhão. O
Sentinela mestiço atingiu uma árvore com um grunhido alto e caiu de
joelhos.

O deus virou seus olhos estranhíssimos para o meu tio e ergueu outra
mão.

— Fique parado, puro sangue, ou você conhecerá um destino prematuro.

Marcus abaixou o queixo.

— Desculpa, mas essa é minha sobrinha, então isso não vai acontecer.

Algo com garras afiadas e hálito horrível segurou o meu cabelo e puxou
com força. Eu caí no chão e, num piscar de olhos, o ar perfurou os meus
pulmões. Lutando para ficar de joelhos, um segundo passou e os pés
descalços da fúria conectaram com o meu queixo, empurrando minha cabeça
para trás.

Um gosto metálico inundou minha boca. A adaga voou das minhas mãos
enquanto a dor radiava pela minha espinha, explodindo sobre os meus
nervos.

Pânico se instalou - pânico cru e desenfreado.

Todos os sons de luta à minha volta aumentaram. Grunhidos e gritos de


dor podiam ser ouvidos. A fúria que havia me chutado até o fim do mundo se
ergueu, seus dedos se abrindo. Eu a encarei, entorpecida e inabalável
enquanto a morte...

Morte? A ficha então caiu. Eles não podiam me matar. Sim, eles podiam
me machucar seriamente, mas me matar? Não. Eu era o Apollyon. Eu
exercia controle sobre os quatro elementos e o quinto e mais poderoso -
akasha. Eu era a força do Assassino de Deus. Eu era a combustão dele - o ás
na manga dele. Eu era o começo e ele era o fim. E juntos... não havia juntos.

Havia apenas eu.

Meus olhos se encontraram com os da fúria e eu sorri.

Ela hesitou.

Eu me lancei de pé.

— Vadia, por favor.

A boca da fúria se escancarou, e eu chamei o elemento do ar, soltando-o.


Os ventos com a força de um furacão se chocaram contra a fúria e a
mandaram de volta voando pelas árvores como se ela estivesse conectada a
uma corda e o próprio Zeus tivesse dado um bom puxão.

— Um a menos, — eu disse, virando-me. — Quem é o pró...?

Thanatos jogou o Marcus ao chão, desviando do ataque de Solos, e se


virou para mim em um nanossegundo. Foi bem épico.

Um raio de luz branca voou da mão do Thanatos e não havia uma única
coisa no mundo que poderia ter se movido rápido o bastante para evitá-lo.
Nem mesmo Seth, eu estava apostando.

Ele me atingiu logo abaixo do peito, e as minhas pernas caíram debaixo


de mim. Uma dor lancinante em brasas cortou a minha pele e o meu rosto
caiu no chão. Eu nem mesmo senti. Não havia nada a não ser a dor
arrasando e travando os meus músculos.

Raios de deuses eram uma droga.

Aiden gritou o meu nome, e então eu pensei ter ouvido o meu nome sendo
chamado novamente, mas era dentro da minha cabeça, alto, e tão, tão
bravo... e soava como o Seth.

Sem qualquer aviso, o chão tremeu embaixo do meu corpo trêmulo. Um


lampejo de luz dourada caiu em cascata através da clareira. O calor roubou o
meu corpo.

Fracamente, eu ergui a cabeça.


Duas pernas vestidas em couro estavam paradas diante de mim.

— Isso é o suficiente, Thanatos. — A voz do Apolo era calma, mas


também bem assustadora, uma calma mortal que eu nunca queria ser a
receptora.

— Q-que bom de v-você a-aparecer, — eu resfoleguei.

— Cala a boca, Alex. — Apolo avançou. Um raio de luz seguiu seus


passos.

Thanatos se manteve firme.

— Ela deve ser neutralizada se nós não conseguimos matá-la. Deixe-me


cuidar disso, Apolo. Nós temos que fazer algo para evitar a guerra.

— Ela quebrou a ligação, seu idiota.

O outro deus bufou.

— Como se isso importasse. O tempo vai passar e ela vai se conectar com
ele novamente.

— Isso importa sim! — Apolo rugiu. — Se ela não está conectada com o
Primeiro, nós não devemos machucá-la! Você... — Apolo grunhia um som
cada vez mais próximo a um sibilo. — Chame suas duas fúrias para longe ou
elas vão se juntar à irmã delas. Eu te prometo.

— Nós devemos...

Muito fraca para manter minha cabeça levantada, eu descansei minha


testa contra o chão, mas eu não precisava ver o que aconteceu para saber
que o Apolo havia perdido sua paciência. O vento aumentou e o chão tremeu.
Os dois deuses colidiram com um baque.

Eu fechei meus olhos e esperei que o Apolo ganhasse essa rodada, porque
de jeito nenhum eu ia lutar mais. De jeito nenhum.

Alguém foi derrubado ao chão, seguido por uma rápida sucessão de


estalidos. O ar estalou com eletricidade, e então silêncio, silêncio precioso.

Fortes mãos agarraram os meus braços e gentilmente me viraram de


costas. Eu encarei os olhos prateados.
— Alex?

— Estou bem. Apenas... um pouco inquieta. Você?

Aiden havia vivido dias melhores. Sangue escorria do canto da boca dele.
Uma contusão sombreava sua mandíbula e a parte da frente da camiseta dele
estava rasgada, mas ele estava vivo e estava bem.

Ele me olhou de cima a baixo e então me ergueu, sem se importar em me


colocar de pé. Segurando-me perto, ele virou e eu observei o estrago.

Solos e Marcus estavam parados próximo de Apolo, que estava segurando


uma das adagas do Covenant em sua mão. Sangue pingava da ponta,
fazendo-me olhar.

Apolo olhou para ela e deu de ombros.

— Ele vai superar isso.

Eu mudei o foco e o encarei.

— Mas eu terei que responder por isso, eu acho. — Apolo entregou a adaga
para um Solos machucado. — E pode levar alguns dias...

Apolo avançou, parou na nossa frente, e Aiden me colocou para baixo e


se colocou entre nós. O deus sorriu.

— Eu sei que ela quebrou a ligação. Bom te ter de volta, Alex.

— Sim, — eu sussurrei.

Ele virou sua atenção para o Aiden.

— Mantenha as proteções na casa até que eu possa retornar. Enquanto


isso, prepare-se para a batalha.

Batalha? O que diabos ele achava que nós acabamos de fazer?

Aiden assentiu.

O deus respirou fundo e flexionou suas mãos.

— E você estava certo. E eu estava errado.


— Eu sei, — Aiden disse, e eu olhei para cima, confusa.

Apolo virou para os outros homens e acenou com a cabeça. Sua forma
começou a desaparecer.

— Espera, — eu chamei. Eu tinha tantas perguntas, mas tudo que ele fez
foi olhar por cima do ombro e sorrir
Oito
Eu não me lembro muito da caminhada de volta para a cabana. Em
algum momento, eu me contorci o suficiente para conseguir me libertar e
caminhar por mim mesma, mas estava me movendo tão lentamente e tão
pateticamente que Aiden tinha finalmente parado de resmungar baixinho e
me pegou de volta.

Eu não lutei depois disso. A pé, eu era mais um obstáculo.

A cabana estava quieta em nossa volta. Marcus e Solos tinham saído


mancando, sem dúvida, para cuidar de seus ferimentos. De alguma forma o
resto dos ocupantes sabia que agora não era hora para uma recepção de boa-
volta ao mundo da sanidade e da lógica. Aiden me levou até as escadas e ao
corredor estreito, em direção ao quarto em que ele dormia quando eu estava
no Elixir. Lembrei-me de que, mesmo quando eu estive bêbada com a bebida
feliz, eu procurava a sua presença e me aconchegava nele no sofá. Meu
coração disparou.

Aiden começou a me levar para a cama, mas eu o interrompi.

— Chuveiro, — eu disse com a voz rouca. — Preciso de um banho.

— Sim, você meio que precisa - nós dois precisamos. — Girando, ele se
dirigiu para o banheiro. Me colocando de pé, os olhos sombrearam com
preocupação quando eu balancei um pouco. — Você está bem?

— Sim, eu estou cansada. Não há nada de muito errado comigo. — E isso


era verdade. Eu estava machucada e dolorida, mas isso era tudo. E eu tive
sorte, considerando que tínhamos acabado de sair de um jogo de morte com
um deus da morte e duas fúrias. — Você está...?

— Eu estou bem. — Ele olhou um momento, depois deu um beijo na


minha bochecha. — Eu já volto.

— Tudo bem. — Eu era um zumbi em pé.

Seus olhos procuraram meu rosto com tanta intensidade que eu agarrei a
pia.

— Não monopolize toda a água quente, tudo bem? — Disse.


Isso trouxe um sorriso aos meus lábios. Assim que ele saiu, eu virei-me
lentamente para o chuveiro e abri as torneiras. Tirar minhas roupas
arruinadas foi uma experiência dolorosa. Todos os músculos doíam e
demorou alguns minutos. No momento em que entrei no box, vapor encheu o
banheiro.

Eu provavelmente ia usar água quente para uma semana enquanto Aiden


provavelmente ia mobilizar as tropas e convencê-los de que eu não era mais
uma sociopata.

Eu tremi sob a água, pressionando meu rosto com minhas mãos. Elas
tremeram. Eu tremi. Mudei-as para a corrente em volta do meu pescoço,
deslizando os meus dedos na rosa. Algo tão pequeno tinha sido a única coisa
forte o suficiente para quebrar a ligação.

Mas não era ela em si, mas o que ela simbolizava - o amor de Aiden por
mim e como eu me sentia por ele - algo puro e natural, uma emoção não
forçada. Ver isso tinha quebrado o vínculo entre Seth e eu.

Trazendo o cristal para os meus lábios, eu dei um beijo contra a rosa.

O vínculo foi quebrado, mas Seth ainda estava lá... no final da corda
adormecida na boca do meu estômago. Deuses, ele tinha estado tão furioso,
realmente assassino, mas o choque tinha percorrido a nossa ligação um
segundo antes de ter terminado. E, novamente, quando Thanatos tinha me
atingido com a força do deus, ele estava lá como um perseguidor assustador
com um bilhete só de ida para o meu cérebro.

Seth não tinha acreditado que eu seria capaz de quebrar o vínculo. E até
que ponto isso teria ido se não tivesse?

Eles estão vindo para te matar. E apesar de Thanatos não ter força para
realizá-lo, ele com certeza não tinha problema em me ferir - ou qualquer
pessoa que me defendesse. As pessoas poderiam ter morrido hoje por minha
causa.

Eu tomei fôlego.

E por que Aiden expulsou Apolo da cabana? O que aconteceu com aquele
amor incondicional?

Deuses, havia muitas perguntas, e eu estava muito cansada para isso


agora. Eu precisava de um tempo para me ajeitar. Eu precisava de uma cama
após este banho.

Água fluiu sobre meu corpo, sobre a pele que estava tão ferida como o
meu interior e meu cabelo colou às minhas costas. Fechando os olhos, eu
levantei meu queixo e deixei o chuveiro fazer seu trabalho, apagando as
lágrimas que haviam se agarrado aos meus cílios com força, limpando a
mente de tudo.

Haveria tempo para fazer essas perguntas, planejar a morte muito


dolorosa de Seth e encontrar meu pai, mas agora, eu simplesmente não podia
fazê-lo. Eu não conseguia pensar em outra coisa além disso agora, neste
exato momento, porque tudo era muito cru e muito fresco para se
aprofundar.

Eu ouvi a porta do banheiro abrir e mantive meus olhos apertados, mas o


meu ritmo cardíaco disparou em territórios inexplorados. Eu cruzei os braços
em volta de mim e segurei a minha respiração.

Houve um pequeno movimento atrás de mim. Pele roçou na minha. Um


pequeno arrepio rolou pela minha espinha. Uma faísca infinita foi transferida
entre nós, algo que não poderia ser replicado ou forçado. Como eu poderia ter
esquecido isso quando estava conectada com Seth? Meu coração bateu mais
forte.

Aiden roçou a massa de cabelo grosso em meu ombro e seus lábios


encontraram o espaço entre o pescoço e o ombro. Suas mãos deslizaram pela
pele lisa dos meus braços, segurando meus cotovelos e depois meus pulsos.
Suavemente, lentamente, ele soltou meus braços aos meus lados.

Mordi o lábio e as minhas pernas começaram a tremer. Mas ele estava lá.
Como sempre, me segurando quando eu não conseguia ficar de pé e me
deixando ir quando ele sabia que eu precisava dele para isso. Ele era mais do
que apenas um abrigo. Aiden era a minha outra metade, meu igual. E ele não
precisava da estranha conexão Apollyon.

Aiden esperou, imóvel como uma estátua, paciente como nunca, até que
meus músculos destravaram, um por um. Então suas mãos desceram até
minha cintura e ele me virou para ele. Um instante passou e ele colocou os
dedos no meu queixo, inclinando minha cabeça para trás.

Abri os olhos, piscando para tirar a umidade dos meus cílios, e o ar


entalou na minha garganta. Hematomas sombreavam sua mandíbula. Havia
um corte na base de seu nariz. Sem dúvida, feridas que eu lhe tinha dado.

— Eu sinto muito, Aiden. — Minha voz falhou. — Eu não posso dizer o


suficiente. Eu sei, mas eu estou tão…

Ele baixou a cabeça e sua boca roçou a minha, silenciando as minhas


palavras. Meus lábios se abriram para os seus, como fez o meu coração e tudo
mais. O beijo doce e terno, bem, ele diminuiu o peso, aliviou um pouco da
culpa e vergonha. Minha pele - minhas entranhas - estavam raspadas e
doloridas, mas seu toque acalmou as pontas desfiadas. Eu imaginava que era
o mesmo para Aiden. Deuses, era provavelmente pior para ele, considerando
tudo o que eu tinha feito e dito. O que ele teve que fazer, teve que sacrificar,
para me manter segura.

O beijo se aprofundou, virando e torcendo minhas entranhas em uma


confusão agradável, e foi como a primeira vez que nos beijamos. Sensações
correram sobre a minha pele, meu coração cantou, e o sentimento
desfraldando na boca do meu estômago era melhor do que moldar akasha,
mais forte e mais viciante. Ele me beijou como se nunca tivesse esperado
fazê-lo novamente, como se ele pudesse de alguma forma me beijar por
semanas.

Eu coloquei minhas mãos em seus braços. Seus músculos flexionaram


debaixo delas quando ele me levantou e eu envolvi minhas pernas nele. O
desejo não era a única coisa entre nós. Havia muito mais: perdão, aceitação,
alívio e, mais importante, o amor.

Não era o tipo de amor que era impulsionado pela necessidade e que
destruía cidades e civilizações inteiras, mas o tipo que reconstruía, isso eu
sabia.

Mantendo um braço em volta da minha cintura, a outra mão enrolou meu


cabelo molhado. E nós não paramos de beijar, porque isso era certo e era
tudo que importava. Meu coração estava batendo muito rápido, mas foi
perfeito, foi como voltar para casa depois de nunca acreditar que eu seria
capaz de voltar.

Eu não sei como nós fomos para a cama ou se a água já estava desligada
no chuveiro. Mas estávamos juntos, nossos corpos escorregadios, nosso
cabelo molhado ensopando os lençóis onde estávamos emaranhados. E então
nós estávamos emaranhados, as pernas e os braços. Suas mãos estavam em
todos os lugares, prestando reverência às muitas cicatrizes em meu corpo.
Seus lábios acompanharam, e eu me adaptei mais aos músculos rígidos de
seu estômago, sentindo ele.

Olhei para meu corpo, surpresa ao ver as marcas do Apollyon brilhando


levemente à medida que giravam na minha pele, formando um símbolo raro e
depois outro.

— O quê? — Aiden segurou meu rosto, levando meus olhos de volta para
ele. — Isso está muito rápido? Eu deveria…

— Não. Não, são... são as marcas de Apollyon. Elas estão fazendo seu
trabalho agora.

— Eu deveria ficar preocupado?

Eu ri conscientemente, sentindo-me como uma dessas serpentes


venenosas que alertam para o seu veneno em suas cores vibrantes.

— Eu acho que elas gostam de você.

A mão de Aiden deslizou pela minha bochecha, minha garganta,


descendo abaixo do meu peito. As marcas deslizavam em direção a sua mão,
como se atraídas por ele. Talvez elas estivessem. Eu não tinha certeza de
como as marcas funcionavam. A resposta, provavelmente, estava na casa dos
milhares de anos de memórias, mas isso era como procurar por uma agulha
em uma pilha de agulhas.

— Eu as vi, — disse ele, sua voz rouca e profunda, e seus olhos como
piscinas de prata líquida. — Quando você Despertou, e quando você entrou
no Elixir. — Suas sobrancelhas se apertaram enquanto ele passava a mão
sobre meu quadril. — Elas eram bonitas.

— Sério? — Eu me senti bonita quando ele olhou para mim, mesmo toda
tatuada.

— Sim. Foi a coisa mais linda que eu já vi.

Um longo momento de agonia passou quando ele pairou acima de mim,


com os olhos nos meus, o seu corpo enrolado apertado como uma corda
pronta para arrebentar. E quando o fez, seus lábios encontraram os meus e
houve um som que veio do fundo de sua garganta e me queimou. Nossos
corpos se encontraram e por alguns momentos, nenhum de nós se moveu, e
então nós nos mexemos, nossas vozes suaves sussurros no quarto escuro.

Algum tempo depois, nós nos colocamos frente a frente, a sua mão em
volta da minha menor. Nossos corpos estavam pressionados. Exaustão me
perseguia agora, e a Aiden, também - há semanas. Os combates e tudo o mais
nos tinham desviado para a borda. Sono me pegou primeiro. Eu só sabia disso
porque eu podia sentir o olhar de Aiden na minha cara, e segundos antes de
eu adormecer, senti seus lábios na minha testa. Eu o ouvi sussurrar,

— Eíste pánta mou...

Você é o meu tudo.


Nove
Não importa o quão complicada a minha vida ficou, uma coisa
permaneceu consistente - meu cabelo parecia como se um bebê gambá
tivesse se refugiado nele, convidado alguns amigos e feito uma festa. Isso é o
que eu ganho por dormir com o cabelo molhado.

Eu fiz uma trança grossa e respirei fundo.

Evidentemente, eu tinha visto melhores dias. Bem, minha cara, pelo


menos. A maioria dos danos, eu tinha feito para mim. Aiden não tinha
levantado a mão contra mim o tempo todo que tínhamos lutado. Ele só se
defendeu. Mas estávamos ambos com sorte de estar de pé depois de enfrentar
Thanatos e as fúrias.

Meu reflexo estremeceu.

Aiden tinha ido embora na hora em que eu tinha me arrastado para fora
da cama. Eu queria ficar entre as cobertas, inalando seu aroma único de mar
e folhas queimando, segurando o travesseiro que ele tinha usado perto do
meu peito. Eu queria esperar lá até que ele voltasse, para que eu pudesse me
enrolar em volta dele, fazendo um replay de ontem à noite.

Mas a realidade não ia fazer uma pausa ou esperar por nós. Havia demais
para ser feito e eu precisava enfrentar todos. Eu dei um longo suspiro e
afastei-me do espelho. Olhar para a minha cara por horas não ia resolver
nada.

Eu encontrei o saco de roupas que eu trouxe comigo quando eu tinha


ficado na casa dos pais de Aiden e Aiden teve o bom senso de pegar quando
saímos da Ilha Divindade. Havia alguns itens de lá que eu não tinha
embalado ou notado antes - sendo um deles um uniforme de Sentinela. Isso
trouxe um sorriso ao meu rosto. Eu puxei uma calça jeans, surpresa ao
descobrir como ela estava folgada. Calçando um par de botas que era nada
como as de Olivia, eu fui até a porta e me encolhi. Olivia. Oh, queridos
deuses, eu tinha usado uma compulsão nela. Eu realmente esperava que ela
não estivesse ainda na cabana.

Eu rastejei pelo corredor silencioso, esfregando a contusão na minha


bochecha. Eu nem sabia em que mês estávamos. Tinha estado frio, mas não
congelando quando eu estava fora ontem. Inferno. Eu nem sabia onde eu
estava.

Agarrando no meio da minha trança, desci as escadas, brincando com


ela. Na parte inferior da escada, avistei um sentinela alto, com cabelo
castanho puxado em um rabo de cavalo baixo. Solos. Pelo que eu me
lembrava, eu não o tinha ameaçado com lesão corporal - pelo menos, não em
seu rosto.

Ele se virou.

— Bem, olha quem está de volta.

Meu rosto corou e eu parei no degrau, totalmente sem saber o que dizer.

Solos sorriu, e distorceu a cicatriz do corte profundo em sua bochecha.

— Eu não vou morder, pequena.

Calor percorreu o meu corpo e eu levantei meu queixo. Deuses, o que


havia de errado comigo?

— Bom. Porque eu mordo de volta.

— Isso é o que eu ouço. — Seus olhos azuis brilhavam. Agora eu corei por
toda uma nova razão. — Tenho certeza de que você está com fome. Você
dormiu por quase um dia inteiro. Todo mundo está na cozinha agora.

Meu estômago roncou com o pensamento de alimentos, mas, em seguida,


azedou.

— Não há talheres afiados ou algo assim?

A risada de Solos foi profunda e rica.

— Não. É uma noite de comida pronta, então você está com sorte.

Encontrando a minha coragem, eu o segui pelo corredor. Ele foi até a


cozinha primeiro e eu espreitei ao virar o corredor. Deacon e Luke sentavam
de um lado, várias caixas de comida chinesa espalhadas na frente deles.
Laadan estava ao lado deles. Marcus, Lea e Olivia estavam do outro lado da
mesa. Eu não tinha ideia de onde estava Aiden.
— Temos companhia — Solos anunciou, pegando um desses bolinhos
deliciosos e estourando-o em sua boca.

Todos se viraram. E todo mundo parou de comer e olhou.

Eu soltei a minha trança e dei ao grupo o cumprimento mais estranho de


sempre.

— Oi.

Luke baixou os pauzinhos em seu macarrão. Havia um hematoma


desagradável ao lado de seu rosto, desaparecendo em seu couro cabeludo.

— Eu fiz isso? — Entrei na cozinha. — O hematoma?

— Sim, — ele disse lentamente. — Quando você me bateu na parede...


sem me tocar.

Estremeci.

— Eu realmente sinto muito sobre isso.

— Ah, não se preocupe com isso. — Deacon sorriu quando ele se inclinou
para trás em sua cadeira, balançando-se sobre duas pernas. — Ele está bem.

— Meu ego não está. — Ele atirou ao irmão de Aiden um olhar obsceno. —
Ela nem me tocou.

Deacon deu de ombros.

— Bem, ela é a Apollyon. Duh.

Uma cadeira raspou sobre o azulejo e minha cabeça virou na direção do


som. Marcus caminhou ao redor da mesa e parou na minha frente. Agora, eu
tinha ameaçado um pouco de seu rosto, mas ele ainda lutou ontem, como
tinha feito Solos.

Eu me senti horrível.

Marcus colocou as mãos sobre meus ombros. Havia um pequeno tremor


nelas.

— Alexandria...
Meu tio sempre se recusou a me chamar pelo meu apelido e eu sempre lhe
chamei de reitor, devido a sua posição no Covenant, mas as coisas... as
coisas eram diferentes agora.

— Marcus?

Houve um momento muito conciso, e então ele me envolveu em um


abraço feroz. Pela primeira vez, não foi um abraço estranho e fraco com os
braços presos para fora, ao meu lado. Eu o abracei de volta com força e
lágrimas queimando na parte de trás da minha garganta.

Marcus e eu... bem, nós percorremos um longo, longo caminho.

Quando ele se afastou, eu reprimi um suspiro. Aqueles olhos cor de


esmeralda eram normalmente gelados, mas eles não estavam gelados agora.
Era como olhar nos olhos de minha mãe.

Ele respirou fundo.

— Fico feliz em ter você de volta.

Eu balancei a cabeça, engolindo.

— Estou contente por estar de volta.

— Inferno, todos nós podemos concordar com isso. — Luke pegou um


donut. — Não há nada mais assustador do que ter um Apollyon psicótico
enjaulado no porão.

— Ha, — eu disse.

Luke piscou e, em seguida, jogou o donut para mim. Eu o peguei. Voou


açúcar por toda parte.

— Ou esperar por ela se soltar e cometer loucuras, — acrescentou Deacon


quando eu dei uma mordida. Ele olhou por cima da mesa. — Ou esperar
alguém, sem mencionar nomes, não nos escutar e ir dizer oi.

As bochechas de Olivia avermelharam enquanto ela se levantava. Ela se


aproximou lentamente, esperando que eu terminasse de mascar. Eu comecei
a pedir desculpas.

— Eu realmente sinto muito…


Ela me socou no estômago. Forte. Eu dobrei, ofegando por ar.

— Deuses.

Solos e Marcus deram um passo adiante, mas eu acenei minha mão para
eles.

— Tudo bem. Eu merecia isso.

Então eu percebi que eles não estavam se movendo para me proteger,


mas para proteger Olivia. Imaginei que ninguém estava cem por cento
relaxado em torno de mim. Acho que eu não poderia culpá-los quando eu
possuía a arma mais poderosa na terra, e apenas um dia atrás eu estava
disposta a usá-la contra eles.

— Você totalmente mereceu isso. — A voz de Olivia balançou. — Você


sabe como eu me senti horrível quando Marcus desceu e encontrou-me
sentada ali como uma bosta? Eu ajudei você a escapar!

Eu pensei que ela poderia me bater de novo, então eu dei um passo para
trás.

Olivia alisou as mãos sobre os cachos.

— Mas eu estou melhor agora, especialmente por que pude bater em você.
— Então ela saltou para frente e me abraçou.

Permanecendo lá, eu a afaguei de volta, esperando que ela não mudasse


de opinião e tirasse minha medula espinhal.

— Eu realmente sinto muito.

— Eu sei. — Ela se afastou, sorrindo. Seus olhos estavam enevoados.

Laadan estava ao lado. A beleza de cabelos negros estava elegante como


sempre. Vestida com um casaco de gola vermelha e calça branca, ela me
envolveu em um abraço caloroso. Ela cheirava a rosas na primavera e
quando ela recuou, eu não queria deixá-la ir.

— Nós vamos conversar mais tarde. Prometo. — ela disse, e eu sabia que
ela estava falando sobre meu pai. Pegando minha mão, ela me puxou para o
lugar vazio ao lado de Olivia. — Sente-se. Coma.
Olhando pela mesa, vi um prato de plástico passando, cada pessoa
derramando uma porção de comida nela. Mesmo Lea, que não tinha dito uma
palavra para mim, no entanto, colocou alguns camarões no prato. Quando
chegou em mim, minha boca encheu de água, mas eu tinha de dizer alguma
coisa primeiro.

— Gente, eu realmente sinto muito por tudo. — Olhei para o meu prato,
mas forcei meus olhos de volta. — Eu sei que era um terror e eu desejo... eu
desejo que nenhum de vocês tivesse que passar por isso.

Marcus voltou ao seu lugar.

— Nós sabemos que você não era você, Alexandria. Nós compreendemos.

Ao lado dele, Lea pigarreou.

— Na verdade, eu preferia a versão louca Apollyon à elixiriazada, para ser


honesta. — Ela olhou para mim, cílios grossos escondendo olhos de ametista.
— Era uma loucura ver você se escondendo atrás de Aiden.

— Você estava muito diferente, — Luke concordou, e então estremeceu.


— Cara, o Elixir não é brincadeira.

— Você se escondeu em um armário, — Deacon sentiu a necessidade de


me informar.

Cutucando meu macarrão, eu fiz uma careta, quando fragmentos de meu


tempo no Elixir deslizaram no lugar.

— Eu aposto que foi divertido de assistir.

— Eu não sei se eu diria que foi divertido, — uma nova voz acrescentou.

Minha cabeça virou e meu coração caiu sobre si mesmo. Aiden estava na
porta da cozinha, vestido como sempre - como um Sentinela. Ele caminhou
até a mesa e pegou o maço de arroz integral. Ele encostou-se ao balcão, a
curva de sua mandíbula forte, olhos como pedra.

Eles encontraram os meus. Ele apontou para o meu prato com o seu
maço.

— Coma. Você precisa comer.


Todos olharam para seus pratos quando eu peguei o garfo que eu não
tinha percebido que tinha deixado cair. Eu ousei uma olhada para Aiden
enquanto eu girava meu garfo em torno do macarrão. Ele estava assistindo,
sempre observando.

Deacon me ofereceu um par de pauzinhos.

— Você não deveria estar usando um garfo.

Eu atirei-lhe um olhar brando.

— Eu pareço saber usar os pauzinhos?

Ele sorriu.

— Poser.

— Punk — Retorqui.

Ele revirou os olhos.

— Não é tão difícil assim. Aqui, deixe-me te mostrar.

A improvisada lição de Deacon de como usar os pauzinhos e meu fracasso


absoluto em dominá-los aliviou a tensão estranha em volta da mesa. Rindo,
eu desisti quando Aiden finalmente ordenou a seu irmão para me deixar
comer em paz.

Me envolvendo, eu escutei a conversa em torno de mim. Não falaram de


nada importante e eu percebi que eles estavam esperando que eu terminasse
de comer antes da conversa real acontecer.

Eu terminei tudo o que tinha sido dado, comi o arroz restante que Aiden
tinha despejado no meu prato quando ele rondava em torno da mesa, em
seguida, acabei com bondade açucarada que eram os donuts.

De estômago cheio, eu me inclinei para trás em minha cadeira e suspirei.

— Isso deu pro gasto e mais um pouco.

Olivia deu um tapinha no meu estômago.

— Você precisava disso... e provavelmente alguns Big Macs, também.


Meus olhos se arregalaram.

— Mmm, Big Macs... Por favor, me diga que há um McDonalds por aqui?
Na verdade, onde eu estou?

Todo mundo ficou em silêncio e ninguém olhou para mim.

— O quê? O que foi? — Sentei-me, olhando ao redor da mesa. E então eu


entendi. — Vocês não confiam em mim, não é?

Lea foi a primeira a encontrar meus olhos.

— Okay. Vou chover neste desfile feliz. Como sabemos que você ainda
não está conectada ao Seth?

— Ela não está. — Aiden disse, pegando as caixas vazias e jogando-as em


um saco de lixo preto que carregava. — Confie em mim, ela não está mais
ligada a ele.

Deacon bufou.

Eu olhei para ele.

Lea recostou-se na cadeira, cruzando os braços.

— Existe alguma outra prova concreta, além de você dizendo para


confiar em você?

Aiden olhou para mim e eu rapidamente desviei o olhar. Eu duvidava que


Lea quisesse ouvir sobre esse tipo de prova.

— Eu não estou ligada ao Seth. Eu prometo a você.

— Promessas são fracas, você poderia estar fingindo, — ela disparou de


volta.

— Lea, querida, ela não tem motivos para fingir. — Laadan sorriu
gentilmente. — Se ela estivesse ligada ao Primeiro, ela não estaria sentada
aqui.

— E meu irmão não estaria limpando nossa bagunça, certo? — Deacon


caiu para trás, como se tivesse acabado de lhe ocorrer que Aiden tinha estado
a segundos de distância da morte. Eu queria me esconder debaixo da mesa
quando Deacon sacudiu a cabeça, aturdido. — Deuses, nós teríamos que ter
uma empregada ou algo assim.

Aiden deu um tapa na nuca de Deacon quando ele passou.

— Eu sinto o amor.

Seu irmão inclinou a cabeça para trás, rindo.

Respirando, levantei-me e apertei as costas da minha cadeira.

— Eu não estou ligada a ele e tenho certeza que ele não pode passar
através dos escudos. Mas sei que ele está lá. Eu posso senti-lo.

Aiden parou e se virou para mim.

Opa, melhor esclarecer isso.

— Quer dizer, eu posso senti-lo, mas ele não pode me atingir, não
realmente. Há apenas um zumbido de baixo nível. Nada como antes. Ele não
pode chegar até mim. Tenho certeza.

— Quanta certeza? — Perguntou Marcus, trabalhando a garganta.

Eu balancei a cabeça e dei um suspiro.

— Olha, eu não posso dizer que alguma coisa esquisita não vai acontecer.
Eu não sei o que ele é realmente capaz de fazer, mas vai ser realmente difícil
passar por esses escudos.

— Você vai ficar bem, — disse Aiden. Amarrando o saco de lixo, os


músculos aparecendo em seus braços. — Ele não vai romper.

Forçando um sorriso, eu sabia que Aiden acreditava nisso.

— E vocês saberão quando acontecer. Eu acho que não tenho paciência


para tentar enganar ninguém.

Luke soltou uma risada curta.

— Bem sei.

— Vamos levar a conversa para um lugar mais confortável, então. —


Marcus ficou de pé, segurando o copo do que eu assumi que era vinho. Eu
olhei para o cristal com saudade. — Tenho certeza que todos nós temos um
monte de perguntas.

O grupo seguiu Marcus, mas eu fiquei para trás. Pegando as latas vazias,
levando-as para o caixote de lixo onde Aiden estava colocando um saco
limpo dentro.

— Você limpando? — Ele perguntou, encaixando o saco para a lata. —


Isto é inesperado.

— Eu sou uma nova garota. — Despejei as latas. — Você está bem?

Aiden enganchou um dedo no cinto da minha calça e me conduziu para a


pia. Então, ele arregaçou as mangas, abriu a torneira e pegou o sabão.

Revirei os olhos, mas coloquei as mãos sob a água morna.

— Aiden?

— O quê? Você está com as mãos pegajosas e está tocando tudo. — Ele
esguichou o sabão em minhas mãos. — Você vai deixar impressões digitais
em todo o lugar.

Vi minhas mãos desaparecerem debaixo das suas e meio que esqueci o


que eu estava perguntando. Quem saberia que lavar as mãos poderia ser tão
perturbador...?

— Você está preocupado com o CSI visitar o lugar?

— Você nunca sabe.

Eu o deixei terminar, porque quem era eu para parar o seu TOC, no


momento, então eu sequei minhas mãos.

— Não foi isso que eu quis dizer. Você está bem?

— Você está?

Eu fechei minhas mãos recentemente limpas em punhos.

— Sim, eu estou bem. Responda à minha pergunta.

Ele inclinou a cabeça para o lado.


— O que quis dizer antes de ser capaz de sentir Seth?

Então era isso que tinha o deixado de repente tenso?

— Você sabe como é quando você está em uma casa com uma TV no
mudo? Há aquela frequência que você pode estranhamente sentir? — Quando
ele acenou com a cabeça, sorri. — É assim. Ele só está lá, mas ele não pode
me alcançar.

Houve uma pausa.

— Você está tendo alguma dor de cabeça?

Confusa, eu balancei minha cabeça.

— Não. Por que você pergunta?

— Nada, — disse ele, e ele sorriu. — E eu estou bem, Alex. Eu sou a


última pessoa com quem você deve se preocupar.

— Mas eu me preocupo. — Havia tanta coisa para me preocupar.


Voltando-me para a geladeira, eu me estiquei até pegar uma garrafa de água.
Quando eu consegui pegar uma, apareceu outra garrafa, mas era diferente.

O conteúdo tinha sido esvaziado e substituído com um líquido azul


vibrante.

A respiração afiada de Aiden foi como uma lufada de ar frio.

— Alex…

Ignorando-o, deixei minha garrafa e estendi a mão para pegar a outra.


Mãos tremendo, eu passei meus dedos em torno do plástico. Eu sabia o que
estava na garrafa. Eu sabia o que uma inofensiva cheirada por dentro levaria
um aroma doentiamente doce e poderia me roubar de quem eu era em
minutos.

Aiden xingou sob sua respiração.

Diante dele, eu segurei a garrafa.

— Isto é o Elixir, não é?


Sua mão apertou a seu lado.

— É.

Olhei para a garrafa de água. Dois medos na vida: perder-me a Seth e


perder-me ao Elixir. Ambos tinham acontecido, e de alguma forma eu voltei
para fora desses buracos de coelho. Mas segurando-o em minhas mãos, eu
não podia negar o gosto cru da construção do medo no fundo da minha
garganta.

Era como segurar uma bomba - uma bomba projetada para decompor
minha mente.

Aiden parecia como se quisesse arrancá-lo das minhas mãos, e eu dei um


sorriso fraco.

— Devemos ficar com ele?

— O quê? — Tensão saiu dele, e algo mais. Nojo? Os pedaços de memórias


de quando eu estava sob o Elixir não eram bonitos.

— E se a gente precisar dele novamente? — eu perguntei, lutando contra


o nódulo frio na minha garganta. — Não é por isso que você... todos vocês o
mantiveram?

— Não. Eu coloquei lá e esqueci. — Então ele tirou-o das minhas mãos.


Movendo-se rigidamente, ele levou de volta para a pia e abriu a tampa.

— Aiden?

Sem dizer uma palavra, ele jogou o que restava do Elixir. Doçura encheu
o ar, indo embora quando ele abriu a torneira. Eu esperava que ele não
estivesse cometendo um erro.

Eu coloquei minha mão em seu braço.

Seus músculos tencionaram quando me tocou, colocando as pontas dos


seus dedos no meu queixo, mas antes que pudesse fazer qualquer coisa,
alguém limpou a garganta atrás de nós. Eu me virei, vendo Solos na porta.

— Só garantindo que vocês dois estão bem, — disse ele, uma sobrancelha
arqueada.
Uma onda de vergonha e culpa bateu no meu estômago.

— Eu não vou matá-lo e esconder o corpo na geladeira.

— É bom saber, — Aiden murmurou.

— Uma pessoa nunca pode estar muito segura. — Solos articulou. —


Andem logo, crianças, as pessoas estão ficando impacientes.

Eu suspirei.

— Deuses, eu meio que sinto falta de Apolo. Pelo menos ele não achava
que eu queria matá-lo.

— Sim, bem, sobre isso...

Eu enfrentei Aiden lentamente, lembrando que Aiden tinha de alguma


forma proibido Apolo.

— O que você fez? Você baniu ele, certo? Como? Por quê?

Suas sobrancelhas arquearam.

— Eu não tenho certeza se você vai realmente querer saber o que


provocou isso.

Cruzando os braços, eu esperei.

Aiden inclinou a cabeça para o lado, apertando a mandíbula.

— Apolo não foi completamente honesto sobre um monte de coisas, ou


seja, como um Apollyon pode ser morto.

Eu tinha um mau pressentimento sobre isso.

— Apolo pode matá-la, Alex. Ele estava planejando fazê-lo se eu te tirasse


do Elixir e você se conectasse com Seth novamente. E seja quem for o
responsável por Seth pode fazer o mesmo, mas parece que o deus possa estar
trabalhando com eles. — Ele fez uma pausa, fazendo uma careta. — Então,
eu bani Apolo da casa.

Meu estômago embrulhou. Sim, talvez eu devesse ter esperado pela


explicação até depois da minha comida ser digerida.
Dez
Depois que eu forcei Aiden a jogar essa pequena bomba, fomos para a
grande sala de estar. Eu estava entorpecida. Apolo podia me matar? Apolo
queria me matar? Então, por que ele tinha aparecido e chutado a bunda de
Thanatos? Deuses, por que eu estava tentando ser lógica sobre isso? Apolo
era um deus. Quem sabia o que eles pensavam?

Sentei-me ao lado de Deacon e decidi empurrar o problema Apolo de lado


por enquanto.

— Ok, eu posso começar com algo pequeno? Qual é a data de hoje?

Marcus encostou-se em uma mesa. Percebi, então, que estava de calça


jeans e eu não conseguia pensar em uma época em que eu já tinha o visto
tão casual.

— Hoje é 5 de abril.

Piscando algumas vezes, eu me sentei. Um mês... Eu basicamente perdi


um mês inteiro. Deuses, o que estava acontecendo no mundo fora desta
cabana? Eu limpei minha garganta.

— E onde eu estou? Se isso faz você se sentir melhor, você pode me dizer
o estado.

— Apple River, — disse Aiden, vigiando pela janela grande.

Eu cruzei os braços, o que machucou um pouco.

— Ok, eu sei que você tem que estar inventando esse nome.

Um leve sorriso se formou nos lábios de Aiden.

— É real. Você está em Illinois.

— Illinois? — Meu cérebro estava preso no nome Apple River sendo real.

— E é tão vazio e chato como parece, — disse Deacon, inclinando a


cabeça para Luke. — E realmente afastado. Eu estive fora uma vez.
Assustador. Lenhadores, é dizer o suficiente.
Solos arrastou os pés.

— Esta é a cabana de caça do meu pai - uma de muitas - e não é tão


assustador.

Eu balancei a cabeça lentamente.

— Tudo bem. Então, e os deuses? Quantos deles estão lá fora irritados


agora?

— Todos eles. — Marcus riu, balançando o conteúdo de seu copo. O


sorriso rapidamente deixou seu rosto. — Todos eles, Alexandria.

— Nós não vimos muitos dos deuses, exceto Hefesto que reforçou as
barras, — disse Lea, estudando as unhas. — Ele era um pouco assustador.

Eu imaginei que tinha estado desmaiada quando ele se mostrou.

— Eu não posso acreditar que Apolo me bateu com um raio de deus.

— Eu não posso acreditar que Aiden deu um soco nele, — disse Marcus
derrubando o resto de seu vinho.

— O quê? — Minha boca caiu aberta. — Você não fez isso.

O meio sorriso espalhou-se até que uma covinha apareceu em sua


bochecha esquerda.

— Eu fiz.

— Todas as vezes que você gritou comigo por bater em pessoas, e você
acertou um deus? — Eu não podia acreditar.

Esse meio sorriso se transformou em um sorriso cheio.

— Esta era uma situação diferente.

Oh. Okay. Balançando a cabeça, eu segui em frente.

— Tudo bem, tem havido mais ataques como... como o que aconteceu
com o Covenant?

Laadan olhou para mim.


— Ele... ele não lhe disse?

Eu imaginei que por ‘ele’, ela queria dizer Seth.

— Eu não tenho certeza. Ele me manteve fora de um monte de coisas.

— Exceto por dizer a você que eles estavam trabalhando com daimons, —
ela disse, e eu assenti. Ela olhou para Marcus e suspirou. — Muita coisa está
acontecendo lá fora, querida. E pouco disso é bom.

Me preparando para o pior, eu passei meus dedos em torno da rosa de


cristal.

— Diga-me.

— Nós realmente não temos que lhe dizer. — Lea pegou um controle
remoto fino e virou, apontando para uma tela plana na parede. — Nós
podemos apenas lhe mostrar.

Lea pegou uma das estações de notícias em todo o país. Eu não achava
que haveria qualquer coisa acontecendo neste instante, mas aparentemente
tanta coisa tinha acontecido que estava sempre nas notícias.

Uma imagem de edifícios destruídos e carros tombados estava sendo


transmitida na tela. Isto era Los Angeles. Há três dias, houve um terremoto
catastrófico, um de magnitude 7,0. Um dia depois, outro tinha atingido o
Oceano Índico, provocando um tsunami destrutivo que tinha eliminado uma
ilha inteira.

E havia mais.

Incêndios florestais devastadores atormentavam o Centro-Oeste e partes


da Dakota do Sul, perto da Universidade. Imaginei que os autômatos de
Hefesto tinham algo a ver com isso, considerando que respiravam bolas de
fogo ou qualquer outra coisa. Houve várias brigas no Oriente Médio. Vários
países estavam à beira da guerra.

Rolando ao longo da parte inferior da tela estava o anúncio de uma


notícia - atividade sísmica começou abaixo do Monte St. Helens. Os temores
de uma erupção vulcânica tinham feito pessoas fugirem para as cidades mais
próximas.
Santos bebês daimons...

O jornalista estava entrevistando um fanático apocalíptico.

Sentei-me de volta, absorvendo, horrorizada com o que estava


acontecendo. Tudo isso por causa de Seth - e eu - e havia tantas vidas
inocentes que foram perdidas, muito mais que estavam em jogo. Havia uma
boa chance de eu vomitar macarrão por todo o chão.

Lea desligou a TV.

— Os deuses são responsáveis por tudo isso? — eu perguntei.

Laadan assentiu.

Cara, os deuses estavam putos.

— Há mais, — disse ela suavemente, e um riso louco borbulhou na minha


garganta. Como poderia haver mais? — Muitos sentinelas foram mortos por
Lucian... por seu exército. E muitos puros-sangues simplesmente
desapareceram. Aqueles que alcançaram os Covenants estão se segurando
fortemente, mas ninguém está a salvo. Depois, há as ocorrências com os
mortais que se parecem com ataques de animais selvagens, mas acreditamos
que eles sejam o trabalho dos daimons. Parece que eles estão tentando
provocar os deuses.

Em algum momento, Aiden tinha se mudado para ficar atrás do sofá.


Suas mãos estavam na parte de trás da almofada. Sua presença era
reconfortante, mas fiquei chocada por dentro. Apolo poderia ter aparecido na
minha frente e feito uma dança pelado e eu não teria piscado um olho. Seth
não tinha mencionado nada disso, mas Aiden tentou me dizer, enquanto eu
estava na cela.

E eu lhe disse que não me importava.

Eu comecei a ficar de pé, mas minhas pernas não cooperaram.

— É muito para engolir, hein? — Luke disse, enquanto olhava para suas
botas pretas. — O mundo foi para a merda em cerca de um mês.

— Não é tarde demais. Os deuses estão nos mostrando o que eles querem.
— Lea soava muito madura para ser a garota que eu tinha jogado uma maçã
a alguns meses atrás. — Eles querem Seth morto.

Eu sabia que não era tanto o caso. Eles queriam um de nós mortos, de
preferência antes de nos juntarmos. Tentei pensar em algo útil. Depois que
eu tinha Despertado, eu aprendi a história de todos os Apollyons, mas nada
disso era útil. Nada disso, exceto algo com Solaris...

— Isso não é tão simples como matar Seth. — Solos coçou a barba em seu
queixo. — Há o problema de chegar perto. Dionísio disse que Lucian tinha
muitos Sentinelas e guardas, principalmente mestiços.

Dionísio? Como no mundo ele tinha vindo parar na cena? Não era ele o
deus dos bêbados ou alguma coisa assim?

— E se chegarmos muito perto - se Alex chegar muito perto, então... — A


voz de Marcus sumiu.

Então ele iria levar o meu poder, possivelmente até me drenar, porque
agora eu não tinha certeza de que poderia parar Seth mesmo se ele quisesse.
Não importa o que ele disse para mim enquanto estávamos conectados, eu
não poderia confiar em suas promessas, seu discurso de vendas, porque eu
realmente não acreditava que Seth sabia o que estava fazendo.

Coloquei-me de pé então, porque eu não poderia sentar mais.


Caminhando para a janela, olhei para a paisagem sombria enquanto torci o
colar entre os dedos. A noite tinha caído e, mesmo com minha visão super
aguçada, as árvores eram escuras e ameaçadoras. Meu reflexo olhou para
mim, pálido e estranho. Isto era eu - Alex, bochechas levemente
arredondadas e lábios largos. Com exceção dos olhos esquisitos cor de âmbar,
eu parecia a mesma.

Mas eu me sentia diferente.

Havia uma quietude em mim que nunca tinha estado lá antes. Eu


realmente não sabia o que significava ainda.

— Então, o que vamos fazer? — Luke perguntou. — Esconder Alex para


sempre?

Meus lábios torceram em um sorriso triste. Isso não ia funcionar.

— Eu poderia concordar com isso desde que alguém traga um DS ou Wii,


— brincou Deacon, mas ninguém riu. — Ou não...

Houve uma pausa e, em seguida, Lea disse:

— Por favor, pelos deuses, me diga que você não é ainda contra matar
Seth.

— Agora não é provavelmente a melhor hora para ir lá, — disse Marcus.

— O quê? — Eu ouvi ela se levantando, e sua raiva explodiu na sala. —


Alex, você tem que compreender, especialmente depois de tudo que ele fez
com você.

— Lea, — Aiden estalou, finalmente se envolvendo na conversa.

— Não, — Lea disse. — Seth tem que morrer e Alex é a única pessoa que
pode fazer isso!

Soltando o colar, eu enfrentei eles.

— Eu sei... ele precisa ser lidado. Eu entendo isso.

Todos, incluindo Aiden, olharam para mim. Ele começou a falar, mas
fechou a boca. Verdade seja dita, eu detestava a ideia de matar qualquer
coisa neste momento. Não quer dizer que eu não faria isso quando
enfrentasse um daimon novamente, e mesmo que Seth tenha sido um real
idiota sobre as coisas, eu sabia que no fundo ele não era nada mais do que
um menino mal amado que queria aceitação. E sim, ele tinha um vício
grande com Akasha, mas ele era uma vítima de tudo isso, também. A única
pessoa que eu provavelmente desfrutaria eliminar, só um pouco, era Lucian.
Sim, eu poderia aceitar isso.

Mas chegar a Lucian não iria acontecer.

— Alex, — Marcus disse baixinho.

Eu respirei, incapaz de colocar adiante as palavras necessárias para o que


precisava ser dito.

— O que vamos fazer? — Olhei para Aiden e Solos. Eles eram os


Sentinelas qualificados aqui. Era hora para algumas estratégias de batalha, o
que não era o meu forte, porque eu era mais uma lutadora do tipo ‘correr
para as coisas com a cabeça e derrubar uma parede’. — Temos que deter Seth
e Lucian, mas não podemos simplesmente ir até eles. Precisamos ser capazes
de chegar perto sem que eles saibam, e nós – eu preciso saber como combater
Seth sem transferir meu poder para ele.

Aiden parecia que não tinha gostado de ouvir isso, mas ele se virou para
Solos e assentiu.

— Apolo disse que pode demorar alguns dias para voltar, mas ele pediu
que não tirasse as proteções até que ele pudesse vir até nós. Essas proteções
os impedem de nos encontrar, e agora elas são a única coisa que impede os
deuses de nos encontrar.

— Como é que Thanatos me encontrou? — Eu perguntei, curiosa.

— Você foi para fora, além das proteções, — disse Aiden. — Esperamos
que Apolo possa nos dizer mais quando ele retornar.

— Então, vamos esperar aqui até ele retornar e não fazer nada? — Lea
caiu contra a almofada, cruzando os braços. Um olhar petulante atravessou o
seu rosto.

— Nós não sentamos e fazemos nada, — disse Solos, olhando para a


menina. — O que precisamos fazer é treinar e nos preparar para o que... para
o que está vindo. Isso é o que Apolo queria.

Porque algo estava vindo, e era uma guerra.

— Esperamos que Apolo possa convencer os deuses a saírem de cena, —


disse Aiden, mexendo a mandíbula. — Neste momento, precisamos dos
deuses do nosso lado.

— Concordo, — metade da sala disse.

Esperança cintilou no meu peito.

— Vocês acham que eles vão parar isso de... Apocalipse-zumbi-prestes-a-


acontecer, se eles perceberem que eu estou de volta à equipe dos Não-
Insanos?

Ninguém parecia esperançoso, mas Aiden sorriu para mim, e eu sabia que
ele tinha feito isso para me fazer sentir melhor, porque era o que eu queria
ouvir. Precisei de muito para não cruzar o quarto e pular em cima dele.
Prioridades, Alex, prioridades...

Todos concordaram em começar o treinamento assim que possível. E isso


fazia sentido. Lutar não era como andar de bicicleta. Músculos
enfraqueciam, reflexos desaceleravam. Honestamente, nós não tínhamos
outra escolha. Que bom que nenhum outro deus apareceu, servindo alguma
boa e velha ira de Deus.

Sentei-me na ponta do sofá e comecei a brincar com a rosa de novo. Eu


sabia que todo mundo estava esperando para ouvir os planos que Seth tinha
compartilhado comigo. Eles iriam se decepcionar.

— A única coisa que Seth me contou foi sobre os daimons, e ele sabia que
eu tinha dito a Aiden depois. Eu não acho que ele estava muito preocupado.
Ele realmente não me disse mais nada. Os planos que ele... os planos que
fizemos foram sobre libertar o meu pai.

Os olhos de Laadan se umedeceram, e eu esperava que pudéssemos


conversar em breve. Havia tanta coisa que eu tinha que perguntar a ela.

Solos nem sequer tentou esconder o seu descontentamento.

— Bem, isso não é realmente útil.

— Isso não é culpa dela, — Aiden atirou de volta.

O Sentinela abriu um sorriso distorcido.

— Acalme-se, Garoto Apaixonado.

Minha boca se abriu para negar que Aiden era o meu garoto apaixonado.
A resposta foi imediata, inerente a minha natureza. Eu forcei minha boca
para ficar fechada antes que pudesse dizer qualquer coisa. Todos nesta sala
já sabiam que Aiden e eu estávamos juntos juntos. Inferno, todos no mundo
provavelmente já adivinharam, cortesia do anúncio de Lucian antes de Seth
explodir o Conselho, o que tinha feito de Aiden o Inimigo Público Número
Dois.

Era estranho ser tão aberta sobre isso - não estranho de uma maneira
ruim, mas algo que iria levar um pouco de tempo para me acostumar. Eu não
era o segredinho sujo de Aiden.
Eu nunca tinha sido seu segredinho sujo.

Deacon riu.

— Oh, você está tão próxima de ser a próxima pessoa a ser atingida.
Estou colocando dinheiro nisso.

— Você precisa se adicionar a essa lista. — Aiden parecia 70% sério.

— E eu estou colocando dinheiro nisso, — Luke adicionou.

Eu me atirei para a frente, segurando meus joelhos.

— Eu me lembro de uma coisa! Não é grande, mas Seth estava se


dirigindo para o norte. Ele provavelmente está indo para o Catskills.

— Isso é algo para seguir. — Marcus olhou para o vidro, como se ele não
conseguisse entender como estava vazio. — Ele não vai alcançar isso. Não
com os Khalkotauroi cercando o lugar.

Olivia estremeceu.

— Você acha que eles realmente podem detê-lo?

— Eles vão atrasá-lo. — Marcus se empurrou para fora da mesa, indo para
a porta. — Mais alguém necessita de bebidas?

— Você compartilha? — Deacon se animou.

Surpreendentemente, Aiden não o repreendeu. Talvez um menor de idade


bebendo um pouco de vinho no momento não fosse nossa maior
preocupação. Nosso grupo se dispersou, alguns seguindo Marcus na corrida do
vinho. Só depois que eles terem saído eu percebi que o reitor do Covenant
estava fornecendo álcool para menores.

Esse realmente era um universo alternativo.

Depois de alguns minutos, era apenas Aiden e eu. Ele se sentou ao meu
lado, exalando um longo suspiro.

— Você está bem?

Me perguntando quantas vezes ele ia perguntar isso em 24 horas, eu me


virei para ele.

— Eu estou bem, realmente.

Parecia que ele ia dizer alguma coisa, mas se inclinou e beijou minha
testa em vez disso.

— Eu estou indo verificar as redondezas.

— Vou com você.

— Fique aqui e tenha calma, Alex. Somente esta noite, ok?

Eu senti a necessidade de fazer beicinho.

— Você não deveria ter que fazer isso sozinho.

— Eu não vou. — Ele abriu um sorriso. — Solos vai estar comigo.

— Ele não estava com você antes. Isso é o que você estava fazendo
quando todo mundo estava comendo, certo? Verificando as redondezas,
certificando que daimons não irão aprontar com a gente?

— Eu duvido que haja qualquer daimon aqui fora.

Mas ele ainda estava patrulhando, porque é isso o que Sentinelas fazem, e
eu pensei sobre como ele estava disposto a deixar esta vida... deixá-la por
nós. Eu aposto que, se nós vivêssemos em um lugar como Apple River, ele
ainda verificaria o quintal toda noite. O pensamento me trouxe um sorriso
aos lábios.

— Eu senti falta de seus sorrisos, — disse ele levantando.

Eu olhei para cima, querendo pegar sua mão e fazê-lo ficar.

— Eu vou ficar aqui esperando.

— Eu sei.

Ele me olhou estranhamente e depois saiu, e eu estava sozinha...


sozinha, exceto pelo zumbido baixo na parte de trás da minha cabeça. Eu
tentei não prestar atenção nele, porque simbolizava um caminhão de
problemas potenciais. Esse maldito zumbido significava que Seth ainda
estava lá, e eu não sabia o que realmente significava em termos de ele entrar
em contato comigo.

Olhando pela janela, eu respirei, mas o ar ficou preso. Será que Seth
poderia me alcançar? Eu seria capaz de lutar contra o que ele queria? Se eu
fosse capaz, eu poderia de alguma forma discutir com ele? Ou será que eu só
me perderia de novo, e desta vez não haveria volta para mim? Uma dor
perfurou meu peito.

Incapaz de pensar sobre isso sem parar, peguei o controle remoto e liguei
a TV. A notícia ainda estava focada no terremoto terrível em Los Angeles e
no desenvolvimento da história do Noroeste do Pacífico.

Compreendendo a destruição que os deuses estavam causando, eu só


sabia uma coisa - e doeu de uma forma que não deveria ter doído, de uma
forma que eu não conseguia explicar. Seth tinha que morrer, mas eu não
tinha ideia de como fazer isso... ou se eu realmente poderia, quando chegasse
a hora.
Onze
Eu fiquei na frente da TV durante toda a noite, cansada mas não
sonolenta. Aiden desmaiou na cadeira ao lado do sofá por volta das três da
manhã. Eu duvidava que ele estivesse bem em ter que deixar o meu lado por
longos períodos de tempo. Eu não sabia se ele estava preocupado que eu
virasse a Alex má novamente, ou se ele só precisava estar perto de mim. De
qualquer maneira, eu estava confortada por seus roncos suaves. Eu acho que
ele estava esperando que eu desistisse da minha fascinação mórbida com as
notícias, mas não o fiz.

Cada apresentador tinha algo diferente a acrescentar. Mais fotos


jorravam de todo o mundo. Mortais saíam às ruas de Los Angeles, com
tumultos e saques, mas no Oriente Médio, eles caíam de joelhos nas ruas e
oraram.

Agarrando o controle remoto até que meus dedos doessem, eu tentei -


realmente tentei - imaginar como seria ser esses mortais. Ser pego em algo
muito maior do que eles, enquanto não tinham nenhuma ideia de que, a
qualquer segundo, tudo poderia ser tirado para bem longe deles.

Eu tinha mais em comum com eles do que eu percebi.

Isso realmente parecia o fim do mundo. Nenhum mortal poderia explicar


as séries de eventos catastróficos que, no seu conhecimento limitado, não
podiam estar relacionadas entre si.

O que estava acontecendo lá fora era além de horrível, e a destruição era


por causa de Seth e eu. Talvez não teria chegado a isto se Seth não tivesse
atacado o Conselho. Talvez os deuses nos deixassem sozinhos, para viver
nossas vidas.

Talvez eles teriam encontrado uma maneira de nos matar de qualquer


maneira.

Eu não sabia e isso realmente não importava. Este era o lugar onde
estávamos agora, e as coisas estavam ruins. Apesar de todo o conhecimento
dos Apollyons estar flutuando na minha cabeça, nada disso era útil quando
se tratava de corrigir isso.
Laadan apareceu na porta, vestida com calça e um suéter branco hoje.
Seu cabelo estava perfeitamente amarrado em um coque, apesar do fato do
mundo estar uma loucura lá fora. A mulher era deslumbrante.

Ela olhou para Aiden e sorriu.

— Gostaria de se juntar a mim para um café?

Como eu poderia recusar cafeína? Assentindo, eu comecei a sair da sala,


mas voltei para onde Aiden estava descansando e ajeitei a colcha que
coloquei sobre ele algumas horas atrás. O homem devia estar esgotado,
porque ele não acordou, o que era raro.

Segui Laadan para a cozinha e observei-a fazer o café de forma eficiente.


Com as nossas xícaras fumegantes na mão, fomos para a marquise para a
privacidade que nos era oferecida. Nós nos sentamos no banco da janela,
nossas pernas dobradas para o outro lado. Finalmente, nós íamos falar sobre
o meu pai, e eu não tinha ideia do que ia sair de sua boca.

Eu estava mesmo um pouco assustada, estúpida e fraca, e meu estômago


estava se movendo em todo o lugar. Eu não sabia nada do meu pai, só
descobri que ele era um mestiço e estava vivo alguns meses atrás.

Laadan tomou um gole de café e piscou várias vezes.

— Primeiro, eu quero pedir desculpas pelo que aconteceu com você no


Conselho. Eu...

— Você não tem que se desculpar. Isso não foi culpa sua. — E não era.
Laadan tinha sido obrigada a me dar o Brew – algo como um Boa Noite
Cinderela super potente dos deuses - por um dos guardas de Telly,
provavelmente o que eu tinha matado...

— O que eles tentaram fazer com você foi horrível. — As lágrimas


encheram seus olhos, brilhando como cristais. — Eu queria, queria ter sabido
disso. Sinto muito…

— Laadan, sério, você não tem que pedir desculpas. Eu sei que você
nunca estaria disposta a fazer algo assim. E sei que você não se lembra de
quem fez isso. Está tudo bem. — E, deuses, eu não queria falar sobre aquela
noite. Além do fato de que ela me fazia pensar sobre o Guarda que eu tinha
matado, se eu não tivesse acabado vomitando as minhas tripas para fora,
Seth e eu... nós teríamos transado, e depois de tudo agora, eu não acho que
algum dia superaria isso.

Coloquei o meu café na mesa de vime pequena quando meu estômago se


agitou.

— Eu quero saber sobre o meu pai.

Uma mudança notável ocorreu em Laadan. Um tipo diferente de brilho


encobriu os seus olhos. Ela tomou outro gole, seu dedo indicador batendo no
vidro. A expectativa estava me matando.

— O seu pai é um... é um homem incrível, Alex. Você deve saber disso
acima de tudo.

Minha respiração ficou curta.

— Eu sei. — Eu sabia, porque ele tinha que ser incrível para quebrar as
regras e amar a minha mãe. — O Elixir não funcionou no meu pai, não é?

Laadan sorriu melancolicamente.

— Seu pai - Alexander - bem, ele sempre teve uma forte vontade, assim
como você. O Elixir exerceu o seu poder sobre ele, mas ele nunca caiu
completamente na compulsão. Eu não sei como, mas ele resistiu desde o
início.

Juntei minhas mãos.

— Eu acho que eu o vi nas escadas uma vez, e em seguida, perto do fim,


durante o ataque. Ele estava lutando...

— Você o viu. — Seu olhar mudou-se para a janela atrás de nós. A luz
solar da manhã cedo cortava o vidro coberto de geada. — Ele estava na
biblioteca na noite em que falamos sobre sua mãe e ele.

Eu só podia olhar. Eu sabia que alguém tinha estado ali.

— Os livros que caíram – foi ele?

Ela assentiu.

Quantas vezes eu tinha estado perto do homem - do meu pai - sem saber?
Um furacão de decepção cresceu dentro de mim.

— E... e ele sabe que eu sou a sua filha?

— Sim, ele sabe. — Ela esticou a mão vazia, tocando suavemente a pele
do meu rosto, perto de uma contusão que já estava começando a se curar. —
Ele iria reconhecê-la em qualquer lugar. Você parece muito com a sua mãe.

Essa mordida de tristeza reforçada veio e eu puxei de volta.

— Então por que ele não falou comigo?

Laadan desviou o olhar, o seu queixo abaixando.

— Eu tentei falar com ele, Laadan. Na escada, mas ele só... olhou para
mim. E por que ele não veio até mim na biblioteca? Eu sei que ele não podia
simplesmente anunciar quem ele era, mas por que... — Minha garganta
apertou. — Por que ele não quis falar comigo, pelo menos?

Sua cabeça se virou na minha direção.

— Oh, querida, ele queria falar com você mais do que qualquer coisa, mas
não é tão simples assim.

— Parece simples para mim. Você abre a sua boca e fala. — Eu me


esforcei para manter-me sentada. Será que ele ouviu falar das minhas
aventuras? Deuses sabem que os rumores de meus problemas com autoridade
tinham viajado distante e largamente. E se ele tivesse ficado envergonhado
como um Sentinela treinado? Pior ainda, como um pai? — Eu só não
entendo.

Ela respirou fundo.

— Ele estava muito perto de você quando você estava lá e você não sabia,
mas era também muito perigoso para ele ser visto ao seu redor. A verdade do
que ele é, o que sua mãe era, e o que você é, era muito arriscada. Você já
tinha muitos olhos em você.

A conversa que Seth e eu tínhamos ouvido, voltou para mim. Nós já


temos um aqui. Raiva despertou e rapidamente acendeu um fogo dentro de
mim. Marcus... Marcus sabia, e agora que estava tudo em aberto, iríamos
com certeza falar sobre isso.
— O que eu lhe disse na biblioteca naquela noite? Que ele estaria
orgulhoso de você por causa de quem você tinha se tornado e não pelo que
você iria se tornar? — Ela apertou a minha mão fechada na sua em um
aperto suave. — Essa é a verdade. A partir do momento em que você chegou
ao Covenant no verão passado, eu fiz o meu melhor para mantê-lo atualizado
sobre como você estava. Sua mãe... ela não sabia o que tinha acontecido
com ele e Alexander queria que fosse assim. De certa forma, a morte era
mais fácil do que a verdade.

Eu pisquei as lágrimas repentinas e queria puxar a minha mão livre, mas


como sempre, a natureza calmante de Laadan me desarmou.

— As coisas são mais complicadas do que você imagina, Alex. Ele não
podia falar com você.

Balançando a cabeça, eu tentei entender isso e não consegui. Eu acho


que um pai teria feito qualquer coisa para falar com sua filha apenas uma
vez.

Laadan apertou as minhas mãos e as soltou.

— Os Mestres sempre suspeitaram que seu pai era diferente, e que talvez
ele estivesse influenciando outros servos. Eles o trataram muito cruelmente.
Ele não podia falar com você, Alex. Eles removeram metade da sua língua.

Eu recusei o que ela disse. Eu tinha ouvido errado. Não havia outras
opções.

— Não. Eu o vi conversando com outro servo na sala de jantar.

Ela balançou a cabeça tristemente.

— No máximo, você viu um servo falar com ele.

Forçando-me a lembrar da manhã depois de eu ter sido jogada no Brew


mais claramente, eu tentei ver o meu pai, e o servo mais jovem. As coisas
pareciam tensas e ele tinha estado de costas para mim a maior parte do
tempo. Eu tinha presumido que ele estava falando pela reação do outro servo.

Eu não tinha visto ele falar.

Levantando, eu ouvi um pequeno arfar de surpresa de Laadan. Até eu


estava um pouco chocada com o quão rápido eu me movi. As marcas de
Apollyon apareceram na minha pele e vibravam enquanto deslizavam em
várias direções. Ela não podia vê-las, mas algum senso inato persuadiu-a a
recuar.

— Eles cortaram a língua dele? — Poder subiu sobre a minha pele.

— Sim.

Era isso. Eu ia tirar o Conselho e cada maldito Mestre deste planeta.


Maus pensamentos, perigosos, mas deuses, como eles poderiam fazer algo
assim?

— Como eu posso estar tão surpresa? — Eu disse em voz alta, e depois ri


loucamente. — Como eu estou surpresa com isso, Laadan?

Não houve resposta.

Afastando-me, eu me esforcei para controlar a minha fúria. Eu já podia


ouvir os ramos batendo na lateral da cabine. Conhecendo a minha sorte, eu
provavelmente causaria um terremoto. Controlar os elementos era fácil, mas
eu aprendi através do Despertar que minhas emoções os afetavam, os faziam
mais violentos e imprevisíveis.

Como fazia a quantidade de éter, a essência dos deuses, que corria em


minhas veias.

Nossa sociedade sempre foi cruel para os mestiços. Puros sempre


assumiram um papel de dominação, e as coisas que eu sabia que se passavam
por trás das portas fechadas de alguns dos puros, coisas que ninguém falava,
coisas com as quais eu queria me enfurecer - aconteciam todos os dias. E
como qualquer outro meio-sangue, eu estive em um papel subserviente toda a
minha vida. Eu cresci sendo ensinada a aceitar essas coisas, porque não
havia outra escolha para mim, ou para qualquer outro mestiço. Mesmo depois
de viver no mundo mortal, eu voltei para o rebanho, rapidamente voltando
ao meu papel quando eu tinha visto os servos.

E só uma vez eu tinha intervindo. Eu tinha recebido um soco em minha


mandíbula por isso, mas parar um Mestre de golpear uma serva não era nada
comparado ao que aqueles mestiços tinham passado.

Na realidade, era mais do que aceitar a Ordem da Raça. Eu tinha


ignorado, porque isso não tinha me afetado.

E isso era imperdoável.

Afastando-me, eu passei as mãos pela parte de fora das minhas coxas. Eu


respirei forte. Isto era maior do que eu e os meus próprios problemas, como
se tornar uma Sentinela e continuar, enquanto outros de minha espécie
eram escravizados. Isso era mais do que meu pai. Era a Ordem da Raça.

— Isso tem que mudar, — eu disse.

— Eu concordo, mas... —

Mas agora, neste instante, não havia nada que eu pudesse fazer. Acredite
ou não, nós tínhamos problemas maiores. A Ordem da Raça e como os
mestiços eram tratados não importavam se estivéssemos todos mortos.

Diante de Laadan, eu percebi uma coisa enorme - enorme para mim, pelo
menos. A antiga Alex teria provavelmente invadido algum lugar e chutado
um Mestre nas partes onde mais doía. Uma grande parte de mim queria fazer
isso, mas a nova Alex - essa menina/mulher/qualquer coisa, que veio do
nada, sabia que algumas batalhas tinham que ser planejadas.

Essa nova Alex esperava.

Eu meio que fiquei sem palavras.

Laadan, mais observadora do que eu percebi, sorriu e deu um tapinha no


local ao lado dela.

— Você está crescendo.

— Eu estou? — Parecia tarde demais no jogo para esse tipo de bobagem.


Sentei-me, e quando ela concordou, eu suspirei e parecia dez anos mais
velha. — Crescer é uma porcaria, então.

— Há ingenuidade no egoísmo de jovem.

Minhas sobrancelhas se levantaram. Eu estava com comichão, como se


eu tivesse deslizado sobre uma pele mais responsável e madura e uma parte
de mim não gostou disso. Afastei a sensação e voltei para o meu pai.

— Você fala muito com ele?


— Tanto quanto eu posso. A comunicação é unilateral, às vezes, mas ele
pode escrever, obviamente. Eu sei que ele recebeu a sua carta, mas,
infelizmente, com tudo o que está acontecendo, eu não sei a resposta dele,
ou se ele teve a chance.

Eu assenti em um movimento abrupto.

— Você sabe onde ele está agora?

Ela tocou o laço na borda de sua blusa.

— Alexander está no Covenant de Nova York.

— Ele ainda está lá? — Quando ela acenou com a cabeça, eu queria
levantar e descobrir como chegar a Nova York, mas a lógica se infiltrou.
Seria quase impossível chegar até ele. E com Seth lá fora, procurando por
nós? Seria apenas estúpido sair correndo.

— Quando o Elixir parou de funcionar, houve muita confusão entre os


servos. Há muito poucos como ele, que resistiram às compulsões. Aqueles que
estão passando por seu próprio Despertar precisam de um líder, e esse é seu
pai. Há muita turbulência lá, com o ataque recente e com o que o Primeiro
está fazendo.

Mas eu queria gritar que eu precisava dele aqui comigo. Eu não era mais
importante? Sua filha há muito tempo perdida? Eu fiz uma careta. Bem, é
bom ver que um pouco do meu egoísmo ingênuo ainda estava presente.

— Ele ainda ama a minha mãe? — eu perguntei, olhando para ela.

Sua expressão era reservada.

— Eu acho que uma parte dele sempre irá amá-la.

— Você o ama? — Eu soltei.

Laadan engoliu em seco e uma longa pausa se seguiu. No intervalo, ouvi


alguém se movendo na cozinha.

Eu comecei a sorrir.

— Você gosta dele.


Desviando o olhar, seus lábios franziram.

Eu cutuquei-a com o cotovelo.

— Você gosta muito dele.

Ela empertigou-se.

— Seu pai…

— É o amor da sua vida?

— Alexandria! — ela retrucou, mas não havia nenhum calor real no seu
tom de voz.

Eu ri enquanto me inclinei contra a vidraça fria. Eu sabia que meus pais


tinham este maravilhoso e proibido caso de amor que começou muito antes
do meu padrasto Babaca ter entrado em cena. E se não fosse pela Raça... a
merda da Ordem da Raça dos deuses, eles ainda estariam juntos. Deuses,
tantas coisas seriam diferentes. Ou seja, a minha mãe... ela ainda estaria
viva, porque eu aposto que meu pai era como Aiden. Ele nunca teria
permitido que nada acontecesse com a minha mãe.

Os lábios de Laadan se curvaram nos cantos.

— Você é tão parecida com o seu pai. Sua teimosia e tenacidade. — Seu
olhar se dirigiu à porta fechada. O cheiro de café fresco cresceu. — E, assim
como seu pai, você se atreveu a amar um puro-sangue.

Minha boca se abriu. Touché.

— Bem, eu meio que entrei nessa.

Eu achei que ela tivesse dado risada, mas eu tinha que estar errada,
porque isso seria tão grosseiro da parte dela.

Por alguma razão estranha, parte do peso saiu dos meus ombros e eu
deixei de ser uma Alex vingativa, apesar de ser mais madura, e virei uma
menininha em menos de dois segundos.

— Eu o amo. Eu realmente o amo. Mais do que... mais do que eu


provavelmente deveria.
Ela acariciou a minha mão.

— Você não pode amar alguém mais do que deveria.

Eu não tinha certeza sobre isso.

— Ele te ama tão fortemente. Era óbvio para mim desde o início.

— Era?

— O Aiden que eu conheço, antes de ele ir para Atlanta para encontrá-la,


sempre respeitou e viu os mestiços com igualdade, mas ele nunca teria tirado
tempo de seus deveres como Sentinela para ajudar qualquer mestiço.

Sabendo o que tinha acontecido a seus pais na frente dele enquanto ele
ainda era um menino, eu podia ver porque ela achava isso. Tornar-se um
Sentinela e vingar seus pais havia se tornado tudo para ele.

— E então eu vi o jeito que ele era ao seu redor, em Nova York. — Ela
sorriu melancólica e virou-se novamente. — Estava tudo na forma como ele
olhava para você - do jeito que ele sempre olhou para você. Você era o seu
mundo, provavelmente antes de qualquer um de vocês perceberem isso.

— Você soube de tudo isso pelo jeito que ele olhava para mim? — Eu
talvez parecesse cética, mas oh, uau, aquela menininha estava pulando e
gritando dentro de mim.

Laadan riu em seguida, o som como sinos de vento.

— Ele olhava para você como um homem faminto pela única coisa que
poderia aplacar a sua fome.

Meus olhos saltaram e meu corpo liberou cerca de mil tons de vermelho.

— Oh, wow...

Isso era muita informação. Como é que mais pessoas não tinham notado
isso? E então isso me atingiu. Laadan saberia, porque era assim que ela
olhava para o meu pai... e, provavelmente, tinha testemunhado o meu pai
olhando para a minha mãe da mesma maneira.

De repente eu estava muito triste por ela.


Lançando-me para mais perto dela, eu passei meus braços em volta dos
seus ombros delgados. Foi estranho no começo, porque eu seriamente sou
horrível com abraços.

— Obrigada.

Lágrimas encheram os seus olhos de novo.

— Conversar com você sobre o seu pai é o mínimo que eu poderia fazer.
Se você gostar, há muitas histórias que eu posso te dizer. Será uma alegria...
falar abertamente sobre eles.

— Eu gostaria disso, — sussurrei.

Laadan descansou a bochecha no topo da minha cabeça, e nesse


momento, ela me lembrou tanto da minha mãe que era quase demais para
manter as lágrimas, mas eu não consegui parar a pergunta que se formou na
ponta da minha língua.

— Você acha que eu alguma vez vou conhecê-lo?

Seu abraço ficou apertado.

— Você irá. Ambos são determinados o suficiente para fazer isso


acontecer. Eu não tenho nenhuma dúvida.

Fechando os olhos, eu me tranquei em suas palavras. Eu queria acreditar


nelas - eu precisava - mas a dúvida inchou em mim como mechas amargas
de fumaça acre. Muito estava entre mim e meu pai, anos de regras e segredos
existiam, um exército de meio-humanos e meio-touros, e o mais importante,
Seth.
Doze
Poucas horas depois, eu estava na clareira protegida de frente ao abrigo,
coberta de lama e com um frio na espinha. Ao meu redor, os sons de
grunhidos e barulhos fortes de queda d’água ecoavam de uma maneira
silenciosa pela floresta.

Olhei para as minhas mãos sujas e suspirei. Eu estava imunda. Talvez eu


repetisse uma ducha no chuveiro mais tarde. Meu olhar encontrou a forma
ágil de Aiden. Ele estava lutando com Luke. Em outras palavras, ele estava
chutando repetidamente a bunda de Luke.

Eu duvidava que a repetição de um banho estivesse no menu.

Uma pontada aguda de insatisfação se formou no fundo da minha


garganta. Eu realmente pensei que, já que eu deveria estar supostamente
treinando, eu ia acabar treinando com o Aiden e seria como nos velhos
tempos, mas com muito mais toques apaixonados. Cara, eu estava errada.

Solos exalou alto.

— Quanto tempo você vai olhar para suas mãos? Eu não estou ficando
mais jovem por aqui.

Mas oh não, no momento em que saímos lá fora, Aiden tinha


emparelhado com Luke e Olivia, Lea com Marcus. Deacon e Laadan estavam
lá dentro, supostamente fazendo o jantar.

Agora eu estava no modo de lamento interno completo.

Eu me mexi para frente, fazendo uma careta quando meu jeans frios
irritaram a minha pele.

— Eu não acho que esse é o tipo de treino que Apolo tinha em mente.

Solos colocou uma mecha de seu cabelo para trás de sua orelha.

— Quando foi a última vez que você treinou?

Eu honestamente não conseguia me lembrar.


— Eu estava lutando, tipo, há dois dias.

— Um dia, no espaço de muitos não significa nada. — Galhos quebrados


rangeram sob as suas botas. — Nossos músculos precisam serem usados
diariamente.

Eu peguei o fim da cena com Luke caindo de bunda.

— Eu acho que eles poderiam usar mais a sua ajuda. Eu poderia estar
trabalhando no uso de akasha agora. Seth tem anos de experiência prática a
mais que eu.

— E você vai trabalhar com isso, mas não agora. — Solos estava longe de
ser tão paciente como alguns dos meus treinadores anteriores tinham sido.
Ele estava na mesma categoria que Romvi.

Estreitando os olhos, eu levantei a minha mão.

— Eu poderia usar apenas o elemento ar e bater...

— Alex, — Aiden estalou, parando um chute vicioso de Luke com uma


mão. Ele empurrou-o de volta quando seus olhos, parecendo uma trovoada, se
aguçaram em mim. — Eu também duvido que Apolo ache que a sua boca é a
única coisa que precisa de um treino.

Tantos comentários inadequados subiram para a ponta da minha língua e


dançaram ao redor, mas eu fechei a boca e olhei para ele.

— Ele está tentando ajudá-la. — Aiden tirou um punhal de titânio a partir


de onde ele estava enterrado no chão. — O mínimo que você poderia fazer
era aceitar isso sem torturar aqueles que estão ajudando você.

Envergonhada e com raiva, eu estava a dois segundos de derramar a


minha ira em Aiden quando eu parei. Aiden estava certo. Eu estava sendo
chorona e mal-intencionada e irritante.

Nossos olhos se encontraram, e não havia muito calor por trás de suas
palavras, mas ele estava frustrado comigo e eu odiava isso, porque eu estava
sendo uma pirralha. Eu não sabia o que havia de errado comigo. Desde que
Laadan e eu tínhamos nos falado, o meu humor havia caído. Falta de sono,
talvez?
A ferroada da advertência de Aiden me forçou a voltar para Solos, que por
sinal, tinha lama respingando nele como sangue na cena de um crime
horrível. Ninguém neste mundo poderia me convencer a fazer o que eu
deveria estar fazendo tão rapidamente quanto Aiden.

Uma parte de mim odiava isso. A outra parte respeitava e agradecia a ele
por isso.

Com as bochechas queimando, eu adotei a postura de luta. Solos se


lançou para mim. Nós começamos, golpe por golpe. Ele mergulhou. Eu girei.
Mais vezes do que nunca, ele acabou estatelado no chão, levantando poeira e
grama solta em mim. Meus músculos estavam um pouco fora de uso, mas eu
era rápida, mais rápida do que eu lembrava ser. Quando eu tinha lutado com
Aiden no outro dia, eu não tinha consciência do que eu realmente estava
fazendo, não a mecânica disso. Mas agora? Whoa, eu me senti como a Super
Mulher.

Solos apoiou-se no chão, expirando pelo nariz. Nós nos mexemos para
desarmar um ao outro, o que geralmente tinha sido um ponto fraco para
mim.

Eu corri para os braços estendidos de Solos, peguei os dois cotovelos e os


puxei para trás, passando minhas mãos até os pulsos, enquanto eu plantei
um pé nas suas costas. Ele lançou as lâminas e eu as peguei.

Acenando-as em seu rosto, eu sorri.

— Eu meio que sou fodona nisso.

Ele se virou, sobrancelhas franzidas.

— Eu nem mesmo sei o que foi esse movimento.

Eu virei o punhal na mão direita.

— É chamado de impressionante e funciona.

— Há uma diferença entre habilidade e velocidade. — Ele pegou o punhal


do meu outro lado. — Você não terá sempre a velocidade.

— Mas eu tenho os elementos, — eu lembrei a ele.

— Isso você tem. — Ele deu um sorriso torto que não esticava a cicatriz.
Ele era bonito quando sorria daquele jeito. Inferno, ele era bonito mesmo
com a cicatriz - como um pirata. — Mas me corrija se eu estiver errada - usar
os elementos não te cansa?

— Isso é o que eu ouço. — Olivia caiu sobre um toco de árvore e estendeu


suas longas pernas lentamente. — Bem, eu ouvi isso de Seth uma vez.

Com apenas um punhal na mão esquerda, apontei-o para Solos.

— Utilizar os elementos pode cansar, mas não tanto como akasha. É por
isso que ele não o usa o tempo todo. Enfraquece-o - a nós, eu acho.

Aiden cruzou os dedos e se espreguiçou, curvando as costas. Meu olhar


seguiu o movimento obsessivamente. Tudo o que ele fazia parecia fluido e
gracioso.

— É por isso que é importante não depender exclusivamente dessas


habilidades.

Desde que eu conhecia Aiden, eu poderia contar em uma mão quantas


vezes ele tinha usado o elemento fogo. Cada puro tinha uma afinidade para
um determinado elemento, ao passo que o Apollyon podia exercer controle
sobre todos eles. Aiden gostava de lutar corpo-a-corpo.

Ou titânio-contra-titânio.

Lea estava encostada em um grande carvalho, seu cabelo bagunçado


enquanto Marcus recuperava as lâminas caídas devido ao treinamento. Meu
tio as manipulava habilmente. Às vezes, eu esquecia que ele tinha sido
treinado como um sentinela uma vez.

Nosso pequeno recesso acabou, e sob o céu nublado de abril continuamos


até que o sol começou a descer no oeste. Só então pudemos andar de volta
para o abrigo, e eu imaginei que praticar akasha estava no cronograma para
amanhã. O cheiro de carne assada brincou com as minhas papilas
gustativas. Eu estava com tanta fome que poderia comer um daimon, mas
um banho vinha primeiro.

E como eu esperava mais cedo, eu estava sozinha nesse desejo.

Todos nós nos sentamos à mesa da cozinha e começamos a comer.


Alguém agradeceu a Laadan pela refeição e Deacon quase teve um enfarte
com isso.

— Quem amaciou a carne? Quem a marinou e a observou devidamente?


— Suas sobrancelhas loiras se abaixaram enquanto segurava um garfo como
Luke segurava um punhal. — Esse seria eu.

Laadan assentiu.

— Eu descasquei as batatas. Só isso.

— Eu não sabia que você cozinhava, — eu disse, surpresa.

Recém-saído do banho, Aiden caiu no assento ao lado de seu irmão. Seu


cabelo escuro estava molhado e penteado para trás, revelando suas largas
maçãs do rosto. Ele bateu seu irmão no ombro.

— Deacon é um ótimo cozinheiro.

— Hmm. — Olivia sorriu quando ela perseguiu uma batata ao molho em


seu prato. — Aprendendo algo novo todos os dias, certo?

Nem mesmo tentando esconder o sorriso orgulhoso, Deacon olhou para


Luke.

— Eu sou cheio de surpresas.

Eu arqueei uma sobrancelha, mas empurrei um pedaço de carne


suculenta na minha boca e não disse nada. Por um tempo, sentada na mesa
com todos, as coisas eram, bem, elas eram agradáveis e acolhedoras.

Aiden permaneceu praticamente em silêncio enquanto todos contavam


histórias, sorrindo de vez em quando, mas ainda um pouco distante do grupo
barulhento. Mais de uma vez, nossos olhares se encontraram. Algo se agitou
em seus olhos cinzentos. Eu poderia facilmente ver a fatia afiada de tristeza
misturada com arrependimento, antes que ele desviasse o olhar.

Depois do jantar, de barriga cheia, o grupo se separou em seções


diferentes da casa. Lea desapareceu com um dos livros que Laadan tinha
trazido com ela. Olivia e os meninos foram para a sala com um baralho.
Solos e Marcus saíram para verificar o perímetro com Aiden. Estava ficando
tarde, e eu estava tentando ficar acordada para quando eles voltassem, mas
eventualmente, eu disse boa noite para o grupo e me arrastei para cima.
Parei na frente do quarto de Aiden, de repente, não tinha certeza de onde
eu deveria estar dormindo. Havia outro quarto ao lado do banheiro, o que era
para ser meu, mas eu não conseguia sequer me lembrar de ter dormido lá
dentro. Eu deveria estar naquele quarto? E se eu fosse para o quarto de
Aiden, eu estaria ultrapassando alguma coisa?

Mudando o peso do corpo de lado, cansada, eu mordi meu lábio inferior.


Deuses, isso não devia ser tão complicado. Vamos, Alex, você está sendo
estúpida. E eu me sentia estúpida.

Indo para o meu quarto, eu descobri que estava em falta no departamento


de roupas de dormir. Indo para o quarto dele através do banheiro, encontrei
algumas das camisas maiores de Aiden dobradas separadamente do resto de
suas roupas, como se tivessem sido propositadamente deixadas de lado.

Vesti uma das camisas de algodão fino que atingiu as minhas coxas, e de
jeito nenhum eu queria voltar para o quarto fresco intocado que deveria ser
meu. Deslizando sob as cobertas, eu me aconcheguei, inalando o cheiro de
terra que cobria a cama.

Não demorou muito para cair no sono. Provavelmente poucos minutos


depois, e eu estava flutuando em uma névoa reconfortante, mas algo me fez
abrir os olhos. E quando eu o fiz, eu estava olhando direito para um par de
olhos cor de âmbar.
Treze
Seth.
Oh deuses, eu estava olhando para Seth. Ele estava aqui. Impossível, mas
ele estava aqui comigo.

Meu coração disparou em um ritmo caótico quando eu recuei. Com tanto


medo, tão aterrorizada por sua súbita aparição, eu não consegui recuperar o
fôlego.

Seus braços formaram uma gaiola em torno de mim. Eu não ousava me


mover, sua pele estava muito perto da minha, seus lábios a uma fração de
polegada de distância. Seus olhos cor de âmbar brilhavam sob grossos cílios
loiros escuros. As marcas do Apollyon corriam até seu pescoço, espalhando-se
sob sua face em uma onda vibrante de azul sobre sua pele dourada. Minhas
próprias marcas respondiam a sua proximidade, fazendo com que minha pele
formigasse. A corda estalou viva.

A força da presença de Seth estava em toda parte, invadindo meu corpo e


pensamentos, mas quando eu finalmente respirei, o cheiro estava todo
errado. Era terra com uma pitada de sal marinho. Aiden.

Os lábios de Seth se curvaram em um sorriso satisfeito e ele colocou sua


boca perto da minha orelha.

— Eu disse a você, Alex. Eu iria te encontrar em qualquer lugar.

Minha boca se abriu, mas meu grito foi estrangulado pelo pedaço de
terror na minha garganta enquanto eu me torci para o lado e tentei me
manter acordada... acordada.

Com o pulso batendo, me sentei e o quarto entrou lentamente em foco.


Meu olhar frenético viajou pelo quarto, procurando pelas sombras por
qualquer sinal de Seth. Uma lasca de luar penetrava sob as cortinas,
espalhando-se pelo chão, seus dedos roçando a cômoda antiga. Por baixo da
porta do banheiro, uma fenda de amarelo brilhava. Além das marcas
formigando, não havia sinal dele.

Foi apenas um sonho - um pesadelo. Nada mais, mas a adrenalina


chutando em torno de mim discordava.

A porta do banheiro se abriu e Aiden encheu a porta. Iluminado pelo


brilho suave da luz atrás dele, ele era um estudo de contrastes sombrios, sem
camisa e vestindo apenas a calça do pijama que estava baixa em seus
quadris.

Isso não ajudou o meu coração ou meus problemas respiratórios.

A luz atrás dele apagou.

— Alex? — Ele se moveu silenciosamente até a cama, mergulhando ao


meu lado. — Eu não quis acordá-la, acordei?

Eu balancei minha cabeça.

Sua cabeça se inclinou para o lado e o cabelo escuro caiu sobre sua testa.

— Você está bem?

— Sim, — eu murmurei, me sentindo ridícula agora por exagerar com um


pesadelo estúpido.

Aiden estendeu a mão, parando com a mão a um milímetro do meu rosto.


Ele afastou-se, deitando de costas. Um braço estendido, me chamando.
Estendendo-me ao lado dele, eu coloquei minha cabeça em seu ombro, minha
mão em seu peito acima do coração fulminante. Sua pele era quente e
reconfortante.

Vários segundos se passaram em silêncio enquanto seu coração


abrandava. Por que tinha começado a bater tão rápido, eu não sabia. Eu me
aconcheguei mais perto, encaixando meu corpo ao seu lado, e o seu braço
enrolou em volta da minha cintura. Senti sua mandíbula pousar em cima da
minha cabeça, e então seus lábios pressionados contra minha testa.

Eu fechei meus olhos, querendo falar com ele sobre o sonho, mas ao
invés disso, outra coisa saiu.

— Eles cortaram a língua do meu pai, Aiden. Ele não pode falar. Eles
fizeram isso com ele.

Ele pareceu prender a respiração por um instante.


— Por que eles fariam uma coisa dessas? — Eu perguntei, e minha voz
soou incrivelmente pequena e frágil.

— Eu não sei. — Sua mão subiu, pressionando entre os meus ombros,


movendo-se em um círculo suave. — Não há qualquer justificativa para algo
tão terrível quanto isso. — Houve uma pausa. — Sinto muito, Alex.

Eu assenti, apertando os olhos fechados. Precisávamos fazer alguma


coisa sobre a Ordem da Raça, e eu sabia que Aiden concordaria, mas discutir
algo tão político às duas da manhã parecia errado.

Esticando-me, eu coloquei meus lábios sob os de Aiden, mas o beijo


acabou mais puro do que a ação quente e úmida que eu estava querendo. Seu
braço apertou, porém, e um leve tremor percorreu seu corpo como se ele
estivesse lutando contra a atração entre nós.

Confusa, deixei a minha tentativa de seduzi-lo, já que isso realmente não


estava funcionando, e me recostei, o coração disparado novamente. Por que
ele não me beijou de volta? Estava ele ainda chateado com a minha exibição
malcriada mais cedo durante o treinamento com Solos? Se sim, então puxa,
não havia nada que eu pudesse fazer para corrigir isso. Ou era outra coisa?
Como o pesar e tristeza que brilhavam em seus olhos cinzentos?

Fora do silêncio que tinha caído no quarto mais uma vez, Aiden disse:

— Eu te amo.

Não havia como perder o fio pesado de emoção em sua voz. Minha
respiração ficou presa. Mesmo com a minha tentativa de sedução falha, ouvi-
lo dizer essas três pequenas palavras era algo de que eu nunca me cansava.

— Eu também te amo.

Muito pouco tempo depois, o constante subir e descer do peito de Aiden se


aprofundou. Eu fiquei em seus braços, olhando através da escuridão para a
parede vazia do outro lado da cama pelo que pareceram horas, antes de eu
cuidadosamente desembaraçar-me de seus braços e arrastar-me para fora da
cama.

Incapaz de dormir ou ficar parada, eu encontrei uma calça e blusa de


moletom e os vesti, enrolando as barras da calça na parte inferior. Meus pés
descalços tocavam o piso de madeira quando eu escorreguei para fora da
porta e desci as escadas.

A casa era um túmulo silencioso e frio. Dobrando meus braços, eu andei


de forma desordenada em torno da cozinha, mesmo eu não estando com
fome ou sede. Inquieta e bem acordada, sem ideia do que fazer, eu fiz o meu
caminho para o solário.

Estava mais frio lá dentro, mas de uma maneira estranha, cercado por
todas as plantas e janelas com nada além de escuridão iminente lá fora,
estava calmo.

Sentada à janela, eu dobrei minhas pernas contra o peito e olhei para


fora de uma das janelas. Muita coisa estava correndo pela minha cabeça -
meu pai, treinar novamente, a Ordem da Raça, Aiden e sua resistência
repentina, tudo o que estava acontecendo fora destas paredes, e...

E eu estava pensando sobre Seth, cortesia da visita do pesadelo.

Uma fatia afiada de pânico perfurou minha barriga. O que tinha


acontecido tinha que ter sido um pesadelo. O que era completamente
compreensível, considerando que Seth estava dando uma de Doctor Evil
agora. Não poderia ser qualquer outra coisa, então eu precisava parar de
entrar em pânico sobre isso. Mas esse zumbido baixo na parte de trás da
minha cabeça ainda estava lá e isso significava que, não importa o que eu
fizesse ou o quão forte eu fosse, eu iria estar sempre ligada a ele.

E que ele ainda poderia me alcançar.

Esse sentimento ansioso estava de volta, espalhando-se sob o meu peito.


Eu fechei meus olhos. O medo era um gosto amargo no céu da minha boca.
Poderia esse pesadelo realmente acontecer, Seth chegar até mim?

Eu chequei meus escudos mentais. Quase como correr a minha língua


sobre os dentes depois de Jackson ter pisado na minha cara durante a aula,
eu empurrei e incitei o escudo, certificando-me que nada tivesse sido
derrubado para fora do lugar ou solto. O escudo era resistente, mas os traços
de alarme demoraram.

Quando eu estava ligada a Seth depois de ter Despertado, eu podia ouvir


seus pensamentos tão claros quanto os meus.

Eu balancei um pouco para trás, apertando minhas pernas até meus


braços doerem.

Realmente pareceu que Seth tinha estado aqui esta noite, inclinando em
cima de mim e sussurrando sua advertência. Nem os meus pesadelos do que
havia acontecido em Gatlinburg tinham sido tão reais, e tinham sido
malditamente muito reais.

Passos se aproximaram da marquise e minha cabeça se levantou.

— Marcus.

Ele ainda estava vestido como no jantar, calça jeans e uma camisa de
flanela personalizada, um sinal claro de que ele não tinha ido para a cama
ainda.

— Acordada até tão tarde? — ele perguntou, inclinando-se contra o


batente da porta.

Eu dei de ombros e mantive meus braços fechados em torno de meus


joelhos.

— Eu não estou com sono.

— Você ficou se arrastando por toda a noite. Achei que você fosse dormir
por um dia inteiro.

Não era como se eu pudesse lhe dizer a verdade, então não disse nada.

Marcus hesitou na porta e, em seguida, caminhou para a frente, claro e


forte. Eu o observei cansada quando ele se sentou ao meu lado, sentando-se
no mesmo local que Laadan quando ela falou comigo. Vários minutos tensos
e desconfortáveis se passaram, e apesar de Marcus e eu termos percorrido um
longo caminho, nós ainda tínhamos montanhas para escalar antes que as
coisas não fossem tão epicamente estranhas entre nós.

Ele colocou as mãos em seu colo e suspirou.

— Você está se sentindo bem, Alexandria?

Tão formal...

— Sim, como eu disse, só não estou com sono. E você?


— Estava patrulhando e acabei de trocar com o Solos. — Ele me lançou
um rápido olhar de soslaio. — Eu não estou com sono, também.

Eu me virei para a janela.

— Vocês acham que é necessário patrulhar?

— Em parte pode ser apenas por força do hábito, especialmente para


Aiden e Solos, mas coisas estranhas têm começado a acontecer.

Surpresa por ele ter respondido tão honestamente, eu o encarei. Com


minha visão de Apollyon, eu poderia ver as linhas do seu rosto nas sombras.
Outro choque veio quando eu encontrei a expressão dele tão aberta.

— E mesmo que os deuses não possam se projetar para nós neste exato
momento, isso poderia sempre mudar, — disse ele. — Então nós
observamos... e esperamos.

Eu não disse nada por um longo momento.

— Eu odeio isso.

— O quê? — Curiosidade marcou o seu tom de voz.

Minhas mãos se curvaram em si, formando uma bola ao lado de minhas


coxas.

— Que as pessoas deem suas vidas de bom grado para me proteger. Eu


odeio isso.

Marcus virou para mim e, em seguida, recostou a cabeça contra a janela.

— Não leve a mal, mas não é só você que estamos protegendo,


Alexandria. Há Lea e Deacon, Olivia e Luke. Três deles são treinados, até
certo ponto, mas não contra os deuses ou uma horda de daimons. Mesmo que
um ataque daimon aqui pareça improvável...

Coisas mais estranhas já tinham acontecido. Eu assenti.

Seus olhos vibrantes deslizaram mais perto.

— Não é sempre sobre você.


Minha boca trabalhou em uma recusa. Eu não achava que isso sempre
era sobre mim, mas espere... eu meio que assumi que todo mundo estava se
jogando na frente de um ônibus por mim. Minhas bochechas queimaram.

— Eu não... Eu não quis dizer isso. — Respirei. — Bem, mais ou menos,


mas eu sei que vocês estão protegendo eles, também. E isso é... isso é uma
coisa boa.

Seus ombros relaxaram.

— E eu não quis dizer do jeito que isso saiu.

Eu ri e o som me surpreendeu. Ele não foi forçado ou sarcástico, apenas


se divertindo.

— Sim, você quis, e eu entendo. Eu estive andando no trem ‘Alex-é-


Importante’ por algum tempo.

Uma sobrancelha arqueou.

A vontade de rir veio novamente, mas eu parei e coloquei meu rosto nos
meus joelhos.

— Eu estive... uh, eu tenho dado bastante trabalho. Eu sei disso. Na


maioria das vezes foi de propósito.

— Eu sei, — foi tudo o que ele disse.

— Você sabe?

Marcus assentiu.

— Você é como qualquer criança…

— Eu não sou uma criança.

Seus lábios se curvaram para cima nos cantos.

— Você era como qualquer criança que estava procurando um lugar para
se encaixar. É especialmente difícil com vocês mestiços. Muitos de vocês
vêm de lares infelizes, ou nenhum lar. O ambiente em que são criados é
violento e agressivo. Eu vi tantos... — Ele balançou a cabeça ligeiramente. —
De qualquer forma, você era diferente, no entanto.
Olhei para a pergunta vazia.

— Por quê?

— Para começar, você é minha sobrinha.

— Uau. — Eu pisquei, soltando minhas pernas. — Estou surpresa que a


primeira coisa não era que você sabia que eu era o Apollyon.

Os olhos de Marcus abriram e encontraram os meus.

— Isso nunca foi a primeira, segunda ou terceira. Você é minha sobrinha.


Você é filha da minha irmã. E você é tão parecida com ela... — Ele exalou
pelo nariz, a mandíbula travada. — Você estava tão parecida com ela quando
voltou ao Covenant... e mesmo agora, eu tenho dificuldade em olhar para
você sem ver a minha irmã.

Algo... algo mudou no meu peito. Nunca Marcus tinha sido tão aberto
comigo. Parecia mais provável para mim valsar ao redor da sala com um
daimon antes de Marcus falar comigo sobre a minha mãe, mas ali estava ele.

Santa bunda de daimon, estávamos subindo a montanha.

Eu tomei fôlego, estava um pouco rouca.

— Você amava muito a minha mãe.

— Rachelle era minha irmãzinha e eu... eu a amava muito. — Seus olhos


se fecharam novamente. — Rachelle era cheia de vida - vibrante. Éramos
opostos. Ela atraía as pessoas a ela em massa, e eu praticamente os repelia.

Meus lábios se curvaram nos cantos.

— Ela era provavelmente a única pessoa que podia me fazer relaxar. —


Ele sentou-se, de repente, soltando as mãos sobre os joelhos. — Quando você
era muito pequena, ela a trazia para a minha casa, e se você se comportasse,
o que nem sempre era possível, ela a levava para tomar um sorvete depois. —
Um sorriso pensativo se formou. — Você era uma coisa tão pequena na
época, mas meus deuses, eu soube imediatamente que iria se parecer como
ela. Tudo, exceto os olhos...

Procurando minhas memórias, eu descobri que eu não conseguia lembrar


nada dele de quando eu era uma menina, apenas as poucas visitas, quando eu
era mais velha, e que tinham sido frias e impessoais. Marcus tinha sido como
qualquer outro puro.

— Ela sempre afirmou que o seu pai era um mortal, mas aquele Sentinela
estava sempre com ela, seguindo sempre ela... e você.

— O quê? — Minha cabeça se levantou.

Marcus se focou em algo que eu não conseguia ver.

— Você era muito jovem, Alexandria, para se lembrar do seu pai.

Ouvir Marcus mencionar meu pai parou o mundo.

— Você era apenas um bebê. Sua mãe não podia sequer sair sem
Alexander ir atrás dela, especialmente se ela estava com você. Olhando para
trás, parece óbvio, mas Sentinelas e guardas estavam sempre por perto. E
eles participaram do Covenant juntos, dois anos depois de mim. Eu apenas
pensei que eles eram amigos. Mas eu acho que sempre soube, no fundo, e eu
não conseguia ver além disso. Toda vez que eu olhava para você, via a queda
de minha irmã.

Meus olhos se arregalaram.

— Ai.

— Sim, — ele suspirou. — Soa terrível, mas todas as pessoas sabem o que
acontece com mestiços e puros que se misturam. Eu estava tão irritado com
a minha irmã por se colocar nessa posição e por trazer uma criança para
isso. — Marcus fez uma pausa, pensativo. — Eu descontei isso em você. Foi
um erro.

Porcos tinham acabado de ter asas oficialmente e estavam voando ao


lado de aviões. Em vez de saltar ao redor e apontar para o que ele acabou de
admitir e de agir como uma idiota completa sobre o assunto, me concentrei
em outra coisa. Às vezes eu me surpreendo com a minha própria maturidade.

— Você... você conheceu meu pai pessoalmente?

Seus lábios se apertaram.

— Eu treinei com seu pai antes de eu decidir ir por um caminho mais


político. Ele era um ótimo Sentinela. Como você.
Eu encarei. Em outro tempo, ouvir algo assim teria me enchido de prazer,
mas agora não era o elogio que tinha me maravilhado, foi ouvir que o meu
pai tinha sido um ótimo Sentinela.

— Eu acho que sua mãe esperava que ela não tivesse que se casar. Eu não
esperava. Nem mesmo Laadan. Mas quando sua mãe se casou com Lucian,
Alexander... você só sabia, se você conhecesse o homem por trás do
uniforme.

Mais uma vez, eu não tinha ideia do que dizer.

— Não havia nada que ele pudesse fazer exceto recuar e deixar a mulher
que amava se casar com outra pessoa. E ele tinha que viver sabendo que essa
pessoa estava criando sua filha. — Marcus pigarreou. — E eu tenho certeza
que Alexander sabia que Lucian não era gentil com você, mas não havia
nada que pudesse fazer. Tomar uma ação teria colocado tanto sua mãe como
você em perigo. Ele estava impotente.

Meus músculos estavam tensos e relaxados ao mesmo tempo.

— O que aconteceu? Como ele acabou virando um servo?

Marcus me olhou.

— Quando você estava com três anos, Alexander desapareceu. Não era
incomum. Fomos informados de que ele tinha sido morto por um daimon.

Eu balancei minha cabeça, franzindo as sobrancelhas.

— Como você não sabia para onde ele foi? Ele estava no Catskills, sob o
polegar de Telly.

— Eu não o vi lá até cerca de um ano antes de seu retorno. — A


sinceridade em suas palavras me abalou. — Eu acreditava que ele estava
morto, e eu não sabia que um meio-sangue homem e uma pura mulher
faziam uma Apollyon. Mesmo quando Rachelle veio até mim antes de ela te
levar, eu não suspeitava do que isso realmente significava. Não até que eu vi
Alexander no Catskills, e então o que eu poderia fazer?

— Você poderia ter ajudado ele!

— Como? Como eu ia fazer isso? O que você acha que teria acontecido se
todos percebessem que o seu pai era um mestiço? Mestiços e Puros se
misturaram antes e foram capturados. Aquelas crianças não tinham
permissão para viver.

Sentindo-me enjoada, eu engoli seco.

— Isso é tão errado.

— Eu não discordo. — Ele estendeu a mão, correndo os dedos sobre uma


planta próxima cheia de folhas. — Seu pai não pareceu me reconhecer. Só
recentemente eu soube a partir de Laadan, que deve ter sido uma atuação.

Em seguida isso me atingiu – direto na minha cabeça. A conversa que eu


ouvi entre ele e Telly ressurgiu. Marcus tinha ficado furioso com Telly.

— Telly queria que você me entregasse, né? Ele até lhe ofereceu um
assento no Conselho.

Ele olhou para mim afiadamente.

Eu sorri.

— Eu ouvi vocês.

Olhando para mim um momento, ele balançou a cabeça.

— Ele pediu.

— E você recusou.

— Sim. — Seu olhar dizia como eu poderia fazer outra coisa?

Uau. As coisas meio que faziam sentido agora, depois de todo esse tempo.
Eu o lembrava de minha mãe e ele sentia falta dela, o que provavelmente o
deixava desconfortável em torno de mim. E, de qualquer maneira, Marcus
não era realmente uma pessoa do povo. Ele não sabia sobre o meu pai, até
que fosse tarde demais. Eu acreditava nisso. E ele não tinha me entregado a
Telly. Lembrei-me de como ele me pegou e me levou depois de Seth ter
atacado o Conselho e eu ter ficado doente.

Assim como Aiden, ele não tinha desistido de mim.

Marcus... ele se preocupava comigo. E isso significava muito. Ao lado de


meu pai, que estava fora do meu alcance, Marcus era o último da minha
família, meu sangue.

— Obrigada, — eu disse. E então, impulsivamente, mesmo que ele não


fosse um homem de abraços, eu pulei para frente antes que ele soubesse o
que estava por vir e o abracei. Foi rápido, porém, eu não queria assustar o
homem.

Eu me ajeitei de volta no meu lugar, enquanto ele olhava para mim, os


olhos arregalados. Acho que eu o tinha assustado.

— Por que você está me agradecendo? — ele perguntou lentamente.

Eu dei de ombros.

— Você é uma garota estranha.

Rindo, eu me inclinei para trás contra as almofadas sobre o assento da


janela.

— Eu aposto que minha mãe era uma garota estranha.

— Isso ela era.

— Você vai me dizer o que sabe sobre o meu pai? Quero dizer, se você não
estiver cansado ou algo assim?

— Há algumas histórias que eu poderia lhe contar. — Ele imitou a minha


posição. — E eu não estou cansado. Nem um pouco. — Seu sorriso era
incerto, mas real, e eu não conseguia pensar em qualquer outro momento
que ele tinha sorrido assim.

Meus lábios responderam na mesma moeda.

— Isso seria muito bom.

Não foi até amanhecer e o sol se levantar, afastando as sombras escuras,


que eu pensei sobre o quão feliz a minha mãe estaria, sabendo que Marcus e
eu tínhamos feito as pazes.

E eu não podia evitar acreditar que ela sentia. E talvez ela estivesse
sorrindo para nós agora. Assim como os filtros de sol através das janelas,
aquecendo nossas costas.
Catorze
Durante os próximos três dias, nosso pequeno grupo caiu em um tipo de
ritmo. As coisas tinham se acalmado no mundo. Não tinha havido mais
desastres naturais, e o Monte St. Helens parecia ter se acalmado. Apolo ainda
estava desaparecido e a cabana no meio do nada se tornou uma zona livre de
deuses. Uma coisa boa, mas eu continuava com a sensação de que algum ia
aparecer, provavelmente na cama de Deacon ou algo assim, onde nós menos
esperávamos. Mas mesmo que não tivesse havido nenhuma interferência
divina, era como ver o relógio de contagem regressiva em uma bomba-
relógio. Nós todos estávamos esperando.

Cada dia tinha sido preenchido com treinamento, treinamento e mais


treinamento. Algumas partes eram piores do que qualquer dia no Covenant,
porque todo mundo parava e assistia quando chegava a hora de eu soltar o
akasha.

Marcus e Solos tinham alinhado várias pedras grandes que tinham


encontrado espalhadas, e meu trabalho era fazer pequenos, muito pequenos
seixos delas. E isso funcionou - de perto. Digamos tipo, a poucos metros de
distância. Mas quanto mais longe eu ficava, pior meu objetivo se tornava.

Suando sob a camisa térmica de Aiden, eu grunhi quando puxei de onde o


akasha descansava logo abaixo do meu peito. A marca do poder dos deuses
vibrou quando o quinto elemento estalou em meus dedos.

Sob a copa das árvores, Aiden e Olivia pararam seu treino para assistir.

Focando no elemento, senti meus sentidos afiarem. Usar akasha era


como estar conectada diretamente com a terra – como correr-e-abraçar-a-
árvore – conectada. Eu podia sentir as vibrações da grama e do solo sob meus
pés, assim como as dezenas de aromas trazidos no gemido do vento, e eu
podia sentir o ar que deslizava sobre a pele com os dedos fantasmagóricos.

Akasha crepitava por cima do meu braço direito quando eu joguei minha
mão. Um raio de luz irrompeu de minha mão, percorrendo os cerca de 3
metros e batendo na borda direita da pedra. Com um estalo alto, a coisa se
estilhaçou.

Luke correu para fora do caminho, mas ele ainda foi atingido por
escombros. Ele se curvou, prestes a beijar o chão.

— Opa. — Eu estremeci. — Desculpe?

Esfregando suas costas, ele acenou e mancou para onde Deacon estava
tentando esconder seu riso.

— Cala a boca, — ele resmungou.

— Você deveria ter pensado melhor antes de ficar tão perto, — Deacon
respondeu.

Suspirei e me virei para Solos.

— Eu tenho uma mira terrível.

Solos assentiu.

— É ligeiramente torta.

— Ligeiramente? — Minhas sobrancelhas se levantaram.

— Você está acertando o alvo, e eu acho que isso é tudo que importa.

Espreitando Aiden, descobri que sua atenção estava agora na disputa


entre Lea e Olivia. As duas meninas eram combatentes maravilhosas e
igualmente combinadas, e Aiden estava em modo pleno de Instrutor,
chamando comandos em sua voz profunda, estranhamente musical. Eu me
encontrei sentindo falta da atenção de um para um.

Inferno, eu estava sentindo falta de um monte de atenção.

Uma coisa tinha ficado clara nos últimos três dias - algo estava
definitivamente acontecendo com Aiden. Não que ele me evitasse. Toda
noite, ele se juntava a mim na cama, me puxava para perto, e me segurava.
Nada progredia mais do que isso, mesmo eu sentindo que ele queria mais. Ele
só não fazia um movimento, e eu não tinha ideia do porquê. Eu tinha certeza
que o jeito que eu acabava me enrolando em torno dele era prova de que eu
estava disponível para alguns momentos felizes.

Mordi o lábio quando me virei para a última rocha, sacudindo os ombros.


Não houve outro pesadelo com Seth, graças aos deuses. Uma parte de mim
suspeitava que tinha algo a ver com o fato de que eu não conseguia dormir
até que Aiden dormisse. Talvez apenas saber que ele estava lá ajudava, mas
ele não ia dormir até ficar tarde, o que normalmente significava que levava
umas duas horas para que eu caísse no sono, e quando ele acordava ao passar
o raiar da aurora, eu também acordava. Já que eu estava jogando akasha
diariamente, eu estava sendo drenada como uma vítima de daimon.

Mas afastei a fadiga. Como Marcus disse uma vez, eu era um monte de
coisas, mas não era estúpida. Eu sabia por que Apolo me queria trabalhando
com akasha. Ele estava me preparando para lutar contra Seth. E eu
precisava de tudo em meu arsenal para evitar a transferência de poder que
acabaria com tudo.

Havia um problema inerente com treinar para um combate cara a cara


com Seth. Como é que eu ia lutar com ele quando tudo o que ele precisava
era um toque e algumas palavras sussurradas em grego?

Sim, nós estávamos fadados ao fracasso.

Pânico martelava no peito quando meu olhar derivou sobre os que me


rodeavam. Se alguma coisa desse errado, que seria o mais provável, todos
eles estavam em risco. Lea poderia acabar como sua irmã, Olivia como
Caleb, Luke e Solos como todos os Sentinelas que tinham sido abatidos por
Lucian e seu exército. Marcus poderia acabar como minha mãe.

Meus olhos se estabeleceram em Aiden.

Deacon tinha levantado e estava ao lado do seu irmão mais velho. Sob a
luz do sol, seus cachos loiros estavam de um platina pálida. Os irmãos
compartilhavam a mesma cor de olhos marcantes, mas era só isso. Como yin
e yang, noite e dia, de pé lado a lado.

As mãos de Deacon estavam colocadas em torno de alguma coisa, e


quando ele levantou a cabeça, um sorriso genuíno se propagou em seus lábios
e os olhos cinzentos brilhavam. Aiden riu com qualquer coisa que Deacon
tinha dito.

Eles poderiam acabar como seus pais.

O medo fez a minha pele ficar tensa enquanto era substituído pelo
pânico. Eu esfreguei minha têmpora, forçando a respiração para dentro e
para fora de maneira uniforme. Ninguém ia morrer. Não haveria mais mortes.
Não poderia haver. Todo mundo já sofreu o suficiente.
Mas havia o Destino. Não havia tal coisa como pagamento de dívidas,
quando se tratava do Destino. Ele simplesmente não se importava, ou
reconhecia experiências passadas.

Saber isso me fazia querer cair subitamente no frio, na grama úmida, e


chorar como um bebê irritado e gordo.

— Alex? — A voz suave de Solos me tirou dos meus pensamentos


incômodos.

Eu assenti com a cabeça e concentrei-me na última pedra. O que eu não


gostava sobre o uso de akasha era o fato de que o zumbido na minha cabeça
sempre ficava mais forte, como se invocar o elemento mais poderoso de
alguma forma afetasse o vínculo. Nenhum dos Apollyons já tinha pensado ou
discutido isso no passado, então eu não tinha ideia se isso era verdade.

Chamando pelo akasha, eu deixei isso passar. O raio de luz azul estava
incrivelmente intenso, quebrando em seu poder. Silêncio e em seguida outro
estalido. Desta vez atingiu a rocha no meio e a coisa não explodiu, mas foi
reduzida a um monte de pó.

Solos soltou um assobio baixo quando ele encarou a poeira e a terra


queimada.

— Me lembre de nunca te irritar.

Eu sorri quando me afastei, deixando o zumbido do akasha recuar e se


acalmar. Me curvando, peguei minha água. Sobre a borda, eu observei Olivia
dar um chute de rotação que fez Lea cair vários metros.

Aiden aplaudiu.

— Perfeito, Olivia. — E então com a Lea, — Você hesitou. Se você não


tivesse hesitado, teria bloqueado esse chute.

Acenando, Lea levantou-se e se espanou para tirar o pó. Ela rapidamente


caiu para trás em posição e correu novamente.

Uma baixa e irritante dor floresceu em minha têmpora, fazendo meu olho
direito piscar todo nervoso. Eu joguei a garrafa para baixo e virei-me para
Solos. Sem mais rochas para destruir, fui entregue a Marcus para trabalhar
nos elementos.
Um pouco fora do grupo principal, ele levantou as mãos. Uma rajada de
vento pegou. Sacudiu ramos e folhas frescas, minúsculas, rodadas no ar
como um vento cilíndrico na minha direção.

Eu levantei minhas mãos, e ao contrário de antes de ter Despertado, eu


encontrei o elemento ar com o meu próprio. Sua explosão era fraca sob a
força da minha. Incrível como o elemento ar tinha sido meu maior inimigo
antes, mas agora era apenas um leve aborrecimento.

Até mesmo Deacon e Laadan se envolveram mais tarde do dia. Laadan


trabalhou com o elemento ar e Deacon começou a criar pequenos incêndios e
a controlá-los. Não imagino os dois brigando, mas neste momento, todo
mundo se tornou um guerreiro.

Aiden assistiu seu irmão com os olhos apertados e um maxilar apertado,


tão apertado que eu me perguntei se ele ainda tinha algum molar.
Finalmente, ele deixou os mestiços e seguiu para onde Deacon tinha várias
pilhas de galhos queimando.

— O que você está fazendo? — Aiden perguntou.

Deacon olhou debaixo de seus cachos.

— Estou me tornando um piromaníaco.

O humor se perdeu em Aiden.

— Eu sei o que você está pensando.

— Ah, diabos, então se for esse o caso, isso é constrangedor.

As costas de Aiden ficaram rígidas.

— A menos que você esteja praticando para fogueiras de piquenique, você


está perdendo seu tempo.

— Mas…

— Você não precisa fazer isso. — Aiden acenou com a mão sobre as pilhas
de galhos queimando e as chamas fracassando. — Não quero você envolvido
em nada disto.

Deacon se esticou até sua altura total, o que significava que só vinha até
os ombros de Aiden.

— Você não pode me impedir, Aiden.

Ah, coisa errada para se dizer.

— Você quer apostar nisso? — Aiden rosnou, sua cabeça caindo para seus
olhos ficarem no nível do seu irmão.

Destemido, Deacon manteve sua postura, mas deixou cair a sua voz.

— Você espera que eu me sente e jogue cartas, enquanto todo mundo está
fazendo alguma coisa importante?

— Sim, eu espero, na verdade.

Deacon riu sem humor.

— Eu posso ajudar.

— Você não é treinado. — As mãos dele formaram punhos em seu lado. —


E antes de você dizer, você não é todo mundo.

— Eu sei que não estou treinado, mas não sou inútil, Aiden. Eu posso
ajudar. — Eles estavam em uma épica briga que eu não tinha visto antes,
especialmente não da parte do Deacon relaxado. — E me pedir para sentar e
assistir a todos os outros - pessoas que me preocupo, pessoas como você – se
prepararem para arriscar suas vidas enquanto eu não faço nada, não é justo.

Aiden abriu a sua boca, mas seu irmão foi mais rápido.

— Eu sei que seu comportamento de supercontrole vem de um lugar bom,


mano, mas não pode me proteger para sempre e você não pode continuar me
mimando. É um desperdício de tempo, porque mesmo se você me proibir de
me envolver, não importa. Não pode me impedir. — Deacon tomou fôlego. —
Eu preciso ajudar, Aiden.

Algo que Deacon disse a Aiden causou uma atrocidade de bombas


começadas por ‘f’ juntas. Minhas sobrancelhas voaram. Aiden raramente
insultava ou perdia sua calma, mas rapaz, ele era uma granada que tinha
sido ativada.

Ele deu um passo para trás, colocando suas mãos nos quadris. Quase
pensei que ele ia arrastar Deacon para dentro da cabana e trancá-lo lá, mas
em vez disso, ele mexeu a cabeça em um aceno lacônico.

— Está bem. Se isto é o que você… precisa, então tudo bem.

Eu estava atordoada em silêncio. Assim como Deacon. Sem mais uma


palavra, Aiden voltou para onde esperavam os mestiços.

Os olhos de Deacon encontraram os meus e ele encolheu os ombros.

Chocada que Aiden tinha desistido – e um pouco alegre de que ele estava
vendo Deacon como algo mais do que o seu irmãozinho que festejava demais
– eu segui Marcus para o resto do grupo.

Nós praticamos pelo resto do dia e até cheguei a usar o elemento ar


contra o resto dos mestiços, forçando-os a quebrar o meu bloqueio. Eu odiava
fazer isso, porque eu sabia quão impotente alguém se sentia quando o
elemento ar era usado para prender, mas os usuários do elemento ar eram os
mais comuns, o que significa que mais da metade dos daimons utilizavam o
ar. Era uma das razões pelas quais tantos mestiços morriam em batalha
contra eles.

Então nós tivemos que lidar com isso.

Fogo e terra eram raros entre os puros. Aiden e Deacon eram os únicos
que eu conhecia que exerciam o fogo, e não conhecia um puro que
controlava a terra, embora já tivesse visto sendo usado uma vez, no
Covenant de Nova Iorque. O elemento água vinha a calhar, se o usuário
estivesse perto da água ou na chuva. Alguns pensavam que eles tinham um
elemento de baixa qualidade, mas eu sabia que não era verdade. Eles podiam
tirar água de canos – de qualquer coisa.

Eu estava escalada para lutar contra a Lea. Não muito tempo atrás, eu
teria experimentado uma espécie de satisfação em derrotá-la, mas as
coisas... as coisas estavam tão diferentes agora.

Olhamos uma para a outra por alguns segundos, e então ela assentiu.

Lentamente, com relutância, eu levantei minhas mãos e puxei o ar em


torno de mim. Um fluxo vicioso de vento se formou atrás dos meus dedos, e
então deslizou através deles. Como com o akasha, a minha mira não era
muito boa, mas atingiu Lea abaixo do peito, jogando-a de costas.
Eu me mexi para frente, os braços tremendo enquanto eu forçava o
elemento nela. Era difícil olhar para ela, difícil não me ver lutando e se
debatendo no chão, incapaz de ganhar equilíbrio.

Aiden se agachou atrás dela, latindo ordens a sua maneira suave, mas o
melhor que ela podia fazer era erguer as pernas para cima e só.

Seu corpo tremia enquanto seus lábios se puxaram para trás em um


rosnado. Ela lutou para sentar, e eu queria que ela o fizesse, porque a partir
daí, ficava mais fácil quebrar o domínio, mas o elemento a prendeu pelos
ombros até a grama.

Onda após onda de ar batiam nela, e ela jogou a cabeça para trás e gritou
quando levantou a mão, os dedos agarrando um inimigo invisível.

— Lea, vamos lá. Use os músculos centrais, — Aiden disse, levantando


seus cílios para me furar com olhos de concreto. — Empurre através dele...

Eu odiava isso, odiava tanto isso. Meu corpo inteiro tremeu.

Outro grito quando ela bateu as mãos nas lâminas curtas da grama. Seus
dedos cavaram, rasgando a poeira. Tufos surgiram quando ela se empurrou
em uma posição sentada. Eu comecei a sorrir, mas a força de Lea
recuperava-se rapidamente e eu me precipitei.

Ela cortou o elemento, braços envolvendo minha cintura, enquanto ela


batia em mim. Caímos, um emaranhado de braços e pernas. A parte de trás
da minha cabeça bateu forte no chão. Estrelas explodiram atrás de minhas
pálpebras. O ar correu dos meus pulmões em um aperto doloroso.

O som de aplausos foi fulminante, e eu acho que Deacon gritou:

— Briga de garotas!

E então houve silêncio. Ninguém se mexeu. Gosto de pensar que todo


mundo estava se preparando para um enorme ataque de Apollyon da minha
parte.

— Droga, — eu grunhi, piscando várias vezes. Através do cabelo


acobreado de Lea, o céu tinha uma cor suave de azul.

Usando seus braços, Lea levantou e sorriu para mim.


— Vamos chamar isso de um pouco de vingança. — Ela saiu e pôs-se de
pé, ainda sorrindo amplamente. — Bem, isso foi divertido.

Fiquei estatelada no chão, o latejar na minha têmpora direita agora se


estendendo para a parte de trás do meu crânio. Bem possível que ela tivesse
soltado algo com a pancada – espero que nada de importante.

Uma forte mão bronzeada apareceu na minha visão.

— Sobe?

Colocando a minha mão na de Aiden, eu deixei ele me puxar para me


levantar e fiquei ali enquanto ele limpava os pedaços de terra dos meus
ombros doloridos. Pensando bem, meu corpo todo doía. Um pequeno sorriso
brincou em seus lábios cheios. Nossos olhares se encontraram e enquanto
todos circulavam sobre nós, naquele momento, era apenas ele e eu.

Aiden se inclinou sobre mim, seu hálito quente contra a curva do meu
pescoço. Um arrepio se afundou sobre a minha pele, e a dor na minha
têmpora direita se abrandou. Eu respirei fundo, me cercando em seu
masculino cheiro de terra. Todo mundo em torno de nós desapareceu.

— Eu sei o que você fez, — ele sussurrou.

Eu me empurrei para trás, estreitando os olhos. Não eram as palavras


doces que eu estava esperando que ele sussurrasse.

— O quê?

Arqueando uma sobrancelha, ele se virou e se juntou presunçoso ao grupo


de congratulações se formando em torno de Lea. Eu coloquei minhas mãos
em meus quadris, balançando a cabeça. Não havia nenhuma maneira de que
ele pudesse saber. De jeito nenhum.
Quinze
Mais tarde naquela noite, eu estava na caça e Aiden era minha presa.
Após o treinamento, ele tinha desaparecido. Depois do jantar, ele tinha
desaparecido de novo, e horas se passaram desde então. Era poucos minutos
depois da meia-noite, e eu sabia que ele não estava nas rondas. Solos estava,
e a suspeita de que Aiden estava me evitando estava virando uma grande
explosão paranoica.

Rondando pelo andar de baixo, eu esperava queimar a maior parte da


energia nervosa e evitar o início de uma dor de cabeça. Agora, era apenas
uma dor estúpida atrás dos meus olhos, mas eu tinha a sensação de que ia se
transformar em uma grande enxaqueca.

Havia outra longa noite pela frente, agravada por onde meus
pensamentos estavam. De todas as coisas com as quais eu deveria ter me
preocupado no momento, eu sabia que não era isso, mas eu odiava que havia
essa parede que tinha saído do nada. E era uma parede estranha que...

Eu resisti a uma súbita e terrível lembrança de Aiden olhando para a


garrafa de Elixir, eu estava na cozinha depois do meu primeiro jantar de
volta à terra da sanidade. Será que ver o Elixir o lembrou da decisão que ele
tinha tomado? Ele não poderia estar... se sentindo culpado por me colocar
no Elixir, poderia? Tenho certeza que todo mundo concordaria que tinha
sido necessário.

— Você parece irritada. — A voz de Lea me sacudiu dos meus


pensamentos.

Eu estava fora de um pequeno escritório que incluía apenas um sofá e


uma mesa. Estantes forravam a parede, mas a maioria das prateleiras
estavam vazias. A única luz vinha da pequena lâmpada à espreita sobre o
encosto do sofá.

— Eu não estou irritada. — Eu estava confusa, frustrada e paranoica,


cansada e... ok, eu estava um pouco irritada.

Ela colocou uma mecha de cabelo para trás. Um momento de silêncio se


passou e, em seguida, disse:
— Eu sei o que você fez.

Essa era a segunda vez que alguém me dizia isso em poucas horas, e
honestamente, nenhum deles poderia realmente saber. Poderiam? Não era
como se eu usasse uma placa na minha testa.

Eu olhei fixamente para Lea.

— Eu não tenho ideia do que você está falando.

Ela fez um show de lentidão fechando o livro e colocando-o de lado.


Reprimindo um gemido, eu entrei na sala e encostei-me à mesa.

— O quê? — Eu exigi, cruzando meus braços.

Minha arqui-inimiga olhou para mim com firmeza. Não importava o


quanto eu a destruísse ao longo dos anos, ela sempre voltava. De certa
forma, nós éramos muito parecidas. Éramos duas fêmeas alfa, sempre na
garganta uma da outra.

Mas era mais do que isso.

Em um lampejo de visão perturbadora, eu sabia por que tínhamos nos


tornado inimigas, muito tempo atrás. Quando eu era jovem, antes de mamãe
arrastar minha bunda para fora do Covenant, antes de Lea e eu odiarmos
uma a outra, nós costumávamos ser decentes. Isto é, até que um dia, eu
disse algo terrível para ela.

Mesmo com dez anos de idade, Lea amava a madrasta puro-sangue e a


meia-irmã, a tal ponto que o resto de nós mestiços pensávamos que algo
estava errado com ela. A maioria dos puros ignoravam suas crianças
mestiças, especialmente os que não tinham gerado ou dado à luz aos
mestiços. Padrastos em nosso mundo eram verdadeiros monstros. Mas no
mundo de Lea, ela tinha uma madrasta puro-sangue que a amava muito.
Toda segunda-feira, depois de passar o fim de semana com sua madrasta, Lea
falava sobre todas as coisas maravilhosas que tinham feito juntas – compras,
assistiam a filmes e tomavam sorvete. Nenhum de nós tinha isso com os
nossos monstros. Lucian costumava me trancar no meu quarto quando
mamãe não estava em casa.

Então, naturalmente, tínhamos ficado com ciúmes.


Nós a perseguimos constantemente sobre seu amor por sua madrasta.
Destruímos o vestido que ela tinha comprado para Lea, derramando suco de
cranberry sobre ele. Escondemos o pequeno álbum de fotos que Lea trazia
com ela o tempo todo. Fazíamos bolinhas com listras cor de rosa, cheio
dessas fotos dela e Dawn, sua meia irmã de sangue puro. Uma vez eu tinha
encontrado um cartão que a madrasta de Lea tinha escrito a ela e escondido
em um de seus livros.

Eu o rasguei em pedaços na frente de Lea, rindo enquanto ela chorava.

Então, um dia, enquanto estávamos todos correndo em voltas, Lea tinha


parado para olhar um visitante puro-sangue membro do Conselho. Seu rosto
tinha assumido esse brilho que nenhum de nós entendia. Parecia respeito e
admiração. Mas isso não podia estar certo. Porque, como meio-sangue, nós
não olhávamos para os puros com admiração aberta, como se fossemos
capazes de cortar o nosso braço esquerdo para ser como eles.

Depois da aula, eu tinha encontrado Lea sentada no pátio com seus


amigos. Seguida por Caleb e alguns outros, eu invadi seu círculo e fiquei no
meio. E eu disse a maior e pior coisa que eu poderia dizer para outro meio-
sangue.

— Você tem mais de puro-sangue em você do que mestiço.

A mesma coisa que Seth tinha me dito antes.

Pensando sobre isso, eu acho que poderia ter cuspido nela, também.

Lea praticamente me odiava depois disso, e honestamente, eu não sei


como tinha esquecido isso. Então, novamente, eu provavelmente escolhi
esquecer o que começou nosso ódio. Eu sempre marquei a animosidade de
Lea comigo como um produto de sua vadiagem no geral, quando na realidade
eu não tinha sido nada mais do que uma valentona.

Parecia tarde demais para pedir desculpas agora, e conhecendo Lea, não
mudaria nada, não que eu esperasse que mudasse.

Lea ficou me olhando agora, a cabeça inclinada para o lado como se ela
soubesse onde meus pensamentos tinham ido. Ela sorriu com força.

— Você aliviou no elemento ar, enquanto estávamos lutando.


Minha boca se abriu, mas ela se apressou.

— Eu não teria quebrado o seu bloqueio se você não tivesse aliviado o


elemento. Eu senti que a pressão diminuiu, e eu não percebi imediatamente
que você fez isso, mas eu percebi isso depois, — ela disse, como se quisesse
provar que ela tinha sido inteligente o suficiente para ver isso. — O que eu
não entendo é por que você fez isso. Você podia ter me empurrado direto no
chão. Deus sabe que nunca teve problemas para vir em cima de mim antes. O
que há de tão diferente agora?

Desdobrando meus braços, eu agarrei a borda da mesa. Eu não tinha ideia


do que dizer. Lea estava certa. Eu tinha aliviado o elemento ar, e esta não
era a única coisa que ela estava me chamando a atenção. Há alguns meses
atrás, se eu tivesse controle sobre o elemento eu a teria jogado pela floresta
para me divertir, talvez até jogado outra maçã no rosto dela. Tudo era
possível.

Eu puxei o meu cabelo, puxando a trança grossa sobre um ombro. Lea


esperou pela minha explicação e eu senti meu rosto corar.

Seus olhos de ametista se estreitaram.

Soprando uma respiração baixa, eu revirei os olhos e joguei meu cabelo


para trás por cima do meu ombro.

— Tudo bem. Você me pegou. Eu deixei, e eu fiz isso porque eu me lembro


o quanto isso me pressionava e me fazia sentir impotente. Eu odiava quando
Seth fazia isso comigo.

Ela empalideceu sob sua pele sempre bronzeada.

— Ele... ele fez isso com você?

— No treinamento, — eu disse, descartando onde sua mente estava,


obviamente, lidando com isso. — De qualquer forma, eu não poderia fazer
isso com outra pessoa, mesmo que essa pessoa seja uma metida demasiado
bronzeada.

Lea ficou me olhando um momento, depois esboçou um sorriso.

— E isso está vindo de Alex, extraordinária fugitiva do Covenant e


Apollyon psicopata.
Meus lábios tremeram.

— Ow. Queime.

Virando a cabeça, ela escondeu o seu sorriso, mas rapidamente ficou séria
quando ela me encarou.

— Você mudou muito, Alex.

Parte de mim queria negar, mas era verdade. Enquanto eu olhava para a
menina de cabelos acobreados, percebi que nós duas tínhamos mudado
irrevogavelmente. Não havia volta para as meninas que nós tínhamos sido
durante o verão passado.

Lea suspirou e franziu o nariz.

— Então... isso é estranho.

Eu ri.

— Sim, é. Eu sinto que preciso insultá-la um pouco mais.

Ela recostou-se em uma expansão arrogante quando ela levantou as


mãos.

— Faça o seu melhor.

— É muito fácil, — eu disse, deixando a mesa, sentindo o sangue correr


de volta para meus dedos. — Eu vou esperar que você faça alguma coisa que
me tire do sério. Tenho certeza de que não vai demorar muito.

— Provavelmente não, — respondeu ela. — Estou surpresa que você não


está no traseiro de Olivia.

Eu arqueei uma sobrancelha.

— Tentando me tirar do sério tão cedo? Estou surpresa.

Lea deu de ombros e, em seguida, houve uma pausa.

— Olivia me disse que você viu Caleb duas vezes. Isso era... era verdade?

Eu balancei a cabeça.
— Eu o vi quando fui ao Submundo, e ele me visitou logo antes de eu
escapar.

Suas espessas pestanas foram para baixo.

— Ele estava bem?

E então me atingiu. Não era preocupação por Caleb ou algo assim, mas a
razão pela qual ela estava perguntando tinha a ver com sua meia-irmã.

— Sim, ele estava mais do que bem. Ele estava mais feliz do que estava
antes de morrer. — Um nó se formou na minha garganta e eu me concentrei
nas estantes vazias. — Ele disse que minha mãe estava lá também, então eu
tenho certeza que seus pais e Dawn estão lá... e eles estão bem.

Ela teve uma respiração sufocada, e como eu, de repente ela se


concentrou nas bordas desgastadas do braço do sofá. Todos os mestiços
tinham sido treinados a não mostrar dor, e os deuses não permitiam que
chorássemos. Todo o mantra não-mostrar-fraqueza era difícil de deixar para
trás.

Eu caí sobre a almofada ao lado de Lea e peguei o livro que estava lendo.
Virando o livro para cima, minhas sobrancelhas voaram quando eu dei uma
boa olhada na capa robusta.

— Espere. Este livro é sobre alienígenas?

Ela pegou-o de volta de mim.

— Sim.

— Sério?

— Mas eles são aliens gostosos. — Ela bateu no rosto do cara com um
dedo fino. — E ele pode ser meu ET a qualquer dia.

Eu ri abertamente, e soava um pouco estranho estar rindo com Lea de


todas as pessoas, mas ela sorriu um pouco. Lea e eu nunca seríamos
melhores amigas, mas eu queria saber se, um dia, nós realmente
consideraríamos uma a outra como amiga.

Uma fatia aguda de dor apareceu por trás dos meus olhos e em minha
têmpora. Estremecendo, levantei-me e respirei fundo.
— Não temos nenhum Tylenol por aí? — Outro golpe de dor, como o fogo
cruzando os vasos em meu cérebro, causado náuseas, subindo na minha
garganta. — Ou uma marreta? Alguma coisa?

— Eu tenho certeza que há algo – hey – hey – você está bem? — A voz de
Lea de repente soou tão, tão longe, mas sua mão estava no meu braço.

— Sim, eu estou... bem. — Dei um passo e senti um tremor em minhas


pernas. Os músculos se contraíram, eu cedi.

Uma explosão brilhou no quarto mal iluminado, me cegando


temporariamente. Eu pensei ter gritado um aviso. Eu pensei ter me virado
para ir em frente a Lea, mas quando a luz branca intensa recuou, eu não
estava mais na pequena sala.

A câmara circular era feita de arenito e forrada com pilares de mármore.


Glifos estranhos cobriam as paredes, runas que combinavam com as que
deslizavam sobre minha pele. Não havia nada na sala – sem sofá ou estantes
ou Lea – mas eu não estava sozinha.

— Que diabos? — Eu exigi.

Diante de mim estava um deus, um que não parecia ser muito mais velho
do que eu. As asas aladas que ele usava escondiam a maior parte do seu
cabelo, mas mechas castanho-claro caíam para fora logo abaixo. Ele usava
um manto branco chlamys.

O deus deu um pequeno sorriso.

— Não mate o mensageiro.

E então ele piscou.

— Mas que di…

Então eu o vi. Encostado em um dos pilares, de costas para mim. O traje


preto familiar, a onda de cabelos loiros, agora um pouco maior... o
reconhecimento enviou uma terrível onda de choque gelado de descrença
através de mim.

— Seth, — eu sussurrei.

Um instante se passou e ele virou a cabeça para o lado.


— Eu não estou muito feliz com você, Alex.

Horror surgiu rapidamente e eu dei um passo involuntário para trás.


Antes, eu nunca o teria temido – teria rido com o pensamento. Mas agora eu
estava com medo, não dele, mas do que ele poderia fazer.

Seth virou-se para mim e seu rosto estava como eu me lembrava,


mandíbula forte e expressivos lábios, olhos como um líquido âmbar e uma
beleza que era perfeita demais. Ele sempre me fez lembrar das esculturas
feitas nas imagens dos deuses.

Ele arqueou uma sobrancelha zombeteira.

— O quê? Você está sem fala? Essa seria a primeira vez.

— Como? — eu resmunguei, o coração acelerado dolorosamente.

— Nós ainda estamos conectados, e eu estava esperando o momento certo


para... como devo dizer isto? Fazer uma chamada de longa distância através
da nossa ligação? — Ele sorriu aquele meio-sorriso maroto. — Escudo ou não,
eu ainda posso alcançá-la... com uma pequena ajuda de amigos em altos
escalões.

O deus...

— Hermes?

Seth assentiu.

— Ele sempre foi um dos meus favoritos. Trazer você para mim
certamente irá irritar alguns dos outros deuses, que era tudo o que eu
precisava para convencer Hermes a fazê-lo. E antes de saltar para a
conclusão errada, Hermes não é o deus responsável por mim.

O fato de que Seth tinha convencido Hermes a dar o golpe me irritou,


mas não fazia sentido. Como havia Hermes me encontrado? Confusão me
inundou, mas havia algo que tinha gosto de sangue por trás disso.

— Eu não entendo. Onde estou?

— Você está onde eu quero que você esteja. — Ele deu um passo calculado
para frente.
Eu avancei para trás.

— Isso não é bem uma resposta.

Seth inclinou a cabeça para o lado, estreitando os olhos enquanto ele


continuava vindo para frente.

— Você acha que merece uma resposta?

Agora eu sabia o que tinha gosto de metal na parte de trás da minha


garganta. Raiva.

— Estou sonhando, Seth?

Ele riu; enquanto estávamos conectados, ele ria muito, mas agora eu
percebi que havia uma diferença entre o Seth real e a versão fantasma dele.
Sua presença era potente; sua voz tinha uma qualidade musical rouca com o
menor sotaque. E sua risada... sua risada era profunda e presunçosa.

— Você não está sonhando, Alex. Como eu disse, eu usei a nossa ligação
e Hermes ajudou. Isso... — Ele abriu os braços para fora, e a pele dourada
estava coberta de símbolos em movimento. — Está aqui. — Ele bateu um
dedo no seu crânio. — É como conversar pelo Skype.

Minha mão coçava para derrubar esse sorriso do seu rosto.

— Então isso não é real?

— Oh, é real, em certa medida.

Eu acho que tinha andado para trás o suficiente e agora minhas costas
estavam contra a parede de arenito quente.

— Isso não pode ser real.

Seth parou na minha frente e se inclinou, chegando tão perto que eu


virei minha cabeça, meus dedos enrolando impotentes ao meu lado. Sua
respiração dançou sobre o meu rosto.

— Se você está preocupada que eu possa transferir o seu poder neste


estado, eu não posso. Nem posso realmente conseguir alguma coisa fora do
nosso vínculo. Seus escudos — ele revirou os olhos, — ainda estão intactos.
Eu provavelmente não deveria ter te ensinado a fazer isso, mas de qualquer
maneira, você não está realmente aqui. Hermes montou a nossa conexão
com o seu subconsciente e ligou-o com o meu.

Deuses, isso soava completamente bagunçado.

— Eu senti sua falta. Portanto, relaxe.

Relaxar? Era para eu relaxar quando eu estava aqui, onde quer que aqui
fosse, com o Seth pirado? Minha cabeça virou na direção dele. Nossos rostos
estavam a poucos centímetros de distância.

— Você sentiu minha falta?

— Sinto falta da Alex que vivia para me fazer feliz. — Ele riu com o que
eu tinha certeza de que era um olhar de eu vou matar você que passou pelo
meu rosto. — Tudo bem. Eu queria ver se isso iria funcionar e funcionou.

— Então, se eu te tocar, nada vai acontecer?

— Correto. — Seus olhos cor de âmbar queimaram. — Espere. Você quer


me tocar? Eu gosto de onde isso está indo.

Eu sorri, e em seguida, um segundo depois eu plantei meu punho em seu


estômago com tudo o que eu tinha em mim. Se dobrando, Seth resmungou e
soltou uma maldição baixa. Seguindo em frente, eu trouxe o meu joelho para
cima, batendo no mesmo lugar, onde meu punho tinha batido segundos
antes.

— Caramba, Alex, eu posso sentir isso. — Seth se ergueu, esfregando o


estômago.

Doce satisfação com gosto de açúcar na minha língua.

— Bom! Porque há mais de onde isso veio, seu babaca psicótico! — Eu


balancei novamente.

Seth reagiu rapidamente, capturando a minha mão na sua. Ele empurrou


para trás, pegando o meu outro pulso, que estava indo para o seu rosto.
Menos de um segundo depois, ele tinha os meus pulsos presos acima da
minha cabeça.

Sorrindo como se eu não tivesse chutado o ar para fora de seu estômago,


o que totalmente me irritou, ele me pressionou.
— Quantas vezes eu disse a você, Alex? Bater não é bonito.

Eu me empurrei para fora da parede, mas tudo o que consegui foi fazer
nossos corpos ficarem mais retos. Raiva aprofundou o tom de seus olhos,
com um interesse a mais e luxúria. E apesar da minha pele se arrepiar, eu
percebi uma coisa importante. A corda não estava batendo viva como ela
sempre fazia quando eu estava ao seu redor, especialmente quando ele estava
praticamente em cima de mim. Ela descansava dormente na boca do meu
estômago.

Isso era real... mas não era real. Ainda assim, eu não estava feliz com o
que estava acontecendo.

— Você está no meu espaço pessoal. — Meu queixo doía de quão duro eu
estava rangendo os molares. — Me solta.

— Não. — Seus olhos se arregalaram. — Você poderia me bater de novo.

— Você pode contar com isso! — Raiva fervia dentro de mim, engolindo a
confusão e o terror que tinham tamanho controle sobre mim. — Como você
pôde fazer isso comigo? — Eu chutei a parede, mas Seth empurrou de volta.
— Você prometeu que não iria usar a nossa ligação contra mim, e você usou!
Você me transformou na presidente do Fã Clube do Seth.

Seus lábios tremeram.

— Não vejo nada de errado com isso.

Eu fervia.

— Eu me referia a você como meu Seth!

— Mais uma vez, não vejo nada de errado com isso.

Minhas mãos se curvaram em punhos e eu olhei para ele.

— Isso era errado, Seth! O que você está fazendo é errado! Você não
entende isso? Merda! — Jogando minha mão para trás, ela bateu contra a
parede rachada. Uma dor muito real explodiu no meu braço. — Merda!

— Agora, acalme-se. Você só vai se machucar. — Malícia brilhava em


seus olhos dourados, e por um instante, lembrei-me de Seth – Seth antes de
ficar louco com o poder do éter, que me irritava tanto quanto ele me fazia rir
– o menino que tinha roubado um pedaço do meu coração.

Olhei em seus olhos, sentindo um pouco da raiva escoando para longe.

— O que aconteceu com você?

Ele piscou.

— O quê?

Caindo contra a parede, eu abaixei meu olhar.

— Você sempre foi arrogante e louco, mas...

— Obrigado, — ele disse secamente, mas o aperto em torno de meus


pulsos ficou solto.

— Mas você nunca teria feito isso comigo, usado o vínculo contra mim.
— Eu levantei o meu olhar. — Você nunca teria atacado o Conselho ou
ficaria ao lado de Lucian. O que aconteceu com você?

Um músculo pulou na mandíbula de Seth.

— Eu fiquei inteligente, Alex. O que aconteceu com você é a melhor


pergunta. A garota que eu conheci teria ido contra o Conselho sem pensar
duas vezes. Ela ainda teria odiado Lucian, mas ela teria visto que o que ele
estava tentando fazer era a coisa certa.

— Não. — Eu virei minha cabeça, engolindo em seco.

— Sim! — Movendo meus pulsos com uma mão, ele pegou meu queixo
com a outra, forçando-me a olhar para ele, e eu odiava o brilho quase febril
em seus olhos. — Ele quer mudar o mundo.

— Ele quer governá-lo, Seth! Há uma grande diferença. E você não é nada
exceto um peão. — Eu cavei a fúria em mim, agarrando-me a ela. — Ele está
usando você, Seth. Você costumava ser mais forte do que isso, mas você é
fraco, fraco pelo poder.

A raiva brilhou em seu rosto como um relâmpago quando seu aperto se


firmou no meu queixo.

— Eu não sou fraco.


— Você é! Você é tão fraco que não consegue nem ver o que Lucian está
fazendo para você! Você nunca se preocupa com o que está acontecendo com
o mundo? Pessoas inocentes estão morrendo, Seth. — Encontrei seu olhar
furioso, eu queria que ele entendesse, para ver onde tudo deu errado. — Como
você pode estar bem com isso? Você tem que parar com isso.

Seu silêncio era afiado.

— Você entende o que eu vou ter que fazer? — Lágrimas brotaram nos
meus olhos, no mesmo momento eu ouvi o sussurro do meu nome sendo
chamado do que parecia quilômetros de distância.

Seth ouviu também, e ele reconheceu a voz. Seus lábios se repuxaram em


um rosnado.

— Eu vou ter que matá-lo, Seth. — Minha voz fraquejou.

Ele recuou, deixando-me ir tão rápido que eu quase caí. Algo muito
parecido com descrença cintilou em seu rosto e havia mais. Um olhar que eu
não consegui descobrir, e então sua expressão ficou fria.

— Você não pode me matar.

O som da voz de Aiden chamando puxou cada célula do meu corpo.

— Eu vou encontrar uma maneira, porque eu não posso deixar você fazer
isso.

Seth cruzou os braços.

— Você vai fracassar.

Meu coração disparou.

— O que eu tenho que fazer para detê-lo? Diga-me!

Seus lábios se torceram em um sorriso cruel.

— Não há nada que você possa fazer, Alex. Você precisa aceitar o que
está acontecendo, aceitar o nosso destino. Você foi feita para mim, e eu vou
te encontrar. E, se alguém ficar em meu caminho, eu não vou pensar duas
vezes antes de derrotá-lo.
Engoli em seco, enojada, triste, e muito perturbada ao ouvi-lo dizer isso.
Ele tinha feito tantas coisas horríveis, mas ao ouvir aquilo, ver quão
realmente longe ele estava, me cortou profundamente.

— Seth...

Ele se atirou para frente, apertando os lados da minha cabeça.

— Então vá em frente e proteja tudo o que quiser. Como você pode ver, eu
ainda posso chegar até você. — Apertando a testa contra a minha, ele
arrastou uma respiração profunda. — Nós vamos nos ver outra vez em breve.

Seth mudou de novo e eu senti seus lábios escovando minha testa um


segundo antes da luz explodir e me envolver.
Dezesseis
Pulmões queimando como se eu tivesse estado me afogando, eu respirei
fundo e empurrei. Quando a luz recuou dessa vez, olhos cor de cinza
metálico olhavam nos meus.

— Alex? — Alivio tingiu o tom de Aiden, fazendo sua voz profunda e


firme. Seus olhos estavam sombreados com preocupação, mas havia uma
pontada de raiva no fundo deles. — Deuses, Alex, eu pensei...

Pisquei algumas vezes quando o pequeno cômodo entrou em foco a minha


volta. Era o mesmo onde eu tinha estado com Lea. Os braços de Aiden
estavam ao meu redor, e eu estava meia no chão, meia em seu colo. Comecei
a sentar, mas ele colocou a mão no meu rosto, apertando a minha cabeça
contra a sua.

— Espera alguns minutos, — disse ele, virando de modo que suas costas
ficassem contra a parte inferior do sofá. — Você está bem?

— Yeah. — Eu limpei minha garganta, desejando que as batidas do meu


coração se abrandassem. — Isso... isso foi esquisito. Onde está Lea?

— Fora da sala com todos os outros. — Seu polegar traçou um círculo


suave sobre a minha bochecha. — Ela veio e me encontrou quando você
desmaiou. Ela disse que você se queixou de uma dor de cabeça antes de
desmaiar. Isso... a assustou. Você tem certeza que está bem?

Eu desmaiei? Nossa, não só Seth poderia chegar e me tocar, mas ele


podia me causar um desmaio como uma covarde?

— Sim, a dor de cabeça desapareceu. Eu só me sinto um pouco fora de


mim.

Empurrando para ficar sentada, eu girei para encarar Aiden em seu


abraço.

— Quanto tempo eu estive fora?

— Poucos minutos. — Seus olhos procuraram os meus. — Alex, você...


você disse o nome de Seth. Eu pensei... — Ele balançou a cabeça e suas
pestanas voaram para baixo, escondendo os olhos.

— O quê? — Eu coloquei minha mão em seu rosto liso, e então isso me


bateu. Minha respiração engatou na minha garganta. — Você pensou que eu
tinha me conectado com Seth de novo?

Ele não respondeu imediatamente.

— Eu pensei que sim, especialmente quando eu ouvi você dizer o nome


dele. Eu tirei todos da sala. — Aiden olhou para cima, seu olhar se reunindo
ao meu. — Eu não sabia o que ia fazer...

O Elixir não teria sido uma opção. Ele jogou o último que restou pelo
ralo. O que ele teria feito? O olhar em seus olhos me quebrou.

Me inclinei, pressionando minha testa contra a dele. O ato me lembrou


de Seth, mas era muito diferente, significava muito mais.

— Eu vi Seth, mas não me conectei com ele.

Aiden me alcançou com as duas mãos, colocando-as em ambos os lados


do meu rosto. Havia um leve tremor em seus braços poderosos. Nenhum de
nós falou por um longo segundo. Meu coração disparou em um tipo diferente
de batida.

— O que aconteceu? — ele perguntou finalmente.

— Hermes – o maldito Hermes, — eu disse. — Eu realmente não entendo


como ele fez isso, mas ele seguiu a conexão entre Seth e eu e me puxou para
o subconsciente de Seth, ou algum tipo de lixo como esse.

Eu tinha certeza de que Aiden estava quieto porque ele estava com tanta
raiva que não podia formar palavras.

Respirando fundo, eu envolvi minhas mãos em torno de seus pulsos e


disse-lhe tudo. A cada palavra, a fúria de Aiden aumentava até se tornar uma
coisa tangível na sala, grossa como fumaça.

Eu acabei abaixando suas mãos, mantendo as minhas enroladas em torno


dele.

— Era real... mas não era real. Eu não sei se ele vai ser capaz de fazê-lo
novamente, ou se Hermes irá ajudá-lo novamente. Ou se havia algo que eu
estava fazendo ou não fazendo que tornou isso mais fácil.

— Você teve uma dor de cabeça antes de acontecer? — Quando eu


assenti, seus olhos se tornaram tão frios quanto o aço. — Quando você
estava no Elixir, você se lembra de ter dores de cabeça?

Eu balancei minha cabeça.

Ele soltou um palavrão baixinho.

— Você tinha uma dor de cabeça quando o Elixir estava começando a se


desgastar. Você também começava a ouvir a voz de Seth. Era ele tentando se
conectar com você. Eu acho que o mesmo tipo de coisa está acontecendo
aqui com Hermes.

— Merda, — eu disse, atordoada. Então eu pensei em um pesadelo. Me


movendo mais rápido do que Aiden poderia seguir, levantei e me e afastei. —
Eu tive um pesadelo a algumas noites atrás.

Ele levantou-se com fluidez.

— Eu me lembro.

— Eu sonhei que Seth estava no quarto, mas talvez não fosse um


pesadelo. Talvez fosse ele testando o recurso maldito de chamada de longa
distância com Hermes? — Eu xinguei, lutando contra a vontade de pegar e
jogar alguma coisa. — Bem, a coisa boa é que ele não pode fazer nada por
obrigação. Ele não pode ver meus pensamentos ou assumir o controle.

— Não há nada de bom sobre isso, — Aiden rosnou.

— Bem, eu estava tentando ser positiva.

Suas mãos se apertaram ao meu lado.

— Você pode atingi-lo, o que significa que ele pode bater de volta, Alex.
Sim, ele não pode descobrir onde você está, mas isso é uma grande violação.

Eu assenti atordoada. Aiden estava certo. Não havia como dizer se Seth
poderia fazer novamente.

— E não há nada que eu possa fazer se ele fizer isso de novo. Eu juro aos
deuses... — Girando rapidamente, Aiden pegou uma pequena estatueta e
jogou-a através da sala. Ela quebrou a parede, uma explosão de gesso e vidro.

A porta da sala se abriu e Solos espiou, sobrancelhas levantadas.

— Está...

— Deixe-nos! — Aiden ordenou bruscamente, então ele deu um suspiro


trêmulo. — Alex está bem. Nós dois estamos bem.

Solos parecia que estava prestes a discordar, mas ele jogou um outro
olhar para Aiden e decidiu não fazê-lo. Ele fechou a porta.

Eu deslizei a Aiden uma olhada.

— Isso fez você se sentir melhor?

— Não, — ele disparou de volta, respirando fundo, quando ele apontou


para o buraco na parede. — Eu gostaria que fosse a cabeça de Seth.

Ver Aiden perder o controle era algo que eu sempre achei nada menos do
que um indutor de terror, principalmente porque ele nunca perdia o controle,
mas às vezes eu esquecia que ele estava longe de ser perfeito ou santo. Ele
tinha um temperamento – nada tão louco quanto o do Seth ou o meu, mas o
fogo cantarolava em seu sangue.

Eu cruzei os braços, sentindo frio.

— Mas tem que haver uma razão para ele só ter sido capaz de fazer isso
agora. E – e – ele ouviu você chamar o meu nome. — Esperança despertou
dentro de mim. — Seu poder sobre mim não era tão forte.

— Eu aposto que ele estava emocionado com isso.

Recordando a maneira que Seth tinha ficado quando ele ouviu a voz de
Aiden, eu tinha certeza que ele tinha estado malditamente perto de virar um
assassino.

— Tem que haver alguma coisa, Aiden. Nós só precisamos descobrir isso.

Aiden me lançou um olhar escuro quando ele andou pelo quarto, parando
diante da janela.

Mordi o lábio.
— Nós vamos descobrir. Nós sempre descobrimos.

Ele não disse nada, as costas estranhamente rígidas.

— Tem certeza de que você está bem?

— Sim — eu disse, exasperada. — Você pode parar de me perguntar isso?


Eu estou bem. Eu estou bem. Hoje foi um pequeno contratempo, mas…

— Eu sei. — Ele olhou por cima do ombro, com a voz baixa e controlada.
— Eu sei, Alex. Sinto muito.

— Você não tem nada que se desculpar.

Ele soltou uma risada curta.

— Eu tenho muita coisa para me desculpar, Alex.

Olhei para ele. Isto era algo mais do que o que tinha acontecido com
Seth. Sim, ele estava incomodado, principalmente para meu benefício e eu
apreciei isso, mas isso era mais. Pensei na diferença estranha entre nós nos
últimos dias.

Irritação picou minha pele.

— Qual é o seu problema?

— Eu não tenho ideia do que você está falando.

— Você não sabe? — Andei até ele e estendi a mão para colocar a minha
mão em seu rosto. Ele se afastou, e eu senti a pontada no meu peito. — Isso!
Isso é o que eu estou falando.

Ele fez uma careta.

Como com qualquer outra situação na minha vida, quando eu estava


irritada ou assustada com uma coisa, eu praticamente virava toda essa
energia em outra coisa.

— Você está agindo de forma estranha durante alguns dias e


praticamente se escondendo de mim.

— Eu não estou me escondendo de você, Alex. — Um músculo trabalhou


em sua mandíbula, enquanto olhava pela janela. — Você realmente acha que
este é o momento para falar sobre isso?

Eu respirei fundo e senti meu famoso temperamento aparecer para a


ocasião.

— Há uma hora melhor?

— Talvez quando você não tiver acabado de ser sugada para deuses-
sabem-onde por Seth e não estivermos pensando em ir lá fora e ficar cara-a-
cara com deuses-sabem-o-quê. — Ele olhou por cima do ombro, os olhos de
um cinza frio. — Talvez depois.

Oh, eu estava a dois segundos de saltar sobre suas costas e estrangulá-lo


por trás... com amor, é claro.

— Você acha que terá um momento melhor para falar sobre isso? Que em
algum momento no futuro próximo, tudo fará uma pausa para que possamos
ter um papo de coração para coração? — Aiden tinha se voltado para a
janela, mas eu não precisava ver seu rosto para saber que ele não estava
feliz. — Tudo bem. Eu não entendo isso. Nós estávamos bem quando
voltamos. Nós…

— Nós não deveríamos ter feito isso.

Dor cortou em meu peito como se ele tivesse me golpeado. Ao mesmo


tempo, senti as marcas responderem, sangrando em toda a minha pele.

A cabeça de Aiden apontou para baixo e ele amaldiçoou.

— Eu não quis dizer isso. Aquela noite foi a melhor noite da minha vida.
Eu não me arrependo, mas eu deveria ter esperado até você ter tido tempo
para absorver tudo. Eu perdi... eu perdi o controle.

Eu dei um passo para frente.

— Eu gosto quando você perde o controle.

Ele balançou a cabeça em silêncio.

— Eu estava bem, Aiden. Eu não estava machucada. Eu não estou


machucada agora. Então, por que você está se escondendo de mim?
— Eu não estou me escondendo de você.

— Mentira! Você evita passar tempo a sós comigo, a não ser à noite.

Aiden me encarou, enfiando os dedos pelos cabelos.

— À noite, quando estou dormindo, é a única vez que eu não penso sobre
isso, o que eu fiz. Você... não entende. O que eu fiz para você, colocando-a
no Elixir? Eu não mereço outra coisa.

— Você…

— Eu não precisava, Alex. Foi fraqueza minha. Eu não confiava que,


eventualmente, você iria quebrar o vínculo. E, vendo o que ele fez para você?
Eu não posso me perdoar por isso.

Minha boca caiu aberta.

— Você não pode se culpar por isso! Você fez o que era certo.

Raiva brilhou em seus olhos.

— Isso não era o certo.

— Aiden…

— O Elixir era um dos seus maiores medos, Alex! E eu fiz isso com você!

Surpresa, eu dei um passo para trás. Raramente Aiden levantava a voz,


mas eu sabia que sua raiva e frustração não foram dirigidas a mim. Era sua
própria culpa – culpa que ele não deveria estar carregando por aí com ele.

— Como... — Ele veio para a frente, baixando a voz quando seus olhos se
encontraram com os meus. — Como é que o que eu fiz é diferente do que
Seth fez para você – ainda está fazendo com você?

Eu fiquei boquiaberta.

— Colocar-me no Elixir não é a mesma coisa que Seth me transformar


em uma Apollyon psicótica!

— Mas eu despojei você de quem você é, Alex. É a mesma coisa. — Calor


saía dele em ondas, intensificando enquanto os segundos passavam. A
maioria das pessoas teria ficado com medo dele assim.

Eu estava mais chateada – e triste.

— Eu segurei você para baixo e forcei a sua boca para ficar aberta quando
Marcus lhe deu o Elixir. — Ele balançou a cabeça um pouco, como se ele
estivesse aturdido por suas próprias ações. — Você pediu para eu parar e eu
não fiz. Eu assisti o Elixir tomar posse, e fui eu quem se tornou o seu
mestre. Eu não posso... — Ele cortou e se afastou.

Lágrimas encheram meus olhos. Querendo nada mais do que afastar essa
culpa, eu estava sem ideias de como poderia. Dei um passo atrás dele,
querendo apenas abraçá-lo até que ele entendesse que eu não o culpava. Se
houvesse alguém mais teimoso do que eu neste mundo, este era Aiden. Se a
situação se invertesse, Aiden teria tido algo ridiculamente apoiativo para se
dizer. Ele usaria um eloquente conjunto de palavras que significava alguma
coisa, e quando isso não funcionasse, ele apenas me diria como era.

Eu não tinha palavras bonitas, então me contentei com o segundo – er,


terceiro – melhor.

— Olha, eu odeio cortar a sua auto piedade com uma grande dose de
cresça.

Virando-se, as sobrancelhas de Aiden dispararam e ele abriu a boca.

— Não. — Eu coloquei minha mão sobre os lábios – seus lábios quentes.


Todo o meu braço formigava ao entrar em contato. — Você teve que tomar
uma decisão difícil. Todos tiveram. Eu era a Alex malvada. E lembro-me de
ameaçar retirar as costelas de Deacon. Posso entender por que você fez isso.

Ele passou os dedos em volta do meu pulso e retirou delicadamente


minha mão, mas ele não a soltou. Ponto!

— Alex, não se trata de você me perdoar.

— Então, do que se trata? — Eu me aproximei, minhas coxas batendo em


seus joelhos travados. — Eu te perdoo. Inferno, não há nada a se perdoar. E
se há alguma coisa, eu deveria estar te agradecendo.

Soltando minha mão, ele desviou o olhar e balançou a cabeça quando ele
ia para o sofá, sentando-se pesadamente.
— Nunca me agradeça por colocá-la no Elixir.

— Ugh! — Eu joguei a minha mão. Eu estava tão perto de derrubá-lo no


sofá. — Eu não estava agradecendo por isso. Eu estava agradecendo por não
desistir de mim. Por ainda estar lá por mim quando eu estava agindo como
uma psicopata.

Ele olhou para mim, teimoso como sempre.

— Eu quero te estrangular.

Aiden arqueou uma sobrancelha.

Deixei escapar um longo suspiro.

— Todos nós já fizemos coisas que nos arrependemos. Eu estou vivendo


com o fato de que eu ameacei a todos com quem me importo. Você não tem
ideia das coisas que eu pensava – as coisas que eu acreditava quando estava
conectada com Seth. Ou talvez você tenha, mas não é a mesma coisa. E se
eu posso superar isso, então por deuses, você precisa superar isso.

Sua boca se abriu, mas eu não tinha terminado.

— Eu preciso de você agora, mais do que nunca. E eu não preciso de você


para me segurar apenas à noite. — Fiz uma pausa, franzindo a testa. —
Mesmo que isso seja realmente bom e tal, eu preciso que você realmente
esteja aqui.

Dor brilhou em seus olhos prateados.

— Eu estou aqui por você.

— Você não está. — Eu balancei minha cabeça. — Você não pode estar
quando você está de mau humor por aqui, se culpando por algo que você
tinha que fazer. Eu preciso que você vire homem, Aiden.

— Vire homem? — Ele sentou-se esticado de forma preguiçosa e


arrogante, mas a tensão estava enrolada em todos os músculos do seu corpo.
— É uma coisa boa que eu te ame ou eu acharia isso particularmente
insultante.

— Se você me ama, vai superar isso. Você vai lidar com isso, aceitar que
você tinha que fazê-lo, e passar por isso. — Minha respiração ficou presa. —
Porque eu estou com medo da minha mente, Aiden, e eu não sei como
qualquer um de nós irá sobreviver ao que está acontecendo. Agora, eu preciso
de você, tudo de você. Nós – nós – somos mais importantes do que a sua
culpa, ou pelo menos eu pensava assim, mas, aparentemente, eu estou
gastando o fôlego.

Eu estava muito perto de derrubar o sofá e jogá-lo nele, mas ele se


levantou e foi na minha direção antes que eu pudesse piscar um olho. Ele
colocou um braço em volta da minha cintura e nossos olhos se encontraram.
Em todos os lugares que os nossos corpos se tocavam, calor subiu às pressas
para a superfície. Não era como se eu tivesse esquecido o que era estar em
seus braços, eu só não estava preparada para isso.

Eu nunca poderia estar preparada para isso.

Tão pouco estava Aiden. Seus olhos estavam queimando prata líquida e
seu braço apertou em volta de mim.

— Eu nunca iria desistir de você, Alex. Nunca.

— Então por que você está sendo tão…

— O quê? — Sua voz caiu baixa. — Eu estou sendo o que?

Irritante. Teimoso. Determinado. Loucamente sexy.

— Bons deuses, podemos parar de discutir e só, eu não sei, dar uns
amassos?

Uma risada profunda e rouca retumbou em seu corpo e provocou a minha.

— É isso que você quer?

Mais do que o ar que eu respirava.

— O que você acha?

Ele andou para frente, me apoiando até eu estar pressionada contra a


porta fechada.

— Que eu estou seriamente apaixonado por sua mente limitada.

Eu abri minha boca para ressaltar que minhas habilidades de multitarefa


tinham melhorado drasticamente, mas Aiden aproveitou. Sua boca estava na
minha, e o beijo – oh, o beijo matou essa recém-adquirida habilidade. Foi
soprada para fora da janela.

Quando ele levantou a cabeça, apenas um pouco, eu engasguei.

— Tudo bem. Você pode ter um ponto, — disse ele.

— Um ponto? — Eu pensei que eu tinha feito vários.

— É difícil, Alex, lembrando de como você estava, — Aiden admitiu


calmamente. Ele deslizou a mão pela confusão de cabelo na minha nuca,
provocando arrepios dançando sobre a minha pele. — Eu odiei. Odiei cada
momento.

Eu coloquei minha mão em seu rosto.

— Eu sei.

— E tudo que eu conseguia pensar era em ter você de volta. — Ele


apertou os lábios na minha têmpora e, em seguida, no meu rosto. — Mas
você está certa. Eu não estava aqui completamente.

— Você não vai se sentir culpado por isso, também?

Ele sorriu contra a lateral do meu pescoço, seus lábios se movendo contra
o meu pulso batendo descontroladamente.

— Você sempre tem que ser tão espertinha.

Colocando meu braço em volta do pescoço dele, eu sorri.

— Talvez... — Esperança se atreveu a acender. — Você está bem agora?


Estamos bem?

— Estamos bem. — Aiden me beijou suavemente e continuou a me beijar


quando ele me levantou apenas por um braço e me virei. Em poucos
segundos, as minhas costas estavam pressionando contra a almofada e ele
estava em cima de mim, cheio de roupas e coberto com armas. — Eu estou
bem.

— Você está?
Ele sorriu e revelou as covinhas.

— Eu vou ficar.

Eu comecei a dizer algo, mas sua mão caiu ao meu lado, seguindo a linha
do meu peito e, em seguida, mais alto, e eu esqueci o que eu ia dizer. Eu me
senti tonta com a expectativa, de querer e precisar, e uma centena de outras
coisas, enquanto meu coração batia forte e minha respiração ficou curta.

— Obrigado, — ele sussurrou, e, em seguida, trouxe seus lábios nos meus


novamente, me pressionando mais perto, até nossos quadris se encaixarem
firmemente. Sensações loucas e insanas corriam pelo meu corpo. —
Obrigado.

Eu não tinha certeza de como fomos de discussão para isso, ou o que ele
realmente estava me agradecendo, mas eu não estava reclamando, e de uma
forma muito distorcida parecia normal. Aiden me adorou como se eu tivesse
nascido digna de um belo homem tão complicado, e ao longo da noite, ele
realmente me mostrou que estávamos bem, que ele estava bem, e, por
enquanto, era o que eu necessitava para enfrentar o amanhã.
Dezessete
Tive um sorriso estúpido no meu rosto pela maior parte do dia seguinte.
Mesmo que eu estivesse com frio, coberta de lama de treinar na área
protegida, e cansada de usar akasha e os elementos, parecia que eu fora
atingida com um raio da felicidade.

Apenas algumas vezes escorregou, e foi quando eu pensei em Seth e a


façanha que ele conseguira realizar ontem. Depois que Aiden e eu... bem,
quando tínhamos começado a realmente usar nossas bocas para palavras de
novo, concordamos em manter o que acontecera entre nós e Marcus. Não
havia nenhuma razão para surtar todo mundo, e indo pelo jeito que Marcus
reagira, fora uma decisão inteligente.

Marcus não atirara nada, mas estivera tão furioso quanto Aiden.

E eu sabia que era por isso que Marcus alternara com Solos quando
chegou o treinamento de hoje. Mas era esquisito espancar meu tio.

Sempre que o nosso grupo heterogêneo fazia uma pausa, Aiden estava ao
meu lado. Houve momentos quando ele se tornara insuportavelmente quieto
e introspetivo, e eu sabia que ele estava pensando sobre o que fizera com o
Elixir. Ele estava tentando, porém, e isso era o que importava.

Encerramos o dia e mancamos de volta para dentro, saudados pelo aroma


do ensopado que Laadan preparara. Subi as escadas para lavar a sujeira do
dia, e Aiden seguiu.

Uma vez dentro do quarto, lancei a ele um olhar recatado sobre o meu
ombro. Pelo menos, eu pensei que era recatado, mas eu provavelmente
parecia que tinha alguma coisa no meu olho.

Aiden sorriu abertamente mesmo assim.

— Você está me seguindo? — Perguntei, chutando as minhas botas.

Ele rondou para a frente, movendo-se como uma daquelas panteras


enjauladas que tínhamos visto no zoológico.

— Estou só estando aqui para você, e eu acho que você realmente precisa
de mim no momento.
— Ha. Ha. — Sem meus sapatos, Aiden se elevava sobre mim e eu me
senti como um hobbit em pé na frente dele.

O sorriso de Aiden se estendeu e uma covinha em sua bochecha esquerda


apareceu. Ele enfiou uma mecha do meu cabelo para trás, depois suas mãos
caíram e ele puxou a camisa para fora das minhas calças cargo.

— Acho que você chamou isso de ‘virar homem’.

Este não era o tipo de virar homem sobre o qual eu estava falando na
noite anterior, porque mesmo com meu conhecimento limitado de tais
coisas, ele se sobressaía nesse departamento. Mas eu não disse nada
enquanto o encarava.

Baixando a cabeça, seus lábios roçaram os meus. Eu tinha certeza de que


tinha gosto de sujeira e maçã verde ácida, cortesia do Blow Pop que eu tinha
chupado mais cedo, mas ele fez este som contra a minha boca, parte rosnado
e parte algo mais profundo. Conforme o beijo se aprofundava, como se ele
pudesse devorar o sabor e a sensação, eu me derretia contra ele.

— Eu realmente gosto da sua ideia de virar homem — Murmurei,


agarrando a frente de sua camisa.

Aiden deu uma risada baixa enquanto as pontas de seus dedos passavam
de leve sobre o meu estômago. Calor seguiu, afugentando o frio na minha
pele. Estendi a mão, querendo mais, sempre precisando de mais…

— Não parem por minha causa.

Guinchei ao som da voz de Apolo e saltei para trás, tropeçando nos meus
pés. Aiden pegou meu braço, me firmando antes que eu plantasse a cara no
chão.

— Deuses, — Resmunguei, colocando uma mão no meu coração


martelando. Eu estivera tão envolvida em Aiden que nem sequer sentira a
presença de Apolo.

Apolo estava sentado na beirada da cama, cabeça inclinada para o lado,


uma perna cruzada sobre a outra. Seu cabelo loiro estava solto, emoldurando
um rosto que era assustadoramente perfeito. Olhos azuis vibrantes me
encaravam de volta em vez dos olhos totalmente brancos arrepiantes de um
deus. Fiquei surpresa que ele se lembrasse o quanto eles me apavoravam.
Aiden se recuperou primeiro, movendo-se para ficar na minha frente. Ele
endureceu ao som da risada divertida de Apolo.

— Como você entrou aqui?

— As proteções na casa desvaneceram cerca de três horas atrás. Por


sorte, nenhum dos outros deuses percebeu isso e, em sua maior parte, eles
não querem Alex morta. — E então ele acrescentou, — … neste exato
momento.

Olhei para ele brandamente.

— Bom saber.

— Talvez da próxima vez você vá querer bater? — Aiden sugeriu,


relaxando uma fração de uma polegada.

Os ombros de Apolo se levantaram.

— Onde está a diversão nisso? — Mas ele ficou de pé, sua cabeça
inclinando para o lado. — Precisamos conversar, mas vocês dois parecem
como se tivessem lutado na lama.

— Nós estivemos treinando, — Apontei. — Como você sugeriu.

Se ele estava grato que tínhamos realmente seguido as instruções, ele


não demonstrou.

— Vou esperar lá embaixo. Tentem não demorar dez anos.

Com isso, ele simplesmente se apagou da existência. Um momento


depois, ouvi um ganido assustado lá embaixo. Fico feliz que não éramos os
únicos para quem ele gostava de fazer isso.

Caí contra a parede.

— Acho que ele tirou alguns anos da minha vida.

A sobrancelha de Aiden se arqueou.

— Eu ainda acho que precisamos colocar um sino nele.

Meus lábios se contraíram.


— E eu ainda acho que é uma boa ideia.

Ele deu uma olhada para a porta e depois pegou minha mão, me
arrastando para o banheiro.

— Só temos alguns minutos. Vamos fazê-los valer o nosso tempo.

***

Mais do que alguns minutos depois, Aiden e eu estávamos de pé na ampla


sala de estar com todos os outros. Apolo estava se ocupando com uma tigela
de ensopado que Laadan e Deacon tinham feito.

— Com fome? — Perguntei, depois que alguns momentos de silêncio


constrangedor se esticaram.

Ele olhou para cima.

— Na verdade não, mas isto está delicioso.

Laadan praticamente ficou radiante do sofá.

— Obrigado.

— Nós não saberíamos, — Aiden disse. Ele estava encostado na parede, os


braços cruzados.

Os lábios de Apolo se espalharam em um sorriso.

— Desculpe. Vou tentar vir depois do jantar da próxima vez. — A tigela


desapareceu de suas mãos, e me perguntei para onde foi. — Bem, é bom ver a
gangue do Scooby toda em uma única peça. Aquece o meu coração e toda
essa besteira, mas vamos chegar ao ponto.

— Vamos fazer isso, — Murmurei enquanto pulava em cima da mesa,


deixando meus pés pendendo da borda. — Você disse que precisávamos
conversar.

— Precisamos. — Apolo foi lentamente para onde Olivia e Deacon se


sentavam afetadamente ao lado de Laadan. Olhou para eles por um longo
momento, como se pudesse ver algo além do que nossos olhos eram capazes,
e depois se virou. — Primeiro, eu preciso que você me atualize com tudo o
que o Primeiro tem compartilhado com você.
Chutando minhas pernas do lado de fora da mesa, dei-lhe a versão rápida
e suja dos eventos. Não havia muito para contar, e Apolo não passou por
cima desse fato.

— É isso? — Ele nem sequer tentou esconder sua irritação e decepção. —


Vocês têm este vínculo inquebrável que quase destruiu o mundo todo, e tudo
que você pode me contar é que acha que ele está indo para o norte, que é
algo que eu já sei?

Meus lábios se franziram. Que forma de fazer eu me sentir como um


fracasso épico de um Apollyon.

— A culpa não é dela, — Aiden retrucou, olhos piscando como mercúrio.


— Ele manteve a maioria dos planos dele para si mesmo.

— Provavelmente porque ele temia que ela poderia eventualmente quebrar


o vínculo, — Marcus disse. — Então a questão permanece – o que vamos
fazer com o conhecimento que temos?

— E esperançosamente você tem algum conhecimento para trazer à


mesa? — Fixei um olhar inocente no meu rosto. — Essa seria uma mudança
agradável de ritmo.

Seus olhos se estreitaram.

— Você pode nos dizer como Thanatos foi capaz de nos descobrir? —
Marcus perguntou.

— Sim, isso é bastante fácil. A pequena exibição de Alex de akasha


enquanto lutava com Aiden atraiu Thanatos a ela.

Franzi o cenho com o lembrete.

— Mas eu venho praticando com isso desde então.

— Praticar com akasha é uma coisa, Alex. Nem sequer registra na nossa
escala, especialmente se você permanecesse dentro das proteções que eu
senti lá fora. — Seus olhos deslizaram em direção a Aiden. — Usá-la para
tentar matar alguém é como vomitar um farol.

Vacilando, desviei o olhar.

— Portanto você está dizendo para não usar akasha então?


— Eu tenho uma solução alternativa para isso. — Apolo estendeu a mão e
o ar em torno dela tremeluziu com um azul elétrico. Um segundo depois, um
pequeno medalhão apareceu em sua palma, ligado a uma corrente que pendia
de seus dedos. Um presunçoso e satisfeito sorriso largo estendeu os lábios de
Apolo. — Peguei o elmo de Hermes, derreti-o, e aqui está. Um encanto de
invisibilidade só para você.

Apolo deixou o colar cair na palma da minha mão. Era de uma cor ouro-
avermelhada, e uma asa grosseiramente formada estava gravada nele.

— Ha, — eu disse. — É como Harry Potter e a capa da invisibilidade.

Todo mundo me encarou.

Revirei os olhos.

— Tanto faz. Então, eu fico invisível se usar isto?

Apolo riu como se eu tivesse feito a pergunta mais estúpida do mundo.

— Não. Sua energia só vai estar escondida dos deuses – todos, exceto de
mim – mesmo se você usar akasha.

— Oh, — eu disse, sustentando o colar. — Útil.

Enquanto Aiden se aproximava e ajudava a fechar do colar, ele


perguntou.

— O que mais você tem sido capaz de descobrir?

— Oh, você sabe, eu não estive fazendo nada. — Apolo nos olhou de modo
penetrante. — Consegui convencer os meus irmãos e irmãs para parar a
destruição deles por tempo suficiente para nos dar uma chance de consertar
isto, mas eles não vão ficar contidos por muito tempo. A cada momento,
Lucian e o Primeiro se aproximam de derrubar o Conselho. E com daimons
atacando humanos aos montes, eles vão arriscar milhões de vidas inocentes
para colocar um fim nisso.

— Não porque eles estão preocupados de verdade com os mortais. —


Enfiei o colar sob a minha camisa, ignorando quão estranhamente morno o
metal era. Ele pendia a cerca de uma polegada abaixo da rosa de cristal. —
Mas porque se Lucian e Seth derrubarem o Conselho nas Catskills, então eles
vão estar a um passo de derrubar os deuses, certo? Porque quem quer que
seja que controle esses assentos são os governantes.

Apolo não disse nada.

— Você sabe, isso é o que eu não entendo. — Deacon esticou as longas


pernas na cadeira, mexendo os dedos dos pés. — Eu sei que, se Seth e Lucian
derrubarem o Conselho, é uma grande coisa para os Hematoi, mas os deuses
não podem estar tão amedrontados assim.

Sem dizer uma palavra, Apolo ficou de frente para o irmão de Aiden. Eu
sabia que ele provavelmente estava dando ao garoto um de seus olhares
Leon/Apolo que dizia eu realmente preciso explicar isto?

Deacon se inquietou.

— Quero dizer, vocês podem apenas se esconder no Olimpo e encerrar o


dia.

— Ele tem razão, — Luke disse cuidadosamente. — Não é como se Seth


pudesse assaltar o Olimpo – não realmente.

Vasculhei as memórias dos outros Apollyons, e o nervosismo me


percorreu, rápido e escorregadio como uma cobra.

— Bem… — Apolo suspirou. — Há uma maneira de chegar ao Olimpo.

Minha mandíbula bateu no meu joelho.

— Portais?

Ele assentiu.

— Eles são dirigidos para lá. É como nos movemos entre o Olimpo e o
mundo mortal.

— Sabe, — Aiden disse. — Este tipo de informação teria sido útil semanas
atrás. Nós poderíamos ter tido Sentinelas em que confiamos guardando esses
portais.

— E em que Sentinelas você pode verdadeiramente confiar? — Apolo


perguntou uniformemente. — A oferta de Lucian é atraente o suficiente para
influenciá-los para o lado dele. A maioria dos Sentinelas tem se virado contra
o Conselho, se virado contra os deuses. Além disso, não era necessário que
qualquer um de vocês soubesse disso.

Aiden pareceu querer dizer mais, mas sabiamente permaneceu quieto.

— E por sorte mantivemos suas localizações em segredo, até mesmo dos


Apollyons anteriores. — O olhar de Apolo tremulou para mim. — O que você
aprendeu com o Despertar?

Fiquei meio surpresa com a fé de Apolo na minha capacidade de bloquear


Seth. Duvidei que a fé permaneceria se eu contasse a ele sobre Seth e
Hermes.

Ainda chutando minhas pernas, dei de ombros.

— Muito disso é sobre as vidas deles, e há muitos. É como assistir a cada


episódio de uma série de TV que tem passado por um milênio. É difícil
classificar tudo isso. Às vezes algo é dito e isso mexe e liberta uma memória.

Um olhar insensível cruzou as feições de Apolo.

Bem, não era como se eu estivesse esperando um abraço dele.

— A maior parte disso é como usar os elementos e akasha. E grego – eu


sei ler grego agora.

A maior parte da sala não pareceu impressionada com isso, mas Aiden
chamou minha atenção e sorriu tranquilizadoramente. Dei um sorriso largo
de volta. Ler grego era uma muita coisa para mim.

— Bem, isso é tudo fino e elegante, — Apolo disse, soltando um suspiro


exagerado.

Eu batia o pé na mesa muito forte, minha perna saltando.

Aiden me deslizou um olhar.

— O que vamos fazer a partir daqui? Obviamente, os deuses esperam que


façamos algo.

— Os deuses esperam que ela faça alguma coisa. — Apolo apontou com o
queixo para mim.
— Mas como ela pode lutar contra ele sem tocá-lo? — Aiden se empurrou
da parede e caminhou a passos largos até o meio da sala. — Os deuses têm
que entender isso.

— Eles entendem. — Os olhos de Apolo se estreitaram em mim. — Mas eu


estava esperando que houvesse alguma coisa vagueando em seu cérebro que
guardasse a resposta para esse pequeno problema. Mas...

Apolo estalou uma mão na minha perna.

— Você tem sempre que estar movendo alguma parte do seu corpo?

Dei-lhe um olhar penetrante enquanto não-tão-gentilmente removia sua


mão. O contato de sua carne na minha revelou as marcas de Apollyon como
nada mais tinha revelado. E eu sabia que ele as viu pelo modo como seus
olhos dispararam pelo meu rosto.

— Não está te machucando — eu disse.

— É irritante.

— Você é irritante — rebati.

À nossa esquerda, Aiden revirou os olhos.

— Tudo bem, crianças, de volta para as coisas importantes.

— Pense, Alex, tem que haver algo que possa nos ajudar – possivelmente
com Solaris. — Apolo inclinou-se, plantando as mãos em cada lado das
minhas agora-paradas pernas. Sobre seu ombro, vi Aiden se mover em nossa
direção, mas então Apolo moveu a cabeça de modo que o bloqueasse. — Alex.

— O quê? — Agarrei a borda da mesa. — Olha, não é como se eu estivesse


sendo teimosa ou estúpida. Se eu pudesse me lembrar de algo útil, eu iria.
Não é como se eu estivesse me impedindo… — Me impedindo de ver ou me
lembrar de algo muito importante – isso era o que eu ia dizer, mas como foi
com outras coisas, aquela onda de familiaridade me inundou novamente,
levantando os cabelos na parte de trás do meu pescoço.

Quando me conectara com Seth, houvera algo sobre o qual ele não queria
que eu pensasse, e tinha a ver com Solaris – provavelmente sobre todo o
mórbido fim dos dois Apollyons. Mas voltando ainda mais, havia algo que eu
tinha visto, algo que Solaris tinha feito, ou… tentado fazer.

Nos momentos antes que eu me conectasse com Seth, eu a tinha visto se


virar contra o Primeiro.

— Alexandria? — Apolo disse.

Ergui a mão, resistindo ao impulso de dizer-lhe para ficar quieto.

— Há algo com Solaris, mas é esquisito. Quase como se eu não devesse


saber, mas eu não consigo…

Deslizando da mesa, passei roçando por Apolo. Sem perceber o que eu


fizera, eu me movera em direção ao abrigo do corpo de Aiden.
Completamente à vontade, ele deslizou um braço sobre os meus ombros, o
olhar em seu rosto desafiando qualquer um a dizer uma palavra.

Ergui os olhos para ele, lembrando o quanto Solaris se importara com o


Primeiro. O amor que eu via nos olhos prateados de Aiden estivera refletido
no Primeiro. E eu senti – me lembrei de sentir – a terrível decisão que Solaris
tomara – proteger os outros destruindo o Primeiro. Peça por peça, isso se
juntou.

— Solaris tentou deter o Primeiro, e houve algo que ela fez… ou estava
tentando fazer. Algo que teria funcionado, mas a Ordem de Thanatos fez sua
jogada antes que ela pudesse ter terminado. — Soltei um suspiro frustrado. —
Ela sabia como deter o Primeiro – matá-lo, de alguma forma – mas eu não sei
o que era. É como se essa informação estivesse blindada ou apagada de
alguma forma. — Frustrada, soltei um gemido. — Pena que eu não possa
conversar com Solaris.

Laadan pigarreou.

— Mas isso é alguma coisa, querida. Pelo menos sabemos que há algo lá
fora.

— Espere, — Marcus disse. — Solaris estaria no Submundo, certo?

Os olhos de Apolo eram de repente afiados.

— Estaria, mas eu não posso viajar para o Submundo. Hades ainda está
chateado.
Solos sorriu maliciosamente enquanto se inclinava sobre o encosto do
sofá.

— Bem, esse é outro beco sem saída.

— Não realmente — Apolo disse.

De repente eu fiquei com um verdadeiro mau pressentimento sobre isto.

— O que quer dizer ‘não realmente’? — Aiden perguntou, seu braço


apertando em volta dos meus ombros.

Apolo moveu-se para ficar na frente da janela. Pálida luz da lua lançava
uma incandescência estranha ao seu redor.

— Bem, se Alex acha que Solaris pode nos ajudar, então é uma avenida
que queremos verificar. E quem melhor do que Alex?

Aiden enrijeceu.

— O quê?

— Ela poderia ter uma conversa-de-garota Apollyon, — Apolo disse, seus


olhos azuis dançando com diversão. — Na verdade, eu não estou realmente
sugerindo que Alex…

— Espere. — Escorreguei de debaixo do braço de Aiden. — Há uma


possibilidade de podermos chegar a Solaris?

Quando Apolo assentiu, o otimismo assumiu o controle. A emoção foi


como ficar tonta de vinho e suco de frutas – inofensiva a princípio, mas
embalando uma maldita depressão na manhã seguinte.

— E eu poderia chegar ao Submundo?

O olhar de Apolo tremulou além de mim, se fixando em Aiden por um


momento, e eu soube que, se eu fosse lá embaixo, Aiden viria também. Uma
antiga parte de mim teria protestado, mas agora eu entendia por que ele não
me permitiria fazer algo assim sozinha, e eu não era insana o suficiente para
tentar. Eu precisaria de ajuda.

— Poderia, — Apolo respondeu.


Eu mal consegui conter meu entusiasmo. A pequena Alex queria fazer
piruetas através da sala de estar. Eu sabia na minha medula que Solaris sabia
como parar o Primeiro. Que ela guardava o conhecimento para parar isto,
porque ela planejara fazer isso antes.

Mas, então, aquele grande problema envolvendo ir ao Submundo veio à


tona.

— Eu tenho que morrer de novo? — Acrescentei rapidamente, porque eu


tinha bastante certeza que Apolo podia ficar emocionado com a ideia de me
matar neste momento. — Porque toda a parte de morrer de ir para o
Submundo foi realmente uma droga da última vez.

Os olhos de Apolo reviraram.

— Morrer não é o único caminho para o Submundo, mas é o mais seguro.

Bem, isso soou como um oximoro, se eu já tinha ouvido um.

— Existem várias entradas para o Submundo do reino mortal — Apolo


continuou. — A mais próxima à nossa localização seria aquela no Kansas.

— Se você disser Cemitério Stull, eu provavelmente vou te abraçar —


Luke disse, e depois se encolheu quando o Deus do Sol virou-se para ele. —
Ou não – nenhum abraço necessário.

— Cemitério Stull? — perguntei, olhando ao redor da sala. Algo sobre o


nome soava familiar. — Eu não posso ser a única pessoa que não tem ideia
do que é... além de um cemitério.

Aiden balançou a cabeça.

— Estou com você.

— Que fofo — Apolo murmurou.

Eu o ignorei.

— Então?

— Vá em frente — Apolo disse a Luke. — Conte a eles o que é, já que é


obviamente material de abraço.
As bochechas de Luke ficaram cor de carmesim.

— A lenda conta que um dos portões para o inferno está no Cemitério


Stull no Kansas.

— Oh, deuses — resmunguei, lembrando onde eu ouvira isto antes. — Isso


não estava na season finale de Supernatural? — Quando os garotos
assentiram, meus olhos rolaram. — Sério? Sam e Dean vão estar lá?

Luke e Deacon pareciam felizes demais com essa ideia, e então Deacon
lançou.

— Luke tem uma teoria.

— Eu tenho. — Luke piscou um sorriso largo. — Cemitério Stull é um


lugar bizarro, com um monte de coisas inexplicáveis acontecendo, assim
como outros lugares rotulados de ‘portões para o inferno’. Acho que os
portões para o inferno são na verdade portões para o Submundo.

— Você está correto. — Uma bola de luz dourada apareceu sobre a mão de
Apolo e ele começou a jogá-la para o alto, sem parar, me lembrando de Seth.
— A passagem era na verdade dentro de uma igreja lá, mas Hades atravessou
uma noite no Halloween e todo mundo pensou que o idiota fosse o diabo.
Meio que estragou nosso disfarce – nós destruímos a igreja.

— Legal — eu disse, observando a bola. Ele estava a centímetros de batê-


la na luminária.

— Mas a passagem ainda é o lugar onde a igreja ficava. — A bola de luz


dourada subiu. — E nós temos tomado algumas precauções, depois de alguns
mortais acidentalmente tropeçarem nele.

Minhas sobrancelhas subiram.

— Então, o que acontece aos mortais quando eles encontram um dos


portões? — Aiden perguntou.

Apolo pegou a bola de luz.

— Oh, você sabe. Eles tendem a se tornar um dos brinquedos de morder


dos cachorros de Hades. De qualquer forma, os portões apenas se mostram
agora para alguém de descendência divina.
— Puros? — Marcus perguntou.

— Ah… não. — A bola sumiu e Apolo olhou diretamente para mim. — Eles
vão aparecer para deuses, semideuses originais, aqueles criados tomando
ambrosia, ou o Apollyon.

Dei uma cotovelada em Aiden.

— Eu me sinto tão especial.

— Que você é. — Ele deu um sorriso largo quando eu lhe lancei um olhar.
— Então, encontramos o portão e o atravessamos. Parece fácil.

Apolo riu.

— Não é assim tão fácil. O portão é guardado agora, mesmo para aqueles
para quem aparece.

Meu estômago afundou.

— Eu ainda quero saber?

Ele deu um sorriso, e meu estômago atingiu meus dedos dos pés. Eu não
gostava mesmo quando Apolo sorria desse jeito.

— Há cães infernais e guardas.

— Oh, guloseimas.

— E depois há espíritos – a maioria não passa pelos espíritos. — Apolo deu


um passo atrás. — Mas se vocês passarem, o portão aparece e vocês estão no
Submundo, mas ir para o Submundo sem um guia não é apenas perigoso, mas
estúpido.

Então eu precisava brincar com alguns cachorros, espancar uma


companhia de guardas, e chamar os Caça-Fantasmas? E eu precisava de um
guia? Tudo bem. Isto não soava tão ruim.

Eu sorri.

— Eu conheço a pessoa certa.


Dezoito
C
— aleb — Olivia sussurrou, falando pela primeira vez. Quando assenti,
ela disparou de pé. — Eu quero ir.

Apolo arqueou uma sobrancelha.

— Duas pessoas se esgueirando para o Submundo tentando encontrar


uma alma entre milhões é insano e perigoso. Ninguém mais pode ir.

Olivia virou seus olhos arregalados, suplicantes para mim.

— Eu tenho que ir então. Tem que ser eu. Eu preciso...

— E é por isso que não pode ser você — Apolo disse antes que eu pudesse
responder. — Você vai estar focada em encontrar Caleb, em vez de se focar
na missão principal.

Suas mãos se enrolaram em punhos ao seu lado.

— Como isso é diferente de Aiden? Ele vai estar focado em Alex!

Deslizei um olhar à pessoa em questão, mas Aiden tinha a mesma


expressão que Apolo tinha. Podia haver um monte de lágrimas e súplicas,
mas não haveria nenhuma discussão.

— E é isso o que precisamos — Apolo disse, quase gentilmente. Por um


momento, eu fiquei quase convencida de que ele tinha pena dela. Não de uma
maneira ruim, mas como se pudesse simpatizar com ela, o que seria
surpreendente já que deuses eram realmente carentes no departamento de
empatia. — Não há nenhuma garantia de que eles vão sequer encontrar
Caleb, mas de qualquer forma, precisamos que Alex volte a sair do Submundo
com a informação que precisamos. Viva.

Alguns dos outros deuses provavelmente não se sentiam assim.

O olhar de Apolo se fixou em Aiden de novo.

— Você daria sua vida por ela?

Eu não gostei nada dessa pergunta e abri a boca, mas Aiden respondeu
sem hesitação.

— Sim.

O deus assentiu.

— Sei que você iria também, Marcus, mas Aiden iria...

Marcus parecia menos que satisfeito, mas assentiu.

— Eu sei o que você quer dizer.

Um gosto amargo rastejou até a minha garganta enquanto meu coração


se virava pesadamente. Entrar no Submundo seria insanamente perigoso, e a
ideia de Aiden arriscando sua vida me assustava demais, mas conforme meu
olhar caía sobre a sala, eu sabia que de todos ali ele era o mais hábil.

Percebendo que não seria capaz de mudar a opinião de ninguém, Olivia


não disse nada enquanto saía da sala, cabeça erguida. A tristeza causou uma
pontada no meu peito, tão potente quanto o medo. Isso não era justo. Eu
desejava que Caleb e Olivia pudessem ter tido mais um momento juntos
antes que todos os seus momentos futuros fossem roubados deles.

Após a saída de Olivia, planos foram rapidamente feitos para a nossa


partida. O grupo iria ficar para trás, como era mais seguro para eles, e Aiden
e eu partiríamos pela manhã para… Kansas. Além de um aparente portão
para o Submundo, eu não tinha nenhuma ideia do que havia no Kansas.
Fardos de feno? Dorothy?

— Há algo mais — eu disse a Apolo depois que o grupo se dispersou. Aiden


ficou para trás, fechando a porta, parecendo saber o que eu pretendia contar
a Apolo.

— Mal posso esperar para ouvir — Apolo disse secamente.

Respirei fundo.

— Eu vi Seth ontem.

As sobrancelhas de Apolo abaixaram com força quando ele abriu a boca,


mas nenhuma palavra saiu. Talvez eu devesse ter esclarecido.

— O que quero dizer é — eu disse rapidamente —, mais ou menos.


— Mais ou menos?

Assenti.

— Ele foi capaz de me puxar... para dentro da minha própria cabeça.


Parecia e tinha a sensação de real, e foi como se eu estivesse sonhando...
mas eu não estava.

Suas sobrancelhas começaram a levantar.

— Isso não faz nenhum sentido, Alex.

— Ela estava conversando com Lea e começou a ter dor de cabeça logo
antes de acontecer, como antes, quando ela estava usando o Elixir — Aiden
explicou, já que, obviamente, eu não poderia formar uma frase coerente. —
Alex desmaiou…

— Eu não desmaiei — resmunguei, sentindo minhas bochechas corarem.

O lábio de Aiden se curvou para cima em um lado.

— Tudo bem. Ela de repente não estava andando ou falando mais.


Durante esse tempo, ela viu Seth. Aparentemente, ele usou Hermes para
puxá-la para dentro.

— Hermes? — Apolo sibilou – realmente sibilou como um leão furioso. —


Aquela vadiazinha inútil.

Minhas sobrancelhas subiram.

— Na verdade, eu me senti um tanto mal por roubar seu elmo e derretê-lo.


— Apolo soou indignado. — Hermes não estará ajudando mais Seth.

Foi difícil não rir quando Apolo ficou todo irritado, mas de alguma forma
eu controlei.

— A propósito, quando você roubou o elmo dele?

Apolo deu de ombros.

— Alguns dias atrás.

— Você acha que é por isso que ele pode ter ajudado Seth?
— Hmm… — O rosto de Apolo franziu. — Pode ser. De qualquer forma,
Seth te contou alguma coisa?

Caramba.

— Ele realmente não disse nada de importante. Tenho esta sensação de


que ele estava realmente apenas testando, mas se você pode impedir Hermes
de ajudar, então não deve ser um problema.

Um músculo se flexionou na mandíbula de Apolo.

— Ele pode transferir poder neste estado?

— Não. E ele não pode ler meus pensamentos. — Inclinei-me contra a


parede, sufocando um bocejo. — Parece mais um aborrecimento do que
qualquer outra coisa.

— É mais do que um aborrecimento. — Os olhos de Aiden piscaram


prateados.

— Ele vê isso como uma ‘violação’ — expliquei, ao ver o olhar perplexo de


Apolo. — Mas poderia ser pior.

— Como no caso de ele fazer algo como isso quando você estiver no meio
de uma batalha ou no Submundo? — Apolo perguntou.

— Bem… — Franzi o cenho.

— Andei pensando — Aiden continuou. — Sabemos que Hermes ajudou,


mas tem que ser mais do que isso ou Seth teria feito isto no momento em
que você quebrou a conexão. Quando você estava no Elixir, ele parecia ser
capaz de te alcançar quando começou a se desgastar, e quando se desgastou,
você estava exausta. Talvez tenha algo a ver com isso – o quão cansada você
está.

— Faz sentido. Suponho que só preciso ter meu sono de beleza.

Aiden não pareceu impressionado.

— Essa é a melhor teoria que posso apresentar.

— Faz sentido sim. — Apolo esticou a cabeça para o lado, seu rosto
marcante tenso com irritação. — Vocês dois ainda estão conectados, e
mesmo que você tenha blindado o grosso dessa conexão, ele pode ser capaz
de chegar até você quando você estiver enfraquecida, com ou sem Hermes.

— Como uma porcaria de rádio de duas vias — resmunguei.

— Exatamente. E especialmente se Hermes criou um caminho para você.

Eu não gostava mesmo do som disso.

Apolo sorriu para Aiden.

— Desnecessário dizer, eu acho que você sabe o quão importante é ficar


perto de Alex.

— Como se você sequer tivesse que apontar isso — Aiden respondeu.

Apolo sorriu maliciosamente.

— A viagem para o Submundo não vai ser fácil, e isso é sem nem sequer
levar em consideração as tendências narcolépticas recém-adquiridas de Alex.

Revirei os olhos. Qual parte de ‘não estava dormindo’ eles não


entendiam?

— E se isso acontecer novamente, você pode não acreditar que ele pode
recolher quaisquer informações importantes, mas precisa ter cuidado para
que não divulgue o que está fazendo, especialmente a sua nova missão.

— Eu sei — eu disse, encarando a cadeira desgastada ao lado do deus. —


Tenho bastante certeza que ele não sabe o que Solaris estava planejando
fazer com o Primeiro, mas ele sabia que havia alguma coisa. E talvez
tenhamos sorte. Seth pode não ser capaz de ter sucesso de novo.

Nenhum deles pareceu convencido.

— Tudo bem, de volta para o maior problema em mãos. Aquele que eu


posso meio que ajudar vocês. — Apolo andou a passos largos até a mesa,
encontrando um pedaço de papel e caneta. — O portal de Stull deve colocar
vocês além da entrada para o Submundo, no início do Campo de Asfódelos.
Ele pode não ser realmente um campo, ou poderia ser. — Fez uma pausa, deu
uma olhada por cima dos ombros. — Ele tem mudado todas as vezes que eu
estive lá. Às vezes, ele está vago. Outras vezes, não está. Almas que vocês
encontrarem lá serão… relativamente inofensivas.
Arrastei-me para mais perto, espiando sobre seu ombro. Ele estava
desenhando um mapa. Reconheci

— Styx. — O resto eu imaginei que iria reconhecer se tivesse prestado


atenção na aula.

— Haverá túneis que vocês vão entrar. Vocês devem ser capazes de
encontrar um lugar para descansar lá por algumas horas já que as almas são
incapazes de viajar através deles. Cheguem lá antes da noite cair e fiquem lá
até que o céu esteja dourado. Se vocês não chegarem lá antes da noite, vão
descobrir por que as almas não viajam para lá.

Esperei que ele elaborasse o raciocínio, e quando não elaborou, eu troquei


um olhar com Aiden.

— Vocês não querem estar vagando em nenhuma parte do Submundo à


noite. — A caneta de Apolo percorreu o papel. — De lá, vocês vão cruzar para
o Vale das Lamentações.

— Oh, isso soa divertido — eu disse.

Apolo sorriu maliciosamente.

— Vocês eventualmente chegarão a uma encruzilhada. Um caminho vai


levar vocês ao Tártaro, e o outro vai levar vocês aos Campos Elísios – esta
será a Planície do Julgamento. Vocês vão querer se tornar tão invisíveis
quanto possível. E eu não quero dizer invisível pelo colar.

Ele soltou a caneta e entregou o mapa para Aiden.

— Posso fazer um favor e dar a notícia a Caleb, fazê-lo encontrar vocês


lá. Mas a partir desse ponto…

— Estamos por conta própria. — Quando Apolo assentiu, mordi meu


lábio. — Está bem.

— Espere — Aiden disse, estreitando os olhos no mapa. — A Planície do


Julgamento não é perto do Palácio de Hades?

— Como eu disse, vocês dois vão querer se tornar tão invisíveis quanto
possível. Eu tenho boa-fé que Hades estará no Olimpo, mas ele tem muitos
olhos guardando o palácio. — Os braços cruzados de Apolo eram do tamanho
de troncos de árvore. — Preciso que vocês dois entendam que o Submundo
vai ser perigoso. Caleb poderia estar em qualquer lugar, e não vai ser como
da última vez, quando sua chegada foi notada. Você vai ver coisas que não
pode entender. Coisas em que vai querer intervir, mas não será capaz.

Engoli com a seriedade de seu tom.

— Eu entendo.

— Entende? Você tem mostrado muito pouco controle dos impulsos no


passado, Alex. Você não será bem-vinda lá. E não é só o Submundo. — Seu
olhar frio, de aço moveu-se para Aiden. — Os portões estarão bem protegidos.

— Nós entendemos — Aiden respondeu calmamente.

O conhecimento afiado chamejou nos olhos do deus.

— Tenham cuidado. A maioria dos que entram no Submundo não sai, e


aqueles que saem são irrevogavelmente mudados pelo que eles
experimentam.

Apolo começou a desaparecer enquanto o encarávamos, sem dúvida


nossas expressões espelhando a gravidade do que ele dissera. Logo antes que
seu corpo estivesse envolto em pó azul cintilante, ele disse:

— Vou dever a vocês dois por isto, e tudo o mais.

***

Era cedo demais para estar se movendo por aí, mas aqui estava eu, em pé
ao lado de um dos Hummers, olhando fixamente para o sol da manhã.

Aiden estava dizendo adeus a seu irmão, e eu estava tentando dar-lhes


um pouco de espaço enquanto mantinha o equilíbrio em um pé. Era a única
coisa me impedindo de cair de cara. Ontem à noite, Aiden havia ido para a
cama cedo e, literalmente, me forçou a deitar como se fosse minha babá.

— Você precisa estar bem descansada — ele tinha argumentado, e depois


sentado para observar até que eu fui dormir. E mesmo depois de cerca de oito
horas de sono, eu ainda não queria me levantar ao raiar do dia. Tínhamos
uma longa viagem pela frente – cerca de nove horas e quase 800 quilômetros.
Um avião teria sido mais rápido, mas não conseguiríamos de jeito nenhum
fazer que o esconderijo de armas passasse a segurança mortal sem usar
compulsão em metade da Administração de Segurança dos Transportes. E
teria sido mais difícil de explicar por que Aiden estava pintando runas de
sangue Titã dentro de um 747. Com isso e o talismã que Apolo me dera, pelo
menos deveria ser uma viagem de carro relativamente tranquila.

— Alexandria?

Virei ao som da voz do meu tio e me dirigi para onde ele estava de pé à
saída da varanda.

— Hey.

Ele tentou sorrir, mas foi forçado.

— Eu sei que você terá cuidado, mas sério – tenha cuidado. Tudo bem?

— Eu sempre tenho cuidado.

A expressão de Marcus se tornou branda.

Incapaz de me conter, dei um sorriso largo.

— Eu terei cuidado. Prometo.

Ao som dos passos se aproximando de Aiden, ele deu um passo para trás e
prendeu o outro puro com um olhar sombrio.

— Se alguma coisa acontecer com ela, é a sua bunda[V1] em jogo.

Minha boca caiu.

— Você acabou de falar palavrão? Eu nunca ouvi você falar palavrão


antes. Uau.

Em vez de responder, Marcus me abraçou. Ele me soltou rapidamente e


desviou o olhar, engolindo em seco. Dentro de segundos, tínhamos nos
despedido do resto do grupo.

— Tente não deixar qualquer alma livre — Luke disse, dando um sorriso
largo.

— A menos que sejam as almas de Sam ou Dean, certo? — Quando eles


riram, dei a cada um deles um rápido abraço e depois trotei para onde Aiden
estava arrumando o Hummer.

Logo que peguei uma parte do pesado saco de armas e provisões, eu disse:

— Não isso.

Aiden deu uma risada baixa.

— Peguei. — Ele a levantou com um braço – impressionante – e atirou na


parte de trás. — Já escondi algumas adagas na frente. Está pronta?

— Yeah. — Olhei por cima do ombro, observando aqueles que estavam


esperando na varanda. Uma dor esquisita encheu meu peito. Por um
momento, tudo esteve pacífico, apesar de tudo. Pássaros chamavam. Raios
de luz brilhante atravessavam as árvores frondosas. Era quase como se Aiden
e eu estivéssemos saindo de férias ou algo assim.

Não indo ao Submundo.

Aiden colocou uma mão no meu braço.

— Vamos vê-los novamente.

— Eu sei. — Eu sorri, mas pareceu todos os tipos de errado. — É só…

— O quê? — Ele fechou o porta-malas.

Balançando a cabeça, afastei meu olhar dos meus amigos – minha


família. Enquanto me virava para Aiden, um flash de movimento chamou a
minha atenção. Perto do limite das árvores de carvalho estava uma corça em
pernas finas e elegantes, e eu podia jurar que nossos olhos se encontraram.
Havia algo inteligente no olhar – algo de fora. Em seguida, ela disparou,
desaparecendo na folhagem abundante.

— Você acha que eles vão ficar bem? — perguntei, encontrando os olhos
de Aiden.

— Eu não deixaria meu irmão para trás se não achasse que sim.

Havia verdade nessas palavras. Assentindo, fui para o lado do passageiro,


meu olhar flutuando para onde a corça tinha estado. Pensei em Ártemis. Os
deuses não deveriam ser capazes de nos encontrar, mas não precisava de
nenhum esforço de imaginação para assumir que Apolo teria contado a sua
irmã gêmea onde estávamos.

Um pequeno sorriso brincou com meus lábios enquanto eu subia. Eles


ficariam bem. Mais da metade deles era treinada e malditamente boa com
uma adaga. Sem mencionar que toda a brincadeira com fogo de Deacon
estava fazendo efeito. Com Laadan e Marcus capazes de controlar ar, eles
podiam se proteger. E se Ártemis estava realmente rondando, eles tinham
uma deusa fodona ao seu lado.

Colocando o cinto de segurança, depois pus as mãos no colo. Elas se


fecharam em punhos. Olhei de relance para Aiden enquanto ele ligava o
motor. O Hummer rugiu à vida.

— Você sabe que eu sou péssima em longas viagens de carro, certo?

Um meio-sorriso apareceu.

— Eu me lembro.

— Você vai precisar me entreter. Muito.

Ele riu enquanto persuadia o massivo veículo pela estrada de terra


estreita, de uma pista que era totalmente nova para mim.

— A propósito — Aiden disse, me lançando um longo olhar que me fez


esquecer totalmente a seriedade da nossa missão. — Você fica muito bem em
um uniforme de Sentinela.

Um rubor quente que não tinha nada a ver com o embaraço se espalhou
sobre mim.

— Assim como você.

— Eu sei.

Eu ri abertamente.

— Uau. Ego saudável aí.

Os olhos de Aiden eram leves, cinzentos, enquanto se focavam na estrada


rural.

— Cheque o porta-luvas.
Curiosa, me inclinei para a frente e joguei o trinco. Dentro estavam dois
objetos brilhantes negros. Tirei um com cuidado, virando a coisa pesada. Era
uma Glock especialmente desenhada. Sentindo-me uma fodona, verifiquei o
carregador – balas de titânio.

Porém, a arma parecia estranha em minhas mãos.

— Eu só segurei uma destas uma vez fora do Covenant.

Aiden ficou quieto enquanto esperava que eu continuasse. É claro, ele


sabia quando.

— Eu não a usei. Eu hesitei.

— Você estava enfrentando sua própria mãe, Alex. É compreensível.

Assenti, ignorando o nó na minha garganta enquanto colocava a arma de


volta no porta-luvas.

— O que mais está guardado?

— Olhe debaixo dos assentos — ele murmurou enquanto os pneus do


Hummer equilibravam no pavimento.

Sob o assento havia duas adagas e uma lâmina de foice.

— O mesmo debaixo do seu?

Ele assentiu.

— O que você está esperando? Um cerco daimon?

— Melhor prevenir do que remediar, Alex. Não temos nenhuma ideia com
o que ou quem vamos topar aqui fora.

Eu me endireitei.

— Seth não está em nenhum lugar perto daqui e estamos protegidos. —


Bati com um dedo no talismã que eu usava, e depois gesticulei para a marca
acima das nossas cabeças.

Aiden grunhiu algo ininteligível.

Minhas sobrancelhas subiram, mas eu as abaixei. Não era como se eu


ficasse incomodada com as coisas projetadas para apunhalar, atirar, e caso
contrário matar.

— Cara, eu gostaria que tivéssemos café.

— Como se você precisasse de mais cafeína.

— Ha. Ha. — Olhei para fora da janela, mordiscando meu lábio inferior. —
A cafeína é minha amiga.

— E carne vermelha – não podemos esquecer a carne vermelha.

Dei um sorriso largo com seu tom de provocação.

— Tanto faz. Coma seu peito de frango sem graça, mas em breve... muito
em breve, vou influenciar você para o lado negro da carne vermelha.

Nós fomos e voltamos por um tempo, nos distraindo, e funcionou. Meus


músculos relaxavam com cada milha que passava e não fomos bombardeados
por daimons caindo do céu a partir do momento em que chegamos à
civilização, também conhecida como a interestadual. Quando fizemos um
desvio para pegar um almoço rápido do drive-thru, eu pedi um hambúrguer…

Aiden pegou um sanduíche de frango grelhado… e tirou um dos


pãezinhos.

Enrolando a embalagem, eu ri.

— Por que você faz isso? É como se você tivesse algo contra sanduíches
de dois pães.

— Um pão é suficiente. — Ele olhou de relance para seu colo, uma mão
no volante e outra coberta com manchas de tempero. Olhando para cima,
suspirou. — Você pegou todos os guardanapos?

Olhei para ele encabulada.

— Talvez, mas eu guardei para você… metade de um. — Cavando na


minha sacola, peguei um guardanapo e rasguei em dois. Depois bati
levemente na sua mão, não tão graciosa como ele tinha sido quando lavara
minhas mãos na noite na cozinha.

Acho que posso ter deixado sua pele em carne viva.


Arrebatando o saco do seu colo, retirei o outro pão, balançando-o perto de
sua boca.

— Alex… — Ele se inclinou em direção à janela, evitando o perigoso


segundo pão. — Qual é.

— Coma, — ordenei, segurando-o com as duas mãos agora, fazendo-o


dançar no ar. — Ele está te implorando. — “Me coma”.

Ele arqueou uma sobrancelha.

— Pervertido — resmunguei.

Aiden apertou os lábios, mas quando olhou de relance para mim e meu
pão dançante, explodiu em gargalhadas.

— Tudo bem, me dê o pão.

Dando um sorriso largo, o assisti comer o pão, e depois tirei a pequena


encomenda de batatas fritas.

— Quer um pouco?

Surpreendentemente, ele não as recusou. Mas depois que a comida


acabou e nenhum de nós conseguiu encontrar nada que remotamente valesse
a pena ouvir no rádio, comecei a ficar agitada. Em quatro horas, chegamos a
uma loja de conveniência a algumas milhas além de Des Moines, enchendo o
tanque e estocando o que parecia ser comida de rato. Considerando minha
briga com Hades da última vez que eu estive em uma loja de conveniência,
fiquei no carro e pedi alguns Doritos, mas, aparentemente, queijo nacho não
era comida apropriada para o Submundo.

— Quer dirigir?

Balancei a cabeça enquanto colocava o cinto de segurança.

— Se estivesse dirigindo isto, eu teria eliminado uma família de quatro


pessoas.

— O quê? — ele riu.

— Eu só dirigi um carro, tipo, uma vez. E era um inseto comparado a esta


coisa. Quer dizer, eu sei como dirigir, mas acho que você não me quer na
interestadual.

Aiden estendeu a mão, envolvendo a sua ao redor da minha.

— Quando tudo isto acabar, eu vou te deixar craque. Você vai dirigir um
daqueles caminhões ali.

Eu ri enquanto fitava o dezoito rodas.

— Você pode querer adicionar ‘cidade pequena’ para a lista de vítimas.

— Você vai dirigir bem – mais do que bem. — Ele deslizou o Hummer
entre dois caminhões. — Em qualquer coisa que você coloque na mente, você
tem sucesso nisso. Então sem preocupações.

Derrubando minha cabeça contra o assento de couro, eu sorri.

— Você sempre diz as coisas certas.

As sobrancelhas de Aiden se enrugaram.

— Nah, acho que não.

— Você diz — eu disse calmamente, segurando sua mão mais forte. — Eu


não acho que você sequer tenta. Só vem naturalmente para você.

Dois pontos em seu rosto coraram, e eu achei isso terrivelmente fofo.


Então eu me inclinei sobre o console central e beijei uma daquelas
bochechas em chamas. Acomodei-me de volta, dando um sorriso largo com o
olhar estupefato que ele enviou na minha direção.

O resto da viagem foi tranquilo, e eu realmente cochilei mais ou menos a


uma hora de Stull. A princípio eu não percebi que estava sonhando. Tudo era
nebuloso, como se eu estivesse olhando por um tubo estreito cheio de névoa.
Conforme ela clareava e o vislumbre de imagens se assentava no lugar, achei
que a câmara circular e suas paredes de arenito pareciam vagamente
familiares. Mas não foi o lugar que chamou minha atenção.

Era o que estava no chão.

Apolo estava de joelhos, com as mãos esticadas, e não estava sozinho.


Aiden estava lá, de costas para mim enquanto segurava algo – ‘alguém’ – em
seu peito, seu corpo inclinado sobre a forma imóvel conforme balançava para
frente e para trás, os ombros largos tremendo. Havia uma outra pessoa na
sala, mas sua forma e imagem eram nebulosas demais para decifrar.

Inquietação deslizou através de mim como neblina obscura enquanto eu


focava em Aiden, querendo alcançá-lo. Chamei o nome dele, mas eu não
tinha nenhuma voz. A ansiedade cresceu e me senti fria – fria demais. Algo
não estava certo. Eu senti como se estivesse lá, mas destacada, como se
estivesse observando o que estava acontecendo de uma grande distância.

Aiden estava dizendo algo, mas era baixo demais para eu decifrar. Tudo o
que ouvi foi a resposta de Apolo.

— Sinto muito.

Sem aviso, Aiden se endireitou e jogou a cabeça para trás, soltando um


rugido cheio de dor e fúria.

Acordei bruscamente com o som baixo de Aiden cantando ‘Saving Grace’


do The Maine, batendo meu joelho no painel do carro.

— Você está bem? — ele perguntou.

Arrastando uma respiração profunda, assenti enquanto afastava mechas


soltas de cabelo do meu rosto. Meu coração martelava no meu peito. Eu
tinha visto o corpo sem vida que Aiden estivera segurando e entendera aquele
grito que rasgou das profundezas de sua alma.

Tinha sido eu em seus braços.

Afundei contra o assento, olhando para fora da janela. Foi só um sonho –


apenas um sonho. E eu podia ficar surpreendida que estava tendo sonhos
bagunçados como esse? Todo o stress e coisas loucas acontecendo tinham
que criar alguns pesadelos malucos, mas...

Houvera algo no sonho que o tornava difícil de esquecer, que deixara para
trás um calafrio profundo em meus ossos. Foi preciso muito para expulsar o
sonho dos meus pensamentos. Eu me recostei no assento, observando Aiden
por trás dos meus cílios, imaginando-nos indo para outro lugar – qualquer
lugar que não fosse uma droga de um cemitério. Como se talvez estivéssemos
dirigindo para Disney World. Tudo bem, talvez não. Talvez uma praia para
um fim de semana ensolarado, romântico, e eu quase podia ver. Podia sentir
o gosto.
Nós sendo normais, vivendo entre mortais como tínhamos conversado,
tendo um futuro em que não estávamos fazendo coisas loucas como esta,
onde eu não estava conectada a um Seth psicótico. Teríamos uma casa,
porque eu não podia imaginar Aiden em um apartamento ou um sobrado. Ele
iria querer espaço – um quintal – e mesmo que um cão estivesse fora de
questão por causa do poder que os daimons tinham sobre os animais, era o
meu futuro perfeito, então tínhamos um labrador que corria ao longo da
cerca.

E eu teria um gato que se enrolava no meu colo, um malhado gordo que


comia os pães de sanduíche restantes de Aiden. Teríamos uma varanda onde
nos sentaríamos às noites. Aiden estaria lendo um gibi ou algum texto
histórico chato escrito em latim, e eu estaria fazendo tudo ao meu alcance
para distraí-lo.

Eu poderia apoiar um futuro assim.

— O que você está pensando? — A voz calma de Aiden me assustou.

— Como você sabia que eu estava acordada?

Houve uma pausa.

— Eu só sabia. Então me conte…?

Sentindo-me um pouco tola, contei a ele sobre o meu futuro de fantasia.


Aiden não riu. Não tirou sarro disso ou perguntou por que um gato estaria
comendo pães de sanduíche. Ele olhou para mim – olhou para mim por tanto
tempo que comecei a me preocupar com um acidente. Depois desviou o
olhar, um músculo surgindo ao longo de sua mandíbula.

— O quê? — perguntei, me contorcendo no banco. — Eu divulguei


informação demais?

— Não. — Essa única palavra foi rouca.

— Então o quê?

Os olhos de Aiden estavam tão brilhantes e luminosos quando


encontraram os meus de novo – reluzentes e fortes como as adagas de titânio
que usávamos.
— Só que eu te amo.

[V1] Achei estranha essa expressão. Verificar depois


Dezenove

O Kansas era... plano e gramado.


Tanto quanto os olhos podiam ver, não era nada mais do que campos
planos com grama amarelada e juncos. À distância, o horizonte parecia se
encontrar com a terra, um escuro e ameaçador azul acinzentado quando a
noite se aproximava, sangrando para a grama marrom alta e flores silvestres
brancas.

‘A terra das pradarias’, segundo a improvisada lição de história de Aiden,


mas o que eu entendi foi que nós estávamos dirigindo em linha reta para
Tornado Alley. Pensando em todas as coisas, provavelmente não era o melhor
lugar para se estar, especialmente quando eu tenho uma boa visão de
algumas das mais recentes destruições causadas pelos deuses bipolares.

Cidades inteiras destruídas. Campos e ruas com detritos espalhados. O


resultado de tantas vidas ceifadas, e sabendo que isso tinha algo a ver
comigo – a resposta a minha inicial incapacidade de combater a influência
de Seth.

Era difícil olhar para o passado, mas eu sabia que não podia me afogar na
culpa agora ou analisar o sonho que tinha acabado de ter como se estivesse
analisando um caso louco de TOC. Eu precisava do meu melhor jogo.
Estávamos muito perto do Cemitério Stull.

Energia nervosa cantarolava através de nós dois. Mesmo que Apolo


estivesse nos portões do submundo, nenhum de nós sabia realmente o que
estávamos indo encontrar.

Cerca de dez quilômetros a oeste de Lawrence, deparamo-nos com a


pequena cidade corporativa de Stull. Eu me endireitei, com os olhos grudados
na janela.

Ao anoitecer, a rua principal, que parecia ser a única rua, estava


completamente abandonada. Nenhuma das lojas estava aberta. As pessoas
não passeavam pelas calçadas. Não havia ninguém. Cara, nós estávamos
definitivamente na zona rural do Kansas.

— Tão assustador — eu sussurrei.

— O quê? — perguntou Aiden.

— Não há uma única alma na rua. — Eu tremi no modo calafrio


completo.

— Talvez eles estejam no cemitério. — Quando eu lhe lancei um olhar


zangado, ele riu. — Alex, você está prestes a ir para o Submundo. Uma cidade
aparentemente vazia não pode te assustar tanto.

Chegamos a uma encruzilhada de três vias e Aiden foi pela direita.

— Sabe, Luke estava dizendo que só vinte pessoas vivem aqui e que
acredita-se que não são da Terra. — Eu disse, olhando para Aiden. — Você
acha que eles são deuses?

— Pode ser. Talvez Stull seja a casa de verão deles.

Dei outro olhar para o povoado, para as casas de aparência antiga.

— Local de férias muito estranho, mas hey, os deuses são estranhos.

— Sim, eles são. — Aiden inclinou-se no volante, os olhos piscando. — É


aqui.

Seguindo seu olhar, eu dei um suspiro suave. Uma dúzia de metros abaixo
da estrada, ao lado direito, estava o Cemitério Stull. Não era uma porta de
entrada para o inferno, mas sim para o Submundo.

E no sol poente e na completa escuridão, era assustador como o inferno.

— Espero que ninguém tente nos expulsar. — Eu murmurei enquanto


Aiden conduziu o Hummer através da entrada estreita ao lado da cerca de
arame. Nós estávamos planejando sair do Hummer no interior do cemitério.
Não levaria muito tempo, o tempo no Submundo se movia de forma diferente.
Horas duravam meio-segundos aqui. Dias seriam minutos. Semanas seriam
horas.

— Por alguma razão, eu acho que nós não vamos ter um problema. —
Aiden dirigiu o veículo para o lado e desligou o motor. Apagou as luzes.
Olhando para as lápides, eu estremeci.

— Você vai sair? — Aiden já tinha aberto a sua porta.

Uma planta seca em forma de bola rolou por uma calçada que tinha visto
melhores dias e meus olhos se arregalaram enquanto a segui até que veio
descansar contra o muro.

— Eu tenho mesmo que ir?

Aiden riu quando ele fechou a porta, desaparecendo em volta do Hummer.


Não querendo reviver uma cena de A Noite dos Mortos-Vivos, eu pulei para
fora e rapidamente o segui. Encontrei-o deslizando os braços através das
tiras da mochila pesada.

Quando ele fechou o Hummer e acionou o sistema de segurança – quem


no inferno iria roubar o carro aqui? – o cemitério ficou mergulhado em
sombras escuras. Grossas nuvens escuras bloqueavam a lua, mas meus olhos
se adaptaram rapidamente e eu quase desejei que eles não tivessem se
adaptado.

Tirando as ervas daninhas dançando e capim de pradaria demasiado


desenvolvido, eram menos de cem lápides. Espalhadas entre as lápides mais
recentes, haviam inscrições antigas que tinham desaparecido há muito
tempo. Algumas eram quadradas, outras me lembravam de mini monumentos
de Washington, e outras eram cruzes antigas que pendiam fortemente para
um lado ou outro.

No centro do cemitério havia uma fundação de pedra desmoronada


cercada por algumas árvores. Dois montes de tijolos de areia marcavam onde
a igreja tinha estado uma vez, antes que os deuses a tivessem queimado
devido à prematura exibição da meia-noite de Hades.

O caminho não era nada mais do que uma pista de terra, e eu tinha quase
cem por cento de certeza de que estava pisando em valas comuns.

— Deuses, eu odeio cemitérios.

Aiden colocou a mão nas minhas costas.

— Os mortos não podem te machucar.


— A menos que eles sejam zumbis. — eu disse.

— Eu duvido que haja qualquer zumbi por aqui.

Eu bufei, apertando o botão na lâmina da foice. Ela estendeu, uma


extremidade formando uma ponta afiada, a outra tinha uma desagradável
aparência de foice de ceifeiro.

— Uma pessoa nunca pode estar completamente segura.

Aiden sacudiu a cabeça, mas continuou andando pelo caminho estreito.


Eventualmente, a passagem ficou desbotada, coberta por ervas daninhas e
capim que se agarrava a minha calça cargo. Tive uma sensação de picadas
no meu pescoço e na minha espinha quando nos aproximávamos da
fundação da igreja. Eu queria olhar para trás, mas seriamente esperava
encontrar uma horda de zumbis comedores de cérebro de pé lá.

Eu me aproximei de uma lápide com aparência solitária e dei um passo


para o lado de Aiden. Estávamos a um pé de distância da brita.

Aiden endireitou as alças da mochila quando ele inclinou a cabeça para o


lado.

— Então, você vê alguma coisa?

De repente, o vento parou. Completamente.

Uma quietude inatural permeava o ar, elevando os minúsculos pelos na


minha nuca. Sob a camisola térmica, pequenos arrepios percorreram a
minha pele. Um velho cheiro almiscarado veio do nada. Deixei escapar uma
respiração irregular e uma pequena nuvem branca espumosa se formou.

— Ok — eu sussurrei, apertando minha mão na lâmina. — Isso não é


normal.

A respiração de Aiden pairava no ar, também. Segurando a mão entre


nós, ele acenou com a cabeça na direção do espesso grupo de árvores que se
aglomeravam nos restos da igreja. Duas sombras mais escuras estavam a
poucos metros de nós, quase indistinguíveis entre a folhagem.

Meus músculos ficaram tensos. Guardas? Fantasmas? Eu não tinha


certeza do que era pior.
— Hora do show. — disse Aiden, tirando silenciosamente a mochila. Ele
colocou-a perto de uma frágil cruz de pedra.

Assenti.

— Aqui vamos nós.

As duas figuras vieram para a frente. Elas estavam encapuzadas e


disformes, e eu percebi que seus pés, se elas tinham pés, estavam no ar, sem
tocar o chão. Suas vestes vermelho-escuro flutuavam uma polegada acima da
grama.

Lentamente, os braços subiram e o material deslizou. Um estranho


rangido seguiu o movimento. Dedos pálidos delgados tocaram os capuzes,
puxando-os para trás.

Oh... oh, uau.

Sob as capas não havia nada além de ossos. Ossos brancos pálidos e
vazios, uma vasta escuridão onde as órbitas dos olhos e narinas deveriam
estar. As bocas... as mandíbulas estavam presas em juntas soltas, por isso as
bocas estavam penduradas, abertas. Não havia pele, carne ou cabelo. Eram
esqueletos – esqueletos flutuantes e assustadores.

Não eram tão assustadores ou perigosos como zumbis, mas ainda assim,
eles eram assustadores.

Olhei para eles, querendo desviar o olhar, mas sem conseguir. Eram
estranhos... seus olhos. Eles eram apenas buracos, mas quanto mais eu
olhava para eles, algo... algo se movia dentro deles, pequenos pontos de luz
bruxuleantes.

Meus dedos afrouxaram em torno da lâmina de foice.

— Eu poderia apenas... explodi-los com akasha.

— A sua ideia foi anotada e descartada. — disse Aiden.

— Oh, vamos lá. — eu disse.

— Usar akasha te esgota, certo? — Disse calmamente, mantendo os olhos


nas coisas. — Por que não usá-la para algo mais do que um saco de ossos?
— Oh. Bom argumento.

Aqueles ‘sacos de ossos’ tiraram suas vestes no mesmo momento.

Eu arqueei uma sobrancelha.

— Espero que eles não se mostrem para nós. Realmente não quero ver um
esqueleto pe...

E então eles retiraram dois instrumentos grossos e brilhantes. Me


perguntei se eles iriam lançar aquilo em nós – admito que estava um pouco
decepcionada com os guardas. Não admira que os mortais tinham descoberto
a porta de entrada, quando tudo que se interpunha entre eles e o portal eram
duas decorações de Halloween andantes.

— Alex, — Aiden murmurou.

Meu queixo se ergueu, assim que faíscas voaram dos instrumentos,


brilhantes e intensas na escuridão. Fogo se espalhou rapidamente, vermelho,
impetuoso e forte, cada um formando uma forma de lâmina longa e mortal.

— O que...? — Meus olhos se arregalaram.

Eles voaram para nós, ossos chacoalhando e batendo em um coro


horrível. Aiden abaixou-se sob a primeira lâmina ardente. Girando em torno
de forma limpa, ele plantou um pé na parte de trás de um esqueleto.

O outro deu uma guinada em minha direção, passando a lâmina tão perto
do meu pescoço que eu senti o calor. Arremessando para o lado, dei um golpe
de foice em um amplo arco. A lâmina afiada mortal cortou o robe e o osso.

Em um flash de luz, a espada fracassou e os ossos caíram em uma pilha


fumegante. Dando um passo para trás, tive a visão da mesma coisa
acontecer com o adversário de Aiden. A espada de fogo desapareceu, e então
nada restava senão ossos e colunas de fumaça.

Eu esperei eles voltarem e fazerem alguma coisa, talvez até uma dança
divertida, mas nada. Abaixando a foice, eu fiz uma careta.

— Isso foi muito, muito fácil.

Aiden caminhou em minha direção, os olhos observando a paisagem.


— Ao que parece. Fique perto, porque tenho a sensação de que eles
tinham apenas a intenção de nos distrair.

Um rosnado baixo percorreu o silêncio do cemitério, e meu estômago caiu


até os dedos dos pés. Juntos, Aiden e eu nos viramos. Eu não sei quem reagiu
primeiro. Se era o palavrão explosivo de Aiden ou o meu gemido, isso não
importava.

Agachado nos restos das ruínas da igreja estava um grande cão do


inferno.

Pedras desmoronavam sob as patas de carne do tamanho das mãos de


Aiden. Garras, tão afiadas quanto as lâminas que segurávamos, brilhavam
como ônix. O corpo era enorme, do tamanho de um daqueles carros
energeticamente eficientes, mas as cabeças, eram três das maiores coisas
mais feias que eu já vi. Foi como pegar um rato de esgoto mutante e misturá-
lo com um pitbull. E os dentes... eles pertenciam a boca de um tubarão –
brancos, molhados e muito, muito fortes. Baba espumava sob gengivas
rosadas e pingava no chão, onde o solo ficava queimado como se fosse
molhado com ácido.

Seis olhos amarelos macabros estavam fixos em nós.

— Droga. — Eu murmurei, me agachando. — Não corte as cabeças. É o


coração que precisamos acertar.

— Entendi. — Aiden virou o punhal na mão, como um fodão total.

— Exibicionista.

Aiden sorriu.

— Qual será o nome desse?

As orelhas do cão do inferno contorceram-se quando o corpo maciço se


abaixou, preparando-se para o ataque. Coloquei minha mão no meio da
lâmina, sentindo meu coração bater e injetar adrenalina no meu sistema
circulatório. Na boca do meu estômago, a corda começou a ondular.

Engoli em seco.

— Vamos chamá-lo de ... Totó.


Três bocas abriram em um rosnado que enviou um calafrio na minha
espinha, e uma onda de hálito quente e fétido bateu em nós. A bile queimou
no fundo da minha garganta.

— Eu acho que ele não gostou do nome. — Eu disse, me movendo


lentamente para a direita.

O poderoso corpo de Aiden ficou tenso.

— Aqui, Totó... — Uma cabeça virou em sua direção. — Assim mesmo


Totó.

Eu deslizei em torno da antiga cruz, me aproximando do cão do inferno


pela direita. A cabeça do meio e a da esquerda focaram em mim, mordendo e
rosnando.

Aiden estalou a língua.

— Vamos lá, Totó, eu sou muito saboroso.

Eu quase ri, mas a maldita coisa saltou da pilha de escombros,


aterrissando entre nós. O chão tremeu com o impacto. Atrás de nós, algumas
lápides estremeceram soltas e tombaram. Por um breve momento, parecia
que Totó estava vindo direto para mim, mas no último segundo, ele pulou em
Aiden.

Pego de surpresa, Aiden tropeçou um passo para trás, com o pé


escorregando em um fragmento de pedra. Meu coração pulou na minha
garganta quando eu girei em direção a eles, jogando a minha mão livre.
Houve uma faísca, um forte cheiro de ozônio queimado, e, em seguida, uma
bola de fogo disparou para a frente, mais violeta do que vermelha, não-
natural e dissipante. Ela bateu na barriga do cão do inferno.

Totó recuou, sacudindo as três cabeças, tão afetado como se uma abelha
houvesse picado sua pata.

Bem, aparentemente o elemento do fogo não o feria. Bom saber.

Então Totó deixou o solo, lançando-se para o ar. Houve apenas um


segundo, antes que desabasse sobre mim. Eu bati no chão, me encolhendo
interiormente, porque eu tinha certeza de que estava em cima de um túmulo,
e rolei, empurrando a ponta da foice para cima.
Eu golpeei o intestino, falhando em atingir o coração.

— Droga. — Puxando a lâmina livre, eu olhei em volta. As garras de Totó


escavaram a terra entre as minhas pernas abertas, girando tão rápido que
deixou minha cabeça girando. Eu recuei, mas o cão do inferno era enorme. A
sua respiração soprou meu cabelo para trás. Sua baba ácida escorria,
espirrando no meu ombro. As roupas queimaram, e dor em brasa queimou
minha pele. O pânico era um vento gelado em minhas veias.

O grito rouco de Aiden do meu nome foi aviso o suficiente.

Que se dane isso.

Alcançando a corda, me senti viva, o que provocou um zumbido baixo e


constante que correu através de mim. As marcas do Apollyon sangraram pela
minha pele, produzindo glifos. Algo brilhou nos olhos do cão do inferno,
como se pudesse ver as marcas e compreender o que elas eram.

Totó rosnou. Todas as três cabeças vieram para cima de mim com a
precisão e letalidade de uma cobra-rei. Empurrando minha mão, meus dedos
cavaram o pelo emaranhado, grosseiro. Poder supremo correu pelo meu
braço. Luz azul crepitou.

Sem qualquer aviso, as cabeças de Totó chicotearam de volta em um


grito. O grande corpo ficou tenso, e então estremeceu. Ele se jogou para o
lado, com as pernas contraindo-se. A ponta da foice se projetava de seu peito,
revestida em trevas. Um momento depois, Totó era nada mais do que uma
pilha de pó azul cintilante.

Atordoada, eu olhei para cima quando a akasha se acomodou na corda,


sem uso.

Aiden estava sobre mim, com as pernas estendidas e ombros para trás, o
cabelo escuro caindo em um desalinho bagunçado, os olhos cor de aço e tão
duros. Poder natural, energia treinada que veio de anos de dedicação,
irradiava dele. Ele era uma força ameaçadora a ser reconhecida, e lá estava
eu, a Apollyon, deitada enquanto ele estava de pé.

Ele era um guerreiro, e eu estava impressionada.

Aiden estendeu o braço.


— Você está bem?

— Sim. — eu murmurei, colocando minha mão na sua. Ele


cuidadosamente me levantou. — Obrigado.

— Não...

Tocando os lados de seu rosto, eu o beijei. Longamente. Profundamente.


Intensamente. Quando eu parei, seus olhos eram piscinas de prata.

— Basta dizer ‘por nada’. Não é difícil. Diga.

Por um longo momento, Aiden não disse nada e então:

— Por nada.

Meus lábios se abriram em um largo sorriso.

— Isso não foi difícil, foi?

O olhar de Aiden flutuou sobre o meu rosto e depois para baixo. Ele
ofegou.

— Você está ferida.

— Não é nada. — Eu me esquivei da mão que ele estendeu para o meu


ombro. A queimadura já estava entorpecida. — Estou bem. É apenas a baba
do cãozinho. Não chegue muito perto; eu cheiro como um cão do inferno
molhado. Estou realmente...

— Lexie.

O nome, o som de uma voz que não era de Aiden, mas que reconheci no
meu coração e alma. Não podia ser, mas era. Minha respiração parou em
meus pulmões. Minhas pernas de repente ficaram fracas enquanto eu virava
de um Aiden em estado de choque. Meu coração – meu coração já sabia a
origem daquela voz maravilhosa, suave e bonita.

Eu tropecei para trás, de repente inundada por uma emoção que apertou
meu peito e roubou meu fôlego. A confusão continuou quando abanei a
cabeça em um transe. Lágrimas saltaram dos meus olhos. Meu peito rachou,
porque isso não podia ser real.
— Mãe?
Vinte

Ela não se parecia como eu me lembrava.


Quando eu a vi pela última vez, quando eu a tinha matado, ela parecia
um daimon, com buracos negros onde seus olhos deveriam estar e uma boca
cheia de dentes afiados, situados numa pele tão pálida e translúcida que
mostrava as veias.

Essa imagem tinha manchado a memória que eu tinha dela. Algo que eu
tinha estado muito envergonhada para realmente avaliar. O fato de eu não
conseguir lembrar o quão bonita ela era me horrorizava, mas ela...

Ela estava linda agora.

Cabelo castanho escuro caía pelos ombros, emoldurando o rosto oval. Sua
pele era ligeiramente mais escura do que a minha, mais azeitonada. Ela
parecia como eu, mas melhor – mais refinada e bonita – e seus olhos eram de
uma cor de esmeralda brilhante. Mesmo na escuridão, eu podia vê-los, era
atraída para o calor neles.

Eu cambaleei um passo à frente, saindo do aperto de Aiden.

— Mãe?

— Bebê, — disse ela, e um pouco do meu mundo despedaçou em resposta


a sua voz. — Você não deveria estar aqui. Você não pode estar aqui.

Eu não me importava com o ‘aqui’ ou o que fosse. Tudo o que importava


era que ela era minha mãe, e eu precisava dela, precisava sentir um de seus
abraços, porque eles tornavam tudo muito melhor e eu estava precisando de
um por tanto, tanto tempo.

Eu tropecei até a inclinação, deixando cair a foice no mato espinhoso.

— Mamãe. Mamãe...

— Alex, — Aiden gritou, sua voz doía, e eu não conseguia entender o


porquê.

Ele deveria estar feliz por mim. Ver minha mãe de novo era algo que eu
esperava secretamente que ocorresse enquanto estivéssemos no submundo,
de modo que vê-la tão cedo, antes de nós sequer conseguirmos passar pelos
portões, era tão...

Então me lembrei do aviso de Apolo. Haveria espíritos, mas minha mãe?


Eu estava a poucos metros dela. Isso... isso era demasiado cruel, mesmo para
os deuses.

Ela inclinou a cabeça para o lado, um sorriso pequeno e muito triste se


formando em seus lábios.

— Você não deveria estar aqui. Afaste-se antes que seja tarde demais.

Eu pisquei, incapaz de me mover. Era realmente ela? Ou era algum tipo


de truque? Com o coração acelerado, eu abri a minha boca seca de repente,
mas, em seguida, sua forma piscou, bem como Caleb quando estava na cela.
Ela era uma sombra – então não haveria abraços – mas era ela?

Aiden veio até a colina atrás de mim, parando de pé ao meu lado.

— Alex, é...

— Não diga isso. — Eu balancei minha cabeça, porque eu não podia lidar
com isso agora. Eu tentei e não estava conseguindo ver isso objetivamente.
— Por favor, não.

A forma da minha mãe brilhou novamente.

— Você tem que se virar. Deixem este lugar antes que seja tarde demais.
Você não pode ir lá. Você nunca mais vai voltar.

Minha garganta se esforçou para soltar um soluço. Abaixando meu


queixo, eu fechei meus olhos. Era ela, mas... não era. Déjà vu, pensei
amargamente. Eu quase podia vê-la – mamãe e eu ali, eu apontando a arma
diretamente para ela, meu braço tremendo, incapaz de fazer o que precisava
ser feito.

E nós poderíamos ter morrido naquele momento ou ao longo do tempo em


Gatlinburg. Caleb poderia ter morrido nessa altura, em vez de meses mais
tarde, dentro da falsa segurança do Covenant. Eu havia falhado nessa altura
e estava à beira de falhar novamente. E, desta vez, seria Aiden que morreria
por causa da minha incapacidade de ver além do que era a verdade?

Esta não era a minha mãe. Era apenas uma ilusão para nos impedir de
alcançar os portões. Com o peito contrito, eu levantei os meus cílios úmidos.

— Você não é minha mãe. — Eu disse com a voz rouca.

Ela franziu as sobrancelhas delicadas e balançou um pouco a cabeça.

— Bebê, não faça isso. Qualquer que seja a razão por que você acha que
tem que fazer isso, não faça. Afaste-se, antes de perder tudo.

Eu meio que tinha uma sensação de que já tinha perdido tudo.

Aiden colocou a mão nas minhas costas e eu tirei força do gesto simples.
Eu respirei fundo e deixei o ar sair lentamente.

— Isso não vai funcionar. Você não é minha mãe. Então... eu não sei.
Faça o que deve ser feito.

Um suspiro exasperado, tão parecido com o da minha mãe, veio dela. Por
um momento, eu duvidei de mim mesma. Talvez fosse ela e eu estava
cometendo um erro terrível. Mas, então, ela mudou.

Cara pálida, veias deslizando debaixo de sua pele de papel como bebês
cobras. Seus olhos estavam afundados, fossas negras, e quando ela abriu a
boca, estava cheia dentes afiados.

— Assim é melhor? — ela perguntou com aquela voz doce dela.

— Deuses. — eu sussurrei, horrorizada. — Isso é tão errado.

Seus lábios formaram um sorriso torto.

— Você vai ter que passar por mim, e bebê, ambas sabemos que você não
vai conseguir fazer isso novamente.

Meu estômago afundou com a compreensão.

— Merda...

Aiden moveu-se para ficar na minha frente. Eu o vi levantar a espada e


sabia que ele ia fazer isso por mim. Tanto quanto eu apreciava isso e
realmente queria que ele o fizesse, eu não podia deixar.

Coloquei minha mão em seu braço, acalmando-o.

— Eu... eu tenho que fazer isso.

A risada fria da minha mãe era como uma onda de choque.

— Você tem certeza? — Perguntou Aiden.

A rigidez de sua mandíbula me disse que ele não queria ouvir, mas quando
eu assenti, ele deu um passo para trás e me entregou a foice que eu tinha
deixado cair. Senti os meus dedos frios em volta do punho. Eu odiava o
tremor em meu braço e o peso da arma.

Acima de tudo, eu odiava o que tinha que fazer.

Mamãe me olhou com curiosidade.

— Ah, querida, você realmente quer fazer isso? — Ela deu um passo em
linha reta através dos escombros, parando na minha frente. Ela riu de novo.
— Matar sua mãe duas vezes? Espere. Na verdade, são três vezes.

— Cala a boca. — Aiden rosnou.

Mas essa coisa – o que quer que fosse – estava empolgada.

— Ela morreu – pelo menos em todos os sentidos que importam – em


Miami. E isso foi para te manter segura. Então, isso também foi culpa sua.
Três é o número da sorte, né? E você acha que pode fazer isso? Então o quê?
Não quer dizer nada. Você não viu nada ainda.

A parte de trás da minha garganta ardia quando eu dei um passo


cambaleante para a frente, levantando o braço.

— Você não traz nada além de morte para aqueles ao seu redor. — Ela
continuou. — Você nunca deveria ter nascido, porque vai matar as pessoas
que ama, de uma forma ou de outra.

Essas palavras me atingiram no fundo, quebrando nas profundezas do


meu coração. Sem dizer uma palavra, porque eu sabia que não teria
importância, eu abaixei a foice.
E a ceifei. Houve um flash de luz opaca e, em seguida, sua forma
desapareceu como se ela fosse nada mais do que fumaça e espelhos. Em
poucos segundos, era como se ela nunca tivesse estado lá, e apenas as
palavras cruéis ficaram.

— Bem. — eu disse um pouco insegura. — Não pode ficar pior do que isso.

E ficou... dentro de um piscar de olhos.

Duas formas apareceram, além da base quebrada, rapidamente tomando


forma. Sem ter ideia de quem ou o que o portão ia atirar em nós agora, eu
fiquei ao lado de Aiden e esperei enquanto as sombras fantasmagóricas
tornaram-se duas pessoas.

Aiden respirou fundo e ficou ereto. Eu não sabia o significado disso em


primeiro lugar. As duas formas eram estranhas para mim, um macho e uma
fêmea. Ambos eram altos e de aparência elegante, carregando o ar de puros-
sangues. A mulher tinha o cabelo encaracolado da cor da seda de milho, e o
homem tinha cabelos escuros, com olhos de um prata chocantemente
familiar...

Eu já os tinha visto antes... em uma foto emoldurada na sala da casa de


Aiden, o lar dos seus pais.

O homem e a mulher eram seu pai e sua mãe.

— Oh, Deuses. — Eu sussurrei, abaixando a foice.

Ver os pais de Aiden – o aparecimento dos nossos falecidos amados – de


repente fez sentido. Não era uma luta física que guardava os portões, não
como com os guardas e o cão do inferno. Isso era uma tática diferente,
emocional e mental, para nós irmos embora, porque se não o fizéssemos,
teríamos que enfrentar o impensável.

Aiden não disse nada enquanto olhava para eles. Eu nunca tinha visto ele
tão quieto – nem mesmo depois da primeira vez que ele me viu limpa, depois
que eu dei um soco no seu rosto e, em seguida, o beijei. Ou mesmo quando as
fúrias atacaram o Conselho, ou depois que ele percebeu que eu tinha matado
um puro-sangue. Nem mesmo quando ele estava em cima da minha cama,
esperando que eu acordasse depois que Linard tinha me esfaqueado.

Eu nunca tinha visto Aiden assim, seu rosto totalmente desprovido de


emoção, mas seus olhos derretendo em cinza e prata. Tensão irradiava de
cada membro dele. Depois de testemunhar o que eu tinha acabado de passar,
ele sabia que isso não ia ser bom.

Eu queria detê-lo, poupá-lo da dor brutal, antes que ele ouvisse as


palavras pejorativas que abririam velhas feridas. Mas quando me aproximei,
ele me deteve.

— Não. — ele disse, sua voz grossa. — Eu quero ouvir isso.

Olhei para ele como se ele fosse louco.

— Claro que ele quer. — O pai de Aiden falou. — Meu filho não é covarde.
Insensato, mas não covarde.

Eu me movi em direção ao som da sua voz. Eu não conseguia superar o


quanto ele soava como Aiden.

O sorriso de sua mãe parecia quente o suficiente.

— Meu filho, você não quer fazer isso. As respostas que você procura não
existem onde você deseja ir.

— Eu tenho que ir. — Aiden respondeu friamente.

O pai empinou o queixo para cima.

— Não. O que você tem que fazer, a coisa certa, é se virar e deixar este
lugar. — Quando Aiden não respondeu, seu pai se aproximou e sua voz era
severa, implacável. — Você tem que fazer a coisa certa, Aiden. Nós sabemos
que você sempre faz a coisa certa.

Aiden assentiu rigidamente.

— Eu faço, e é por isso que eu tenho que fazer isso.

Os olhos do homem se estreitaram, e eu sabia que estava prestes a


presenciar um drama familiar épico.

— A coisa certa teria sido tomar o seu lugar no Conselho, como você foi
criado para fazer.

Ah, não...
Um músculo tremeu na mandíbula de Aiden.

— Você acha que pode alcançar alguma coisa como um sentinela? — Seu
pai perguntou, e eu me perguntei se ele tinha sido assim na vida real. Frio.
Disciplinado. Era daí que vinha o controle de Aiden? Mas se sim, Aiden
nunca deixou transparecer que era o caso.

Seu pai não tinha terminado.

— Você está desperdiçando sua vida, e para quê? Um sentimento de


vingança? Justiça? Você foge dos seus deveres enquanto a sede da nossa
família permanece vazia?

— Você não entende. — disse Aiden. — E... nada disso importa agora.

A mudança que veio da sua mãe era nada menos do que dramática. Foi-se
o conforto e elegância.

— Você nos envergonha, Aiden. Você nos envergonha.

Eu pisquei.

— Espere um segundo...

— Você não tem controle. — Nojo escorria da voz do seu pai. — Nós te
ensinamos a nunca tirar proveito daqueles que estão sob seu comando. Olhe
o que você fez.

A mãe estalou a língua.

— Você põe ela em risco, sabendo que ela poderia ser prejudicada por
causa da sua falta de controle. Como você pode ser tão imprudente? Como
você pode fazer isso com alguém que você diz amar?

Minha boca caiu aberta.

— Oh, agora não é...

— Você não pode protegê-la. — Seu pai fez um gesto para mim. — Você
não pôde nos proteger. Você é um fracasso. Você simplesmente não vê ainda,
mas você só vai continuar até não poder ir mais.

Sua mãe concordou.


— Estou surpresa que Deacon sobreviveu tanto. Mas, novamente, olhe
para o meu menino – um bêbado e um viciado, tudo antes dos dezoito anos.
Estou muito orgulhosa.

Eu virei para Aiden e implorei:

— Você não precisa ouvir isso! Pode parar com isso.

Ela sorriu friamente, continuando como se eu não tivesse falado.

— E ela, olha o que você fez com ela. Colocou-a no Elixir, a despiu de sua
vontade. Você é menos do que um homem.

— Sua vadia. — Eu cuspi, preparando-me para lançar a minha espada


nela, estilo ninja.

— Vá agora. — disse o pai. — Deixem este lugar. Ou o sangue dela estará


sobre as suas mãos.

Nunca na minha vida eu quis exorcizar alguns fantasmas mais do que


agora. A raiva fervilhava como veneno através de mim.

— Aiden, não ouça eles. Eles não são reais. O que eles estão dizendo são
mentiras. Você...

— O que eles estão dizendo é verdade. — Aiden engoliu em seco, me


lançando um breve olhar. — Mas não são eles que estão dizendo isso.

Eu não percebi em primeiro lugar, porque eu duvidava que seus pais


fossem tão idiotas em vida, mas depois entendi.

— O que a minha mãe disse... somos nós. — Eu virei para ele lentamente.
— O que eles estão dizendo? É o que você realmente pensa?

Quando Aiden não disse nada, eu acho que fiquei mais horrorizada com
isso do que qualquer outra coisa que tinha acontecido até agora. Ele pensava
essas coisas terríveis, horríveis sobre si mesmo? E quanto tempo tinha
estado levando isso com ele? Anos?

— E o seu irmão? — Seu pai disse, balançando a cabeça com a


preocupação estampada em seu rosto.

Eu ia destruir seus pais.


— Ele está desprotegido agora. — Acrescentou a mãe. — Você deveria
estar lá, não aqui, perseguindo uma missão de tolos. Ele vai morrer também,
como nós, e vai ser sua...

— Basta! — Aiden gritou, indo para a frente.

Eu ainda não tinha visto ou sentido ele tomar a foice dos meus dedos,
mas ele tomou. A lâmina se arqueou pelo céu escuro.

— Você vai se arrepender. — disse sua mãe, um segundo antes de a


lâmina cortar seus pais.

Como a minha mãe, eles se separaram em finos fios soltos de cor e


fumaça e depois desapareceram, espalhados no ar ao seu redor. E, assim
como com a minha mãe, suas palavras permaneceram.

Aiden ficou de costas para mim. Sem dizer nada, ele pressionou o botão
de recolher a foice e com um ruído suave ela desapareceu dentro do punho.
Não havia nenhum perigo agora. Três obstáculos tinham surgido: guardas,
cães infernais e espíritos.

Mas eu não conseguia controlar os batimentos do meu coração.

— Aiden...?

Seus ombros estavam tensos e ele virou a cabeça para o lado. Seu perfil
era sombrio, a linha do queixo dura.

— Eu pensei nessas coisas por um longo tempo. Tornar-me um sentinela


era a coisa certa para mim, o que eu queria e precisava, mas era realmente a
coisa certa?

Eu não sabia como responder a isso.

— Mas você não está se esquivando dos seus deveres ou qualquer outra
coisa. Você ainda está fazendo algo importante, Aiden. E um dia, se você
quiser ter o seu lugar... você pode. — As palavras feriram mais do que
deveriam, e por uma razão puramente egoísta. Se Aiden tomasse o seu lugar,
não haveria nenhuma possibilidade de nós estarmos juntos. No futuro, com a
casa, o cão e o gato.

Mas eu não pararia Aiden se ele sentisse que precisava tomar o seu lugar.
E seus pais ou sua voz interior poderiam estar certos em algum sentido. Com
um assento no Conselho, ele poderia fazer mais no que diz respeito a mudar
as coisas, mas...

Inferno, nada importava se Seth fosse bem sucedido.

— Eu poderia. — disse ele quase para si mesmo, e eu estremeci. — Meu


irmão...

— Não é um viciado. — Fiz uma pausa. — Ok. Ele tem um pouco de um


bêbado e drogado, mas ele não é um viciado. Seth é um viciado. Um daimon
é um viciado. Deacon está na cabana fazendo bifes marinados.

Isso trouxe um meio sorriso fraco ao seu rosto.

— Ele está a salvo.

— Sim.

Ele me encarou e exalou bruscamente.

— Eu realmente não acho que vou causar a sua morte.

— É um alívio ouvir isso. — eu disse.

Aiden fechou os olhos por alguns instantes. Quando os abriu de novo, eles
eram de um cinza suave.

— Eu tenho que dizer que foi bom calar essas vozes malditas ao menos
por uma vez.

Dei um passo à frente, coloquei minha mão em seu braço e apertei.

— Você está bem?

— Eu estou. — Ele abaixou a cabeça, colocando os lábios na minha testa.


— Deixe-me pegar a mochila e depois nós vamos entrar na igreja juntos. Ok?

Eu assenti, esperando do lado de fora da base. Aiden voltou com a


mochila e se ajoelhou. Abrindo, ele tirou um material amorfo escuro e me
ofereceu. Outro se seguiu quando eu peguei o meu.

— Uma capa? — Eu deslizei sobre a minha cabeça. — Onde você


conseguiu duas destas?

Aiden levantou, jogando a mochila em suas costas.

— Você ficaria surpresa com o que o pai de Solos tem guardado em suas
cabanas. Na verdade, eu peguei estas quando estávamos em Atenas. Imaginei
que poderíamos precisar delas.

— Você é tão inteligente e organizado. — eu disse.

Rindo, ele me puxou e, em seguida, estendeu a mão, segurando os lados


do meu capuz. Ele puxou-o.

— Nós temos que esconder o seu lindo rosto deles.

Eu retruquei.

— O mesmo para você.

— Eu tenho um rosto lindo? — Aiden puxou seu próprio capuz, que


lançou o seu rosto nas sombras. — Eu prefiro bonito ao invés de lindo.

‘Bonito’ não era uma palavra forte o suficiente, mas eu assenti. Ele
estendeu a mão, e eu a peguei, confortada pelo constante aperto quente.

— Você está pronta? — Ele perguntou.

— Sim. — eu disse.

Juntos, nós fomos para baixo da linha das pedras caídas e encontramos a
abertura. Juntos, atravessamos onde a porta ficava. Não houve mais avisos
ou guardas. Nós fomos através das manchas de cimento em ruínas e as ervas
daninhas crescidas.

Esperamos.

Após cerca de dez segundos, uma fissura de energia percorreu a minha


espinha. Aiden sentiu isso também, pois sua mão apertou a minha. Energia
ansiosa cresceu no meu estômago, formando bolas apertadas de medo e até
mesmo um pouco de emoção.

Esperançosamente, minha visita ao Submundo seria diferente desta vez.


Em direção à parte de trás da fundação, o ar ondulou, lembrando-me do
calor saindo do asfalto quente no verão. O véu que separava a verdade do
mundo mortal simplesmente sumiu.

— Você vê isso? — Perguntei.

Aiden apertou minha mão.

— Sim.

O portão de ferro forjado revestido de titânio era enorme, trancando algo


que nenhum de nós podia ver. Em vez de grades, havia duas lanças dentadas
decoradas com imagens de touros e ovelhas negras. Onde as duas portas se
uniam, uma réplica do capacete invisível estava gravada no ferro. O cheiro
de mofo ficou mais forte.

Com a mão livre, Aiden abriu o portão com um empurrão. Ele balançou
para trás, sem fazer nenhum som, revelando nada além de escuridão, não do
tipo associado com a noite, mas um buraco negro. Um portal. E juntos, lado
a lado, nós atravessamos os portões para o Submundo.
Vinte e um

Eu quase esperava que, quando entrássemos no vazio, nós fôssemos cair


com nossos rostos em terra. Mas o chão permaneceu sob os nossos pés à
medida que continuamos na escuridão, o que eventualmente deu lugar a uma
neblina tão espessa quanto sopa.

Olhando por cima do meu ombro, eu procurei encontrar o portão através


do nevoeiro que nos engoliu, mas ele tinha ido embora e o nevoeiro era ainda
mais pesado. Segurei a mão de Aiden quando gavinhas se infiltraram entre
nós, envolvendo um tipo diferente de manto ao nosso redor. Eu não podia
sequer ver Aiden... ou meio metro a minha frente. Uma pontada de pânico
cresceu no meu peito.

— Eu estou bem aqui. — A voz profunda de Aiden quebrou o véu e ele


apertou minha mão. — Apenas continue segurando.

Eu considerei brevemente usar o elemento do ar para dissipar um pouco


da névoa, mas se o nevoeiro deveria estar aqui, isso poderia ser
potencialmente uma má notícia, se de repente ele desaparecesse.

Quanto mais nós nos movemos no nevoeiro, mais enervante se tornou


estarmos cegos. E então houve um som diferente da batida do meu próprio
coração – um tipo embaralhado de som, como pés e pano arrastando-se em
volta de nós, e um zumbido baixo, como um suave e interminável suspiro de
um gemido, e eu nem mesmo queria saber o que era. Seguindo o caminho do
braço de Aiden, eu me aproximei dele, tão perto que eu estava surpresa por
não tê-lo derrubado.

Após vários minutos de nada além de caminhar cegamente através da


névoa e o terrível som de algo se arrastando e gemendo, o nevoeiro começou
a se dissipar até que o caminho foi revelado diante de nós.

Eu respirei fundo, incapaz de parar de agarrar seu braço. O pouco do


Submundo que eu tinha visto antes não tinha me preparado.

A neblina deu lugar a um céu que era da cor do pôr do sol, um


cruzamento entre vermelho e laranja. Mas pelo que pude perceber, não havia
sol. E tudo ao nosso redor eram pessoas, movendo-se sem rumo. Vestidas
com brandas roupas esfarrapadas, elas se arrastavam para lá e para cá.
Muitos estavam em silêncio, alguns gemiam baixinho, enquanto outros
murmuravam sob sua respiração atrás de seus próprios mantos, mas todos
tinham seus olhares atraídos para o chão. Eles eram jovens e velhos, desde a
mais pequena criança até a velha mais envelhecida.

Este... este lugar continuava tão longe quanto eu podia ver, até a beira
das colinas que Apolo tinha falado. Eu não entendi o que este lugar
realmente era. Não era o limbo – isso eu sabia – já que eu já tinha estado lá
antes.

Nenhuma das almas levantou o olhar enquanto navegávamos em torno


deles. Não havia guardas montados em cavalos, como eu tinha visto no
limbo. Parecia como se essas pessoas foram colocadas aqui, deixadas
sozinhas para os seus próprios movimentos e para o tédio.

— Por quê? — Eu perguntei em voz baixa.

Aiden sabia o que eu estava perguntando.

— A maioria dos mortos mora aqui. — Ele me levou para perto de um


grupo de três pessoas encolhidas no chão. — Aqueles que foram enterrados,
mas não seguiram para enfrentar seu julgamento. Alguns deles podem ter
feito alguma coisa em suas vidas para fazê-los temer seu julgamento. Outros
são...

Uma mulher se moveu a nossa frente, o olhar colado ao chão enquanto


ela torcia as mãos. Ela murmurava baixinho:

— Onde está meu filho? — Várias vezes.

— Alguns estão confusos — eu respondi. — Eles não sabem que estão


mortos.

Aiden assentiu solenemente.

E então a mulher triste simplesmente desapareceu, como se ela tivesse


caminhado através de um portal invisível – estava lá em um momento e
tinha desaparecido no outro.
Parei.

— O que...?

— Eu vou explicar, mas temos que seguir em frente. — Aiden me puxou


para a frente. — A lenda diz que algumas dessas almas deixam o limbo e
viram sombra. Eles voltam para o mundo mortal, e depois voltam aqui
novamente. Eu não acho que eles possam nem mesmo controlar isso.

Engoli em seco.

— Eles são fantasmas.

— Pensei que você não acreditava em fantasmas. — Humor preenchia seu


tom.

Agora era uma boa hora para mudar de ideia. Enquanto eu olhava através
do meu capuz, havia algo medonho em algumas das almas. Muitas delas
pareciam sólidas e de quando elas tinham tocado em mim, eu sabia que elas
tinham massa, mas outras tinham essa imprecisão vacilante nelas. E quanto
mais eu prestava atenção, mais os outros simplesmente desapareciam.

Este lugar era assustador, como caminhar por um labirinto de desespero e


esquecimento. E nós ainda não tínhamos atingido o Vale das Lamentações
ainda. Oba, isso ia ser divertido.

Uma súbita frieza úmida agarrou-se ao ar ao nosso redor. Ergui a cabeça,


olhando para o céu laranja queimado.

Uma gota de água caiu, salpicando o meu rosto. Em seguida, o céu se


abriu, encharcando-nos na chuva fria em poucos segundos.

Eu suspirei.

— Realmente, tem que chover?

— Pelo menos não é ácido.

Esse era Aiden, sempre olhando para o lado positivo das coisas.

Puxando meu capuz mais para baixo, eu marchei para a frente. As almas
não prestaram atenção à chuva forte. Talvez elas tivessem se acostumado
com isso. Eu queria parar e gritar com elas para irem ao julgamento, porque
o que esperava por elas não poderia ser pior do que isso.

Especialmente para os menores que estavam sozinhos – não havia nada


que eles poderiam ter feito para garantir-lhes a eternidade no Tártaro.

Um pequeno menino estava sentado sozinho em uma grande poça de


água que a chuva já havia criado. A criança não poderia ter mais do que
quatro ou cinco anos. Ele movia seus dedos gordinhos na lama, desenhando
um círculo e, em seguida, riscando linhas ao redor dela.

O sol – ele estava desenhando o sol.

Comecei a dirigir-me para ele, não sabia o que eu faria, mas eu tinha que
fazer alguma coisa, talvez convencê-lo a ir ao julgamento. Deus sabe quanto
tempo ele esteve aqui. Sua família já poderia estar nos Campos Elísios.

— Não — Aiden disse suavemente.

— Mas...

— Lembre-se do que o Apolo disse. Nós não podemos intervir.

Olhei para o menino, lutando contra o desejo de me libertar.

— Isso é errado.

O aperto de Aiden na minha mão se intensificou.

— Eu sei, mas não há nada que possamos fazer.

Meu coração doeu enquanto eu observava o menino esculpir uma lua ao


lado do sol, indiferente à chuva ou as outras almas praticamente pisando
nele. Eu queria estar com raiva e eu estava – mesmo com Aiden, porque ele
estava certo. Não havia nada que pudéssemos fazer. E haveria mais como
este menino – mais almas esquecidas.

Lutando contra a ardência das lágrimas, eu puxei minha mão livre de


Aiden, mas não fugi. Eu caí no passo ao lado dele enquanto passamos pela
pobre criança, navegando pelo campo infinito de almas que haviam sido
deixadas para trás ou postas de lado.

***
Demorou horas para passar pelos campos de Asfódelos. No momento em
que deixamos a lama, que ia até os tornozelos, e as nossas botas tocaram
manchas dispersas de grama, nós estávamos encharcados e com frio, nossos
casacos pesados e densos. A chuva tinha entrado de alguma forma em minha
bota e, a cada passo, meu pé deslizava para frente e para trás. Exaustão me
perseguia, e provavelmente a Aiden também, mas nenhum de nós reclamou.
Viajar através do campo com todas aquelas almas serviu como um lembrete
de que as coisas podiam sempre ser piores.

A chuva tinha parado um pouco, voltando a ser uma constante garoa


estável. O céu era agora um laranja mais escuro, sinalizando que a noite
estava perto. À frente, as colinas verdes levavam a uma parede espessa de
ardósia, quase impenetrável. Ia ser uma subida íngreme.

— Você quer descansar um pouco? — Aiden perguntou atrás de seu manto


enquanto inspecionava as colinas. — Parece relativamente seguro.
Poderíamos parar...

— Não. Eu estou bem. — Eu pisei perto dele, subindo lentamente a


primeira colina, ignorando a dor estúpida tomando conta de minhas
têmporas. — Além disso, quanto mais rápido entrarmos nos túneis, mais cedo
podemos descansar, certo? Estaremos seguros lá durante a noite.

— Sim. — Aiden estava ao meu lado em um segundo. Sua mão saiu do seu
manto e entrou dentro do meu capuz. Sua palma estava quente contra
minha bochecha. O gesto foi breve, e desapareceu demasiado rápido.

Viajamos em silêncio, mas a preocupação me incomodava. A dor de


cabeça não estava grave, nada parecido com o que eu tinha experimentado
antes quando Seth tinha feito a ligação, mas eu não tinha ideia de quanto
tempo levaria para ela progredir.

A única esperança era de que iriamos chegar a um lugar seguro – de


preferência seco – onde poderíamos ficar à noite. O sono era o que eu
precisava, e quanto mais cedo melhor.

O céu estranho escurecia a cada colina que passávamos, forçando-nos a


aumentar o nosso ritmo. Atravessamos um campo de narcisos que crescia na
altura dos nossos joelhos, luminosas pétalas brancas carregando um cheiro
incrivelmente doce. Uma parede de ardósia se aproximava enquanto as flores
davam lugar a árvores.
Pelo menos é o que eu pensava que elas eram.

Elas subiam para o céu, seus ramos nus na maior parte, como dedos finos
que alcançam a crescente escuridão. Em torno dos ramos mais baixos, frutas
vermelho-rubi pairavam no ar. Romãs.

Curiosa com o gosto delas, peguei uma.

A mão de Aiden arrebatou a minha em um aperto quase doloroso. Deixei


escapar um suspiro assustado.

— Não — ele disse asperamente. Por trás da capa, seus olhos eram de um
prata brilhante. — Você não sabe nada de Perséfone?

Eu olhei para ele.

— Uh, ela é a Rainha do Submundo. Eu não sou estúpida.

— Eu não disse que você era estúpida. — Seu aperto afrouxou quando ele
me levou por entre as árvores, em direção ao último monte. — No entanto,
eu realmente estou começando a achar que você deveria ter passado menos
tempo dormindo em sala de aula ou fazendo o que você estava fazendo.

— Ha. Ha.

— Perséfone comeu das árvores de romã aqui. Se você comer qualquer


coisa deste mundo, você nunca poderá sair.

Todas as minhas respostas espertinhas desapareceram. Cara, eu me senti


como uma idiota por não lembrar disso.

— Tudo bem. Talvez eu devesse ter prestado atenção nas aulas.

Ele riu.

Mas todo o humor desapareceu quando ele deu uma boa olhada no morro.

— Deuses...

Era íngreme, coberto com manchas de gramíneas, raízes expostas,


árvores com enorme frutas pretas em forma de lágrima penduradas em seus
galhos, e algo que eu realmente esperava que fossem fragmentos de rochas
pálidas – não ossos, como pareciam. No topo, uma borda aparecia na espessa
parede cinza.

Suspirando, eu passei Aiden.

— É melhor irmos andando.

Subimos o morro, usando as raízes para nos apoiar e continuar subindo.


Eu não sei como Aiden fez isso, carregando a mochila pesada nas costas,
mas ele se moveu muito mais rápido do que eu.

No meio do caminho para o topo, um som de gorjeio apareceu acima do


dossel da fruta estranha. Eu parei, levantando minha cabeça. O capuz pesado
escorregou para trás enquanto eu olhava através da garoa, além das árvores,
para o céu agora azul-escuro.

A noite já tinha caído, e eu recordei o aviso do Apolo.

— Vamos lá — Aiden chamou. — Precisamos nos apressar.

Agarrando uma raiz, eu me puxei para cima.

— Você ouviu esse barulho?

Aiden não disse nada, apenas continuou a subir.

Os ramos acima de nós começaram a tremer, balançando o fruto gigante.


O gorjeio ficou mais alto.

— Eu... eu acho que... ele está vindo da fruta.

Acima de mim, uma lágrima negra do tamanho de um pufe sacudiu – e


em seguida, abriu-se, uma... uma perna longa, preta e peluda apareceu de
cada vez. O centro da massa se contraiu e, em seguida, uma fileira de olhos
vermelho-rubi olhou para mim.

— Oh, meus deuses... eles não são frutos. — E agora eu entendi muito
bem por que as almas não viajavam perto dos túneis.

Uma aranha gigante caiu da árvore, batendo no chão em seis de suas oito
pernas. Seu grito transformou meu sangue em gelo. Outra bateu na grama...
e depois outra e outra. Seus coros abafando o som de todo o resto.

Aiden deslizou pela colina, chutando pedrinhas soltas e ossos quando ele
veio para o meu lado. Ele agarrou minha mão enquanto uma caiu ao nosso
lado, presas reluzentes, duas de suas pernas levantadas e fez um guincho
como unhas arranhando uma lousa.

Gritando, eu pulei para trás, batendo em Aiden quando a enorme aranha


correu no chão. Aiden me empurrou para o lado e puxou um punhal.
Empurrando para cima, ele enfiou a lâmina até o punho no centro da
aranha.

Rolei de joelhos e me levantei, pegando a visão de milhares de pés pretos


correndo pelo chão.

Um peso bateu em minhas costas, me empurrando de cara na terra solta


e grama molhada. Dor aguda atravessou meu lábio cortado e eu experimentei
o gosto de sangue na boca, mas isso não era nada quando eu senti o pesado
peso peludo da aranha nas minhas costas.

Suas pernas entravam em meu manto enquanto assobiava no meu


ouvido. Invocando o poder que descansava dentro de mim, eu senti... senti
nada.

Merda.

Empurrando meus joelhos, eu me ergui do chão e joguei a aranha. Ela


caiu de costas a poucos metros de distância, as pernas se debatendo no ar
enquanto assobiava.

— Deuses, eu odeio – odeio aranhas.

Aiden se inclinou para baixo, enganchando sua mão em meu braço. Ele
me levantou e me empurrou para frente.

— Este seria um bom momento para usar akasha.

Centenas de olhos vermelhos e redondos olhavam para nós.

— Eu não posso. Não acho que ele funciona aqui em baixo.

Com as mãos nas minhas costas, ele me empurrou para cima da colina,
xingando baixinho.

— Eu ainda posso sentir o elemento de fogo. Você pode?


Levantando a mão enlameada, fiquei surpresa e aliviada ao encontrar
uma pequena faísca.

— Sim.

— Bom. Na contagem de três, vamos limpar o caminho para as rochas à


frente... — Ele cortou, passando a lâmina de foice em uma aranha que se
aventurou perto demais. Pernas voaram em todas as direções. — Vê o buraco
lá na rocha?

Eu vi. Eu também vi uma centena de aranhas entre nós e a rachadura


fina.

— Uh-uh.

— Na contagem de três, acenda e fuja. Não pare. Ok?

— Sim.

— Um... dois... três!

Concentrando-me no elemento de fogo, eu estendi minha mão, como


Aiden fez. Bolas de fogo de cor violeta caíram no chão em ambos os lados,
espalhando-se rapidamente enquanto formavam uma parede.

— Vá! — Aiden ordenou, empurrando-me para cima.

Me arrastei pelo solo, não surpresa quando vi alguns dos bastardos


peludos saltando sobre o fogo. Outros bateram direto nele, mas caíram para o
lado, assobiando de dor. Aiden agarrou meu braço enquanto subíamos a
última parte da colina escorregadia por causa da chuva. Atrás de nós, as
aranhas ultrapassaram as chamas. O som de suas pernas movendo pelo chão
iria me assombrar direto para terapia de grupo. Chegando ao topo do morro,
meus dedos bateram na pedra e eu quase chorei de alegria.

Um dos monstros mais rápidos balançou abaixo, agarrando minha perna.


Minha pegada escorregou e meu coração pulou na minha garganta quando o
peso da aranha e o pesado manto me arrastaram de volta ao longo da borda.
Eu soltei um grito rouco enquanto meus dedos continuavam a deslizar, mas
Aiden estava lá de repente, enfiando os braços sob os meus.

Ele se jogou para trás, músculos poderosos enrijecendo e aparecendo sob


o manto enquanto ele me puxava sobre a borda, aranha e tudo mais.
Puxando a minha perna livre para cima, eu torci e rolei, batendo o calcanhar
da minha bota em um dos olhos da aranha. Deixando escapar um silvo, a
aranha escorregou da minha perna e caiu morro abaixo, levando alguns de
seus amigos com ela. Cambaleando para ficar de pé, nós passamos pela fenda
estreita, justo quando a massa de aranhas parou na borda e bateu na parede.
Vinte e dois

Nós viajamos durante o que pareceram horas através de um túnel


apertado tão escuro que até mesmo os meus olhos estavam tendo dificuldade
em se ajustar a ele. Aiden enviava uma pequena bola de fogo a cada poucos
minutos, mas nenhum de nós queria arriscar a luz por muito tempo, quem
sabe o que poderia estar aqui? Essas aranhas não podiam caber na fenda
estreita, mas, conhecendo a nossa sorte, elas provavelmente tiveram bebês
que estariam mais do que ansiosos para nos encontrar no labirinto de
túneis[V1] .

Exaustos e encharcados até os ossos, paramos quando o túnel alargou no


que parecia ser uma entrada para uma caverna. Aiden avançou em direção a
ela, olhando para a escuridão. Ele levantou a mão quando eu fui para frente
para dar uma olhada.

— Deixe-me ver o que temos em primeiro lugar, tá? — Ele perguntou.

Eu afastei a minha vontade de empurrá-lo de lado e ajudar.

— Fique à vontade. Se houver um urso do Submundo aí dentro, vou


deixá-lo roer você primeiro.

Atirando-me um sorriso irônico, ele balançou a cabeça e se arrastou para


a frente, o punhal na mão. A pequena bola de fogo que ele enviou foi
engolida pela escuridão. Ficar do lado de fora da caverna literalmente levou
todo o meu autocontrole.

Encostei-me na rocha invisível, mas provavelmente viscosa, entorpecida


na minha roupa molhada. Eu não tinha certeza de que eu ainda tinha todos
os meus dedos. Era uma coisa boa que Aiden me amava e poderia olhar
através da minha aparência. Eu não duvidava que eu parecia ser uma rainha
do baile da semana passada depois de uma noite infernal.

Aiden voltou, suas adagas guardadas por agora.

— Tudo limpo. Devemos ficar bem pela noite.


Me empurrando da rocha, eu o segui para dentro. Era estreito por alguns
passos, e então abria em uma câmara circular – definitivamente mais seco
no interior, de modo que era algo positivo. Chuva pingava na rocha de alguns
buracos relativamente pequenos em uma parte do teto, mas o resto estava
seco e adequado.

Tinha também outra coisa dentro...

Na esquerda da câmara tinha uma espécie de nascente natural. Bem, aqui


em baixo, eu não tinha certeza do que era. Por tudo o que sabia, poderia ser
um tanque de ácido, mas cheirava a...

— Jasmim — eu disse.

— Eu sei. — Aiden apareceu ao meu lado. Ele soltouou o capuz de volta


na minha capa e alisou suavemente o polegar em meus lábios que já não
pulsavam. — Estranho, né?

— Tudo é estranho aqui embaixo. — Aproximando-me da piscina de água


perfumada, eu estendi minha mão. O calor fez cócegas na minha palma. — É
aquecido, mas não parece muito quente.

Aiden tinha retirado o capuz.

— Eu duvido que teríamos sorte o suficiente para um banho – Alex, não!

Muito tarde. Eu já tinha me ajoelhado e cuidadosamente colocado um


dedo na água, imaginando se eu poderia me privar de um. A água borbulhou.

Ar agitou em torno de mim quando Aiden disparou para a frente,


agarrando meus ombros.

— Está tudo bem. — Eu disse a ele. Diferente da súbita espuma


borbulhante, a água realmente parecia agradável. Era tão clara que eu podia
ver o chão da piscina de pedra.

— Deuses, Alex, você não pode apenas enfiar o dedo nas coisas.

Eu arqueei uma sobrancelha.

Ele revirou os olhos.

— Sua mente me assusta.


Eu sorri.

— Você gosta de como a minha mente funciona.

Calor instantâneo escureceu seus olhos para prata.

— Na maioria das vezes, sim. — Ele relaxou, deixando de lado os meus


ombros. — Eu não tenho certeza se devemos iniciar uma fogueira.

Me endireitando, eu olhei para a minha roupa molhada. Droga.

Seus lábios tremeram.

— Pode chamar atenção indesejada.

— Aranhas — eu sussurrei.

Aiden assentiu.

Estremeci.

— Você é tão feroz. — Ele veio para ficar diante de mim, inclinando a
cabeça para o lado enquanto ele colocava as pontas dos seus dedos no meu
queixo. — E tão valente, mas as aranhas te fazem pirar.

— Essas aranhas eram o dobro do tamanho de Rottweilers, Aiden. Elas


não eram aranhas normais.

— Ainda assim, aranhas — ele murmurou, abaixando a cabeça. Seus


lábios roçaram os meus. O toque suave foi muito rápido, mas poderoso. —
Mas se você tirar a roupa, eu tenho certeza que posso deixá-las secas.

Meus olhos se arregalaram.

— Uau. Você está tentando me deixar nua?

Seu olhar prateado encontrou o meu.

— Você realmente precisa que eu responda a isso?

Um quente e doce rubor deslizou através do meu rosto. Quando ele era
assim – aberto, flertante e francamente sexy – eu era do meu jeito mais
brega. Eu não estava acostumada com esse lado dele. Eu acho que nunca
estaria, e havia algo de emocionante nisso. Mas eu olhei para ele, presa entre
as imagens rodando na minha cabeça e o homem muito real diante de mim.

Aiden riu.

— Você devia se ver agora.

Saindo disso, eu esperava que a minha expressão agora se parecesse com


Alex a Deusa do Sexo e não Alex a Patética.

— Como estou?

Seu sorriso era pequeno e secreto.

— Bonita.

— Bonita?

— Mmm hmm. — Ele vagou em direção às bordas da caverna, analisando


as sombras por deuses sabem o quê. — Mas, falando sério, se você tirar essas
roupas, eu posso secá-las.

Mas eu ficaria totalmente nua. Não havia nenhuma necessidade para que
eu fosse tímida perto dele, mas alguma coisa sobre isso, aqui...

Ele tirou o manto e deu de ombros para tirar a mochila. Como se lesse
minha mente, ele levantou a sobrancelha.

— Empacotei dois cobertores. Eles não são muito grandes, mas são
grandes o suficiente para cobri-la.

Meus lábios se espalharam em um sorriso. É, Aiden pensava em tudo.

— Você é incrível.

O olhar que ele lançou por cima do ombro disse que ele sabia.

— Eu sei que as roupas estão te incomodando.

— Não estão. — A última coisa que eu queria era ser chorona e fraca na
frente de Aiden.

Seu olhar caiu.

— Elas não estão?


— Sim... — Meu olhar seguiu o seu para onde eu estava coçando no meu
quadril. Eu parei. — Tudo bem. Elas estão me incomodando.

— Pele delicada? — Ele se aproximou, em seguida, ajoelhou-se e abriu o


zíper da mochila.

Olhei para seus cachos úmidos e escuros enquanto ele vasculhava a


bolsa.

— Sim, eu tenho a pele sensível. Você embalou alguma loção?

— Não — ele riu. — Mas nós temos Trail Mix.

— Yum.

— Além disso, algumas nozes mistas...

— Duplo Yum.

— E um pouco de água. — Ele inclinou a cabeça erguida, os olhos


dançando. — Sinto muito. Eu não pude embalar um McDonald’s para você.

— Bem, ninguém é perfeito.

Aiden riu novamente. Deuses, eu amava esse profundo som rouco, e eu


nunca me cansava de ouvi-lo. Assim cada vez que ele fazia, eu desfrutava
disso como um bem mais precioso.

Ele colocou o cobertor em um local seco, e em seguida, levantou-se.

— Vou ver a entrada só para ter certeza de que estamos bem pela noite.

Eu assenti, e ele se virou sem uma palavra, desaparecendo na rachadura


na parede.

Sentindo-me estranhamente tonta, considerando onde eu estava eu me


virei para a piscina. Só de pensar em escorregar na água quente fazia a
minha pele gelada e suja implorar.

Mas Aiden não aprovaria.

Arrancando a capa, eu chutei as minhas botas, olhando para a água


como se fosse um pedaço de filé. Se a água fosse perigosa, ela certamente
teria descascado a pele do meu dedo agora ou me faria sair correndo,
gritando como uma galinha. Opinião formada, eu rapidamente me despi e
deslizei os dedos dos pés na água. Suspirei quando a piscina fez espuma e
bolhas, e cuidadosamente desci até os degraus naturais. Água batia e caía em
meus quadris enquanto eu ia mais longe. Calor, inebriante e agradável,
atravessou minha pele, até meus músculos. Ela não ardia os inúmeros
hematomas ou cortes – na verdade, a água parecia acalmá-los. O perfume
sedutor e suave também pareceu acalmar a dor surda em minhas têmporas.

No meio da nascente, a água batia logo abaixo do meu peito, mas a


minha presença agitava a água e a espuma branca da ponta alcançava a
minha clavícula, borbulhando ao redor do talismã.

Fechando os olhos, deixei escapar um suspiro. A água estava muito boa.


Eu poderia ficar aqui a noite toda, sentindo as pequenas bolhas provocando
meus dedos dos pés, deslizando para cima em minhas pernas.

Era o paraíso no Submundo.

Eu sorri, pensando que Hades tinha coisas boas quando se tratava de


SPAs e relaxamento.

— Alex...

A voz de Aiden me tirou dos meus pensamentos. Olhei por cima do


ombro, sorrindo timidamente.

— Eu não pude resistir. Sinto muito.

Ele não parecia zangado. Surpreendentemente, ele não parecia irritado


também. Eu não poderia dizer que ele parecia emocionado também, mas...

Oh...

Aiden parecia faminto.

Minha respiração engasgou na minha garganta, e foram precisas algumas


tentativas para encontrar a minha voz.

— Está tudo limpo fora da caverna?

De olhos semicerrados, ele acenou.


Mordi o lábio. É claro que estava bem. Estávamos seguros pela noite, mas
descansar não estava em minha mente. O que era totalmente inadequado e
eu seriamente tinha minhas prioridades misturadas, mas estávamos
enfrentando o desconhecido. Esta viagem era perigosa e nós dois poderíamos
ser feridos. Pior ainda, Aiden podia morrer.

Um pânico puro brotou no meu peito com a ideia de perdê-lo. Eu


simplesmente não podia suportar sua perda. E por causa disso, eu queria
fazer uma pausa. Eu queria viver, realmente viver o momento, e com Aiden,
isso sempre era possível. Era mágico, na verdade.

Respirei fundo e demoradamente.

— Você... você deveria se juntar a mim.

Parte de mim esperava que eu teria que implorar bastante. Aiden estava
'trabalhando', e eu estava preparada para implantar todas as técnicas que eu
conhecia, incluindo choramingar.

Então, quando ele deu um passo para trás e deslizou para fora de suas
botas, eu fiquei muito surpresa. Choque espirrou em mim quando ele
calmamente puxou a camisa para fora da cintura de suas calças táticas e
puxou o tecido molhado sobre sua cabeça.

Eu reprimi um suspiro.

Seu estômago era uma séria perfeição, um produto de anos de


treinamento rigoroso. Parecia que alguém tinha colocado rolos de pintura
sob sua pele esticada. E seu peito...

Sim, eu não conseguia parar de olhar.

E todo o tempo ele me observava com um olhar intenso como prata


aquecida. Senti o rubor retornar ao meu rosto enquanto minha respiração
acelerava.

Quando suas mãos se moveram para a parte superior de suas calças, eu


me virei. Só porque eu tinha certeza de que iria desmaiar e me afogar se eu
ficasse olhando, e bem, isso iria matar o momento.

A roupa atingiu o leito de pedras e houve um segundo, muito grande, de


silêncio, e depois a água se agitou na piscina, borbulhando ainda mais. Pulso
batendo em todos os lugares, eu me virei para ele e perdi a minha respiração
e meu coração mais uma vez.

Aiden estava ali como um deus.

Muito mais alto do que eu, a água roçava seu umbigo. Espuma branca
lambia as nervuras planas de seu estômago, e eu estava impressionada com a
imagem de Poseidon saindo do oceano.

Poseidon não se comparava com ele.

Ele deslizou pela água borbulhante, suas mãos nos seus lados. Eu tive que
inclinar minha cabeça para trás para encontrar seu olhar.

— Hey — eu disse.

Um lado de seus lábios se curvou.

— Isso provavelmente não é uma boa ideia.

— Por quê?

— Tenho a sensação de que vou estar muito distraído aqui em poucos


segundos. — Ele estendeu a mão porém, encontrando a faixa que mantinha a
maioria do meu cabelo para cima. — Na verdade, eu já estou distraído.

Meu coração estava tentando sair do meu peito.

— Mas estamos seguros aqui. Apolo disse isso.

— Nós estamos, mas... — Ele gentilmente puxou a faixa, e em seguida,


começou a reorganizar as mechas grossas ao redor dos meus ombros. Uma
grande quantidade se afundou abaixo da superfície. — Mas devemos ter
cuidado. Eu deveria estar prestando atenção.

Entrei no círculo que seus braços criavam enquanto ele brincava com
meu cabelo. Colocando minha mão em seu peito, fiquei emocionada pela
forma como ele tremeu e respirou fundo.

— Você não consegue ser multitarefa? Eu consigo.

Aiden preguiçosamente jogou uma mecha úmida por cima do meu ombro
e mudou para outra.
— Você é uma mentirosa. Suas habilidades de multitarefa são uma droga.

— Não são. E não estamos falando de minhas habilidades de multitarefa.


— Minha mão deslizou para baixo, tendo mente própria. — Eu acho que você
consegue fazer duas coisas ao mesmo tempo.

Ele tinha reunido todo o meu cabelo agora, torcendo-o em torno de seu
punho.

— Você acha? — Ele colocou um dedo no meu lábio inferior, lentamente,


traçando a curva. Seus cílios baixaram ainda mais, e só o mais fino pedaço
de olhos prateados brilhou. — Você deveria estar descansando.

— Eu vou descansar. — Eu tomei o último passo para a frente. As bolhas


borbulharam e cederam. Esticando-me, eu enrolei um braço em volta de seu
pescoço. — Mas você deve descansar, também.

A mão livre de Aiden caiu do meu pescoço, através do meu ombro, e em


seguida, seu braço estava em volta da minha cintura, segurando-me
firmemente contra ele, nossos corpos se tocando por inteiro. Era de
enlouquecer, e quando seus lábios roçaram a curva de meu queixo, meus
olhos se fecharam. Todos os músculos do meu corpo ficaram tensos, e então
eu senti as marcas deslizando sobre minha pele.

— Nós podemos fazer turnos — Aiden disse contra o meu queixo, e então
no outro maxilar. — Você dorme primeiro. Descanse algumas horas e eu vou
acordá-la. — Ele fez uma pausa, dando um beijo no ponto sensível abaixo da
minha orelha. Eu tremi. — Tudo bem?

Eu teria concordado com qualquer coisa a essa altura, então eu


concordei.

— Depois saímos assim que for seguro. — Aiden abaixou a mão enrolada
no meu cabelo, arqueando minha costas. O ar frio da caverna propagava
arrepios na minha pele exposta. Eu respirei fundo, quando senti seus lábios
voltarem para onde minha pulsação batia e depois mais baixo, sobre a curva
da minha clavícula, e ainda mais baixo.

Em seguida, ele recuou, soltando, seu peito subindo e descendo instável


enquanto ele se movia em direção à borda da piscina.

— E você deveria estar descansando agora. Isso...


— Pare de falar. — Eu me empurrei através da água, bem consciente de
que, enquanto eu me aproximava dele, o manto de água recuava lentamente.

Aiden estava bem ciente disso também. Um músculo flexionou em sua


mandíbula quando seu olhar caiu.

— Você acabou de me dizer para calar a boca?

— Não. — Eu o segui enquanto ele continuava recuando, até que ele não
tinha nenhum outro lugar para correr, até que suas costas estavam contra a
borda da piscina de pedras e ele estava preso. Colocando minhas mãos em
cada lado dele, olhei para cima. — Tá bom. Eu lhe disse para calar a boca,
mas eu fiz isso gentilmente.

Ele tomou um profundo e longo fôlego.

— Eu posso ser capaz de esquecer isso.

Eu flutuei mais perto, deixando minhas pernas emaranhadas com as dele.

— Para alguém que não fala muito, com certeza você está falando muito
quando eu preferia que não estivesse falando.

A risada de Aiden soou embargada.

— Isso faz muito pouco sentido, Alex.

Sorrindo, eu me inclinei e pressionei meus lábios à curva forte de sua


mandíbula, repetindo o que ele havia feito até que minha pulsação trovejava
em cada parte de mim[V2] .

— Fazer sentido é superestimado.

— Eu acho que você acredita que um monte de coisas são


superestimadas. — A cabeça de Aiden caiu para trás, as faixas grossas de
seus músculos em seu pescoço e ombros tensas, enquanto suas mãos
afundavam na borda da piscina.

Por um momento, eu congelei maravilhada com ele. Não era sempre que
alguém via Aiden assim, completamente vulnerável a outra pessoa. Toquei
seu rosto, querendo lembrar deste momento. A enormidade do que estava por
vir era uma corrente de ar frio na minha pele e mais profunda, em minha
alma. Não havia como dizer o que o meu futuro reservava – o que Aiden
acabaria sendo. Tantas coisas ainda eram tão incertas.

As palavras de Apolo se intrometeram. Só pode haver um.

Estremeci, entendendo o que aquilo significava mais do que eu queria.


Até Seth tinha entendido isso. Eu pensei sobre o maldito sonho que eu tinha
tido no caminho para cá.

Poderia não haver anos para Aiden e eu – talvez nem mesmo meses ou
semanas. Poderia não haver nem mesmo dias. E o tempo que tínhamos
sobrando, estaríamos gastando em constante perigo. A próxima hora nem
estava garantida, e eu não queria gastar cada momento correndo para o
tempo final.

Os olhos de Aiden se abriram.

— Alex?

Eu pisquei as lágrimas repentinas.

— Eu te amo. — Era tudo que eu poderia dizer.

Sua cabeça levantou, seus olhos procurando os meus, e talvez ele tivesse
visto o que eu estava pensando. Talvez ele também soubesse que, no final,
haveria mais vidas perdidas – aquelas que seriam quase impossíveis de
superar e seguir em frente, perdas que iriam roubar uma parte de nós. Que
este momento juntos, nunca poderíamos ter novamente.

Ele tinha terminado de falar.

Aiden saiu da parede tão rápido que a água reagiu em um frenesi


borbulhante. Ele – nós – estávamos em um frenesi. Seus braços me
esmagaram contra ele, sua boca exigente, dizendo essas três pequenas
palavras uma e outra vez, sem pronunciá-las. Aiden me levantou, uma mão
enterrada no fundo do meu cabelo, e a outra pressionando a parte inferior
das minhas costas, encaixando-nos juntos. Ele se virou e minhas costas
estavam contra a borda e ele estava em todos os lugares ao mesmo tempo,
roubando minha respiração, meu coração, minha alma. Não havia busca por
ar, sem controle ou limites. Não havia vacilos. Nós dois caímos de cabeça.
Em seus braços, na forma como a água borbulhava e se mudava com os
nossos corpos, eu posso ter perdido a noção do tempo, mas eu ganhei uma
pequena parte de mim. Eu ganhei uma parte dele que eu iria segurar perto
pelo resto dos meus dias, não importa quão longo ou curto isso acabasse
sendo.

[V1] 17/2

[V2] nnn
Vinte e três

Enquanto eu dormia, Aiden tinha conseguido secar nossas roupas, sem


torná-las crocantes. Se isso tivesse sido deixado para mim, eu provavelmente
as teria transformado em tochas. Dormi um pouco mais de quatro horas,
acordando antes que ele me chamasse. Eu me troquei, e depois me acomodei
ao lado dele em um dos dois cobertores finos. Nós dois tínhamos cheiro de
jasmim, que era melhor do que o cheiro úmido do Submundo.

Aiden estava deitado de lado, com um braço pesado sobre minha cintura.

— Você poderia ter dormido por mais tempo.

Eu preguiçosamente brinquei com a mão que repousava sobre meu


estômago.

— Eu estou bem. É a sua vez. Vou ficar de olho nas coisas, ter certeza de
que nenhuma aranha fuja com você.

Ele apertou seus lábios em minha bochecha e soltou uma risadinha.

— Eu estou preocupado que se a decisão for entre mim e uma aranha, eu


poderia estar ferrado.

— Eu enfrentaria uma horda de aranhas por você, baby. — Eu sorri ao


ouvir o som de sua risada de novo. — De verdade.

— Aí está o verdadeiro amor. Coisa séria — ele brincou.

— É mesmo.

Houve uma pausa e então ele disse.

— Enquanto você estava dormindo, eu estava pensando sobre o que Apolo


disse sobre a existência de um outro Deus envolvido.

Com a curiosidade aguçada, eu joguei minha cabeça para trás para que
pudesse ver seu rosto.
— Sim?

— Eu sei que Seth não deixou escapar quem poderia ser, mas Marcus tem
suas apostas sobre Hermes, e já que ele ajudou Seth...

— É sempre Hermes. Ele é como o saco de pancadas dos deuses. A grande


piada.

— Exatamente. — Aiden tirou uma mecha de cabelo úmido da minha


testa. — Parece muito óbvio que seria ele. E mesmo que Hermes seja
conhecido por aprontar algumas, suas ações são relativamente inofensivas.
Isso – o que tem sido feito para o mundo inteiro, inclusive Olimpo – é maior
do que ele, quase como se fosse pessoal.

Ele tinha um ponto.

— Eu aposto que ser o alvo de piadas do Olimpo poderia tornar as coisas


pessoais depois de alguns milhares de anos.

— É verdade, mas eu não sei... — Ele bocejou. — Eu fico pensando sobre


Seth, sobre a sua personalidade.

— Oh querido...

Um sorriso cansado apareceu.

— Querendo você admitir ou não, você carrega alguns dos traços de


Apolo. Então, logicamente, Seth carregaria alguns de sua própria linhagem.

Havia coisas piores do que ser comparada a Apolo.

— Seth é arrogante e presunçoso. Isso realmente não diminui a lista. —


Ao cansado aceno de concordância de Aiden, eu apertei suas mãos. — Vá
dormir. Nós vamos descobrir isso na parte da manhã.

Aiden insistiu que ele não estava tão cansado, mas não demorou mais do
que alguns momentos antes de que sua respiração se tornasse profunda e
constante. Eu fiquei em seus braços, os olhos grudados na entrada. Eu ainda
estava cansada, e a dor de cabeça tinha voltado desde o momento em que eu
tinha acordado, espalhando-se a partir de minhas têmporas, mas era
controlável.

Remoendo o que Aiden tinha dito, eu tinha que concordar com a ideia de
que havia algo pessoal por trás disso. Mas o único problema com isso era o
fato de que todos os deuses provavelmente tinham uma boa razão para
causar discórdia. Apolo mesmo tinha dito uma vez que, depois de milhares de
anos estando juntos, eles não tinham nada melhor para fazer do que brigar
uns com os outros.

Precisávamos descobrir quem estava por trás disso, mas o que poderíamos
fazer? Eliminar um deus era algo inédito. Mesmo os Titãs haviam sido
sepultados, e não mortos. A perda de qualquer deus acarretava consequências
cósmicas. O mundo não pararia de girar, mas todos os deuses seriam
enfraquecidos se um caísse. Isso era, provavelmente, a única coisa que os
impedia de matar uns aos outros, mas...

Um grande problema de cada vez...

Seth e Lucian eram o nosso maior problema. Felizmente, nós acharíamos


Solaris e ela teria a resposta para pará-lo. Parte de mim não tinha desistido
do menor raio de esperança de que de alguma forma Seth poderia ser salvo –
que ele poderia ser consertado. Eu sinceramente acreditava que, sem Lucian
e a influência do éter, ele não teria feito as coisas que ele fez.

Mas quem era eu para dizer que isso o absolvia de seus pecados? Se um
viciado em drogas matasse uma pessoa sob influência, ele ainda era culpado.
Seth tinha feito o que tinha feito e parecia que não havia como voltar atrás
com isso.

Mágoa era como lama em meu sangue, suja e bagunçada, porque se


sentia deslocada. Como se eu me sentisse mal por um assassino...

Empurrando os pensamentos de Seth de lado, eu acariciei o comprimento


dos dedos de Aiden e me perguntei se eu ouviria Aiden tocar violão
novamente. Eu esperava que sim. Talvez até mesmo levá-lo a cantar, porque
ele tinha uma voz agradável.

Eu não tinha certeza de quanto tempo se passou, mas não poderia ter
sido mais de uma hora. O céu espreitando pelos buracos no teto da caverna
ainda era de um azul profundo e minha dor de cabeça... tinha aumentado
constantemente. Agora pulsava atrás dos meus olhos.

Não havia como continuar me enganando. Eu sabia o que isso


significava. Seth estava na outra extremidade do vínculo e estava tentando
me alcançar. O veneno de pânico me deu uma mordida afiada. Agora não era
hora para ele puxar esse tipo de coisa. Um maldito exército de aranhas
poderia descer sobre nós enquanto eu estava com ele. Pior ainda, poderíamos
ser descobertos por Hades.

Cuidadosamente me soltando do abraço de Aiden, eu fiquei de pé e fui


para a piscina, recolhendo a água de jasmim e espirrando-a sobre meu rosto.
Isso pareceu ajudar antes, mas eu tinha a sensação de que estava além de
ajuda.

Me sentei, concentrando em minha respiração. Eu podia sentir a corda


agora. Ela ainda dormia, mas o barulho era mais forte, mais poderoso.
Colocando minha cabeça em minhas mãos, eu fechei meus olhos e esperei.
Parte de mim já sabia que não havia como parar isso.

Seth era incrivelmente forte e extremamente determinado quando ele


queria ser.

Então eu esperei pela dor vir, mas ela nunca veio. Em vez disso, o
zumbido da corda tornou-se mais alto e mais forte, até que parecia que meu
corpo inteiro vibrava. Em seguida, fora do ruído branco enchendo minha
cabeça, um sussurro cresceu até que eu pudesse entender as palavras e
reconhecer a voz.

É bom ver... ou ouvir você de novo, Alex.

Seth.

Meus olhos se abriram e, ao contrário da última vez, eu não estava


mentalmente transportada em algum lugar por Hermes. A nascente ainda
estava na minha frente. Eu podia ouvir as respirações profundas de Aiden e
sentir o frio leve no ar da caverna.

Eu sei que você pode me ouvir, Alex. Eu posso sentir isso.

Eu gemi. Estou realmente começando a ficar irritada com isso.

Através da ligação, eu podia sentir a sua presunção. Era como antes,


quando tínhamos estado ligados. Suas emoções fluíam através de mim e vice-
versa. Aposto que, se eu fechasse meus olhos, eu podia vê-lo tão claramente
quanto se ele estivesse na minha frente, mas nós não estávamos conectados.

No fundo, você ama isso, ele disse.


Uh, não. Colocando meu cabelo úmido para trás, deixei escapar um
suspiro. Eu não entendo como você é capaz de fazer isso. Nós não estamos
conectados.

Depois da nossa pequena última visita social, é mais fácil de tocar na


conexão. Sempre que você está se sentindo realmente desgastada ou
emocional, posso te alcançar. Eu acho que seria a mesma coisa se você
estivesse com dor. Houve uma pausa, e eu juro que senti um lampejo de
preocupação. Você está com dor?

Revirei os olhos. A boa notícia é que Apolo deve ter tido uma conversa
com Hermes. Não, mas você é um pé no saco. Isso conta?

A risada de Seth ainda tinha aquela estranha sensação de calor. Pelo


menos assim você não pode me bater.

Bater em Seth ainda parecia como uma opção viável. Eu não tenho
tempo para isso agora.

Curiosidade filtrou através da conexão. O que é que você está fazendo


agora, Alex?

O que é que VOCÊ está fazendo agora, Seth?

Houve aquela risada novamente. Era uma boa risada. Não tinha o mesmo
efeito que a de Aiden, mas era rica e profunda e lembrava-me de Seth.

Seth Pré-Assassino, quero dizer.

Você diz primeiro.

Sim, isso não vai acontecer. Olhando por cima do meu ombro, eu vi
Aiden mexer um pouco. Então eu fechei os olhos e foquei na conexão. Eu
percebi que eu poderia muito bem recolher algumas informações a partir
disto.

Uma fração de segundo mais tarde, Seth tomou forma em meus


pensamentos. Por alguma razão, ele só tinha metade de suas roupas. Eu não
tinha certeza se era eu fazendo isso, ou se ele realmente estava sem camisa.
De qualquer forma, era muita pele dourada exposta. Pisando de leve, eu testei
a conexão e as emoções que me alimentaram. Eu não sabia se poderia de
alguma forma ser sugada para ele dessa maneira, então eu continuei com
uma grande dose de cautela.

A única coisa que eu sentia era... calma, o que era realmente...

Um frio repentino serpenteou pela minha espinha, e, em seguida, Seth


disse, O que você está procurando, não vai encontrar.

O que você acha que eu estou procurando?

Com você, nunca se pode ter tanta certeza.

Oh, o sujo falando do mal lavado.

Divertimento fluiu através da conexão quando Seth disse, Ou é o sujo


chamando o sujo de sujo.

Eu fiz uma careta. O quê?

Seth riu. Ah, eu meio que senti falta disso, Alex.

Abrindo os olhos, eu resisti ao impulso irracional de admitir que eu


também senti falta da brincadeira, a batalha de xingar que nenhum de nós
vencia. Isso era estranho – a dinâmica das minhas relações com Seth e
Aiden. Aiden me complementava, ele era o yin para o meu yang, o ‘agora,
agora’ para os meus comentários espertinhos. Mas Seth e eu éramos muito
parecidos, e de certa forma, nós realmente éramos a mesma pessoa. Juntos
por muito tempo, nós provavelmente mataríamos um ao outro.

Mas sim, havia uma parte de mim que sentia falta disso – falta dele.

Por que você não começou a gritar comigo ainda? Perguntou ele.

Eu sufoquei uma risada. Só você faria essa pergunta. O quê? Você quer
que eu grite com você? Eu duvido que isso fizesse algum bem. Isso não vai
te mudar.

Mas isso nunca te impediu de fazer alguma coisa antes. Mesmo se você
soubesse o resultado e que isso era inútil, você ainda faria.

Como agora? Ficar longe de você é inútil?

A presunção estava de volta, estabelecendo-se em cima de mim como


uma segunda pele. Muito inútil, ele acrescentou.
Frustrada agora, eu fechei os olhos e suspirei. Talvez você não me
conheça tão bem quanto você acha. Eu sei que você não se importa com
ninguém além de si mesmo, mas eu realmente preciso ir.

Picadas de irritação ofuscaram o calor de diversão e arrogância. Eu quero


conversar.

Imediatamente cautelosa, minhas mãos abriam e fechavam. O que você


quer falar?

O quão você está errada.

Foi uma coisa boa Hermes não ter aparecido, porque a minha mão coçava
para se conectar com seu rosto. Oh, deuses... Seth, eu não posso fazer
isso...

Eu me preocupo com você, disse ele, me surpreendendo.

Eu balancei minha cabeça, querendo negar, porque tirar a minha


capacidade de tomar minhas próprias decisões era um baita jeito de mostrar
como ele se importava, mas era a verdade. Mas lembrei-me daquela noite na
casa de Telly, naquele momento eu tinha visto a indecisão em seus olhos, a
vulnerabilidade. Ele não queria me machucar, mas eu acreditava que o que
ele precisava oprimia o que ele queria.

Eu sei, eu disse, porque, no fundo, eu sabia que ele se importava.

Ainda mais chocante, havia uma abertura súbita na conexão. Não que eu
pudesse ler qualquer um dos pensamentos de Seth, mas havia uma
vulnerabilidade que não tinha estado lá antes. Isso não teria sido ruim
entre nós, mesmo se você nunca conectasse comigo. Não teria sido terrível.

Meu peito estava pesado e doía, porque também havia alguma verdade
nisso.

Mas nunca teria sido suficiente, ele acrescentou, e de uma maneira


estranha, ele parecia mais perto agora, como ele estivesse bem ao meu lado.
Eu sou homem o suficiente para admitir isso. Mesmo que eu lutasse por
você bastante – e, acredite, Aiden não ganha de mim quando eu estou
determinado – no final, o que quer que fosse que você sentiria por mim
teria sido sobras. Eu teria sido uma sobra. Você nunca teria sido
realmente minha. Eu sempre soube disso.
Eu apertei minhas mãos até que minhas articulações doessem. Então,
por que você quis estar comigo – no Catskills, você me pediu para tentar.
Ou foi uma grande parte de seu plano de mestre?

Plano de mestre? Seth riu, mas era sem humor. Por que eu não teria
perguntado? Eu me sinto atraído por você, Alex. Não é preciso muito para
descobrir isso. E há mais. Vim sendo atraído por você, desde que eu te vi
pela primeira vez. É assim que acontece para nossa espécie.

Um distante, quase triste sentimento rastejou através da conexão. Essa


conexão entre nós – eu não acho que você já entendeu, ou até mesmo
sentiu, tanto quanto eu. Mas de qualquer forma, como eu disse, eu me
importo com você, também.

Havia uma coisa física entre nós, em parte devido ao vínculo de Apollyon
e nossa própria atração pelo outro. Eu era adulta o suficiente para admitir
que isso ainda estava lá, mas era diluída em comparação com o que eu sentia
por Aiden. Mas algumas coisas não mudaram.

Eu me preocupo com você. As palavras foram sussurradas e soaram


quebradas para mim.

Por um momento, nós não dissemos nada. Era como um impasse, um


muito estranho e triste.

Por favor, não faça isso, Seth.

Ele suspirou. Alex...

Eu posso ajudá-lo.

As picadas de irritação azedaram meu estômago agora. Eu não preciso de


ajuda.

Você precisa. Eu respirei fundo. Você é como um viciado – o éter,


qualquer amor e aprovação que você está procurando a partir de Lucian.
Você precisa de ajuda.

Eu soube na hora que eu tinha dito a coisa errada. Irritação virou raiva e
foi como estar muito perto de uma fogueira. Eu não preciso de sua ajuda,
Alex. O que eu preciso é que você entenda que não pode escapar do
destino. Isso tudo vai ser diferente – vai ser melhor – se você deixar
Lucian fazer o que precisa ser feito.

Seth...

E eu preciso que você entenda Alex, se você puder, que talvez – apenas
talvez – Lucian realmente se importa comigo, que eu valho isso, e que ele
quer o melhor para mim – para nós. Você acha que pode fazer isso?

Minha garganta trabalhou no caroço que se formou lá. Você vale alguém
se importando com você, mas...

Mas o quê? Sua voz estalou como fogo, me provocando a dizer o que ele
sabia que eu ia dizer.

Eu respirei falhadamente. Mas eu não posso fazer o que você está


pedindo. Você vale a pena – vale muito – mas não Lucian. Ele está usando
você. E vai ser tarde demais...

Não é tarde demais. No final, não importa, eu vou ter tudo o que eu
quero.

E então ele recuou e quebrou a conexão.


Vinte e quatro

Quando abri os olhos novamente, Aiden ainda estava dormindo, e apesar


da corda cantarolar baixinho no meu estômago, Seth tinha ido embora por
enquanto. Levantei e rapidamente examinei a caverna. Tudo estava na
mesma – não era exatamente o Hotel Hilton, mas era seguro.

Engolindo o nó que sentia como um elemento permanente em minha


garganta, me arrastei até Aiden e sentei-me ao lado dele, puxando os meus
joelhos para o meu peito. Deuses, eu não sabia o que era pior – se Seth estava
completamente perdido e não havia nenhuma esperança para ele ou se havia
uma parte dele ainda em algum lugar. De qualquer forma, pensar sobre isso
era indiferente. Agora eu estava em uma missão para descobrir um jeito de
destruir Seth. Então, isso importa? No final, eu não poderia deixá-lo roubar o
poder de mim. Muitas vidas foram perdidas tentando pará-lo.

Aiden deve ser o orgulhoso proprietário de um relógio interno, porque


quando o céu começou a ficar laranja além dos buracos irregulares no teto
da caverna, ele se esticou como um gato selvagem acordando de um cochilo
à tarde.

Sentou-se com fluidez e inclinou-se, colocando as mãos em cada lado dos


meus joelhos dobrados. Calor emanava através de seu peito nu. Ele apertou
os lábios no espaço sensível debaixo da minha orelha e murmurou:

— Bom dia.

— Bom dia.

— Eu estou supondo que nós não fomos invadidos por aranhas? — Aiden
se levantou e estendeu mais uma vez, levantando os braços, as costas
curvando-se.

— Não.

Ele me lançou um olhar por cima do ombro e, em seguida, abaixou-se,


tirando sua camisa da mala.
— Você está bem?

Eu assenti.

Quando nós comemos um rápido café da manhã de alimentos para


hamster e ficamos prontos para ir de volta para o túnel, eu debati sobre o que
dizer a Aiden. Eu não poderia esconder o fato de que tive algum tipo de
interação com Seth novamente, mas eu não tinha certeza de como colocar o
que eu estava sentindo em palavras que qualquer um poderia entender.

Quando ele me entregou o manto com cheiro de mofo, eu finalmente


disse algo.

— Eu vi Seth ontem à noite.

Aiden ficou imóvel, com as mãos apertando a sua própria capa.

— Ok.

Concentrei-me em seu ombro.

— Eu sei que eu deveria ter dito algo antes.

— Sim. Você deveria.

Rubor subiu por minhas bochechas.

— Eu realmente não o vi. Não como da última vez. Ele falou comigo
através da conexão. Ele não sabe o que estamos fazendo. Ele perguntou, mas
eu não disse nada.

— É claro. — Ele colocou a capa com movimentos rápidos e duros. — O


que ele queria?

Mudei o meu peso desconfortavelmente.

— Eu acho que ele só queria... conversar.

— Conversar? — Descrença coloriu seu tom.

— Sim, ele... Eu acho que há uma parte dele lá. Você sabe, uma parte
dele que está confusa, mas ele realmente acredita que Lucian se preocupa
com ele. — Eu parei, balançando minha cabeça. — Isso não importa. Você
está pronto?

Aiden me estudou por um momento, depois assentiu. Com as nossas


capas no local, deixamos a pequena fatia de paz para trás e nos aventuramos
nos estreitos túneis escuros, viajando em silêncio. Como eu não podia ver o
rosto de Aiden ou seus olhos, eu não tinha certeza do que ele estava
pensando, mas eu tinha certeza que tinha algo a ver com Seth. Era o que eu
estava pensando quando nós navegamos no escuro, apenas com os nossos
passos ecoando no silêncio.

Eu desejei que eu tivesse visto o que estava acontecendo com Seth antes
que se tornasse tarde demais, percebido como o éter e o akasha tinham
estado afetando ele. Acima de tudo, eu gostaria de ter visto o quanto ele
precisava de alguém – alguém que o aceitasse, o amasse. Em vez disso eu
tinha estado tão ocupada com meus próprios problemas que eu não tinha
visto tudo o que tinha feito para ele.

O que eu tinha feito para ele.

De certa forma, eu não tinha levado Seth a sério.

Depois de duas horas de caminhada sem parar no escuro, uma pequena


partícula de luz laranja brilhou à frente, e quanto mais perto chegamos, o
local tornou-se maior até que pudemos ver o mundo do lado de fora da
caverna.

— Finalmente — Aiden murmurou.

Ele parou na abertura irregular e áspera e olhou para fora sobre a colina
inclinada que levava a uma espessa névoa que cobria o céu de laranja.

— O Vale das Lamentações — disse Aiden. — Estamos perto da Planície


do Julgamento.

— Esperemos que Apolo tenha recebido a notícia de Caleb. — Eu avancei.


A grama monótona rangia sob as botas. — Não deve demorar muito.

E não demorou, levamos apenas meia hora para descer o morro e para
entrar na névoa, que deu forma quando a fumaça se mexeu, revelando o
Vale.

O lugar era tão deprimente quanto soava.


Árvores nuas pontilhavam a paisagem. Seus ramos enrolados para baixo
nas extremidades, como se pesadas pelo sofrimento infiltrado no ar. Lajes de
rocha cinzenta levantavam da grama maçante e um pequeno riacho de água
escura e mal-humorada se separava da planície.

As pessoas estavam em todos os lugares.

Alguns estavam perto do riacho, deitados preguiçosamente em seus lados.


Seus dedos se arrastavam para dentro da água, seus corpos tremendo uma e
outra vez com suspiros profundos, pesados. Outros estavam empoleirados em
cima de rochas, chorando abertamente, mãos agarrando em seus peitos.
Alguns se sentavam nas bases de árvores, escondidos em bolas enquanto
clamavam.

O Vale das Lamentações era uma fossa de desgosto e sofrimento – o lugar


de descanso final de quem tinha morrido infeliz no amor.

Eu não poderia ter passado por essas pessoas rápido o suficiente. Embora
ninguém se aproximasse de nós, uma vez que pareciam tão perdidos em sua
miséria até mesmo para nós, o nó que estava na minha garganta durante
toda a manhã cresceu rapidamente. A depressão estava no ar que era soprado
aqui. Tristeza enchia o rio. Tristeza enraizava as árvores mortas no local.

Mesmo os passos de Aiden pareciam mais pesados, como se estivéssemos


andando pelo encharcado Campo de Asfódelos.

— Eu não quero estar aqui — disse eu, finalmente, à deriva perto dele.

Aiden estendeu a mão, encontrando a minha mão debaixo da minha


capa.

— Eu sei. Estamos quase terminando.

Um homem virou o rosto coberto de lágrimas para o céu, deixando


escapar um grito rouco. Perto dele, uma mulher caiu no chão, chorando e
cuspindo histéricas palavras ininteligíveis que ninguém estava ouvindo. Essa
era provavelmente a pior parte do Vale. Todas essas almas estavam aqui por
causa do amor infeliz, mas ninguém se importava. Eles estavam sozinhos em
seu sofrimento, como provavelmente tinham estado na vida.

Mas nós não éramos uma parte do Vale, por isso viajávamos por ele sendo
capazes de fazer o que essas pobres almas tinham sido incapazes de fazer na
vida e na morte. Nos movíamos, passando os desejos e necessidades que
nunca viriam a ser concretizadas, além do amor que tinha sido perdido, ou
nunca tinha sido deles.

Algo pesado levantou junto com a névoa e diante de nós estava uma
estrada de paralelepípedos que honestamente veio do nada junto com o céu
limpo, laranja queimando estranhamente. Mas não estávamos sozinhos.
Centenas, se não milhares, de almas percorriam o mesmo caminho que nós.
Todos os tipos de pessoas – jovens e velhos, puros e mestiços – viajando para
o seu julgamento. Distinguir os Sentinelas e os Guardas foi fácil, apesar de
seus uniformes não estarem cobertos de sangue como estavam enquanto eu
estava no limbo. Estas almas tinham sido enterradas.

Aiden e eu nos destacávamos.

Muito poucas almas que viajam usavam capas de qualquer espécie, já que,
obviamente, não era a tendência da moda acima do solo. Se alguém tinha
morrido em um manto, eu estaria curiosa para saber como e o porquê. A
maioria estava com roupas de rua. Alguns até tinham bonés, e talvez a gente
devesse ter guardado algumas delas. Alguém estava até balançando um
chapéu de cowboy.

De qualquer forma, isso não era bom.

Guardas de Hades estavam em postos ao longo da estrada, em cima de


seus cavalos de guerra negros. Mantinham os viajantes se movendo. Era
provavelmente um trabalho interminável e chato.

Nós nos movemos para o centro do grupo, na esperança de nos perder nas
massas de Sentinelas. Alguns deles passaram olhares superficiais por nós,
mas ninguém falou conosco. Ao som de cascos se aproximando, meu coração
disparou enquanto eu coloquei minha mão sobre o punhal debaixo da minha
capa. Senti Aiden mover-se para fazer a mesma coisa.

Mas o grande cavalo de batalha passou na nossa frente, o guarda sobre o


seu dorso. As pessoas correram para fora do caminho, se eles não tivessem
feito isso, seriam esmagados sob as patas poderosas.

Desconforto floresceu na boca do meu estômago, mas não era como se


pudéssemos voltar atrás agora.

Ao nos aproximarmos da Planície do Julgamento, era difícil não notar o


baixo brilho avermelhado se espalhando por todo o horizonte, e quanto mais
viajávamos, maior o... o fogo crescia.

Tártaro.

Whoa, eu não queria estar perto daquele lugar. E eu realmente esperava


que não fosse pega e jogada no Tártaro.

Meu coração estava atirando-se contra as minhas costelas no momento


em que entrei nas planícies do Julgamento. A massa de pessoas que se
aglomeravam na encruzilhada era enorme e os guardas estavam por toda
parte, posicionados apenas no caso de algum condenado ao Tártaro tentar
fugir.

Aiden ficou perto do meu lado.

— Você por acaso não consegue ver Caleb?

Eu ri secamente quando eu fiz a varredura sobre o povo. A multidão era


tão espessa que eu não tinha ideia de como eu poderia ver alguém no meio
dela. E eu tive um momento difícil para não olhar para o palácio, o que
parecia muito perto.

Mais para uma fortaleza medieval do que uma casa, o palácio de Hades
subia pelas montanhas que nós percorríamos, lançando uma sombra escura
em toda a Planície do Julgamento. Quatro torres chegavam até o céu
alaranjado, uma em cada canto do reduto.

Embora eu esperasse que os Campos Elísios oferecessem um melhor


cenário, eu não poderia imaginar acordar todas as manhãs e olhar por uma
das muitas janelas para ver... tudo isso.

Incidindo sobre as coisas importantes, eu me juntei a Aiden na busca


para encontrar a cabeça loira familiar. Havia um monte de loiras, mas
nenhuma delas era de Caleb.

— O que acontecerá se o aviso não tiver chegado a ele? — Eu perguntei a


Aiden, com medo de dizer o nome de Apolo aqui em baixo.

— Ele tem que saber — ele me assegurou, examinando a pilha crescente


de pessoas. — Deuses, quantas pessoas eles processam aqui em um dia?

Milhares, pelo que parecia.


Seguindo em frente, eu percebi que eu era bastante inútil na busca de
Caleb. Sendo tão pequena, tudo que eu podia ver eram nucas. Meu
desconforto cresceu sem controle. Quanto mais tempo nós estivéssemos
aqui, mais perigoso era. Eu pensei de novo no guarda que tinha corrido à
frente. Minha boca ficou seca. Precisávamos encontrar Caleb e
precisávamos…

Uma mão pesada pousou no meu ombro.

Respirando de forma afiada, meus dedos se contraíram em torno do


punho da adaga quando eu a girei, pronta para usar a lâmina se fosse
necessário.

— Nossa, não me esfaqueie. Eu acho que nós já tivemos o suficiente disso


acontecendo entre nós dois.

Eu tropecei para trás quando a voz familiar me inundou. Ele usava um


boné de beisebol puxado para baixo e um capuz enfiado sobre ele, mas
mechas de cabelos loiros aparecendo nas bordas. Um sorriso selvagem
brilhava debaixo da sombra do boné.

— Caleb. — Minha voz soou rouca.

A segundos de derrubá-lo no chão, eu fui parada quando Aiden agarrou o


meu ombro.

— Eu sei o que você quer, — ele disse em voz baixa, — mas iria chamar a
atenção.

— Sim, iria. — Caleb acenou com a cabeça. — Então, vamos manter os


abraços e choros ao mínimo.

Eu já estava a ponto de chorar, por isso agradeci aos deuses que o capuz
escondia. Afastando Aiden, eu parei na frente de Caleb.

— Eu estou tão contente de vê-lo novamente.

— E eu estou feliz em te ver... — Ele ergueu a mão, como se quisesse me


tocar, mas parou. — Também é bom vê-la de volta ao normal.

Eu estremeci.
— Sim, sobre isso... desculpa?

Caleb riu.

— Que bom que estão cobertos pela capa. Venha, temos que fazer isso
rapidamente. — Ele fez um gesto em direção à estrada que conduzia ao
palácio de Hades. — Estou surpreso que vocês mesmo chegaram até aqui sem
serem pegos. Todo o submundo está em um estado de confusão sobre o que
está acontecendo lá em cima.

— Eu imagino que é por isso que eles estão tão ocupados aqui em baixo —
Aiden comentou.

— Sim. — Caleb enfiou as mãos nos bolsos da calça jeans. — Um monte


de Sentinelas e puros chegando. É uma droga, sabe?

— Sim, é horrível. Então, por que nós…?

Sem aviso, o chão tremeu violentamente e um grande, terrível rugido


rachou em cima, me tremendo até os ossos.

Virei-me, assim como todos os outros, para o Tártaro. O cheiro de enxofre


aumentou até que ele fosse grosso e asfixiante. O medo explodiu em meu
intestino. Aiden estava ao meu lado em um instante, sua mão pressionando
minhas costas.

— O que está acontecendo? — Eu perguntei.

— Você vai ver — respondeu Caleb, totalmente não-perplexo.

Eu atirei-lhe um olhar, mas, em seguida, uma bola de fogo voou direto


para o ar sobre o Tártaro, torcendo e agitando enquanto brasas voavam em
todas as direções. O fogo mudou, transformando-se, uma vez que continuava
a ir para o céu.

O funil de fogo parou por um momento.

Em cada lado, o fogo cresceu, espalhando-se em asas gigantes que


pareciam chegar a todos os cantos do Submundo. No centro, uma cabeça de
dragão apareceu. A boca abriu, omitiu outro grito horripilante, e então
desceu. O impacto fez o chão tremer enquanto a cauda de fogo chicoteava
pelo ar.
Em seguida, ele se acalmou.

— Santo Hades. — Eu murmurei.

— É como se fosse a festa de boas-vindas para os condenados no inferno


— explicou Caleb. — Acontece cada vez que um grupo chega lá. Você se
acostuma depois de um tempo.

— Que diabos... — eu murmurei. De jeito nenhum eu ia me acostumar a


ver isso.

— Vamos lá, temos que ir. — Caleb deslizou na frente de nós. — Pode
levar anos para encontrar Solaris, mas eu sei de uma coisa que…

Quatro garanhões negros se separaram da multidão, os seus cavaleiros


altos e imponentes, vestindo couro. Espadas – assustadoras espadas – foram
tiradas para fora. Eles nos cercaram em segundos, pressionaram nós três, até
que nossas costas encostaram uma contra a outra.

Aiden pegou sua adaga e acabou com uma espada apontada para sua
garganta. O olhar na cara do guarda gritava que ele não estava assustado,
nem com medo de usá-la.

— Merda — eu murmurei.

Estávamos tão ferrados.


Vinte e cinco

O braço do guarda não tremeu.


— Mexa-se e você não vai se mover novamente.

Aiden congelou e eu não acho que eu respirava. Eu tinha certeza que


Caleb não estava respirando, mas, novamente, ele não precisava respirar,
sendo que ele estava morto. Mas isso não quer dizer que ele iria sair sem
punição. Fomos pegos. Ele foi pego e tudo que eu conseguia pensar era no
dragão que eu tinha visto. Culpa rasgou através de mim como um rastro de
pólvora.

O olho do guarda fechou em Aiden.

— Levantem suas mãos.

— Você me disse para não me mover, então eu não sei como eu posso
levantar minhas mãos — foi a resposta seca de Aiden.

Mordi uma risada que não teria sido apreciada.

Sem achar graça, o guarda colocou a espada dentro da capa de Aiden. A


espada inclinou-se, puxando de volta. O guarda sorriu quando o rosto de
Aiden foi revelado e um filete de sangue escorreu.

Raiva quente e ardente me queimou, e eu não queria nada mais do que


chutar sua bunda do cavalo, mas a espada estava muito próxima da pele do
pescoço de Aiden.

— Levantem as mãos — disse o guarda.

Um sorriso cruzou seus lábios enquanto ele lentamente levantou as mãos.

— Assim está bom o suficiente?

— Vocês três venham com a gente — outro guarda anunciou quando ele
embainhou sua espada. — Se vocês não obedecerem, nos foi dada a permissão
para usar qualquer método necessário. Tenha certeza de que a morte no
submundo é o mesmo que no mundo superior.

Os guardas viraram os olhos claros além de mim para Caleb.

— E há coisas piores que a morte aqui, rapaz. Você deveria ter pensado
nisso.

Caleb não disse nada, mas tínhamos que fazer alguma coisa. Nós não
poderíamos deixá-los nos levar onde quer que eles planejassem nos levar. O
problema era, apenas Caleb sabia como chegar e sair do submundo, e não era
como se pudéssemos realmente perguntar-lhe isso agora. E eu não estava
deixando Caleb para enfrentar isso sozinho.

Então, sim, como eu disse, nós estávamos ferrados.

Um guarda em pé veio entre os dois cavalos e foi direto para mim. Aiden
se moveu apenas uma fração de uma polegada e a ponta da espada espetou
sua pele.

— Estamos de volta para a parte de não se mover. — O guarda sorriu. —


Isso é bom para você?

Aiden olhou para o guarda e calor derramou dele. O sorriso do guarda


inclinou-se em resposta.

O da minha frente pegou um pedaço da minha capa e arrancou-a. Seus


olhos azul-gelo se estreitaram.

— São eles.

Meu coração caiu aos meus pés. Ele disse como se alguém tivesse estado
nos esperando, o que não era bom. Eu tentei tirar o pânico da minha cara,
mas deve ter sido evidente, porque o guarda riu quando ele voltou.

— Desarmem todos eles — disse ele. — E então nós temos que ir.

A parte de desarmamento levou alguns segundos. Nossas capas foram


removidas, punhais arrancados. A mochila de Aiden foi levada. Dei uma
olhada para Aiden, mas ele olhava para frente, a mandíbula numa linha
rígida. Porcaria, isso era ruim. Caleb parecia resignado, porém, os ombros
caídos, como se soubesse que castigo estava por vir.
Observando as costas dos guardas, eu me perguntava quão rápido eu
poderia derrubá-los para que nós três pudéssemos fugir. Mas isso
provavelmente exigiria o akasha, e onde Caleb se esconderia aqui em baixo?
Onde é que iríamos? E chegar até aqui, só para perder tudo? Eu não poderia
mesmo enfrentar isso. Um nó frio de medo caiu no meu estômago.

Com o medo aumentando mais e mais a cada passo, eu não podia fazer
nada senão seguir os guardas para o palácio de Hades.

— Sinto muito — eu sussurrei para Caleb.

Ele deu de ombros.

— Como nos velhos tempos.

— Sim, mas isso é diferente. Há um dragão feito de fogo que vai…

— Não fale. — O guarda que gostava de brincar com sua espada surgiu ao
nosso lado. — Ou vou fazer com que nenhum de vocês possa falar de novo.

Que nem o meu pai? Raiva doce e quente explodiu. Minha boca se abriu,
mas o olhar de advertência de Aiden a fechou. Estávamos concentrados em
direção ao palácio, em silêncio. Dois guardas montados em cavalos na nossa
frente, dois atrás de nós, e um no chão tornava impossível fazer qualquer
coisa.

E então os portões do palácio foram se abrindo e fomos levados através de


um pátio escasso. Tudo estava acontecendo tão rápido. Meu coração batia
forte, suor pontilhava minha testa. Eu me senti nua sem a maldita capa, e
havia um cão do inferno maldito dormindo deitado de costas na entrada, as
patas davam chute no ar enquanto ele sonhava com as almas que perseguia
ou com o que quer que cachorros do inferno sonhem.

Os Guardas desmontaram de seus cavalos e caminharam em direção à


entrada, abrindo as portas do palácio. Os caras pareciam estar lidando com
tudo isso melhor do que eu, ou eles eram apenas melhores em fingir não
estar a um passo do colapso, mas Caleb provavelmente não estava tão
surpreendido pelo palácio de Hades como eu.

Afinal de contas, ele jogava Wii com os deuses aqui.

Mas o palácio de Hades era... opulento.


Ouro e titânio banhavam tudo – as paredes, teto, móveis, e até mesmo o
chão. Os Símbolos de Hades estavam por toda parte. O touro e as lanças de
dois gumes estavam gravados nos pisos, costurados nas tapeçarias elegantes.
Espreguiçadeiras de veludo preto enchiam o grande salão, mas foram os
tronos cobertos ocupando o estrado que me chamaram e prenderam minha
atenção. Eles eram verdadeiramente dignos de um rei e uma rainha, mas
também era o que estava perto deles.

Dormindo ao lado deles estavam cachorros do inferno menores – talvez


filhotes de cachorros do inferno. Suas múltiplas cabeças descansavam em
suas patas, e baba ácida se agrupava sob a língua pendurada.

Os guardas pararam e, sem palavras, caíram sobre um dos joelhos e


baixaram a cabeça. Um segundo depois, as portas de ouro e titânio do chão
ao teto próximas aos tronos se abriram. Mesmo que Hades devesse estar no
Olimpo, eu esperava que o Deus entrasse pelas portas, pronto para jogar nós
três nos abismos do Tártaro.

Com os joelhos fracos, eu me forcei a manter meus olhos treinados para a


frente. Sentinelas não sentiam medo mas o meu bumbum rosado mestiço...

Mas quando a figura se aproximou, eu soube que não era Hades. Não era
nem mesmo um cara. Era uma fêmea – e era uma deusa.

Ela era linda e alta, próximo dos 2,13 metros. Ondas de cabelo vermelho
encaracolado caiam para uma cintura incrivelmente estreita. Seus olhos
eram brancos, maçãs do rosto altas, lábios carnudos e nariz empinado.

E ela estava praticamente nua.

Seu vestido era branco claro e completamente transparente. Eu tive uma


boa ideia do seu tamanho de sutiã... se ela estivesse usando um, o que ela
não estava. Roupa íntima deve ser opcional aqui.

Aiden estava olhando. Caleb também estava, embora parecer que ele
estava bastante acostumado a toda essa... exposição. Inferno, mesmo eu
estava olhando.

Ela cruzou o grande salão, suas longas pernas dividindo o chiffon da saia,
brincando de esconde-esconde. Caros deuses, eu senti meu rosto começar a
queimar, mas eu ainda não conseguia desviar o olhar. Enquanto ela se
aproximava, os olhos totalmente brancos queimaram e escureceram. Dois
brilhantes olhos cor de esmeralda apareceram.

Caleb relaxou ao meu lado, um sorriso lento rastejando em seu belo rosto
– o rosto que eu tinha sentido tanta falta.

— Olá, Perséfone.

Meus olhos se arregalaram na bela deusa. Portanto, esta era a infame


Perséfone. Mesmo que eu fosse da equipe dos garotos, eu podia ver por que
Hades tinha ficado tão encantado com ela, indo tão longe a ponto de
arrancá-la de lá e trazê-la para o submundo.

O primeiro guarda – não aquele que tinha cortado Aiden – levantou a


cabeça.

— Nós os apreendemos como você desejava.

‘Apreendemos’ definitivamente não era uma palavra quente e acolhedora.

— Vocês três parecem surpresos. — Os lábios exuberantes de Perséfone se


inclinaram com malícia. — Estes são meus guardas pessoais e eles estavam
de olho em vocês. Eu estive esperando por vocês.

— Como? — Eu perguntei, atordoada.

Perséfone sorriu.

— Caleb e eu jogamos Super Mario Kart todos os dias e quando ele


cancelou, eu sabia que algo estava acontecendo.

Olhei para Caleb lentamente.

Ele deu de ombros.

— Não é minha culpa que ela é observadora.

— E fico muito aborrecida quando meu marido está no Olimpo. Caleb me


faz companhia.

Eu esperava que fosse o tipo platônico de companhia, pois Hades não era
conhecido por sua natureza de perdoar.

— Guardas, vocês podem nos deixar agora. — Quando hesitaram, ela riu.
— Eu estou bem. Por favor, vão e não falem disso para ninguém.

Um por um, eles saíram da sala, o cara da espada olhando Aiden como se
quisesse cortar a sua face. Aiden segurou seu olhar enquanto um sorriso
cruzou os seus lábios.

Homens. Suspiro.

Uma vez que as portas do palácio se fecharam atrás deles, Perséfone


bateu palmas.

— Eu fiz algumas perguntas a uma pequena ninfa que havia entrado no


Submundo poucos dias atrás – uma das ninfas de Apolo. E não é preciso ser
um cientista do tempo para descobrir que tinha algo a ver com a sua
linhagem.

— É cientista espacial — Caleb corrigiu quando ele puxou para baixo seu
capuz e tirou seu boné.

Ela franziu a testa.

— De qualquer forma, eu percebi que tinha algo a ver com você... e eu


tinha uma escolha. Ligar para o meu marido e ele vir correndo para casa,
mas depois ele estaria em um estado de confusão, e ele é um pé no saco. Ou
eu poderia descobrir o que vocês precisavam. Tenho certeza de que vai ser
muito interessante.

Aiden passou ao meu lado, claramente pego fora de guarda, como eu


estava. Olhei para Caleb e sussurrei:

— Podemos confiar nela?

Caleb acenou com a cabeça.

— Ela é muito legal, e realmente isso torna meu trabalho muito mais
fácil.

A deusa levantou uma sobrancelha delicada.

— Não disse?

— Eu preciso ver as Águas Convocadoras.


Águas Convocadoras? Eu nunca tinha ouvido falar de tal coisa e, pelo
olhar no rosto de Aiden, nem ele.

— E por que você precisa usar as Águas Convocadoras? — ela perguntou,


cruzando os braços delgados sob os seios, como se ela precisasse de ajuda
para chamar a atenção para eles. — Se você gostaria de ver alguém, Caleb,
você só tem que pedir.

— Eu sei. — Ele deixou cair um braço sobre os meus ombros e o buraco


que tinha estado lá desde que ele morreu foi preenchido. — Mas isso não é
para mim. É para eles. Eles precisam usá-las.

Perséfone ficou em silêncio por um longo momento.

— Quem é que eles querem convocar?

— Solaris — eu respondi. As Águas Convocadoras de repente faziam


sentido – chamar uma alma para você. — Precisamos falar com Solaris.

— Por causa do que está acontecendo no mundo superior com o


Primeiro? — ela perguntou.

Eu assenti.

Seu olhar brilhante deslizou para Caleb.

— E o que você pretendia fazer? Esgueirá-los aqui para usá-la?

— Esse era o plano.

A deusa balançou a cabeça.

— Se meu marido estivesse em casa e você fosse fazer algo tão


imprudente, eu não seria capaz de te ajudar.

Um arrepio dançou pela minha espinha. A última coisa que eu queria era
que Caleb entrasse no tipo de problema da eterna condenação.

— Eu sei — Caleb respondeu, apertando meus ombros. — Mas vale a pena


o risco, e Solaris poderia dar informações para parar o Primeiro. E é isso que
Hades quer, certo? Isso é o que os deuses querem?

— A maioria deles — ela murmurou, seu olhar deslizou de volta para mim
e, em seguida, para Aiden. — Mas não todos, pelo que parece.

Algo me atingiu.

— Você sabe quem é o deus – aquele que está ajudando Seth e Lucian?

Ela pegou uma mecha vermelha brilhante e girou em torno de um dedo


elegante.

— Se eu soubesse tal coisa, então esse deus teria que ter cuidado. Mas eu
raramente estou no Olimpo e tenho pouco interesse na política sobre quem
irritou alguém o suficiente para acabar com o mundo como nós o
conhecemos desta vez.

Aiden pigarreou.

— Isso acontece bastante, então?

Perséfone sorriu, e quando ela sorria, até mesmo eu perdia minha


respiração.

— Mais do que você jamais saberá. O mundo tem estado à beira da total
devastação várias vezes por um motivo ou outro. Mas agora... é como quando
enfrentamos os Titãs. Foi além de algumas palavras bonitas usadas para
encobrir um insulto. — Ela soltou um pequeno suspiro. — Mas de qualquer
forma, eu tenho muito pouco a fazer, e se esta Solaris pode ser de alguma
ajuda para você, então ela vai ser de alguma ajuda para o meu marido. Siga-
me.

Quando ela se virou graciosamente em seu calcanhar, eu estava chocada


demais para me mover em primeiro lugar. Perséfone nos ajudando não era
algo que eu tinha planejado.

Aiden sorriu.

— Isso é bom.

— Isso é bom. — Virei-me para Caleb. — Você arrasa.

— Eu sei. — Ele me puxou para um abraço rápido e apertado. — Senti sua


falta.

Segurando-o perto, eu engoli as lágrimas felizes.


— Eu senti sua falta, também.

Caleb beijou o topo da minha cabeça, e depois se afastou.

— Vamos lá. Vamos começar este show.

Nós três seguimos atrás da deusa. Pobre Aiden estava tentando olhar em
toda parte, menos para ela, mas por baixo de tudo, ele era um cara.
Estranhamente, eu não estava com ciúmes – provavelmente mais divertida
do que qualquer outra coisa, porque ele estava fazendo o possível para
manter seus olhos para o norte.

Deslizando minha mão em torno da dele, eu apertei. Quando seu olhar


encontrou o meu, eu sorri e ele me deu um sorriso torto de desculpas.

Quando fomos por um corredor comprido e escuro coberto com tapeçarias


de veludo negro, Caleb olhou para Aiden e para mim, um olhar estranho em
seu rosto.

— O quê? — Perguntei.

Ele balançou a cabeça.

— Vocês realmente estão fazendo isso – o relacionamento, a céu aberto e


tudo mais?

A mão de Aiden envolveu mais firmemente ao redor da minha.

— Eu acho que agora o mundo tem problemas maiores do que um puro e


uma mestiça estarem apaixonados.

Meu coração deu uma dança feliz na última parte. Apenas ouvi-lo dizer
isso – a palavra com A – poderia afastar todas as sombras escuras e
expectativas ruins.

A risada gutural de Perséfone chegou a nós.

— Isso não é a verdade? Além disso, eles não são os primeiros e nem
serão os últimos.

Os olhos azul-céu de Caleb fixaram em Aiden.

— E você não vai tentar esconder o relacionamento uma vez que tudo se
acalme?

O desafio em sua voz me fez sorrir.

— Não vai acontecer — Aiden disse a ele. — Não vai ser fácil, mas vamos
encontrar um caminho.

— Bom. — Os olhos de Caleb endureceram. — Porque se você a magoar,


vou te assombrar até que você morra.

Eu cai na gargalhada e assim fez Aiden, mesmo que nós dois sabíamos
que Caleb estava falando sério. Deixando de lado a mão de Aiden, eu passei
meus braços ao redor de Caleb.

— Isso não será necessário.

A deusa parou em frente a uma porta de bronze. Com um aceno de sua


mão, ela se abriu. Ainda bem que ela estava nos ajudando, porque eu não
tinha ideia de como Caleb teria conseguido.

Uma onda de ar frio saiu da câmara circular. Havia tantas armas na


parede – machados de batalha, lanças e espadas. Havia itens mórbidos
também, como cabeças de animais abatidos na caça e uma seção inteira
dedicada a rabos de cavalo cortados.

Limpei a garganta.

— Belo quarto...

— É a sala de guerra de Hades. — Incredulidade encheu o tom de Aiden.


— Droga.

— As armas são do meu marido, mas... — Perséfone deslizou um olhar


indiferente ao redor da sala de guerra. — Estes são principalmente troféus de
Ares e não do meu amado. Hades tem uma tendência a oscilar um pouco
sobre o lado mórbido, mas o cabelo... — Ela apontou para os rabos de cavalo
cortados pregados na parede. — Aqueles pertencem a Ares. Ele gosta de
cortar o cabelo das pessoas que ele conquistou e, em seguida, amarrá-los para
que todos possam ver. Isso perturba a maioria dos outros deuses, por isso ele
os mantém aqui.

As sobrancelhas de Caleb subiram.


— Belo toque decorativo, eu acho.

Havia algo estranhamente familiar sobre o cabelo. Não o lance de cortá-


los e pendurá-los na parede, porque, graças aos deuses, isso era estranho para
mim. Mas havia algo que cutucou minha memória.

— Vocês conhecem Ares — Perséfone disse, nos atraindo ainda mais para
a sala de guerra. — Para ele, tudo é sobre a guerra e seus despojos. Paz
praticamente não existe. Ele acredita que nunca se deve virar as costas para
a guerra... — Ela parou de falar e deu de ombros. — Ele deve estar feliz
agora, com tudo à beira do caos.

— Ele é provavelmente um campista feliz — disse Caleb, deslizando um


olhar de ‘Que porcaria é essa?’ para mim.

Dei de ombros, mas aquela sensação estranha estava lá, me irritando.


Será que Perséfone quis dizer para nunca virar as costas para Ares, também
conhecido como ‘O Sr. Guerra’ ou apenas na própria guerra?

— Aqui estamos. — Ela parou na frente de um pedestal de mármore.


Rostos demoníacos foram gravados no mármore da bacia e água vermelho-
rubi a enchia. — Tudo que você tem a fazer é ficar diante dela e chamar a
alma com que você deseja falar – qualquer alma – e elas serão convocadas
aqui.

— Qualquer alma? — Minha respiração ficou presa quando uma imagem


de minha mãe encheu minha cabeça.

— Sim, mas eu só posso permitir que você use-a uma vez. Então escolha
sabiamente. — Perséfone riu. — Eu me sinto como se eu estivesse em
Indiana James e a Arca Perdida.

Aiden lançou o olhar para o chão, o queixo flexionando para esconder seu
sorriso.

Caleb revirou os olhos.

— É Indiana Jones e a Última Cruzada.

— Oh. — Ela encolheu os ombros. — É a mesma coisa.

Meu olhar caiu para a bacia. O nome da minha mãe estava na ponta da
minha língua, e eu sabia, sem olhar para Aiden que ele estava pensando em
seus pais. Qualquer um de nós, provavelmente, daria qualquer coisa para vê-
los, especialmente depois do quão ruins os espíritos tinham estado no portal.

O olhar de Perséfone mudou para entendimento.

— Ah, a chance de ver um ente querido é difícil de passar.

— Você saberia — Aiden disse calmamente.

Seu sorriso desapareceu lentamente.

— Eu faria isso. Talvez alguns me achem egoísta pelas decisões que eu


tomei e o impacto que tiveram.

Lembrando do mito de Perséfone, eu balancei minha cabeça.

— Não. Você foi inteligente. Você fez o que pode para ter os dois – Hades e
sua mãe.

Se ela se sentia convencida pela forma como tudo acabou, no final, toda
a divisão de tempo e as estações do ano, ela não mostrou – surpreendente, já
que os deuses não eram um bando de gente humilde.

Voltando-se para a bacia, ela juntou as mãos na frente dela.

— É hora de fazer a sua escolha e, em seguida, você deve sair.

Olhei para Aiden, que assentiu. Havia um toque de tristeza em seus olhos,
refletindo o que eu sabia. Caleb colocou a mão no meu ombro. Por mais que
eu quisesse ver a minha mãe, tanto quanto eu queria que Aiden tivesse a
chance de ver seus pais, nenhum de nós poderia ser tão egoísta.

Olhando intensamente para a bacia, eu olhei para a água vermelha que


me lembrava sangue. Na verdade, ela era grossa como sangue, e havia um
cheiro metálico fraco. Eca.

Um segundo se passou, e então eu disse.

— Solaris.

Nada aconteceu num primeiro momento, e, em seguida, a água ondulou


como se tivesse explodido uma respiração suave sobre ela. Parte de mim
esperava que seu rosto aparecesse na bacia, mas a água parou novamente.
Em seguida, houve uma fissura repentina de energia que se arrastou até as
paredes e rolou os andares. Os minúsculos pelos do meu corpo levantaram e
um tremor fez seu caminho através de mim. Houve um suspiro suave de
surpresa e eu me virei.

Solaris tinha chegado.


Vinte e seis

Quando eu entrei no Submundo, eu realmente não sabia o que esperar. O


mesmo poderia ser dito para Solaris. Eu realmente não tinha ideia, e ainda
assim eu fiquei encantada.

Solaris estava diretamente na frente de Caleb e ela parecia muito melhor


do que eu pensava que ela estaria. Por alguma razão, eu esperava que ela e o
Primeiro estivessem servindo no Tártaro, mas seu vestido branco estava puro
e intacto. Cabelo loiro-prateado, longo e fino, instalava-se sobre os ombros
magros. Ela era alta e esbelta e seus olhos eram como os meus – uma cor
âmbar brilhante. Suas delicadas características de porcelana faziam-me
lembrar de uma frágil flor exótica, o que eu não esperava. Talvez eu estivesse
balançando um enorme ego ou algo assim, mas eu pensei que ela se pareceria
comigo.

Ela era completamente o oposto de mim.

Solaris olhou ao redor da sala, suas sobrancelhas pálidas subiram quando


ela percebeu onde ela estava. Surpresa e um pouco de medo passaram pelo
seu rosto, mas quando seus olhos pousaram em mim, uma profunda
compreensão infiltrou em seus olhos cinzentos. Uma sensação de
familiaridade tomou conta de mim, espelhada na sua expressão.

Caminhando para frente, Solaris parou a apenas trinta centímetros de


mim, a cabeça inclinada curiosamente. Quando ela falou, sua voz era suave.

— Você é o Apollyon.

Não havia muito tempo para eu descobrir como ela sabia quem eu era.

— Eu sou um deles.

Outro lampejo de surpresa atravessou o rosto dela, rapidamente seguido


por tristeza.

— Portanto, há dois de novo?


Eu assenti.

Ela olhou por cima do ombro.

— E nenhum destes é ele. Eu posso dizer. Um deles está morto. Um deles


é um puro-sangue.

Ignorei o olhar ofendido de Caleb.

— Não. O Primeiro não está aqui.

Solaris me enfrentou, as sobrancelhas erguidas.

— Você já Despertou. Eu posso ver as marcas do Apollyon.

— Você pode? — Olhei surpresa ao descobrir que a minha pele visível


estava toda marcada. Eu não tinha nem sentido.

— Como você pode ter Despertado e não ficar com o Primeiro? Você não
está morta.

Ainda.

— É complicado. É por isso que viemos falar com você.

— Ah. — A tristeza se aprofundou e seus cílios varreram para baixo. —


Ele é como o meu?

Todos na sala, até Perséfone, fixaram em Solaris, mas ela parecia


totalmente inconsciente deles agora. Eu respirei e lutei contra o aperto
repentino na minha garganta. A dor saindo de Solaris era palpável.

— Sim. — Minha voz soava rouca. — Ele é como o seu.

Indo para longe, ela colocou os braços em torno de si mesma.

— Então não há nada que eu possa fazer por você.

Olhei para ela.

— Mas nós não pedimos nada.

— Se ele se perdeu ao éter, ao chamado de akasha, não há nada a ser


feito. — Seu queixo inclinou para baixo, fazendo com que seu cabelo
deslizasse para frente, protegendo seu rosto. — E não há nada a ser feito por
você. Eu tentei... mas o poder foi transferido.

— Espere. — Eu fui em direção a ela, segurando a frustração rugindo


dentro de mim. — Eu não transferi meu poder para ele. Ele é apenas o
Apollyon. Não é o Assassino de Deuses.

Solaris endureceu.

— Isso não é possível.

— É. Eu não estive perto dele desde que eu Despertei. Há algo sobre o éter
e akasha com ele, mas ele ainda é apenas o Apollyon. — Fiz uma pausa,
dando um longo suspiro. — Eu preciso saber como parar a transferência.

Ela permaneceu em silêncio.

— E eu acho – eu sei – que você sabe como fazê-lo.

Sua cabeça virou na minha direção.

— Não há nenhuma maneira. Eu bloqueei esse conhecimento de forma


que nenhum outro Apollyon poderia aprendê-la.

— Bem... Eu vi alguma coisa quando eu acordei. Você se virou contra ele,


tentou impedi-lo. Você sabia como, mas a Ordem a encontrou primeiro.

Solaris riu, uma risada seca e quebradiça.

— Isso é o que a história lhe diz?

Olhei para a deusa, imaginando o que ela sabia, mas ela parecia tão
confusa quanto eu me sentia.

— Mas eu vi…

— Você viu? O Despertar é o que os Apollyons anteriores desejaram que


você visse. No momento de sua morte, quando ela chegar, você vai implantar
suas memórias. Algumas delas podem ser como você queria vê-las, mas não
como realmente aconteceram.

Bem... bunda de daimon. Seth sabia disso?


— O que aconteceu, então?

Seus cílios foram para baixo novamente.

— Quando eu o conheci, ele não era como ele era no final. Ele era um
belo homem gentil que apenas era o Apollyon. — Um pequeno e triste sorriso
puxou seus lábios. — Nós realmente não entendíamos nada disso. Fomos os
primeiros a existir na mesma geração. Ele nem sequer entendia por que ele
veio me encontrar. Era como se ele fosse atraído e eu não entendia o que
estava acontecendo quando eu Despertei. A dor... Eu pensei que estava
morrendo.

Eu estremeci, incapaz de imaginar passar por isso sem Aiden e sem


qualquer conhecimento do que estava acontecendo.

— Mas quando nos conhecemos, era como se estivesse destinado. Por


muitos meses, nós... conhecemos um ao outro. Eu não acho que nem mesmo
os deuses sabiam o que poderia acontecer. — Um olhar distante penetrou em
seus olhos, não bem ofuscando uma dor que ainda não tinha cicatrizado. —
Ele parecia ficar mais poderoso quanto mais tempo nós estávamos juntos,
capaz de manipular akasha com pouco esforço, e ele não se cansava. Mas ele
era mais instável. Nunca em minha direção, mas eu sabia... Eu sabia que era
por causa de mim. Houve uma situação...

Meu estômago afundou quando meu olhar cintilou para o de Aiden.

— Um grande grupo de Daimons atacaram um dos Covenants e durante a


batalha, ele... tirou de mim. O poder que ele mostrou era inimaginável. O
Conselho ficou preocupado e então... então eu conheci o oráculo.

Ah, o oráculo ataca novamente.

— Ela me disse o que iria acontecer. Que ele iria puxar todo o meu poder
de mim e que iria atacar o Conselho. Eu não acreditei nela, porque isso seria
uma loucura. — Solaris riu suavemente. — Mas ela insistiu que eu o
impedisse. Que se eu não pudesse encontrá-lo em meu coração para matar o
que eu mais amava, então eu devia tomar o poder.

Minha respiração ficou presa, e as paredes pareceram girar e inclinar.

— Eu nunca pensei que ele iria agir, mas o Conselho se moveu contra
nós. Eles queriam nos separar e nenhum de nós, em nosso egoísmo ingênuo,
poderia suportar tal pensamento. Saímos da segurança do Conselho e saímos
por nossa conta. — Solaris balançou a cabeça. — Eles nos seguiram,
enviando seus sentinelas mais qualificados. Quando não conseguiram, a
Ordem de Thanatos veio.

Ela engoliu em seco.

— Ele ameaçou o Conselho, em seguida, e eu sabia que tudo o que o


oráculo tinha dito estava se tornando realidade. Ela tinha me dado os meios
para impedi-lo, mas já era tarde demais.

Mordi o lábio.

— O que ele fez?

Seus olhos encontraram os meus.

— Ele nunca teria feito isso se o fascínio do poder – a atração do poder


supremo – não tivesse o dominado. Mas ele fez. Antes que eu pudesse impedi-
lo, ele tirou de mim. Houve um momento, logo depois que ele tomou o meu
poder, quando ele ainda não era capaz de canalizá-lo. Como um calcanhar de
Aquiles, por assim dizer, e a Ordem atacou. O resto... o resto é história.

Eu não sabia o que dizer. Pena amontou no fundo da minha garganta.


Era óbvio que Solaris amara o Primeiro, ficava claro sempre que ela falava
seu nome. Eu não poderia me fazer perguntar só para saciar minha
curiosidade, porque eu sabia, só traria mais dor.

— Sinto muito. — Era tudo que eu poderia dizer.

Solaris assentiu.

— O que o seu Primeiro está fazendo?

Contei tudo a ela – a destruição, a guerra iminente, e a esperança de que


de alguma forma poderíamos impedir que a história se repetisse. Se ela ficou
surpresa, ela não demonstrou. Solaris simplesmente andou até mim.

— Eu bloqueei isso dele e dos outros Apollyons — Solaris disse


novamente. — Eu não sei como você viu. Talvez fosse o Destino?

Deuses, por uma vez o destino não estava tentando me forçar a tomar um
pela equipe. Mudança agradável.
— Talvez.

— É mais simples do que você pensa. — Solaris estendeu a mão,


colocando a mão fria sobre a minha mão direita. — Você deve seguir a ordem
das marcas que apareceram em você. A original. — Solaris apertou minha
mão direita — Θάρρος. — Coragem.

Então, ela segurou a mão dela em volta da minha esquerda.

— Ισχύς. — Força.

Deixando de lado a minha mão, ela colocou o dela abaixo do meu peito,
por cima do meu umbigo.

— απόλυτη εξουσία. — Poder Absoluto. Então, finalmente, ela estendeu a


mão e segurou a minha nuca. — Αήττητο. — Invencibilidade.

O ar saiu de meus pulmões e Solaris assentiu.

— Você terá que pressionar a sua carne para ele e convocar cada marca
pelo seu verdadeiro nome.

— Espere — disse Aiden. — Não é assim que ele iria transferir o poder dela
para ele?

Eu já sabia, por isso quando Solaris afastou-se e virou-se para Aiden, eu


mal conseguia olhar para ele.

— Sim — ela disse. — Ela vai ter que fazê-lo antes que ele faça.

Aiden abriu a boca, mas não havia palavras. Nós tínhamos aprendido a
transferir o poder e isso era algo, mas também seria quase impossível.

— Isso é tudo? — ela perguntou. — Eu queria ir embora.

Perséfone pigarreou.

— Eu acredito que sim.

Por um instante, os olhos do Solaris encontraram os meus e eu pensei


que iria vê-la novamente. E mais cedo do que eu provavelmente esperava.
Eu não sei de onde esse pensamento veio – se ele estava enraizado em
qualquer possibilidade real ou apenas paranoia.
— Tem certeza que é isso que você quer fazer? — Ela perguntou, a voz
baixa o suficiente apenas para eu ouvir. — Porque o poder do Assassino dos
Deuses irá transferir para você. E, embora você possa se sentir forte e você
possa pensar que pode controlá-lo, ele pode mudar você também.

Parecendo muito triste, como se ela soubesse que esse era um grande
segredo, ela suspirou.

— E, para qualquer fim que os deuses procuram usá-la, uma vez que eles
o façam, você vai ficar de pé no final? Como o oráculo me avisou, não pode
haver dois de nossa espécie, em nenhuma geração.

E então ela se foi, mas suas palavras de despedida entraram


profundamente, envolvendo o seu caminho sobre o meu coração e alma. Suas
palavras não eram uma advertência, mas mais como uma declaração de fato.
Olhei para a minha mão esquerda e eu senti como se o meu destino tivesse
sido selado muito antes de eu sequer saber o que era.

Deixei escapar um suspiro.

— Bem, isso foi deprimente. — Caleb passou a mão pelo cabelo. — Se eu


não estivesse morto, eu me sentiria um pouquinho suicida.

— Sem dúvida — Perséfone murmurou. — Mas as pessoas mortas – sem


ofensa – tendem a estar no lado deprimente das coisas.

Caleb deu de ombros.

— Nenhuma ofensa.

Cada vez que eu tinha visto Caleb, ele não parecia deprimido. Como se
lesse a minha mente naquele momento, ele sorriu e me lembrei do que ele
disse quando eu estava no limbo.

— Você me disse que ainda havia esperança para ele.

Caleb se aproximou de mim, parecendo tão vivo que era doloroso de ver.
Envolvendo seus braços ao redor de mim, ele me abraçou forte.

— Sempre há esperança. Talvez não o tipo de esperança que você está


pensando, mas ainda há esperança.

Eu não entendi a princípio, então eu aconcheguei mais perto, sabendo


que nosso tempo estava rapidamente chegando ao fim. Quando eu inalei o
aroma fresco de Caleb, eu percebi que precisava saber algo que
provavelmente iria me cortar em pequenas tiras.

Afastando-me, eu me virei para Perséfone.

— Onde está o Primeiro dela?

Todo um minuto se passou antes de ela responder.

— Ele está no Tártaro.

Eu pressionei meus dedos na minha boca antes que a massa subisse. Não
era tanto o destino do Primeiro, mas o que isso significava. Se eu
conseguisse e fosse capaz de matar Seth, seu destino seria o mesmo. E assim
seria o meu.

***

Eu passei os seguintes 15 minutos ou mais dando atenção a Caleb,


enquanto Aiden ocupou-se em estudar as armas e Perséfone pintava as unhas
ou qualquer outra coisa. Enquanto nós nos sentamos no chão da sala de
guerra, nossos joelhos pressionando juntos, Caleb me contou sobre algumas
das coisas que ele estava fazendo aqui em baixo para passar o tempo e eu
disse a ele o quanto Olivia queria vê-lo. Nós não falamos sobre o que iria
acontecer a seguir. Eu tinha certeza de que Caleb estava ciente de todas as
coisas loucas acontecendo e nenhum de nós queria manchar esses preciosos
minutos.

— Você disse a ela o que eu pedi? — Ele perguntou.

Eu assenti.

— Ela chorou, mas eu acho que eram lágrimas de felicidade.

O sorriso de Caleb estava amplo.

— Eu sinto falta dela, mas você pode me fazer outro favor?

— Qualquer coisa. — E eu quis dizer isso.

— Não diga a Olivia que me viu.


Eu fiz uma careta.

— Por quê? Ela iria…

— Eu quero que ela siga em frente. — Caleb agarrou minhas mãos e


levantou-se, puxando-me para os meus pés. — Eu preciso que ela siga em
frente, e eu acho que ouvir falar de mim é um atraso para ela. Eu quero que
ela viva e eu não quero ser sombra a cada passo que ela tomar.

Deuses, eu odiava a ideia de mentir para Olivia, mas eu entendi o que


Caleb estava dizendo. Olivia nunca iria seguir em frente, sabendo que, de
certa forma, Caleb estava consciente e tão vivo como ele poderia estar no
Submundo. Era como se ele estivesse lá, não alcançável, mas ainda estivesse
lá. Sabendo disso, como ela poderia realmente seguir em frente?

Então eu concordei. Eu prometi dizer a todos que tinha sido apenas


Perséfone que havia nos encontrado. Mesmo que Apolo soubesse a verdade,
não importava desde que Olivia não soubesse. De certa forma, este era o seu
presente para ela.

— Obrigado — disse Caleb, e me abraçou mais uma vez. Parte de mim


queria ficar nos braços de Caleb, porque ele sempre teve esse efeito de
aterramento em mim. Caleb era o meu lado racional. Ele era mais do que
isso; além da minha mãe, ele foi a primeira pessoa que eu amei
verdadeiramente.

Caleb seria sempre o meu melhor amigo.

— Está na hora. — Perséfone disse baixinho e quando eu me afastei e


olhei para ela, havia simpatia em seu olhar. Um deus que poderia simpatizar
era uma anomalia.

Aiden voltou para o meu lado, balançando a mochila nos ombros antes de
me devolver as armas que os guardas haviam me tirado, assim como o meu
manto nojento. Perséfone foi em direção ao centro da sala de guerra e
acenou com a mão. Um buraco negro apareceu, completamente opaco.

— Esta porta vai levá-lo de volta para onde vocês vieram.

— Obrigada — eu disse a Perséfone.

Ela assentiu graciosamente.


Quando eu disse adeus e olhei por cima do ombro uma última vez, meu
peito apertou quando eu encontrei olhos azuis, olhos azuis de Caleb. Eu
soube então que a morte poderia parar um monte de coisas, mas nunca
poderia cortar o laço da amizade.

Caleb sorriu, e eu respondi com um sorriso molhado, e depois voltei para


o vazio esperando por nós. Enfiando meus dedos nos de Aiden, entrei pela
porta, armada com o conhecimento que era necessário, mas que carregava o
fardo de ter que realizar o impossível.
Vinte e sete

O Hummer ainda estava onde foi deixado, e de acordo com o relógio no


painel, apenas três horas se passaram – três horas no reino mortal, 48 horas
no submundo, e uma vida inteira para Aiden e eu.

Eu me ofereci para dirigir na volta, mas Aiden insistiu que ele estava bem
e eu sabia que ele queria que eu fosse dormir. Eu sabia que devia – para evitar
que Seth usasse a conexão – mas isso não parecia justo. Aiden tinha de estar
esgotado.

Mas era uma batalha que eu não estaria ganhando em breve, assim me
aconcheguei no banco do passageiro e tentei dormir um pouco. O único
problema foi que o meu cérebro não iria parar. Desde que eu estive na sala de
guerra, algo tinha me incomodado. O que Perséfone tinha dito, os rabos de
cavalo cortados na parede – tudo parecia familiar, mas eu não poderia dizer
como ou por quê. E era mais do que isso. As palavras de despedida de Solaris
foram inquietantes e entraram na minha cabeça.

O que eu nunca pude perceber foi porque Apolo tinha me mantido viva
uma vez que Seth tinha deixado todos loucos no Conselho. Ou por que
Artemis tinha impedido Hades de me levar para o Submundo. Os deuses – ou,
pelo menos, todos eles, exceto um – temiam a transferência de poder, porque
quando isso acontecesse não haveria modo de parar Seth. Tirar-me da
equação antes que eu Despertasse, ou me colocar fora de combate depois,
fazia sentido.

Me manter viva, não.

Mas eu me lembrei do que Artemis tinha dito na loja de conveniência


quando ela enfrentou Hades. Profecias podiam mudar e não era preciso muito
para perceber que se eu me tornasse a Assassina dos Deuses, a profecia iria
mudar.

Desconforto floresceu no meu peito. Apolo e os outros sabiam que isso era
possível? Então eu me senti idiota mesmo por questionar isso. Os oráculos
pertenciam a Apolo, e mesmo que ele não soubesse de todas as suas visões, a
parte que o oráculo tinha dito a Solaris poderia ter sido compartilhada com
Apolo. O que fazia sentido já que Apolo havia sido tão favorável à ideia de eu
descer para ver Solaris.

Parte de mim era ingênua o suficiente para esperar que não fosse o caso,
porque isso significava que Apolo tinha algumas explicações a dar. A outra
parte era mais analítica sobre o assunto, mais razoável. Apolo havia dito
antes que eles precisavam parar o deus que estava, obviamente, trabalhando
com Lucian. E como eles poderiam impedi-lo?

Eles precisavam do Assassino dos Deuses.

A parte pior de toda esta situação de porcaria era que Lucian controlava
Seth, e esse deus – quem quer que fosse – controlava Lucian, e, portanto,
ele/ela controlava Seth e todos aqueles que estavam seguindo Lucian. Então,
se Seth conseguisse transferir meu poder para ele, esse deus, então,
controlaria o Assassino de Deuses. Arriscado, porque Seth poderia sempre
liquidá-lo, mas, no final, uma vez que o deus tinha Seth fazendo o que ele
queria, eu tinha certeza que ele ia ser criativo o suficiente para mantê-lo sob
controle de alguma maneira. Possivelmente isso significava manter um
membro da Ordem pronto, são e salvo.

Meus músculos se apertaram em reflexo quando eu pensei nisso. Nada


disso parecia bom. E Seth estava sendo manipulado de todas as direções, e
ele não tinha ideia. Inferno, ele recusava-se a pensar que era o caso.

Enquanto as milhas entre Kansas e Illinois desapareciam, eu não


conseguia afastar o que Solaris tinha dito sobre os deuses me utilizando, e o
que isso significaria. Nem a sensação de que, ao aprender a transferir o poder
para mim, eu tinha selado o meu próprio destino.

O peso repentino da mão de Aiden no meu joelho chamou minha atenção


para ele. Seus olhos estavam na estrada escura.

— Você não está dormindo.

Sorri quando eu coloquei minha mão sobre a dele.

— Como você sabe?

— Eu só sei. — Ele me mandou um breve sorriso. — O que você está


pensando?
Tudo estava na ponta da minha língua – as minhas suspeitas, as minhas
preocupações sobre o que Solaris tinha dito, e o que eu sabia agora que Apolo
estava escondendo – mas quando Aiden olhou para mim de novo, eu descobri
que eu não poderia contar a ele.

Ele não tinha ouvido o que Solaris tinha dito, e eu não queria
sobrecarregá-lo com isso em cima de todo o resto. Se minhas suspeitas
estivessem corretas, se tudo estivesse levando para uma coisa...

Respirando fundo, me concentrei nas linhas brancas iluminando a


escuridão.

— Eu estava pensando sobre como eu deveria chegar perto o suficiente de


Seth para transferir seu poder para mim. Parece impossível, certo?

— Eu não gosto disso, Alex. Eu vou ser honesto, acho que é insano. Para
mim, é como tentar atacar uma cobra. Isso não vai funcionar.

— Eu sei, mas que escolha temos? Além disso, nós não temos apenas que
descobrir como chegar perto o suficiente dele. Há também todos os
Sentinelas e guardas que estão apoiando ele.

Aiden apertou minha mão.

— Nós vamos precisar de um exército.

Lentamente, eu olhei para ele.

— E onde é que vamos desenterrar um?

— Boa pergunta. — Ele soltou uma risada curta. — O que precisamos


descobrir é exatamente quanto apoio Lucian tem…

— Eu sempre posso pedir para Dionísio dar alguma espiada. — A voz de


Apolo cresceu a partir do banco de trás.

Gritando, eu saltei para frente, batendo os joelhos no painel. A mão de


Aiden puxou o volante, desviando o Hummer na pista da esquerda, que
estava felizmente vazia.

Aiden xingou sob sua respiração.

— Você precisa de um maldito sino.


Eu me virei no banco, pronta para bater o sorriso do rosto do deus. Eu já
estava muito puta com ele sem que ele nos desse um ataque cardíaco.

— Você poderia ter causado um acidente!

Apolo se inclinou para frente, apoiando os braços na parte de trás de


nossos assentos.

— Mas não causei. Aiden tem os reflexos de um cão do inferno.

Fechando o rosto, eu balancei minha cabeça.

— Como é que você só... se materializou aqui?

Ele me deu um olhar tipo ‘duh’ muito típico de um deus

— Essas proteções fazem o seu poder invisível para os deuses, mas não
nos repelem. Você carrega a minha linhagem. Eu posso encontrá-la quando
eu quiser.

— Bem, isso não é assustador.

Aiden olhou no espelho retrovisor.

— Você quer saber o que descobrimos? — Quando Apolo assentiu, uma


carranca apareceu no rosto de Aiden. — E você não poderia ter esperado até
voltarmos ao Rio Apple?

— Vamos ver... — Apolo bateu um dedo no queixo. — O mundo inteiro


está à beira de um apocalipse dos deuses. Devo esperar mais seis horas?

— Seis horas não vão mudar nada — Aiden respondeu, virando os olhos de
um cinza aço.

— Eu espero que não. — Apolo voltou seu olhar para mim. — O que você
aprendeu?

Eu debati entre dizer que eu não tinha aprendido coisa alguma, mas era
inútil.

— Eu aprendi a transferir o poder para mim.

Apolo não mostrou nenhuma reação, e eu realmente acho que eu o odiava


naquele momento.

— E você acha que pode fazer isso?

Olhei para Aiden.

— Há o pequeno problema de como chegar a Seth.

— Como eu disse, eu posso mandar Dionísio fazer algumas aferições. Ver


o que eles têm a seu favor — ele respondeu.

— Nós ainda não temos um exército. — Eu virei em meu banco, me


sentindo o tipo fantástica de vadia.

— Na verdade...

Recusei-me a me virar e morder a isca.

— O quê?

Quando ele não respondeu, Aiden rosnou no fundo de sua garganta.

— O quê, Apolo?

— Cerca de uma hora depois que vocês partiram, um dos sentinelas que
usou uma das cabanas de Solos antes de vocês nada gentilmente o
expulsarem apareceu. Ele trouxe notícias.

Aiden tinha ficado completamente imóvel, e eu me perguntei como ele


ainda conseguia dirigir assim.

— E você confia neste Sentinela?

O deus riu sombriamente.

— Vamos apenas dizer que tenho a certeza que ele estava jogando no
nosso time.

Curiosa, eu comecei a perguntar como, mas Apolo sorriu para mim.

— Use sua imaginação — disse ele, e minha imaginação foi a alguns


lugares muito estranhos.

— De qualquer forma — continuou ele —, a maioria dos puros estão


fugindo dos Covenants e de suas comunidades, indo para a Universidade em
Dakota do Sul. Tal como seus Guardas. Faz sentido – a localização da
Universidade é bastante remota e quase certamente não pode ser violada. Os
Sentinelas que não caíram com Lucian deixaram suas funções e estão a
caminho da universidade.

— E sobre os daimons? — eu perguntei.

— O que tem eles? Eles vão aonde os puros estão, e os puros estarão bem
protegidos. Depois, há os daimons que Lucian está alimentando. Não há nada
que possamos fazer sobre isso. — Apolo sentou-se, olhando para o teto do
Hummer como se ele nunca o tivesse visto antes. Ele bateu na luz interna
uma vez e ela acendeu, depois ele a desligou. Coisas brilhantes devem ser
uma distração para os deuses também. Ele fez isso de novo, suas
sobrancelhas franzidas.

— Apolo — eu repreendi.

Seu olhar pousou em mim.

— Há uma boa chance de que Lucian e o Primeiro vão conquistar o


Conselho de Nova York, então os membros do Conselho e os Sentinelas
estarão sendo mandados para fora do Covenant.

Meu coração parou.

— Meu…

— Eu não sei se o seu pai está entre os que já chegaram à Universidade


ou se está morto ou vivo. Sinto muito.

Meus ombros caíram.

— Então, o que eles estão fazendo? Movendo a base de operação para lá?

— Sim. Portanto, haverá centenas, se não milhares, de sentinelas e


guardas lá. Aqueles que viram os seus amigos e outros sentinelas mortos por
aqueles que estão do lado de Lucian. Aqueles que não querem nada mais do
que obter um pedaço dele.

Aiden assentiu lentamente.

— Um exército – nosso exército.


— Marcus e Solos já estão fazendo planos de viajar para a Universidade.
Quanto mais cedo você chegar lá, melhor.

Eu poderia concordar com esse plano. E sim, havia um pouco de razão


egoísta por trás disso. Qualquer chance de meu pai estar lá era o suficiente
para mim.

— Seria mais seguro lá para Deacon e os outros — disse Aiden. — Seria


melhor.

Agora, eu me senti como uma idiota por apenas pensar no que eu poderia
ganhar.

— Quão rápido nós podemos ir embora?

— Assim que possível — respondeu Apolo. — Uma vez na universidade,


podemos apelar para aqueles que desejam colocar um fim a isso. Então nós
poderíamos mover contra Lucian…

— E o deus que está puxando as cordas? — Eu joguei, incapaz de me


controlar. — Nós vamos querer nos mover contra ele ou ela, né?

Os vibrantes olhos azuis de Apolo encontraram os meus e ele segurou


meu olhar.

— Sim. Nós o faremos.

Naquele momento eu queria exigir respostas, mas a única coisa me


impedindo era Aiden... e essa parte de mim, a menor parte que Laadan tinha
notado que estava crescendo, tornando-se mais madura. Ela meio que
entendia.

— Mas eu preciso fazer uma checagem com Dionísio. — Apolo ainda


estava olhando para mim, e eu sabia que iria vê-lo em breve. — Verificarei
vocês mais tarde.

E então ele se foi.

Aiden me deslizou um olhar de soslaio.

— Às vezes eu realmente o odeio.

— Eu também — murmurei.
***

Chegamos de volta ao rio Apple, logo quando o céu estava voltando de


preto para azul escuro. O lugar estava escuro quando saímos do Hummer e o
canto distante dos pássaros era o único som.

Aiden se esticou, curvando as costas enquanto elas estalavam. Ele parou,


me pegando observando-o do outro lado do veículo.

— Venha aqui.

Ele era, provavelmente, a única pessoa no mundo que poderia exigir isso
de mim e eu ouviria. Toda obediente, eu fui para frente do Hummer e parei
na frente dele.

— O quê? — Eu perguntei, abafando um bocejo.

Aiden segurou minhas bochechas e inclinou minha cabeça para trás.

— Você não dormiu nada.

— Nem você.

Um sorriso cansado apareceu.

— Eu estava dirigindo.

Eu coloquei minhas mãos em seus pulsos. Nossos olhos se encontraram.

— Eu não posso acreditar que fomos para o Submundo e voltamos.

— Nem eu. — Seus polegares traçaram ao longo da curva de minhas


bochechas. — Você foi perfeita.

— Exceto pelas aranhas...

Sua cabeça caiu e seu nariz roçou o meu.

— Eu não estava falando sobre as aranhas.

— Não?

Aiden riu e sua respiração foi quente e tentadora.


— Não. Eu estava pensando sobre o que veio depois das aranhas.

— Oh... oh! — Eu inspirei forte e minhas pernas de repente ficaram


fracas. — Aquilo.

— Sim. — Seus lábios roçaram os meus. — Aquilo.

Eu comecei a sorrir, porque aquilo realmente tinha sido perfeito, mas, em


seguida, Aiden me beijou e eu me derreti nele. Havia força naquele beijo,
junto com amor e um gosto de como o futuro seria com ele. Eu amei – amava
– que, no meio de tudo, ainda poderíamos ter momentos como aquele. Onde
éramos apenas nós e não havia muros entre nós. O beijo se aprofundou, sua
língua deslizou pelos meus lábios, e os meus dedos cavaram em seus pulsos.
Um rugido baixo e sensual veio de Aiden, e eu queria…

— Vocês dois deveriam realmente procurar um quarto — Apolo disse do


nada. — Meus pobres olhos...

Eu gemi. Mesmo em sua verdadeira identidade, ele ainda tinha um timing


impecável.

— Deuses — Aiden soltou. Ele se afastou, lançando a Apolo um olhar de


desgosto sobre a minha cabeça. — Você não vai parar de aprontar com a
gente?

— Vocês provavelmente não querem saber o que eu aprontei.

Eu fiz uma careta.

— Eca.

Aiden beijou minha testa, enquanto suas mãos escorregaram por minhas
bochechas. Soltando o braço em volta dos meus ombros, ele me puxou para o
abrigo de seu corpo e eu fui, descansando a minha bochecha contra seu
peito.

— Você já falou com Dionísio?

Apolo encostou-se no para-choque.

— Sim. Ele está trabalhando enquanto nos falamos.

— Como podemos acreditar que Dionísio não é o deus por trás disso? —
Eu sufoquei outro bocejo. — E que ele não vai mentir para nós?

— Dionísio pouco se importa com a guerra, e ele não tem a motivação


para projetar algo como isto.

— Quanto tempo até que ele nos avise? — perguntou Aiden.

— Devemos ouvi-lo até o final do dia. — O olhar de Apolo virou para o céu
azul profundo. — É quase de manhã. Vocês dois deveriam descansar.

Aiden olhou para mim.

— Vamos entrar.

Eu me afastei, olhando para Apolo.

— Eu irei em poucos segundos. Quero falar com Apolo.

Ele hesitou, enviando-me um olhar interrogativo. Eu odiava mantê-lo no


escuro sobre isso, mas não havia outra maneira, porque se Aiden soubesse,
ele iria pará-lo, e então o mundo iria virar um lixo.

— Está tudo bem. — Sorri. — Eu entrarei logo.

Aiden olhou Apolo e deixou escapar um suspiro.

— Ok. Eu vou... acordar Deacon ou algo assim.

— Tenho certeza que ele vai apreciar isso — eu disse.

Um breve sorriso apareceu.

— É verdade.

Ao som da porta da frente fechando atrás de Aiden, eu olhei para Apolo e


senti a máscara que eu estava usando escapar.

Nossos olhares se encontraram e Apolo suspirou.

— Alexandria...

— Eu sabia que havia algo que estava escondendo de mim. Que havia
uma razão maior para todos vocês quererem me manter viva, quando seria
muito mais fácil simplesmente me matar. Isso iria resolver o problema com
Seth, então eu só não entendia por que vocês iriam arriscar.

Ele parecia como se tivesse esquecido o que iria dizer. Boa – eu deixei um
deus mudo. Ponto para mim. Eu estava indo para o ponto dois.

— Vocês precisam do Assassino de Deuses.

Um longo momento passou.

— Precisamos impedir que isso aconteça novamente.

— Você precisa de mim para matar o deus responsável. — Raiva cresceu


dentro de mim, mas dor também e essa dor tinha aumentado desde que eu
tinha deixado o Submundo. Eu não sabia o porquê. Apolo podia estar
relacionado a mim por laços de sangue, mas ele era um deus e tinha perdido
todo o comboio de empatia, como uma espécie de grupo de sociopatas, mas
ainda doía ferozmente.

Era um corte profundo.

Porque no final, eu era o leão e o cordeiro, eu faria o abate e, em seguida,


seria abatida. Apolo não disse isso, mas eu vi isso no que ele não diria.

— Não podemos arriscar esse tipo de destruição de novo, Alexandria.


Milhares de pessoas inocentes morreriam, e não haveria mais. E mesmo se
pararmos o Primeiro, isso vai acontecer de novo. — Ele colocou a mão no
meu ombro e foi pesado. — Nós não podemos matar uns aos outros.
Precisamos da única coisa que pode nos matar. Precisamos do Assassino de
Deuses – precisamos de você.

Olhei para ele estupefata.

— Você não quer que eu mate Seth, então.

Ele bufou.

— Na maioria dos dias eu quero, mas você deve tomar o seu poder, e ele
tem que estar vivo para isso. Eu preciso que você seja capaz de derrotá-lo e
transferir seu poder para você.

Minhas mãos se fecharam em punhos e precisei de muita coisa para não


agarrar essas mechas douradas e arrancá-las.
— Você esteve mentindo para mim este tempo todo.

— Não, eu não estive. — Ele nem sequer piscou.

— Mentira! Você me disse antes de eu Despertar que você queria que eu


matasse Seth! Você sabe, junto com o refrigerante de uva e o bolo do homem
aranha?

— Eu queria que você matasse Seth, mas não é o que eu preciso.

Minha boca caiu aberta.

— Isso nem é semântica!

— E eu não sabia ao certo, então, que havia uma maneira de transferir


seu poder para você — ele argumentou com calma. — Eu tinha minhas
suspeitas. E a minha irmã também, mas não podia ter certeza. De qualquer
forma, ele não pode ser permitido de tomar o seu poder. Se você não puder
derrotá-lo e tomar o seu poder, então você deve matá-lo.

Apolo fez tudo parecer tão simples, como se ele estivesse me pedindo para
ir até a loja e pegar Cheetos Crunchy e se não tivesse, para pegar Puffs
Cheetos. Insano.

— Eu não quero que isso acabe como você teme, mas não há muito que
eu possa fazer para ficar nas mãos dos outros.

— Sim, porque depois de eu matar esse deus – se descobrirmos quem ele é


– há uma boa chance de que os deuses irão ficar contra mim, porque eu vou
ser uma ameaça. E eu aposto que eles têm um membro da Ordem pronto,
certo? Mesmo se eu não fizer nada, eles vão agir como juiz e júri em um
crime que não cometi?

Houve aquela maldita pausa novamente e então ele disse:

— Todo mundo morre, mas no final tudo se resume pelo o que você está
disposto a morrer, Alexandria.

Deuses, havia uma parte de mim – uma grande parte de mim – que queria
chutar Apolo nas bolas, mas eu me controlei. Tão fodida como eu era, eu
entendia. E talvez fosse por isso que eu não estava pirando. A perda de uma
vida, talvez duas, valia a pena pela segurança de milhares, de milhões. Eu
podia ver isso e se eu estivesse totalmente imparcial sobre isso – digo, se eles
não estivessem falando de mim – então eu provavelmente os apoiaria.

Mas era eu.

Seria eu.

Isso era um monte para engolir. Era algo que eu realmente não podia
sequer começar a processar. Eu me senti muito egoísta, mas eu também
sabia que tinha de ser feito.

Deuses, eu não era tão velha ou madura o suficiente para fazer esses
tipos de decisões.

Ficou tão tranquilo entre nós que o vento suave agitando os ramos
parecia muito alto. Se eu não tivesse as minhas estranhas habilidades agora,
eu teria pensado que ele havia partido. Mas ele ainda estava lá, esperando.

— E não há outro jeito? — eu perguntei.

Ele não respondeu, e eu tomei seu silêncio como um não.

Com o coração pesado, eu levantei minha cabeça.

— O que acontecerá se eu morrer?

Apolo não respondeu imediatamente.

— Você vai ter a morte de um guerreiro. Há orgulho nisso e não será em


vão.

Exceto perder a vida, mas eu percebi que era um ponto discutível.

— Você pode ter certeza de que... que Aiden vai ficar bem?

Os olhos do deus encontraram os meus e ele concordou.

Com a garganta queimando e apertando, me concentrei no cascalho


escuro.

— Ele... ele teve que ver seus pais depois, Apolo. Eu não quero que ele me
veja, ok? Você pode ter certeza que ele não verá?

— Se é isso que você deseja.


Eu pressionei meus lábios, um pouco aliviada que Aiden seria poupado do
horror – talvez não da maior parte, mas alguma.

— E você vai ter certeza que Marcus e os outros ficarão bem?

— Sim.

— Tudo bem. — Engoli em seco, mas eu ainda me sentia como se eu


estivesse sufocando. — Eu quero ser deixada sozinha por algum tempo.

— Alex…

Olhei então, encontrando seu olhar.

— Por favor, saia.

Parecia que ele ia dizer algo, mas assentiu e simplesmente desapareceu.


Não sei quanto tempo fiquei ali, mas, eventualmente, eu me arrastei até a
varanda e me sentei nos degraus.

O ar da noite ainda estava fresco e soprando nas minhas bochechas


quentes. Lágrimas queimaram meus olhos, mas eu me recusei a deixá-las
cair. Chorar não serviria para nada. Não mudaria o que iria acontecer. Se de
alguma maneira eu conseguisse chegar a Seth, transferir seu poder para mim
antes que ele tomasse o meu e destruir o deus misterioso, eu ainda estaria
como um animal raivoso. Possivelmente até mesmo Seth estaria assim,
embora ele já não fosse uma ameaça. Talvez sem mim por perto para
influenciá-lo, ele iria ficar melhor. Ele seria apenas o Apollyon então, como
ele deveria ser – apenas um de nós e tudo isso.

Esfreguei meus olhos até que doessem.

Que dia seria aquele? Algum em abril? Menos de um mês a partir de


agora, eu deveria me formar no Covenant. Isso obviamente não ia acontecer.
Tanta coisa mudou, e muito nunca mais seria o mesmo. Gostaria de saber se
o meu destino mudou, também, ou se isto tinha sido sempre uma parte dele e
ninguém tinha pensado em me dar uma pista.

Uma ideia me ocorreu. Foi uma loucura, mas eu pensei em deixar a


conexão instável com Seth acontecer. A dor estava em minhas têmporas.
Talvez eu pudesse dizer-lhe o que eu sabia. Talvez houvesse uma parte dele
que ainda se importava o suficiente.
Eu balancei minha cabeça e abaixei minhas mãos.

Seth provavelmente apenas usaria como mais um motivo para eu pular do


barco.

Respirando fundo várias vezes, eu empurrei os pensamentos de Seth fora


da minha cabeça e, por alguma razão, eu pensei sobre o meu pai. As
características que ficaram ásperas por uma vida dura se encaixaram. As
maçãs do rosto largas e um queixo forte falavam do rosto de um guerreiro.
Nós realmente não éramos muito parecidos, mas seus olhos... eles eram
como os meus.

Eu tentei não pensar no meu pai. Talvez fosse errado, mas era difícil
estar aqui, sabendo que ele estava no Catskills. E era ainda mais difícil
reconhecer que pudesse haver uma boa chance de que nunca nos
encontraríamos cara-a-cara, cientes do que éramos um ao outro.

Apertando meus joelhos, eu pensei sobre o sacrifício que ele estava


fazendo – tinha feito – por tantos anos. Lá no fundo eu sabia que ele
provavelmente queria estar aqui comigo, mas ele tinha um trabalho a fazer.
Por completo, o meu pai era um Sentinela.

Eu o respeitava por isso.

Não sei quanto tempo fiquei lá, mas não poderia ter sido muito, antes que
a porta atrás de mim se abrisse. O assoalho rangeu quando os passos se
aproximaram.

Aiden sentou ao meu lado, ainda em seu uniforme de Sentinela. Ele olhou
para frente e não disse nada. Eu olhei para ele. As ondas escuras estavam
sujas, indo em todas as direções. Uma ligeira sombra estava se formando em
sua mandíbula.

— Não acordou Deacon? — eu perguntei.

— Não, se eu fizesse, então eu provavelmente nunca iria voltar para a


cama. Ele iria precisar de entretenimento ou algo assim e você sabe como
isso vai. — Aiden inclinou a cabeça para mim. — Quando Apolo saiu?

— Há pouco tempo.

Aiden ficou em silêncio por um momento.


— Há algo que eu deveria saber?

Meu coração pulou uma batida.

— Não.

Seus olhos encontraram os meus e eu não podia dizer se ele acreditava


em mim, mas ele estendeu o braço. Eu deslizei sobre ele, deitando-me contra
a lateral de seu corpo quando ele trancou seus braços em volta de mim. Ele
descansou sua bochecha contra o meu cabelo e eu senti sua respiração.

Minutos se passaram, e então ele disse:

— Estamos juntos nessa, Alex. Nunca se esqueça disso. Estamos juntos


nessa até o fim.
Vinte e oito

Até o momento em que Apolo reapareceu mais tarde naquela noite, eu


não tinha realmente entrado em acordo com tudo. Quero dizer, como eu
poderia? Passando por tudo isso, enfrentando apenas deuses sabiam o quê,
sabendo que havia uma chance de 99% que eu morresse no final, realmente
não ajudava com todo o fator de motivação. Então eu decidi fazer a única
coisa que eu poderia fazer.

Esquecer o resultado final.

Provavelmente não é o método mais sábio, mas era a única maneira que
eu poderia fazer isso e me manter sã, porque agora eu não sabia como mudar
nada disso.

Apolo não retornou sozinho. Quando ele apareceu na sala, ele trouxe
Dionísio. Era a primeira vez que eu tinha visto o deus. Ele parecia um garoto
de fraternidade em sua camisa havaiana e bermuda cargo.

Dionísio caiu sobre o sofá em uma preguiçosa e grande arrogância. Seu


olhar de pálpebras pesadas se moveu sobre as mulheres na sala, avaliando-as
como se olhasse para um menu. Quando seus olhos esquisitos pousaram em
mim, arqueou uma sobrancelha.

Ele sorriu.

— Então esse é o Apollyon?

— Esse seria eu.

— Por alguma razão, eu esperava que você fosse mais alta.

Mas que diabos? Dobrando meus braços, eu atirei-lhe um olhar brando.

— Eu não sei por que as pessoas continuam a dizer isso.

Aiden encostou-se na mesa onde eu estava sentada.

— Você é bem pequena.


Minha altura não era o nosso maior problema. Felizmente Marcus pegou
as rédeas da conversa, trazendo-a de volta para as coisas mais importantes.

— Vocês têm notícias de Lucian?

O deus se esticou, cruzando os braços atrás da cabeça.

— Bem, eu cheguei o mais perto que pude. Algo diferente desta vez.

Apolo fez uma careta. Eu não gosto quando deuses franziam a testa –
geralmente isso significava algo muito, muito ruim.

— O que você quer dizer?

— Eu só consegui chegar perto até certo ponto. Algo me impediu de ficar


no meio deles, mesmo as minhas ninfas foram barradas. — Ele mexeu os
dedos do pé. — Nenhuma proteção pode fazer isso. Apenas um outro deus.

— Eu não entendo — eu disse. — Como pode um outro deus te bloquear?

— Um poderoso pode, pequena Apollyon. — Dionísio piscou um olho todo


branco. — Seria como bater numa parede invisível. O Primeiro e o puro-
sangue estão bem protegidos.

— Hermes? — Marcus disse, esfregando o queixo, pensativo.

Dionísio bufou.

— Hermes não conseguiria puxar algo como aquilo.

— Quem poderia? — Solos perguntou, o olhar astuto.

— Um dos principais — Dionísio respondeu com um sorriso.

— O que você quer dizer? — Luke se inclinou para frente em sua cadeira,
deixando cair os braços sobre os joelhos. — Um dos principais?

O deus poupou-lhe um breve olhar.

— Há uma estrutura social... ou política para as coisas no Olimpo – uma


classificação pelo poder.

Do outro lado da sala, Laadan pigarreou. Ao lado dela, Olivia permaneceu


quieta. Ela não tinha falado desde que perguntou sobre Caleb mais cedo. Eu
tinha mantido sua promessa, tanto quanto isso fosse uma droga.

— Você pode nos dar um pouco mais de detalhes? — Laadan perguntou


educadamente. — Eu acredito que isso é algo que não é do nosso
conhecimento.

— Não realmente — respondeu Apolo. — Vocês modelaram seus Conselhos


após o Olimpo, com cada conselho tendo um líder, por assim dizer. No
Olimpo é a mesma coisa.

Minha curiosidade crescia.

— Então, quem é o principal?

Dionísio podia não ter pupilas, mas eu tinha certeza de que, quando sua
cabeça girou de volta para mim, ele estava olhando para os meus peitos. E eu
também tinha certeza de que Aiden acreditava nisso, também, considerando
a maneira como ele se enrijeceu.

— Zeus e Hera, seguidos pelo cada vez mais popular Apolo e sua irmã
Artemis, em seguida, Ares e Atena — respondeu Dionísio. — Por último, mas
não menos importante, Hades e Poseidon. Eles são os deuses mais poderosos
e os únicos que poderiam fazer aquilo.

— Bem, não é Hades. Ele queria me levar para o Submundo. E eu duvido


que foi Poseidon já que ele foi todo ‘deus da água’ na Ilha Divindade.

Aiden deslizou a Apolo um olhar.

Os olhos do deus do Sol se estreitaram.

— Sim, isso não foi culpa minha.

— Poderia realmente ser qualquer um deles — disse Dionísio, e depois


bocejou alto. — Eles teriam que estar enganando a todos, para que eles
pudessem ter enganado até mesmo a nós. — Ele deu de ombros, como se
nada disso fosse um grande negócio. — É o que é.

— Você sentiu alguma coisa? — As mãos de Apolo se fecharam ao seu


lado quando Dionísio abanou a cabeça. — Você viu qualquer coisa que possa
nos dizer quem era o deus? Alguma coisa?

— Realmente eu não estava procurando por isso. Você me disse para ver
quantos idiotas puro-sangue estavam com ele, e eu o fiz.

Um músculo estalou na mandíbula de Apolo e ele todo rosnou:

— Então, o que você viu?

— Nada de bom.

— Detalhes — Apolo disse, exalando pelo nariz. — Detalhes.

Gostaria de saber se Dionísio estava bêbado ou drogado. Meu olhar se


prendeu com o de Deacon na outra extremidade do sofá, e eu poderia dizer
que ele estava pensando a mesma coisa. Mesmo Lea, que estava sentada no
braço ao lado de Deacon, estava dando a Dionísio o olhar de mas que diabos.

— Ele tem aproximadamente cerca de mil sentinelas e guardas mestiços,


talvez mais. Além disso, ele está cercado por algum tipo de Círculo Interno –
outros puros. E fica ainda melhor. — Ele fez uma pausa, e eu sabia que era
para o efeito dramático. — Havia mortais com ele.

Minha boca caiu aberta.

— O quê?

— Soldados — respondeu Dionísio. — Soldados mortais – do tipo ‘somos o


que você quiser’. Havia provavelmente cerca de quinhentos deles.

Eu quase caí da mesa.

— Como isso é possível? — Lea exigiu. Então ela fechou os olhos,


reprimindo as feições. — Ele está usando uma compulsão.

— Não — Marcus balançou a cabeça quando ele se virou para Apolo. —


Nenhum puro-sangue poderia controlar tantos mortais. Nem mesmo se ele
tivesse uma centena de puros que o rodeassem.

— É o deus. — Apolo parecia enojado.

Meu estômago se soltou com o pensamento. Usar mortais assim era


errado em tantos níveis. Eles nunca sobreviveriam a uma luta contra um
sentinela ou guarda, não importa quantas armas tivessem. Somos
simplesmente muito mais rápidos e melhor treinados. Mortais seriam bucha
de canhão e nada mais. Era revoltante.
A raiva encheu o quarto, tão espessa que eu praticamente podia sentir o
gosto.

— Eu não entendo — Deacon passou a mão sobre a cabeça, segurando a


parte de trás do seu pescoço. — Como é o que o mundo mortal não presta
atenção a uma coisa dessas?

— Um dos mortais deve ser de alta patente no exército, alguém que possa
fazer esse tipo de ordem e dar algum tipo de razão — Os lábios de Apolo se
diluíram. — Pelo menos isso é o que eu faria.

— E eles poderiam ter convocado uma espécie de estado de emergência —


acrescentou Marcus. — Nenhuma parte dos EUA estava completamente ilesa,
e eu estou começando a me perguntar se esse deus sequer se preocupa com a
exposição.

Aiden agarrou a borda da mesa.

— Eu acho que é óbvio que o risco de exposição não é importante.


Inferno, talvez seja mesmo planejado.

Todos os olhos se voltaram para ele.

— Pense sobre isso. Por que mais um deus estaria orquestrando tudo isso?
Ou indo junto com o que Lucian quer? — perguntou Aiden. — Para eliminar
os deuses e depois o que… governar o Olimpo? Ou governar o Olimpo e o
reino mortal?

Um calafrio correu através dos meus ombros. Minha imaginação não


podia sequer imaginar o que seria caso o mundo soubesse que os deuses
existiam – e além de tudo, se o mundo acabasse sendo governado por um.

— Nós não podemos deixar que isso aconteça — eu disse.

Os olhos de Apolo se encontraram com os meus.

— Não. Nós não podemos.

Desviei o meu olhar, porque agora eu não queria pensar sobre o que parar
esse deus significava. Limpei a garganta.

— Eu me pergunto se Lucian e Seth sabem disso.


— Isso importa? — Perguntou Lea, arrogante como sempre.

Meus lábios se curvaram com seu tom.

— Eu acho que não, mas você tem que saber quem está usando quem. E o
que vai acontecer com eles no final, se o deus for bem sucedido. Será que ele
pretende mantê-los por perto ou se livrar deles? Será que eles sequer têm
uma pista?

A maioria das pessoas na sala não poderia se importar menos – isso era
evidente – mas Marcus caminhou até onde eu estava e encostou-se à mesa do
outro lado a mim.

— Eu duvido que eles saibam. De certa forma, não importa pelo que eles
foram responsáveis, isto é trágico.

— Será trágico se eles conseguirem — Dionísio se levantou e esticou os


braços sobre a cabeça. — Bem, eu estou fora.

Apolo assentiu e Dionísio se curvou para a sala, varrendo os braços para


os lados com um florear. E então ele se foi.

Eu balancei minha cabeça.

— Tudo bem. Quem mais acha que ele estava mais alto que uma pipa?

Mãos subiram pelo quarto e eu sorri.

— Então, vamos embora amanhã de manhã para a Universidade? —


Olivia perguntou como se ela estivesse sendo puxada por uma onda elástica.
— Você não acha que, se esse deus é tão conivente e inteligente, ele
descobriria que Alex estará indo para lá? Quero dizer, mesmo se ele estiver
usando Lucian e Seth para seus planos malignos finais, ele ainda vai precisar
da Alex, certo? Porque ele está provavelmente controlando Seth, ou
querendo.

Todo mundo ficou em silêncio e eu me senti como uma formiguinha sob


uma lupa.

Olhei para Apolo, mas ele estava olhando para o globo sobre a mesa.

— Fazer qualquer movimento vai ser tão perigoso quanto estar aqui —
Marcus disse finalmente. — Mas em Dakota do Sul, estaremos mais seguros.
— Alex estará mais segura lá também — Luke murmurou, olhando para
suas mãos.

Eu abri minha boca, mas Lea falou.

— Bem, eu acho que o nosso trabalho é ter certeza de que Seth e este
deus não consigam chegar até a Alex.

Minha boca realmente caiu aberta.

Ela sorriu de forma inteligente para mim.

— Não podemos deixar que você fique toda psico-Alex de novo e acabe
com o mundo como nós o conhecemos.

— Ela tem um bom argumento — Deacon sorriu.

Eu estreitei meus olhos.

— Espere. Gente, eu não quero…

— O quê? — Aiden me cutucou com o cotovelo. — Você não quer nos ter
te dando cobertura?

— Isso não é o que é — Olhei para Apolo, mas porra, aquele globo o
fascinava. — Se vai haver um deus perseguindo o meu traseiro…

— É um belo traseiro — Aiden murmurou enquanto ele estudava os dedos


de suas botas. Um pequeno sorriso estava em seu rosto.

Olhei para ele por um momento.

— Além de Seth estar lá fora, procurando por mim, isso... isso vai ser
realmente perigoso. Eu não quero vocês arriscando suas vidas por mim.

Lea bufou.

— Droga, Alex, seu ego está fora de controle. Você me conhece. Prefiro
jogá-la na frente de um daimon qualquer dia, mas se te manter longe deles
significa salvar milhões de vidas, então eu estou em sua equipe. Portanto,
isto é maior do que você.

— Eu sei que isso é maior do que eu — Minhas bochechas queimaram, e o


sorriso idiota de Deacon não estava ajudando. — E eu sei que você me jogaria
na frente de um daimon, mas eu não quero ver nenhum de vocês se
machucando.

— Todo mundo aqui sabe os riscos, Alex — A voz de Marcus era severa,
lembrando-me dos dias no Covenant quando ele passava a maior parte de seu
tempo gritando comigo. — Ninguém está sendo forçado a fazer isso.

— E nenhum de nós faria qualquer outra coisa — Olivia deu um sorriso


hesitante. — Todos nós perdemos pessoas por causa do que está acontecendo.
Nós todos temos razões para nos certificarmos de que isto pare e não volte a
acontecer.

— Até mesmo eu — disse o Deacon. — Eu não recebi as minhas regulares


doze horas de sono desde que tudo isso aconteceu, e isto é muito trágico.

Aiden revirou os olhos.

— Todo mundo está pronto para lutar — Laadan atravessou a sala,


sorrindo enquanto estava ao lado de Marcus. — Esta não é apenas a sua
batalha.

— Nunca foi apenas a sua batalha — Solos corrigiu.

— Em outras palavras — Marcus disse, com os olhos cor de jade


encontrando os meus —, você não está sozinha neste barco. Você nunca
esteve.

— E você nunca estará — Aiden terminou calmamente.

Uau. Eu acho que eu meio que amava a todos nesta sala agora, mesmo
Lea. Lágrimas queimaram meus olhos, e eu inclinei minha cabeça para
frente, para que ninguém pudesse ver. A coisa é que, desde que eu percebi
como tudo isso podia acabar, provavelmente iria acabar – eu nunca me senti
mais sozinha. Mas, sentada aqui, ouvindo eles...

— Hora de um abraço em grupo? — Deacon sugeriu.

— Cale a boca — eu disse, mas eu ri.

Aiden deslizou um braço ao redor dos meus ombros e me puxou de


encontro a ele. Bem na frente da sala inteira cheia de mestiços, puros, e um
deus, ele beijou minha testa.
— Você só vai ter que aceitar que isso não vai ser só você. Vai ser todos
nós.

Ergui a cabeça e olhei para todos eles, perdida no que dizer.

Luke sorriu.

— Eu sei. Nós somos incríveis.

Eu ri novamente.

— E nós nascemos para fazer isso — Olivia disse, encolhendo os ombros.


— Nós estaríamos fazendo isso em um mês ou algo assim, de qualquer
maneira. Estamos prontos.

Lea deslizou para Olivia um sorriso que disse que ela estava mais do que
pronta.

— Aqui vamos nós.


Vinte e nove

Eu só tinha tirado algumas horas de sono na hora em que o sol rompeu


as cortinas na manhã seguinte. Ouvir todos me dizerem que eles estavam
prontos para enfrentar o que fosse jogado no nosso caminho... até mesmo
horas mais tarde, eu ainda não conseguia encontrar as palavras certas para o
quanto elas significavam. Mas um peso invisível também se estabeleceu em
meus ombros e foi crescendo durante a noite, me pressionando para baixo
através do colchão. Eu não conseguiria parar qualquer um deles – e eu não
gostaria que eles me parassem – mas milhares de coisas estavam correndo
pela minha cabeça.

E os principais pensamentos se concentraram em qualquer um deles que


pudesse perder a vida nisso. Tantos já haviam morrido, e não importa o quão
positiva eu tentasse ser, eu sabia no fundo do meu ser que algo terrível, algo
violento, nos esperava no futuro. A morte havia chegado muito antes deles se
comprometerem a fazer isso, e ela estava do outro lado da porta, ou em outro
estado, esperando pacientemente, porque nada era tão inabalável quanto à
morte. Ela provavelmente era a mais antiga no mundo.

Mesmo que eu soubesse o que os aguardava – o que nos aguardava – no


Submundo, eu não poderia suportar a ideia de ver qualquer um deles caindo.
Se eu pudesse, eu iria prender todos eles na gaiola lá embaixo, até mesmo
Aiden. Sem dúvida que não iria mais além, mas eu sabia que, entre o que
Apolo precisava de mim, o que Solaris tinha avisado, e como longe (ou quão
perdido) Seth parecia estar, isso iria acabar em um desastre.

Quando Aiden passou ao meu lado e deixou cair um braço sobre minha
cintura, eu fiz uma careta.

— Sinto muito.

Ele se aconchegou mais perto.

— Pelo quê?

— Eu continuo te acordando — Eu me pressionei contra ele, olhando por


cima do meu ombro. Dois olhos prateados olharam por trás de uma confusão
de cabelos escuros. — Eu sei que acordei você.

— Não muito — Aiden se levantou em um braço. Seu corpo estava


relaxado, mas a preocupação irradiava em seu olhar. — Quanto você dormiu?

Pensei em mentir, mas eu balancei minha cabeça, e então mexi nas


minhas costas.

— Nós estamos partindo em poucas horas.

Aiden acenou com a cabeça e seus olhos procuraram os meus.

Torcendo os dedos juntos, eu tentei sorrir.

— Quanto tempo vamos ficar na estrada?

— Nós viajaremos por cerca de dez horas.

Caramba.

— Deacon vai com a gente?

— Sim. Assim como Luke e Marcus. Solos vai levar as meninas.

Algo se agitou inquieto na boca do meu estômago. Eu não queria nomear


isso.

— Você acha que ficará tudo bem?

Aiden colocou sua mão sobre a minha, acalmando-a.

— Olivia e Lea são muito boas. Você sabe disso.

Elas eram. Especialmente Lea, ela era como She-Ra. E Solos e Marcus
tinham saído mais cedo, levando dois telefones celulares descartáveis para
nos ajudar a manter contato.

— E você sabe que Solos nunca vai deixar que nada aconteça a elas. Nem
Laadan — Enquanto ele falava, ele massageava as minhas mãos e enfiava os
dedos nos meus. — Nós temos 600 milhas de terra desconhecida para passar.
Vamos ficar bem.

Aquela coisa no meu estômago desviou.


— Eu não estou com medo.

— Eu não disse que você estava.

Meus olhos se estreitaram.

Aiden abriu um sorriso.

— Mas você está.

— Eu…

— Preciso encontrar uma câmara de privação sensorial de novo? —


Quando meu rosto corou com a memória, o seu sorriso se espalhou em um
sorriso cheio. Covinhas profundas apareceram e, em vez de meu estômago
cair, o meu coração caiu. — Está tudo bem, Alex.

— O quê? — Minha voz soou terrivelmente frágil, e normalmente eu teria


odiado isso, especialmente considerando que eu era essa grande Apollyon
malvada, mas com Aiden, eu não precisava fingir. Às vezes, eu me esquecia
disso, apesar de tudo.

— Sentir medo, Alex, é normal. O que estamos enfrentando é uma…


merda assustadora.

Então eu sorri.

— Você falou palavrão.

— Eu falei palavrão.

Porém meu sorriso desvaneceu-se rapidamente, porque estávamos


perante uma merda assustadora. Uma merda que Aiden nem sequer sabia a
metade.

— Você está com medo?

Por um momento, ele não respondeu. Tudo o que se podia ouvir era o
marcador do antigo relógio de parede, lento e firme, e o assobio distante dos
pássaros fora das paredes da madeira rústica.

— Sim.
Ouvi-lo admitir isso era ao mesmo tempo assustador e um alívio.

— Você nunca está com medo.

Aiden sacudiu a cabeça, seu sorriso entrando em um tom irônico.

— Você sabe que isso não é verdade. Há um monte de coisas que me


aterrorizam, Alex.

Eu encontrei seus olhos.

— Me diga.

Estendendo-se ao meu lado, ele me puxou mais perto para que meu rosto
estivesse pressionado contra seu peito.

— Eu tenho medo de que Deacon se machuque... ou pior. Eu tenho medo


de que iremos perder mais pessoas — Houve uma pausa e seu coração bateu
abaixo do meu rosto. — Estou com medo do que você está indo encarar, o
que você tem que fazer e como isso irá afetá-la.

Minha respiração ficou presa em volta de uma negação quando eu enrolei


os meus dedos no lençol jogado ao redor de seus quadris.

— Eu vou ficar bem — Essas palavras saíram amargas na minha língua.

Seu peito subia bruscamente.

— Eu não quero que você esteja bem.

Eu levantei minha cabeça para que eu pudesse ver os seus olhos. Eles
eram de um cinza escuro e sombrio. Ele tentou um sorriso, mas como o meu
mais cedo, parecia aflito.

— Eu quero que você esteja mais do que bem — Aiden segurou meu rosto
delicadamente. — Eu não quero que você tenha pesadelos para o resto de sua
vida, e ver o rosto de Seth em vez de sua mãe. Eu não quero isso a
assombrando.

De repente, tudo parecia muito real e eu estava muito perto. Sentando-


me, eu coloquei um pouco de espaço entre nós, mas eu ainda me sentia
quente e sufocada.
— Eu sei o que tem que ser feito.

E eu também sabia o que provavelmente significava para mim.

Ele acompanhou, capturando a distância recém-adquirida. Seu rosto, os


lábios bonitos estavam apenas a alguns centímetros do meu.

— Eu sei, Alex. Eu também sei que você vai fazer isso, porque eu não
posso sequer pensar por um segundo que você vai falhar. Você não pode.
Você não vai.

Na dor e determinação em sua voz, eu pressionei os meus lábios. Falhar e


ter sucesso meio que terminavam iguais.

— Olhe para mim — ele ordenou.

Eu não tinha percebido que eu desviei o olhar, mas eu senti a mão dele
na minha bochecha. Ele guiou o meu queixo para cima até que nossos olhos
se encontraram e eu não podia mais me mover.

— Mas eu também sei que matar Seth não vai ser fácil, e eu não me refiro
a um nível físico. Eu sei que no fundo você se importa com ele. Talvez uma
parte de você ainda o ame.

Horrorizada do que ele pensou, porque tinha acertado em cheio, eu


balancei minha cabeça.

— Aiden…

— Eu entendo — O pequeno sorriso que brincava em seus lábios era real.


— Eu sei que não é a mesma coisa que você sente por mim, mas isso não o
torna menos forte ou importante.

— Ele... — Eu não sabia o que dizer. Aiden estava certo. Parte de mim
ainda amava Seth, e não era do jeito que eu sentia por Aiden, mas não era
menos real ou poderoso. Mesmo depois de tudo o que Seth tinha feito, eu não
poderia esquecer tudo o que ele tinha feito antes. Fazia o mesmo com a
minha mãe, mas no final, eu tinha tomado a sua vida como se tivesse sido
destinado o tempo todo.

Você vai matar as pessoas que você ama...

A testa de Aiden se pressionou contra a minha.


— Seth estava lá para você quando você precisava de alguém. Vocês
compartilham este vínculo que... que é mais do que ele se conectar com
você. Nós quebramos a conexão, mas há algo mais por baixo disso. Ele é uma
parte de você.

Eu respirei surpresa.

— Ele... ele fez coisas terríveis.

— Ele fez — Aiden deu um beijo na minha testa. — Mas ele fez algumas
coisas boas, e eu sei que você não pode se esquecer de como ele costumava
ser. Eu sei que nada disso vai ser fácil para você.

Matar Seth iria quebrar um pedaço de mim, e não importa quanto tempo
eu andasse nesta terra depois, isso não poderia ser reparado. Ele era uma
parte de mim – uma parte que era um pouco louca – mas ainda assim. Isso
me mudaria de uma maneira que eu não conseguia entender. Assim como a
minha mãe tinha feito. Mas desta vez era diferente.

Apolo não me queria para matar Seth, ele queria que eu tirasse o seu
poder. Conhecendo Seth, ele provavelmente iria preferir a morte. E se Seth
descobrisse o que eu estava fazendo, ele viria atrás de mim. Então, eu teria
que detê-lo, matá-lo. Matar Seth seria a única maneira que eu saísse dessa
com vida.

— Alex? — Aiden sussurrou. — Fale comigo, agapi mou.

— Não tenha medo — Minha voz estava rouca. — Eu vou ficar... bem.

Sua mão escorregou para a minha nuca, e ele me segurou como se ele
pudesse me manter lá para sempre.

— Você vai me dizer que você vai ficar bem. E você vai agir como se
estivesse tudo bem, mas...

Eu fechei os meus olhos. Aiden saberia melhor. Segundos se passaram em


silêncio. A verdade estava na ponta da minha língua, me queimando de
dentro para fora. Eu queria dizer a ele o que poderia acontecer – eu
realmente precisava – mas sobrecarregá-lo com isso não era justo para ele. O
tempo se estendeu, mas não foi o suficiente.

— Você vai matar as pessoas que você ama — Minha risada era seca e
quebrada. — Eu odeio esse oráculo maldito.

Os dedos de Aiden se espalharam por todo o meu rosto.

— Se eu pudesse mudar isso, eu o faria. Eu faria qualquer coisa para


salvá-la disso.

— Eu sei — Eu inclinei minha cabeça um pouco para o lado e o beijei


suavemente. — Mas o destino é uma vadia.

— Ou um canalha — disse ele suavemente.

Eu ri, porque sempre que Aiden xingava, eu não podia evitar. Parecia
errado saindo da sua língua, mas ainda elegante, de alguma forma. Como
uma pessoa britânica xingando. De qualquer forma, eu simplesmente não
conseguia mais falar sobre isso. Eu nem sequer queria pensar sobre isso, mas
eu precisava limpar o meu cérebro para corrigir isso.

Inclinando para frente, eu enrolei os meus braços ao redor do seu pescoço


e subi em seu colo.

— Podemos falar de outra coisa?

Aiden parecia que ia argumentar, mas ele assentiu.

Olhando em seus olhos, eu pensei de volta nos dias em que ele costumava
aparecer e me ver treinar. Isso me fez sorrir.

— Eu costumava pensar que você era a fonte do meu fracasso.

— O quê? — Ele arqueou uma sobrancelha quando ele passou os braços


em volta da minha cintura.

— Eu nunca conseguia fazer as coisas direito quando você estava por


perto, especialmente quando você costumava me assistir em sala de aula —
Eu dei de ombros. — Eu queria estar perfeita em seus olhos. Eu queria que
você tivesse orgulho de mim.

— Eu tenho.

Eu sorri para ele, sorrindo de verdade pela primeira vez desde que esta
conversa começou.
— Mas você é tipo como a minha fonte de força, mesmo quando eu não
conseguia me concentrar por causa de você.

Aiden inclinou a cabeça para o lado, fazendo com que seus lábios
pousassem na minha bochecha.

— Nós tivemos o mesmo problema, então.

— Duvido.

— Você não tem ideia de como era difícil — Aiden suspirou contra meus
lábios. — Treinar você – estar tão perto quando tudo que eu queria...

Havia uma vibração no meu peito.

— O que você queria?

Ele se inclinou, seu hálito quente se tornando o meu mundo.

— E se eu lhe mostrar?

Oh, eu realmente gostava de onde isto estava indo. Muito melhor do que
a desgraça e a porcaria da tristeza que queria me puxar para baixo, trazendo
Aiden comigo.

— Aceito.

Rindo baixinho, ele apagou essa distância minúscula e deixei escapar um


pequeno suspiro. Se ele me beijasse desse jeito a cada duas horas, ele iria
manter a escuridão longe. Iria destruir tudo o que eu temia e, provavelmente,
vir a se arrepender. Meu mundo estaria perto de perfeito.

Houve uma batida, e nos afastamos um instante antes da porta se abrir e


a cabeça de Deacon aparecer lá dentro. Aiden gemeu, mas seus olhos
estavam iluminados com vários tons.

— Bom dia! — Muita alegria tocou em sua voz para esta hora da manhã.

Minhas bochechas queimavam quando eu murmurei.

— Bom dia.

Antes que qualquer um de nós pudesse dizer outra palavra, Deacon correu
da porta e lançou-se sobre a cama, subindo pelo ar, como um projétil
humano. Eu me afastei para o lado com uma fração de segundos de sobra.
Ele caiu com as pernas sobre seu irmão e a parte superior de seu corpo entre
nós.

Deacon jogou os braços atrás da cabeça, dobrando-os quando ele inclinou


a cabeça para trás e sorriu para nós.

— É como fazer um montinho.

— Um montinho? — Aiden arqueou uma sobrancelha. — Você é tão


estranho.

— Tanto faz — Os olhos cinzentos de Deacon se jogaram para mim. — Eu


estava interrompendo alguma coisa?

Aiden revirou os olhos e eu lutei com um sorriso.

— De jeito nenhum, irmão.

— Bom, porque vocês têm que se apressar. Estamos saindo em uma hora
— Deacon cruzou os tornozelos, deixando escapar um suspiro satisfeito. — É
hora de pegar a estrada.

Coloquei meu cabelo para trás, imaginando o quanto de café ele tinha
que ter tomado tão cedo.

— Você está tão estranhamente desperto.

— Eu estou animado — Ele respondeu. — Eu estou olhando para esta


viagem como um jogo da vida real de Oregon Trail.

Minhas sobrancelhas se levantaram.

— Você vai pegar a febre tifoide?

— Na verdade, eu estava pensando em quebrar uma perna ou me afogar.

— Sempre há aqueles morrendo de fome — Meus lábios se dividiram em


um sorriso. — Ou você pode ser sequestrado pelos índios.

Os olhos de Deacon se ampliaram drasticamente.


— Eles me querem pelos meus gloriosos cachos dourados.

— É hora de alguém cortar esses seus cabelos — Aiden despenteou os


cachos já indisciplinados e, em seguida, jogou as cobertas para trás. — Eu
vou tomar um banho.

O olhar que Aiden me enviou disse que não tinha planejado fazer isso
sozinho, e meu estômago fez todos os tipos de reviravoltas malucas e giros.
Não ajudou ele ter atravessado a sala em toda a sua glória com o peito nu. O
calor que corria em alta velocidade em minhas veias era difícil de negar, mas
Deacon, aparentemente, não estava indo a lugar nenhum.

Eu esperei até Aiden fechar a porta e ouvi o silvo do chuveiro antes de


olhar para a seu irmão mais novo.

— O quê?

Seus lábios se inclinaram em um lado.

— Precisamos conversar.

Não tendo nenhuma ideia do que ia sair de sua boca, mas positivamente
seria divertido, eu me mexi e me estendi a seu lado.

— Tudo bem. Sobre o quê?

— Você precisa permanecer viva.

Tudo bem, então não é o que eu estava esperando.

— Eu não estou planejando algo diferente para mim, Deacon.

— Não, mas você tem o olhar de alguém que está voltada para baixo na
morte, praticamente esperando — Deacon fez uma pausa e seu olhar foi para
as vigas nuas no teto. — Eu sei o que parece. Eu vi no espelho por um longo
tempo.

Minha boca se abriu, mas eu não conseguia encontrar as palavras.

Ele riu secamente.

— Eu odiava viver depois de ver o que aconteceu com os meus pais e as


outras pessoas. Se não tivesse sido por Aiden, eu não teria sobrevivido. Eu
não deveria ter sobrevivido. Nem ele deveria — Ele deu de ombros,
desequilibrado. — Eu acho que eu tive um caso louco de culpa de
sobrevivente ou algo assim. Toda vez que eu bebia ou ficava doidão, eu
secretamente esperava que eu exagerasse, sabe?

Quando suas palavras se afundaram, meu peito doeu. Estendi a mão,


colocando minha mão em seu braço.

— Deacon...

— Ah, eu estou bem agora. Eu acho que estou, pelo menos. Mas você sabe
por que eu nunca fui lá? — Deacon virou a cabeça para mim e eu sabia o que
ele queria dizer. — Eu não estava com medo da morte, mas eu estava com
medo do que eu, morrendo, faria com ele.

Deacon acenou para a porta do banheiro e meu olhar seguiu o dele. Eu


não podia ver Aiden e eu sabia que ele não podia nos ouvir, mas meu coração
batia como se eu tivesse acabado de correr uns mil passos.

— Ele não iria continuar se perdesse você — eu disse, engolindo em seco.


— Ele é tão forte, mas...

— Isso iria matá-lo. Eu sei. Perder você iria matá-lo.

Um calafrio tomou conta de mim, como se eu tivesse entrado em um


congelador. Sentando-me rapidamente, eu puxei meu cabelo sobre o ombro.

— Por que você está me dizendo isso?

— Você tem o mesmo olhar desde que voltou do Submundo — Houve uma
pausa, e ele olhou para mim com toda a seriedade que ninguém lhe dava
crédito, e nesse momento ele me lembrou muito de Aiden. — Faça o que
fizer, não magoe o coração do meu irmão. Você é o mundo dele. E se você o
deixar, isso irá destruí-lo.
Trinta

Nosso Hummer era o carro de partida – o único legal. Ou pelo menos isso
é o que eu acreditava. Entre Luke e Deacon, a viagem de dez horas da
floresta para a Dakota do Sul não iria se transformar em algo tão ruim
assim. Pobre Marcus parecia que ele queria por fitas adesivas para fechar as
bocas dos dois rapazes após seu resumo de duas horas ininterruptas da
última temporada de Supernatural. Eu não estava reclamando. Em seguida,
Luke mudou para este novo programa sobre tronos e dragões, que tentou
explicar a Aiden. Considerando que Aiden era um fã de programas de TV em
preto-e-branco, Luke não estava indo muito longe.

Marcus parecia que tinha uma dor de cabeça, o que refletia como eu me
sentia. Não tinha nada a ver com a conversa dos meninos ou com os
ridículos – mas hilários – jogos que eles insistiam em jogar no carro. E eu
tinha certeza de que, se Deacon se inclinasse entre os assentos e Aiden
desse-lhe um soco no braço mais uma vez quando ele visse um Fusca, Aiden
encostaria o carro e iria estrangulá-lo.

Eu também tinha certeza de que Marcus iria jogar Deacon para fora. O
homem devia ter uma contusão ímpia em sua perna do último soco que
Deacon tinha lhe dado.

Mas, após quatro horas, a agitação tornou-se estável. Minutos depois de


pararmos de correr o risco de virar o carro, eu tentei descansar um pouco.
Não era como se o cenário tivesse muito para se olhar. Muitos campos.
Muitas colinas. Muitas árvores. Tédio coçava a minha pele enquanto eu
olhava para as proteções, desenhadas em sangue de Titã em todo o carro, que
impediam os deuses de me sentir. Mas o fato de que eu estava presa dentro do
veículo para o futuro previsível não era a pior parte. O pulsar cada vez maior
nas têmporas disparou através do meu sistema nervoso.

Seth estava lá, perambulando, esperando por aquele momento onde ele
poderia aparecer e ter uma conversa. Parte de mim quase dava boas-vindas a
isso, porque seria algo para se fazer, mas era tão estúpido. Conversar com
Seth não iria ajudar em nada. Ele estava de um lado da barreira e eu estava
do outro lado.
Eu não queria pensar em tudo.

Virando no banco, meus olhos se encontraram com os do meu tio. Sorri


quando ele acenou para Deacon. O puro finalmente tinha desmaiado, com o
rosto colado contra a janela. Ao lado dele, Luke estava olhando para fora da
janela, sua mandíbula apertada.

Não querendo acordar a besta falante, eu não disse nada e me virei.


Minha bota deslizou sobre a lâmina de foice apoiada no chão. Estávamos tão
abastecidos e bem armados como tínhamos estado quando fomos para o
Kansas.

Eu me ajeitei no banco, cuidadosamente esticando minhas pernas


quando o que eu realmente queria era me esticar toda. Com o canto do meu
olho, eu vi o sorriso divertido de Aiden. Eu fiz uma careta para ele e ele riu
baixinho.

O tempo passou devagar até rastejar. Toda vez que eu olhava para o
relógio no painel eu teria jurado que duas horas haviam se passado, mas
eram apenas vinte minutos depois. Quando atingiu o ponto médio, Solos
chamou por Aiden. Eles precisavam abastecer.

Aiden não estava feliz sobre isso.

— Estamos muito perto de Minneapolis.

Em outras palavras, estávamos muito perto de uma área densamente


povoada. Quase todas as grandes cidades dos EUA tinham comunidades de
puros na periferia. Onde havia puros, havia daimons. E isso também
significava que haveria sentinelas e guardas – aqueles que poderiam estar
trabalhando com Lucian.

Mas nós não tínhamos outra escolha. Ambos os veículos estavam ficando
sem gasolina, e também era parar agora ou ficar sem gasolina no meio do
nada e ser comido por coiotes selvagens e ursos.

Entramos numa área de viagens de tamanho decente e eu imediatamente


estendi a mão para a maçaneta da porta.

— Eu prefiro que você fique no carro — disse Aiden, tirando o cinto.

Eu fiz uma careta.


— Por quê? Eu tenho o talismã.

— Eu sei — Ele atirou-me um olhar. — Mas conhecendo a nossa sorte,


alguém vai reconhecê-la.

— Mas eu tenho que usar o banheiro.

— Se segure — Luke disse, abrindo a porta do carro. — Eu vou trazer algo


para fazer um lanche, e água – muita água.

Eu olhei para ele.

— Isso é tão errado.

Todos menos eu correram do Hummer e eu me joguei contra o assento,


cruzando meus braços. Eu sabia que nós não precisamos de outro deus nos
arrasando no meio do posto de gasolina, mas porra...

Aiden foi em direção ao outro Hummer, enquanto Marcus abastecia com


gasolina. Lá estava eu, a enlouquecida Apollyon, e eu não conseguia nem ir
lá dentro para pegar um saco de beef jerky sozinha. Nossa.

Alguns momentos depois, Aiden veio para o meu lado do carro. Eu pensei
em deixar a janela fechada, mas eu a abri. Ele se inclinou, descansando em
seus braços.

— Hey — ele disse, sorrindo.

Eu sabia que estava fazendo beicinho, mas eu não podia sentir o meu
bumbum.

— Olivia e Lea estão checando o banheiro. Parece que é do lado de fora e


pela parte de trás.

— Oh, graças aos deuses — Eu caí no meu lugar.

Seu sorriso se espalhou em um lado.

— Eu vou garantir que Luke pegue para você algo diferente do que a
água.

— Você é o melhor — Eu fui para frente e o beijei rapidamente. — Eu falo


sério.
Quando passou por nós, os olhos de Marcus se estreitaram.

— Eu sinto como se estivesse tendo a necessidade de separar os dois.

As bochechas de Aiden coraram quando ele se afastou e limpou a


garganta.

Marcus parou ao lado dele, cruzando os braços.

— Especialmente as coisas para dormir. E eu não sou ingênuo o


suficiente para...

— Whoa! — Eu o cortei. — Isso não é um tema que eu estou disposta a


aprofundar.

Marcus me deu um olhar brando.

— Você é minha sobrinha e eu sou o seu guardião.

— Eu tenho dezoito anos.

— E você ainda é muito...

— Olivia! Pausa para o banheiro! — Eu abri a porta, quase batendo em


Marcus. Atirei a meu tio um rápido sorriso, eu corri em volta dele.

Aiden agarrou meu braço.

— Tenha cuidado.

— Claro. Exceto por morrer de irritação e querendo vomitar, é só um


banheiro público.

Ele ainda parecia querer me acompanhar até lá, mas Marcus também
estava de olho em Aiden como se quisesse socá-lo novamente. Aiden deixou-
me ir e me juntei às meninas na calçada.

— O que está acontecendo lá? — Perguntou Olivia.

Olhei por cima do meu ombro. A boca de Marcus estava voando a mil por
hora, e Aiden estava ali, rígido e silencioso. Eu fiz uma careta.

— Você não quer saber.


— Provavelmente tem a ver com o fato de que você e Aiden estão tendo
relações sexuais — Lea anunciou, cruzando os braços.

Meu queixo caiu.

— Legal — Olivia golpeou-lhe um braço. — Um jeito de jogar isso para


fora.

Lea deu de ombros.

— Ei, é o que é. Ele é um gato. Eu estaria fazendo com ele a cada cinco
segundos.

— Tudo bem. Obrigada por compartilhar.

Olivia olhou para o outro lado.

— Falando de sexo como um coelho excitado, você já ouviu falar de


Jackson? Ele não estava no Covenant quando... — Ela olhou ao redor e
baixou a voz. — Ele não estava lá quando Poseidon enlouqueceu.

— Não. Meu celular morreu e eu não tenho um carregador — Seus olhos


se estreitaram com o céu nublado. — Eu não sei o que ele poderia estar
fazendo. Nós não estávamos realmente tão próximos quanto vocês pensam.
Pelo menos, não nos falamos muito.

Olivia bufou.

— Eu não acho que ele está com Seth e Lucian — eu disse quando
começamos a dobrar a esquina do edifício de cimento.

— Por quê? — Olivia puxou um cacho de volta.

— Lembra quando Jackson teve o rosto reorganizado? — Nós tínhamos


parado do lado de fora da porta do banheiro, e eu já podia sentir o cheiro do
medo. As meninas assentiram. — Tenho certeza de que Seth fez isso com ele.

— Caramba — Olivia murmurou enquanto deslizava a chave na porta. —


Por causa do que Jackson fez com você na sala de aula?

Eu balancei a cabeça. Jackson tinha me batido muito, enfiando a bota


na minha cara – eu tinha uma pequena cicatriz para provar isso – e eu tinha
certeza de que o instrutor Romvi tinha o incitado a isso. Quando fomos para
o banheiro e procurei por uma cabine um pouco decente, eu me perguntava
se Romvi ainda estava vivo.

Romvi havia desaparecido após Linard ter dado o ultimato do Ministro-


chefe Telly, e Seth tinha os membros da Ordem caçados, pois eles eram a
única ameaça real para nós. Tão terrível quanto parecia, se tivesse
encontrado seu fim, eu não ficaria muito arrasada. Romvi tinha um fim para
mim desde o primeiro dia.

A viagem para o banheiro acabou sendo monótona, já que eu não


considerava o risco de pegar a mão, o pé, e a febre aftosa uma ocorrência.

De volta ao Hummer, com meu colo cheio de Skittles e outras guloseimas


sortidas, fiquei surpresa pelo fato da Medusa não ter aparecido no banheiro e
tentado me comer. Talvez essa viagem não fosse tão ruim.

Eu olhei para trás, passando onde Deacon e Luke estavam


compartilhando nachos. Os braços de Marcus estavam espalhados ao longo
do encosto no último lugar. Seu olhar estava focado na parte de trás da
cabeça de Aiden como se ele pudesse de alguma forma fazer furos através
dele.

Tudo bem. Talvez essa viagem não fosse tão ruim para mim. Para Aiden
por outro lado...

Lançando-me para frente, eu peguei o olhar de Aiden e ofereci um sorriso


simpático.

— Skittles?

— Por favor.

Eu depositei alguns na palma da mão aberta, em seguida escolhi os


verdes.

Aiden sorriu para mim.

— Você sabe que eu não gosto dos verdes?

Dando de ombros, eu os coloquei na boca.

— As poucas vezes que eu vi você comê-los, você deixa os verdes para


trás.
Deacon colocou a cabeça entre os nossos lugares.

— Esse é o amor verdadeiro.

— É isso — O olhar de Aiden voltou para a estrada.

Eu corei como uma pequena colegial e foquei nos restantes doces até
Deacon se voltar para o seu lugar. Eu entreguei todos os vermelhos para
Aiden.

Algumas horas depois de termos atingido o apocalíptico trânsito fora de


Sioux Falls, os céus abertos tinham escurecido e a noite estava apenas a
alguns minutos. Nós se formaram no meu estômago quando eu pensei na
distância entre mim e a Universidade se evaporando. Estávamos ainda a
cerca de quatro horas de distância, mas isso não era nada depois de estar no
carro por tanto tempo.

A Universidade estava aninhada no fundo de Black Hills na Dakota do


Sul. Não é perto de Monte Rushmore, mas na parte conhecida como Colinas
do Norte. Era um deserto fortemente protegido, só alcançável em veículos
como o que estávamos dentro. As pessoas tinham que saber o que eles
estavam procurando até para ver a entrada da escola.

Eu nunca tinha visto a Universidade em pessoa, mas eu sabia que parecia


algo saído da Grécia. Como todos os Covenants, os mortais acreditavam que
a escola era uma parte de um sistema de ensino de elite, apenas para
convidados. Até mesmo eu estava animada para ver a escola, os meus nervos
cantarolavam por um motivo diferente.

Meu pai poderia estar lá – ou ele poderia estar a caminho.

Esperança subiu no meu peito e eu me senti tonta por alguns segundos.


Eu não sei o que eu faria se eu o visse – provavelmente algo como atacar e
combater o homem, e eu esperava que eu não berrasse como um bebê e me
envergonhasse.

Eu sabia que não deveria ter minhas esperanças. Meu pai pode não estar
lá. Ele nunca poderia aparecer lá. Ele poderia ser morto.

Meu estômago despencou, e por um momento eu pensei que ia vomitar.

A questão era que – e eu ficava tentando dizer a mim mesma que era – eu
não sabia. E não havia razão para ficar excitada de qualquer maneira. E eu
tinha coisas mais importantes para me concentrar, por exemplo, como
diabos eu iria convencer um bando de sentinelas e guardas a arriscarem suas
vidas até a morte, guerreando contra Seth e um deus.

Aiden se mexeu em seu lugar, e o olhar em seu rosto enquanto ele ouvia
com atenção não era bom.

— O quê? — Eu perguntei, sentindo meu estômago cair novamente. Eu


me pergunte se eu tinha uma úlcera... ou se isso era mesmo possível.

— Entendi — disse ele ao telefone, e depois o fechou. — Nós estamos


sendo seguidos.

Eu girei no meu lugar, assim como Marcus e Luke. Os faróis do Hummer


de Solos estavam bem atrás de nós. Eu olhava. Vários metros atrás havia
outro conjunto de faróis. Eu não era uma especialista nessas coisas, mas
parecia muito com outro Hummer.

Sentinelas e guardas adoravam dirigir Hummers. Quanto maior, melhor e


tal – provavelmente se disfarçando de outra coisa. Mortais dirigiam Hummers
também, mas cada instinto me dizia que era do Covenant e não eram
amistosos.

Porcaria.

— Quanto tempo? — perguntei.

— Desde que passamos por Sioux Falls — Aiden respondeu, os olhos


passando rapidamente para o espelho retrovisor.

— Há uma saída chegando – vamos pegá-la. Precisamos sair da estrada


principal — Marcus xingou quando ele se inclinou para trás, puxando uma
Glock. — A boa notícia é que a estrada ficará livre dos mortais. A má notícia
é que as estradas vão ficar mais claras.

Não haveria ninguém por perto para qualquer lado para se preocupar com
a exposição, se é que eles ainda se importavam com isso.

— Diga a Solos para seguir — Marcus disse, — e para chegar perto de nós.

Enquanto Aiden retransmitia a mensagem para Solos, eu mantive os


meus olhos colados no trecho da rodovia atrás de nós quando chegamos na
rampa e voamos na escuridão, na estrada de volta. Então eu vi o que Aiden
não tinha dito, e que Marcus deve ter percebido uma vez que Solos tinha
mudado para a outra pista.

Não era só um Hummer; eram dois, e eu tinha certeza de que ambos


estavam lotados.

Merda dupla.

Luke estava se esforçando para dar uma olhada melhor.

— Nós não podemos deixá-los reportarem, pessoal. Se já não tiverem


reportado. Estamos muito perto da universidade.

— Então, você realmente acha que eles são – de Lucian? — Perguntou


Deacon, segurando a parte de trás do meu assento.

Aiden assentiu.

— Tá tudo certo, apesar de tudo. Pode deixar.

A força em suas palavras – a determinação para que todos passassem por


isso – era a cara dele. Não importava o que fosse, ele a mantinha. Ele pode
vacilar um passo ou dois, mas ele resistia aos golpes e ele nunca desistia.
Não de mim. Não de seu irmão. E nunca da vida. Deuses, não era de admirar
que eu amasse esse homem.

Enquanto eu olhava para ele e via a determinação de aço nas linhas de


seu rosto marcante, eu percebi uma coisa. Na verdade, foi como ser
atropelada por um caminhão de sete toneladas.

Eu precisava colocar minhas calças de garota grande – pra valer.

Deacon tinha razão. Uma parte de mim tinha aceitado que minha morte
seria inevitável desde que eu tinha saído do Submundo, que meu destino final
seria encontrar uma maneira de vencer. Eu – eu tinha me sentido assim –
acredita nisso. Eu? A menina que praticamente disse FODA-SE para tudo,
especialmente para o Destino.

Caramba...

Meio surpresa, eu olhei para a frente do veículo. Eu era melhor do que


isto – melhor do que chafurdar na minha própria piedade. E era muito
melhor do que deixar o Destino me controlar. Eu não era fraca. Eu nunca
tinha sido uma desistente antes. Eu nasci para ser a guerreira definitiva.
Então, se alguém poderia sair dessa situação ilesa, esta deveria ser eu.

Seria eu.

Porque eu era uma lutadora. Porque eu não desistia. Porque eu era forte.

Quando a extremidade dianteira do Hummer de Solos chegou na metade


do nosso caminho, houve um som de estalo distinto e seu carro de repente
virou para a esquerda.

— Caramba — Deacon engasgou. — Estão atirando neles...

A nossa janela traseira explodiu. O vidro quebrou e choveu através do


carro. Eu girei no meu assento, percebendo que Luke tinha Deacon preso
contra o assento. Eu não vi o meu tio.

— Marcus?

— Eu estou bem — ele gritou.

— Alex, fique abaixada — Aiden segurou firme no volante com uma mão
enquanto ele estendia a outra mão para mim, agarrando o meu braço e me
puxando para baixo.

Marcus apareceu e devolveu o fogo em uma rápida sucessão. Pneus


cantaram, o Hummer ao nosso lado virou de novo, e depois voou à frente em
um rugido. Eu não podia acreditar que eles realmente estavam atirando em
nós. E então isto me surpreendeu. Eles não se preocupavam com qualquer
outra pessoa no veículo. Eles sabiam que eu iria sobreviver à batida de uma
maneira ou de outra.

Eles iriam continuar a atirar até que nós falhássemos.

Outro estalo, e a janela ao lado de Aiden explodiu. Cacos de vidro voaram


para os lados, sendo atirados em Aiden e eu. Ele fez uma careta, e eu já
estava muito sobrecarregada sobre isso.

— Pare o carro — eu disse.

— O quê? — A mão de Aiden pressionou minhas costas enquanto ele


acelerava, colocando alguma distância entre nós e o veículo cheio de
psicopatas.

Lutei para me levantar.

— Pare o carro!

Ele olhou para mim, e deuses sabem o que ele viu nos meus olhos, mas
ele xingou baixinho e desviou para o acostamento. Os outros veículos
dispararam atrás de nós, o som de seus pneus guinchando no asfalto.

Antes que Aiden pudesse me parar, eu abri a porta. Outro palavrão


explodiu dele e ouvi Marcus gritar:

— Que diabos?

Eu saí do Hummer, me mantendo abaixada. Havia um punhal preso à


minha coxa, mas não era isso que eu precisava.

Aiden deslizou para fora do lado do passageiro, estreitou os olhos em


mim. Ele tinha uma arma na mão.

— O que você está fazendo?

— Boa pergunta — Luke empurrou Deacon para o aterro. — Parar não


parece ser a coisa certa a se fazer.

— Eu não posso acreditar que eles realmente estão atirando em nós. Nós?
— Deacon começou a se levantar. — O que está errado...?

— Fiquem abaixados! — Aiden virou, apontando para Luke. — Mantenha-


o vivo ou...

— Eu sei — Luke puxou Deacon para baixo e para trás dele. — Nada vai
acontecer com ele.

Mais à frente, Solos tinha estacionado e todos eles se jogaram para fora
do carro, mantendo-se para o lado do passageiro. Eu soltei um suspiro de
alívio e, em seguida, me lancei em direção à frente do Hummer.

— Alex — Aiden me seguiu agachado. — O que são...?

Os dois veículos tinham se virado e estavam quase sobre nós. Realmente


não havia tempo para pensar sobre o que eu estava fazendo. Usando a
velocidade que todos os meio-sangues têm, e a potência extra do Apollyon, eu
corri ao redor do para-choque e na direção da pista.

Aiden soltou uma palavrão.

Eu estava banhada nas luzes dos faróis quando eu levantei a minha mão,
chamando o elemento ar. Era como destravar uma porta dentro de mim.
Poder correu de dentro, em seguida, espalhando-se, deslizando sobre a minha
pele. O ar se jogou rodovia abaixo, soprando por mim, mais rápido e mais
forte do que um puro poderia exercer. Ventos com força de furacão se
chocaram com o primeiro Hummer.

Isso o deixou sobre duas rodas, os pneus girando no ar quando os faróis


perfuraram o céu noturno. O Hummer pairava há um segundo, e em seguida,
capotou o segundo veículo. Através do ar ele tombou algumas vezes – algo foi
arremessado de uma das janelas, talvez uma pessoa.

Cintos de segurança salvam vidas.

O primeiro Hummer caiu de cabeça pra baixo. Metal rangia e gemia, e


depois cedeu. A pessoa por trás girou para a direita para evitar uma colisão
direta. Faíscas de cor âmbar voaram.

As portas do segundo se abriram e eu contei seis sentinelas vestidos de


preto. Eles eram meio-sangues, jogando no lado errado do campo.

Uma carga depois, e eu o atirei nos olmos grossos que enchiam a estrada
com um movimento do meu pulso. Houve uma barulho com o impacto que
disse que essa ferramenta estaria fora de serviço por um tempo.

O segundo brandiu dois punhais do Covenant quando ele foi direto para
mim.

— Venha com a gente e vamos deixar seus amigos viverem.

Eu inclinei minha cabeça para o lado e sorri.

— Bem, não é muito cliché? Que tal isso – vire as costas e eu posso
deixá-lo viver.

Aparentemente, o Sentinela não entendia inglês, porque ele deu uma


guinada para mim. Dei um passo para o lado, me esticando e pegando seu
braço. Eu o torci para baixo quando eu trouxe o meu joelho para cima,
fazendo contato logo acima do cotovelo. Os ossos quebraram e o Sentinela
gritou. Balançando atrás dele, eu peguei o outro braço e o torci. Suas costas
curvaram e o punhal caiu no chão.

Marcus apareceu na nossa frente. Sem pestanejar, ele enfiou uma adaga
no peito do Sentinela que eu tinha deixado cair. O homem nem sequer fez
um som.

Eu o soltei, e seu corpo caiu na rua.

Meus olhos se encontraram com os do meu tio. Um segundo depois, ele


tinha a Glock levantada e apontada. Eu estava tão perto que eu vi a pequena
faísca quando o gatilho foi puxado. Ofegante, eu me virei.

A bala bateu no meio dos olhos de uma Sentinela.

— Nossa — eu disse, cambaleando para trás.

— Eles sabem que não podem matá-la — Marcus agarrou meu braço e me
empurrou de volta para o Hummer. — Mas eu acredito que pretendem levá-la,
não importa qual seja a sua condição.

— Eu estou começando a ver isso.

Solos e Aiden estavam lutando com dois Sentinelas. Olhando para trás, vi
que Olivia e Lea tinham mais dois encurralados. Minha atenção girou de
volta para o Hummer amassado.

Havia mestiços no carro, e como esperado, não estavam derrotados.


Outros seis estavam amontoados. Sentindo a descarga de adrenalina
enrolando firme na corda, eu me atirei à frente com Marcus logo atrás de
mim.

Alcancei um Sentinela, segurando o punhal na mão direita. Ele


mergulhou na minha direção, mas eu abaixei debaixo de seu braço, mais
rápido do que os olhos do mestiço poderiam acompanhar. Balançando ao
redor, eu o acertei nas costas com a minha bota e ele caiu sobre um joelho.
Algo dentro de mim foi desligado enquanto eu agarrava seu cabelo e puxava
a sua cabeça para trás. Estes não eram Sentinelas. Eles eram inimigos, como
os Daimons. Eu não conseguia pensar em nenhuma outra maneira. Eu
trouxe o punhal para baixo em uma morte limpa e rápida.
Ouvindo passos batendo atrás de mim, girei e me empurrei para o lado,
por pouco perdendo um punho direcionado para o rosto. Saltando no ar, eu
girei e dei um indecente chute do tipo Eu – espero – que – alguém – veja –
este – giro.

O sentinela caiu no chão, segurando o que era provavelmente uma


mandíbula quebrada. Lançando o punhal acima, eu andei para frente. Cara,
eu meio que sentia falta da luta com Apolo. Nós estaríamos mantendo
contagem...

Mãos agarraram meus ombros e me puxaram de volta. Eu bati na calçada


e deslizei. Dor explodiu ao longo de minha espinha e eu olhei para cima,
atordoada.

Um Sentinela de pele escura olhou para mim.

— Você poderia fazer isso... — Suas palavras foram sufocadas. Algo


molhado e quente pulverizou no ar. Seu corpo ficou em uma direção e sua
cabeça foi na outra.

Rolei de joelhos, apertando minha boca fechada contra a vontade de


vomitar.

Olivia deu um passo atrás, seu olhar passando rapidamente de mim para
a adaga.

— Isso... isso não era nada parecido com o que eles ensinam em sala de
aula.

Me levantando, eu balancei a minha cabeça. Era esta a primeira vez que


Olivia tinha lutado? Por sua primeira morte ser outro Sentinela ... Eu não
sabia o que dizer. E nós não tínhamos tempo para uma sessão de terapia.

O Mandíbula Quebrada estava de pé. Ele girou, a adaga arqueada para


baixo. Senti o silvo da lâmina afiada ao longo do meu estômago. O objeto
cortou, mas isso foi o mais perto que ele chegou.

Aiden apareceu atrás dele e agarrou os lados de sua cabeça. Houve uma
rápida torção, outro som se rastejando de volta e repetiu uma e outra vez
mais tarde, e em seguida, o Sentinela caiu.

Os olhos de Aiden encontraram os meus e eles eram da cor de aço.


— Mesmo que a exibição de poder seja muito atraente, não tente fugir do
trânsito nunca mais.

Comecei a responder, mas uma sombra deslizou por trás dele. Meu
coração parou.

— Aiden!

Antes que eu pudesse levantar a mão, ele virou-se como o vento, soltando
a adaga. Ela bateu no peito do guarda que se aproximava dele. Lançando-se
para frente, ele puxou a lâmina antes do guarda entrar em colapso, e em
seguida a jogou novamente, derrubando o outro guarda que tinha
encurralado Solos.

Droga. Aiden era um ninja foda.

Apenas alguns minutos se passaram e tínhamos tido sorte até agora, mas
a aproximação de faróis nos avisou que estávamos com falta de sorte.

— Olivia, pegue Lea e vão para o outro lado do carro.

Seu olhar caiu para o Sentinela caído mais uma vez e, em seguida, ela
balançou a cabeça, desviando o olhar. Ela agarrou o braço de Lea e puxou-a
para onde Luke e Deacon começaram a surgir a partir do aterro.

Um sedan parou atrás do Hummer amassado. Desembainhando a adaga,


eu corri até o carro no mesmo momento em que a janela do motorista rolou.
Um mortal de meia-idade examinou a cena com crescente horror.

— Oh, meu Deus — disse ele, segurando um telefone celular. — Eu posso


pedir ajuda – isto é um corpo?

Ajoelhei-me, obrigando o mortal a me olhar nos olhos.

— Não há nada para se ver aqui. Você não vai ver nada enquanto você
dirigir. Você vai voltar para casa e... beijar sua esposa ou qualquer outra
coisa.

O mortal piscou lentamente e, em seguida, assentiu.

— Eu não sou casado.

Whoops.
— Uh, você tem namorada?

Ele acenou com a cabeça, os olhos grudados nos meus.

— Tudo bem... então vá e beije-a e diga-lhe... que você a ama? — Deuses,


eu era uma merda com compulsões. — De qualquer forma, vá. Não há nada
acontecendo aqui. Se mova.

À medida em que o carro passou, eu me virei para encontrar Solos


boquiaberto.

— O quê? — Eu exigi.

— Você acabou de fazer o truque da mente Jedi nele?

Um pequeno sorriso puxou meus lábios.

— Eu sempre quis dizer isso.

— Queridos deuses — ele murmurou, se virando.

Dando de ombros, eu o segui e passei por Aiden. Ele estava parando em


cada corpo, colocando dois dedos sobre as formas fixas. Vi faíscas voarem de
seus dedos e viajarem sobre os corpos com uma rapidez anormal. Chamas
violetas cobriam os caídos, e em poucos segundos nada restava além de
cinzas. O ar estava pesado com o cheiro de zimbro, sangue, carne queimada
e metal.

Dakota do Sul nunca tinha se sentido mais brutal.

Quando Aiden dirigiu-se para os dois Hummers, me virei e vi um corpo


perto da parte traseira do nosso carro. Engolindo o gosto amargo que crescia
na minha garganta, eu fui até o Sentinela e ajoelhei-me. Tão fraco quanto
parecia, eu não conseguia olhar para o rosto dele quando eu coloquei minha
mão sobre o ombro imóvel. Ele também tornou-se nada além de cinzas.

Com o coração pesado, eu fiquei parada.

— Sinto muito.

Aiden reapareceu, pegando a minha mão.

— Você está bem?


Eu balancei a cabeça.

— Você?

— Sim — Seu olhar mudou-se para o monte de cinzas e sua mão apertada.
— Nós precisamos ir.

Do outro lado do Hummer, dois Sentinelas estavam de joelhos diante de


Solos na terra e cascalho. Eu reconheci um deles como o cara que eu tinha
atirado para a árvore. Ambos estavam machucados e sangrando.

— Quem é o deus por trás disso? — Solos exigiu.

Um levantou a cabeça e cuspiu a boca cheia de sangue. O cara da árvore


riu.

— Eu disse algo engraçado? — Solos ajoelhou-se diante deles. — Eu não


penso assim. Vou perguntar mais uma vez. Quem é o deus por trás disso?

— Matem-nos agora, porque nós não vamos falar — O cara da árvore


levantou a cabeça e seu olhar pousou em mim. — Vocês não podem vencer
isto. Eles vão mudar o mundo, e se você ficar no caminho, eles vão te
destruir.

Dei um passo para frente.

— Por ‘eles’ você quer dizer Seth, Lucian, e esse deus? Você percebe que
não há um único deles que se importe sobre os meio-sangues, certo?

O cara da árvore riu de novo, o som falhado.

— E você percebe que você não pode escapar dele, Apollyon?

Raiva me queimou.

— Eu acho que eu estou fazendo um trabalho muito bom em ficar longe


de Seth, seu idiota.

O outro Sentinela arqueou uma sobrancelha.

— Você acha que nós estamos falando sobre o Primeiro? — Ele riu. —
Você não tem ideia no que você já entrou, menina. Isso é maior do que você
e o Primeiro, maior do que um simples assento no Conselho.
Um arrepio disparou em linha reta na minha espinha e eu dei um passo
involuntário para trás.

— O que é?

Nenhum dos homens respondeu. Eles não disseram nada quando Solos
questionou sobre os planos de Lucian. Marcus entrou em cena então, mas
quando ele usou compulsão sobre eles, eles permaneceram em silêncio.

— Eles não vão falar — disse Marcus, mãos apertadas em seus lados. —
Ou é uma compulsão mais forte do que um puro pode fazer, ou é lealdade
cega. De qualquer maneira, estamos perdendo um tempo precioso e nos
arriscando demais.

— Nós não podemos deixá-los ir — Aiden disse calmamente.

Meu coração afundou um pouco, apesar do fato de que, se tivesse a


chance, estes dois homens cortariam as gargantas das pessoas ao meu lado.
Eles eram jovens, talvez alguns anos mais velhos do que eu, jovens demais
para estar aqui, prestes a morrer. Mas Aiden estava certo, não poderíamos
deixá-los ir.

Marcus rapidamente voltou com Deacon e os outros, levando-os para trás


do Hummer danificado que Solos estava dirigindo. Ainda era dirigível, mas
chamaria a atenção, se estivéssemos nessa coisa durante o dia.

Colocando a mão no braço de Aiden, eu girei para ele.

— Eu posso...

— Não — Ele usou aquela voz que eu viria a odiar e respeitar – o tom sem
argumento. — Você não vai fazer isso.

Laadan, que tinha ficado de fora da briga com Deacon, virou-se.

Eu queria fazer, porque uma execução era a última coisa que eu queria
ver, mas quando Aiden conseguiu se libertar do meu lado e foi em direção a
eles, eu me forcei a ficar parada. Se ele tivesse que fazer isso, então eu tinha
que testemunhar isso. Era o máximo que eu podia fazer, pelo menos.

Aiden se moveu muito rápido. As mortes foram limpas e rápidas. Eles não
sentiram. Seus corpos caíram para frente, separados de suas cabeças.
Não importa o quão rápido e indolor Aiden tinha feito, eu sabia que ele
iria sentir isso nos cantos escuros de sua alma por um longo tempo.
Trinta e um

Nosso Hummer era o carro de partida – o único legal. Ou pelo menos isso
é o que eu acreditava. Entre Luke e Deacon, a viagem de dez horas da
floresta para a Dakota do Sul não iria se transformar em algo tão ruim
assim. Pobre Marcus parecia que ele queria por fitas adesivas para fechar as
bocas dos dois rapazes após seu resumo de duas horas ininterruptas da
última temporada de Supernatural. Eu não estava reclamando. Em seguida,
Luke mudou para este novo programa sobre tronos e dragões, que tentou
explicar a Aiden. Considerando que Aiden era um fã de programas de TV em
preto-e-branco, Luke não estava indo muito longe.

Marcus parecia que tinha uma dor de cabeça, o que refletia como eu me
sentia. Não tinha nada a ver com a conversa dos meninos ou com os
ridículos – mas hilários – jogos que eles insistiam em jogar no carro. E eu
tinha certeza de que, se Deacon se inclinasse entre os assentos e Aiden
desse-lhe um soco no braço mais uma vez quando ele visse um Fusca, Aiden
encostaria o carro e iria estrangulá-lo.

Eu também tinha certeza de que Marcus iria jogar Deacon para fora. O
homem devia ter uma contusão ímpia em sua perna do último soco que
Deacon tinha lhe dado.

Mas, após quatro horas, a agitação tornou-se estável. Minutos depois de


pararmos de correr o risco de virar o carro, eu tentei descansar um pouco.
Não era como se o cenário tivesse muito para se olhar. Muitos campos.
Muitas colinas. Muitas árvores. Tédio coçava a minha pele enquanto eu
olhava para as proteções, desenhadas em sangue de Titã em todo o carro, que
impediam os deuses de me sentir. Mas o fato de que eu estava presa dentro do
veículo para o futuro previsível não era a pior parte. O pulsar cada vez maior
nas têmporas disparou através do meu sistema nervoso.

Seth estava lá, perambulando, esperando por aquele momento onde ele
poderia aparecer e ter uma conversa. Parte de mim quase dava boas-vindas a
isso, porque seria algo para se fazer, mas era tão estúpido. Conversar com
Seth não iria ajudar em nada. Ele estava de um lado da barreira e eu estava
do outro lado.
Eu não queria pensar em tudo[V1] .

Virando no banco, meus olhos se encontraram com os do meu tio. Sorri


quando ele acenou para Deacon. O puro finalmente tinha desmaiado, com o
rosto colado contra a janela. Ao lado dele, Luke estava olhando para fora da
janela, sua mandíbula apertada.

Não querendo acordar a besta falante, eu não disse nada e me virei.


Minha bota deslizou sobre a lâmina de foice apoiada no chão. Estávamos tão
abastecidos e bem armados como tínhamos estado quando fomos para o
Kansas.

Eu me ajeitei no banco, cuidadosamente esticando minhas pernas


quando o que eu realmente queria era me esticar toda. Com o canto do meu
olho, eu vi o sorriso divertido de Aiden. Eu fiz uma careta para ele e ele riu
baixinho.

O tempo passou devagar até rastejar. Toda vez que eu olhava para o
relógio no painel eu teria jurado que duas horas haviam se passado, mas
eram apenas vinte minutos depois. Quando atingiu o ponto médio, Solos
chamou por Aiden. Eles precisavam abastecer.

Aiden não estava feliz sobre isso.

— Estamos muito perto de Minneapolis.

Em outras palavras, estávamos muito perto de uma área densamente


povoada. Quase todas as grandes cidades dos EUA tinham comunidades de
puros na periferia. Onde havia puros, havia daimons. E isso também
significava que haveria sentinelas e guardas – aqueles que poderiam estar
trabalhando com Lucian.

Mas nós não tínhamos outra escolha. Ambos os veículos estavam ficando
sem gasolina, e também era parar agora ou ficar sem gasolina no meio do
nada e ser comido por coiotes selvagens e ursos.

Entramos numa área de viagens de tamanho decente e eu imediatamente


estendi a mão para a maçaneta da porta.

— Eu prefiro que você fique no carro — disse Aiden, tirando o cinto.

Eu fiz uma careta.


— Por quê? Eu tenho o talismã.

— Eu sei — Ele atirou-me um olhar. — Mas conhecendo a nossa sorte,


alguém vai reconhecê-la.

— Mas eu tenho que usar o banheiro.

— Se segure — Luke disse, abrindo a porta do carro. — Eu vou trazer algo


para fazer um lanche, e água – muita água.

Eu olhei para ele.

— Isso é tão errado.

Todos menos eu correram do Hummer e eu me joguei contra o assento,


cruzando meus braços. Eu sabia que nós não precisamos de outro deus nos
arrasando no meio do posto de gasolina, mas porra...

Aiden foi em direção ao outro Hummer, enquanto Marcus abastecia com


gasolina. Lá estava eu, a enlouquecida Apollyon, e eu não conseguia nem ir
lá dentro para pegar um saco de beef jerky sozinha. Nossa.

Alguns momentos depois, Aiden veio para o meu lado do carro. Eu pensei
em deixar a janela fechada, mas eu a abri. Ele se inclinou, descansando em
seus braços.

— Hey — ele disse, sorrindo.

Eu sabia que estava fazendo beicinho, mas eu não podia sentir o meu
bumbum.

— Olivia e Lea estão checando o banheiro. Parece que é do lado de fora e


pela parte de trás.

— Oh, graças aos deuses — Eu caí no meu lugar.

Seu sorriso se espalhou em um lado.

— Eu vou garantir que Luke pegue para você algo diferente do que a
água.

— Você é o melhor — Eu fui para frente e o beijei rapidamente. — Eu falo


sério.
Quando passou por nós, os olhos de Marcus se estreitaram.

— Eu sinto como se estivesse tendo a necessidade de separar os dois.

As bochechas de Aiden coraram quando ele se afastou e limpou a


garganta.

Marcus parou ao lado dele, cruzando os braços.

— Especialmente as coisas para dormir. E eu não sou ingênuo o


suficiente para...

— Whoa! — Eu o cortei. — Isso não é um tema que eu estou disposta a


aprofundar.

Marcus me deu um olhar brando.

— Você é minha sobrinha e eu sou o seu guardião.

— Eu tenho dezoito anos.

— E você ainda é muito...

— Olivia! Pausa para o banheiro! — Eu abri a porta, quase batendo em


Marcus. Atirei a meu tio um rápido sorriso, eu corri em volta dele.

Aiden agarrou meu braço.

— Tenha cuidado.

— Claro. Exceto por morrer de irritação e querendo vomitar, é só um


banheiro público.

Ele ainda parecia querer me acompanhar até lá, mas Marcus também
estava de olho em Aiden como se quisesse socá-lo novamente. Aiden deixou-
me ir e me juntei às meninas na calçada.

— O que está acontecendo lá? — Perguntou Olivia.

Olhei por cima do meu ombro. A boca de Marcus estava voando a mil por
hora, e Aiden estava ali, rígido e silencioso. Eu fiz uma careta.

— Você não quer saber.


— Provavelmente tem a ver com o fato de que você e Aiden estão tendo
relações sexuais — Lea anunciou, cruzando os braços.

Meu queixo caiu.

— Legal — Olivia golpeou-lhe um braço. — Um jeito de jogar isso para


fora.

Lea deu de ombros.

— Ei, é o que é. Ele é um gato. Eu estaria fazendo com ele a cada cinco
segundos.

— Tudo bem. Obrigada por compartilhar.

Olivia olhou para o outro lado.

— Falando de sexo como um coelho excitado, você já ouviu falar de


Jackson? Ele não estava no Covenant quando... — Ela olhou ao redor e
baixou a voz. — Ele não estava lá quando Poseidon enlouqueceu.

— Não. Meu celular morreu e eu não tenho um carregador — Seus olhos


se estreitaram com o céu nublado. — Eu não sei o que ele poderia estar
fazendo. Nós não estávamos realmente tão próximos quanto vocês pensam.
Pelo menos, não nos falamos muito.

Olivia bufou.

— Eu não acho que ele está com Seth e Lucian — eu disse quando
começamos a dobrar a esquina do edifício de cimento.

— Por quê? — Olivia puxou um cacho de volta.

— Lembra quando Jackson teve o rosto reorganizado? — Nós tínhamos


parado do lado de fora da porta do banheiro, e eu já podia sentir o cheiro do
medo. As meninas assentiram. — Tenho certeza de que Seth fez isso com ele.

— Caramba — Olivia murmurou enquanto deslizava a chave na porta. —


Por causa do que Jackson fez com você na sala de aula?

Eu balancei a cabeça. Jackson tinha me batido muito, enfiando a bota


na minha cara – eu tinha uma pequena cicatriz para provar isso – e eu tinha
certeza de que o instrutor Romvi tinha o incitado a isso. Quando fomos para
o banheiro e procurei por uma cabine um pouco decente, eu me perguntava
se Romvi ainda estava vivo.

Romvi havia desaparecido após Linard ter dado o ultimato do Ministro-


chefe Telly, e Seth tinha os membros da Ordem caçados, pois eles eram a
única ameaça real para nós. Tão terrível quanto parecia, se tivesse
encontrado seu fim, eu não ficaria muito arrasada. Romvi tinha um fim para
mim desde o primeiro dia.

A viagem para o banheiro acabou sendo monótona, já que eu não


considerava o risco de pegar a mão, o pé, e a febre aftosa uma ocorrência.

De volta ao Hummer, com meu colo cheio de Skittles e outras guloseimas


sortidas, fiquei surpresa pelo fato da Medusa não ter aparecido no banheiro e
tentado me comer. Talvez essa viagem não fosse tão ruim.

Eu olhei para trás, passando onde Deacon e Luke estavam


compartilhando nachos. Os braços de Marcus estavam espalhados ao longo
do encosto no último lugar. Seu olhar estava focado na parte de trás da
cabeça de Aiden como se ele pudesse de alguma forma fazer furos através
dele.

Tudo bem. Talvez essa viagem não fosse tão ruim para mim. Para Aiden
por outro lado...

Lançando-me para frente, eu peguei o olhar de Aiden e ofereci um sorriso


simpático.

— Skittles?

— Por favor.

Eu depositei alguns na palma da mão aberta, em seguida escolhi os


verdes.

Aiden sorriu para mim.

— Você sabe que eu não gosto dos verdes?

Dando de ombros, eu os coloquei na boca.

— As poucas vezes que eu vi você comê-los, você deixa os verdes para


trás.
Deacon colocou a cabeça entre os nossos lugares.

— Esse é o amor verdadeiro.

— É isso — O olhar de Aiden voltou para a estrada.

Eu corei como uma pequena colegial e foquei nos restantes doces até
Deacon se voltar para o seu lugar. Eu entreguei todos os vermelhos para
Aiden.

Algumas horas depois de termos atingido o apocalíptico trânsito fora de


Sioux Falls, os céus abertos tinham escurecido e a noite estava apenas a
alguns minutos. Nós se formaram no meu estômago quando eu pensei na
distância entre mim e a Universidade se evaporando. Estávamos ainda a
cerca de quatro horas de distância, mas isso não era nada depois de estar no
carro por tanto tempo[V2] .

A Universidade estava aninhada no fundo de Black Hills na Dakota do


Sul. Não é perto de Monte Rushmore, mas na parte conhecida como Colinas
do Norte. Era um deserto fortemente protegido, só alcançável em veículos
como o que estávamos dentro. As pessoas tinham que saber o que eles
estavam procurando até para ver a entrada da escola.

Eu nunca tinha visto a Universidade em pessoa, mas eu sabia que parecia


algo saído da Grécia. Como todos os Covenants, os mortais acreditavam que
a escola era uma parte de um sistema de ensino de elite, apenas para
convidados. Até mesmo eu estava animada para ver a escola, os meus nervos
cantarolavam por um motivo diferente.

Meu pai poderia estar lá – ou ele poderia estar a caminho.

Esperança subiu no meu peito e eu me senti tonta por alguns segundos.


Eu não sei o que eu faria se eu o visse – provavelmente algo como atacar e
combater o homem, e eu esperava que eu não berrasse como um bebê e me
envergonhasse.

Eu sabia que não deveria ter minhas esperanças. Meu pai pode não estar
lá. Ele nunca poderia aparecer lá. Ele poderia ser morto.

Meu estômago despencou, e por um momento eu pensei que ia vomitar.

A questão era que – e eu ficava tentando dizer a mim mesma que era – eu
não sabia. E não havia razão para ficar excitada de qualquer maneira. E eu
tinha coisas mais importantes para me concentrar, por exemplo, como
diabos eu iria convencer um bando de sentinelas e guardas a arriscarem suas
vidas até a morte, guerreando contra Seth e um deus.

Aiden se mexeu em seu lugar, e o olhar em seu rosto enquanto ele ouvia
com atenção não era bom.

— O quê? — Eu perguntei, sentindo meu estômago cair novamente. Eu


me pergunte se eu tinha uma úlcera... ou se isso era mesmo possível.

— Entendi — disse ele ao telefone, e depois o fechou. — Nós estamos


sendo seguidos.

Eu girei no meu lugar, assim como Marcus e Luke. Os faróis do Hummer


de Solos estavam bem atrás de nós. Eu olhava. Vários metros atrás havia
outro conjunto de faróis. Eu não era uma especialista nessas coisas, mas
parecia muito com outro Hummer.

Sentinelas e guardas adoravam dirigir Hummers. Quanto maior, melhor e


tal – provavelmente se disfarçando de outra coisa. Mortais dirigiam Hummers
também, mas cada instinto me dizia que era do Covenant e não eram
amistosos.

Porcaria.

— Quanto tempo? — perguntei.

— Desde que passamos por Sioux Falls — Aiden respondeu, os olhos


passando rapidamente para o espelho retrovisor.

— Há uma saída chegando – vamos pegá-la. Precisamos sair da estrada


principal — Marcus xingou quando ele se inclinou para trás, puxando uma
Glock. — A boa notícia é que a estrada ficará livre dos mortais. A má notícia
é que as estradas vão ficar mais claras.

Não haveria ninguém por perto para qualquer lado para se preocupar com
a exposição, se é que eles ainda se importavam com isso.

— Diga a Solos para seguir — Marcus disse, — e para chegar perto de nós.

Enquanto Aiden retransmitia a mensagem para Solos, eu mantive os


meus olhos colados no trecho da rodovia atrás de nós quando chegamos na
rampa e voamos na escuridão, na estrada de volta. Então eu vi o que Aiden
não tinha dito, e que Marcus deve ter percebido uma vez que Solos tinha
mudado para a outra pista.

Não era só um Hummer; eram dois, e eu tinha certeza de que ambos


estavam lotados.

Merda dupla.

Luke estava se esforçando para dar uma olhada melhor.

— Nós não podemos deixá-los reportarem, pessoal. Se já não tiverem


reportado. Estamos muito perto da universidade.

— Então, você realmente acha que eles são – de Lucian? — Perguntou


Deacon, segurando a parte de trás do meu assento.

Aiden assentiu.

— Tá tudo certo, apesar de tudo. Pode deixar.

A força em suas palavras – a determinação para que todos passassem por


isso – era a cara dele. Não importava o que fosse, ele a mantinha. Ele pode
vacilar um passo ou dois, mas ele resistia aos golpes e ele nunca desistia.
Não de mim. Não de seu irmão. E nunca da vida. Deuses, não era de admirar
que eu amasse esse homem.

Enquanto eu olhava para ele e via a determinação de aço nas linhas de


seu rosto marcante, eu percebi uma coisa. Na verdade, foi como ser
atropelada por um caminhão de sete toneladas.

Eu precisava colocar minhas calças de garota grande – pra valer.

Deacon tinha razão. Uma parte de mim tinha aceitado que minha morte
seria inevitável desde que eu tinha saído do Submundo, que meu destino final
seria encontrar uma maneira de vencer. Eu – eu tinha me sentido assim –
acredita nisso. Eu? A menina que praticamente disse FODA-SE para tudo,
especialmente para o Destino.

Caramba...

Meio surpresa, eu olhei para a frente do veículo. Eu era melhor do que


isto – melhor do que chafurdar na minha própria piedade. E era muito
melhor do que deixar o Destino me controlar. Eu não era fraca. Eu nunca
tinha sido uma desistente antes. Eu nasci para ser a guerreira definitiva.
Então, se alguém poderia sair dessa situação ilesa, esta deveria ser eu.

Seria eu.

Porque eu era uma lutadora. Porque eu não desistia. Porque eu era forte.

Quando a extremidade dianteira do Hummer de Solos chegou na metade


do nosso caminho, houve um som de estalo distinto e seu carro de repente
virou para a esquerda.

— Caramba — Deacon engasgou. — Estão atirando neles...

A nossa janela traseira explodiu. O vidro quebrou e choveu através do


carro. Eu girei no meu assento, percebendo que Luke tinha Deacon preso
contra o assento. Eu não vi o meu tio.

— Marcus?

— Eu estou bem — ele gritou.

— Alex, fique abaixada — Aiden segurou firme no volante com uma mão
enquanto ele estendia a outra mão para mim, agarrando o meu braço e me
puxando para baixo.

Marcus apareceu e devolveu o fogo em uma rápida sucessão. Pneus


cantaram, o Hummer ao nosso lado virou de novo, e depois voou à frente em
um rugido. Eu não podia acreditar que eles realmente estavam atirando em
nós. E então isto me surpreendeu. Eles não se preocupavam com qualquer
outra pessoa no veículo. Eles sabiam que eu iria sobreviver à batida de uma
maneira ou de outra.

Eles iriam continuar a atirar até que nós falhássemos.

Outro estalo, e a janela ao lado de Aiden explodiu. Cacos de vidro voaram


para os lados, sendo atirados em Aiden e eu. Ele fez uma careta, e eu já
estava muito sobrecarregada sobre isso.

— Pare o carro — eu disse.

— O quê? — A mão de Aiden pressionou minhas costas enquanto ele


acelerava, colocando alguma distância entre nós e o veículo cheio de
psicopatas.

Lutei para me levantar.

— Pare o carro!

Ele olhou para mim, e deuses sabem o que ele viu nos meus olhos, mas
ele xingou baixinho e desviou para o acostamento. Os outros veículos
dispararam atrás de nós, o som de seus pneus guinchando no asfalto.

Antes que Aiden pudesse me parar, eu abri a porta. Outro palavrão


explodiu dele e ouvi Marcus gritar:

— Que diabos?

Eu saí do Hummer, me mantendo abaixada. Havia um punhal preso à


minha coxa, mas não era isso que eu precisava.

Aiden deslizou para fora do lado do passageiro, estreitou os olhos em


mim. Ele tinha uma arma na mão.

— O que você está fazendo?

— Boa pergunta — Luke empurrou Deacon para o aterro. — Parar não


parece ser a coisa certa a se fazer.

— Eu não posso acreditar que eles realmente estão atirando em nós. Nós?
— Deacon começou a se levantar. — O que está errado...?

— Fiquem abaixados! — Aiden virou, apontando para Luke. — Mantenha-


o vivo ou...

— Eu sei — Luke puxou Deacon para baixo e para trás dele. — Nada vai
acontecer com ele.

Mais à frente, Solos tinha estacionado e todos eles se jogaram para fora
do carro, mantendo-se para o lado do passageiro. Eu soltei um suspiro de
alívio e, em seguida, me lancei em direção à frente do Hummer.

— Alex — Aiden me seguiu agachado. — O que são...?

Os dois veículos tinham se virado e estavam quase sobre nós. Realmente


não havia tempo para pensar sobre o que eu estava fazendo. Usando a
velocidade que todos os meio-sangues têm, e a potência extra do Apollyon, eu
corri ao redor do para-choque e na direção da pista.

Aiden soltou uma palavrão.

Eu estava banhada nas luzes dos faróis quando eu levantei a minha mão,
chamando o elemento ar. Era como destravar uma porta dentro de mim.
Poder correu de dentro, em seguida, espalhando-se, deslizando sobre a minha
pele. O ar se jogou rodovia abaixo, soprando por mim, mais rápido e mais
forte do que um puro poderia exercer. Ventos com força de furacão se
chocaram com o primeiro Hummer.

Isso o deixou sobre duas rodas, os pneus girando no ar quando os faróis


perfuraram o céu noturno. O Hummer pairava há um segundo, e em seguida,
capotou o segundo veículo. Através do ar ele tombou algumas vezes – algo foi
arremessado de uma das janelas, talvez uma pessoa.

Cintos de segurança salvam vidas.

O primeiro Hummer caiu de cabeça pra baixo. Metal rangia e gemia, e


depois cedeu. A pessoa por trás girou para a direita para evitar uma colisão
direta. Faíscas de cor âmbar voaram.

As portas do segundo se abriram e eu contei seis sentinelas vestidos de


preto. Eles eram meio-sangues, jogando no lado errado do campo.

Uma carga depois, e eu o atirei nos olmos grossos que enchiam a estrada
com um movimento do meu pulso. Houve uma barulho com o impacto que
disse que essa ferramenta estaria fora de serviço por um tempo.

O segundo brandiu dois punhais do Covenant quando ele foi direto para
mim.

— Venha com a gente e vamos deixar seus amigos viverem.

Eu inclinei minha cabeça para o lado e sorri.

— Bem, não é muito cliché? Que tal isso – vire as costas e eu posso
deixá-lo viver.

Aparentemente, o Sentinela não entendia inglês, porque ele deu uma


guinada para mim. Dei um passo para o lado, me esticando e pegando seu
braço. Eu o torci para baixo quando eu trouxe o meu joelho para cima,
fazendo contato logo acima do cotovelo. Os ossos quebraram e o Sentinela
gritou. Balançando atrás dele, eu peguei o outro braço e o torci. Suas costas
curvaram e o punhal caiu no chão.

Marcus apareceu na nossa frente. Sem pestanejar, ele enfiou uma adaga
no peito do Sentinela que eu tinha deixado cair. O homem nem sequer fez
um som.

Eu o soltei, e seu corpo caiu na rua.

Meus olhos se encontraram com os do meu tio. Um segundo depois, ele


tinha a Glock levantada e apontada. Eu estava tão perto que eu vi a pequena
faísca quando o gatilho foi puxado. Ofegante, eu me virei.

A bala bateu no meio dos olhos de uma Sentinela.

— Nossa — eu disse, cambaleando para trás.

— Eles sabem que não podem matá-la — Marcus agarrou meu braço e me
empurrou de volta para o Hummer. — Mas eu acredito que pretendem levá-la,
não importa qual seja a sua condição.

— Eu estou começando a ver isso.

Solos e Aiden estavam lutando com dois Sentinelas. Olhando para trás, vi
que Olivia e Lea tinham mais dois encurralados. Minha atenção girou de
volta para o Hummer amassado.

Havia mestiços no carro, e como esperado, não estavam derrotados.


Outros seis estavam amontoados. Sentindo a descarga de adrenalina
enrolando firme na corda, eu me atirei à frente com Marcus logo atrás de
mim.

Alcancei um Sentinela, segurando o punhal na mão direita. Ele


mergulhou na minha direção, mas eu abaixei debaixo de seu braço, mais
rápido do que os olhos do mestiço poderiam acompanhar. Balançando ao
redor, eu o acertei nas costas com a minha bota e ele caiu sobre um joelho.
Algo dentro de mim foi desligado enquanto eu agarrava seu cabelo e puxava
a sua cabeça para trás. Estes não eram Sentinelas. Eles eram inimigos, como
os Daimons. Eu não conseguia pensar em nenhuma outra maneira. Eu
trouxe o punhal para baixo em uma morte limpa e rápida.
Ouvindo passos batendo atrás de mim, girei e me empurrei para o lado,
por pouco perdendo um punho direcionado para o rosto. Saltando no ar, eu
girei e dei um indecente chute do tipo Eu – espero – que – alguém – veja –
este – giro.

O sentinela caiu no chão, segurando o que era provavelmente uma


mandíbula quebrada. Lançando o punhal acima, eu andei para frente. Cara,
eu meio que sentia falta da luta com Apolo. Nós estaríamos mantendo
contagem...

Mãos agarraram meus ombros e me puxaram de volta. Eu bati na calçada


e deslizei. Dor explodiu ao longo de minha espinha e eu olhei para cima,
atordoada.

Um Sentinela de pele escura olhou para mim.

— Você poderia fazer isso... — Suas palavras foram sufocadas. Algo


molhado e quente pulverizou no ar. Seu corpo ficou em uma direção e sua
cabeça foi na outra.

Rolei de joelhos, apertando minha boca fechada contra a vontade de


vomitar.

Olivia deu um passo atrás, seu olhar passando rapidamente de mim para
a adaga.

— Isso... isso não era nada parecido com o que eles ensinam em sala de
aula.

Me levantando, eu balancei a minha cabeça. Era esta a primeira vez que


Olivia tinha lutado? Por sua primeira morte ser outro Sentinela ... Eu não
sabia o que dizer. E nós não tínhamos tempo para uma sessão de terapia.

O Mandíbula Quebrada estava de pé. Ele girou, a adaga arqueada para


baixo. Senti o silvo da lâmina afiada ao longo do meu estômago. O objeto
cortou, mas isso foi o mais perto que ele chegou.

Aiden apareceu atrás dele e agarrou os lados de sua cabeça. Houve uma
rápida torção, outro som se rastejando de volta e repetiu uma e outra vez
mais tarde, e em seguida, o Sentinela caiu.

Os olhos de Aiden encontraram os meus e eles eram da cor de aço.


— Mesmo que a exibição de poder seja muito atraente, não tente fugir do
trânsito nunca mais.

Comecei a responder, mas uma sombra deslizou por trás dele. Meu
coração parou.

— Aiden!

Antes que eu pudesse levantar a mão, ele virou-se como o vento, soltando
a adaga. Ela bateu no peito do guarda que se aproximava dele. Lançando-se
para frente, ele puxou a lâmina antes do guarda entrar em colapso, e em
seguida a jogou novamente, derrubando o outro guarda que tinha
encurralado Solos.

Droga. Aiden era um ninja foda.

Apenas alguns minutos se passaram e tínhamos tido sorte até agora, mas
a aproximação de faróis nos avisou que estávamos com falta de sorte.

— Olivia, pegue Lea e vão para o outro lado do carro.

Seu olhar caiu para o Sentinela caído mais uma vez e, em seguida, ela
balançou a cabeça, desviando o olhar. Ela agarrou o braço de Lea e puxou-a
para onde Luke e Deacon começaram a surgir a partir do aterro.

Um sedan parou atrás do Hummer amassado. Desembainhando a adaga,


eu corri até o carro no mesmo momento em que a janela do motorista rolou.
Um mortal de meia-idade examinou a cena com crescente horror.

— Oh, meu Deus — disse ele, segurando um telefone celular. — Eu posso


pedir ajuda – isto é um corpo?

Ajoelhei-me, obrigando o mortal a me olhar nos olhos.

— Não há nada para se ver aqui. Você não vai ver nada enquanto você
dirigir. Você vai voltar para casa e... beijar sua esposa ou qualquer outra
coisa.

O mortal piscou lentamente e, em seguida, assentiu.

— Eu não sou casado.

Whoops.
— Uh, você tem namorada?

Ele acenou com a cabeça, os olhos grudados nos meus.

— Tudo bem... então vá e beije-a e diga-lhe... que você a ama? — Deuses,


eu era uma merda com compulsões. — De qualquer forma, vá. Não há nada
acontecendo aqui. Se mova.

À medida em que o carro passou, eu me virei para encontrar Solos


boquiaberto.

— O quê? — Eu exigi.

— Você acabou de fazer o truque da mente Jedi nele?

Um pequeno sorriso puxou meus lábios.

— Eu sempre quis dizer isso.

— Queridos deuses — ele murmurou, se virando.

Dando de ombros, eu o segui e passei por Aiden. Ele estava parando em


cada corpo, colocando dois dedos sobre as formas fixas. Vi faíscas voarem de
seus dedos e viajarem sobre os corpos com uma rapidez anormal. Chamas
violetas cobriam os caídos, e em poucos segundos nada restava além de
cinzas. O ar estava pesado com o cheiro de zimbro, sangue, carne queimada
e metal.

Dakota do Sul nunca tinha se sentido mais brutal.

Quando Aiden dirigiu-se para os dois Hummers, me virei e vi um corpo


perto da parte traseira do nosso carro. Engolindo o gosto amargo que crescia
na minha garganta, eu fui até o Sentinela e ajoelhei-me. Tão fraco quanto
parecia, eu não conseguia olhar para o rosto dele quando eu coloquei minha
mão sobre o ombro imóvel. Ele também tornou-se nada além de cinzas.

Com o coração pesado, eu fiquei parada.

— Sinto muito.

Aiden reapareceu, pegando a minha mão.

— Você está bem?


Eu balancei a cabeça.

— Você?

— Sim — Seu olhar mudou-se para o monte de cinzas e sua mão apertada.
— Nós precisamos ir.

Do outro lado do Hummer, dois Sentinelas estavam de joelhos diante de


Solos na terra e cascalho. Eu reconheci um deles como o cara que eu tinha
atirado para a árvore. Ambos estavam machucados e sangrando.

— Quem é o deus por trás disso? — Solos exigiu.

Um levantou a cabeça e cuspiu a boca cheia de sangue. O cara da árvore


riu.

— Eu disse algo engraçado? — Solos ajoelhou-se diante deles. — Eu não


penso assim. Vou perguntar mais uma vez. Quem é o deus por trás disso?

— Matem-nos agora, porque nós não vamos falar — O cara da árvore


levantou a cabeça e seu olhar pousou em mim. — Vocês não podem vencer
isto. Eles vão mudar o mundo, e se você ficar no caminho, eles vão te
destruir.

Dei um passo para frente.

— Por ‘eles’ você quer dizer Seth, Lucian, e esse deus? Você percebe que
não há um único deles que se importe sobre os meio-sangues, certo?

O cara da árvore riu de novo, o som falhado.

— E você percebe que você não pode escapar dele, Apollyon?

Raiva me queimou.

— Eu acho que eu estou fazendo um trabalho muito bom em ficar longe


de Seth, seu idiota.

O outro Sentinela arqueou uma sobrancelha.

— Você acha que nós estamos falando sobre o Primeiro? — Ele riu. —
Você não tem ideia no que você já entrou, menina. Isso é maior do que você
e o Primeiro, maior do que um simples assento no Conselho.
Um arrepio disparou em linha reta na minha espinha e eu dei um passo
involuntário para trás.

— O que é?

Nenhum dos homens respondeu. Eles não disseram nada quando Solos
questionou sobre os planos de Lucian. Marcus entrou em cena então, mas
quando ele usou compulsão sobre eles, eles permaneceram em silêncio.

— Eles não vão falar — disse Marcus, mãos apertadas em seus lados. —
Ou é uma compulsão mais forte do que um puro pode fazer, ou é lealdade
cega. De qualquer maneira, estamos perdendo um tempo precioso e nos
arriscando demais.

— Nós não podemos deixá-los ir — Aiden disse calmamente.

Meu coração afundou um pouco, apesar do fato de que, se tivesse a


chance, estes dois homens cortariam as gargantas das pessoas ao meu lado.
Eles eram jovens, talvez alguns anos mais velhos do que eu, jovens demais
para estar aqui, prestes a morrer. Mas Aiden estava certo, não poderíamos
deixá-los ir.

Marcus rapidamente voltou com Deacon e os outros, levando-os para trás


do Hummer danificado que Solos estava dirigindo. Ainda era dirigível, mas
chamaria a atenção, se estivéssemos nessa coisa durante o dia.

Colocando a mão no braço de Aiden, eu girei para ele.

— Eu posso...

— Não — Ele usou aquela voz que eu viria a odiar e respeitar – o tom sem
argumento. — Você não vai fazer isso.

Laadan, que tinha ficado de fora da briga com Deacon, virou-se.

Eu queria fazer, porque uma execução era a última coisa que eu queria
ver, mas quando Aiden conseguiu se libertar do meu lado e foi em direção a
eles, eu me forcei a ficar parada. Se ele tivesse que fazer isso, então eu tinha
que testemunhar isso. Era o máximo que eu podia fazer, pelo menos.

Aiden se moveu muito rápido. As mortes foram limpas e rápidas. Eles não
sentiram. Seus corpos caíram para frente, separados de suas cabeças.
Não importa o quão rápido e indolor Aiden tinha feito, eu sabia que ele
iria sentir isso nos cantos escuros de sua alma por um longo tempo.
Trinta e dois

Nós estávamos correndo, correndo para longe.


Fogo ainda caía, espirrando da terra, sacudindo o chão. Era um caos
conforme rastejávamos sobre as pequenas colinas, batendo no chão cada vez
que o céu se iluminava e outra saraivada de fogo enchia o ar.

E onde diabos estava Apolo-que-surgia-quando-você-menos-esperava


quando precisávamos dele? Claro, ele podia aparecer do nada quando eu
estava prestes a ter algum tempo dando uns beijos em Aiden, mas oh não,
quando nós realmente precisávamos dele, ele estava longe de ser
encontrado.

Comecei a me erguer, mas Aiden me segurou.

— Eu tenho que encontrar Marcus! E Olivia! Laadan…

— Não — Seu aperto reforçou. — Você não vai correr para o meio disto!

No chão ao meu lado, Luke gemeu.

— Eu acho que... meu braço está pegando fogo.

— O quê? — Rolei na direção dele, agarrando a parte de trás de sua


camisa, ciente de Deacon tentando passar rastejando por seu irmão.
Lançando-o de costas, me encolhi quando outra explosão atingiu perto
demais. — Deuses…

Seu braço direito estava um tom não natural, brilhante de vermelho do


cotovelo até o pulso. Remendos já tinham começado a borbulhar. Ele
ofereceu um sorriso vacilante.

— Bem, eu estava querendo um bronzeado.

Eu o encarei, e então Deacon disparou em torno de nós, agarrando a


frente da camisa de Luke. Antes que o mestiço de cabelos bronze pudesse
pronunciar uma palavra, Deacon plantou um beijo nele. Caí de volta ao meu
lado, respirando pesadamente.

Em seguida, Deacon levantou a cabeça, olhos arregalados.

— Nunca mais me assuste assim de novo. Tá bom?

Luke assentiu lentamente.

— O que há com os irmãos St. Delphi e sua atração por mestiços? —


Solos grunhiu, batendo na colina perto de nós. Laadan estava com ele, seu
cabelo caindo solto de seu arrumado coque chignon, calças sujas e
chamuscadas. — Não me interpretem mal — ele continuou. — Sendo um
mestiço e tudo, apoio totalmente amor igual, direitos iguais, abaixo a Ordem
da Raça e blá, blá, blá.

— Nós só temos bom gosto — Aiden respondeu, enquanto olhava por cima
do ombro para o Sentinela meio-sangue. — Ao contrário de alguns…

Solos bufou.

— Você sabe onde Marcus e as garotas estão? — Perguntei, de olho no


céu calmo-por-enquanto. — Você os viu?

Ele assentiu.

— Eles estão do outro lado da estrada, em uma vala. Eles estão bem —
Solos deu uma olhada para Laadan. — Ela salvou meu bumbum vermelho
rosado, sabe? Uma bola de fogo estava indo direto para minha cabeça, e ela
só a arremessou para longe com ar.

Laadan balançou a cabeça.

— Não foi nada.

— Foi alguma coisa…

Um berro profundo quebrou o ar, como um coro de gritos de guerra. Um


som que eu nunca tinha ouvido antes. Não era humano; não era animal, mas
uma torcida e revoltante mistura de ambos. De repente, tornou-se tudo muito
óbvio o que estava vindo.

Autômatos de Hefesto.
Não fazia sentido. Eles deveriam estar protegendo os Covenants. Eles
tinham nos julgado uma ameaça? Bem, obviamente, já que estavam
tentando nos transformar em criaturas chamuscadas. Mas aquelas pessoas
nos carros… De jeito nenhum eles iriam atacar primeiro e perguntar depois.
Derrotava todo o propósito de tê-los aqui e mover os membros do Conselho
para a Universidade a menos que…

Olhei para Aiden.

— O deus… é Hefesto?

Aiden abriu a boca, mas o chão tremeu sob o peso da tempestade se


aproximando. Sobre a elevação da colina, a não mais do que alguns metros
de distância, sombras altas e imponentes saíram marchando de trás da fileira
de árvores. Quando pisaram na fatia de luar, eu suguei uma respiração
estridente.

Santo bumbum daimon…

Suas coxas grossas como tronco de árvore e grandes cascos eram feitos
de titânio. Cabelo escuro e emaranhado cobria seus peitos largos e braços
musculosos. Cada cabeça era a de um touro – dois chifres e um focinho longo
e chato que descia para uma boca cheia de dentes e mandíbulas fortes.

— Queridos deuses — ouvi Laadan sussurrar.

Havia mais de uma dúzia deles formando uma linha inquebrável entre
nós e a Universidade, e eu duvidava que eles estivessem agindo como vigias
como eles deveriam estar.

Um dos maiores autômatos abriu a boca e bufou ruidosamente.

— Aposto que seu hálito fede — resmunguei.

Deacon assentiu.

— Sem dúvida.

Então ele abriu a boca mais uma vez e uma corrente de fogo brotou. Uma
bola se formou, indo direto para a vala do outro lado da estrada. As garotas
se espalharam pela colina.

O primeiro tiro veio de Solos, dirigido às monstruosidades. Em seguida,


Marcus estava de pé e assim também estava Aiden, suas armas em punho.
Balas de titânio rasgaram o ar, batendo nos autômatos, mas fazendo pouco
para detê-los.

Fogo jorrou em direção ao nosso grupo e nos separamos. Minha mão


estava no gatilho, sistemicamente apertando para qualquer coisa que se
parecesse com uma versão maluca de um minotauro. E eles devolveram fogo
com… uh, fogo.

Chamas se espalharam pelo chão e eu me lancei ao redor da labareda. Os


autômatos correram na nossa direção, cuspindo fogo, depois lutando.

O primeiro alcançou Marcus, atingindo-o com o lado largo de seu braço


musculoso. Marcus voou para trás vários metros, pousando em um monte
gemendo. Outro estava na minha frente e eu mergulhei sob seu braço voador.
Surgindo de baixo, eu nivelei a arma na parte de trás da cabeça do autômato
e soltei. Sangue e sangue coagulado de cor prateada espirraram nos arbustos
baixos enquanto o autômato caía e, em seguida, virava pó.

Bem, essa era uma maneira de matá-los. Mais ou menos como zumbis…

Me virei bruscamente, percebendo que as adagas eram absolutamente


imprestáveis e as Glocks eram apenas úteis se fôssemos capazes de nos
esgueirar por trás de um. Coração batendo forte, bati no chão conforme uma
outra bola de fogo disparava diretamente para mim. Porcaria. Isto era ruim –
mais do que ruim. Este era um pesadelo ganhando vida. Horrorizada até o
núcleo, congelei por um instante no chão seco, queimado. Pedras minúsculas
cutucavam minha barriga e coxas. Curiosamente, eu sentia cada uma como
se fosse a picada de uma faca quente.

Tudo desacelerou e o ar parou nos meus pulmões.

Marcus estava de volta de pé e lutava costas-com-costas com Lea, se


lançando para a frente com suas lâminas de foices, arrancando os braços de
um autômato. Mas a coisa continuava vindo para eles. Solos estava tentando
manter Laadan fora da linha de fogo. Fuligem cobria as bochechas coradas
de Aiden quanto distribuía uma rajada de fogo para as criaturas. Deacon na
realidade tinha uma arma em sua mão enquanto permanecia perto de Luke.
Olivia estava encurralada em algumas árvores.

Em uma corrida, recordei a premonição que tive mais cedo. Eles iam
morrer, todos eles. Como aqueles corpos bem-passados nos carros, eles
seriam grelhados e esse seria o fim deles.

Algo se rompeu dentro de mim – algo primitivo e absoluto. Poder correu


através de mim e minha pele formigou com o aparecimento das marcas. O
campo de batalha cheio de sombras de repente foi tingido com tons de
âmbar. Dei boas-vindas ao fluxo quase-estrangeiro de energia, mesmo que
fosse como veneno em minhas veias. Meu cérebro desligou e eu já não era
mais Alex.

Eu era o Apollyon. Eu era o início e o fim.

Mechas soltas de cabelo começaram a subir acima da minha cabeça, e eu


podia jurar que por um momento o tempo realmente parou enquanto eu me
levantava. A lâmina de foice e adaga caíram dos meus dedos, e então eu
enrolei minhas mãos em punhos.

Oh, ia ser como Donkey Kong.

Voei sobre a terra estéril na direção de Olivia enquanto ela tentava


afastar a coisa. Mergulhei sob o autômato, brotando entre ele e Olivia,
batendo meu pé em sua barriga peluda. Ele desceu em um joelho,
chacoalhando as árvores próximas.

Poder absoluto – implacável e duro, puro como era mortal – percorreu a


minha pele. Recuei e me endireitei, convocando o quinto e último elemento.
Luz azul intensa irrompeu da minha palma.

Akasha rasgou de mim, arqueando através do ar como um raio, direto em


seu alvo e impressionantemente real. O céu crepitou e aqueceu. Um segundo,
o autômato estava de joelho, e no próximo ele não passava de uma pilha de
pó cintilante.

— Bons deuses — veio o sussurro rouco de Olivia.

Outro autômato tomou o lugar do caído, balançando uma mão de metal


que tilintava e clicava. Fogo faiscou de sua boca aberta. Girei, pegando o
lado largo de seu braço e torcendo. O berro rouco de dor foi perdido no
choque de metal, a trovoada de balas encontrando um outro autômato.

Ele levantou seu rosto de touro e tentou me morder com mandíbulas


massivas.
— Por favor — coloquei a mão em sua testa massiva.

A luz azul percorreu a cabeça e para baixo do corpo, iluminando o crânio


metálico e estrutura óssea. Por um momento, ele ficou como uma belo raio-x
ou uma água-viva – uma água-viva realmente perturbadora – e, em seguida,
luz cobalto irradiou de seus olhos e boca aberta. Ele implodiu – desabou
sobre si mesmo, se transformando em nada além de pó.

E então a merda realmente bateu no ventilador.

Os autômatos – cada última das coisas touro bizarras – se viraram contra


mim. Eles se moveram rapidamente, pernas de metal chacoalhando e
tinindo. Fogo foi expelido de suas bocas como a versão pobre de um dragão.
Eles vieram de todas as direções, mísseis Apollyon-guiados com “Matar Alex”
estampado por toda parte neles.

Fogo veio deles, cegante e intenso. Nada existia fora das chamas.
Nenhum som. Nenhuma visão. Meu mundo estava vermelho e laranja…

E meu mundo estava tingido de âmbar.

Alex? A voz dele veio através da conexão vibrante.

Eu o ignorei e a forma como sua consciência deslizou ao lado da minha.

O que você está tramando?

Ainda assim eu ignorei o puxão do Primeiro. Instinto em um nível


profundo, antigo, com que eu não estava familiarizada tinha assumido. As
marcas do Apollyon fluíam através da minha pele enquanto eu erguia as
mãos. O fogo parou a centímetros de mim, formando um círculo ardente.
Calor caiu sobre mim, mas não queimou. Soprei uma respiração constante,
suave, e o fogo tremeluziu uma vez, duas vezes, e depois se desvaneceu.

Os autômatos chegaram a um impasse de repente, soprando e bufando


ruidosamente.

Meus braços se levantaram a meu lado, meus dedos se espalharam, e o ar


zumbiu com poder e antecipação. Luz azul crepitou sobre a ponta dos meus
dedos, esperando... querendo…

Um dos autômatos, o maior daqueles restantes, investiu. Ao som do


rugido sombrio, akasha puxou firmemente e contraiu assim como a ligação
entre Seth e eu.

Eu soltei.

A explosão de poder correu de mim, rolando como ondas agitadas pela


tempestade. O fluxo se chocou contra o autômato mais próximo de mim. Luz
azul chamejou das órbitas e mandíbulas abertas da criatura. Um segundo
depois, ele implodiu. A ondulação colidiu com mais quatro, eliminando-os
antes que o derramamento de akasha abrandasse.

Enquanto o pó cintilante se assentava no solo seco, exaustão me varreu.


A ligação com Seth ainda se sentia aberta, mesmo que o mundo estivesse
sombreado em profundo azul e preto de novo. Sendo que esta era minha
primeira vez usando akasha como um mata-moscas, eu não estava preparada
para a exaustão que se seguiu. Minhas pernas tremiam sob o meu peso
enquanto eu lutava para me manter de pé. Estendi a mão para minhas
adagas e percebi, como uma idiota total, que as tinha jogado em algum lugar
lá longe em um acesso de viagem de ego tipo “eu sou tão impressionante” e
“quem precisa de adagas quando tenho dedos akasha de poder?”.

Felizmente, outros ainda seguravam suas armas, e os autômatos estavam


distraídos comigo. Marcus eliminou um com um tiro à queima-roupa na parte
de trás do crânio. Aiden empunhou sua lâmina da foice como um carrasco,
decepando a cabeça de outro.

Um dos autômatos estendeu a mão para mim e eu me lancei – er, tropecei


– para o lado e caí pesadamente na minha retaguarda. E uma vez que estava
caída de bunda, eu realmente não queria me levantar. Estava como uma
criança pequena, totalmente esgotada. Patético – eu precisava aprender a
andar sozinha.

O autômato pronunciou um grunhido gutural.

Andei para trás como um caranguejo, colocando muito pouca distância


entre nós. Justo quando eu tinha bastante certeza que estava prestes a
acabar com um profundo bronzeado, Lea saiu de droga de lugar nenhum,
empurrou a ponta afiada de sua adaga do Covenant pela parte de trás do
pescoço do autômato, e depois torceu o braço para o lado.

Meus olhos se arregalaram enquanto o pó cintilante caía perto dos dedos


das minhas botas.
— Uau.

Lea inclinou a cabeça para o lado enquanto franzia a testa para o sangue
coagulado pingando da lâmina.

— Bem, isso foi nojento.

— É — eu disse lentamente, olhando ao redor. Contei oito e, em seguida,


Lea. Nove. Todos nós ainda estávamos de pé. Machucados e exaustos, mas
ainda estávamos lutando. Soltei uma risada fraca. — Deuses.

O som de metal triturando, junto com o som molhado, carnudo de ossos e


músculos cedendo, continuaram enquanto o resto dos autômatos era
eliminados em exibições menos explosivas.

Lea abaixou as mãos e balançou os dedos.

— Você vai se sentar aí pelo resto da noite ou se levantar? Porque com


certeza eu não vou te carregar. Você provavelmente pesa uma tonelada.

Sorrindo fracamente, levantei minha mão justo quando uma sombra


escura apareceu atrás de Lea. Meu coração saltou para minha garganta
enquanto o medo formava uma bola no meu peito. O estouro extremo de
emoção deixou Seth em polvorosa, e eu podia dizer que ele estava prestando
muita atenção mesmo que estivesse irritado por eu o ignorar.

— Lea! — Gritei bem alto enquanto meus dedos roçavam os dela.

Ela deu meia volta, sugando uma respiração.

Encontrando um reservatório de energia, fiquei de pé, mas – oh, deus –


era tarde demais. Convoquei akasha, mas foi como drenar um poço seco. Não
havia nada restando, mas eu era o Apollyon e deveria ter havido algo que eu
pudesse fazer – tinha de haver, mas antes que eu pudesse usar o elemento ar
para mover Lea para fora do caminho, tinha acontecido.

O autômato agarrou os lados da sua cabeça e torceu. O estalo do osso foi


ensurdecedor, tão alto quanto trovão. Os dedos dela convulsionaram e a
adaga escorregou deles. O som... ele chicoteou por mim, roubando meu
fôlego e torcendo minhas entranhas em dolorosos nós em carne viva. O
som... ele ficaria comigo para sempre.
Lea estava no chão diante de mim, um monte desossado, sem
movimento, de nada mais do que carne. Meu cérebro não conseguia conciliar
o que tinha acabado de acontecer. Como com Caleb, negação subiu e foi tão
forte, tão potente que eu me recusava a acreditar nisso.

Alguém surgiu por trás do autômato e houve uma explosão de pó


cintilante, mas eu não sabia quem era e eu não me importava. Naquele
momento, autômatos podiam chover sobre nós, e eu não me importaria.

Houvera nove de nós…

Meu coração gaguejou e depois acelerou rápido demais. O mundo rodopiou


à minha volta, um caleidoscópio de tons pastéis com flashes de âmbar
intenso. Alguém estava chamando meu nome, a voz profunda, quase
frenética se misturando com o zumbido baixo da de Seth.

Eu queria que eles calassem a boca – os dois, porque isso não era real.
Não podia ser, e, em seguida, em um momento de dolorosa e dura realidade,
eu não consegui entender como pude ficar tão surpresa. Como se eu não
tivesse esperado a morte. Como se a morte não pudesse nos tocar. Como
pude ficar tão surpresa? Cada um deles iniciara a jornada sabendo que isto
era perigoso, que qualquer momento poderia ser o seu último. E a alguns
quilômetros atrás, eu soubera que a morte estava chegando, tanto para que
eu pudesse provar a tristeza na ponta da minha língua.

Caí de joelhos, mãos sacudindo enquanto as colocava no ombro de Lea e


gentilmente a rolava de costas. Do ângulo bizarro que sua cabeça estava, à
cor pálida sangrando sob a sua pele bronzeada, à forma como seus olhos…

Meus dedos tremiam enquanto eu escovava as mechas acobreadas de sua


testa fria. Deuses, como o corpo podia esfriar tão rápido assim? Não parecia
possível ou certo. Definitivamente não era justo.

Os belos olhos de ametista de Lea – olhos que eu tinha invejado quando


criança – estavam fixos no céu escuro. Não havia nenhum brilho neles,
nenhuma luz interior. Não havia nada.

Lea tinha ido, como Caleb e a Mamãe, como todas aquelas pessoas de
volta naqueles carros. Ela estava… Eu não conseguia terminar a frase.
Aquela palavrinha não podia ser levada de volta.

Sacudi minhas mãos para longe, dobrando-as embaixo do meu queixo.


Outros estavam se aproximando de nós. Alguém estava chorando
suavemente. Vozes se elevaram, proferindo negações, e depois houve
silêncio. Minha respiração ficou presa novamente.

Alguém se ajoelhou no outro lado da Lea. Uma adaga do Covenant foi


cuidadosamente colocada no chão e suaves palavras foram pronunciadas em
Grego antigo. Uma oração pela morte de um guerreiro – um hino entregue
durante o enterro.

Levantei meu olhar e meus olhos travaram com cinzas escuros,


tumultuosos. O rosto de Aiden estava tão pálido; o horror gravado em seus
traços espelhava o meu próprio. Seus olhos estavam secos, mas raiva e
tristeza queimavam de dentro deles. Ele balançou a cabeça. Senti meus cílios
úmidos.

Eu não podia me sentar aqui. Simplesmente não podia.

Me empurrando para ficar de pé, passei tropeçando por Marcus e Olivia.


Passei por Luke e Deacon, além de onde Laadan e Solos estavam de pé.
Continuei andando, sem ter ideia de para onde ia ou o que eu ia fazer.

Alex?

Minhas mãos se enrolaram ao som da voz de Seth. Raiva em brasa rugiu


através de mim como um trem descarrilado. Ele não tinha partido o pescoço
de Lea como se fosse nada mais do que um graveto, mas suas mãos estavam
ensanguentadas, não estavam? Eu não quero conversar com você agora.

Houve silêncio – por enquanto.

Com o estômago revirando, lágrimas percorreram minhas bochechas.


Parte de mim ainda estava em choque, tão estúpido quanto isso era. Nós
nove tínhamos estado vivos. Todos nós tínhamos estado ainda de pé. Eu
tinha rido. E, em seguida, Lea tinha ido. Exatamente assim, sem nenhum
aviso real.

Deuses, Lea e eu tínhamos estado longe de sermos melhores amigas para


sempre, mas tínhamos chegado tão longe. Eu a respeitara, provavelmente
mais do que percebera, e o mesmo aconteceu com ela. Havia tanta coisa
entre nós que precisava ser encarada – ser reparada – mas não haveria mais
tempo. E apesar de que tínhamos passado a maior parte de qualquer tempo
que estivéssemos juntas odiando uma a outra, ela tinha vindo em meu
auxílio e se mantido firme.

Perceber isso cortou tão profundo que correspondeu à dor da perda de


Caleb.

— Alex — Aiden disse de trás de mim.

Balancei a cabeça.

— Eu não posso... eu não posso fazer isto agora — Minha voz falhou. —
Preciso de alguns minutos.

Ele hesitou, e então senti sua mão no meu ombro. Me soltei com um
puxão e andei em frente, arrastando respirações profundas mesmo que elas
não parecessem estar puxando ar suficiente para os meus pulmões. Eu não
podia me dar ao luxo de perder o controle, como eu tinha feito depois da
morte de Caleb. Não podia me desconectar disto ou me autodestruir. Eu
tinha que lidar, mas…

Maldição. Me curvei, colocando as mãos nos joelhos. A vontade de


vomitar era forte, mas não havia nada subindo.

Eu tinha pedido desculpas a ela pela babaca que tinha sido com ela
quando éramos crianças? Eu achava que não. Apertei meus olhos fechados e
vi seu corpo deitado no chão lá atrás.

Alex? Houve uma pausa e o vínculo retesou. O que está acontecendo!?

Sentei-me – provavelmente caí – pela segunda vez naquela noite.


Mantendo os olhos fechados, mantive os escudos levantados, mas segui o
vínculo com Seth. Eu não sabia como me sentir sobre isso. Talvez toda a
raiva estivesse ocupando espaço demais para sentir qualquer outra coisa. Isto
é o que você queria? perguntei.

Seth não respondeu imediatamente. Eu não tenho certeza do que você


quer dizer. Eu posso sentir suas emoções. Alguma coisa aconteceu.

Cale a boca! Eu não tenho certeza do que fez isso – a qualidade quase
sincera de sua voz, ou o fato de que ele tinha levado a irmã de Lea e minha
mãe tinha levado a família dela e, por causa do que Seth e eu éramos, ela
havia perdido a vida. Quebrei bem aberta em um instante. Cale a boca! Só
cale a boca! Você está feliz, Seth? É isso o que você queria?
Lágrimas trilharam minhas bochechas, velozes e furiosas. Meus braços
tremiam – todo o meu corpo tremia para manter os escudos levantados. Eu
não podia deixá-los baixar, não quando Seth estava dentro da minha cabeça
deste jeito. Ele saberia onde eu estava e haveria mais morte.

Joguei a cabeça para trás e não havia nenhuma palavra, só tristeza,


culpa e fúria. Eles derramaram de mim em um grito que não fez nenhum
som fora do meu corpo.

Pare, ele disse, e houve uma pressão a minha volta, quase como se Seth
estivesse envolvendo os braços a minha volta, me segurando imóvel. Você
precisa se acalmar, porque está estourando um monte das minhas células
cerebrais. Respire fundo. Só acalme-se. Tudo bem?

Vários momentos se passaram, e eu respirei pesadamente através deles.


Sentei-me ali, olhos fechados, sem ver nada e sem sentir nada. Nada disto
parecia real.

Quem está morto? Seth perguntou, e eu podia dizer pelo seu tom de voz
que ele esperava o pior.

Lea. Até mesmo a voz dentro da minha cabeça soou entorpecida. Ela está
morta, como toda a família dela.

Seth não disse nada. Talvez ele soubesse o significado. Afinal de contas,
quando tínhamos estado conectados antes, ele vira muito do meu passado, e
provavelmente podia adivinhar que eu não tinha ideia de como lidar com
isto. Talvez ele estivesse até mesmo pensando a mesma coisa que eu tinha –
que nossa conexão tirara tudo de Lea, incluindo sua vida. Eu duvidava que,
mesmo se estivesse pensando isso, faria qualquer diferença. Seth continuaria
fazendo o que estava fazendo. E eu também iria. Ele não disse nada
enquanto eu puxava minhas pernas para meu peito e me enrolava como uma
bola, desesperadamente não querendo sentir a perda cortante novamente. E
ele não disse nada enquanto a estranha pressão dentro de mim aumentava.

Éramos inimigos até o âmago, ainda mais agora do que nunca, mas a
minha perda era a dele. Quando eu sofria, ele sofria. Era o modo que nós
fomos construídos, e mesmo a morte que ele havia causado indiretamente
não poderia romper isso ou estilhaçar o que havia entre nós.

Nada poderia.
Trinta e três

Eu não sei quanto tempo fiquei lá, mas quando eu abri os meus olhos
novamente, o céu ainda estava escuro e a presença de Seth tinha ido
embora. Em algum momento, eu senti a facilidade da distância. Eu acho que
ele sussurrou algo antes da conexão desaparecer, mas eu tinha que estar
ouvindo coisas, porque isso não podia estar certo.

Eu acho que eu o ouvi dizer que estava sentia muito.

Obviamente, eu estava perdendo a minha cabeça. Seth raramente se


desculpava, e dadas as suas necessidades de poder e aceitação que o levou
para o jogo final, eu duvidava que ele sentisse remorso.

Respirando fundo, eu quase engasguei com os restos amargos de fumaça.


Eu sabia o que eu precisava fazer – me levantar e me mexer. Sentar aqui a
céu aberto, à espera de que mais autômatos cheguem, não era seguro.

Eu me levantei e me virei, escovando a sujeira das minhas calças de


tática. O grupo ainda estava em volta do corpo de Lea. Olivia estava sentada
ao lado da mestiça caída, com a cabeça entre as mãos. Deacon e Luke a
ladeavam, o mestiço segurando o braço ferido.

Enxugando as minhas mãos em meu rosto, eu parei ao lado de Aiden.

Olivia olhou para cima, com os olhos brilhantes sob o luar.

— Ela não sente isso, certo?

Eu balancei minha cabeça.

— Não. Eu acho que não.

Ela balançou a cabeça, em seguida, pegou a espada de Lea, segurando-a


perto enquanto ela ficava de pé.

— O que iremos ... o que iremos fazer a partir daqui?

Foi Solos que falou.


— Precisamos avançar rapidamente. Não há como dizer se mais virão, e
nós somos patos parados aqui fora.

— Você ainda acha que a universidade é um lugar seguro? — perguntou


Marcus, coçando o queixo. A palma de sua mão voltou vermelha. Percebi
então que ele estava sangrando.

Eu me dirigi a Marcus, mas ele me dispensou.

— Eu estou bem. É só um arranhão — disse ele rispidamente. — Como


sabemos que a universidade ainda está de pé? Os autômatos poderiam ter
incendiado e...

E todas aquelas pessoas. Minha cabeça girava quando eu olhei para Lea.
Alguém tinha fechado os seus olhos. Os meus estavam queimando.

— Nós temos que descobrir — Aiden enfiou a mão pelo cabelo — Estamos
a cerca de um quilômetro do campus.

Luke balançou a cabeça.

— Pode haver mais deles. Inferno, pode haver uma dúzia ou mais ao
longo da próxima maldita colina e nós estaríamos andando cegamente.

— Ou poderia haver nada mais do que terreno aberto e a maldita


Universidade — Aiden respondeu, sua mandíbula se definindo duramente. —
Até onde sabemos, esses autômatos talvez estivessem aqui para impedir que
ninguém chegue ao campus... ou para impedir as pessoas de saírem.

— Ou o campus poderia ter ido embora — Deacon se moveu, passando as


mãos para baixo dos seus lados.

Solos avançou, batendo a mão no ombro de Deacon.

— Eu não posso acreditar que todo o campus tenha desaparecido.

— Com todos esses autômatos, tudo é possível — Luke endireitou o braço


ferido, enquanto olhava na direção de onde eu assumi que o campus estava.
— Mas temos que ver. Viemos até aqui.

— Espere! — A voz de Olivia subiu acima da dos rapazes. — Eu não estava


perguntando sobre ir para a universidade ou não. Eu estava falando sobre o
que íamos fazer com a Lea.
O silêncio caiu de novo e eu me virei para Aiden.

— Nós não podemos deixá-la aqui.

Dor brilhou naqueles olhos cinzentos profundos. Ele puxou o braço,


estendendo a mão, e eu fui, me pressionando contra o seu lado. Meus dedos
cavados em sua camisa chamuscada, encontrando pequenos buracos
queimados no material.

— Nós não podemos — eu sussurrei.

Seu braço apertou ao meu redor.

— Eu sei.

— Nós não podemos... levá-la conosco — disse Solos. — Nós não temos
ideia do que vamos enfrentar.

Olivia saiu como uma bomba nuclear, sustentando a adaga que ela estava
considerando empalar entre os olhos de Solos.

— Nós não podemos deixá-la aqui assim. Isso é tão errado que eu nem
preciso explicar.

Simpatia brilhou no rosto cheio de cicatrizes de Solos.

— Eu sei, mas...

— Nós enterramos nossos mortos – nossos guerreiros — O lábio inferior de


Olivia tremia. — Nós simplesmente não os deixamos aqui para apodrecer.

Laadan colocou uma mão pálida no braço de Olivia, mas Olivia estava
além de ser consolada.

— Eu não me importo com o que temos de enfrentar ou o que está


esperando por nós! Nós não podemos deixá-la aqui — Seu olhar voltou-se para
mim. — Nós precisamos enterrá-la.

— Com o quê? — Solos perguntou gentilmente. — Nós não temos pás e


este terreno é duro demais.

Olivia puxou uma respiração afiada e se virou. Seus ombros magros


tremiam enquanto Luke passava o braço bom ao seu redor.
— Aiden, nós temos que fazer alguma coisa — Deacon pediu. — Eu não
sei o quê, mas algo.

Afastando-me de Aiden, olhei para as minhas mãos. Eu não tinha certeza


de quanta energia eu ainda tinha deixado em mim, ou mesmo se eu poderia
usar o elemento terra para criar... para criar uma sepultura, mas eu gostaria
de tentar. Não havia nenhuma maneira que nós pudéssemos deixar a Lea
aqui.

— Eu não sei se isso vai funcionar. Coloquei meu cabelo para trás, sem
ter ideia do que aconteceu com o meu rabo de cavalo.

As sobrancelhas de Aiden bateram queimando com preocupação.

— Tem certeza que você irá fazer isso?

Eu balancei a cabeça.

— Onde você acha que devemos fazê-lo, Olivia?

Levou alguns segundos para ela se afastar de Luke e processar o que eu


estava pedindo. Ela olhou em volta e pareceu reconhecer que realmente não
havia um local adequado. Ela andou e eu a segui. Paramos perto de duas
árvores de zimbro que permaneceram ilesas do fogo e da batalha, o seu
cheiro doce tão em desacordo com o persistente cheiro de ácido e metal.

— Isso deve servir — disse ela, limpando a garganta. — Não é muito, mas
as árvores... ela gosta das árvores.

Eu olhei para ela.

Olivia lentamente se virou para mim e soltou um abafado, riso rouco.

— Tudo bem. Lea realmente não era muito ligada a natureza ou árvores.

— Não — Eu sorri e isso doeu. — Ela provavelmente está pensando mas


que inferno exatamente agora.

Ela piscou.

— Você acha?

— Sim, quero dizer, quando eu estava lá embaixo esperando, eu não


poderia dizer o que estava acontecendo aqui, mas talvez seja diferente para
ela — Eu pensei no oráculo que eu tinha conhecido, e em seguida, na mulher
idosa. — Parecia diferente para todos, mas eu sei que ela não está sofrendo.

Olivia assentiu com a cabeça lentamente.

— Essa é a coisa sobre a morte, eu percebi. Eles foram embora para nós,
mas não é verdade, sabe? Há vida após a morte, apenas um tipo de vida
diferente — Houve uma pausa. — Eu gostaria que tivéssemos nos tornados
amigas antes de toda essa porcaria. Lea... ela era muito legal se você
passasse por sua fase de vadia.

Eu esfreguei minha têmpora, sentindo um lugar incrivelmente vazio no


meu peito.

— Eu gostaria de não ter sido uma vadia para ela.

— O quê?

Balançando a cabeça, eu abaixei meu olhar.

— É uma longa história.

Olivia parecia que queria jogar algo para fora, mas não o fez.

— Ela vai ver sua família novamente.

— Sim, ela queria isso — Meus olhos estavam começando a queimar


novamente e eu sabia que, se eu deixasse as lágrimas cair mais uma vez, eu
não iria parar e eu seria totalmente inútil. — Pode deixar. Eu posso fazer
isso.

Respirando fundo, eu caí de joelhos e coloquei minhas mãos na terra.


Fechei os olhos, balançando os dedos na maca da folha até que eu encontrei
o solo. Eu tinha feito o movimento do solo antes, quando eu tinha lutado
com Aiden, então eu imaginei que eu poderia fazer isso.

Eu imaginei o solo se soltando e abrindo caminho sob os meus dedos. O


chão tremeu um pouco e minha confiança floresceu. Eu criei uma imagem
da terra se rachando, fundo – profundo o suficiente para um enterro decente.
Na minha cabeça, o solo era mais escuro – um marrom rico – o mais
profundo que eu fui. Inalando, eu peguei a umidade, o cheiro de terra do solo
sendo perturbado.
Quando abri os olhos, o chão realmente estava aberto. Montes de terra
fresca colocados em cada lado de um circular buraco de seis metros. Vendo
que era profundo o suficiente, eu me sentei para trás e enxuguei minhas
mãos trêmulas ao longo de minhas coxas. Eu me sentia seca por dentro e um
pouco frágil. E eu definitivamente não ficaria de pé tão cedo.

Todo mundo começou a fazer sua parte. Alguém encontrou um cobertor


em uma de nossas mochilas e Lea foi envolvida na mesma. Quando seu corpo
foi rebaixado para a sepultura, Marcus me ajudou a levantar. Ele me
entregou uma garrafa de água, junto com os punhais que eu tinha deixado
cair.

— Obrigada — Eu murmurei, engolindo a água abaixo antes de guardar as


adagas. E então algo me atingiu. — Espere. Alguém tem alguma moeda?

Aiden apalpou os bolsos, assim como o resto dos rapazes. Eles vieram
para cima vazios e meu estômago se afundou.

— Enterrar ela realmente não faz a diferença — disse. — Faz a diferença


para nós. Mas ela precisa de passagem para Charon ou ela vai ficar presa lá.

— Podemos trazer de volta as moedas — Solos sugeriu.

— Não — Pânico borbulhou. — Nós temos que ter alguma coisa. Confie
em mim, ela precisa ter as moedas agora.

Laadan avançou, pegando algo por trás de seu pescoço.

— Eu tenho isso — disse ela, soltando um colar e puxando-o por baixo de


sua blusa. — Os enfeites são moedas de ouro, aquelas antigas. Elas vão valer
mais do que o suficiente.

Meus músculos relaxaram, cheios de alívio.

— Obrigada.

Ela sorriu quando ela entregou o colar para Marcus, que em seguida,
quebrou duas das moedas de ouro. Partindo para o cobertor, colocou-as nas
mãos de Lea.

Eu respirei, tentando aliviar o ardor e o crescente nó na minha garganta.


Aiden veio para o meu lado, envolvendo os braços em volta dos meus ombros.
Virei-me para ele, descansando a minha bochecha contra o seu peito. O
aumento constante e a queda de sua respiração acalmou as minhas pontas
desfiadas.

Solos tinha encontrado dois ramos grossos, e os empurrado para o chão


acima da terra perturbada, após Laadan e Marcus terem usado o elemento ar
para empurrar a sujeira de volta para a sepultura. Deacon e Luke recolheram
algumas pedras, que eles colocaram em torno dos ramos. Não era muito para
uma lápide, mas isso teria que servir por agora.

Ficamos em torno da sepultura improvisada de Lea quando Laadan


murmurou uma oração na língua antiga. Eu não sabia que eu estava
chorando até que senti o polegar de Aiden enxugando as minhas lágrimas.
Eu não poderia ajudar, mas perguntei quantas vezes mais estaríamos fazendo
isso antes que chegasse o fim – e quem iria enxugar as lágrimas de Aiden
para longe quando eles ficassem de pé de novo caso fosse a minha sepultura.

***

O sol começou a subir no momento em que chegou à parede externa do


campus da Universidade, lançando um pedaço de luz alaranjada que se
estendia por todo o prado da montanha. Havíamos passado a última milha da
viagem em um silêncio solene. Não houve nenhuma conversa, nenhuma
brincadeira ou riso. Falar parecia inapropriado após a perda que todos nós
tínhamos sofrido. Eu sabia que não estava sozinha em me convencer de que
Lea está, ou estaria, em um lugar muito melhor, um lugar onde a luta não
poderia mais alcançá-la, onde o futuro já não era precário, e onde ela se
reuniria com seus entes queridos.

Isso ajudou um pouco.

Mas quando a parede de pedra exterior entrou em vista, nós praticamente


sabíamos que as coisas iam ser um saco.

Seções inteiras da estrutura externa de mármore foram destruídas ou


estavam completamente desaparecidas ou em vias de ruir. Parecia que
alguém tinha trazido uma bola de demolição e jogado pô-lo com ele.

— Deuses — Marcus murmurou. — Isso pode ser um problema.

Eu arqueei uma sobrancelha para o meu tio.


— Sério?

A parte mais assustadora de tudo eram as centenas de árvores dentro da


parede exterior. Estavam todas derrubadas em troncos, os membros
atingindo o solo, as raízes expostas e branco-acinzentadas, como se tivessem
sucumbido a um forte vento.

— Eu nunca vi nada como isso — disse Laadan, sua cabeça movendo-se


lentamente de um lado para o outro. — É como se uma grande mão invisível
obrigasse todas para o chão.

Eu fui até uma, colocando minha mão sobre ela. Eu meio que esperei a
árvore cair, mas estava estável.

— Tão estranho — Virei-me para Aiden. — Alguma ideia do que poderia


ter feito isso?

— Nenhum indício — Ele franziu a testa para o sol nascente. — Mas


espero que a gente tenha uma resposta para isso. Precisamos seguir em
frente.

Nós continuamos, oito de nós cansados e esperando desesperadamente


que a Universidade estivesse segura e em paz. Isso quase parecia demais para
pedir.

A segunda parede parecia melhor. Danos se mostravam em alguns


lugares, mas a porta ainda estava de pé e bloqueada. Tipo de boa notícia, eu
imaginei. Mas como diabos iríamos passar por cima de uma parede de vinte
metros de altura?

Eu cruzei os braços doloridos.

— Antes que alguém tenha alguma ideia, eu não irei fazer um buraco por
isso.

Aiden enviou um sorriso irônico sobre seu ombro enquanto ele se juntou a
Marcus e Solos que se aproximavam dos portões de titânio. As pontas afiadas
ao longo do topo chamaram minha atenção, e minha imaginação colocou
cabeças decapitadas nas coisas.

Estremeci.
Luke deixou cair um braço sobre meus ombros.

— Você se pendurando ali?

— É claro.

Suas sobrancelhas subiram.

— Você está correndo como uma pequena coelhinha Apollyon


energizante.

Eu quase ri.

— Esperemos que todos nós possamos nos recarregar em breve. Como


está o seu braço?

— Não é tão ruim quanto eu pensava inicialmente — Luke apertou meus


ombros e deixou ir. — Eu acho que Deacon está ficando com bolhas em seus
pés.

Ao som de seu nome, Deacon fez uma careta por cima do ombro.

— Meus pés estão cobertos de bolhas.

— Seus pobres pés preciosos — Luke brincou.

Do portão, Solos levantou a mão, silenciando-nos. Meu coração acelerou


quando peguei os punhais amarrados em minhas coxas. Luke mudou Laadan
e Deacon para trás de nós, quando eu avancei para frente.

— O que está acontecendo? — Eu perguntei em voz baixa.

O amanhecer ainda tinha que quebrar a escuridão além do portão, e tudo


que eu podia ver eram as sombras das árvores torcidas.

Marcus pigarreou.

— Olá! — Ele gritou, e sua voz ecoou no que pareceu uma eternidade. —
Nós... Nós viemos em paz.

Eu revirei meus olhos e murmurei:

— Uau.
Meu tio me lançou um olhar escuro e em seguida, continuou.

— Eu sou Marcus Andros, o Reitor do Covenant da Ilha Divindade. Eu


tenho sentinelas comigo e o...

O som de armas sendo travadas no lugar eram como um rapta-tat-tat que


calaram Marcus e provavelmente parou os corações de todos. Nem uma única
sombra se moveu para além do portão.

— Virem-se e abaixem suas armas agora — veio uma voz escura atrás de
nós.

Oh, merda.

Meus olhos foram para cima, encontrando Aiden por um breve segundo, e
depois, porque eu realmente não queria ser bombeada por balas de titânio,
virei-me e esperei que eu não tivesse usado muito do poder dentro de mim até
ficar completamente seca.

Dois Sentinelas ficaram atrás de Deacon e Laadan, armas pressionadas


contra suas bochechas pálidas. Mas haviam mais de dois Sentinelas. Mais de
uma dúzia nos cercaram, formando um semicírculo. Todos eles com Glocks e
pareciam mais do que prontos para usá-las.

Estávamos cercados.
Trinta e quatro

— Abaixem suas armas — o Sentinela disse novamente. Ele era alto e


mais velho, talvez em seus quarenta anos, e aparentemente, estava
acostumado a ser ouvido.

Deuses, era verdadeiramente possível que uma situação ruim pudesse


ficar ainda pior.

Aiden foi o primeiro a baixar os seus punhais, colocando-as no chão ao


lado de seus pés. Depois levantou-se lentamente, levantando as mãos. Eu
sabia que ele carregava mais armas com ele, e eu esperava que os outros
homens não percebessem isso. Seguindo o exemplo, eu me livrei dos meus
punhais, mas deixei a arma escondida na parte de trás da minha cintura
apenas no caso.

O Sentinela responsável caminhou para frente, mantendo a arma


apontada em Solos, o que achei que foi meio engraçado. De nós quatro, ele
realmente deveria ter aquela arma apontada para mim.

Então eu percebi que ele não sabia quem eu era. Uma parte de mim
relaxou, porque se eles estivessem jogando no time do mal, eu tinha certeza
de que teria fotos do meu rosto rebocadas através de suas paredes do quarto.

Marcus se preparou para falar de novo, mas os olhos do Sentinela se


estreitaram em advertência.

— Eu ouvi de onde você disse que era e que não tinha más intenções, mas
por favor me diga, como nós deveríamos acreditar nisso.

Boa pergunta. Olhei para o meu tio, sobrancelhas levantadas.

— Nós éramos uma parte do grupo que escapou da Ilha Divindade — disse
Marcus.

— Bem, obviamente — respondeu o Sentinela.

Eu meio que gostei deste cara, arma apontada em nossos rostos, não
obstante. Um músculo se flexionou na mandíbula de Marcus.

— Nós não estamos trabalhando com Lucian ou com o Primeiro. Eu não


sei como provar isso para os seus padrões, mas temos viajado muito para vir
aqui e perdemos um dos nossos, cortesia dos autômatos guardando este
lugar. Nós não somos o inimigo aqui. Nós queremos a mesma coisa, parar
Lucian e o Primeiro. O Sentinela Mathias estava a caminho para cá. Ele
deveria ter chegado com notícias de nossas viagens.

— Se esse Sentinela foi mandando para chegar aqui nas últimas vinte e
quatro horas, então ele está entre as pobres almas para além do muro — O
olhar do líder derivou sobre nós. — Ninguém passou por eles há mais de um
dia, o que me deixa curioso para saber como o seu grupo conseguiu.

Eu não tinha conhecido o Sentinela que tinha chegado enquanto Aiden e


eu estávamos no submundo, mas engoli em seco quando ouvi que ele agora
estava entre os mortos.

— Eles se voltaram contra vocês, então? — Aiden perguntou


calmamente. — Eles não estavam guardando o campus?

No começo eu não achava que o meio-sangue ia responder, mas ele o fez.

— Os autômatos estavam guardando o campus até cerca de um mês


atrás, e então eles começaram a disparar sobre as pessoas que procuraram
refúgio aqui. Nós tentamos detê-los, e acabamos perdendo metade da
primeira barreira e muitas vidas. Então, novamente, eu estou curioso de
como um grupo constituído por adolescentes e dois destreinados puros
poderiam ter passado por eles.

— Eu sou o Apollyon — eu disse, enquadrando meus ombros. — Pode ter


algo a ver com isso.

Todas as malditas armas foram direcionadas para mim, e eu me perguntei


se isso tinha sido a melhor coisa a se dizer. Com o canto do meu olho, eu vi
Aiden começar a se mover em direção a mim.

— Está tudo bem — eu acrescentei rapidamente, mantendo minhas mãos


para fora na minha frente. — Eu sou o Apollyon bom, aquele que não quer
tirar o Conselho e matar os deuses.

O Sentinela responsável não parecia aliviado ou intimidado. Em vez


disso, ele parecia incomodado e como se ele realmente quisesse dar um tiro
entre os meus olhos. O que não era bom, porque eu tinha certeza de que
Aiden já estava calculando o tempo que levaria para ele puxar a arma e
atirar no Sentinela.

As balas estavam prestes a voar – justamente quando o sol começou a


aparecer, também, e quem não iria realmente esnobar um belo nascer do sol?

— Metade dos Sentinelas e Guardas que apoiaram o Primeiro estão


procurando por você, e você veio até aqui? — Raiva brilhou nos olhos do
Sentinela. — Você tem um último desejo antes de morrer?

Ainda bem que eu não tinha mencionado que Seth e eu ainda tínhamos
um tipo de ligação.

— Na verdade, eu não tenho um último desejo antes de morrer. E você


pode atirar em mim se isso te faz sentir melhor, mas isso não vai me matar.

Parecia que ele estava a segundos de descobrir.

Eu respirei fundo, tentando manter um controle sobre o meu


temperamento.

— Olha, eu entendo a sua falta de vontade para me abrigar. Eu entendo


isso, mas você precisa de mim – você precisa de nós – porque nós acabamos
com aqueles autômatos e nós podemos protegê-lo. Já para não falar que eu
sou a única que pode parar tudo isso. Então, se você quer nos atirar para os
lobos, você está selando seu próprio destino.

O Sentinela endureceu, mas não disse nada.

— E você deve perceber que isto não é sobre a sede de um puro-sangue


para o poder. Isto é muito maior do que isso. Somente um deus poderia ter
transformado os autômatos. Não Lucian, e não O Primeiro. E esse deus vai
acabar com qualquer um que esteja em seu caminho.

Eu dei o meu melhor sorriso, aquele que normalmente me tirava de


apuros ou enumerava aqueles a fim de recebê-lo.

— E esse deus não é o único com quem você vai ter que se preocupar. Há
um outro que atende pelo nome de Apolo – sim, aquele Apolo – e ele vai ficar
muito chateado se você nos virar as costas. Veja, nós somos meio que
relacionados e ele meio que gosta de mim.

Alguém xingou sob a respiração.

Meu sorriso se tornou superior.

— Só mais uma coisa – se você machucar qualquer um dos meus amigos,


você vai se arrepender seriamente de fazê-lo. Me entendeu? Então, vamos
todos jogar bonito e nos tornar melhores amigos para sempre.

— Eu acho que nós deveríamos deixá-los — um dos Sentinelas disse.

— Soa como uma boa ideia — Um tom de humor negro se atou em Aiden.
— Você pode querer tirar a arma do rosto do meu irmão, enquanto você
pensa nisso.

Ninguém se moveu por um segundo, e eu esperava seriamente que esse


cara não ligasse para o meu blefe. Eu não tinha certeza se eu poderia fazer
muito mais em termos de coisa Apollyon, mas felizmente ele levantou a mão
e as armas desapareceram.

Deixei escapar um suspiro de alívio.

— Eu espero que eu não me arrependa disso — disse o Sentinela,


deslizando sua arma de volta em seu estojo. Então ele estendeu a mão, para
minha grande surpresa. — Meu nome é Dominic Hyperion.

Minhas sobrancelhas subiram quando peguei a sua mão. Ele tinha um


aperto firme.

— Hyperion? — disse Marcus. — Sobrenome interessante.

Dominic sorriu ironicamente.

— Eu acho que alguém tinha um senso de humor, tendo o sobrenome de


um Titã.

— Eu acho que sim — eu murmurei, aliviada ao ver que meus amigos já


não tinham armas apontadas para suas cabeças.

Andando arrogantemente, Dominic parou no portão.

— Então vocês realmente acabaram com os autômatos?


— A menos que eles enviem mais, vocês devem estar livre deles — Solos
respondeu.

— Isso é bom — Uma meia pausa. — Você disse que perdeu um?

Olivia pigarreou.

— Sim. Ela tinha apenas dezoito anos, treinando para ser uma Sentinela.
Seu nome era Lea.

O queixo de Dominic se inclinou para baixo.

— Eu sinto muito por tudo o que vocês perderam. Os deuses sabem que
podemos simpatizar com o que vocês estão sentindo — Com isso dito, voltou-
se para o portão. — Por favor, sigam-me.

— Então, você realmente pode parar o Primeiro? — Perguntou outro


Sentinela. Ele era mais jovem do que Dominic, em torno da idade de Aiden.
Um certo brilho encheu seus olhos quando eu assenti. — Bem, eu tenho
certeza que um monte de gente para além destas portas vão ficar felizes ao
ouvir isso.

— Não disse? — Perguntou Aiden, que de repente estava ao meu lado. Ele
colocou um braço sobre os meus ombros, e enviei-lhe um olhar curioso.

Os olhos do Sentinela se sobressaíram de seu rosto quando eles caíram no


braço excessivamente possessivo de Aiden.

— Você é um... e você é um...

Oh, céus.

Aiden sorriu, seus olhos de um cinza escuro.

— Nós somos o quê?

— Não. Não. É só que... — O Sentinela olhou para os outros igualmente


perplexos. Ninguém veio em seu auxílio. — Não é nada. Não importa.
Problemas maiores, certo?

— Sim, problemas maiores... — Houve um claro aviso, frio na voz de


Aiden quando ele me guiou ao redor.
O portão estava abrindo quando o braço de Aiden deslizou do meu ombro,
à deriva nas minhas costas, deixando uma onda de arrepios em seu caminho.
Dominic passou primeiro, seguido por Marcus e depois Solos.

Eu parei, voltando para o Sentinela de olhos esbugalhados.

— Você disse que outros estariam felizes em saber que eu sei como parar
... o Primeiro? Quem seriam esses?

Caros deuses, o cara olhou para Aiden primeiro antes de responder.

— Antes dos autômatos ficarem loucos, um punhado de grupos veio de


outros locais, incluindo de Catskills.

Meu coração parou.

— Os membros do Conselho e Sentinelas?

Quando ele acenou com a cabeça, eu estava perto de fazer algo como um
Muppet com o braço. Eu não tinha deixado de considerar que meu pai
poderia ter sido um daqueles corpos queimados ao longo da estrada, mas
sabendo que alguns tinham ido para a Universidade provocou uma segura
esperança no fundo do meu peito. Isso não aliviava a dor forte da perda de
Lea, mas era alguma coisa para continuar.

Isso era uma coisa, e isso era melhor do que nada.

***

Quando o amanhecer rastejou através do prado luxuriante, jogando luz


sobre as pequenas flores silvestres azuis, nós tínhamos chegado ao nosso
destino. O campus da Universidade era grande, espalhando-se entre dois
picos de montanhas, como a sua própria pequena cidade em uma rede. Eu
imaginava que era como qualquer outra faculdade em tamanho e atmosfera,
mas foi aí que as semelhanças acabaram.

A luz matinal refletia nos grandes edifícios de arenito modelado após o


antigo coliseu. Pátios estavam cheios com o que parecia ser cada flor e
árvore conhecida pelo homem, farejando o ar. Estátuas das musas
guardavam um edifício escolar, enquanto esculturas dos Doze Olimpianos
forravam a estrada. Os dormitórios pareciam mini arranha-céus subindo ao
fundo, habitando potencialmente milhares de alunos.
Era assim como a Ilha Divindade, mas em uma escala muito maior, isso
deu uma pontada no meu peito.

No centro do campus estava o que eu presumi que fosse o seu edifício do


Conselho, e que era onde estávamos indo. Os músculos das minhas pernas
doíam, e visões de camas estavam dançando na minha cabeça, mas eu me
forcei a continuar em vez de sentar-me no meio da estrada e ir dormir.

Bustos dos Doze Olimpianos esculpidos na estrutura de mármore e


arenito. Era circular, como um anfiteatro interior, e um arrepio frio laminou
na minha espinha. Eu não sabia o que tinham os edifícios do Conselho
porque sempre me assustavam, mas eles me assustavam.

À medida que subia as escadas, eu vi a estátua de Themis e quase ri. Sua


balança estava equilibrada, mas a favor de quem?

Não parecia haver ninguém mais se movendo em torno de nós quando


entramos no átrio iluminado. Os alunos estavam, provavelmente, ainda
dormindo, se eles estavam mesmo continuando com as aulas. Inferno, eu
nem sabia que dia era. Poderia ser fim de semana por tudo que eu sabia.

Dominic levou-nos em torno de um outro conjunto de estátuas, e até


então eu estava tão cansada de vê-las e, claro, fomos até um voo
interminável de escadas. Nem mesmo a Universidade maldita poderia investir
algum dinheiro em um elevador.

Foi quando estávamos descendo um grande corredor, e eu vi os guardas


de pé diante de portas duplas revestida de titânio, que eu sabia para onde
estávamos indo.

— O gabinete do reitor — eu disse.

Dominic acenou para os guardas, e depois mudou-se como uma unidade,


abrindo as portas pesadas. Meu primeiro vislumbre do escritório realmente
marcou. Era quase idêntico ao de Marcus. Luxuoso. Espaçoso. Toneladas de
mobiliário de couro caro para o futuro, incluindo uma grande mesa velha que
provavelmente fazia alguém se sentir poderoso e todo especial. Havia até
mesmo um aquário embutido na parede atrás da mesa, com os peixes
nadando para frente e para trás.

Olhei para Marcus e vi que seu rosto estava impressionantemente em


branco. Meses atrás eu acreditava que Marcus não sentia nada, mas agora eu
sabia melhor. Ver este escritório tem que trazer lembranças boas e uma
tonelada de ruins, e eu sinceramente sentia por ele.

Uma porta abriu-se a nossa esquerda, e um homem alto, de cabelos loiros


gelados e olhos azuis surpreendentes entrou na sala. Ele estava vestido como
Marcus costumava se vestir – um pôster infantil para o Golf Club of the
Month. Atrás dele, uma figura menor entrou e meu queixo caiu.

— Diana — Marcus suspirou, e depois atirou-se para a frente.

Um grande sorriso bonito se espalhou pelo rosto da Ministra. Eu a


conheci quando eu estava no Covenant de Catskills, e ela tinha sido a
ministra a se levantar contra Telly, votando contra eu ser colocada à
servidão.

Então, sim, eu gostei da mulher.

Marcus apertou as mãos dela nas suas e parecia que ele queria fazer mais
– talvez puxá-la em seus braços, abraçá-la... beijá-la como um homem que
nunca tinha esperado vê-la novamente.

— Eu estou tão... grato de ver que você chegou aqui em segurança — A


voz de Marcus era rude e pesada com uma emoção silenciosa. Então ele
sentia algo por essa mulher. — Tão grato.

O rosto da mulher estava corado.

— Como eu estou por vê-lo aqui.

O Reitor limpou a garganta.

— Eu não sabia que você estava familiarizado com a minha irmã, Reitor
Andros.

Irmã? Oh... oh, estranho.

Marcus soltou as mãos de Diana e encarou o homem.

— Somos amigos... Reitor Elders. Ela é uma mulher linda, mas tanto
quanto eu gostaria de listar seus atributos brilhantes, não é por isso que
estamos aqui.

Minhas sobrancelhas subiram na minha testa.


Os lábios do Reitor se contorceram como se quisesse sorrir.

— Eu também sou grato ao ver que você está aqui em segurança. Muitos
não têm estado recentemente.

— Isso é o que temos visto e ouvido. Marcus cruzou as mãos atrás das
costas, me jogando de cabeça em lembranças dele em um escritório muito
semelhante a este, onde ele tinha estado a ponto de mentir por mim por algo
estúpido que eu tinha feito.

Ele fez uma volta rápida de apresentações. O Reitor parecia


mensuravelmente surpreso quando Marcus anunciou o nome de Aiden. Sua
cabeça inclinada para o lado.

— Eu já ouvi esse nome antes, um puro-sangue que usou uma compulsão


contra outro puro para proteger uma mestiça?

Porcaria. Com tudo que está acontecendo, nós esquecemos que Aiden foi
denominado como o Inimigo Público Número Dois.

Meus dedos avançaram em direção as minhas adagas, mas Aiden falou,


sua voz plana e calma.

— Este seria eu. E não se engane, se você estiver procurando por remorso
ou culpa, eu não tenho nenhum. Eu faria isso de novo.

O Reitor sorriu.

— Tenha calma, Sentinela. Neste momento, eu não poderia me importar


menos com o que você tem feito. Não é um problema... agora. Como estou
certo que a maioria dos membros do Conselho concordam.

A maneira como ele anexou o agora não me deixou feliz de modo algum.

— Obrigado por sua hospitalidade — disse Marcus, obviamente, tentando


dissipar a tensão no edifício. — Esperamos ser capazes de reembolsá-lo de
alguma forma.

Meu tio era um diplomata.

O reitor da Universidade assentiu.

— Por favor, comece por explicar como você conseguiu passar pelos
autômatos.

Entre Marcus e Dominic, que contaram ao Reitor e Diana, na maior


parte, sobre como nós fizemos isso em uma única vez. A conversa girou
rapidamente, porém, quando Dominic anunciou que eu poderia deter o
Primeiro.

Me mexi inquieta, surpresa por estar tão desconfortável com todos os


olhos em mim. Normalmente eu gostava de ser o centro das atenções. Eu
não tinha ideia de quando isso mudou.

— Eu posso parar Seth — eu disse finalmente. — Não vai ser fácil, mas eu
sei como.

— E como é que você pode? — perguntou o Reitor. — Pelo que a nossa


história nos ensina, o Primeiro tem controle total sobre o Segundo, e se
vocês dois estão em torno de si, ele pode transferir seu poder para ele,
tornando-se o Assassino de Deuses.

Dobrando meus braços, eu encontrei o Reitor Elders com um olhar


curioso.

— Bem, obviamente, o Primeiro não tem completo controle sobre mim. E


há um caminho para mim para reverter a transferência, impedindo-o de se
tornar o assassino de deuses. E se ele não for o Assassino de Deuses, Lucian
não tem nenhuma arma real, protegendo-o.

Diana encostou-se à mesa de carvalho, as sobrancelhas comprimidas.

— Mas você tem que estar perto dele para fazer isso, certo?

Eu balancei a cabeça.

— Sim. Viemos aqui esperando que houvesse outros que estivessem


dispostos a... para lutar por isso. De jeito nenhum apenas os oito de nós
possa violar o exército que Lucian tem cercando-o, para que eu possa chegar
até Seth. Nós precisamos do nosso próprio exército.

Reitor Elders olhou para Dominic, que deu de ombros.

— Temos muitos Sentinelas e guardas aqui, além de meios-sangues que


estão recebendo treinamento avançado. E nós queremos também o mesmo
desfecho. Isso precisa ser parado antes que mais pessoas inocentes sejam
perdidas, então você pode recrutar quem quiser se juntar a você.

Bem, isso foi surpreendentemente fácil.

— Haverá alguns, talvez até mesmo muitos — o Reitor continuou —, mas


nenhum será forçado a aderir à causa, Apollyon.

Eu achei engraçado que, considerando que uma raça inteira de mestiços


tinham sido forçados a uma servidão qualquer ou uma certa morte precoce,
mas em algum lugar ao longo da linha, eu aprendi a manter minha boca
fechada. Mais ou menos.

— Entendido — eu disse. — Como uma meio-sangue, eu nunca iria forçar


as pessoas a algo que arriscam as suas vidas.

As sobrancelhas do reitor se levantaram.

— Tudo bem — Ele olhou sobre o resto do meu grupo. — Eu imagino que
todos vocês desejam se reunir com os Sentinelas e guardas aqui o mais
rápido possível, mas do jeito que vocês parecem, vocês poderiam usar
chuveiros, alimentos e camas limpas. Enquanto vocês descansam, o
Sentinela Hyperion e eu vamos ter tempo para definir alguma coisa para
você.

— Ok — eu disse, perguntando-me quando a minha concordância ou não


com algo tinha começado a importar. Eu queria falar com os Sentinelas
agora, mas eu sabia que se eu o fizesse, assim iria Aiden e a maioria dos
outros. Tudo o que nós precisávamos era descansar, mal estávamos de pé. —
Isso seria ótimo.

— Há muitos quartos disponíveis para o seu descanso — disse o reitor. —


Sentinela Hyperion vai mostrar a eles.

Incapaz de segurar a pergunta mais tempo, eu me virei para Diana.

— Os Sentinelas que chegaram de Catskills... você conhece algum de


seus nomes?

— Alguns eu conheço — disse ela.

Então isso me surpreendeu. Meu pai provavelmente não seria conhecido


como Sentinela, pelo menos não por muito tempo.
— E sobre os servos?

Eu não poderia dizer pela expressão de dor de Diana se ela sabia aonde eu
queria chegar, ou se ela estava ciente de que o meu pai tinha sido um servo
no Catskills.

— As coisas estavam em um estado de caos, quando saímos de lá. Alguns


funcionários foram trazidos para cá, e aqueles que já não pareciam estar sob
a influência do Elixir escaparam para a floresta. Alguns ficaram para trás.
Os funcionários poderiam estar em qualquer lugar.

— Oh — eu sussurrei. Eles poderiam estar em qualquer lugar, meu pai


poderia estar em qualquer lugar. Senti a mão de Laadan nas minhas costas e
eu desenhei uma respiração afiada. — Qual era o estado do Covenant quando
você saiu?

Uma sombra escura cruzou o rosto de Diana.

— As paredes não haviam sido violadas, mas era apenas uma questão de
tempo. Lucian e o Primeiro desejavam tomar o Catskills. Não importa que a
maioria do Conselho já não residisse lá. É a sede do poder, e quem está
sentado no trono rege nossa sociedade. É a lei.

Era uma lei incrivelmente estúpida que não significa absolutamente nada
para mim.

— Posso fazer uma pergunta? — Diana rebateu. Quando eu balancei a


cabeça, ela prosseguiu. — Se você tiver sucesso na transferência do poder
para você, o que acontece?

Na pergunta inesperada, eu pisquei.

— O que aconteceria com Seth? Ele ainda estaria vivo. Eu acho que ele
ainda seria o Apollyon, só que mais fraco. O placar se inverteria. As
profecias... — Eu balancei minha cabeça. — A profecia mudaria.

— E o que isso faz com você?

Eu podia sentir os olhos em mim novamente, principalmente os de Aiden.

— Eu seria o Assassino de Deuses.

Suas sobrancelhas se juntaram em confusão.


— Por favor, não se ofenda com isso, mas não é o Assassino de Deuses a
última coisa que os deuses querem?

— Eu imagino que sim, com exceção do deus que está trabalhando com
Lucian. Esse deus quer obviamente, o Assassino de Deuses por suas próprias
razões. Falando nisso, ele deve ser Hefesto, considerando que ele criou os
autômatos — eu joguei isso, esperando que o assunto fosse mudar. — Eu não
sei por que ele faria isso, porém. Quero dizer, ele ajudou a manter-me longe
do Primeiro, certo?

Aiden assentiu.

— Ele ajudou.

— Não faz sentido, mas quando é que os deuses fazem sentido? — Forcei
uma gargalhada. — Acho que ele estava cansado de ser conhecido como o
manco.

— Mas o que acontece com os outros deuses? — ela insistiu. — Eles não
podem estar satisfeitos com a ideia.

Sem ver alguma maneira de contornar isso exceto ignorando a pergunta


dela, eu suspirei.

— Isso é o que Apolo quer. E é o que os deuses querem.

Aiden virou completamente para mim, assim como metade da sala. Eu


senti como se esgueirando sob a mesa.

— Depois de me tornar o Assassino de Deuses, eles me querem para matar


o deus responsável — Eu olhei para cima, o meu olhar se concentrou em um
busto de mármore de Zeus. — Os Olimpianos me querem para matar um dos
seus.
Trinta e cinco

Essa pequena cantiga era como o Titanic. Todo mundo estava muito
atordoado. Havia alguns palavrões perfeitos de Aiden e Marcus, e alguns
suspiros surpresos do resto da galera do amendoim[1].

Há um tipo de “Macacos me mordam” acontecendo. Os deuses tinham


lutado e por milênios, mas nunca quiseram seriamente outro morto, não
desde que os Titãs caíram. Mas as coisas estavam diferentes agora. Este
deus, surpreendentemente aquele que ninguém teria esperado, tinha ido
longe demais. Embora muitos mortais tenham morrido, os deuses estavam
mais provavelmente preocupados com o fato de que Hefesto esperava usar o
Assassino de Deuses contra eles.

Então, sim, as coisas estavam diferentes agora.

Uma vez que o choque diminuiu, Dominic nos levou ao primeiro


dormitório e nos mostrou o interior. Eles não eram como os da Ilha
Divindade. Estes quartos eram suítes – dois quartos ligados por uma sala
comum e banheiro.

Nós fomos deixados para arrumas as coisas de dormir sozinhos. Antes de


Marcus poder vir todo parental para nós novamente, Aiden reivindicou uma
das suítes para nós dois, praticamente me arrastando para dentro. Antes
mesmo de fechar a porta, ele se inclinou para que nossos rostos estivessem
apenas a centímetros de distância. Eu sabia que ele estava louco – aqueles
olhos prateados, da cor de uma nuvem de tempestade, a linha rígida de sua
mandíbula, e os seus movimentos rígidos praticamente deram a ele uma
distância. Isso e o fato de que ele não tinha muito quando olhou em minha
direção, uma vez que tinha deixado o escritório do Reitor.

— Tome um banho primeiro, e depois precisamos conversar — disse ele,


em voz baixa, não deixando espaço para discussão. Ele desapareceu em seu
quarto antes que eu pudesse concordar.

Os lábios de Olivia se apertaram.


— Alguém não é um campista feliz.

— Posso dividir beliche com você? — Eu estava meio brincando.

Ela encostou-se à porta da suíte em frente a minha, sorrindo


ligeiramente. Os cachos caídos ao redor do rosto. Sombras floresceram sob
seus olhos.

— Meu quarto é o seu quarto, mas sério, você precisa falar com ele. É
óbvio que ele não sabia o que você tinha sido convocada a fazer. Nenhum de
nós sabia.

Eu limpei meu rosto sujo.

— Eu... eu não tinha certeza se deveria dizer algo.

— Isso importa?

— Eu acho que não. Eu só não quero que ninguém se preocupe.

— Eu entendo isso. Tenho certeza que ele também entende, mas existem
algumas coisas que você não deve esconder daqueles que te amam — Olivia
se virou, abrindo a porta. — Fale com ele.

Não era como se eu tivesse uma escolha quando se tratava de falar com
ele.

— Obrigada.

Ela assentiu com a cabeça e, em seguida, entrou em seu quarto.


Deixando escapar um suspiro alto e grande parte detestável, eu fui para o
meu quarto. Meu olhar foi imediatamente para a cama tamanho-gigante e eu
gemi.

— Um banho primeiro. Épica sessão vadia em segundo, um sincero pedido


de desculpas em terceiro, e depois dormir.

***

Acabando de sair banho, fiquei emocionada em poder encontrar alguém


que havia vestido um par de jeans e uma camisa limpa que me serviam. Mais
Aiden provavelmente tinha feito isso enquanto eu estava monopolizando
toda a água quente. Isso era tão a cara dele, mesmo quando ele estava com
raiva de mim. Sozinha por alguns momentos, eu me sentei na cama e cruzei
as pernas. As paredes do quarto eram de um agradável tom de ouro, enquanto
a porta e janelas eram aparadas com titânio, assim como a cabeceira da
cama e a pequena mesa de canto. Na parede oposta, uma imagem de Artemis
caçando com seu arco e flechas era enquadrado em titânio também.

Era como se essas pessoas esperassem daimons saindo de debaixo de suas


camas.

Mas estudar a decoração não era o motivo de me sentar na cama como


uma impressionante budista. Desde a aparição de Seth depois da morte de
Lea, ele estava estranhamente silencioso. Como se ele tivesse partido, na
verdade. A corda ainda estava lá, mas a sua presença inconfundível estava
ausente. Como antes do despertar, quando minha cabeça e o corpo tinham
sido meus.

Fechei os olhos e me concentrei na corda. Estava lá, cantarolando


baixinho e quase imperceptível.

Mas não havia Seth.

Eu comprimi meu rosto em concentração. Esta porcaria de chamada


telefônica a longa distância interna maluca deveria ser capaz de funcionar
nos dois sentidos. Talvez eu estivesse louca para ser aquela a iniciar o
contato, mas um Seth tranquilo deixava uma Alex realmente nervosa. Isso
não soava como ele. Ele estava tramando algo. Ele tinha que estar.

Seth? Chamei o nome dele de novo... e de novo. Em algum momento, eu


ouvi um silvo baixo do chuveiro e depois sendo desligado. O som abafado de
uma porta se fechando, seguido minutos depois. Esse foi o tempo que fiquei
lá, parecendo uma falha épica em meditação.

A porta para a sala de estar se abriu, e Aiden entrou carregando um prato


de frutas e fatias de peru assado.

— Eu trago presentes na forma de alimentos – o que você está fazendo?

— Nada — Eu corei quando eu dei um tapinha no local ao meu lado. — Eu


estou morrendo de fome. Obrigada — E eu também fiquei surpresa que ele
estava me trazendo comida.

Aiden sentou ao meu lado, colocando a bandeja entre nós. Ele cheirava a
sabão limpo e especiarias. Tirando algumas fatias do caminho, ele encontrou
um grosso pedaço de carne escura.

— Aiden...

— Coma primeiro.

Eu fiz uma careta para ele, mas ele segurou o peru muito perto e minha
boca encheu de água. Tomando isso dele, nós passamos os próximos vários
minutos ingerindo carne e frutas em excesso. Quando eu persegui um
morango maduro em toda a bandeja, ele inclinou-se e colocou uma mecha
úmida de cabelo de volta atrás da minha orelha. Olhei para cima e nossos
olhos se encontraram. Todo o ar fugiu dos meus pulmões. Aiden estava,
provavelmente, pronto para me estrangular, mas aquele olhar em seus olhos
prateados... uau, simplesmente uau.

Aiden se inclinou para trás, me observando, estudando o rubor que eu


sabia que estava se espalhando como uma febre em todo o meu rosto.

— Antes que isso vá mais longe, o que você fez com os autômatos foi
nada menos que incrível. Eu não tive a chance de te dizer, mas eu queria que
você soubesse.

Eu pisquei.

— Sério?

— Sim. Esse tipo de poder – era épico e gracioso. Foi muito


surpreendente.

Meu olhar caiu para o prato vazio.

— Se eu não tivesse me desgastado, eu poderia ter salvado Lea.

Seus dedos encontraram meu queixo, inclinando-o.

— Não se culpe pelo que aconteceu com ela. Sua morte não foi culpa sua.
E se você não tivesse usado o seu poder, todos nós teríamos morrido.

Eu assenti. Aquelas palavras não eram tão fáceis de engolir como de


dizer.

— Acabou? — Aiden apontou para o prato e tigela. Ele os colocou sobre a


mesa quando eu assenti novamente. Houve um momento de silêncio, onde
ele apenas olhou para mim até que eu me contorci. Ele suspirou. — Como
você pôde não me contar, Alex?

— Eu não queria que você se preocupasse — eu disse sem muita


convicção.

Seus olhos se estreitaram.

— Isso é besteira, Alex.

Eu pulei, com os olhos arregalados.

— Estamos nisto... nesta bagunça juntos, certo? Ambos faríamos


qualquer coisa um pelo outro, estou correto? — Ele não me deu a chance de
responder. Ele estava realmente em um rolo. — Nós nos amamos. E pode me
chamar de burro ou antiquado, mas acho que tudo isso significa que nós não
guardamos segredos um do outro, especialmente segredos potencialmente
perigosos que a outra parte realmente deve saber.

Minhas bochechas estavam queimando por uma razão completamente


diferente agora. Tudo o que ele disse era verdade. Mantê-lo no escuro havia
brotado a melhor das intenções, mas ele estava certo.

— Eu sinto muito e eu quero dizer isso. Eu deveria ter lhe contado


quando eu descobri isso.

Suas sobrancelhas se abaixaram.

— Quando foi que você descobriu? Espere. Enquanto estávamos no


Submundo, certo? Você estava diferente quando voltamos.

Droga. Ele era bom.

— Foi quando eu estava falando com Solaris. As coisas meio que


estalaram, e então eu confrontei Apolo. Ele confirmou que os deuses queriam
que eu me tornasse o Assassino de Deuses para que eu pudesse parar o deus
responsável.

Aiden amaldiçoou sob sua respiração.

— Às vezes eu quero bater naquele bastardo.


— Junte-se ao clube.

Ele ficou em silêncio por alguns momentos.

— Eles esperam que você lute com Seth e tenha o poder transferido para
você. Então, eles esperam que você lute com esse deus?

Eu balancei a cabeça.

— Eu não gosto disso – eu não quero que você faça isso — Raiva queimou
em seu olhar. — Isso é muito perigoso, cada parte disso. Além do fato de que
Seth poderia transferir o poder de você, Nenhum deus vai facilitar. É uma
loucura.

Era, mas quando alguma coisa na minha vida tinha sido completamente
sã? Me mexi mais perto dele.

— Mas isso tem de ser feito, Aiden. Mesmo se conseguirmos parar Lucian
e Seth, este deus vai tentar algo novo. Olhe para todas as pessoas que
morreram.

— Eu não... — Ele se interrompeu.

— Você não o quê?

Ele olhou para cima, suas características rígidas.

— Eu ia dizer que eu não me importo. Não quando você pode morrer


fazendo isso. Eu não me importo.

Eu não tinha ideia do que dizer a isso, e eu sabia que foi preciso muito de
Aiden para admitir isso. Inferno, seria preciso muito de qualquer um para
admitir isso. Mas era a verdade, e às vezes a verdade não era bonita ou ética
ou justa. Ela só era.

Aiden inclinou a cabeça para trás e suspirou.

— E se eu lhe pedisse para não fazer isso?

Minha boca se abriu em surpresa, mas as palavras não saíam.

Ele balançou a cabeça.


— Eu sei que não posso pedir isso. Eu sei que é incrivelmente egoísta.
Não responda isso, tá?

Lágrimas subiram na parte de trás da minha garganta tão rapidamente


que eu não acho que eu seria capaz de detê-las. Por algum milagre eu
consegui. Eu sabia que precisava dizer que havia uma boa chance de que eu
não iria sobreviver a isto no final. Não era como se eu estivesse desistindo,
pois Deacon meio que me deu o pontapé no traseiro que eu precisava, mas
isso não alterava a possibilidade.

Aiden fez um som na parte de trás de sua garganta e ele estendeu a mão
para mim. Eu fui, subindo em seu colo. Com os braços dele me rodeando, me
apertando com tanta força contra ele que eu podia sentir o seu batimento
cardíaco, eu não podia dizer-lhe isso agora. Eu não acho que eu poderia dizer
a ele.

E essa era a coisa sobre verdades e segredos. Às vezes a verdade não


precisa ser conhecida. A mentira é mais saudável do que a verdade e,
enquanto alguns segredos podem libertar as pessoas, outros segredos podem
destruí-las.

Eu não me sentia bem sobre isso quando eu fechei os olhos. A culpa


revolvia no meu estômago como um punhado de pedras afiadas, mas esse
segredo não foi feito para ser compartilhado.

Finalmente, o aperto de Aiden soltou e suas mãos se moviam para meus


ombros. Ele me segurou, seu olhar procurando o meu rosto.

— Você está tendo dores de cabeça recentemente?

Grata pela mudança de assunto, eu balancei minha cabeça.

— Não desde que... Lea morreu. Seth estava lá depois, mas ele se foi. Quer
dizer, eu ainda posso sentir a corda, mas é estranho. É como se ele tivesse
tirado umas férias.

Aiden arqueou uma sobrancelha.

— Ele está tramando algo.

Um pequeno sorriso puxou meus lábios.


— Exatamente o que eu estava pensando.

— Grandes mentes pensam da mesma forma — Com uma mão, ele alisou
o polegar sobre meu lábio inferior. — Você deve estar exausta.

Eu dei de ombros.

— Assim como você.

— Devemos descansar um pouco — Sua mão caiu no meu ombro.

— Marcus não vai ficar feliz com você dormindo aqui.

— Eu sei — Ele encostou-se na cabeceira da cama, com os olhos


cobertos. — Nós provavelmente vamos ter que cortar toda a coisa de dormir
juntos de novo.

Eu fiz beicinho.

Aiden deu uma risadinha.

— Eu disse sobre dormir juntos, Alex. O que tenho em mente não envolve
o sono.

— Oh — Calor espalhou-se através de mim como se eu estivesse de volta


ao chuveiro fumegante. — Oh.

Um lento sorriso surgiu em seus lábios enquanto suas mãos se


espalhavam pelos meus braços para os meus quadris. Esse calor vertiginoso
roubou a medula dos ossos.

— Um pouco lenta para captar, hem?

Eu ri e foi... bom rir. Inclinando para frente, eu pressionei minha testa


na dele.

— Sinto muito. Minha mente não está na sarjeta, como algumas pessoas
que eu poderia citar.

— Se você diz — Suas mãos se apertaram — Nós vamos ter que ver isso.

Aiden se moveu tão rapidamente que em um segundo eu estava em seu


colo, e no seguinte eu estava de costas e ele estava pairando acima de mim.
Ele abaixou a cabeça para que seus lábios roçassem o meu baixinho. Isso
tudo – um simples toque quase me desfez.

— Eu te amo — ele disse, e essas foram as últimas palavras ditas por


algum tempo.

[1] Figurativo = pessoas cujas críticas são consideradas como irrelevantes ou insignificantes
lembrando as pessoas ignorantes que jogam amendoim no palco para expressar descontentamento
com a performance
Trinta e seis

Aiden não tinha deixado a cama, então suponho que tirar as coisas de
dormir não iria começar hoje. Não que eu estivesse reclamando. Depois de...
bem, não dormir e depois dormir por várias horas, e um pouco mais de não
dormir, nós fomos convocados por uma batida na porta.

Trocamos um olhar rápido.

— Uh, eu deveria estar atendendo à porta, já que este é o meu quarto?

Aiden assentiu e eu comecei a subir, mas ele pegou meu braço.

— Você pode querer vestir algumas roupas primeiro.

— Oh. Ha. — Dei uma risadinha enquanto começava a procurar minhas


roupas. — Boa ideia.

— Uh-huh.

Saltando ao redor do quarto, enfiei minhas pernas nas calças jeans.

— Já estou indo!

Eu tinha certeza que Aiden conseguiu uma boa olhada divertida, e meu
rosto estava vermelho-sangue no momento em que cheguei à porta. Abrindo
o bastante para que eu deslizasse através dela, vi Dominic.

— Hey — eu disse, esperando que eu não estivesse com um cabelo de


travessa na cama.

Sua expressão permaneceu branda.

— Sinto muito que eu tenha te acordado, mas temos novas chegadas. Um


deles, acredito, era um Instrutor na Ilha Divindade.

— Sério? Uau. Onde eles estão?

— Atualmente, com o Diretor — ele respondeu. — Seu tio já está ciente.


Passei pelo quarto do Sentinela St. Delphi, mas…

— Oh. É, hm… — Eu tinha bastante certeza de que me igualava a um


caminhão de bombeiros. — Ele tem um sono pesado.

— Tenho certeza que tem — Dominic deu um passo atrás. — Se desejar se


juntar ao seu tio, estarei esperando do lado de fora. Você deve ter tempo para
ficar pronta. Seu tio tem um... sono pesado, também.

O queeee… e então eu entendi. Eca. Eca. Eca.

Correndo de volta para o quarto, fechei a porta, e então me apoiei nela.

— Queridos deuses, isso foi embaraçoso. Você ouviu?

Aiden estava de pé ao lado da cama, abotoando as calças. Meus olhos


ficaram parados em seus dedos e então naquele abdômen.

— Sim. Ele não disse quem era?

Eu não estava com sede, mas minha boca estava com certeza seca.

— Não. Só que era um Instrutor. Você acha que devemos dar uma olhada?

— Claro — Músculos surgiam enquanto ele alcançava por cima da


cabeça, vestindo uma camisa. — Acho que vai ser bom ver um rosto familiar.

Eu pensava que seria bom para ele tirar aquela camisa, mas o que eu
sabia? Depois de passar uma escova pela minha massa de cabelo, peguei uma
adaga esguia, a escorreguei no meu bolso de trás, e puxei minha camisa para
baixo sobre o cabo.

Adagas. Nunca saia de casa sem elas.

Era tarde da noite e o ar parecia excepcionalmente frio quando nos


juntamos a Dominic e meu tio. Então novamente, estávamos bem no alto
nas montanhas, mas eu estava bem positiva de que era o início de maio e fiz
uma nota mental de encontrar um calendário prontamente.

— Eu me pergunto quem é — eu disse, me sentindo um pouco nervosa.


Um mau caso do distúrbio de hiperatividade estava provavelmente prestes a
ocorrer.
— Eu não sei — Marcus disse.

Aumentei meu passo para ficar junto com as aberrações de pernas longas.

— Você sabe de algum Instrutor que tenha escapado?

— Muitos não estavam no campus quando Poseidon atacou.

— É verdade. Eles estavam de férias — Enfiei as mãos nos bolsos do meu


jeans. — Então realmente poderia ser qualquer um.

Marcus olhou de relance para mim, uma única sobrancelha arqueada.

— Realmente poderia ser.

Tirei minhas mãos dos bolsos.

— Por que Diana não veio?

Meu tio me atirou um olhar e eu sorri abertamente.

— De qualquer forma, espero que seja alguém que eu conheço — Comecei


a enfiar as mãos de novo nos bolsos, mas Aiden agarrou meu pulso.

Ele franziu o cenho.

— Qual é o seu negócio?

— O que quer dizer?

— Você está agindo um pouco hiperativa agora.

Tirei minha mão livre.

— Não sei. Só estou hiperativa.

— Oh, ótimo — Marcus resmungou.

Atirando-lhe um olhar, tentei manter meus movimentos agitados a um


mínimo. Não era hiperatividade. Mais como nervosismo, mas eu não tinha
nenhuma razão para ficar nervosa. Bem, além do óbvio, mas isto era
diferente. As marcas do Apollyon estavam sangrando através da minha pele,
passando preguiçosamente para glifos.
As escadas não foram tão assassinas desta vez. Como sempre, dois
Guardas estavam postados no final do corredor, do lado de fora das portas do
Reitor. Eles deram um passo para o lado enquanto abriam a porta e nós
entramos. Curiosidade tinha começado a superar o nervosismo em algum
lugar nas escadas.

Meu olhar vagou sobre a sala, encontrando Reitor Elders primeiro, e


depois para o lado distante da sala, para a janela em forma oval e a figura
que estava de pé na luz, as costas dele para nós.

Aiden e eu ficamos para trás enquanto Marcus caminhava a passos largos


até a mesa. Eu não tinha certeza se Reitor Elders realmente nos queria aqui.

— Reitor Andros — Reitor Elders disse, curvando-se ligeiramente. —


Obrigado por se juntar a nós. Nossa mais nova chegada estava muito
satisfeita de ouvir que alguns de seus colegas da Ilha Divindade do Covenant
tinham alcançado nosso campus.

O homem perto da janela virou-se lentamente, e eu reconheci o cabelo


escuro ralo, tom de pele oliva, e olhos próximos de cor obsidiana. Minha boca
caiu todo o caminho até o chão.

— Você tem que estar brincando comigo — eu disse.

Instrutor Romvi deu um sorriso tenso.

— Fico feliz em te ver também, Srta. Andros.

Bem, suponho que eu sabia da minha suspeita sobre alguns membros da


Ordem escapando de Seth e dos Sentinelas. Um deles estava agora de pé na
minha frente.

Aiden e Marcus se moveram na minha direção, retirando adagas. O pobre


Diretor da Universidade parecia que estava prestes a ter um ataque cardíaco.

— Guardas! — Ele berrou, movendo-se para trás de sua mesa, como se


isso pudesse de alguma forma protegê-lo no caso da merda estar prestes a
bater no ventilador.

As portas atrás de nós voaram abertas e os dois entraram, olhos


dardejando ao redor da sala. Dominic estendeu sua adaga também.
— O que diabos está acontecendo?

Tudo isto não era necessário. Eu já não era mais a aluna em aula. Eu era
o Apollyon e estava totalmente carregada. Deixe Romvi tentar alguma coisa.
Eu tinha seriamente ansiado por jogar sua bunda de macaco pela janela.

— Ele é um membro da Ordem de Thanatos, que tentou matar Alex —


Fúria rolava para fora de Aiden, e eu esperava que algo pegasse fogo. — Ele
não é o que consideraríamos um conhecido amigável.

Instrutor Romvi juntou as mãos na frente dele.

— Pelo que me lembro, não fui eu quem realizou a ação, que foi bem
sucedida, posso acrescentar.

Oh, essa foi a coisa errada a dizer.

A postura de Aiden disse que estava prestes a romper todos os tipos de


mau.

— Correto, mas você é um membro da Ordem e...

— Tem a capacidade de matar o Apollyon? — Interrompeu Romvi. — Sim.


Tenho. Mas eu sou muitas coisas. Estúpido não é uma delas. Parece que Srta.
Andros tem muitos deuses ao lado dela, e a única verdadeira missão da
Ordem é servir aos deuses.

— E isso significava me matar? — Eu disse, cruzando os braços.

Seus olhos encontraram os meus.

— Significava na época.

— E não mais? Nós deveríamos acreditar nisso?

Romvi ergueu a cabeça para o lado.

— Estamos do mesmo lado, Srta. Andros.

Aquela sensação nervosa, de excesso de cafeína, estava de volta,


amarrando meu estômago em nós. As runas estavam realmente
enlouquecendo agora.
— E que lado é esse, Romvi?

— O único lado que existe para se ficar — ele respondeu. — Na guerra,


existe apenas um lado para verdadeiramente se ficar, e esse é o lado que
ganha. E não se engane, Srta. Andros, estamos em guerra.

— Você nunca pareceu o tipo filosófico — Aiden disse.

O sorriso de Romvi não escorregou.

— Tenho certeza que eu não parecia muito para você, St. Delphi.

Aiden respondeu, mas eu não estava escutando. Estava tendo uma


sensação esquisita de novo, a que eu tinha tido enquanto estava de pé na
Sala de Guerra no palácio de Hades. Aquela sensação bizarra, incômoda,
como se houvesse algo que eu deveria lembrar, que eu deveria ver. Era muito
mais forte agora.

— Em tempos como estes, devemos abandonar antipatia mútua — Romvi


ainda não tinha se aproximado mais, mas eu me senti... sufocada pela sua
presença. — Devemos trabalhar juntos.

— Nós sempre estamos em guerra — murmurei, me sentindo muito, muito


esquisita.

Romvi arqueou uma sobrancelha fria.

— Você se lembra dos meus ensinamentos. Isso me agrada.

Pensei na coisa mais estranha então. Quando Romvi e eu tínhamos


lutado uma vez, o que ele tinha me dito? Eu deveria cortar meu cabelo. Algo
a ver com vaidade, mas eu recordei daquela Sala de Guerra com excessiva
facilidade e o que Perséfone dissera.

Ele gosta de cortar o cabelo daqueles que ele conquista e depois


pendurá-los para que todos vejam.

Lentamente desdobrei meus braços. Meu coração acelerou. Romvi estava


me observando com curiosidade, como se estivesse esperando por algo.
Memórias do que Perséfone dissera se juntaram rapidamente. Para ele, tudo
é sobre guerra e seus despojos… O que ela tinha dito sobre ele? Sem guerra,
não havia nada.
— Nunca se deve virar as costas em uma guerra — eu disse, movendo
minha mão por trás de mim. — Também me lembro de você dizendo isso.

E também me lembro de Perséfone dizendo isso sobre…

O olhar de Romvi caiu.

— Não. Nunca se deve virar as costas em uma guerra. Acredito que é por
isso que estamos onde estamos hoje. Os tolos têm virado as costas para isso,
mesmo que guerra sempre exista.

De repente, a sensação esquisita, nervosa e as marcas faziam sentido.


Não era nervosismo ou hiperatividade. Não, nem um pouco. E os autômatos.
Havia outro deus que podia exercer controle sobre eles – eles eram criaturas
criadas para lutar. Havia os exércitos mortais que estavam apoiando
Lucian. Isso fazia sentido agora.

Filho de um burro daimon.

Me movendo rápido com um raio, puxei a adaga do Covenant do meu


bolso de trás. Com velocidade e precisão perfeita, lancei a lâmina do outro
lado da sala.

A extremidade pontiaguda se incorporou profundamente no peito de


Romvi antes que ele pudesse dar um próximo suspiro.

— Que diabos? — Marcus explodiu, girando para mim. — Qual o


problema...?

Aiden virou olhos arregalados para mim.

— Alex…? Santa merda…

O Diretor da Universidade partiu em direção a Romvi, mas parou


abruptamente. E Marcus e Aiden se acalmaram, porque Romvi ainda estava
de pé.

E ele estava rindo.

Marcus deu um passo para trás.

— Que di…?
Os Guardas e Dominic trocaram olhares, e depois se moveram em direção
ao Diretor, rodeando-o e deslocando-o em direção à porta.

A risada de Romvi desvaneceu.

— Eu estava começando a pensar que você não era tão esperta assim,
Srta. Andros.

Então um molde azul cintilante rodeou o corpo de Romvi, rodopiando em


torno dele até que não pudéssemos ver o homem por trás do brilho sinistro,
divino. Então retrocedeu, revelando o que estava por trás disso.

Ares era impressionante.

Bem mais de dois metros de altura, ele se aproximava do tamanho do


Godzilla com sua altura e massa. Ele tinha mais músculos do que um lutador
profissional, como Apolo com esteroides.

Ele usava calças de couro e uma túnica que estava perfurada pela adaga
do Covenant ainda em seu peito. Faixas tipo cobra cobriam seus bíceps, mas
enquanto ele levantava um braço, percebi que não eram faixas mesmo.

Eram cobras de bronze, pulsando e deslizando em torno de seus braços.

— Santa merda — sussurrei.

Levantando a mão, Ares envolveu uma mão carnuda em torno do punho


do cabo e puxou a adaga livre. Ela virou pó em suas mãos.

— Isso não foi muito agradável, Srta. Andros. Os deuses e o Conselho


temem o Primeiro, mas quem é aquela arremessando adagas em um deus?

Dizer que eu não estava assustada seria uma mentira deslavada. Ares era
o deus da guerra e da discórdia. Exércitos tremiam aos seus pés e nações
caíam sob sua ira. Seus filhos eram deuses de terror e miséria. Não havia
uma única coisa sobre ele que não enviava um pico de medo direto através de
mim ou de qualquer outra criatura viva, respirando.

Este devia ser o deus que fazia parte da linhagem de sangue de Seth,
aquele que vinha trabalhando nos bastidores com Lucian.

Estávamos tão ferrados.


Pelo menos agora eu podia entender como Romvi podia chutar a minha
bunda dia, noite e aos domingos. Isso me golpeou então. Eu tinha estado
lutando com Ares. Queridos deuses…

Seu olhar frio e apático flutuou sobre nós[V1] .

— Silêncio? Ninguém vai se acovardar diante de mim? Implorar por


misericórdia, como milhares têm feito antes de vocês? Que decepcionante.
Mas haverá tempo para isso no futuro.

— Como? — Marcus sufocou.

— Como o quê? — As sobrancelhas escuras de Ares subiram. — Como


tenho estado bem debaixo dos seus narizes todo este tempo? Da mesma
forma, aparentemente, que Apolo estava, eu assumo. Eu o evitava sempre
que ele estivesse por perto, e portanto ele nunca me sentiu. O Menino de
Ouro tinha suas suspeitas, tenho certeza, mas... bem, ele só não é tão
esperto assim, é?

— O que você quer? — Eu estava orgulhosa que a minha voz não tremeu.

Ares limpou o pó de sua mão.

— Oh, você sabe. Só... tudo. E para conseguir tudo, eu preciso que você
se conecte com o Primeiro.

Ciente de que Marcus e Aiden estavam se movendo atrás de mim, inclinei


meu queixo para cima.

— Isso não vai acontecer.

Ele suspirou.

— Eu realmente esperava que eu não tivesse que acrescentar o já clichê


“senão” no final disso, mas eu vejo que tenho. Você pode tornar isto muito
fácil, muito indolor. Você sabe o que eu sou, do que eu sou capaz. Apollyon
ou não, você não pode sequer começar a esperar me derrotar. Eu sou o deus
da guerra. Conecte-se com o Primeiro.

Mantive minha posição.

— Senão o quê? Você vai ficar aí e me encarar até a morte? Você não
pode me matar. E não pode me forçar a me conectar com o Primeiro.
O sorriso que foi gravado em seus lábios enviou uma onda de choque
gelada através de mim.

— Você está certa e errada. Eu posso não ser capaz de te matar, mas
posso te dobrar a minha vontade e posso fazer você desejar a morte. E posso
matar todos aqueles que você ama.

Ares jogou seu braço para fora, e várias coisas aconteceram em questão
de segundos. O Guarda mais próximo a ele foi arremessado do outro lado da
sala e através da janela de que eu quis atirar em Romvi/Ares. O segundo
Guarda aproximou-se dele e Ares fechou o punho. O Guarda desmoronou no
chão, sangue fluindo de seu nariz, boca e orelhas. Dominic estava ao lado.
Ele foi lançado para trás, seu corpo se contorcendo e torcendo no ar. Ossos
estouraram pela pele. Ele não era nada além de uma bagunça mutilada
quando atingiu o chão. Em seguida, Ares se virou contra o Reitor da
Universidade.

Ares virou o pulso e a cabeça do homem torceu para o lado. O estalo do


osso ecoou pela sala.

Aiden começou a me rodear e verdadeiro terror roubou o fôlego. Em um


flash de horror, eu o vi tomando o lugar de Dominic, assim como iria
Marcus. Ares iria matá-los. Tudo estava acontecendo rápido demais, mas não
havia nenhuma maneira que eu pudesse permitir isso.

Fiz a única coisa que eu podia fazer.

Atirando meu braço em direção à porta, convoquei o elemento de ar e o


usei contra Aiden e Marcus. A rajada de vento foi tão forte que não havia
nada que eles pudessem fazer senão se submeter a ela.

Houve um segundo quando os meus olhos encontraram os de Aiden, antes


que ele fosse empurrado pela porta junto com Marcus, quando eu vi o horror
absoluto em seus olhos prateados. Quando eu soube que havia uma boa
chance de que ele nunca me perdoaria por isto.

As pesadas portas se fecharam e trancaram por dentro.

— Você não é uma estraga-prazeres — Ares disse, rindo baixinho. — Eu


estava realmente ansioso para arrancar o coração de St. Delphi na sua
frente. Mas há sempre o depois.
Virei-me devagar, minha respiração travando na garganta.

Ares piscou.

— Agora é só você e eu.

— Bem, isso não é bizarro, nem nada.

— Ah, isso é a sua cara. Fazer piada quando está com medo — Suas
grandes botas bateram forte quando ele deu um passo à frente. — Ou do que
eles chamam? Você é “irritável”?

Meu peito subia bruscamente enquanto punhos socavam a porta atrás de


mim. O grosso titânio silenciava suas vozes.

— Isso é o que algumas pessoas dizem.

— Hmm… — Ares inclinou a cabeça para o lado, sobrancelhas levantadas.


— Sabe o que eu acho sobre este sarcasmo que você faz? É uma pobre
tentativa de mascarar quão afetada você é pelas coisas. O quê? — Ele sorriu
abertamente. — Você parece tão surpresa. Você acha que eu não te conheço?
Que não tenho te observado tanto tempo quanto Apolo tem? Veja, eu sou
apenas mais esperto do que ele. Afinal de contas, sou um grande estrategista.

— O deus da guerra vem me perseguindo? Uau, eu me sinto muito


especial. Normalmente, os outros deuses são conhecidos por essas coisas
arrepiantes, mas você? Uau.

Ele riu de novo, o som profundo, mas plano.

— Você é divertida. Muito bonita, também. Vejo porque Seth é bastante


afeiçoado a você.

— Estou supondo que, já que você está aqui, Seth não vai estar muito
para trás.

Ares apenas sorriu, e os punhos na porta continuaram.

— Como você me encontrou, a propósito? — Perguntei, ganhando tempo.


Para quê, eu não tinha certeza.

— Oh, eu tenho camaradas por toda parte, garotinha. Maneiras de


contornar talismãs estúpidos — Mais um passo e ele estava a apenas sessenta
centímetros de distância de mim. — Você está tremendo — ele sussurrou.

Eu estava?

— Você foi para o Submundo recentemente. Por favor, explique, para


quê?

Minha garganta parecia que estava se fechando.

— Bem, acho que você não tem camaradas por toda parte, se você não
sabe.

Ares sorriu maliciosamente.

— Encantadora. Você vai me contar o que estava fazendo lá, ou isto vai
acabar com você não sendo capaz de falar. A escolha é sua.

Eu me recusei a recuar mesmo que cada instinto gritasse para eu fazer


isso.

— Pensei que isto ia acabar comigo implorando pela morte. Como posso
fazer isso quando eu não posso falar?

Ele riu de novo.

— Você é tão simples, garotinha. Existem outras maneiras de implorar


pela morte além de com palavras.

— Existem? — Minha voz falhou um pouco e eu me encolhi.

Seus olhos totalmente brancos cintilaram.

— Eu tenho visto isso tudo em batalha. Existe a maneira como o corpo se


enrola em si mesmo quando quer a morte. Existe o grito silencioso por
liberação. Existem os olhos, e eles falam mesmo quando a língua não
funciona mais. E depois existe a alma que apodrece tão pobremente quando
a morte é desejada mas recusada, que carrega um certo mau cheiro.

Gelo disparou pelas minhas veias, transformando meu sangue em neve


derretida. Naquele momento eu soube que, não importa o quanto eu lutasse
contra, isto… isto ia ser uma droga.

— Então a menos que queira experimentar estas coisas em primeira mão,


você vai me contar por que estava no Submundo, e depois vai se submeter.

Engoli, me encolhendo enquanto punhos batiam na porta atrás de mim


de novo.

— Eu não sou boa na coisa toda de submissão.

— Você pode querer repensar isso — Ele soava civil enquanto sugeria isso
— Olhe para isto racionalmente, garotinha. Tudo o que eu peço é que você se
conecte com Seth. Permita que ele faça o que foi feito para fazer. Isso é tudo.
Ele vai cuidar de você. Você sabe disso. Como isso é tão ruim?

— Ele vai me despir de quem eu sou.

— E daí? Você vai estar feliz e viva. Você não vai desejar nada —
Inclinou o queixo para baixo quase divertidamente. — Eu vou até deixar as
pessoas que você ama vivas. É uma situação de ganho dos dois lados.

— Exceto para os deuses que você quer eliminar, e milhares, se não


milhões, de pessoas que vão morrer.

Ele deu de ombros.

— Consequências de guerra.

— Doentio — eu disse.

— É a verdade.

Meu estômago se agitou.

— Por que... por que você está fazendo isto?

— Por que não? — Ele bateu um longo dedo de leve no meu queixo. — Por
tempo demais os Olimpianos têm se sentado em seus tronos sem fazer nada.
Deixando o mundo inteiro ser infestado dos filhos dos semideuses e mortais,
enquanto nós estamos isolados no Monte Olimpo. O mundo deveria ser nosso.

Balancei minha cabeça.

— O mundo pertence à humanidade.

— O mundo pertence aos deuses! — Rugiu, olhos crepitando. — A mim e a


qualquer outro deus que veja a verdade. Isso é a quem o mundo pertence.

Meus dedos se enrolaram impotentes.

— Por que você só não me leva até Seth? Por que tentar me convencer?

— Bem, eu não posso realmente só fazer você surgir lá, agora eu posso?

— Você não pensou bem nisso, não é? — Forcei uma risada. — Você
poderia só me nocautear e me enfiar em um carro. Por que passar por isto?

Suas sobrancelhas desceram e um músculo pulsou em sua mandíbula

— Há uma coisa. Você não pode me forçar a ir com você — Meu pulso
acelerou. — Pode?

O deus estava fervendo.

— Você é o Apollyon. Portanto, não posso forçar você, mas tenha em


mente, garotinha, que eu posso e vou te machucar.

— Esta “garotinha” está tendo dificuldade para acreditar nisso —


Coragem alimentou minha bravata, o que geralmente nunca era uma boa
combinação. — A menos que você seja como cada vilão que quer dar um
discurso longo, desnecessariamente chato, eu imaginaria que você fosse um
tipo de deus que age mais e fala menos.

Os lábios de Ares se separaram.

— Você não tem ideia. As regras que protegem o Apollyon são como todas
as coisas na natureza – equilibradas. Embora você não possa ser forçada com
compulsão ou à mão, pode ser persuadida por certos outros meios.

— Você é uma droga como vendedor, então não está persuadindo uma
porcaria.

Ele soltou um rosnado baixo, profundo.

— Submeta-se, ou que assim seja.

Encontrei os sinistros olhos totalmente brancos.

— Vá para o inferno.
Por um momento, ele quase pareceu desapontado, como o tipo de
desaprovação que os pais sentem quando seu filho é estúpido demais para
descobrir alguma coisa, mas depois sorriu amplamente.

— Eu não acho que Seth vai gostar disto, mas oh, bem.

— O que...?

Ares disparou para a frente, de frente para mim em meio segundo. Todos
os pensamentos de Seth fugiram, e instinto entrou em ação. Convoquei
akasha, sabendo que não iria matar, mas esperando que fosse mandá-lo de
volta ao Olimpo com o rabo entre as pernas, mas isso não foi o que
aconteceu.

Ele pegou meu braço pelo pulso e apertou com o que era provavelmente a
mais leve pressão, mas o pico de dor me fez perder a concentração.

— Você não vai gostar da minha persuasão, garotinha.

Em seguida, ele me empurrou, e eu atingi a porta com força suficiente


para tirar o ar de mim. Infelizmente, seu discurso de Dr. Evil não tinha sido
totalmente pompa. Mas se ele podia me machucar, eu podia aguentar. Eu
não ia me submeter. Demais estava em jogo. Vidas demais. Eu podia lidar
com isto, e tudo o que podia esperar era que ele esquecesse de Aiden e Marcus
quando acabasse, ou que eles fossem conforme programado e dessem o fora
daqui.

Eu posso lidar com isto.

Empurrando fora da parede, girei para a direita e estendi o braço, mas


onde seu peito tinha estado, estava um espaço vazio, e eu tropecei nele.

— Errou.

Rodopiei ao redor, encontrando-o atrás de mim. Descendo, eu varri a


minha perna em sua… mas não atingi nada além de ar.

— Você pode continuar com isto, se quiser.

Olhando para cima, ele estava encostado na porta, braços cruzados.


Agora eu estava começando a ficar puta. Me levantando, ganhei impulso e
empurrei para o ar, me torcendo para o perfeito chute borboleta que…
Braços me arrebataram do ar pelas costas e soltei um ofego surpreso.

Ele me segurou como se eu fosse nada mais do que um saco de arroz.

— Eu sou o deus da guerra, garotinha. Não há nenhum movimento que


você saiba, nenhum método de batalha ou manobra que eu não saiba.

Porcaria.

— Vou sempre estar um passo à frente. Vou sempre pensar mais rápido
que você. Você não pode lutar contra mim.

Atirando a cabeça para trás, atingi seu ombro amplo e duro. Então
balancei as pernas, mas Ares me largou. Tropeçando para os meus pés, vi que
ele não estava na minha frente.

Dupla porcaria.

Rodopiando ao redor, eu dei um chute em nada. Girei de volta e, de


repente – queridos deuses – sua mão estava na minha garganta, me
erguendo do chão enquanto eu chutava e arranhava sua mão, em pânico e
distraída demais para tentar convocar akasha de novo.

— Você vai desejar a morte até o momento em que eu acabar — Seus


dedos cavaram profundamente, cortando meu suprimento de ar. — Você vai
implorar por ela de todas as maneiras que eu listei. Você teve sua escolha.
Você teve sua diversão. Fim de jogo.

Por um segundo aterrorizante, pensei que ele fosse esmagar a minha


traqueia, e disse a mim mesma novamente que eu podia lidar com isso. Mas,
então, de repente eu estava voando para trás pelo ar. Atravessei o aquário.
Vidro afiado fatiou minhas costas enquanto água e peixes derramavam a
minha volta.

Atingi o chão no meu lado. Peixes vibrantemente listrados rosa-e-azul


caíram pesadamente no chão de mármore. Sugando uma inspiração afiada
contra a dor, coloquei minha mão para baixo e empurrei para cima. Grunhi
quando o vidro cortou aberta a palma da minha mão. Sangue se misturou
com água.

Eu posso lidar com isto.


Fiquei de pé, respirando irregularmente enquanto erguia a cabeça.

Ares estava na minha frente. Sem uma única palavra, a parte de trás da
sua mão atingiu o lado do meu rosto. Estrelas estourando inundaram minha
visão como uma dúzia de fogo de artifício explodindo de uma só vez. Bati na
cadeira de couro atrás da mesa. Sangue se acumulou na minha boca
enquanto eu me agarrava na beira da mesa. Algo tinha se partido. Minha
bochecha? Rosto inteiro? Eu não tinha ideia. E acima da dor latejante, eu
podia ouvi-los na porta.

Eu posso lidar com isto.

Agarrando o teclado, o rasguei para soltar e girei, visando sua cabeça.


Ares pegou o teclado, soltou com um puxão e depois o partiu em dois como
se fosse um graveto.

Tropecei para trás, alcançando cegamente por alguma coisa. Adagas e


espadas pendiam da parede, mas ele estava em cima de mim antes que eu
pudesse ir atrás delas.

Ares me apanhou como se eu fosse nada mais do que um gatinho


indefeso. Antes que eu pudesse me mexer para me libertar, antes que eu
pudesse provar o medo cru se construindo na parte de trás da minha
garganta, ele me virou, batendo minhas costas com força no canto da mesa
virada ao contrário.

Houve um estalo que eu ouvi e senti. Dor aguda veio em um flash de luz,
e então cada terminação nervosa disparou de uma só vez. Meus sentidos
sobrecarregaram conforme eu escorregava até o chão, olhos fixos no teto.

Algo tinha ficado desarticulado dentro de mim. Eu podia sentir isso. Uma
dor escaldante rugia através de mim como uma explosão de tiro. Eu estava
úmida e quente no interior e se não tivesse sido o Apollyon – se eu tivesse
sido apenas uma meio-sangue ou uma mortal – sabia que o que quer que Ares
tinha feito teria sido fatal.

Mas eu não iria morrer e eu não podia me mover. Algo ruim estava
quebrado. As pontas dos meus dedos estavam dormentes, e eu não podia
sentir meus dedos dos pés, mas sentia tudo o mais. E percebi que, se alguém
sabia o lugar certo para romper a espinha para imobilizar alguém mas
garantir que eles ainda pudessem sentir tudo, seria Ares.
Eu posso lidar com isto – oh deuses, eu posso lidar com isto.

Ele pairava sobre mim, sorrindo, olhos totalmente brancos.

— Tudo isto pode acabar agora, pequena. Basta dizer as palavras.

Minha garganta trabalhou, e minha língua parecia pesada demais. Levou


tudo para fazer as palavras saírem.

— Vai se… fuder…

O sorriso escorregou de seu rosto e então ele se moveu rápido como um


raio. Dor... ela estava por toda parte. Outro osso rachou – talvez a minha
perna, ou uma patela, mas eu não podia ter certeza. Minha boca se abriu
para gritar, mas um choramingo úmido, quente, saiu em vez disso.

Eu… eu posso lidar com isto. Eu precisava… eu precisava.

Quando ele estalou minha outra perna e depois cada costela, uma de cada
vez, a dor se tornou meu mundo. Não havia como escapar dela – como
respirar ao redor disso ou se esconder. Consciência estava escapulindo de
mim e eu lutei contra a névoa, porque quando terminasse comigo, se algum
dia terminasse comigo, ele passaria para Aiden e Marcus, para toda a
Universidade. Ele era o deus da guerra e ele iria assolar tudo.

Mas aquela dor... ela me apodreceu por dentro. Ela alcançou embaixo na
minúscula parte onde eu ainda era uma pessoa, onde eu ainda era Alex, e a
dor tomou conta. Eu não podia aguentar isso. Eu não podia lidar com isso.
Meus escudos desabaram e a corda rugiu, mas o zumbido crescente foi
ofuscado pela terrível dor, e a desesperança crescente cavou profundamente
com garras afiadas como navalhas e afastou todo o meu sentido de ser.

Eu não era tão forte quanto pensava que era, ou talvez eu tivesse só
atingido meu limite, porque eu queria ir – eu queria morrer. Não havia
nenhum orgulho nisso. Não havia nenhum propósito. Minha alma se
fragmentou e eu fiquei aberta.

Ares agarrou meu braço quebrado, me arrastando para o centro da sala,


sobre vidros quebrados e peixes mortos e o sangue daqueles que já tinham
morrido aqui. Essa nova explosão de dor não pareceu ser nada em
comparação a tudo o mais, mas com o canto do meu olho, vi Ares apanhar
uma adaga.
Ele se ajoelhou sobre mim, lábios enrolados para trás. Havia uma lâmina
na sua mão, e isto estava prestes a ficar muito, muito pior.

— Diga as palavras.

Eu estava estilhaçada e eu estava fraca. Ele tinha ganhado, e eu queria


morrer, mas não podia, e não havia nenhuma maneira – gritei enquanto o
primeiro ataque da lâmina afundava profundamente.

Com outro corte afiado, minha visão piscou âmbar momentaneamente e,


em seguida, reverteu, mas algo... algo estava diferente. A sensação externa
mexeu em torno dos ossos quebrados e músculos rompidos. Não era de mim,
mas era uma parte de mim. Era fria e se sentia como aço e era fúria, escura
e infinita.

Não era de mim, porque a pequena parte de mim que restava tinha se
enrolado em uma bola e estava esperando e rezando para que isto terminasse.
Ela tinha desistido, se encolhendo longe de mais dor como um cachorro
abusado. Ela queria que isto terminasse. Queria provar a tranquilidade da
morte.

Mas essa fúria se construía e, enquanto Ares se curvava sobre mim


segurando a adaga de ponta vermelha, eu soube que a raiva estava filtrando
através da conexão entre mim e o Primeiro.

Era Seth.

Ele estava com raiva que eu não tinha ido com Ares? Ou isso era porque
eu estava tão fraca que desejava a morte? Ou era algo mais, algo mais
profundo do que de qual lado estávamos, porque Seth... Seth tinha que sentir
isto agora. Ele tinha que saber, e esse último pequeno farrapo do meu ser se
recusava a acreditar que ele iria perdoar isso. Eu sofria, e então ele sofria.

O deus riu friamente.

— Eu me pergunto, se você cortar a cabeça do Apollyon, ela volta a


crescer? Suponho que poderíamos descobrir, huh? Você gostaria disso.

Parte de mim morreu bem naquele momento, talvez não uma morte
física, mas em algum nível mental, algum nível emocional, eu estava boa
como morta. Quando tudo isto acabasse, eu não seria a mesma.
Madeira e metal se estilhaçaram, e eu soube que a porta finalmente tinha
sido violada. Enquanto o deus trazia a adaga para baixo, um corpo colidiu
com ele. A lâmina empalou o piso inofensivamente ao lado do meu pescoço.
Antes que eu pudesse tomar minha próxima respiração dolorosa, eles três se
moveram por cima de mim, se engajando em uma espécie de dança doente,
macabra. Ares. Aiden. Marcus. Eles se moveram rápido demais para eu
acompanhar. Os três estavam juntos demais.

Luz explodiu, deixando a sala em luz branca tão brilhante quanto o sol. A
presença de um outro deus encheu a sala, e eu fiquei cega. Tentei tomar
minha próxima respiração e arquejei. Calor úmido se espalhou ao longo do
lado esquerdo do meu corpo, se acumulando pelo chão como chuva
vermelha. Meu sangue? O de outra pessoa? Deuses... deuses não sangravam
como nós.

Houve um rugido desumano e Ares girou, sua atenção sobre o que quer
que estivesse atrás de mim. Em um instante, o deus da guerra atirou os
braços para fora. Uma onda de choque rolou através da sala destruída.
Madeira estilhaçada e móveis quebrados voaram para o ar, junto com corpos
prostrados, sem vida… e Marcus e Aiden.

Chuva vermelha parecia derramar do teto agora.

Meu nome foi chamado, mas soou tão longe. Lutei para sentar, ver Aiden
e Marcus, saber que eles estavam bem, mas não conseguia me mover e não
conseguia respirar. Mãos pousaram em mim, mas minha pele parecia
destacada. Havia gritos no fundo, e eu queria que eles calassem a boca –
apenas calassem a boca. Todo o meu corpo parecia escorregadio enquanto eu
era levantada, minha cabeça caindo frouxamente para o lado.

Onde estavam eles – onde estavam Aiden e Marcus?

O horror crescente tomou conta da dor e se misturou com a fúria de


Seth. As marcas se espalharam pela minha pele e a corda cantarolou
violentamente. Havia vozes, tantas vozes, e uma veio tão clara, e eu não
sabia se isso foi falado em voz alta ou em meus pensamentos.

— Deixe ir, Alex.

Em seguida não havia nada.


Trinta e sete

Não havia nada, e então a dor voltou, começando com os ossos


quebrados em meus dedos dos pés e então rastejando pelas minhas
panturrilhas e joelhos despedaçados, lambendo minha pélvis pulverizada em
ondas de dor ardente, incandescente. Quando o fogo alcançou minha cabeça,
eu tentei gritar, mas minha mandíbula não quis se mexer. O grito rasgou
através de mim ainda assim, silencioso mas cheio de raiva que tinha o sabor
do sangue que se acumulava na minha boca.

Morte... oh deuses, eu implorei pela morte mais e mais na minha mente.


Um fluxo implacável, constante, para qualquer deus que estivesse ouvindo
levar isto embora, porque a dor estava dividindo as costuras da minha
sanidade.

Mas a dor não diminuiu. Ela queimou. Permaneceu. Continuou a me


apodrecer de dentro até que eu quis que meus olhos abrissem.

Minha visão não se focou a princípio. O que eu vi foi um borrão nebuloso


de azul, mas quando a minha vista clareou, eu não entendi o que estava
vendo.

Talvez eu já tivesse enlouquecido.

Eu estava encarando um céu – o azul mais brilhante que eu já tinha


visto. Como a água do mais profundo oceano, intocada e pura. Nenhum céu
era dessa cor. E eu estive no escritório do Reitor, onde Ares... onde ele…

Eu não podia pensar nisso. Eu não podia pensar em nada.

O ar cheirava a jasmim, como... como a piscina no Submundo, quando eu


tinha estado com Aiden.

Aiden…

Oh deuses, eu não sabia o que acontecera com ele, se Ares o ferira ou se


ferira Marcus. Eu não sabia onde estava, ou como chegara aqui. Tudo o que
eu sabia era dor. Estava em cada fibra de músculo, cada osso estilhaçado e
vaso estourado, mas isso... isso não era verdade. Havia uma coisa que eu
sabia.

A corda – a conexão entre Seth e eu – tinha ido embora.

Não havia nenhum zumbido. Nenhuma raiva. Nenhuma presença de fora


se misturando com a minha. Oh deuses, eu não era nada agora além de dor.

— Alexandria.

Não percebi que meus olhos estavam fechados novamente, até que os
forcei a reabrir ao som da voz vagamente familiar. A princípio, eu não o vi,
ou qualquer coisa além do céu bonito, irreal.

Uma sombra caiu sobre mim e, em seguida, uma forma apareceu,


bloqueando o céu. Segundos depois, os pedaços do homem se juntaram. Alto
e largo e uma cabeça cheia de cabelos cor de mel, o homem tinha o rosto de
um anjo.

Oh, pelo amor dos deuses, eu não conseguia ter um maldito intervalo.

Thanatos.

Os lábios do deus subiram um pouco de um lado, como se soubesse o que


eu estava pensando, e eu me perguntei, então, se eu estava realmente morta,
se alguém mentira sobre toda a coisa da morte do Apollyon, porque eu estava
encarando o deus da morte pacífica.

Então novamente, a minha morte, se era isso que isto realmente era, fora
tudo menos pacífica. Ele tinha vindo para responder às minhas orações?
Para levar esta dor embora?

Sentando-se suavemente, Thanatos inclinou a cabeça para o lado


enquanto se inclinava sobre mim.

— Você pode me ouvir?

Tentei abrir a boca, mas não consegui.

— Pisque se puder — disse ele com gentileza surpreendente.

Eu pisquei.
— Podemos ter sido inimigos no passado, mas eu não estou aqui para te
prejudicar agora. Estou cuidando de você até que Apolo possa retornar com
seu filho, Asclépio.

Apolo? Seu filho? Confusão me inundou e eu arrastei uma respiração


mais profunda que imediatamente lamentei. Dor arqueou em meu peito.

Thanatos se moveu para colocar a mão na minha testa, mas parou de


repente.

— Está tudo bem. Você está no Olimpo.

Olimpo? Como no mundo isso estava bem?

— Bem, nos arredores do Olimpo, se você quiser ser técnica — Olhou de


relance por cima do ombro, suspirando baixinho. — O que você fez
enfrentando Ares? Não muitos fariam – nenhum mortal, semideus e,
certamente, nem mesmo o Apollyon. Você poderia ter se submetido a ele.
Teria se poupado de tanta dor.

Thanatos se inclinou para perto, focando em mim com olhos brancos que
não possuíam nenhuma pupila ou íris.

— Você manteve sua posição, e eu posso respeitar isso. Também posso


admirar isso.

Talvez, se eu não sentisse como se meu corpo tivesse sido estilhaçado em


um milhão de pedaços, eu poderia realmente apreciar essa declaração. O ar
com cheiro de jasmim se agitou, e mais duas sombras caíram sobre o local
onde eu estava deitada... na grama, percebi estupidamente. Minhas costas
inteiras pareciam molhadas e eu não tinha esperança o suficiente para
pensar que era orvalho em vez do meu próprio sangue... ou do de outra
pessoa. Não. Não podia ser de outra pessoa, porque isso significaria que Aiden
ou Marcus…

Apolo entrou em foco, e em vez de exibir aqueles olhos arrepiantes de


deus, ele me encarava com olhos que combinavam com o céu sobre seu
ombro. Um pequeno sorriso, quase triste, puxou seus lábios, o que eu achei
tão estranho já que era raro que Apolo mostrasse qualquer emoção
verdadeira.

— Não havia nenhuma forma que eu pudesse te curar no reino mortal. O


dano é extenso demais — disse, e pela primeira vez, cortou direto ao ponto.
— Tive que trazer você aqui, tão perto do Olimpo quanto possível. Todo o éter
em torno da minha casa vai ajudar Asclépio.

Queria perguntar sobre Aiden e Marcus, mas quando finalmente consegui


abrir a boca, apenas o menor choramingo vazou.

— Não tente falar — Apolo disse. Ele se inclinou para trás, abrindo espaço
para outro deus — Meu filho vai te curar — Um sorriso irônico torceu seus
lábios. — E eu sei que se você pudesse, diria algo como “quantos filhos você
tem?” e minha resposta seria “muitos”.

É, eu estava meio curiosa, e também me perguntei se isso significava que


Asclépio estava relacionado a mim, mas o que eu realmente queria saber era
o que tinha acontecido com Aiden e Marcus.

Asclépio tomou o lugar de Thanatos. Este deus mal se assemelhava a


Apolo. Uma barba cheia cobria seu rosto, tornando difícil aferir sua idade,
mas as linhas finas se espalhando a partir dos cantos de seus olhos brancos o
faziam parecer muito mais velho do que o seu pai. Meus olhos se moveram
para Apolo, e eu estava confortada ao descobrir que ele ainda estava lá. Que
não tinha me deixado com Thanatos e um estranho.

Finalmente, Apolo ficou com pena de mim.

— Da última vez que vi Aiden e Marcus, eles estavam bem. Mas não estive
de volta desde que trouxe você aqui.

Fechei os olhos e engoli em seco. Não era uma confirmação de cem por
cento que eles estavam bem, mas era algo em que eu poderia me agarrar.

— Você conhece a história do meu filho? — Apolo perguntou.

Quando eu não fiz nada, Asclépio riu.

— Ele ama contar esta história.

— Sua mãe mortal morreu durante o parto, e, enquanto ela estava na pira
funerária, eu o cortei do útero — Enquanto Apolo falava, seu filho fitava as
numerosas lesões com um olhar misto de nojo e desafio. — Eu o dei para o
centauro Quíron, que o educou na arte da medicina. É claro, tendo meus
genes, ele já tinha um talento especial para a cura.
É claro.

— Mas a minha irmã tinha pedido a Asclépio para trazer Hipólito de volta
à vida, e entre Hades ficando puto com isso e o choramingo de Afrodite, Zeus
matou o meu filho com um raio — Um músculo saltou na mandíbula de
Apolo. — Então, eu matei Ciclopes, garantindo que Zeus não teria mais
nenhum raio.

Oookay…

— Eu acabei banido do Olimpo por um ano — Apolo continuou


jovialmente — mas no fim, Zeus ressuscitou meu filho para garantir que não
haveria nenhuma futura contenda comigo. — Ele fez uma pausa. — Você
está se perguntando qual é a moral desta história? Eu sempre encontro uma
maneira de cuidar dos meus.

Antes que eu pudesse processar o que aquilo significava, seu filho colocou
as mãos no meu peito. Em circunstâncias normais, eu não teria ficado
emocionada com a ideia de ser apalpada, mas um calor inacreditável passou
por mim. Das pontas dos meus dedos dos pés doendo até o topo do meu
crânio fraturado, um calor vertiginoso e maravilhoso invadiu cada poro.

O deus fechou os olhos.

— Isto pode doer.

O quê? Não, eu quis gritar, porque eu não podia aguentar mais, mas
então o calor empolou minha pele e eu gritei mesmo.

Fogo se alastrou por mim, espalhando-se fora de controle e chamuscando


cada célula. Meu corpo quebrado empinou fora do chão.

O rosto de Asclépio borrou em uma carranca severa.

— Há algo mais aqui...

Pela segunda vez em não importa quantos minutos, fui puxada para o
vazio, perdida em um mar negro de nada.

***

Quando abri os olhos, a minha visão era clara e eu tinha sido movida
para uma câmara circular com paredes de mármore. Pássaros guinchavam
em um verso lírico, suave, de algum lugar fora do quarto. Uma mesa ficava
no meio de uma plataforma elevada. Descansando em cima da mesa estava
um jarro cheio de líquido cor de mel. Ar pesado, perfumado fluía através de
uma pequena abertura na parede, agitando o dossel branco pendurado nos
postes ao pé da cama onde eu repousava.

Uma cama? Obviamente, era um passo à frente de deitada na grama, mas


confusão chamou minha atenção. Me empurrei para cima em meus cotovelos
e me encolhi enquanto uma dor rolava por todo meu corpo.

Eu tinha sido curada, mas…

Memórias se juntaram de novo, de Thanatos, Apolo e seu filho.

Santa merda, eu estava no – ou perto do – Olimpo.

Nunca na minha vida eu pensei que respiraria o ar enriquecido-com-éter


dos deuses, mas aqui estava eu. Um zumbido baixo de entusiasmo vibrou em
minhas veias. Eu queria correr para fora da cama e investigar. Os rumores
eram que o Olimpo era o lugar mais bonito existente, ainda mais do que os
Campos Elísios. Criaturas de mitos vagavam livremente aqui, e plantas que
já não floresciam no reino mortal cresciam a alturas assombrosas no Olimpo.
Isso acontecia uma vez na vida...

O entusiasmo deu lugar à inquietação. Eu não estava aqui para fazer


turismo. Não era como se eu estivesse de férias e Apolo fosse surgir e me dar
um tour junto com orelhas de rato de recordação. Esta não era a Disney
World, e eu estava aqui porque Ares…

No fundo da minha mente, e no centro do meu verdadeiro ser, havia uma


coisa escura e feia que tinha nascido e criado raízes, uma frieza distinta que
nenhuma quantidade de ar quente poderia reprimir. Meus pensamentos
oscilaram para Ares e meu coração ficou pesado. Terror cru se formou no
fundo da minha garganta, com gosto de bile.

Mas, oh deuses, não era apenas Ares, ou o pensamento de enfrentá-lo


novamente. Era a dor que me inflamara e apodrecera, a dor que me
estilhaçara em pedaços e me fizera implorar pela liberação – pela morte.
Mesmo que eu nunca tivesse falado as palavras em voz alta, eu sabia que
Ares sentira isso. Estivera em meus olhos; minha verdadeira alma fora
exposta.
Ares sabia.

Seth sabia.

Vergonha e algo sombrio aumentaram dentro de mim, torcendo e


sufocando como uma erva daninha vil.

Eu tinha implorado pela morte.

Eu. Alex. A toda-poderosa Apollyon. A garota que era derrubada apenas


para pular de novo de pé e pedir mais. Eu vinha treinando para ser uma
Sentinela, uma guerreira criada para desconsiderar o medo. Eu tinha
conhecido dor antes disto, tanto física quanto mentalmente. Eu tinha até
vindo a esperar isso.

Mas Ares tinha me aberto.

Uma vulnerabilidade crua avançou lentamente através de mim. Sentindo-


me doente, puxei o cobertor macio até meu peito. Deuses, eu me senti... me
senti como um enigma na minha própria pele. O que Aiden pensaria se
descobrisse? Ele nunca teria implorado ou desistido como eu tinha – oh
deuses, e se Aiden realmente não estivesse bem? E se Apolo tivesse mentido?

Comecei a me livrar do cobertor, mas parei. Indecisão bateu em mim. O


que eu estava fazendo? Onde eu estava indo para exigir respostas? Minha
mão se apertou ao redor do cobertor, até que eu pensei que ia desfazer o
trabalho duro de Asclépio.

Eu não conseguia me mover.

Eu estava congelada por... pelo quê? Medo. Aflição. Vergonha. Confusão.


Ansiedade. Uma centena ou mais de emoções rodopiavam através de mim
como um tornado F-5. Minha respiração serrava para dentro e para fora
dolorosamente. Pressão floresceu do nada, reprimindo meu peito ainda-tenro.
Isto era pior do que como eu me sentira depois de Gatlinburg, ampliado por
um milhão.

Eu não conseguia respirar.

Imagens da luta no escritório do reitor passaram minha cabeça como um


álbum de fotos retorcido. As manobras que sempre foram tarde demais. Os
chutes e socos que nunca pousaram. Ser pega e lançada como se não fosse
nada mais do que um saco de arroz. A quebra da minha espinha e cada osso
depois disso e, em seguida, a faca…

O som de Aiden e Marcus golpeando as portas, tentando


desesperadamente entrar, me assombrava. Tantas lembranças de Ares
vencendo meu traseiro continuavam vindo em uma arremetida contínua de
quão-não-impressionante-eu-realmente-era. Como eu podia ter pensado que
poderia ficar contra Ares – o deus da guerra? Como qualquer um de nós
poderia?

E eu tinha implorado pela morte.

Eu não conseguia respirar.

A pressão constringiu meu peito de novo e eu soltei o cobertor,


pressionando minha mão na minha pele pegajosa. Saí tropeçando da cama,
caindo sobre o granito gelado de joelhos, e então pressionei minha testa nele.
O piso frio pareceu ajudar, como na noite que tinham me deslizado a
Infusão.

Não sei quanto tempo fiquei assim – minutos ou horas – mas o chão tinha
esta maravilhosa capacidade de conexão com a terra. Uma exaustão até os
ossos se assentou, o tipo que um guerreiro sentia no fim da batalha final,
quando ele estava pronto para entregar sua espada e desaparecer na
eternidade.

Em algum lugar no quarto, uma porta se abriu, raspando contra


mármore. Não levantei a cabeça nem tentei me sentar, e eu sabia como
parecia para quem quer que estivesse no quarto – como um cão se
encolhendo no canto. Essa era eu.

— Lexie?

Meu coração parou.

— Lexie? Oh, meus deuses, bebê.

Eu estava congelada de novo, com medo demais de olhar e descobrir que


a voz realmente não pertencia a minha mãe, que era algum tipo de ilusão
bagunçada. Um tipo diferente de pressão empunhou meu peito. Frágil
esperança inchou.
Braços calorosos me rodearam em um abraço gentil, dolorosamente
familiar. Inalando um fôlego irregular, peguei o perfume dela – o perfume
dela. Baunilha.

Levantando minha cabeça, espiei através das mechas de cabelo e perdi


meu fôlego, junto com toda a capacidade de formar um pensamento
coerente.

— Mãe?

Ela sorriu, deslizando as mãos até minhas bochechas. Era ela – o rosto
oval e compleição ligeiramente mais escura que a minha, lábios espalhados
em um sorriso largo e olhos da cor do verde mais brilhante. Ela parecia como
ela tinha da última vez que eu a vi em Miami, na noite anterior ao ataque
daimon que a transformara em um monstro viciado-em-éter, antes que eu a
matasse.

Aquele punho espremeu até que eu não conseguia respirar, não conseguia
pensar, não conseguia ver nada além dela.

— Bebê, sou eu, sou realmente eu — Sua voz era como eu me lembrava –
suave e melodiosa. — Eu estou aqui.

Eu a encarei, até que seu lindo rosto começou a nadar. Parte de mim não
podia permitir que eu aceitasse isto – este presente – porque, se não fosse
real, seria cruel demais. Os espíritos guardando os portões para o Submundo
quase tinham me enganado.

Mas as mãos dela eram calorosas e seus olhos estavam cheios de


lágrimas. Cheirava como ela e soava como ela. Até mesmo o cabelo escuro
caía em ondas passando dos ombros do jeito que tinham antes.

Então ela ficou de joelhos e inclinou-se para frente, pressionando a testa


contra a minha. A voz dela estava tensa com lágrimas.

— Você se lembra do que eu disse a você naquela noite?

Lutei para fazer as palavras saírem.

— Que você me amava?

— Sim. — O sorriso dela era aguado. — Eu te disse que, com ou sem


propósito, que você era uma garota muito especial.

Oh deuses…

— E você me disse que, como sua mãe, eu era obrigada a te dizer isso —
Ela riu e isso pareceu travar na garganta dela. — Mesmo que eu não soubesse
o quão especial você verdadeiramente era.

Era ela – realmente ela.

Avançando com um clamor, joguei meus braços em torno dela, quase a


derrubando para trás. Com uma risada baixinha, ela me envolveu em um
forte abraço – o abraço eu vinha sentindo falta e precisando por tanto tempo.
Mamãe dava os melhores abraços do mundo.

Ela me segurou apertado, e eu me agarrei a ela enquanto ela alisava meu


cabelo para trás com uma mão. Lágrimas queimaram o fundo da minha
garganta e jorraram em meus olhos. Emoção derramou em meu peito até eu
sentir que meu coração ia explodir. Eu vinha esperando por este momento
pelo que parecia uma eternidade, e eu nunca queria deixá-la ir.

— Como isto é possível? — Minha voz estava rouca e abafada. — Eu não


entendo.

— Apolo pensou que seria bom para você depois do que aconteceu — Ela
recuou um pouco. Lágrimas reluziam nos olhos dela, e eu odiei isso. — Ele
cobrou um favor a Hades.

Apolo deve ter um monte de favores à sua disposição.

— Senti tanto a sua falta — Ela colocou a mão na minha bochecha e


sorriu. — E eu queria poder ter estado lá para você quando você perdeu Caleb
e enfrentou o Conselho. Eu desejo isso mais do que qualquer outra coisa.

Um nó em brasa encheu minha garganta.

— Eu sei. Mãe, eu sinto... eu sinto tanto. Eu…

— Não, bebê, não se atreva a pedir desculpas por qualquer coisa que me
aconteceu. Nada disso foi culpa sua.

Mas foi culpa minha. Claro, eu não a transformei em um daimon, mas


tínhamos deixado a segurança da Ilha Divindade por causa do que eu me
tornaria. Ela sacrificou tudo – sua vida – por mim, e eu ainda me conectara
a Seth quando Despertara, estimulando eventos horríveis, catastróficos por
todo o globo enquanto os deuses retaliavam. Como isso não foi minha culpa?

— Me escute — ela disse, segurando ambos os lados do meu rosto agora e


forçando meu olhar para cima. — O que aconteceu comigo em Miami não foi
sua culpa, Lexie. E você fez a coisa certa em Gatlinburg. Você me deu paz.

Ao matá-la – minha mãe.

Ela comprimiu os lábios, e depois tomou um fôlego trêmulo.

— Você não pode se agarrar a esse tipo de culpa. Ela não pertence a você.
E o que aconteceu depois que você Despertou não foi algo que você pudesse
controlar. Você quebrou a conexão no final. Isso é o que importa.

Suas palavras eram tão sinceras que eu quase fiquei convencida, mas eu
não queria passar este tempo com ela falando sobre todas as coisas terríveis
que aconteceram. Depois de tudo o que acontecera, eu só queria que ela me
abraçasse.

Conter a culpa era como tirar um par de calças apertadas demais. Eu


podia respirar agora, mas as marcas foram deixadas para trás na minha pele.

— Você está feliz? — Perguntei, deslizando para mais perto.

Mamãe me puxou para perto de novo, descansando o queixo no topo da


minha cabeça, e eu fechei os olhos, quase capaz de fingir que estávamos em
casa e que um coração realmente batia sob minha bochecha.

— Eu sinto sua falta, e existem outras coisas que eu sinto falta, mas
estou feliz — Pausando, ela puxou meu cabelo para trás. — Existe paz, Lexie.
O tipo que apaga um monte das coisas negativas e as torna mais fáceis de
lidar.

Eu estava meio que com inveja desse tipo de paz.

— Eu cuido de você quando posso — ela disse, pressionando um beijo no


topo da minha cabeça. — Não é algo que eles sugerem que façamos, mas
quando posso, eu verifico. Você quer me contar sobre este puro-sangue?

Meus olhos estouraram abertos, e calor inundou meu rosto.


— Mãe…

Ela riu baixinho.

— Ele se importa tanto com você, Lexie.

— Eu sei — Meu coração se apertou enquanto eu erguia a cabeça. — Eu o


amo.

Seus olhos se iluminaram.

— Você não tem ideia de como me deixa feliz saber que você encontrou o
amor entre toda esta…

Tragédia, eu terminei em silêncio. Envolvendo as minhas mãos em torno


de seus pulsos esbeltos, meu olhar caiu para a janela. Galhos finos oscilavam
na brisa. Flores rosa brilhante estavam abertas, suas pétalas em forma de
lágrima úmidas de orvalho. Os encarei por um tempo obscenamente longo
antes de falar.

— Às vezes eu me pergunto se isso é certo, sabe – se eu deveria sentir


felicidade e amor quando todo mundo está sofrendo.

— Mas você tem sofrido, também — Ela guiou meu olhar de volta para o
dela. — Todo mundo, não importa o que está acontecendo ao redor deles,
merece o tipo de amor que aquele homem sente por você, especialmente
você.

Corando de novo, eu me perguntei exatamente o quanto Mamãe tinha


visto. Cidade do Embaraço, bem à frente.

— E esse tipo de amor é mais importante do que qualquer coisa agora,


Lexie. Vai te manter sã. Vai sempre te lembrar de quem você realmente é.

Respirei fundo, mas a respiração ficou presa.

— Tantas pessoas morreram, Mãe.

— E as pessoas vão morrer, bebê, e não haverá nada que você possa fazer
sobre isso — Pressionou os lábios na minha testa. — Você não pode salvar
todo mundo. Você não está destinada a salvar.

Eu não tinha certeza de como me sentir sobre isso. Ser o Apollyon era
tudo sobre morte e destruição, em vez de salvar vidas?

— Você pode ficar de pé? — Ela perguntou.

Assentindo, me levantei e me encolhi quando a dor desceu estilhaçando


minhas pernas. Preocupação comprimiu os traços da minha mãe, mas a
dispensei com um aceno.

— Estou bem.

Ela se levantou, mantendo uma mão no meu braço.

— Você deve se sentar. Apolo disse que iria demorar um pouco para...
você se sentir normal.

Sentir-me normal não era possível, provavelmente nunca mais, mas eu


sentei na beira da cama e observei minha mãe deslizar em direção à
plataforma elevada e à mesa. Ela não andava – nunca tinha andado. Minha
mãe tinha esta graça inata com que eu sempre desejei que tivesse nascido.
Em vez disso, eu pisoteava ao redor como uma vaca na maior parte do
tempo.

Ela apanhou o jarro e uma taça que estava por trás dele.

— Ele quer que você beba isto.

Minhas sobrancelhas subiram em suspeita. Se eu tinha aprendido alguma


coisa nos últimos dezoito anos, beber ou comer alguma coisa dos deuses
justificava uma pesada quantidade de receio.

— O que é isso?

Minha Mãe derramou o conteúdo em uma taça de vidro de aparência


antiga e voltou para a cama. Sentando-se, ela o entregou.

— É um néctar de cura que o filho de Apolo inventou para auxiliar o que


ele tinha feito. Você não pode ficar aqui a quantidade de tempo que você irá
demorar para cicatrizar completamente, mas isto vai ajudar. Mesmo para
você, há éter demais no ar. Ele vai te sufocar.

Sufocamento soava merdástico, mas eu encarei o cálice cautelosamente.

— Está tudo bem, Lexie. Entendo a sua hesitação, mas isto não é para te
enganar.

Com uma grande dose de trepidação, peguei a taça e a cheirei. O aroma


era uma mistura de mel e algo de ervas daninhas. Porque eu sabia que esta
era a minha mãe, e eu podia sentir essa verdade bem dentro de mim, eu bebi
da taça. Fiquei aliviada quando descobri que tinha gosto doce e não de
bumbum.

— Beba lentamente — Mamãe advertiu. — Ele vai te deixar sonolenta.

— Vai? — Fiz uma careta para baixo, para o cálice.

— Quando acordar, você estará de volta ao mundo mortal.

Um vento frio encheu meu peito.

— Isto não é um sonho, é?

— Não — Mamãe sorriu enquanto estendia a mão, pegando aquela parte


de cabelo que sempre caía para frente e enfiando-a para trás. — Isto não é
um sonho.

Deixando escapar uma respiração falhada, tomei outro gole. Havia tanto
que eu queria dizer. Muitas vezes, desde que ela morrera, eu fantasiara sobre
vê-la novamente e criara esta massiva lista de coisas que eu queria dizer a
ela, começando com um montão de desculpas por escapar, xingar, brigar, e
ser um geral estorvo o tempo todo. E depois eu passaria para que grande mãe
ela tinha sido. Agora, era engraçado e estranho. Quando abri a boca, a
emoção sufocou essa lista, apagando-a completamente. As palavras que eu
falei foram:

— Sinto tanto sua falta.

— Sinto sua falta também, mas estou com você tanto quanto posso estar
— Ela me observou beber o néctar de cura. — Eu quero que você me prometa
uma coisa.

— Qualquer coisa — eu disse, e quis dizer isso.

Um pequeno sorriso apareceu.

— Não importa o que aconteça, e não importa o que você tenha que fazer,
eu quero que você se absolva de culpa.
Eu a encarei.

— Eu…

— Não, Lexie. Você precisa deixar a culpa ir, e precisa deixar o que Ares
fez ir.

Abaixando a taça, desviei o olhar e dei uma pequena sacudida de cabeça.


Deixar ir o quão mal Ares tinha me quebrado, como eu tinha implorado para
morrer? Impossível.

— Você… você viu isso?

— Não — Ela colocou a mão sobre a minha e apertou. — Mas Apolo me


contou.

A risada que saiu de mim soou incrivelmente amarga.

— Claro que contou. E onde estava Apolo quando eu estava levando uma
surra, a propósito?

Um olhar de dor atravessou seu rosto, e me arrependi imediatamente de


dizer isso.

— Sinto muito — sussurrei. — Ele provavelmente estava fora fazendo


coisas importantes de deus. — Ou perseguindo ninfas.

— Está tudo bem — sua mão varreu minha bochecha, e fiquei surpresa ao
descobrir que meu rosto já não doía. — Apolo está muito preocupado com
você. Assim como eu.

— Eu estou bem — a mentira soou falsa em meus próprios ouvidos.

Ela inclinou a cabeça para o lado e suspirou.

— Eu não queria esta vida para você. Eu queria poupar você desta
escuridão.

— Eu sei — Olhando para ela, eu absorvi seus traços. Deuses, minha mãe
era linda. Era mais do que bom DNA divino. Era o que estava lá dentro que
saía sangrando – sua bondade, amor e tudo o que eu aspirava a ser. Aos meus
olhos, ela brilhava. E sua vida tinha acabado ainda muito cedo. Ela merecia
tão mais, e eu desejei que pudesse dar isso a ela. Mas eu não podia, então eu
dei-lhe a única coisa que eu podia.

— Eu prometo — eu disse a ela. — Eu prometo deixar ir.

Seus lábios se curvaram para cima nos cantos.

— Eu quero matar Ares pelo que ele fez com você.

Engasguei com a minha bebida. Eu não acho que já tinha ouvido minha
mãe dizer que queria matar alguém, a não ser depois que se transformara em
um daimon. Aí, ela quisera matar todo mundo. Um tipo diferente de dor
encheu meu peito. Sem querer pensar sobre isso, espantei esses pensamentos
com um golpe.

Sufocando um bocejo que veio do nada, eu terminei o que restava da


bebida doce. Mamãe pegou a taça de mim e se levantou, recolocando-o sobre
a mesa. Até o momento em que ela tinha se virado, eu estava deitada de
costas.

— Droga — murmurei. — Essa coisa... isso é forte.

Apressando-se para a cabeceira, ela se sentou ao meu lado.

— É. Queria que tivéssemos mais tempo, bebê.

— Nós não podemos? — Tentei levantar o meu braço, mas parecia


cimentado para baixo. Pânico arranhou meu peito. Eu não estava pronta
para deixá-la ir. Não era justo. Eu precisava dela agora mais do que eu
jamais precisara dela. Havia algo dentro de mim e isso me assustava. — Há
tantas… coisas que eu ainda tenho que te dizer, que eu quero perguntar.

Com um sorriso que torceu meu peito, ela cobriu minha bochecha.

— Haverá tempo mais tarde.

— Mas eu não estou pronta. Não quero te deixar. Por favor… — Estranho.
Esqueci o que estava dizendo. Aparentemente, eu tinha bebido o néctar de
Distúrbio de Déficit de Atenção.

Conforme minhas pálpebras se tornavam pesadas demais para manter


abertas, eu a ouvi dizer:

— Estou tão orgulhosa de você, Lexie. Lembre-se sempre que eu estou


orgulhosa de você e que eu te amo — Houve uma pausa e então sua voz doce
disse, segundos antes de eu escapulir, — Não desista da esperança, bebê. O
paraíso está esperando por você no final.

FIM.
Continua:

Sentinel (Covenant #5)


by Jennifer L. Armentrout

É um lindo dia para uma guerra.


À medida que o mundo mortal desliza lentamente no caos do tipo piedoso, Alexandria
Andros deve superar uma impressionante derrota que a deixou abalada e em dúvida sobre
a sua capacidade de acabar com essa guerra de uma vez por todas.
E com todos os obstáculos entre Alex e seu felizes para sempre com o deslumbrante
Aiden St. Delphi, que agora deve confiar em um inimigo mortal enquanto viajam
profundamente no submundo para liberar um dos deuses mais perigosos de todos os
tempos.

No deslumbrante e cheio de ação clímax da série best-seller Aliança, Alex deve enfrentar
uma terrível escolha:. a destruição de tudo e todos que ela tem de mais precioso ... ou o
fim de si mesma.
Tradução
Késcia, Serena, Dayanne,, Dani, Ligia, Ravana

Revisão:
Bianca, Valdir

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