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RAFAEL F.

CARVALHO

AMOR,
BELIGERÂNCIA
Este livro eletrônico é um conjunto de textos que
possuem um objetivo claro e definido: a intencionalidade.
Alguns deles estão publicados em livros, alguns inéditos. O
grande barato em escrever narrativas curtas é poder reuni-las
em blocos temáticos, segundo critérios totalmente subjetivos
e abstratos, que só o autor sabe quais são – ou qual é. Falar
sobre nós mesmos, através do vínculo com pessoas que
transgridem essa ordem dos dias, demonstra que viver junto é
assumir que a outra, o outro, mudam sim esse nosso jeito de
portar e alterar o tempo presente.
AMOR,
BELIGERÂNCIA
Se é a melhor solução? Não sei ao certo, mas para mim existe um
propósito próprio, uma lógica própria, um motivo e uma razão: não mais
falar com você. Por que? Porque você já não faz mais parte da minha vida.
Naquele dia em que você falou com as mais claras palavras: “eu não quero
mais falar com você” eu não soube onde encaixá-la mais em meu coração.
Aquelas não eram palavras, era aço afiado que cortou e arrancou. Então,
dia após noite, lua após sol, após tanto tempo de mágoa contida, você se foi.
Pensei que eu não pudesse, mas pude, e a cada dia que vivi sem você,
percebi que eu vivia. Eu vivia, sim. Como seria viver sem você? Eu acabara
de descobrir, e descobri, também, que nada mudara. Eu disse adeus e vivi.
Viver, morrer, nascer, fazer sexo, gritar, apertar os punhos. Ora, sou apenas
um homem, desses que passam em catracas de ônibus, que sonham e
pulam buracos. Não sei das coisas óbvias da vida, sei que vivo sem você (e
que alegria saber!) e saber que isso, agora, é óbvio, faria eu levantar, encher
um copo com água e beber. Ou comer, ou dormir, ou trabalhar. Uma cura,
sim, posso pensar em uma cura. Eu estou curado. Saudável. Mas você não é
uma doença, um mal, uma peste. Ah, não, definitivamente um mal você
não é. E quem disse que não adoecemos de coisas boas? Pudera eu saber
das outras pessoas, mas eu sei apenas que adoeci de você e demorei muito
tempo para me recuperar. Um momento. Meu coração não deixou de bater,
não deixei de amar, nem de novamente sofrer. Por que digo para todos os
lados que você tanto machucou? Porque assim eu desboto as últimas
lembranças de você. Guardei seu olhar amoroso, seu sorriso, suas palavras
que diziam meu nome, havia algo sincero nos dias que compartilhamos
juntos. Olhei para trás, nos anos que vieram depois de você. Eles foram
bons. Bons como os anos que vieram antes de você. Eu sou feliz por eles,
por todos esses anos. Mesmo os seus anos foram bons. Surpresa. Você foi
igual às outras, nem melhor, nem pior, foi uma das. Uma das. Uma delas.
Aquelas pessoas tão seletas, que fizeram tanto amar como entristecer.
Aquelas pessoas chamadas passado, que não voltam. Por que você não foi,
por que você insistiu tanto para não ir? Eu que não desamarrava o barco do
cais. Sendo assim, soltei o que prendia você e não quis ver a partida, fechei
os olhos para não ver o rumo tomado nem dizer adeus. Era assim que
decidi que fosse. Sem despedidas. Só aqui, no papel. Dizer adeus é para ser
grafado e pintado na página em branco. Se você foi para o norte, para o sul,
para o leste ou oeste, meu adeus é para todas essas direções. Quis apenas o
adeus para todas as direções. Acenar como um doido para todos os lados,
sem ao menos ver para onde você foi. Meu adeus é para todas as direções.
Devo ser isso sim, um doido que não sabe para onde acenar e que acena de
olhos fechados. Sem olhos eu não posso ver para onde você foi, e sem olhos
não posso chorar, e sem chorar não posso sofrer. Sei agora como tudo é
óbvio, e não lutarei mais contra ele. O óbvio. A lógica. A continuidade. Viva
aos ponteiros do relógio que só param por falta de corda ou por pilhas
gastas. Verei que o ângulo de noventa graus marca as nove horas, as vinte e
uma horas, as três horas, as quinze horas. Todo dia, toda a noite, toda a
noite, todo o dia. Não há comida em casa, é preciso comprá-la e fazê-la. É
preciso jornal para ler, roupas para vestir. Ou ao menos tomar banho. Sei
que debaixo do chuveiro suas lembranças não serão levadas com a água,
porque elas não existem mais. Viva o ceticismo das coisas. Viva para quem
acredita no tempo como solução. Eu acredito no tempo como solução, um
viva para mim. Viva, para que? Saí machucado de tudo isso. O tempo é a
melhor resposta, o meu O Tempo e o Vento. Tudo passou, passou de olhos
fechados. Quando eu os abri, vi o mar, o céu, nuvens rápidas. Antes de
mim, diante de mim, e depois de mim.
Tout passe, tout casse, tout lasse.*

Victor Hugo

De repente, o meu amor, esse amor ora tão profundo, descansou. Deus
ensurdeceu de tanto ouvir minhas orações.

* - Tudo passa, tudo quebra, tudo cansa.


Esperei um sorriso seu. Esperei uma mensagem sua. Esperei um
telefonema seu. Esperei uma carta sua. Esperei um beijo seu. Esperei uma
resposta sua. Esperei um gesto seu. Esperei uma fotografia sua. Esperei um
olhar seu. Esperei uma declaração sua.
A campainha tocou. Não era você. Era outra pessoa. Abri a porta, e ela
entrou.
Muito tempo depois, eu a reencontrei. Eu não a reconheci. O cabelo era
outro, as roupas eu não conhecia, os sapatos eram novos e a tinta das unhas
não era a mesma. Somente a voz e os olhos permaneciam os mesmos. Mas
ela não era mais a mesma, era outra pessoa. As rugas e os vincos em seu
rosto eu desconheci, não as vi aparecer. Essas roupas, sapatos, eu não estava
junto quando comprou. Eu também estava vestindo outras roupas, tenho
um outro corte de cabelo, rugas e vincos apareceram. Sou um estranho, um
desconhecido, exceto para as pessoas que continuam comigo. Minha
literatura tem isso.
Pela primeira vez em minha vida, primeira vez, presencio a ausência do
amor. Vou a todos os destinos, ou ao outro lado da rua, depois de
presenciar o furioso ressurgimento das coisas.
rafercar@yahoo.com

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