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EDIçÃO ESPECIAI ANO 13. Rs 9,9O
wwwrevistacult.com.br

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Filosofia Francesa
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O direito na política moderna


O excesso de biopoder força a passagem do racismo para o racismo de Estado. Introd,uz uma
not)a economia de poder na qual a tnorte dos outros é o fortalecimento da prrípria pessoa

SÉncro Auonno

í1 ão bastante conhecidas as objeçôes de Foucault ao suspender a ideia mesma de direito, isto é, de um con-
\ trutu-errto que a teoria políüca moderna atribuiu junto de regras universais
e abstratas que circunscrevem
Lf ar relações entre direito e poder. Foucault recusa- opodereoEstado.
se a aceitar a hegemonia que o modelo jurídico-político, No mais rigoroso nominalismo, Foucault decreta:
herdeiro das tradições'jusnaturalistas" e contratualis- o direito não existe; o que existe são práticas jurídicas
tas, centrado na ideia de soberania e no primado da lei, referidas a um princípio de racionalidade - o do juizo,
conquistou no interior do pensamento político, quer em lugar da coerção. É esse princípio que ordena as
clássico, quer contemporâ'neo. A ficçáo jurídica do con- práticas legislativas, as doutrinas, a jurisprudência, a
trato, cuja substância se encarna na figura do príncipe aplicação e distribuição da justiça.
pàcificador, Foucault opôs uma mecânica de poder que Trata-se de um princípio atravessado pela histó-
opera sob a forma de infradireito. ria. Na história ocidental moderna, o juizo revestiu-se
EmVigiar e Punir (1977), Foucault reconhece que de legalidade. O direito enuncia-se sob a forma da lei
o século 19 elegeu a delinquência como uma das en- inscrita nos códigos. Sob essa perspectiva, uma crítica
grenagens do poder e identificou a prisão como seu arqueológica e genealógica do direito requer liberá-lo
observatório político. Esse momento corresponde à desse revestimento. É justamente o que faz Foucault em
emergência de uma nova mecânica de poder, que náo Vigiar e Punir, em especial nas páginas consagradas ao
diz mais respeito exclusivamente à lei e à repressão, mas exame da reforma iluminista da legislação penal verifi-
que dispôe de uma riqueza estratégica porque investe cada na França no período pós-revolucionário.
sobre o corpo humano, não para supliciá-lo, contudo Em estudo recente, Marcio Alves Fonseca (Foucault
para adestrá-lo; não para expulsáJo do convívio social, eo Direito) aprofunda o lugar do direito no pensamento
senão para explorar-lhe o miíximo de suas potenciali- de Foucault. O direito define-se por seus usos. Fonseca
dades, tornando-o politicamente produtivo economi-
e reconhece ao menos três. O primeiro faz justamente
camente dócil. Disso resulta que a disciplina não é uma referência ao direito como lei, imerso na arquitetura
estratégia de sujeição política exclusivamente repressiva, jurídico-política da soberania. O segundo compreende a
todavia positiva: o poder é produtor da individualidade, extraordinária démarche em torno do poder disciplinar,
o indivíduo é uma produção do poder. Trata-se de uma magistralmente descrita na terceira parte de Vigiar e
forma de poder que se opõe ao modelo da soberania. Punir, segtida de seus ensaios, cursos e do volume I de
Essas conhecidas formulaçÕes de Foucault não con- História da Sexualidade. Por fim, o terceiro uso introduz
duzem, entretanto, a uma teoria geral do direito sob uma inovação: o apelo a um novo direito que percorre as
a égide do poder disciplinar. François Ewald sustenta entrelinhas de sua reflexão sobre a crise contemporânea
(no livro Foucault, a Norma e o Direito) que o direito, das disciplinas (Ditos e Escritos,volame III), a emergên-
em Foucault, é antes de tudo um princípio de raciona- cia de novos ilegalismos (Vigiar
e Punir), em especial em

lidade que cabe percorrer em sua plenitude. Enquanto seus cursos no Collêge de France de 1975-1976,"Em
tal, impõe-se reconstruir sua história (afinal, o direito Defesa da Sociedade", e de L978-1979, "Nascimento da
tem uma história?), o que significa, primeiramente, Biopolíticdl em parte dedicado à análise do liberalismo

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O F L OSOF]A FRANCFSA CON IEIVPOBANEA

e do neoliberalismo alemáo e americano. A nova história, inaugurada com a emergência do


Esseterceiro uso é anunciado nos seguintes termos: mundo moderno, prodtz acentuada nrpfura: em lugar
"E creio que nos encontramos aqui numa espécie de do discurso histórico das ürtudes da soberania, emerge
ponto de estrangulamento: não é recorrendo à sobera- o discurso das raças por meio das guerras entre nações,
nia contra a disciplina que poderemos limitar os pró- o que fez diluir a tradicional identidade entre povo e mo-
prios efeitos do poder disciplinar. De fato, soberania e narca. Daí em diante, a soberania terá precípua funçào:
disciplina, legislação, direito da soberania e mecânicas não mais o que une, porém o que subjuga. A história de
disciplinares são duas peças absolutamente constitutivas uns não é mais a história de todos. A lei vai aparecer co-
dos mecanismos gerais de poder em nossa sociedade. mo dupla face: "Triunfo de uns, submissão de outros'l
Nâo é na direção do antigo direito de soberania que se Assim, 'b papel da história será o de mostrar que
deveria ir; seria antes na direção de um direito novo, as leis enganam, que os reis se mascaram, que o poder
que seria antidisciplinar, mas que estaria ao mesmo ilude e que os historiadores mentenl' (Em Defesa da
tempo liberto do princípio da soberania" (Em Defesa Sociedade, p. 8 ). A nova história será, nessa medida,
da Sociedade,p.4T). uma anti-história, tendo em üsta que desenterra o que
Um direito finalmente liberto do princípio da le- parecia escondido nas saliências da memória: os reis,
galidade? Estamos diante da emergência de um novo os poderosos, as leis nasceram justamente do acaso e
princípio de juízo? O curso "Em Defesa da Sociedade" da injustiça das batalhas. Trata-se, portanto, de uma
é devotado ao estudo das relações entre guerra e poder. história que reivindica direitos ignorados, a decifração
Ao contrário do que sustenta certa tradição do pensa- de uma verdade selada pela dissimetria das raças e de
mento ocidental, a emergência do mundo moderno não seucontínuo enfrentamento bélico.
é por excelência o reino da paz sobre a guerra, nem a O desfecho desse processo, em fins do século 18 e
política é, como sonhava Clausewitz, a guerra pacificada meados do 19, encorajado pelos saberes médicos e bio-
sob outros meios. Examinando detidamente textos de lógicos, converterá a guerra das raças em racismo, de
historiadores contemporâneos dos processos revolu- que se nutrirão todos os profetismos revolucionários
cionários na Inglaterra e na França, Foucaú recoúece que se seguem. Esse é justamente o momento do nasci-
que'h ordem civil é fundamentalmente uma ordem de mento da biopolítica, a partir do qual a questão da vida
batalha'l A políüca é a continuação da guerra por outros é problematizada no campo do pensamento político.
meios. De que guerra se trata? A guerra das raças. Seus fundamentos repousam em dois eixos: nos séculos
Na tradição clássica que adentra a Idade Média, o 17 e L8, eÍnergem e se consolidam as técnicas de poder
discurso histórico tinha por função justificar e fortale- disciplinar em torno do corpo individualizado; na se-
cer o poder. Seus fundamentos repousavam sobre três gunda metade do século 18, uma nova tecnologia ganha
eixos: antiguidade dos reinos e consequente anciani- materialidade. Ela não exclui as técnicas disciplinares,
dade do direito; glorificação dos reis e príncipes e de antes as recobre. Dirige-se à multiplicidade dos homens,
seus antecedentes; memorização dos feitos heroicos. não como portadores de corpos individualizados, toda-
A glória é feita lei. via como massa global, afetada por processos coletivos

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EDITORA
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PAUT RICGUR

A memória,
a história,
o esquecimento
como o nascimento, a morte, a produção, a doença. Suas
técnicas residem na medição estatística de fenômenos
demográficos. Seu alvo é a população como problema
político e de gerenciamento estatal. Seu escopo não é
o nascimento em si, porém a natalidade; não a morte,
contudo a morbidade e a mortalidade.
Uma inovação dessa ordem inverte o clássico direito
de soberania, o de mandar matar ou deixar viver, que @

se expressava na grande ritualização pública da morte.


Com a invenção da biopolítica, um novo direito emer- A memória, a história, o esquecimento
ge: o de fazer üver e - em seu limite extremo - deixar Paul RicrtuR
morrer. Sob essa perspectiva, o direito é uma possibi-
lidade, um mecanismo de regulamentação. Seu para= 536 páginas | 16 x23 cm I Rg 82,00
doxo é que, na era contemporânea, tenha-se tornando
excessivo, uma espécie de superpoder ou supradireito.

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A estatização cada vez maior do direito à úda introduz
uma possibilidade perturbadora: não só a da incessan-
te fabricação da vida e dos üventes como também a
fabricação de algo monstruoso, a possibilidade de sua
eliminação sem controle por meio da disseminação de
vírus, de armas químicas, da guerra sem interditos mo-
rais contra'ãs outras raças".
O excesso de biopoder força apassagem do racismo
TRANSMtTIR a clíNtea
para o racismo de Estado. Introduz uma nova econo- psrcaNalírtca
mia de poder na qual a morte dos outros é o forta-
lecimento da própria pessoa, na medida em que se é
membro de umapopulação ou de uma raça. "portanto,
o racismo é ligado ao funcionamento de um Estado que
é obrigado autilizar araça, aeliminação das raças e a
purificação das raças para exercer seu poder sobera-
nci' (Em Defesa da Sociedade, p. 309). Nesse cenário,
no qual repúblicas parlamentares se inclinam muito 1iansmitir a clínica psicanalítica
rapidamente a Estados totalitários, se assiste paradoxal- Freud, l-acan, hoje
mente ao retorno do velho direito soberano de matar Énrx pclnr;u
para deixar viver. E
264páginas | 14x21cm I R$ 58,00

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vetndas(de clitoru.un icarnp. br
. F_ILOSOFIA FRANCESA CONTEMPORANEA

A herança foucaultiana
de Agumben
A produçd,o d,o fi,tósofo italiano confi,rma a continuid,ade das pesquisas e do método dc Foucauh

Cr-Árrlro Oltvrtn,t

\ Yuma entreüsta concedida em 2004, Giorgio Biopolítica


\l egr.ben diz: "Meu método é arqueológico e A presença explícita de Foucault na obra de Agamben
I \ paradigmático num sentido muito próximo ao de fato só começa a ser observada no primeiro volu-
de Foucault, mas não completamente coincidente com me de Homo Sacer, O Poder Soberano e a Vida Nua,
eldl Tal não coincidência é difícil de definir, até mesmo publicado em 1995. Mas a presença de Foucault nessa
para o próprio Agamben. Em Signatura Rerum - Sobre o obra não se dá apenas sob o viés metodológico, que
Método,liwopublicado recentemente (março de 2008) e assume a perspectiva arqueológica e paradigmática,
no qual, às noçoes de paradigma e de arqueologia, vem mas também no que diz respeito à própria questão nela
se juntar uma teoria das slgr ature, Agamben afirma que tratada (a üda nua e o poder soberano), na medida em
sua reflexão, nesta obra, se apresenta com uma indaga- que o livro toma como ponto de partida a problemática
çáo sobre o método de Michel Foucault,
"de quem o foucaultiana da biopolítica. Na mesma entrevista con-
autor, nos últimos anos, teve ocasião de aprender muito'l cedida em 1999, Agamben confessa que suas pesqúsas
Mas não podendo (ou não querendo) decidir-se quanto não teriam sido possíveis sem os trabalhos de Foucault
ao que, nessa reflexão, é seu ou de Foucault, Agamben sobre a biopolítica, que não tinham tido, acreditava ele
conüda o leitor a fazer ele próprio o discernimento entre então, uma verdadeira sequência. Mas é uma crença
o que deve ser referido a Foucault, o que deve ser posto mais radical que o animava em sua busca: a de que a
na conta do autor (Agamben) e o que vale para am- política não sairia do seu retraimento atual senão pela
bos. É preciso lembrar que, em sua leitura de Foucault, assunção da herança foucaultiana.
Agamben parte de um princípio que ele deve a Walter Foucault introduz a noção de biopolítica no quinto
Benjamin: o de que a doutrina de um autor só pode capítulo ("Direito de Morte e Poder sobre a Vida") do
ser exposta legitimamente na forma de uma interpre- volume I da História da Sexualidqde, que se intitula A
taçáo. Trata-se, portanto, em Agamben, não podemos Vontade de Saber,publicado eml976. É dessa obra e da
esquecer, de uma interpretaçáo de Foucault como única célebre passagem daPolítica de Aristóteles que define o
possibilidade da exposição legítima de sua doutrina, de homem como animal p olítico (zôion politikón), e à qual
um Foucault lido (interpretado) por Agamben. O que Foucault faz ai referência, que Agamben parte para o
os une, metodologicamente, talvez seja a ideia, como desenvolvimento da questão a ser colocada emHomo
acredita Agamben, de que a arqueologia't a únicaüa de Sacer:"Durante milênios, o homern', afirma Foucault,
acesso ao presente'l Partindo dessa ideia, Agamben teria "permaneceu o que era para Aristóteles: um animal
tomado os dois campos de investigaçáo que Foucault vivente e, além disso, capaz de existência política; o
deixou de lado, o direito e a teologia. É nesses dois âm- homem moderno é um animal em cuja política está
bitos que ele tem trabalhado nos úlümos anos, em sua em questão a sua vida de ser vivente". Nos anos que
longa tetralogia intitulada Homo Sacer. Uma tarefa que, se seguiram à publicação da obra, Foucault desen-
em outra entreüsta, concedida a fean-Baptiste Marongiu volverá as consequências dessa mudança nos cursos
(em l"l4l1999), ele defire como 'tontinuar o trabalho que deu no Collêge de France: "Segurança, Território,
daqueles que se amam". Populaçãd' (1977-1978) e "Nascimento da Biopolíticd'

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(L978-1979). Nesses cursos, o fllósofo francês mostrará conseguiu. Homo Sacer, nesse sentido, pode ser defini-
como a modernidade biológica da sociedade entende do, sobretudo em seu primeiro volume, como a obra
o homem como espécie e como simples corpo viven- que produz o encontro dessas duas linhas de força do
te. Nas estratégias políticas dessa sociedade está em pensamento político do século 20 que nunca haüam
jogo, para Foucault, uma animalizaçáo do homem. se encontrado. É no horizonte dessas questões, herda-
Tal animalização será objeto de uma obra posterior de das tanto de Foucault quanto de Hannah Arendt, que
Agamben (O Aberto - o Homem e o Animal,publicada Agamben buscará investigar aquilo que, não mais nos
em2002) e que náo foi incluída natetralogíade Homo termos apenas de Foucault (biopolítica), mas em seus
Sacer, embora estritamente afim a ela. próprios termos (politização da vida nua), constitui
'b evento decisivo da modernidade, que assinala uma
Do homo laborans ao homo sacer transformaçáo radical das categorias político-filosóficas
Mas Agamben já chama atenção, nas primeiras páginas do pensamento clássico i
de Homo Sacer, para aqulo que ele considerará um limi-
te das investigaçôes de Foucault. O fato de que elas não Duas faces do poder
tenham levado em conta as análises de Hannú Arendt, Mas é também sob outro aspecto que Agamben se di-
desenvolvidas em A Condiçao Humana, sobre o homo ferenciará de Foucault, no movimento mesmo em que
laborans e sobre a üda biológica como o que vem ocu- assume sua herança. Ele se perguntará pelo ponto de
par o centro da cena política do moderno. Para Hannú convergência, que permaneceu singularmente à sombra
Arendt, o primado da vida natural em relação à ação na pesquisa de Foucault, entre os dois aspectos do poder
política era a chave para a compreensão da decadência nos quais ele havia insistido em toda a sua obra e dos
do espaço público na sociedade moderna. Agamben quais teria se recusado a elaborar uma teoria unitária:
observa, por outro lado, que a própria Hannú Arendt, 'por um lado, o estudo das técnicas políticas (como a
por sua vez, não haüa estabelecido nenhuma conexáo ciência do policiamento) com as quais o Estado assume
entre o que havia pensado em Á Condição Humana e as e integra em sua esfera o cuidado da üda natural dos
análises que haüa dedicado precedentemente ao poder indivíduos; por outro, o estudo das tecnologias do eu,
totalitário. Nessas aniílises, Arendt não leva em consi- através das quais se realiza o processo de subjetivação
deração qualquer perspectiva biopolítica. Aos olhos que leva o indivíduo a üncular-se à própria ldentidade
de Agamben, o fato de que Foucault não tenha tido eà própria consciência e, conjuntamente, a um poder
um encontro com a obra de Arendt talvez explique a de controle externo'. É o centro comum a que remetem
peculiaridade de que ele jamais tenha investigado as essas duas tendências que Agamben buscará. Para ele,
áreas por excelência da biopolítica moderna: o campo há um ponto de intersecção em que técnicas de indi-
de concentração e a estrutura dos grandes estados to- vidualização subjetivas e procedimentos totalizantes
talitários do século 20. Se o tivesse feito, ele teria esta- objetivos se tocam. Influenciado pelas análises feitas
do em condições de ter realizado aquilo que a própria por Guy Debord sobre o poder midiático-espetacu-
Hannah Arendt, por algum motivo desconhecido, não lar, Agamben não crê que seja legítimo ou até mesmo

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O FI LOSOFlA FRANCESA CONTEMPORANEA

possível manter distintas tecnologias subjetivas e técni- do pensamento de Agamben, o filósofo alemão Walter
cas políticas. Mesmo considerando esse ponto de indis- Benjamin, com sua ideia de que o estado de exceção se
tinção logicamente implícito nas pesquisas de Foucault, tornou em nosso tempo a regra. Partindo dessa referên-
ele o vê como um ponto cego em sua obra, precisamente cia benjaminiana, a tese foucaultiana, nas palawas de
o ponto oculto de intersecção entre o modelo jurídico- Agamben, deverá "ser corrigida ou, pelo menos, inte-
institucional e o modelo biopolítico do poder de que grada, no sentido de que aquilo que caracteriza a polí-
Homo Sacer tratará. Para Agamben, as duas análises tica moderna náo é tanto a inclusão da zoé na pólis, em
não podem ser separadas, pois "a implicação da üda si antiguíssima, nem simplesmente o fato de que a üda
nua na esfera políticd' - essa é uma das teses centrais como tal venha a ser um objeto eminente dos cálculos
de Homo Sacer -'tonstitui o núcleo originrírio - ainda e das preüsões do poder estatal; decisivo é, sobretudo,
que encoberto - do poder soberano'. Nesse sentido, é o o fato de que, lado a lado com o processo pelo qual a
próprio poder soberano que produz o corpo biopolítico, exceção se torna em todos os lugares arcgra, o espaço
e o Estado moderno, ao colocar a vida biológica em seu da vida nua, situa-do originariamente à margem do
centro, não faz mais que explicitar o vínculo que une o ordenamento, vem progressivamente a coincidir com
poder à vida nua. É exatamente por isso que é preciso o espaço político, e exclusão e inclusão, externo e in-
retornar a Aristóteles com um cuidado que Foucault terno, bios e zoé, dheito e fato entram em uma zona de
não teve e entender melhor a distinção entre os dois irredutível indistiçáo". Em outras palavras, aquilo que
termos gregos que traduzimos indistintamente por "vi- constituía o fundamento oculto sobre o qual repousava
dti', bios e zoé, a vida política e a vida nua. A afirmação o inteiro sistema político vem à tona na modernidade,
de Foucault segundo a qual, para Aristóteles, o homem na medida em que nela o estado de exceção vira regra
era um 'ânimal vivente e, além disso, capaz de existên- ao mesmo tempo em que avida nua se libera na cidade.
cia políticd' deve, segundo Agamben, ser retomada, no É nesse sentido que Agamben entende a decadência da
sentido de que o mais problemático nela é, justamente, democracia moderna e seu progressivo convergir aos
o sentido daquele'além dissdi Tiata-se de se perguntar estados totalitários nas sociedades pós-democráticas es-
de novo pela relação entre política e vida. petaculares (de novo a referência a Debord). Na medida
em que a nossa política não conhece outro valor que a
Heidegger e Benjamin yida, "nazismo e facismo, que haviam feito da decisão
Ao fazê-lo, Agamben mostra-se um leitor de Foucault pelaüda nua o criterio políüco supremo, permaneceráo
que não abandona sua referência fundamental a desgraçadamente atuais" e a biopolítica do totalitarismo
Heidegger. Somente à luz dessa referência heidegge- moderno cai numa estranha equivalência com a socie-
riana fundamental é que se torna compreensível a tese dade de consumo e do hedonismo de massa. Em ambos,
agambeniana de que "a'politizaçád da vida nua é a o que não eíste mais é a política propriamente dita. E
tarefa metafísica por excelência, na qual se decide pe- como essa não pode advir de um retorno a um passado
la humanidade do vivente homem, e, assumindo essa irrecuperável, trata-se da criação de uma nova política
tarefa, a modernidade náo faz mais do que declarar que ainda resta em grande parte inventar. Ela terá de ser
a própria fidelidade à estrutura essencial da tradição inventada, de todo modo, com base em nossa realidade
metafísica'i A essa referência heideggeriana, deve-se biopolítica, posto que não há outra. É da própria vida
acrescentar, além disso, a outra referência fundamental nua que uma nova política nascerá. E

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