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CARL SCHMITT:

A AFIRMAÇÃO (EXISTENCIAL) DO POLÍTICO


NA CRÍTICA AO LIBERALISMO

Cesar Ramos
Universidade Federal do Paraná

RESUMO

O artigo tem por objetivo destacar alguns pontos da análise schmittiana da categoria do político. Essa
análise, nitidamente conservadora, remete, numa prim eira instância, a alguns pressupostos: o caráter
conflituoso da natureza humana e a distinção amigo/inimigo. Com base nesses elementos, Schm ittpretende
a afirmação do político, denunciando a neutralização/negação do mesmo produzida pelo liberalismo. Essa
crítica schmittiana é feita segundo um fundam ento existencial ciue se opõe ao normativ is mo jurídico.

PALAVRAS-CHAVE: política; liberalismo; Estado; existencialismo; normativismo.

INTRODUÇÃO Schmitt a uma forte rejeição da política liberal.


Cari Schmitt, jurista e pensador político ale­ Por que se ocupar com um pensador que sem­
mão, nasceu em 1888 em Plettenburg (Alema­ pre foi objeto de grandes controvérsias? Deixan­
nha) e morreu em 1985 com 97 anos. Uma vida do de lado os preconceitos teóricos, e separando
quase secular dedicada aos problemas jurídicos o autor da obra com suas múltiplas interpreta­
e políticos do século XIX com suas contradi­ ções, é possível contextuaiizar essa questão nos
ções: a República liberal de Weimar, a ascensão termos em que Paul Piccone (editor da revista
e a queda do Nazismo, a reconstrução da demo­ americana de esquerda Telos, dedicada a temas
cracia alemã no pós-guerra, o ambiente da guer­ da filosofia política) coloca na apresentação de
ra fria, o avanço do capitalismo monopolista, a Cari Schmitt na edição dedicada a este pensador.
universalização e a consolidação do neolibera- Para Piccone, Schmitt é “uma figura extrema­
lismo. mente controversa, compromissado com o seu
conluio com o Nazismo no pico de sua carreira
Diante desses acontecimentos históricos, e
e através da sua vida um europeu conservador
diante do desafio teórico de pensar a categoria
cujos objetivos políticos autoritários nunca fo­
política do político no mundo atual, Cari Schmitt
ram postos em dúvidas” (PICCONE, 1987: 03).
adota uma visão crítica singular e inusitada.
No entanto, Piccone reconhece que a obra de
Distancia-se dos padrões clássicos de classifica­
Schmitt é “claramente uma das mais importantes
ção da política presentes desde o século XIX e
contribuições para a teoria política do século XX
que podem, grosso modo, ser resumidos numa
e merece ser enfrentada seriamente”.
posição de direita de cunho liberal e numa posi­
ção de esquerda, de inspiração m arxiana. A obra de Schmitt, extensa quanto à pro­
Schmitt não adota nem uma nem outra posição. dução e diversificada quanto ao conteúdo temá­
Filia-se, antes, a uma corrente de pensamento tico, desprovida de uma organização sistemati­
conservador que remonta aos anti-revolucio­ camente bem elaborada, permanece, no entanto,
nários: de Maistre, de Bonald e, principalmente, centralizada no tema da natureza, fundamen­
Donoso Cortés (1809-1853), autor do ensaio Ca­ tação e autonomia do político. Na afirmação do
tolicismo, Liberalismo e Socialismo. Esse senti­ político critica a sua redução ao normativismo
mento conservador de inspiração católica induz jurídico de inspiração kelsiana, insistindo na exi­
gência do retorno ao tema clássico da política dimensão política da existência humana. “Por
cujo núcleo é o Estado. Nessa linha de investiga­ mais diferentes que possam ser estes pensadores
ção, rejeita a neutralização do político operada quanto à espécie, ao nível, ou à importância his­
pelo liberalismo e refuta os princípios liberais tórica na concepção problemática da natureza
do legalismo do Rechstaat. humana, todos eles estão de acordo, na mesma
medida em que se mostram como pensadores
A crítica conservadora de Schmitt é ampla e
políticos” (SCHMITT, 1992: 88). E noque estão
pode ser classificada na sua dimensão propria­
de acordo estes pensadores? Segundo Schmitt,
mente política. Trata-se de recuperar a categoria
na filosofia política de Maquiavel, Hobbes, Bos-
do político, tirando-a do desprezo conceituai lan­
suet, Fichte, Donoso Cortés, Taine, Hegel e ou­
çado pelo liberalismo. O objetivo de Schmitt é
tros, permanece um traço comum: todos rejeitam
capturar esta categoria a partir da sua própria
como pressuposto das suas teorias políticas a
especificidade existencial: afirmá-la como reali­
noção da bondade natural do homem e o caráter
dade autônoma, determinada apenas por elemen­
não conflituoso da natureza humana.
tos intrínsecos à sua natureza auto-explicativa.
Com esse objetivo, a obra schmittiana apresenta- Para Schmitt, o postulado da natureza perigo­
se como uma crítica contundente ao liberalismo. sa do homem não é de ordem histórica nem um
No comentário de Leo Strauss, “a tarefa de dado empírico, mas uma hipótese, um “credo
Schmitt é determinada pelo fato do fracasso do antropológico”. O “otim ism o” antropológico
liberalismo [...] o liberalismo negou a política, não pode ser tomado como ponto de partida, pois
mas, no entanto, ele não a eliminou do universo: exclui a possibilidade do antagonismo, elemento
ele sim p lesm en te o c u lto u a p o lític a ” nuclear da política que se traduz na polaridade
(STRAUSS, 1988: 190). amigo/inimigo. A idéia de um mundo pacificado
representa, em última análise, a abolição da pró­
I. O CARÁTER CONFLITUOSO DA NATU­
pria especificidade do político. “Num mundo
REZA HUMANA
bom entre homens bons reina, naturalmente, so­
A tese schmittiana de que a “política é inevi­ mente a paz, a segurança e a harmonia de todos
tável e indestrutível”, e que existiria mesmo com com todos; os padres e os teólogos são aí tão
o desaparecimento do Estado, permite afirmar supérfluos quanto os políticos e os estadistas”
que o conceito do político está baseado numa (SCHMITT, 1992: 91). Os homens, reitera Sch­
matriz antropológico-existencial, na qual a de­ mitt, “amam a ilusão de uma tranqüilidade sem
terminação do estatuto da natureza humana tem perigos” e, nesta condição, não toleram os “pes­
um papel relevante. simistas”.
O político não só é possível como necessário. A questão também não é de ordem ética. A
Esta necessidade decorre da própria condição idéia de que o homem é “mau” ou “bom” está
humana, traduzida num tipo de relação social aquém de um possível julgamento moral. A per­
que autoriza pensar a especificidade do político. gunta correta, para Schmitt, é saber se o homem
Mas qual é o estatuto da natureza humana a é um ser perigoso ou não-perigoso, um ser cuja
partir do qual o político deve tomar posição? conduta traz riscos ou se ela é inofensiva. A op­
Na obra Teologia Política Schmitt é bastante ção antropológica de que o homem é um ser pe­
claro: “Toda idéia política toma, de uma maneira rigoso não pode adquirir um significado moral,
ou de outra, posição sobre a natureza do homem desfigurando a categoria do domínio no seu po­
tencial político. Se a natureza humana remete à
e pressupõe se ele é ‘bom por natureza’ ou ‘mau
por natureza” (SCHMITT, 1988a: 65). Schmitt necessidade que o homem tem de dominar — e
não hesita em assumir a tese de que o homem é a política é o campo onde essa tendência se con­
“mau por natureza”. Observa que os pensadores centra— o juízo ético despolitizao conflito ao
que adotaram o pressuposto antropológico de que dicotomizá-lo em algo bom ou mau, segundo
o homem é “mau”, isto é, um ser “perigoso”, uma vontade moral e princípios éticos.
construíram teorias políticas autênticas e são, A política é a instância onde o conflito se
justamente, aquelas que acabam destacando a exprime. O ideal pacifista não deve emascular
essa realidade. Schmitt recusa este ideal, preci­ Esta mútua relação entre proteção e obediên­
samente porque ele conduz a uma espécie de cia constitui o aspecto forte da filosofia política
anarquismo ingênuo: a ausência de arché no do­ hobbesiana presente em Schmitt. E possível ain­
mínio político exclui a realidade do governo do da constatar a influência de Hobbes na própria
homem sobre outro homem. Por conseguinte, concepção da natureza perigosa do homem, na
se há necessidade de governo é porque a nature­ idéia de que auctoritas, non veritasfacit legem,
za humana se exprime também pela potência na convicção de que o conflito entre os homens
do mando. A esfera do político se constitui, no tem a ver com a noção de posse do bem e do
fundo, em garantia para que o mundo não se justo que os indivíduos creditam para si; enfim,
torne um universo pacificado sem o élan agonís- na idéia do bellum de todos contra todos. Estes
tico da política. princípios constituem “pressuposições elemen­
tares de um sistema teórico especificamente
A pretensão moral em buscar um mundo
político” (SCHMITT, 1992: 92). Mas o que mais
pacificado reflete, na verdade, o ideal de civiliza­
aproxima Schmitt de Hobbes é a correlação que
ção liberal. Ao lutar pelo conforto de uma vida
ambos estabelecem entre a segurança que o po­
segura e sem conflitos, o burguês pretende, no
der do Estado pode fornecer ao cidadão e a obe­
limite, privilegiar o fato social-econômico que
diência que estes, em contrapartida^ prestam ao
lhe garante segurança, neutralizando a especi­
Estado.
ficidade do político que representa, sempre, um
jogo perigoso de alternâncias de mando. Se O princípio hobbesiano, exposto no fim do
houver apenas fatos sociais puros “não haverá Leviatã, da conexão entre a proteção do Estado
mais nem política nem Estado”. A conseqüência e a obediência dos súditos é assumido explícita e
nefasta da lógica econom icistae empresarial da enfaticamente por Schmitt, formulando-o nos
sociedade liberal é o desprezo pelo político. A seguintes termos: o “protego ergo obligo é o
expansão universal do ideal burguês de seguran­ cogito ergo sum do Estado” (SCHMITT, 1992:
ça e de conforto acaba por neutralizar a política, 78)1. A mútua relação entre a proteção e a obe­
tornando-a mero instrumento para realização diência constitui o “pivôt da construção hobbesi­
daquele ideal. Ao excluir da política a luta — ana do Estado”, destaca Schmitt, a qual participa
pois, certamente, o caráter conflituoso do políti­ da sua teoria política, juntamente com a hipótese
co comprometeria o projeto de civilização bur­ da natureza conflituosa do homem2.
guesa — o mundo pacificado encontraria sua
Para Schmitt, a imagem do Leviatã associada
realização “política” numa sociedade sem Esta­
ao totalitarismo é falsa. Se o ponto de partida
do. No momento em que esta mesma sociedade
para a construção do Estado é o medo suscitado
desenvolvesse forças produtivas que possibi­
pelo estado de natureza, então, interpreta Sch­
litam a todos as condições materiais para uma
mitt, o objetivo final é a segurança da condição
vida “feliz”, a utopia da vida despolitizada pro­
civil que só o Estado pode oferecer. O poder es­
duziria um mundo emasculado e uma existência
tatal nasce com este objetivo. A própria concep­
humana anódina.
ção contratualista do Estado, concebida de forma
O caráter conflituoso da natureza humana e individualista, reforça esta tese.
a sua necessária conexão com o político tem
A resposta à pergunta por que os homens dão
repercussão direta na lógica de constituição do
mando político. A realidade da política se impõe
devido à necessidade que o homem tem de segu­ 1 A simpatia teórica de Schmitt por Hobbes é eviden­
rança, pois sua natureza conflituosa não desapa­ te. O pensador alemão considera Hobbes como um
rece com a constituição do político. A única “grande e verdadeiramente sistemático pensador po­
instância que pode oferecer proteção aos indiví­ lítico” (SCHMITT, 1992: 78).
duos, face à potencialmente perigosa relação 2 O texto O Estado como mecanismo em Hobbes e
antitética entre os homens, é o poder político Descartes (1937) precede o livro de Schmitt O Levia­
que o Estado representa. Este, por sua vez, ne­ tã de Hobbes e já esboça as principais teses sobre o
cessita da obediência dos cidadãos como condi­ pensador inglês, reconhecido por Schmitt como um
ção elementar para proporcionar segurança. dos grandes inspiradores de sua obra.
seu consentimento ao poder pode ser ampla e O par amigo/inimigo é aquele que determina
diversa. Contudo, a necessidade de proteção que a especificidade de uma relação política. Schmitt
os homens procuram numa instância suficien­ pondera que esta distinção não é uma metáfora,
temente capaz de oferecer segurança constitui nem um símbolo. Também não é úma contrapo­
a razão última de ser do Estado. Se este possui sição normativa e nem uma diferenciação moral.
o poder elementar e básico para dar proteção, Antes de mais nada, esta distinção deve ser as­
então, ele tem o direito, também basilar, de exi­ sumida no seu significado existencial. Inimigo
gir a obediência. “Por que os homens dão o seu é aquele que, ao menos virtualmente (dentro de
consentimento ao poder? Em certos casos por uma possibilidade real), se contrapõe a outro,
confiança, em outros por medo, às vezes por não de forma privada, mas pública. Inimigo
esperança, outros por desespero. Contudo, eles (.Feind) é aquele “contra o qual se leva adiante
sempre têm a necessidade de proteção e procu­ uma contenda ou um conflito (.Fehde). Conflito
ram esta proteção no poder. Visto do lado do e inimizade {Fehde u n d Feindschaft) se corres­
homem, a ligação entre proteção e poder é a úni­ pondem desde o início” (SCHMITT, 1992: 132).
ca explicação do poder. Aquele que não possui Embora tomados em seu “sentido concreto, exis­
o poder de proteger alguém não tem mais o direi­ tencial”, os conceitos amigo e inimigo não ex­
to de exigir obediência. E, inversamente, aquele pressam formas privadas de manifestação de
que procura e aceita o poder não tem o direito sentimentos ou reações pessoais de fundo moral
de se recusar a obedecer” (SCHMITT, apud ou psicológico. “Inimigo é apenas o inimigo p ú ­
FREUND, 1965: 16-17). blico, pois tudo que refere a tal conjunto de ho­
mens, especialmente a um povo inteiro, torna-
A matriz antropológica schmittiana conduz
se, por isto, público” (SCHMITT, 1992: 35).
a um necessário aprofundamento do caráter e
Trata-se, portanto, do antagonismo político, (no
da natureza do conflito. Em que medida o con­
sentido grego do pólem os), da tensão que os
flito ou a sua virtualidade, além de ser um fato
pólos associação-dissociação, amizade-inimiza-
antropológico, se constitui numa categoria es­
de produzem nos agrupamentos humanos. A real
sencialmente política? Por outras palavras: co­
possibilidade de luta, e que pode culminar na
mo distinguir a atividade humana — marcada
guerra, está presente mas não é um destino inevi­
pela tensão conflituosa e que se desdobra nas
tável. “A guerra não é absolutamente fim e obje­
diversas esferas da atividade social e econômica
tivo, sequer conteúdo da política, porém é o pres­
dos homens — como uma ação própria do fenô­
suposto sempre presente como possibilidade
meno político?
real, a determinar o agir e o pensar humanos de
O conflito deve servir a um determinado tipo modo peculiar, efetuando assim, um compor­
de relação existencial entre os homens apropriada tamento especificamente político” (SCHMITT,
àdimensão do político que se autonomiza e torna- 1992: 60).
se algo “puramente político”. A intenção de Sch-
Inimigo político é aquele que, numa relação
mitt consiste em retirar da análise do político
potencialmente passível de conflitos, se configu­
elementos de ordem jurídica ou institucional,
ra como o “existencialmente algo outro ou es­
capturando-o no seu valor puramente existen­
trangeiro”. A relação amigo/inimigo passa a ser
cial. O objetivo é evitar a compreensão do polí­
política quando o oponente é reconhecido como
tico pela racionalidade liberal-burguesaque pre­
tal. Reconhecimento este que ultrapassa a esfera
tende explicá-lo segundo critérios exteriores,
particular e se efetiva no âmbito do público e se
quer seja da estrutura jurídica, quer seja da orga­
determina no pólo oposto do inimigo (político).
nização social ou econômica da sociedade. O
Qualquer outra contraposição (econômica, reli­
problema para Schmitt está em propor uma for­
giosa, moral, étnica) é subsumida pela contrapo­
mulação para o conflito, de tal forma que este
sição política. O que era “puramente” econômi­
contenha em si um elemento adequado apenas
co, moral ou religioso, adquire um estatuto novo:
para a dimensão do político — a distinção ami­
torna-se político, colocando em segundo plano
go/inimigo. a contraposição originária3. O político é, então,
II. A DISTINÇÃO AMIGO/INIMIGO 3 J. Freuhd, discípulo e de certa forma continuador
para Schmitt, o determinante, a “unidade nor­ Schmitt, não pode [...] ser uma nova substância,
mativa e soberana”. Assim, se a atividade econô­ uma nova ‘m atéria’ ou um novo domínio obje­
mica, por exemplo, atingir uma intensidade tal tivo autônomo. O único critério cientificamente
que ultrapassa a simples oposição de interesses utilizável é doravante o grau de intensidade de
econômicos concorrentes, e se intensifica numa uma associação ou de uma dissociação, quer di­
luta por esses interesses, o que era “puramente” zer, a d istin ç ã o e n tre am igo e in im igo”
econômico transforma-se em político, tendo no (SCHMITT, 1988b: 96). Na Teologia Política
horizonte o caso extremo da guerra. Schmitt insiste sobre o caráter autônomo e não
substancial da política, remetendo-a à dimensão
Se o político não se reduz àquilo que é mera­
existencial do conflito, ou pelo menos, à sua
mente jurídico ou institucional, ele pode se cons­
virtualidade, traduzido na distinção amigo/ini­
tituir numa instância autônoma: um domínio di­
migo, a qual, por sua vez, exprime a intensidade
verso “relativamente independente” da econo­
da sociabilidade associativa ou dissociativa. A
mia e da moral. A distinção rentável e não rentá­
mesma idéia aparece no Conceito do Político'.
vel, bom e mau são exemplos de distinções con­
“a diferenciação entre amigo e inimigo tem o
ceituais que servem para especificar e definir
sentido de designar o grau de intensidade extre­
conhecimentos da Economia e da Moral. Já o
mo de uma ligação ou separação de uma associa­
critério especificamente político determina-se
ção ou dissociação; ela pode, teórica ou pratica­
pela discriminação amigo/inimigo. Contudo, ob­
mente, subsistir sem a necessidade do emprego
serva Schmitt, esta distinção “fornece uma deter­
simultâneo das distinções morais, estéticas, eco­
minação conceituai no sentido de um critério,
nômicas ou outras” (SCHMITT, 1992: 52).
não como definição exaustiva ou especificação
de conteúdos” (SCHMITT, 1992: 51). O antiliberalismo de Schmitt deriva, em par­
te, da concepção “pessimista” do homem, a qual
O objetivo de Schmitt é afirmar o político
remonta à tradição hobbesiana. O pressuposto
independente de qualquer outra relação que não
de uma antropologia negativa autoriza a pensar
seja a de amigo/inimigo, sem nenhuma referên­
a ação humana — mormente quando ela se insti­
cia a uma construção material ou ideal. Com
tui em atividade política — travejada por con­
efeito, esta relação fornece apenas o elemento
flitos e interesses, os quais não podem ser elidi­
existencial específico, a partir do qual o objeto
dos pelo Estado.
da política pode ser elaborado. Enquanto exis­
tencial, ela independe de qualquer julgamento O liberalismo opõe-se a essa antropologia
normativo ou moral. “O critério do político, diz negativa ao pensar a soberania do indivíduo na
singularidade dos seus direitos, constituídos a-
quém de toda tensão conflitual, quer na investi­
de Schmitt, na obra L ’Essence du Politique fornece dura originária desses direitos, quer na atuação
comentários esclarecedores sobre a distinção schmit-
dos mesmos em relações inter-subjetivas.
tiana am igo/inim igo, considerada por Freund com o
uma espécie de cogito da política. Por que ignoramos Segundo esse individualismo otimista, o po­
essa evidência? “A lguns a ignoram — responde der político não possui autonomia. Ele é instru­
Freund — simplesmente porque são negligentes em mentalizado para a proteção e defesa dos interes­
dar atenção à essência do político, atraídos que são ses individuais. O decisivo, para o liberalismo,
pela perspectiva de construção de uma sociedade
não é a afirmação do político, mas a sua limita­
pacífica e harmoniosa, com o se a intensidade da
ção.
esperança em um porvir radioso pudesse, de seu pró­
prio m ovimento, afastar a hostilidade e converter a Para Schmitt, o individualismo não pode con­
política em uma atividade de pura conciliação e de duzir a uma teoria positiva do Estado e da políti­
constante paternidade” (FREUND, 1965: 442-443). ca. Antes de ser a construção de uma teoria
N o entanto, observa Freund, o ser humano que age e
política, o liberalismo é a denegação do político
pensa politicamente, não pode, nas condições his­
e do poder do Estado. “A desconfiança crítica
tóricas que sempre conhecem os, se comportar com o
se o inimigo jamais existisse. Mesmo as teorias hu­
frente ao Estado e à política se esclarece facil­
manitárias têm, também, antes de instaurar a paz per­ mente a partir dos princípios de um sistema para
pétua, um inimigo a vencer. o qual o indivíduo (der Einzelne) tem de perma-
necer terminus a quo e term inus ad quem ” tanto, diante dos muitos status individuais e co­
(SCHMITT, 1992: 98). A crítica schmittianaao letivos pensáveis, o status pura e simplesmente”
liberalismo destaca a relação entre o individua­ (SCHMITT, 1992: 43). Na sua necessária uni­
lismo e a convicção moral num otimismo da versalidade, ele se define como medida: o estado
bondade e perfectibilidade do homem. Enfim, (.Zustand) para além do qual não há nenhum
a crença íiuma harmonia natural da sociedade estatuto possível para o status político. E é esse
baseada no livre jogo dos interesses, determi­ seu status que lhe faculta arbitrar e decidir
nando uma integração harmoniosa dos indiví­ universalmente acima dos “status” individuais.
duos no conjunto da sociedade. Tal ideologia Por isso, o Estado não pode ser a extensão jurídi­
leva à neutralização do político pela sua depen­ ca ou a resultante institucional da sociedade ci­
dência ao moralismo humanitário, ou ao legalis- vil. Se uma sociedade quer ser política, ela o
mo normativista. será necessariamente sob a forma de Estado, isto
é, deve alcançar o status de uma “unidade po­
III. A NEUTRALIZAÇÃO DO POLÍTICO
lítica” que serve de “norma e medida”. Esta uni­
A idéia schmittiana de que “o conceito do dade política suprema congrega os agrupamen­
Estado pressupõe o conceito de político” visa tos sociais divergentes, impedindo a dissociação
destacar a autonomia do político que deixa de e rupturas extremadas. Nesta condição, o Estado
ter uma fundamentação normativa para obtê-la não é uma forma social mais complexa e neutra
na esfera existencial do caráter conflituoso da que aparece apenas como “um conciliador que
natureza humana. se abstém de toda decisão autoritária, que
A forma institucional para a manifestação renuncia totalmente a dominar os antagonismos
desse conflito se dá na instância que se oferece sociais, econômicos e religiosos [...]” (SCH­
como objeto de disputa para o exercício do poder: MITT, 1988b: 143). Esse caráter eminentemente
no Estado e nos procedimentos propriamente político do Estado é um fenômeno da época con­
políticos para alcançar esse poder. O político temporânea, na qual a extensão e a intensificação
não pode, portanto, no modo como ele hoje se do político podem ser promovidas.
apresenta, ser independente da sua forma “esta­ Cada época, nos últimos quatro séculos, diz
tal”, o modo institucional moderno de atuação Schmitt, produz uma representação de si mesma,
do político, pelo qual o Estado detém o mono­ organizada em torno de uma região central do­
pólio do político que se evidencia pelos atos de minante que lhe dá coerência e sentido histórico.
decisão do soberano. Esta forma (estatal) de “Os degraus em que se movimentam o espírito
apresentação do político requer a identificação europeu nos últimos quatro séculos são: teoló­
deste com o Estado. “A fuga da política é a fuga gico, metafísico, humanitário-moral e econômi­
do Estado”, diz Schmitt, ao sublinhar a necessária co. O século XX é caracterizado como a era da
dimensão “estatal” do político. Contudo, se o técnica: o termo aparece neste século na sua mais
Estado deve ser compreendido a partir do po­ estreita ligação com o econômico, como ‘indivi­
lítico, e não o contrário, nem por isso a equiva­ dualism o’” (SCHMITT, 1992: 110). A progres­
lência estatal/político deve ser vista como con- são acima significa uma série de contínuas neu­
ceitualmente necessária. O político, mesmo sob tralizações, sucessivos deslocamentos do lugar
a forma estatal moderna de manifestação, possui do político. Esse processo chega ao seu fim na
a sua autonomia conceituai. era da técnica, onde se institui aquilo que Sch­
Para Schmitt, o Estado não se limita ao as­ mitt chama de Estado total. E é nesse Estado
pecto institucional e normativo do mecanismo que ocorre a absorção da totalidade da existência
burocrático, e nem o compreende como um or­ humana pelo político.
ganismo social complexo. Mais que isso, o Esta­ O Estado total schmittiano não é a teoria do
do “conforme o sentido da palavra e de acordo Estado totalitário, mas a tendência ao hiperes-
com o seu surgimento histórico, é um estado tatismo, no sentido da progressiva intervenção
(Zustand) peculiar de um povo, a saber, o estado do Estado em todos os domínios: na economia,
que fornece a medida em caso de decisão e, por­ na cultura, no laser, na educação etc. Sob o pre-
texto de um Estado do bem-estar social, ele in­ concorrência e de eterna discussão. O Estado
vade a esfera social, identificando Estado e so­ se torna em sociedade e então, de um lado, es-
ciedade. A neutralidade ou a despolitização do piritual-ético, numa representação ideológica
Estado, que o liberalismo promove, está precisa­ humanitária da ‘humanidade de outro lado, nu­
mente na impotência que ele apresenta em se ma unidade econômico-técnica de um sistema
manter uma instituição política pura. unitário de produção e de comércio. Da vontade,
dada na situação de luta e completamente óbvia,
No entanto, a noção de Estado total é ambí­
de repelir o inimigo, surge um ideal ou progra­
gua para Schmitt. De um lado, ela designa um
ma social, construído racionalmente, uma ten­
modo de organização política e jurídica do Es­
dência ou um cálculo econômico. De um povo
tado moderno que se apresenta como um Estado
unido politicamente surge, de um lado, um p ú ­
total no sentido fraco, na medida em que renun­
blico culturalmente interessado, e de outro lado
cia ao monopólio político da decisão: torna-se
em parte um pessoal da fábrica e do trabalho,
um Estado social-providência onde os interesses
em parte uma massa de consumidores. Da domi­
políticos obrigam-no a intervir e, ao mesmo tem­
nação e do poder surgem, no pólo espiritual,
po, procuram subordiná-lo. O Estado de regime
propaganda e sugestão de massas, e no pólo e-
de partidos e o Estado burocrático-adm inis-
conômico, controle” (SCHMITT, 1992: 98-99).
trativo são as outras manifestações deste Estado
total no sentido fraco. Por outro lado, o Estado IV. LEGALISMO E NORMATIVISMO
total, quando está plenamente voltado à realiza­
O instrumento mais poderoso de neutraliza­
ção da sua natureza política, é designado como
ção e de despolitização do Estado é o recurso à
Estado total “por força” . E o Estado que, graças
legalidade normativista que a ideologia liberal
ao avanço da técnica e da racionalidade adminis­
promove. Diante da inevitabilidade do processo
trativa, pode promover uma politização ominila-
histórico de totalização da forma política estatal,
teral da existência humana, apresentando uma
o liberalismo, ao invés de radicalizar essa ten­
interpenetração entre privado e público, entre o
dência sob a forma da legitimidade democrática,
burgeois e o citoyen, entre a sociedade civil e o
permanece apenas no aspecto da legalidade do
Estado.
Estado, isto é, procura compreendê-lo apenas
Esse Estado total “por força” pode ser o re­ segundo o alcance da sua forma legal de consti­
sultado da intensificação democrática traduzida tuição e atuação.
na identificação entre o Estado e o povo, atestan­
Schmitt distingue entre legalidade — defini­
do a tendência da democracia moderna para
da como o exercício do poder político realizado
evoluir em direção à politização total do Estado.
no âmbito ou em conformidade com leis estabe­
“E muito mais importante reconhecer na demo­
lecidas — e legitimidade, como sendo atributo
cracia a causa atual do ‘Estado total’, mais preci­
do Estado que age segundo a identidade entre
samente, a politização total da existência hu­
governantes e governados. A doutrina liberal
mana no seu conjunto” (SCHMITT, 1971: 146).
recorre à legalidade parajustificar a legitimidade
No entanto, essa tendência (e exigência de­ do governo e dos seus atos. A legalidade pres­
mocrática) é neutralizada pelo processo de des­ supõe a adequação entre a lei e a realidade social
politização do político no Estado. O liberalismo e política, operando no vácuo a partir de abstra­
opera uma conversão de determinadas reali­ ções que excluem o conflito e a luta. Isto é, a a-
dades e termos políticos em questões neutras e dequação do poder à lei significa pressupor um
apolíticas, resultando, assim, num deslocamento ideal de governabilidade racional que paira aci­
semântico que reflete esse processo de neutra­ ma dos conflitos, afastando a ação da autoridade
lização. “Assim [diz Schmitt], no pensamento pública que pode se envolver e intervir no confli­
liberal o conceito político de luta se transforma, to, a fim de propor soluções de acordo com a le­
no aspecto econômico, em concorrência, e no gitimidade das reivindicações dos contendores.
outro aspecto, ‘espiritual’, em discussão; no lu­ Legalidade significa neutralidade do governo e
gar de uma clara distinção dos dois diferentes acaba por favorecer o domínio de grupos política
status ‘guerra’ e ‘paz’, entra a dinâmica da eterna e economicamente mais fortes.
A segunda crítica à legal idade refere-se à tri- deve realizar uma mistura ideal destes dois prin­
vialização da lei. Esta degenera-se não só pela cípios. Contudo, Schmitt demonstra simpatia
infinidade dos dispositivos legislativos que tratam pelo princípio da identidade da democracia radi­
de tudo, como também pela proliferação de me­ cal, na mesma perspectiva já tem atizada por
didas não legislativas e regulamentadoras: de­ Rousseau. “O Estado se baseia, como unidade
cretos, ordens de serviço, portarias etc. Estas política, na vinculaçãodedois princípios contra­
medidas acabam tendo força de lei devido ao postos de formação, o princípio da identidade
caráter coercitivo subrepticiamente nelas intro­ (do povo presente consigo mesmo como unidade
duzido. O volume legislativo das leis e o acúmu­ política quando, por virtude da própria consciên­
lo não legislativo das regulamentações solapam cia política e vontade nacional, tem aptidão para
o monopólio da legalidade como fonte de legiti­ distinguir entre amigo e inimigo), e o princípio
midade. da representação em virtude do qual a unidade
política é representada pelo Governo. A aplica­
Com a noção de Estado total, Schmitt não
ção do princípio de identidade significa a ten­
pretende abandonar o elemento da legalidade,
dência ao mínimo de governo e de direção pes­
mas denunciar a sua unilateralidade e insuficiên­
soal. Quanto mais se aplica esse princípio tanto
cia. Nesse estado, é preciso fortalecer a legitimi­
mais se pratica a resolução dos assuntos políticos
dade exatamente porque o Estado tende a se poli­
‘por si’, graças a um máximo de homogeneidade
tizar, a ponto de tornar-se a “auto-organização
naturalmente dada ou historicamente alcançada.
da sociedade”.
Esta é a situação ideal de uma Democracia se­
O caráter plenamente político do Estado total gundo a supõe Rousseau no Contrato SociaF
no século XX, em que todas as atividades sociais (SCHMITT, 1982: 214).
são politizadas, encontra sua efetiva expressão
Este elogio à democracia radical e ao seu
política na democracia, única forma em que se
princípio (de identidade) organizador, associado
realiza esta “auto-organização da sociedade” : a
à concepção que Schmitt tem da Constituição
identidade entre o social e o político. “A razão
como expressão viva orgânica do Estado e forma
de ser d o ‘Estado total’, atual, ou mais exata­
política da unidade de um povo, leva o pensador
mente, da politização total de toda a existência
alemão a criticar a democracia formal dos gover­
humana, há que buscá-la na democracia” (SCH­
nos liberais e o normativismo jurídico (de inspi­
MITT, 1971: 146). Com efeito, o Estado total
ração kelsiana) que orienta a teoria constitu­
significa a plenitude política da sociedade, a efe­
cional destes governos. Schmitt entende a Cons­
tiva participação do cidadão nos assuntos políti­
tituição como a “alma, a vida concreta” de um
cos, possível na democracia, na qual a manifes­
Estado. Ela aparece, aqui também, definida sob
tação plebiscitária constitui uma das formas de
o ponto de vista existencial. O normativismo,
sua legitimidade. Essa radical democratização
ao compreender a Constituição como um con­
da sociedade “deverá abolir todas as distinções,
junto de normas abstratas, aniquila a unidade
todas as despolitizações técnicas do século XIX
viva e concreta que ela deve expressar. A Cons­
liberal, e, ao apagar a oposição Estado-sociedade
tituição da República de Weimar, por exemplo,
(o político oposto ao social), fará também desa­
emborajuridicamente perfeita, pecou pelo cará­
parecer as contraposições e as separações que
ter idealista e abstrato das suas propostas em
correspondem à situação do século XIX [...]”
prejuízo do caráter político que uma Constitui­
(SCHMITT, 1992: 47).
ção deve ter. O texto constitucional deve refletir
Na relação ente o Estado e a sociedade, entre a política enquanto exercício de um poder o mais
o governo e o povo, Schmitt se reporta a dois próximo possível como expressão da identidade
princípios que devem reger a vida política do entre o povo e o Estado. Do contrário, apesar da
Estado em relação à sociedade. O princípio da sua legalidade, ela se torna impotente para resol­
representação política destaca o lado do Estado ver conflitos que, inevitavelmente, surgem em
que abstrai o povo: é o “ Estado sem povo”. Já o qualquer sociedade.
“povo sem Estado” manifesta-se pelo princípio
A pretensão em estabelecer um regime do
da identidade da democracia radical. O Estado
“ império do direito” significa apenas a “ legiti­ “ordem de tipo abstrata”, a concepção normati-
mação de um determinado status quo, em cuja vista concebe o Estado como um ordenamento
manutenção, obviamente, têm interesse todos jurídico organizado segundo uma unidade de
aqueles cujo poder político ou cuja vantagem normas, e cuja referência última é a Constitui­
econômica se estabilizam neste direito [...]” ção. Esta concepção acaba por desqualificar o
(SCHMITT, 1992: 93). Schmitt exemplifica este autêntico caráter da soberania ao despolitizar o
caráter “ ideológico” do império do direito, di­ conceito de Estado em favor da abstração do
zendo que “a soberania do direito significa ape­ seu conteúdo jurídico: “em realidade trata-se da
nas a soberania dos homens”, e que a soberania velha negação liberal do Estado face ao direito
desta “ordem superior” é um “palavrório vazio” [...]” (SCHMITT, 1988a: 32).
para ocultar o sentido político da dominação de
O essencial na soberania é a decisão (ato cria­
determinados homens que, apoiados naquela or­
dor e fundamento de toda norma, verdadeira
dem, dominam sobre outros de uma “ordem in­
arché do soberano), particularmente na demo­
ferior”.
cracia radical enquanto forma de governo que
A concepção normativa do Estado e do direi­ afirma de modo pleno e total o caráter político
to, exemplarmente defendido por H. Kelsen, do Estado, ao promover a identidade entre os
reduz o político à norma, e esta à ordem jurídica. que governam e aqueles que são governados.
O normativismo está baseado na soberania da Schmitt emprega o sentido tradicional de sobe­
norma impessoal, abstrata, fundamentando a lei rania, o qual remonta a Bodin, como o poder
na universalidade de critérios formais: o direito supremo juridicamente independente. No século
deve expurgar qualquer elemento político, fa­ XX, observa Schmitt, Kelsen ameniza a força
zendo prevalecer apenas a pureza da coerência deste conceito ao concentrar o poder do Estado
jurídica. numa realidade puramente jurídica, cujo valor
não é da pessoa do soberano, mas da forma ju ­
Em situação oposta, o decisionismo de Sch­
rídica abstrata que dissolve o caráter forte da
mitt afirma que a “ordem jurídica repousa, a e-
autonomia do soberano.
xemplo de toda ordem, sobre uma decisão, e
não sobre uma norma” (SCHMITT, 1988a: 20). Mas em que condições a decisão do soberano
A decisão é algo extra-jurídico, anterior à norma atesta o seu elemento eminentemente político?
e pertence à esfera da política, ou melhor, a uma Se o soberano possui o “monopólio da decisão”,
vontade política que gera a norma. A decisão é precisamente o caso de exceção que revela
política do soberano cria a norma, o que supõe a com maior clareza a essência da autoridade do
primazia do político sobre o direito. Aqui também Estado. Por isso, Schmitt declara na Teologia
Schmitt segue rigorosamente Hobbes, “o repre­ Política: “soberano é quem decide na situação
sentante clássico do decisionismo” : Autoritas, excepcional” (SCHMITT, 1988a: 15)4. A nor­
non veritas fü c it legem (Leviatã, Cap. XXVI). malidade “esconde” o poder decisório da auto­
Isto significa dizer, em termos schmittianos, que ridade política. É a exceção e não a normalidade
o Estado e a ordem jurídica que o sustenta re­ que interessa a Schmitt. “A exceção é mais inte­
pousam sobre a decisão do soberano, que é pré- ressante que o caso normal. O caso normal não
jurídica. Nem mesmo os direitos do homem, prova nada, a exceção prova tudo [...]” (SCH­
nem os princípios do Rechtstaat podem fun­ MITT, 1988a: 25). O que ela prova? Prova que
damentar o Estado enquanto ordem jurídica poli­
ticamente constituída. A verdade desta ordem
está na autoridade do soberano que decide, e 4 A expressão “situação excepcional” {Ausnahme­
cuja decisão se constitui em condição de valida­ zustand) parece indicar situações políticas mais am­
de da norma. O decisionismo de Schmitt oferece plas e correntes, e não se restringe ao seu aspecto es­
uma clara criticado positivismo jurídico, no sen­ pecificam ente jurídico. Em outros contextos —
tido de que recusa, não tanto o evidente caráter observa Schlegel, tradutor da Teologia Política para
normativo do direito, mas uma suposta raciona­ o francês — Schmitt utiliza as expressões: Ausnahme­
lidade auto-fundadora da norma. Ao colocar no fa ll (caso de exceção), Notstand (caso de urgência),
Notfall (caso de necessidade).
lugar da soberania (existencial) do Estado uma
no caso de exceção a “norma é reduzida ao na­ dividual como fim e a organização estatal (políti­
da”. A decisão é sempre autônoma e única e ca) como meio para a realização destes fins. O
“escapa a toda formulação geral”, própria da recurso à normatividade, isto é, ao governo da
norma que exige organização das condições de lei como forma política de autoridade legítima,
vida que serão submetidas à regulamentação significa excluir do direito qualquer interferên­
normativa. cia estranha à natureza racional da norma. Esse
elemento “puro” do direito, associado ao caráter
Schmitt não recusa a necessidade dessa regu­
irredutível da liberdade individual (e da plausibi­
lamentação. Critica apenas o puro normativismo
lidade moral dos direitos individuais); a idéia
que desconsidera a “subjetividade” da decisão.
do consenso dos homens sobre a conveniência
Deve haver mediação entre a decisão e a norma,
da paz e da supremacia ética do valor dos acor­
entre a situação política e a regulamentação jurí­
dos como idéia reguladora da sociabilidade, são
dica. A norma representa a continuidade, a deci­
pressupostos da teoria liberal para julgar e com­
são a ruptura. O jurista tende a privilegiar as
preender o político. Nessa medida, ele acaba se
normas, porque elas são conservadoras por natu­
desqualificando face à “racionalidade” da lei, à
reza e têm a vantagem de serem impessoais e
positividade do direito e à legalidade dos proce­
aparentemente “objetivas”; enquanto a decisão
dimentos. A norma e o ordenamento jurídico
é pessoal e aparentemente “subjetiva” .
tornam-se auto-suficientes (dotados de uma fun­
O liberalismo neutraliza a política, pois des­ damentação pré-política) e envolve a crença de
loca a decisão para a esfera do interminável dis­ que a norma racional funda a política subordi­
curso que escamoteia toda tensão conflituosa. nando-a aos fins de direito. A ausência de uma
A burguesia é uma “classe discutidora” . Este outra via que não a da racionalidade normativa
conceito de Donoso Cortés é assumido integral­ leva o liberalismo a desqualificar a possibilidade
mente por Schmitt. O “discussionismo” liberal de buscar um fundamento político para a polí­
“coloca toda a atividade política no discurso, tica.
na imprensa e no parlam ento” (SCHM ITT,
Para Schmitt, a racionalidade da norma é in­
1988a: 68). Deste ponto de vista, Schmitt pode
trínseca e necessária a um Estado de Direito e à
afirmar que “a fé no parlamentarismo, em um
sua legalidade, mas não pode ser estendida à
governement by discussion, pertence ao universo
natureza do político. A racionalidade jurídica é
do pensamento do liberalismo. Ela não pertence
de procedimento e de métodos, a “racionali­
à democracia” (SCHMITT, 1988b: 105)5.
dade” política é de outra ordem, ela é existencial,
V. O EXISTENCIALISM O POLÍTICO DE porque é intrínseca à decisão que institui a nor­
SCHMITT ma.
O liberalismo subordina o político às liberda­ Essa fundamentação existencial da política
des individuais, fazendo prevalecer o direito in­ ressalta não a finalidade, o resultado ou o sentido
da decisão política, mas o fato existencial da
própria decisão. Ao destacar o caráter existencial
5 Kervégan, referindo-se à crítica schmittiana à “ética
da sua teoria política (“todas as representações
da discussão” do liberalismo, observa que a elabo­
essenciais da esfera do espiritual do homem são
ração teórica deste tipo de procedimento está na “ética
do discurso” de Habermas, a qual coloca-se contra o
existenciais e não norm ativas” (SCHM ITT,
decisionismo de Schmitt. Segundo Kervégan, “a for­ 1992: 111)), Schmitt argumenta que o critério
mulação mais exata e mais elaborada da ética liberal de validade deste existencialismo político não
da discussão pode ser encontrada num pensador que, é o direito, a positividade ou normatividade da
se leu atentamente Cari Schmitt, apresenta-se com o lei, a justiça, o bem, a virtude ou qualquer outra
o adversário mais resoluto de toda forma de decisio­ determinação ética-racional, mas o ato de ser
nismo: Jürgen Habermas. Sem dúvida, não é exage­ do político que se exprime pela decisão. “Toda
rado reconhecer na sua ética comunicacional o desen­ unidade política existente tem seu valor e sua
volvimento sistemático daquilo que Schmitt apresen­
razão de existência não na justiça ou na conve­
ta como o próprio coração do liberalismo” (KER­
niência de normas, mas em sua própria existên­
VÉGAN, 1992: 123).
cia. O que existe como magnitude política é
juridicam ente considerado digno de existir” de Schmitt como um “nihilismo ativo”, o qual
(SCHMITT, 1982: 46). Esse caráter metafísico- “corresponde exatamente à atitude interior fun­
existencial do político é sustentado pela voluntas damental da ontologia existencial de Heidegger”
e não pela ratio e afirmado mais pelos atos de (LÕWITH, 1991: 44). Para ambos, o decisivo é
decisão do que pela norma. “Uma Constituição a resolução a tudo ou a nada. Essa atitude traz
não se apoia em uma norma cuja justiça seja o como resultado a hipostasia da decisão — a de­
fundamento de sua validez. Se apoia em uma cisão pela decisão — cujo valor não está no obje­
decisão política surgida de um Ser político to nem na sua motivação, mas no próprio ato de
acerca do modo e forma do próprio Ser. A pala­ decisão. Para Lõwith, trata-se de um “nihilismo
vra ‘vontade’ denuncia — em contraste com to­ ativo” que se manifesta por uma indiferença ra­
da dependência em relação a uma justiça norma­ dical quanto ao conteúdo: “a decisão de Schmitt
tiva ou abstrata — o essencialmente existencial para o político não é, como no caso de uma deci­
deste fundam ento de validez” (SCH M ITT, são religiosa, m etafísica ou moral, ou geral­
1982: 94). mente toda decisão espiritual, uma decisão pelo
domínio de um objeto determinado e dominante,
É precisamente essa fundamentação existen­
não é outra coisa senão uma decisão pela
cial da política que dá a oportunidade a conside­
decisão — pouco importa para quê — porque
rações críticas. R. Wolin ressalta que o existen­
ela é, de qualquer modo, a essência do político”
cialismo político (de direita) de Schmitt — ao
(LÕWITH, 1991: 25). A conseqüência, conclui
lado do seu decisionismo e antropologia “exis­
Lõwith, é que o decisionismo de Schmitt cai
tenciais” — ampara o estado de exceção porque
num “ocasionalismo” da decisão, porque consi­
nele a decisão reveste-se de uma “realidade
dera-a como algo vazio e meramente existencial.
existencial superior”, cuja qualidade principal
O seu conteúdo depende apenas da ocasião de
é “transcender a norma”. Por isso, o existencia­
uma determinada situação e da oportunidade de
lismo político “afasta-se sem cessar do tribunal
se aplicar uma decisão.
da razão a fim de poder proclamar impunemente
verdades existenciais de uma ordem superior” A análise de Kervégan do existencialismo
(SCHMITT, 1982: 94). político de Schmitt, orienta-se por uma leitura
positiva, cujo sentido é diferente daquele da
Herbert Marcuse também destaca no existen­
racionalidade do positivismo jurídico. Schmitt
cialismo político a sua auto-justificação: “o exis­
“pretende situar-se não fora, mas além da inter­
tencial aparece essencialmente como oposição
rogação que engendra a racionalidade filosófica”
ao ‘norm ativo’, quer dizer, como um conceito
(KERVÉGAN, 1992: 23). Kervégan ressalta no
que não pode ser submetido a nenhuma norma
decisionismo schmittiano uma “metafísica da
exterior a ele próprio” (MARCUSE, 1970: 91).
positividade” : o fato dele ser algo concreto e se
Disto resulta que “ [...] o verdadeiro detentor do
referir à decisão como o feito efetivo de uma
poder político é definido como estando além da
vontade política instituidora da norma que não
legitimidade e legalidade: ‘é soberano aquele
se reduz à sua mera facticidade. Nesse sentido,
que decide no estado de exceção.’ A soberania
ele pode ser definido como um verdadeiro “posi­
repousa sobre o poder efetivo de tomar esta de­
tivism o” : “o decisionismo autêntico é o verda­
cisão (Dezisionismus). A relação política pro­
deiro positivismo, uma vez que ele vê a força
priamente dita é a ‘relação amigo-inimigo’ (die
normativa da decisão e não como o mero positi­
Freund-Feind Beziehung); seu caso limite é a
vismo, a força factual” (KERVÉGAN, 1992:
guerra que vai até o aniquilamento físico do ini­
70). Com efeito, Schmitt ao se referir aos três
m igo” (M ARCUSE, 1970: 95-96). O poder,
modelos de regras jurídicas (modelo norma-
conclui Marcuse, é justificado pela mera exis­
tivista, modelo institucional e modelo decisio-
tência da autoridade, pelo caráter metafísico e
nista), chama atenção para o aspecto ruim, não
transcendente que ela possui, pois está para além
autêntico deste último. Se analisado do ponto
da sua explicação social e é algo incompre­
de vista da sua autenticidade, este modelo “faz
ensível para o povo.
prevalecer numa decisão pessoal o bom direito
Karl Löwith define o existencialismo político da situação po lítica ju lg a d a com ju ste z a ”
(SCHMITT, 1988a: 13); se visto pelo lado ina­ beralismo demonstrou a “tendência objetiva [...]
dequado, ele pode degenerar para a “pontua­ em escamotear a argumentação fundamentadora
lidade do instante”, para a “força normativa do do político (em seu sentido estrito), favorecendo,
factual” deixando de ser uma decisão autêntica. assim, a neutralização da vida política” (FLI­
CKINGER, 1992: 24). Neste quadro, pergunta
Na caracterização do decisionismo como
Flickinger, como repensar a fundamentação da
“metafísica da positividade”, Kervégan quer
teoria política? Será isso possível? Sem apontar
sublinhar a intenção crítica de Schmitt na rejei­
diretamente para uma resposta, conclui afirman­
ção dos princípios da racional idade normativista
do que “o fascínio maior da teoria schmittiana
dojuridicismo. Ao comparar o pensamento polí­
consiste na descoberta de um ‘abismo’, ou seja,
tico de Schmitt com o de Hegel, Kervégan pro­
de um momento constitutivo do político, sem
cura mostrar que “o que aproxima o jurista Cari
que este sejadeduzível por argumentos inerentes
Schmitt de Hegel é uma recusa radical do ju r i­
à própria razão política” (FLICKINGER, 1992:
dicismo. Como Hegel, ele rejeita a separação
25). Na renúncia à busca desta fundamentação
abstrata entre o direito e a política [...]. É em
que dá lugar a “mitos destrutivos e não legitimá­
termos vizinhos que Schmitt e Hegel não acei­
veis”, Flickinger, no caminho apontado por
tam as abstrações normativistas, universalistas
Schmitt, sugere uma “mito-lógica” do político.
e moralistas [...]. Da mesma forma, observa-se
Conclui afirmando que, pela radical idade do seu
num e noutro uma resoluta rejeição da concep­
questionamento “teológico-político”, Schmitt
ção liberal do Estado e da sociedade, mesmo se
obriga a pensar sobre o “fetichismo da racio­
seus argumentos são diferentes” (KERVÉGAN,
nalidade”.
1992: 24).
Com efeito, o que se pode destacar da crítica
A interpretação de Flickinger move-se, tam­
schmittiana é que ela denunciou a ilusão da ra­
bém, dentro do quadro geral da crítica ao norma-
cionalidade da política liberal na tentativa de
tivismo e à sua racionalidade. Ela destaca o
instaurar um Estado, onde o poder está distribuí­
aspecto “mito-lógico” que está por detrás da crí­
do, regulado e limitado por um ordenamento
tica existencial schmittiana ao liberalismo na
jurídico “neutro” que se diz racional e legítimo.
pretensão que este tem de fundação racional da
No entanto, o problema da filosofia política libe­
política. “O ponto crucial da argumentação
ral está justamente nesta tautologia: a legitimi­
schmittiana, diz Flickinger, é precisamente
dade da norma justifica-se pelo seu normativis-
apontar a impossibilidade de encontrar um últi­
mo. A razão liberal recusa a fundamentação que
mo fundamento de legitimação dentro da ra­
não seja pela via da racionalidade. Apega-se
cionalidade moderna” (FLICKINGER, 1992:
àquilo que ela apresenta como única possibilida­
18). Com isso, observa Flickinger, “se reconhece
de: a positividade da norma que se basta a si
o fato de um momento ‘irracional’ ter caráter de
mesma. Schmitt quer chamar atenção para essas
condição constitutiva da normalidade objetiva,
contradições, e mostrar que a fundamentação
mesmo que este momento não possa ser deduzido
do político escapa à obviedade da razão Iiberal-
dentro da r a c io n a lid a d e d e s ta o r d e m ”
burguesa. Opera, então, com a hipótese do “va­
(FLICKINGER, 1992: 22). Nesta medida, afir­
zio” na fundamentação do político, escolhendo
ma que o liberalismo é incapaz de propor uma
como única possibilidade da sua explicação o
fundamentação do político. Mais que isso, o li­
recurso ao seu irredutível caráter existencial.

Cesar Ramos é Doutor em Filosofia Política (Universidade Estadual de Campinas) e Professor de


Filosofia na Universidade Federal do Paraná (UFPR).

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