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Influência da Saturação dos Transformadores de
Corrente no Desempenho da Proteção Diferencial
I.O.Viana
Abstract: To ensure the safety of electrical power systems
in the midst of a fault it is necessary to ensure the operation of
the devices that compose the protection system. The saturation
of the current transformers (CT's) is one of the main problems
that affect the reliability of the relays, leading to operational
failures. This paper aims to analyze the effects of saturation
with regard to the correct performance of differential relays.
Besides, through computer simulations, the efficiency of the use
of varistors (MOV) as an error mitigation means will be
evaluated.
Keywords – Saturation, Relay, Current Transformer, CT,
Differential Protection, ATPdraw, MOV.
I. INTRODUÇÃO
A proteção dos Sistemas Elétricos de Potência (SEP)
tem como componente chave os relés. Estes dispositivos
operam como sensores de monitoramento online que
interagem diretamente com atuadores (disjuntores ou
seccionadoras) que, em caso de anomalias, isolam os
componentes faltosos a partir do seccionamento do sistema.
Visto que os níveis das tensões e correntes do sistema
elétrico são elevados, é agregado ao conjunto de proteção os
transformadores de medição (TM’s). Estes operam de modo
a reproduzir proporcionalmente a grandeza medida (tensão
ou corrente) de seu circuito primário com sua posição
fasorial mantida, conhecida e adequada para uso em
equipamentos de medição, controle e proteção. [1] A
reprodução dos sinais primários deve ocorrer fielmente de
modo a viabilizar a correta interpretação e atuação dos relés.
A grande preocupação durante o dimensionamento de
transformadores de corrente (TC’s) é a possível ocorrência
da saturação do núcleo durante eventos de curto-circuito,
religamentos, partida de motores, energização de
transformadores de potência (corrente de Inrush), dentre
outros.
Em caso de saturação os TC’s perdem a capacidade de
reproduzir réplica fiel do sistema primário aos relés,
acarretando em mau funcionamento da proteção que se
traduz em desligamentos intempestivos ou não atuação em
caso de faltas.
De modo a mitigar os efeitos da saturação dos TC’s
quanto a confiabilidade do sistema de proteção, vastos
estudos direcionados a elaboração de algoritmos aplicados a
relés de proteção microprocessados tem sido desenvolvidos.
As definições e considerações abordadas terão como
base a aplicação da proteção diferencial comum, onde
utiliza-se um relé de sobrecorrente padrão (ANSI 50/ANSI
51) para executar a função diferencial (ANSI 87). Relés
confeccionados para executarem a proteção 87 apresentam
ferramentas eficientes para mitigar os efeitos de saturação
que não serão abordados neste artigo.
Este artigo tem como objetivo apresentar os efeitos da
saturação de TC’s aplicados a proteção diferencial, bem
como analisar a eficácia da aplicação de varistores (MOV)
em paralelo com as entradas analógicas de relés de baixa
impedância como meio para mitigar seus efeitos, conforme
proposto por Feras e Taek para relés de alta impedância [10].
O MOV é um componente caracterizado como um
resistor especial que apresenta comportamento não-linear
associado à relação tensão e corrente. Para níveis de tensão
igual ou superior ao limite proposto pelo dispositivo, uma
grande corrente passa pelo elemento que se caracteriza como
uma baixa impedância. Quando os níveis de tensão se
estabelecem a níveis inferiores ao limite do dispositivo o
mesmo comporta-se como uma impedância elevada. O MOV
é capaz de transitar da região não linear de operação para a
região linear em poucos nano-segundos. [2]
II. CONSIDERAÇÕES BÁSICAS
A função diferencial é fundamental para estabelecer a
proteção de componentes específicos como transformadores
de potência, linhas de transmissão curtas, barramentos,
máquinas síncronas, dentre outros.
Conforme ilustra a Figura 1, seu funcionamento ocorre
pelos fundamentos da 1ª lei de Kirchhoff.
Figura 1 - Representação Proteção Diferencial.
Onde:
• TC1, TC2: Transformadores de corrente que
compõem a função diferencial comum;
• ZM1, ZM2: Representação do comportamento
não linear do circuito de magnetização dos
TC’s;
• ZB1, ZB2: Carregamento (Burden) dos TC’s,
composto por condutores, chaves de aferição,
medidores, dentre outros;
• ZR: Impedância característica do relé que, em
conjunto com ZB1 e ZB2 compõem o
carregamento do circuito secundário;
 2

• Zmov: Impedância não linear do varistor
disposto em paralelo com as entradas
analógicas do relé;
O desempenho desta configuração depende de que todos
os TC’s em série não só apresentem a mesma relação de
transformação, mas também se comportem de forma idêntica
para quaisquer solicitações.
A realidade é que os transformadores são dispositivos
não ideias e, independentemente da classe de exatidão, são
suscetíveis à saturação durante a operação.
A comparação entre as correntes de entrada e saída
devem permanecer dentro dos ajustes pré-estabelecidos,
conforme Equação 1.
𝑖𝑖𝑖𝑖 = 𝑖𝑖𝑖𝑖 − 𝑖𝑖𝑖𝑖
(1)
𝑖𝑖𝑖𝑖 ≥ 𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖 → 𝑇𝑇𝑇𝑇𝑇𝑇𝑇𝑇
Apesar de existir inúmeras aplicações para a proteção
diferencial, os desenvolvimentos a seguir serão direcionados
para a proteção de barramentos (87B).
Para que o relé diferencial não opere indevidamente, o
valor do ajuste de pick-up deve ficar acima dos possíveis
erros que podem ocorrer, causados pelo defasamento
existente entre os transformadores de corrente. Em geral, a
fim de contornar desligamentos inoportunos causados por
erros intrínsecos à instalação, é prática comum a adoção de
ajustes entre 0.1 e 0.3 p.u.
III. DESENVOLVIMENTOS
Para simular os efeitos da saturação nos transformadores
de corrente para a função diferencial foram realizadas
simulações através do software ATPdraw. A Figura 3 ilustra
as configurações adotadas.

Para condições normais (sem falta), a corrente que

circula pela carga passa pelos TC’s que se encontram em
série, que reproduzem réplicas secundárias com mesma
intensidade e sentido. Desta forma, a corrente prevista para o
relé será nula e a proteção não atuará.
Para condições de falta fora da zona de proteção, dada a
configuração do circuito secundário, ambos TC’s irão
reproduzir a mesma corrente, similar a condição normal,
independente se o sistema elétrico apresenta configuração
radial ou em anel.
Caso a falta ocorra dentro da zona de proteção, devido à
disposição da polaridade dos TC’s, toda a corrente Figura 3 - Representação do sistema elétrico no software ATPdraw
(Saturação de 1 TC).
secundária percorrerá pelo relé, e o mesmo será sensibilizado
conforme ajustes pré-definidos.
Os parâmetros da rede encontram-se na Tabela 1 [4].
O evento de saturação afeta o funcionamento do
dispositivo, levando ao aparecimento inapropriado de Tabela 1 - Parâmetros da rede.
corrente elétrica pelo relé em condições normais de operação Tempo de Amostragem 1μS
ou para faltas fora da zona de proteção, causando
desligamentos inoportunos. Além disto, a saturação pode Configuração Radial
fazer com que a corrente secundária inserida no relé, para Potência de Curto 329MVA
faltas localizadas na zona de proteção, não supere a corrente Tensão Nominal 13,8kV
de ajuste (pick-up) acarretando na falha de proteção a partir
da não atuação do dispositivo. X/R 17
A curva de saturação típica de transformadores Burden 6Ω
apresenta comportamento similar ao ilustrado pela Figura 2. Relé (2+j3,464)Ω
O TC passa a atuar em regime de saturação ao ultrapassar o
limite de corrente de magnetização determinado pelo joelho A Tabela 2 apresenta os parâmetros relacionados a
da curva (“knee point”), definido como ponto do qual a saturação do transformador de corrente [4].
elevação de 10% da tensão corresponderá a um aumento de
50% da corrente de magnetização, segundo IEC 60044. Tabela 2 - Parâmetros do TC a montante.
I[A] φ[Wb.T]
0,01414 0,1049
0,1402 1,444
0,6492 1,673
1,5033 1,706
2,8681 1,755
26,7258 1,898
RTC 120
Figura 2 - Curva de saturação.

Foi considerada, primeiramente, a ocorrência da
saturação em apenas um dos TC’s da configuração, bem
como ângulo da tensão igual a 90°. O objetivo é ilustrar o
pior cenário de incompatibilidade entre os TC’s.
Além disto, foi atribuído o mesmo curto-circuito para
falhas dentro e fora da zona de proteção, similar a uma falta
próxima ao TC a jusante.
As figuras 4 e 5 apresentam, simultaneamente, as
oscilografias de corrente e tensão registradas na entrada do
relé durante a ocorrência de curto-circuito franco dentro da
zona de proteção, considerando-se a ocorrência de saturação
do TC a montante.
Figura 4 - Corrente registrada na entrada do relé para falta interna a zona
de proteção (TC saturado).
Figura 5 - Tensão registrada na entrada do relé para falta interna a zona de
proteção (TC saturado).
As figuras 6 e 7 apresentam, simultaneamente, as
oscilografias de corrente e tensão registradas na entrada do
relé durante a ocorrência de curto-circuito franco fora da
zona de proteção para a mesma configuração.
Figura 6 - Corrente registrada na entrada do relé para falta fora da zona de
proteção (TC saturado).
3
Para avaliar a eficiência da aplicação de varistores na
entrada de corrente dos relés, foi necessário o
desenvolvimento de premissas para estabelecer o
comportamento tensão/corrente do dispositivo a ser utilizado
que pudesse apresentar algum ganho de desempenho ao
sistema de proteção, considerando-se a ocorrência de
incompatibilidade de TC’s provocada pela saturação de um
dos componentes da proteção diferencial.
Figura 7 - Tensão registrada na entrada do relé para falta fora da zona de
proteção (TC saturado).
Visto que em aplicações reais os TC’s que compõem o
sistema de proteção diferencial são projetados para
apresentarem características semelhantes, foi analisado o
cenário onde há a ocorrência de falta fora da proteção com
saturação de ambos transformadores, conforme ilustrado
pela Figura 8.
Figura 8 - Representação do sistema elétrico no software ATPdraw
(Saturação de 2 TC’s).
A consideração dos parâmetros apresentados pela
Tabela 2 aplicados ao TC a jusante implicaria em uma
situação demasiadamente idealizada que agregaria pouco ao
estudo. Sendo assim, os parâmetros adotados para o
transformador de corrente a jusante são apresentados na
Tabela 3, adotando-se pequenas alterações no modelo
proposto por [4] a fim de possibilitar a ocorrência de
diferentes níveis de saturação entre os TC’s.
Tabela 3 - Parâmetros do TC a jusante.
I[A] φ[Wb.T]
0,01414 0,1049
0,1402 1,4
0,6492 1,45
1,5033 1,6
 4

I[A] φ[Wb.T] I[A] U[V]

2,8681 1,68 760 42,6
26,7258 1,78 1000 43,8
RTC 120
As 11 e 12 apresentam os gráficos comparativos de
As figuras 9 e 10 apresentam, simultaneamente, as corrente registradas com a utilização de um varistor em
oscilografias de corrente e tensão registradas na entrada do paralelo com a entrada de corrente do relé obtidas a partir da
relé durante a ocorrência de curto-circuito franco fora da aplicação dos parâmetros da Tabela 4 na configuração
zona de proteção, considerando-se a ocorrência de saturação apresentada pela Figura 3 considerando-se a ocorrência de
dos dois TC’s de proteção. saturação em apenas 1 dos TC’s.

Figura 9 - Corrente registrada na entrada do relé para falta fora da zona de Figura 11 - Corrente registrada na entrada do relé para falta interna a zona
proteção (2 TC’s saturados). de proteção (TC saturado com utilização de varistor paralelo).

Figura 12 - Corrente registrada na entrada do relé para falta fora da zona de

Figura 10 - Tensão registrada na entrada do relé para falta fora da zona de
proteção (1 TC saturado com utilização de varistor paralelo).
proteção (2 TC’s saturados).

Visto que a proteção diferencial apresenta ajustes que

representam uma pequena fração da corrente nominal do
circuito protegido, é necessário estabelecer premissas para
dimensionar corretamente o varistor shunt. Para efeitos
práticos, será considerada uma corrente nominal de 1300A.
Sendo 1p.u a maior diferença possível entre a entrada e
a saída da zona de proteção (característico de faltas internas
para circuitos radiais), baseando-se na impedância do relé
apresentada pela Tabela 1, será fixada a tensão de corte igual
a 40V.
Deste modo os parâmetros adotados para o varistor,
Figura 13 - Corrente registrada na entrada do relé para falta fora da zona de
adaptados para o sistema de proteção sob análise, proteção (2 TC’s saturado com utilização de varistor paralelo).
apresentam-se na Tabela 4.

Tabela 4 - Parâmetros do MOV.

IV. ANÁLISE
I[A] U[V] Durante a ocorrência de curto-circuito, o relé de baixa
impedância não representa um carregamento significativo
0,1 37,3 para o TC. Desta forma, os níveis de tensão previstos para os
230 39,4 terminais do dispositivo no momento da falta não são
500 41,4 elevados, conforme ilustram as Figuras 5 e 7.

As correntes de falta apresentaram comportamentos
típicos para falhas dentro e fora da zona protegida,
independente se a ocorrência envolve um ou mais TC’s
saturados.
Para curto-circuito dentro da zona protegida,
considerando-se a composição radial, apenas o TC a
montante reproduz a corrente de falta para o relé, conforme
ilustra a Figura 14.
Figura 14 - Circuito equivalente para faltas na zona de proteção
(Composição radial).
A assimetria subtransitória característica do curto-
circuito contribui para a saturação do TC, que distorce a
corrente. A réplica secundária apresenta valores atenuados
até que a assimetria se encerre, aliviando o TC, que promove
reproduções menos distorcidas à medida que o tempo se
estende para o regime permanente.
Para curto-circuito fora da zona protegida, tanto o TC a
montante quanto o TC a jusante compõem a corrente
fornecida ao relé, conforme ilustra a Figura 15.
Figura 15 - Circuito equivalente para faltas fora da zona de proteção
(Composição radial).
Para faltas fora da zona de proteção, a assimetria
subtransitória apresenta comportamento contrário ao
estabelecido para curtos-circuitos internos. A forte corrente
assimétrica promove a saturação dos TC’s que, por sua vez,
apresentarão réplicas distorcidas com diferentes intensidades
de corrente que irão se somar (1ª Lei de Kirchhoff) no
circuito central, que representa o relé. Desta forma, na
ocorrência de saturação dos TC’s para esta situação haverá
sobrecorrentes acentuadas durante o período subtransitório.
Conforme o tempo se aproxima do regime permanente,
a assimetria da corrente de curto se extingue e os TC’s
tendem a pontos mais próximos do “joelho de saturação”
(Figura 2).
V. CONCLUSÃO
Em vista dos gráficos apresentados, nota-se que há
compatibilidade entre os valores máximos de tensão
registradas para faltas dentro e fora da zona de proteção,
considerando-se a ocorrência de saturação de um dos TC’s.
Deste modo, em uma análise preliminar, é possível dizer
que a limitação da tensão máxima através da alocação de
varistor shunt na entrada dos relés promove perda de
5
sensibilidade para a ocorrência de falhas internas à zona de
proteção.
É possível concluir que a simples inserção de varistor
em instalações que utilizem função diferencial comum com
relés de sobrecorrente de baixa impedância não apresenta
quaisquer benefícios para o desempenho do sistema.
Uma técnica simples aplicada para fornecer meios
operacionais para a proteção diferencial de sobrecorrente em
meio a condições de saturação de TC é a utilização de tempo
de atraso de trip até que a corrente transitória se estabilize.
Este recurso é pouco interessante visto que expõem o sistema
a possíveis eventos faltosos por um maior período de tempo.
[5]
RECOMENDAÇÕES
Em instalações que utilizam a proteção diferencial
comum, a ocorrência de saturação dos TC’s de proteção
fatalmente levará ao mal funcionamento dos relés.
Desta forma, é recomendável a troca destes dispositivos
por outros que apresentem recursos para tratar estes
fenômenos, como relés de alta impedância que utilizem a
metodologia diferencial percentual.
REFERÊNCIAS
[1] G. Kindermann. “Proteção de Sistemas Elétricos de Potência”.
3ªEd.Vol.1. Florianópolis, LabPlan Editora, 2012.
[2] Harnden J.; Martzloff F and Morris G., "Metal-oxide varistor: a new
way to suppress transients, " General Electric Co, 1972.
[3] IEC 60044-6, “Instrument Transformers Part -6. Requirements for
protective Current Transformers for Transient performance”, 2nd
Edition, International Electrotechnical Commission.
[4] P.S.Silva, “Investigação sobre os efeitos da saturação de corrente de
proteção”, Monografia de Especialização, CESEP, 2014.
[5] Behrendt K., Costello D. and Zocholl S.E., “Considerations for Using
High-Impedance or Low-Impedance Relays for Bus Differential
Protection”, SEL Journal of Reliable Power, Volume 2, Number 3,
September 2011.
[6] G. Benmouyal and S. E. Zocholl, “The Impact of High Fault Current
and CT Rating Limits on Overcurrent Protection, ” proceedings of the
29th Annual Western Protective Relay Conference, Spokane, WA,
October 2002.
[7] J. Roberts, S. E. Zocholl, and G. Benmouyal, “Selecting CTs to
Optimize Relay Performance, ” proceedings of the 23rd Annual
Western Protective Relay Conference, Spokane, WA, October 1996.
[8] S. E., Zocholl and D. W. Smaha, “Current Transformer Concepts, ”
proceedings of the 19th Annual Western Protective Relay Conference,
Spokane, WA, October 1992.
[9] S. E., Zocholl, “Current Transformer Accuracy Ratings, ” Schweitzer
Engineering Laboratories, Inc., June 2006.
[10] F.Mahfound, G.C.Lazaroiu, T.Kherbek and T.Hayder, “ Improvement
of Differential Protection Performance by External Faults Associated
with a Current Transformer Saturation”, IEEE publication, 2017.