Mas há autores que não procuram apresentar senas, nem pintar quadros.
É insuficiente. Dar vida a duas verdades, uma pela outra, não é precisamente fazer
uma antítese.
Também é inexato.
Muitas vezes, até há antítese, sem essa mescla. É difícil definir-se bem a antítese,
porque reveste mil formas.
Marmontel chama-lhe uma relação de oposição, entre dois objetos diferentes ou,
num mesmo objeto, entre as suas qualidades ou os seus modos de operar. O que quer
dizer que ela consiste em opor os pensamentos uns aos outros, para lhes dar relevo.
San-Paulo disse:
Amaldiçoam-nos e nós abençoamos. Perseguem-nos e nós sofremos. Dizem-nos
injúrias e nos respondemos com orações. Coríntios, I, IV.
Pode notar-se aqui a criação do segundo pensamento pelo primeiro. Cada segundo
pensamento estava contido no primeiro.
Diderot escreve a Rousseau que julga dever dar-lhe um bom conselho, embora
pense que ele o não seguirá.
Como se vê, trata-se de alargar um pensamento para extrair dele o seu contrário
ou alguma oposição paralela. Na ideia de que há historiadores de gênio, isto é, de
inspiração, e outros que só tem erudição, o espírito encontra uma relação das
oposições, de que Montesquieu faz esta frase:
Entre os autores que escreveram sobre a história de França, uns tinham talvez
erudição demais para que tivessem gênio, e outros muito gênio, para que tivessem
erudição.
Montesquieu, Pensamentos Diversos.
Há pessoas que gostam do laconismo nas obras. É que as acrescentam por sua
conta, mas os autores perdem com isso.
Quando se tem o corpo esguio, avoluma-se, e assim, quando há pouco que dizer,
multiplicam-se as palavras.
Plutarco gosta mais que nós o gabemos pelo seu juízo que pelo seu saber; gosta
mais de se tornar desejado do que de saciar, sabia que nas obas coisas se pode dizer
muito.
Aqueles que tem corpo magro, enchumaçam-no; aqueles que em assunto frouxo,
enchem-no de palavras. Montaigne, Ensaios, 1, 25.
Estas antíteses aparecem por si. É um processo simples. Por isso não admira que
Duclos tenha escrito estas belas frases a tal respeito:
Os néscios, que conhecem muitas vezes o que não têm e que supõem que é um
erro ignorá-lo, vende o triunfo da originalidade, tornam-se originais, e deve calcular-se
o que poderá produzir esse excêntrico intuito.
Em vez de se limitarem a não ser nada, o que tão bem lhes convinha, querem à
viva força ser alguma coisa e são insuportáveis.
Tendo notado, ou antes, tendo ouvido dizer que há gênios reconhecidos que nem
sempre são isentos de um grão de loucura, tratam de imaginar loucuras e só fazem
tolices.
Não podendo ser ilustres, tratam pelo menos de ser famosos; querem que se fale
deles, que se ocupem deles. Querem antes ser desgraçados, do que ser desconhecidos.
Aquele que prende a atenção pelas suas desditas tem nisso meia consolação.
Diz Marmontel:
A filosofia pode gemer ou sorrir, pensando que o maior monumento, saído das
mãos dos homens, é um túmulo. Mas, porque se não há de ver na pirâmide de Queops
senão um monte de pedra e um esqueleto?
Não foi pelo sentimento do seu nada que o homem construiu tal sepulcro; foi pelo
instinto da sua imortalidade.
Este sepulcro não é a baliza que anuncia o fim de uma carreira de um dia; é a
baliza que marca a entrada de uma vida sem fim; é uma espécie de porta eterna,
construída nos confins da eternidade...
A vista de um túmulo não ensina, então, nada? Se ensina alguma coisa, porque
lastimar que um rei quisesse tornar perpétua a lição?
Logo que o homem morre, os monumentos da sua vida são ainda mais vãos que
os da sua morte. O seu mausoléu é pelo menos útil às suas cinzas, más os seus palácios
conservam acaso alguma coisa dos seus prazeres? Chateaubriand, Itinerário, VI parte.
É pela afirmação do seu nada que esses reis perpetuaram a sua duração. Foi a
imagem da morte que deu glória à sua vida. Lembramo-nos deles pelo que é transitório,
e o lado perecível do seu destino é que lhes salvou a memória. A sua recordação persistiu
apenas pela glorificação do seu esquecimento.
Eis aqui o que pode inspirar o uso da antítese. Não há senão escolher, reforçar,
desenvolver; porque tudo isto, evidentemente, não é igualmente bom, nem bom ao mesmo
tempo, mas tem muito disso.
É preciso, primeiro que tudo, saber tirar partido de uma ideia e notar os
contras que ela comporta.
Sois milhares contra um. A vossa fraqueza é a força dele. Oprime-vos, porque vos
submeteis. Não sabeis resistir a alguém, que nem sequer sabe o que é combater! Se tendes
as mãos ligadas, é porque as estendeis... cultivais a terra, para ele vo-la tirar.
Adotai este rodeio, que consiste em dispor o contrário das coisas, e as ideias
chegarão, desdobrar-se-ão, engendrar-se-ão
Que vício, ou antes que desgraçado vício, ver um número infinito não obedecer,
mas servir, não ser governado, mas tiranizado, não tendo bens, nem país, nem filhos,
nem mesmo a vida que deles seja?
Como pode ele ter tantas mãos para vos ferir, se é de vós que as toma?
Os pés, com que ele esmaga as vossas cidades donde os teve eles, se não são os
vossos?
Como é que ele tem qualquer poder sobre vós, senão por meio de vós mesmos?
Como se atreveria ele a passar sobre vós, se não estivesse entendido convosco?
Que poderia ele fazer, se vós não fôsseis receptadores do ladrão que vos rouba,
cúmplices do assassino que vos matas e traidores de vós mesmos?
Eis aqui excelentes conselhos, que Rondelet nos dá, sobre o mecanismo da
antítese:
— A qualquer gênero que pertença uma composição, quer ela saia do familiar,
quer do sublime, nem por isso é menos certo que ninguém, na verdadeira conversação,
jamais se exprimiu assim, e procurou ou conseguiu atingir o grau exato de precisão ou
sobriedade.
Não se escreve como se fala, assim como não se deve falar como se
escreve.
Seja o que for, e para nos limitarmos ao nosso atual assunto, não há dúvida que
o leitor se prende, ainda que não seja senão por deferência à sua dignidade, a um certo
cuidado e a certas atenções da parte do escritor.
Se ele não exige que lhe ponham sobre a mesa a baixela de prata e o serviço do
Japão, pelo menos espera encontrar a toalha lavada e as crianças asseadas.
O estilo escrito, por mais familiar que o aceitem, e por mais baixo que o
imaginem, não deixa de ser uma expressão encontrada com a pena na mão, de
que se recebe a comunicação por intermédio de um livro e não pela impressão fugaz de
uma conversação.
É que realmente há uma copiosa fonte de belezas, de que os escritores novos não
tirarão poucas vantagens.
Mas pergunto a mim próprio se valerá a pena ser repetido isto, sob esta forma
frouxa, que mal toca no espírito.
A desgraça não engrandece somente o caráter, que lhe resiste pela luta, mas a
inteligência, que com ela lucra, pela contemplação.
Sob esta forma, nada tem de cativantes, e não passam de simples opiniões, como
se ouvem todos os dias na conversação.
A verdadeira desgraça da maior parte dos homens está em eles adiarem sempre
para o outro dia, o gozo de viver ou a possibilidade de trabalhar.
Não faltará quem diga que, com tais cuidados, o estilo não é natural; que contém
um requinte dificilmente suportável e que as expressões tão fortemente concentradas e
tão sabiamente equilibradas não podiam chegar por si só à pena; que há por conseguinte
um esforço visível, e portanto penoso, para o escritor e para o leitor, ao mesmo tempo.
Há dias em que nos achamos mais bem-dispostos; então, trabalha-se com mais
ardor e há mais probabilidades de bom êxito.
Veem-se os belos efeitos de estilo, que a antítese pode produzir. Pode ser curta,
um simples embate de palavras:
O filho de Deus fez-se homem, a fim de nos tornar filhos de Deus. Foi ferido para
curar as nossas chagas. Tornou-se escravo para nos tornar livres.
Finalmente, morreu, para que nós vivêssemos.
San-Cipriano, Sermão sobre a Esmola.
Uma vez que se saiba tirar estas espécies de efeitos de um pensamento, bastará
repetir o processo, dividi-lo em séries, e obter-se-ão diferentes gêneros de antíteses:
Saint-Évremond, Os Historiadores.
Fléchier explorou muitas vezes este jogo de ideias, como nesta passagem:
Tal era, enfim, a sua habilidade, que, quando vencia, só podiam atribuir tal honra
à sua prudência.
2. Antítese enumerativa.
Pode compreender-se, sob o nome de antítese enumerativa, a que consiste em
apresentar dois pensamentos opostos a desenvolvimentos paralelos indefinidos.
Duas ideias tinham erguido a Idade Média da informe barbaria; uma, religiosa,
que erguera gigantescas catedrais e arrancara do solo as populações, para as levar à
Terra Santa; a outra, secular, que edificara as fortalezas feudais e pusera de pé o homem
de sentimentos, armado nos seus domínios; uma, que produzira o herói aventureiro; a
outra, que produzira o monge místico; uma, que é a crença em Deus; a outra, que é a
crença em si.
Ambas, excessivas, haviam degenerado pelo impulso da sua própria força; uma
exaltara a independência até à revolta; a outra desvairara a piedade até ao entusiasmo;
a primeira tornava o homem impróprio para a vida civil; a segunda infundia no homem
a vida natural; uma, instituindo a desordem, dissolvia a sociedade; a outra, entronizando
a despropósito, pervertia a inteligência. Fora preciso reprimir a cavalaria, que tinha por
alvo a pilhagem, e refrear a devoção que importava o servilismo.
3. Antítese simétrica.
Em vez de ser puramente enumerativa, a antítese pode fracionar-se, espacejar-se
e tornar-se simétrica por meio de pequenas oposições, como nesta bela descrição de um
exército:
4. Antítese-retrato.
O retrato é bem conhecido como gênero literário. Encontra-se nos oradores, nos
historiadores, nos romancistas.
— Mais afortunado súdito que ditoso príncipe; mais sem vícios que virtuoso;
superior à condição privada em quanto nela se esteve; e, na opinião de toda a gente,
capaz de ser imperador, se o não tivesse sido.
Maria Stuart estava muito adiantada, para a sua idade. Era alta e formosa. Os
seus olhos respiravam espírito e resplandeciam de brilho. Tinha as mãos mais bem-feitas
do mundo. A sua voz era doce, o seu aspecto nobre e gracioso, a sua linguagem era
animada e inspirava já profunda simpatia. Mignet.
Estas linhas não só se podem aplicar a Maria Stuart, como a qualquer outra
mulher, inteligente e bela. Tal retrato não é mais que um lugar-comum.
Diz ele:
O que se assemelha a muita gente não pode servir para caracterizar ninguém.
Vou citar um, que poderá substituir todos os outros; encontrareis reunidas nele
quase todas as ideias que é costume copiar dos antigos escritores, para compor assim
essas espécies de imagens artificiais, sem aspirar a semelhança alguma.
Quero falar do retrato, que Sarrasin colocou ao princípio de uma obra histórica,
que não concluiu e tem por título: A conjuração de Valstein.
Esse fragmento teve celebridade nos meados do século XVIII; é um dos mais
notáveis monumentos do estado da nossa língua em 1650 e dos progressos que a arte de
escrever em prosa começava a fazer entre nós.
Ao mesmo tempo, muito curioso e perspicaz, quanto aos planos dos outros; muito
prudente em dirigir os seus e, sobretudo, muito esperto em os ocultar, e tanto mais
impenetrável, quanto ele afetava em público candura e liberdade, censurando no
próximo a dissimulação, de que se servia em todas as coisas.
Fosse qual fosse o estado em que a fortuna o pusesse, pensou sempre em elevar-
se mais; e, afinal, tendo chegado a tal ponto de grandeza, que não tinha senão as coras
acima dele, teve a coragem de pensar em usurpar a da Bohêmia ao Imperador. E, posto
que soubesse que tal desígnio era cheio de perigos e perfídia, desprezou o perigo que
vencera sempre e julgou dignas todas as ações, quando, além do cuidado da
conservação, as praticava para reinar.
Daunou diz:
— Ia jurar que, de todas estas ideias, quase não há uma que seja de Sarrasin,
nem que convenha a Valstein, mais que a qualquer outro ambicioso.
Pelo contrário, poderíamos dizer que elas estão muito mal aplicadas aqui, pois
parece que Valstein não concebeu projetos de usurpação ou de revolta, senão quando
reconheceu que o Imperador Ferdinando II, cujos exércitos comandava, desconfiava dele
e lhe tomara ódio.
Depois de ter mostrado a falsidade histórica dos traços que compõem essa figura,
Daunou conclui dizendo:
— Seria supérfluo entrar em mais extensos pormenores; quis apenas mostrar que
o traçado por Sarrasin, é de pura fantasia; mas, para dizer a verdade, nem sequer é um
jogo de imaginação, é um tecido de rapsódias.
Esta página de Daunou resume os nossos conselhos. Tais observações têm uma
importância capital, porque, quer se escreva história, quer se escrevam romances e contos,
as regras são sempre as mesmas.
Os romancistas medíocres fazem retratos de donzelas; mas são raros os que fazem
o retrato de uma donzela.
Eis aqui pois este retrato, tão difuso e tão pouco expressivo:
Para o usurpador, que tinha elevado pelo caminho da injustiça, que despojou o
inocente e expulsou o herdeiro legítimo, para se por no seu lugar e revestir-se com os
seus despojos, ah! A sua glória ficará sepultada com ele no túmulo e a sua morte
desenvolverá a vergonha da sua vida.
Então, sendo tirado o dique que opunham, aos discursos públicos, os seus triunfos
e o seu poder, tirar-se-á vingança, sobre a sua memória, dos falsos louvores, que
forçadamente tinham atendido a sua pessoa.
A sua falsa glória apenas durará um momento e o seu opróbrio só findará com
os séculos.
A última posteridade só o conhecerá pelos seus crimes, pela piedade filial calcada
aos pés, à face dos reis e das nações, que tiveram a cobardia de aplaudir a sua
usurpação; finalmente, pelo atentado, com que destronou um pai e um rei justo, para se
colocar em seu lugar.
Mas, afastemos por agora esta discussão crítica à qual só voltaremos muito
forçadamente.
Quereis ver agora como Bossuet descreveu o protetor Cromwell, quase tão odioso
como o príncipe de Orange?
Só ela, e não as cortes de França ou da Inglaterra, era o que este grande homem
representava, perante a justiça dos seus pensamentos, quando soube antecipar assim o
julgamento da mesma posteridade. Maury, Ensaio sobre a Eloquência, p. 148.
5. O paralelo.
Quando se comparam entre si dois assuntos (caracteres ou retratos, etc.) o trecho
chama-se Paralelo.
Plutarco comparou vinte e quatro homens ilustres da Grécia com igual número de
Romanos célebres, desde Teseu e Rômulo até Demétrio e Marco António.
Lede estas linhas sobre Sócrates e Catão. Vê-se aqui a antítese no seu estado
natural:
Muitos escritores se serviram dela, tais como: Sêneca, Plínio o Moço, Salviano,
Lucano, Santo Agostinho, entre os antigos.
Um homem, a quem ninguém agrada, é muito mais desgraçado que aquele que
não agrada a ninguém. (Saint-Real). No poder de Augusto, a liberdade só perdeu os
males que ela pode causar, e nada da felicidade que ela pode produzir. (Saint-Évremond,
Os Romanos).
É preciso rirmo-nos antes de sermos felizes, com receio de morrermos, sem nunca
termos rido. (La-Bruyère).
Diz um pensador, que fez sobre o estilo uma obra de considerações gerais:
— Não é preciso fazer contrastar as palavras entre si, nem as palavras com as
coisas; é necessário que os contrastes estejam entre as ideias. Beccaria, Recherches.
É por se terem esquecido deste preceito, que tantos autores são insuportáveis. No
século XVII, quase toda a literatura havia adotado esse mau gosto.
A afetação inspirou algumas vezes a Racine, versos como estes, que apresentam
Pirro como grande incendiário de navios:
Estas espécies de ditos só são admissíveis, quando se tira deles um efeito cômico,
como nestes versos:
O rapasto seria o repouso; o meu cozinheiro não me serviria veneno por peixe.
(poisen pour du Poisson).
Fatalista na sua História, fatal nos seus conselhos, fátuo nas suas resistências,
reunindo em si tudo o que inspira, contra a Providência o culto do acaso, contra o poder
do gênio do aniquilamento e contra si próprio o excesso da vaidade; recriando-se
(s’amusant) como seu espírito, iludindo-se (s’abusant), com a sua ambição, gozando
(s’usant), com a sua volubilidade.
Bossuet disse:
— Aqueles que fazem antíteses, forçando as palavras, são como aqueles que
fazem janelas falsas, só para simetria. A sua regra não está em falar com justeza, mas
em fazer figuras justas.
Carlos Nodier é mais severo ainda, a tal respeito. Carlos Nodier, Questões de
Literatura Legal, p. 68.
Marmontel disse:
E Brunetière acrescenta:
Os defeitos da antítese.
As antíteses são más, quando são rebuscadas e não naturais; quando não fazem
corpo com a ideia, e quando, em vez delas, se podem encontrar também antítese
verossímeis; quando o seu desenvolvimento se baseiam em artifícios de retórica; quando
correspondem a simetrias insignificantes; quando ficam vagas, duvidosas, sem
consistência.
Na verdade, os Alemães têm tido a liberdade de pensar, como nós. Kant, Fichte,
Hegel e Strauss não se contentavam apenas com a liberdade de devanear.
Quanto a Rossini, não era de Nápoles, terra dos Lazaroni; nasceu em Pésaro,
(Marcas).
V. Hugo, Filosofia.
Graco reunia ao amor do bem um ódio do mal, ainda mais forte. Tinha compaixão
pelos oprimidos e muita animosidade contra os opressores. De forma que, prevalecendo
a paixão sobre a virtude, odiava insensivelmente mais as pessoas que os crimes.
Prosseguia, por espírito de facção o que tinha começado por um sentimento de virtudes.
Saint-Évremond, Os Romanos.
Não há razão para se não continuarem tais enumerações e dizer: resolver tantos
perigos, conciliar tantos interesses, afrontar tantas revoltas, etc.
Thiers não é o mais eloquente dos nossos oradores: não tem a amplitude de
Guizot; não tem o esplendor de Lamartine; não tem a dialética apaixonada de Berryer;
não tem a graça pérfida e cáustica de Montalembert; não tem o ardor grandioso de
Ledru-Rollin; mas tem a nitidez, a limpidez, o método, a lógica, o imprevisto, a audácia,
o vigor, tudo que cativa, tudo que seduz, tudo que fascina.
O abuso é escorregadio.
Altivo, sem orgulho; confiado, sem presunção; ambicioso, sem egoísmo, fino, sem
malícia, amável, sem volubilidade; instruído, sem pretensão; firme, sem rudeza, etc.
Quando ela fizer parte integrante do vosso pensamento, dosá-la-eis, mesmo contra
a a vossa vontade, apresentá-la-eis com tato; evitá-la-eis, se ela fatigar; explorá-la-eis,
se ela impressiona.
Ela deve moldar o vosso modo de pensar, porque o seu uso em literatura não é
acidental, mas geral, como vai prova-lo o exemplo de todos os nossos grandes prosadores.
É necessário que ela pareça não ter sido nem rebuscada, nem arquitetada, nem
combinada, mas involuntariamente demonstrada.
Somente os fatos a devem fazer brilhar, como a seiva faz abrir o gomo.
Na sua defesa de Milão, Cícero prova, com fatos, que é inverossímil que seu
cliente, tendo podido desembaraçar-se de Clódio facilmente e com segurança, procurasse
mata-lo nas circunstâncias mais favoráveis e correndo o risco de ser castigado.
Era lá possível que, depois de ter desprezado ocasiões, parar tirar a vida a
Clódio, com a aprovação geral, tivesse tomado essa resolução numa circunstância, em
que tal ação lhe devia criar tantos inimigos?
Podeis supor que, depois de ter respeitado a sua vida, quando lha poderia
arrancar com justiça, num lugar, num momento favorável, com a certeza da impunidade,
pudesse tenta-lo, contra toda a justiça, num lugar suspeito, numa circunstância
desfavorável, com o risco de ser punido severamente?
Temístocles foi banido, depois de ter salvado a sua pátria; Camilo salvou
a sua pária, depois de ter sido banido. Camilo é o maior dos Romanos antes de
seu exílio; depois de seu exílio, é superior a si próprio.
Eis aqui uma, excelente, extraída do assunto, sem artifício nem esforço:
Séyés foi o amigo ou o mestre dos homens mais notáveis do nosso tempo.
Montaigne sabe bem o que diz, mas nem sempre sabe o que vai dizer.
Se pensa em ir a um lugar qualquer, o menor objeto que lhe passa diante dos
olhos fá-lo sair do seu caminho, para correr atrás desse segundo objeto.
Mas o importante é que ele se distrai com melhor resultado, que se fosse por
caminho direito.
As suas digressões são muito agradáveis e instrutivas.
De ordinário, quando deixa o bom, encontra o melhor, e é certo que nunca muda
de matéria, sem que o leitor lucre com esta mudança...
Uma antítese só é boa pela verdade absoluta das coisas que exprime.
Eis aqui um último exemplo deste gênero superior de antítese, aplicado a uma
abstração.
Fala-se de tudo, para que todos tenham alguma coisa que dizer; não se
aprofundam os assuntos, com receio de enfado; propõem-se como de passagem, tratam-
se com rapidez, precisão e elegância.
Cada um diz a sua opinião, justifica-a em poucas palavras; ninguém ataca com
ardor o conceito de outrem; ninguém defende teimosamente o seu.
Vê-se que ela deve ser assim. Os pontos de vista surgem de um assunto, que toda a gente
compreende de igual forma.
São fatos, verdades reconhecidas.
Não se pensa em Rousseau, mas na conformidade do que ele diz com o que nós
sentimos.
Eis aqui como Taine, que tem belos exemplos do estilo em antíteses, louva o estilo
antitético de Cornelis de Witt, autor de uma obra sobre Washington:
Eles mesmos, sem medida nos seus sentimentos, sem escrúpulos nos seus atos,
não podem compreender as simpatias nacionais, quando não vão até ao esquecimento
dos interesses nacionais, nem a habilidade diplomática, quando ela não toma o aspecto
da perfídia, nem a dignidade, quando não reveste as aparências da violência.
E Taine conclui:
— Não se trata do estilo facetado. Todos estes matizes e antíteses de palavras são
antíteses de pensamento. Taine. Artigo sobre Cornelis de Witt, na Revista da Instrução
Pública, Maio de 1855.
Na antítese se encarnou a grande arte de escrever, não só entre nós, mas entre os
Gregos.
Numa página, que é verdadeira lição de estilo prático, Mr. Croiset mostrou-nos de
que modo alguns escritores gregos exploraram voluntariamente a antítese.
Diz ele:
Górgias transformou principalmente a frase; tornou-a antitética e vibrante.
Apoiando-se na aptidão do gênio grego, para opor as ideias, duas a duas, fez
deste processo, até ali instintivo, um método: as ideias não mais se lhe
apresentaram senão aos pares, uma iluminando a outra pelo contraste.
Os pares, formados assim, quase sempre breves, desembaraçados de todo o
parasito, claros e empolgantes, juntaram-se uns aos outros, quase sem ligação, em frases
muitas vezes longas, de forma que produzissem sobre o espírito, pelo rodeio incessante
desses embates repetidos, uma impressão forte.
Não só as palavras, mas até os membros das frases, assim opostos, tinham, tanto
quanto possível, o mesmo número de sílabas e apresentavam ao ouvido espécies de rimas
ou assonâncias, que tornavam sensível a relação das ideias.
Havia certamente nesta arte graves defeitos: primeiro, era de uma monotonia
fatigante e, quando ampliada, insuportável; o período de Isócrates, sem falar o de
Demóstenes, é muito mais variado nos seus efeitos e muito mais rico; é também
muito mais poderoso, mais capaz de arrastar. Demais, em toda esta simetria do
estilo de Górgias, o artifício é bastante visível; vai sempre até a puerilidade; as janelas
falsas abundam ali.
A glória de Górgias foi cedo contestada, e, contudo, era legítima em grande parte.
O que ele tinha inaugurado era um jogo de frase, de um ritmo já oratório e, além
disso, maravilhosamente concebido, para estimular a finura da inteligência.
O molde era bom; tratava-se somente de não abusar dele e depois enchê-lo bem.
Mas, já era muito o haver encontrado esse molde: quando a forma é nítida,
insensivelmente nela penetra o espírito. Disse La-Bruyère. A. Croiset, ed. Grega de
Tucídides.
Podereis observar-me porque é que vamos tão longe e nos contentamos com
os prosadores do nosso tempo... Ninguém, como Vitor Hugo, empregou mais
magistralmente a antítese.
Quanto aos que sabem latim e grego, andarão bem avisados em estudar o texto de
Tácito, de Demóstenes, de Cícero e principalmente de Sêneca.