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CDD: 189

SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS EM PEDRO


ABELARDO E GUILHERME DE OCKHAM
GUY HAMELIN

Departamento de Filosofia
Universidade de Brasília, UnB
Brasília, UF, Brasil

hamelingr@hotmail.com

DANILO MAIA

Departamento de Filosofia
Universidade de Brasília, UnB
Brasília, UF, Brasil

danilomaia87@hotmail.com

Resumo: Pedro Abelardo e Guilherme de Ockham representam as duas principais


figuras do nominalismo na Idade Média. Ambos compartilham a tese fundamental
dessa doutrina de origem medieval segundo a qual existem somente entidades
individuais. As repercussões do nominalismo são bastante evidentes em relação à
questão dos universais, constituindo assim um assunto que, até agora, chamou a
atenção da maioria dos estudos contemporâneos sobre os dois lógicos mais
importantes da sua época. Contudo, o nominalismo respectivo a cada um desses dois
protagonistas diverge aparentemente de maneira significativa, notadamente no tocante
ao papel exercido pela mente no processo semântico. Ockham parece se afastar
definitivamente dos seus predecessores, inclusive Abelardo, quando transfere a
gramática e as funções semânticas da linguagem convencional ao nível de uma
linguagem mental. No presente artigo, a intenção primeira é expor a concepção do
signo e da significação de cada um dos autores em estudo. O objetivo final é comparar
as suas teorias semânticas respectivas e indicar os principais pontos divergentes e
convergentes, tendo em mente a hipótese segundo a qual esses dois nominalistas
medievais devem ter mais elementos teóricos em comum do que o contrário.

Palavras-chave: Abelardo, Ockham, semântica, significação, mente.

Abstract: Peter Abelard and William of Ockham represent the two main figures of the
nominalism of the Middle Ages. Both share the fundamental thesis of that doctrine of
medieval origin, according to which only individual entities exist. The repercussions of

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nominalism are quite evident in relation to the question of universals, which constitutes
a subject that, until now, won the attention of the majority of contemporary studies on
the two most important logicians of their time. Nevertheless the nominalism of each of
these two protagonists apparently diverges in a significant manner, especially in respect
to the role exercised by the mind in the semantic process. Ockham seems to distance
himself definitely from his predecessors, including Abelard, when he transfers grammar
and semantic functions of conventional language to the level of mental language. In the
present article, the chief intention is to expound the conception of sign and
signification of each of the authors under consideration. The ultimate objective is to
compare their respective semantic theories and indicate the principal points of
agreement and disagreement, keeping in mind the hypothesis according to which these
two medieval nominalists should have more theoretical elements in common than not.

Keywords: Abelard, Ockham, semantics, signification, mind.

A comparação das ideias semânticas dos dois principais


representantes do nominalismo da Idade Média e, talvez, dos dois
maiores lógicos desse período parece constituir, à primeira vista, um
exercício inteiramente legítimo e até desejável. Na verdade, essa
aproximação não é tão evidente, pois, se Abelardo (1079-1142) e
Ockham (1285/90-1349) compartilham teses semelhantes, as distinções
teóricas entre eles parecem continuar a ser mais importantes. É preciso,
portanto, tomar as precauções necessárias para que nossa análise não
caia em paralelo e confronto inapropriados e impertinentes. Por isso, é
necessário indicar os principais pontos de convergências e de
divergências preliminares a fim de deixar clara a avaliação em estudo.
Em outros termos, examinamos logo alguns desses elementos de
comparação mais básicos e introdutórios antes de passar à exposição da
concepção semântica própria de cada um dos nossos protagonistas.
Em primeiro lugar, deve-se enfatizar o fato de que a teoria
semântica de Pedro Abelardo não se encontra em uma obra específica,
nem em uma parte precisa de um dos seus tratados lógicos. É
necessário, deste caso, reconstituir a sua concepção a partir do conjunto
da sua obra ligada, sobretudo, à lógica ou, como era conhecida na
época, à dialética, que sejam textos de juventude ou do período mais

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maduro. Essa reconstrução não é, portanto, tão precisa como


poderíamos esperar e sempre haverá algumas dúvidas sobre tal ou tal
aspecto particular da sua teoria. Apesar disso, existem informações
suficientes para constituir e formar o essencial da sua concepção da
semântica. Por outro lado, não temos essa dificuldade com Guilherme
de Ockham, que claramente expõe os principais elementos da sua teoria
semântica na sua obra lógica chave, chamada de Summa logicae1. Sem
dúvida, essa sua concepção pode ser ampliada e detalhada, ao examinar
outros tratados dele, como a Ordinatio2, mas encontra-se claramente
uma visão amadurada e completada da semântica na única Summa
logicae.
Podemos salientar, em seguida, outra diferença evidente entre
nossos dois protagonistas, levantando a questão relativa a seu contexto
histórico e intelectual respectivo. Pensador do seu século, Abelardo é
antes de tudo um fiel representante do trivium, ou seja, das três artes da
linguagem em vigor desde a Antiguidade: gramática, lógica e retórica. A
sua análise da linguagem reflete essa realidade, já que contém não
somente elementos lógicos, mas também vários desenvolvimentos
gramaticais e retóricos. Na verdade, Mestre Pedro estima que muitos
problemas ligados à linguagem possam ser resolvidos graças aos
instrumentos da gramática, inclusive uma boa parte da questão dos
universais. Além disso, Abelardo ainda vive em um ambiente intelectual
bastante limitado, na medida em que a vinda em massa das traduções
latinas de filósofos gregos e árabes, notadamente de Aristóteles e de
Avicena, bem como o nascimento das universidades medievais, aparece
na segunda metade do século XII, isto é, pouco depois do seu
desaparecimento. O século de Ockham é bem diferente. Vivendo em
um meio intelectual muito mais rico, o Venerabilis inceptor pode se

1OCKHAM, 1993.
2Trata-se do seu comentário sobre o prólogo e o primeiro livro das Sententiae
de Pedro Lombardo.

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consagrar em mais alto grau à parte do trivium que domina doravante as


universidades, isto é, a lógica, notadamente no quadro da Proprietates
terminorum. Aproveitando os novos instrumentos dialéticos
desenvolvidos no grande século XIII, em particular a famosa teoria da
suppositio, Ockham tenta expor uma nova semântica, na qual a análise
fundamental da linguagem é transferida para o nível da mente. Todas
essas diferenças circunstanciais também provocam adversários
distintos. Enquanto Abelardo luta contra os realismos da sua época,
notadamente o de Guilherme de Champeaux, assim como o
nominalismo de Roscelino, Ockham combate, sobretudo, os modistas,
isto é, os defensores da famosa teoria dos modi significandi. Existem
ainda outras distinções contextuais que poderiam ser levantadas, mas
trata-se aqui das mais relevantes em relação à semântica dos autores em
estudo.
Como é possível então comparar as teorias semânticas de dois
autores aparentemente tão diferentes? A resposta é simples. Trata-se de
duas concepções medievais defendidas por dois nominalistas. Há
necessariamente pontos em comum. Nosso estudo pretende relevar
essas convergências e divergências. É suficiente, por enquanto, afirmar
primeiro que ambos usam fontes idênticas para desenvolver a sua
concepção respectiva, como o De interpretatione de Aristóteles, os
comentários de Boécio e as Institutiones grammaticae de Prisciano. Em
segundo lugar, apesar de representar formas idiossincráticas de
nominalismo, Abelardo e Ockham veementemente defendem a
existência somente de entidades individuais na sua ontologia.
Concomitante a essa atitude, ambos criticam todas as formas de
realismo dos universais da sua época respectiva. Essa abordagem
teórica já basta para justificar tal estudo comparativo.
Seguindo a ordem cronológica, começamos nosso estudo pela
análise da concepção semântica de Abelardo. Esse último examina a
questão do signo e da significação sob todos os ângulos do trivium,
como acabamos de ver, desenvolvendo os seus aspectos tanto

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gramaticais, quanto lógicos, e até retóricos. Essa parte introdutória visa


a entender melhor a nossa análise abelardiana da necessidade do signo
lingüístico passar primeiro pelo intelecto, ou significar uma intelecção
(intellectus), antes de se referir às coisas. Trata-se de uma tese clássica
conforme mutatis mutandis a concepção aristotélica do De interpretatione I.
Quanto à parte consagrada a Ockham, também elaboramos uma seção
inicial, examinando os principais elementos básicos da sua teoria da
significação, como os signos, os termos e suas principais propriedades.
Ao mostrar a conexão entre esses elementos, inclusive a indispensável
contribuição das noções de imposição (impositio) e de intenção (intentio),
veremos que o Venerabilis inceptor chega a novas relações semânticas
entre termos e coisas. Nossa hipótese de trabalho é que, apesar das
aparências iniciais e da dificuldade de comparar a visão semântica
‘moderna’ de Ockham com a concepção mais tradicional de Abelardo,
os pontos de semelhanças entre eles são maiores que as divergências.
Em suma, queremos enfatizar, para cada um dos autores em estudo, o
essencial dos principais tipos de signos encontrados em sua teoria
respectiva e o papel tomado pela mente no processo semântico de
significação. O objetivo final é, portanto, a comparação entre as teorias
semânticas dos nossos dois protagonistas.

I. PEDRO ABELARDO

As principais referências usadas por Abelardo no século XII


relativas às questões de signo e de significação são essencialmente de
Aristóteles, Porfírio, Boécio e Prisciano3. Nosso autor sofre então
influências ao mesmo tempo de filósofos, de lingüistas e, de maneira
mais precisa, de autores e comentadores ligados ao triuium, isto é, as três

3 As principais fontes secundárias usadas para o nosso atual exame são as


seguintes: DE RIJK, 1986, p.85-127; JOLIVET, 1982; MARENBON, 1997;
MARENBON, 1999, p.199-215; ROSIER-CATACH, 1999, p.125-164;
ROSIER-CATACH, 2003, p.175-248.

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artes da linguagem: lógica ou dialética, gramática e retórica4. De


Aristóteles, as Categorias e o De interpretatione, comentados e traduzidos
por Boécio, constituem os tratados básicos estudados; de Porfírio, a
Isagoge (), também na tradução de Boécio; do próprio Boécio,
várias monografias, como o De syllogismo categorico e o De differentiis
topicis5; de Prisciano, as Institutiones grammaticae6. Inspirado por esses
textos filosóficos e gramáticos, Mestre Pedro vai desenvolver a sua
própria concepção do signo e do significado, que segue no essencial a
concepção dos antigos, mas que não deixa de apresentar divergências
significativas em certos pontos precisos.
Por seu lado, Abelardo desenvolve esse tema principalmente
nas suas obras de lógica: as Introductiones paruulorum (Introduções para
principiantes) de juventude, conhecidas também como Glosas literais7, a
Logica ‘Ingredientibus’8, a Dialectica9 e a Logica ‘Nostrorum petitioni sociorum’10.

4 Além de Prisciano, Abelardo também foi influenciado por vários outros


gramáticos do século XI, muitos deles anônimos. A retórica também exerceu
certa influência em relação às questões ligadas ao significado das translationes ou
metáforas, como veremos mais adiante. Cf. JOLIVET, 1982, p.13-62;
ROSIER-CATACH, 1999, p.132; ROSIER-CATACH, 2003, p.175-178;
MARENBON, 1999, p.202 sqq.
5 Os tratados citados até agora pertencem ao que foi chamado de logica uetus

(antiga lógica) que inclui, além disso, as duas outras monografias de Boécio: o
De syllogismo hypothetico e o De diuisione. Mas o estudo da sua lógica mostra que
Abelardo também teve acesso, pelo menos em parte, aos Analíticos anteriores e
às Refutações sofísticas de Aristóteles, os quais já pertencem à logica nova (nova
lógica).
6 Essas Institutiones são sobretudo conhecidas no século XII por comentários e

glosas anônimos, notadamente as Glosulae in Priscianum maiorem. Cf. ROSIER-


CATACH, 2003, p.176-177.
7Cf. ABELARDO, 1954. As Introductiones paruulorum teriam sido escritas entre

1102/1105 e 1112/1114. Cf. MEWS, 1985, p.73-134; LUSCOMBE, 1988,


p.280.
8Cf. ABELARDO, 1919-1927. Também conhecida como Glosas de Milano, a

Logica ‘Ingredientibus’ teria sido escrita antes de 1120. Cf. MEWS, 1985, p.73-
134; LUSCOMBE, 1988, p. 280. Uma parte da glosa sobre o De interpretatione,

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Além desses tratados dedicados exclusivamente à lógica, Abelardo


também discute o tema da significação no seu De intellectibus11, mas a
perspectiva encarada é mais psicológica que lingüística.
Na presente parte, queremos antes de tudo mostrar a
concepção abelardiana, segundo a qual a esfera do pensamento
(intellectus) é intermediária e necessária no processo da significação das
coisas (res) pelos signos lingüísticos (dictiones). Para chegar a essa
conclusão, é preciso examinar, em primeiro lugar, a variedade desses
signos distinguidos por Abelardo, e enfatizar o papel indispensável da
própria significação como critério de demarcação entre eles.
Lembramos enfim que o primeiro objeto de reflexão filosófica e, até
certo ponto, teológica do presente autor em estudo é a linguagem, tal
como é tratada no século XII pelas disciplinas do triuium, notadamente
a lógica, considerada como ars sermocinalis (arte do discurso)12. Daí a
importância para Abelardo da questão da significação como um dos
temas centrais do seu pensamento.

publicada por Geyer nessa edição (p.497-503), é espúria e não é de Abelardo.


L. Minio-Paluello corrige e completa essa edição de Geyer em ABELARDO,
1958.
9Cf. ABELARDO, 1970. Mews data esse tratado entre 1117-21. Cf. MEWS,

1985, p.130. Faltam essencialmente o início e o fim desse texto.


10Cf. ABELARDO, 1933. Também conhecida como Glosas de Lunel, a Logica

‘Nostrorum petitioni sociorum’ teria sido escrita antes de 1125. Na verdade, trata-se
de uma revisão e correção por parte de Abelardo da Logica ‘Ingredientibus’.
Todavia o seu conteúdo é hoje em dia perdido em grande parte e se restringe
apenas a um comentário elaborado sobre a Isagoge.
11Cf. ULIVI, 1976. Seria também questão de lógica e verossimilmente de

significação em dois outros tratados de Abelardo, a Rhetorica e a Grammatica,


mas infelizmente esses tratados não chegaram até nós. Salientamos que existe
certa dúvida sobre a existência real desses dois textos. Cf. LUSCOMBE, 1988,
p.282.
12 Na sua apresentação da Dialectica de Abelardo, o editor De Rijk afirma: ‘For

Abailard logic is ars sermocinalis, i.e. the art of the use of language, in the large
sense of the word.’ ABELARDO, 1970, p.XCV.

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I. I. SIGNA: VOX, SERMO, DICTIO E NOMEN

Para Abelardo, é claro que a frase (oratio) constitui o lugar


predileto do significado, na medida em que serve para veicular o que o
locutor quer dizer ao interlocutor; trata-se do meio privilegiado para se
comunicar13. Não falamos com palavras, mas sim com frases. Isso é
manifesto. Todavia as frases são constituídas de palavras. Assim, para
entender o que significa uma oração, é preciso compreender primeiro o
que significa os seus elementos constitutivos14, pelo menos se
acreditamos, como Abelardo, no princípio de composicionalidade,
segundo o qual a soma dos significados dos componentes de uma frase
constitui o significado da proposição inteira15. Sem digressionar em vão,
não insinuamos aqui que Abelardo defende a importante tese estóica,
segundo a qual o elemento básico e primeiro da significação é a
proposição, ou o  completo, como é o caso na lógica
contemporânea. Abelardo segue, sem dúvida, a idéia de Aristóteles
sobre esse ponto, que dá a entender que a palavra ou o termo constitui
o mínimo significativo do discurso e não a frase16. Todavia, na sua

13 Cf. ABELARDO, 1919-1927, p.307 30-308 1; JOLIVET, 1982, p.26, 54, nota
211, 67-68; JOLIVET, 1994, p.64 e 68.
14 Cf. ABELARDO, 1919-1927, p.2 8-15.
15 A comentadora Rosier-Catach explica o princípio em questão da seguinte

maneira. “Ce principe (de composicionalidade) exige que le sens du tout soit
formé à partir de celui de ses parties.” ROSIER-CATACH, 1999, p.128. Cf.
ABELARDO, 1919-1927, p.337 41-338 20; JOLIVET, 1982, p.54.
16 Na Dialectica, Abelardo distingue a palavra da frase, que chama,

respectivamente, de incomplexo e complexo. “Significativarum autem ad


placitum<alias incomplexas, alias complexas, hocest> alias dictiones, alias
dicimus orationes.” ABELARDO, 1919-1927, p.114 32-33. Essa diferença é
certamente inspirada por Aristóteles, que fala, nas Categorias 2, 1a 16-17, em
termos de expressões ligadas ou combinadas () e não ligadas
ou combinadas (). Todavia a distinção abelardiana também
nos parece se aproximar da dos estóicos, que diferenciam o  completo

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análise das conjunções e das preposições, Mestre Pedro afirma que não
significam em si, porque a significação delas é indeterminada, como os
nomes e os verbos, que têm o seu sentido somente em um contexto
proposicional17. Já que dá um significado preciso e aparentemente
completo às palavras isoladas, podemos pensar que Abelardo insiste
aqui sobre o caráter final do significado, que se encontraria na frase,
enquanto instrumento do discurso. Enfim é preciso voltar ao estudo da
significação das palavras para entender, segundo a própria concepção
de Abelardo, o significado das frases e o poder de se comunicar.
Referindo-se explicitamente a Prisciano e Boécio, Abelardo
distingue o som (vox), enquanto ar (aer), da frase (oratio), considerada
como duração do ar (tenor aeris) ou medida do ar (mensura aeris)18.
Essencialmente vox refere-se, a princípio19, a uma substância, isto é, ao
sujeito, enquanto oratio designa um acidente ou uma quantidade
duradoura dessa mesma substância, que pode ser medido20. Ou seja,
enquanto a vox claramente se reporta a uma coisa, o conjunto da frase
diz algo a respeito dessa coisa e alude assim a um estado de coisas ou,
como diz Abelardo, exprime ou significa uma certa maneira de se

(), isto é, a proposição e o silogismo, do  incompleto


(), como a palavra e o predicado. Cf. LONG, SEDLEY, 1987, p.198.
17ABELARDO, 1919-1927, p.33741-338 20.
18 Abelardo afirma na Logica ‘Ingredientibus’: “Est autem vox Boethio teste aeris

per linguam percussio (...).”ABELARDO, 1919-1927, p.335 2-3; “(...) quippe


Priscianus aërem tantum vocem appellat.” ABELARDO, 1919-1927, p.173 33.
19Digamos ‘a princípio’, porque a vox também pode designar um acidente,

como a oratio, mas essa última nunca pode se referir a uma substância. Por
outro lado, a palavra oratio é equívoca nas primeiras Glosas literais e, pelo
menos, uma vez na Dialectica, podendo também se referir a uma substância.
Contudo, Abelardo precisa seu sentido definitivo mais adiante na mesma obra
e na Logica ‘Ingredientibus’. Cf. ABELARDO, 1954, p.65 28-36; ABELARDO,
1970, p.53 31-34; ABELARDO, 1919-1927, p.173 6-177 3; JOLIVET, 1982,
p.22-24.
20 Cf. ABELARDO, 1919-1927, p.173 6-177 3; ABELARDO, 1970, p.65 22-71
14.

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comportar das coisas (quidam rerum modus habendi se), maneira que reflete
na realidade relações entre coisas21. Salientamos que Abelardo usa nessa
ocasião, via Prisciano, uma expressão inspirada dos estóicos, ao afirmar
que as voces são aeres prolati (sons proferidos)22. Agora existe certa
ambigüidade no uso feito por Abelardo da palavra vox no decorrer da
sua obra, pelo menos até o seu último tratado, intitulado Logica
‘Nostrorum petitioni sociorum’.
A frase é composta de vários sons, isto é, palavras, sílabas e
letras, e o mínimo audível pode não ser significativo. É preciso então
distinguir dois aspectos intrínsecos à vox: o sensível ou a matéria e o
inteligível ou o psicológico23. A parte sensível da vox é o som ouvido,
mas é o componente inteligível que torna esse som significativo por
intermédio do que é conhecido na época de Abelardo como impositio,
institutio ou inventio24. Enquanto signo, a vox constitui um som que
significa por convenção (vox significativa ad placitum)25 ou pela vontade
daquele que impõe o significado (secundum voluntatem imponentis)26, e se
opõe tanto ao som insignificativo quanto ao signo que significa

21 Cf. ABELARDO, 1970, p.160 35. Sobre a questão do status ontológico desse
estado de coisas ou, como diz Abelardo, desse dictum propositionis, ver
HAMELIN, 2011, p.63-88.
22 Cf. ABELARDO, 1970, p.65 34; ABELARDO, 1919-1927, p.173 33. Os

estóicos usam a expressão ‘palavra expressa’ (). Cf. LONG,


SEDLEY, 1987, p.196-204; PANACCIO, 1999ª, p.53-63.
23 Cf. ABELARDO, 1919-1927, p.307 4-23.
24 Lembramos que a oratio também significa convencionalmente. Cf.

ABELARDO, 1919-1927, p.307 6-8; ABELARDO, 1933, p.522 17. Inventio aqui
se distingue do uso desenvolvido, por exemplo, na retórica por Cícero, que
tem, antes, o sentido de processo da descoberta dos argumentos.
25 Cf. ABELARDO, 1919-1927, p.307 6-7. Abelardo opõe convencionalmente

(ad placitum) a naturalmente (naturaliter). “‘Ad placitum’ dicimus ad differentiam


naturaliter significantium.” ABELARDO, 1919-1927, p.307 12; Cf.
ABELARDO, 1970, p.114 17-18.
26 ABELARDO, 1970, p.114 28.

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naturalmente, como a fumaça que significa sem convenção o fogo27.


Interessado pelo significado e pela verdade das proposições, o lógico
vai se sentir espontaneamente atraído pelos signos significativos por
convenção. Agora existe certa ambigüidade no uso que faz Abelardo da
palavra vox, na medida em que pode se referir a um som insignificativo
e também a um som dotado de significado. Ciente desse problema,
Abelardo esclarece seu vocabulário no seu último tratado de lógica,
como vimos, usando doravante vox, para se referir à parte estritamente
sensível e material, e sermo, para aludir ao som significativo28. Inspirado
por Prisciano, acrescenta sempre o fato de que as palavras
significativas, seja a vox nos primeiros tratados, seja o sermo no último,
são compostas de sílabas não significativas em si, sendo a palavra a
unidade mínima de significação29.
Os signos que significam por convenção, voces ou sermones,
segundo o tratado, constituem as palavras (dictiones). Uma primeira
distinção feita por Abelardo acerca dessas palavras diz respeito o seu
caráter definido ou indefinido. Uma palavra definida (dictio definita) tem
um sentido determinado (certa significatio), enquanto a indefinida
(indefinita) possui um significado indeterminado (incerta significatio)30. No
primeiro caso, os nomes (nomina) e os verbos (verba) são exemplos de

27 Abelardo usa antes o exemplo do cão que ladra, que significa naturalmente a
ira. Cf. ABELARDO, 1970, p.114 20-25; ABELARDO, 1919-1927, p.307. Há
também o caso da significação por hábito (consuetudo) ou por relação (habitudo),
que não é convencional, como um homem qualquer nos lembra certo homem.
Cf. ABELARDO, 1970, p.111 21-26.
28 Cf. ABELARDO, 1933, p.522 17-21; JOLIVET, 1982, p.70-71; JOLIVET,

1994, p.62-64.
29 Cf. ABELARDO, 1970, p.115 1-2; Prisciano. Institutiones grammaticae, II, III,

14 (citado por JOLIVET, 1982, p.33, nota 78).


30 Possuir uma significação indeterminada quer dizer, segundo Abelardo, ter

um significado confuso e incerto, significado que se torna certo em contexto


proposicional. Cf. ABELARDO, 1970, p.118 13-14; ABELARDO, 1919-1927,
p.337 11-32.

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palavras definidas, enquanto as conjunções (coniunctiones) e as


preposições (praepositiones) são indefinidas, o que lembra a distinção
feita, no mesmo período, entre os categoremas e os sincategoremas31.
Na continuação, vamos examinar somente as palavras definidas ditas
simples (simplices)32, notadamente os nomes, que possuem, com os
verbos, um significado certo e interessam, por isso, mais os lógicos que
os gramáticos33.
Vimos que as verdadeiras partes do discurso são, segundo
Abelardo, os nomes (nomina) e os verbos (verba), pois possuem cada um
delas um sentido próprio e formam frases, que são completadas por
elementos consignificativos (consignificantes)34 ou sincategoremáticos.
Abelardo sabia que não havia acordo entre seus predecessores sobre o
número de partes constitutivas do discurso, já que os lógicos, como
Boécio35, consideram que são duas, enquanto os gramáticos enumeram
oito ou nove, até mais36. Como lógico, portanto, Mestre Pedro
interessa-se antes de tudo aos componentes significativos básicos do

31 Na Dialectica, Abelardo afirma: “Dictionum autem alie per se certam


significationem habere dicuntur, ut nomina vel verba, alie incertam, ut
coniunctiones vel prepositiones.” ABELARDO, 1970, p.117 26-28. Cf. Idem,
p.121 21-26.
32 As palavras definidas – nomes e verbos – subdividem-se, em seguida, em

simples e complexas (compositae). “(...) quasdam earum (dictiones) compositas


dicamus, sicut ‘impius’, ‘respublica’, et omnes simplices voces confiteamur.”
ABELARDO, 1970, p.115 8-9.
33 Cf. ABELARDO, 1970, p.121 4-7, 25.
34 A palavra latina consignificatio, assim como seus derivados consignificans e

consignifico, quer dizer ‘o que tem um sentido somente unido a outras palavras’.
Cf. GAFFIOT, 1934.
35Cf. BOÉCIO, 1877, p.766 B-C, 796 C-797 A; JOLIVET, 1982, p.34.
36 Notamos que os estóicos, que são entre os primeiros a se interessar pela

gramática, contam cinco partes do discurso: nome (), appellatio


(), verbo (), pronome () ou artigo () e
conjunção ().Cf. LONG, SEDLEY, 1987, p.196-204; BLANK,
ATHERTON, 2003, p.310-327.

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 385

discurso, notadamente os nomes e os verbos, que distingue a partir dos


seus próprios critérios.
Aristóteles indica, no De interpretatione II, que o nome () é
um som () que significa convencionalmente ()
sem referência ao tempo (), e do qual nenhuma parte
tomada separadamente significa37. Mais adiante no mesmo tratado,
precisa que o verbo (), ao contrário, acrescenta a seu próprio
significado aquele do tempo, além de repetir que cada parte dele,
tomada separadamente, não significa38. Na última parte dessa definição,
o Estagirita não se esquece de indicar que o verbo sempre é predicado
de outra coisa39. Abelardo retoma essa discussão, ao se limitar às
palavras definidas simples, que são as únicas a possuir uma imposição
própria e primeira, como homem (homo), Sócrates, (Socrates), corre
(currit) ou branco (album)40. Apesar de normalmente concordar com as
explicações de Aristóteles, pelo menos sempre tenta salvá-las, Mestre
Pedro considera desta vez que a distinção entre nome e verbo não
depende do tempo, mas de outros critérios. O essencial dessa diferença
é que o nome também implica, como o verbo, um tempo, precisamente
o presente, ou seja, com seus próprios termos, o nome consignifica o
tempo presente41. Na verdade, o que os diferencia é a maneira de

37 Nos próprios termos do Estagirita, encontramos a seguinte explicação:


“
” ARISTÓTELES, 1938,
p.116 (16a 20-23).
38“

”
ARISTÓTELES, 1938, p.118 (16b 6-8).
39 “(...) ”
ARISTÓTELES, 1938, p.118: (16b 8).
40 Cf. ABELARDO, 1970, p.121-129.
41 Cf. ABELARDO, 1970, p.63 29-30, 122 22-34, 124 24-26, 138 sqq. Na Logica

‘Ingredientibus’, Abelardo mostra, por exemplo, a necessidade do nome de


consignificar o tempo presente para preservar a verdade das frases como “Hoc
vivum erit mortuum” (Este vivo (esta coisa viva) será (um) morto), “Hoc cadáver

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386 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

significar (modus significandi), já que o verbo supõe a inerência a um


sujeito, e não o nome42. Portanto, Aristóteles não forneceu critérios
adequados, segundo Abelardo, para distinguir estes dois tipos de
palavras, já que o nome sempre significa indiretamente ou consignifica
o presente, e que, além disso, a análise aristotélica do verbo no De
interpretatione diz respeito em geral ao tempo presente. Em suma,
Abelardo estima que a distinção entre o nome e o verbo não é tão
manifesta, já que ambos significam segundo a sua imposição
respectiva43, apesar do fato de que o verbo dispõe de uma escala
temporal maior. A verdadeira divisão entre eles releva mais da sintaxe,
das construções das frases e, assim, da inerência de um acidente a um
sujeito, ou seja, da predicação44.

fuit homo” (Este cadáver foi um homem), ou “Hic senex fuit puer” (Este velho foi
uma criança). Na primeira frase, por exemplo, vivum significa todos os vivos
atuais no momento presente, e mortuum, todos os mortos também atuais no
momento presente. É possível então conservar o valor de verdade da
proposição somente se, entre todos os vivos atuais no momento presente, este
vivo será no futuro (um) morto. O verbo deixa possível de transferir no futuro
o vivo atual em um estado de morto. Se vivum significaria todos os vivos em
todos os tempos, ou em nenhum tempo, então a frase “Hoc vivum erit mortuum”
nunca será verdadeira, a não ser que vivum vir a perder sua impositio primeira de
significar todos os homens vivos atuais no momento presente. A mesma lógica
permite também conservar o valor de verdade das duas outras proposições. Cf.
ABELARDO, 1919-1927, p.348 15-350 18; ROSIER-CATACH, 1999, p.127-
128, 143; JOLIVET, 1982, p.36.
42Abelardo insiste sobre isso na Dialectica: “Non tam igitur in significatione

temporis nomen a verbo recedere videtur quam in modo significandi. Verbum


enim, quod solum inherentiam facit (...)” ABELARDO, 1970, p.123 15-21. A
própria análise do verbo em Abelardo é bastante completa e inclui, como se
sabe, toda a questão do verbo como simples ligação ou copulatio. Mas essa
questão toda ultrapassa o nosso exame atual. Cf. KNEALE, KNEALE, 1962,
p.200-224; JOLIVET, 1982, p.52-53 et circa.
43Cf. ABELARDO, 1919-1927, p.308 27-28; ABELARDO, 1970, p.132 14-16.
44 Abelardo mostra que ‘currit’ (corre) e ‘currens’ (correndo) não se distinguem

a partir do seu significado respectivo, que é o mesmo, mas pelo fato de que

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 387

Voltamos ao nome simples, que Abelardo divide ainda


segundo o mesmo critério de significação (iuxta significationem). Em
primeiro lugar, encontram-se os nomes próprios ou singulares, como
Sócrates, que se distinguem dos nomes apelativos ou universais, como
homo e album45. Existe ainda uma série de outras divisões desses nomes a
partir de critérios, desta vez, mais gramaticais (secundum positionem
constructionis), relacionados às flexões ou casos, aos gêneros e aos
números, por exemplo, ou segundo fundamentos ditos de impositio e de
composição (secundum vocis impositionem)46, que distribuem os nomes em
primitivos ou de primeira invenção (prima inventio) e derivativos
(derivativa), assim como em nomes apelativos simples e compostos47.
Não é necessário examinar aqui todas as divisões dos nomes feitas por
Abelardo para chegar a nossa conclusão, segundo a qual é preciso que
todos esses tipos de nomes passem pelo intelecto para significar as
coisas.

I. II. SIGNIFICATIO E INTELLECTUS

Antes de examinar o papel determinante do pensamento


(intellectus) no processo lingüístico de significação, salientemos a
necessidade dessa mesma noção de significado para distinguir a maioria
dos tipos de signos examinados até agora. Todavia a significação das
palavras não é suficiente para garantir a retidão de uma frase48.

‘currit’, ligado a um nome, forma uma frase. Cf. ABELARDO, 1954, p.79 42-80
3. Ver a nota anterior.
45 Cf. ABELARDO, 1970, p.124 27-31. Toda a questão dos universais

evidentemente diz respeito a essa nova separação das palavras. É curioso


constatar que essa primeira divisão dos nomes simples em próprio e apelativo
corresponde exatamente à distinção estóica entre nome () e appellatio
(). Ver nota 33 supra.
46 Cf. ABELARDO, 1970, p.124 27-125 15.
47 Cf. ABELARDO, 1970, p.125 16-18.
48 Cf. ABELARDO, 1970, p.125 19-30; JOLIVET, 1982, p.37-38.

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388 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

Retomamos o caso analisado por Abelardo, seja o nome apelativo


composto (compositio) ‘mulher branco’ (mulier albus). Essa palavra possui
aparentemente um sentido correto e verdadeiro, que corresponde à
frase “A mulher é branca” (Mulier alba est), já que os gêneros não
interferem no significado das palavras, assim como as flexões49. De
fato, ‘branco’ (albus) e ‘branca’ (alba) significam ‘possuindo a brancura’
(habens albedinem) e, portanto, “A mulher é branco” (Mulier albus est) é
equivalente ou pode ser substituída a “A mulher é possuindo a
brancura” (Mulier est habens albedinem). Então, apesar dessa substituição,
por que somente a segunda frase é aceita como correta? A resposta é
clara. A significação dos nomes não assegura a retitude da frase, pois
também é preciso uma construção sintática correta. O fato de possuir
um significado idêntico não necessariamente leva as palavras de uma
frase a uma identidade de construção lingüística. Ainda que a imposição
de uma significação seja o motivo principal da existência de uma
palavra, a sintaxe constitui um acréscimo que deve ser considerado. Em
outros termos, os casos e os gêneros das palavras não parecem intervir,
por via dos significados, na referência aos objetos, mas eles influenciam
a retidão das frases50.
Abelardo segue o modelo lingüístico tradicional dos dialéticos e
dos gramáticos, segundo o qual as palavras significam diretamente os
conceitos ou as intelecções (intellectus) e indiretamente as coisas (res)51,

49 Cf. ABELARDO, 1970, p.124 36-125 15.


50 Cf. ABELARDO, 1970, p.125 19-28.
51 É preciso aqui salientar que se trata da função principal das palavras, e não

da ordem cronológica natural, como explica Fumagalli: “Now, if the


signification ‘de intellectibus’ is the first and principal semantic function of a
noun and the most important in order of the ‘causa impositionis’, because a
noun is formed precisely ‘ut intellectus constituet’, but ‘naturaliter’
nonetheless, this is in accordance with the chronological development of the
proces of ‘inventio’, the signification ‘de rebus’ is ‘prior’. The plan of the
formative process of a noun, according to Abelard, results as: (1) a
consideration of the ‘natura rei’ that motivates the ‘inventio’ of a noun with

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 389

apesar do fato de que, quando falamos, designamos ou queremos


designar normalmente as coisas52. Para ilustrar essa concepção
tripartida, que também implica que as palavras nem sempre se referem
ao mundo, nem o representam corretamente em todas as ocasiões,
sendo conseqüentemente um intérprete, às vezes, infiel na
representação das coisas53, vamos nos limitar ao essencial da análise do
Mestre Pedro.
As três principais razões lógicas, pelas quais Abelardo afirma
que as palavras significam primeiramente as intelecções, são as
seguintes. Primeiro o nome e o verbo derivado designam uma mesma
coisa no mundo, já que é apenas a intelecção que difere entre eles. Por
exemplo, ‘corrida’ (cursus) e ‘corre’ (currit) denotam a mesma coisa, mas
correspondem cada um a uma intelecção distinta54. Além disso, o nome
e o verbo diferenciam-se respectivamente pela referência substancial (in
essentia) e acidental (in adiacentia) das coisas55, o que constitui uma

the necessity that this suggests to it; (2) ‘impositio’ of the noun whereby this is
delegated to ‘constituere intellectum’.” FUMAGALLI, 1970, p.29.
52 Cf. ABELARDO, 1919-1927, p.307 28-29, 308 19-309 13; ABELARDO, 1970,

p.119 3-13, 120 18-20. As principais fontes tradicionais sobre essa questão são
Aristóteles e Boécio. Cf. ARISTÓTELES, 1938, p.114 (16a 4-9); BOÉCIO,
1877, p.24, 33-35; FUMAGALLI, 1970, p.28-41; JOLIVET, 1994, p.67-70.
53 Por isso, não podemos entender adequadamente o mundo a partir da

linguagem; existe um elo imediato dela com a mente e mediato com as coisas.
Cf. JOLIVET, 1982, p.74-76.
54 Abelardo descreve essa primeira explicação com os seguintes termos: “Nam

quia partes orationis distinguere debebat, quas tractabat propter


constitutionem propositionis enuntiativae simplicis, nomen scilicet et verbum,
recte de significatione intellectus intendit. Quippe haec distinctio partium
orationis fieri non potest secundum diversitatem rerum, sed intellectum. Res
enim eaedem a nomine e a verbo significantur, ut ‘currit’ et ‘cursus’ eandem
rem significant.” ABELARDO, 1919-1927, p.308 23-28.
55 O trecho a seguir é a continuação imediata da passagem da nota anterior.

“Sed diversus modus concipiendi variat intellectum, quia hic in essentia cursus
ostenditur, ibi in adiacentia, hic cum discretione temporis, ibi sine.”

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390 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

distinção a priori simples, mas que se torna rapidamente intrincada,


ultrapassando assim a presente discussão56. Segundo, ao examinar a
frase, analisamos o nome e o verbo a partir do princípio de
composicionalidade. Ora, a idéia ou a intelecção da frase é constituída
pelas idéias das suas partes, mas não há uma coisa no mundo, na
ontologia abelardiana, que corresponde a uma frase e a sua intelecção.
Para Abelardo, uma frase significa, por via do significado dos seus
componentes, uma intelecção própria, que, por sua vez, diz respeito a
um dictum propositionis, isto é, o dito da proposição, que não constitui,
em si, uma coisa própria; trata-se, no vocabulário nominalista
abelardiano, de uma quase coisa (quasi res)57. Todavia esse mesmo dictum
propositionis denota relações e ligações entre coisas sensíveis no mundo e
não as próprias coisas singulares. Isso mostra que existe um mundo
inteligível dos significados, que é distinto das próprias intelecções e a
fortiori das coisas58. Mais uma vez, há um hiato entre o que significa uma
frase, que é, na melhor das hipóteses, um tipo de estado de coisas
abstrato, e as próprias coisas do mundo59. Enfim, a terceira razão diz

ABELARDO, 1919-1927, p.308 28-30. Cf. ABELARDO, 1970, p.138 5-17;


Prisciano. Institutiones grammaticae, II, IV, 18 (citado por JOLIVET, 1982, p.40).
56 Por exemplo, os termos ‘substantia’, enquanto substância primeira ou

segunda, e ‘qualitas’, como acidente em geral ou qualidade no sentido estrito,


têm assim vários sentidos na obra de Abelardo, o que particulariza bastante,
segundo o caso, a significação e a predicação do nome e do verbo. Cf.
JOLIVET, 1982, p.40-46, 76; JOLIVET, 1994, p.48-49.
57 Como o status, que constitui o significado dos universais, o dictum propositionis

é dito ser uma quase coisa (quasi res). Cf. HAMELIN, 2011, p.63-88;
JOLIVET, 1982, p.77-85; JOLIVET, 1994, p.70-72.
58 Cf. JOLIVET, 1994, p.70.
59 Abelardo descreve essa segunda razão da seguinte maneira: “Praeterea cum

de nomine et verbo gratia constitutionis orationum intenderet, máxime


significationem intellectum, non rerum attendere debuit, quia haec sola
significatio ad constitutionem pertinet. Quippe sicut propositio materialiter
constat ex nomine et verbo, ita intellectus illius materialiter iungitur ex
intellectibus partium. Res autem propositionis, cum nullam habeat rem

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 391

respeito ao fato de que as intelecções sobrevivem em relação às coisas,


já que essas últimas denotadas pelas palavras podem desaparecer, o que
não é o caso das intelecções60. Todas as rosas podem ser, por exemplo,
eliminadas pelas ações do homem, mas continua a fazer sentido dizer:
“O perfume das rosas é agradável”61. Em suma, que seja por causa da
univocidade ou da equivocidade das palavras, ou do fato de que o
significado subsiste mesmo quando a coisa correspondente desaparece,
é claro, segundo Abelardo, que as palavras significam primeiramente as
intelecções62 e em seguida, mas nem sempre, como no caso das
próprias frases, as coisas63.

subiectam, ex rebus vocabulorum non constat.” ABELARDO, 1919-1927,


p.308 34-40.
60 Abelardo descreve esse motivo desta maneira: “Denique haec significatio,

quae est de intellectibus, eo quoque maxime ad constitutionem orationis


attinere monstratur, quod ex ea semper ad constitutionem orationis dictiones
sufficiunt, sed non ita ex rerum significatione. Rerum quippe significatio
transitoria est, intellectus vero permanens.” ABELARDO, 1919-1927, p.309 1-
5.
61 Cf. ABELARDO, 1919-1927, p.309 5-13. É também o caso dos nomes ditos

indefinidos, que designam uma qualidade essencial para negá-la, como a


expressão ‘não-homem’. Salientamos que esses nomes indefinidos se
distinguem das palavras indefinidas (conjunção e preposição), como vimos
anteriormente. Cf. ABELARDO, 1954, p.82 19-40; ABELARDO, 1970, p.128 9-
10; JOLIVET, 1982, p.39-40, 44-45.
62 Além desses três motivos, existem outras razões, pelas quais Abelardo

defende a passagem obrigatória pelo intelecto no processo lingüístico da


significação, como quando indica que a oração tem seu significado próprio,
por causa somente das intelecções formadas a partir das palavras constitutivas
isoladas retidas na memória. Cf. ABELARDO, 1970, p.68 3-24.
63 A metáfora ou a translatio também ilustra esse fenômeno, já que as palavras,

nesse caso, não significam mais o seu sentido primeiro e imposto e,


conseqüentemente, não se referem mais às coisas correspondentes, como na
frase estuda por Abelardo: “Os campos dão risada” (Prata rident). Cf.
ABELARDO, 1919-1927, p.121 1-21, 399 26-30; JOLIVET, 1982, p.76-77;
JOLIVET, 1994, p.80.

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392 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

II. GUILHERME DE OCKHAM

As principais referências antigas de Ockham sobre a temática


dos signos, da semântica e da lógica são, basicamente, Aristóteles,
Porfírio, Boécio e Agostinho64. Além desses autores, Ockham refere-se
explicitamente aos estudos gramaticais realizados por Donato no século
IV e por Prisciano nos séculos V e VI. Ele também mostra ter sido
influenciado pelos compêndios do âmbito lógico-linguístico feitos por
Pedro Hispano, Roger Bacon e Guilherme de Shyreswood, no século
XIII, e pelos trabalhos dos seus contemporâneos Duns Escoto e
Walter Burleigh65.
A temática da semântica e da lógica aparece em textos de
Ockham, que datam até meados de 132866.Os seus escritos dividem-se,
essencialmente, em dois períodos distintos, sendo o primeiro
considerado acadêmico, de temática predominantemente teológica e
filosófica, anterior a 1328, e o outro representando a sua época política,
posterior a essa mesma data67. Esse marco de distinção temporal
corresponde à sua fuga de Avignon, devido ao fato de alguns de seus
textos serem considerados heréticos por comissão nomeada pelo Papa
João XXII. Vários de seus textos de teor filosófico do período
acadêmico são comentários sobre escritos lógicos de Aristóteles,
Boécio e Porfírio. Apesar de Ockham desenvolver algumas ideias
semânticas e lógicas no conjunto desses comentários, sua obra de maior
amplitude e desenvoltura no assunto, onde expõe mais explicitamente

64As principais fontes secundárias utilizadas são: ADAMS, 1987; PANACCIO,


1999a; SPADE, 1996; SPADE, 1999; CHALMERS, 1999; NORMORE, 1999;
PANACCIO, 1999b.
65 Cf. MÜLLER, 1999, p.12-16.
66 Datados do período entre 1340 e 1347, dois outros tratados menores sobre

o mesmo assunto foram anteriormente atribuídos verossimilmente com


falsidade a Ockham, isto é, o Tractatus minor logicae e o Elementarium logicae, que
seriam provavelmente. Cf. ADAMS, 1987, p.XVII; SPADE, 1999, p.9.
67 Cf. SPADE, 1999, p.4-5.

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 393

sua própria teoria, é a Summa logicae de 132368. Seguindo a tradição, esse


tratado divide-se em três partes, que correspondem respectivamente ao
tema dos termos, das proposições e dos argumentos. O essencial da
semântica e dos pontos desenvolvidos no presente trabalho é tratado
na primeira parte dessa mesma Summa logicae69.
A relação tradicional entre palavras, conceitos e coisas
pressupõe, para o Venerabilis inceptor, uma subordinação das palavras aos
conceitos, o que contrasta com o modo como a tradição filosófica,
inclusive a teoria de Abelardo, compreende tal relacionamento.
Ockham preza por uma significação direta das palavras convencionais
para as coisas sem a necessária intermediação dos conceitos,
enfatizando que o elo entre palavras e conceitos constitui uma simples
subordinação. Como veremos mais adiante, trata-se de um tema que
aparece, sobretudo, quando é questão do processo da imposição
(impositio) na formação das palavras. Para mostrarmos essa triangulação
entre palavras, conceitos e coisas, assim como a ideia de subordinação
semântica em Ockham, abordamos primeiro a sua concepção implícita
do signo (signum), o que nos permite assimilar sua proposta de que
conceitos (conceptus) são termos lógicos (termini) que significam
naturalmente as coisas. Temos também de tratar da significação
(significatio) e da suposição (suppositio), visto serem propriedades dos
termos lógicos que auxiliam no entendimento das relações entre
palavras e conceitos. Por fim, examinamos a formação dos signos
naturais, isto é, dos conceitos (terminus conceptus) ou termos mentais
(terminus mentis), feita através do processo de origem das intenções da
alma (intentiones animae), e a dos signos convencionais, realizada por
intermediário da imposição dos termos (impositio terminorum), mostrando
assim o cerne da teoria da subordinação. Desta forma, vemos como
compreender o modo de subordinação das palavras aos conceitos em

68 Cf. NORMORE, 1999, p.32.


69 Cf. BIARD, 1993, p.XI.

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394 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

Ockham e possibilitamos o entendimento de sua diferença com a


tradição filosófica e, em particular, com Abelardo.

II. I. SIGNUM

Entre as explicações fornecidas por Ockham sobre os usos da


palavra ‘signo’(signum) impõem-se algumas distinções específicas.

“Em razão dos impertinentes, cumpre saber que ‘signo’ é tomado


de dois modos. Primeiramente, como tudo aquilo que, apreendido,
traz algo diverso à cognição, embora não leve a mente à primeira
cognição daquilo, (...), mas à cognição atual, após a habitual. E,
assim, a palavra falada significa naturalmente, como um efeito
qualquer significa ao menos a sua causa (...). Aqui, porém, não falo
de signo de um modo tão geral. Diferentemente, toma-se signo
como aquilo que traz algo à cognição e é capaz de supor por isto
ou de ser acrescentado na proposição a termos sincategoremáticos,
a verbos e àquelas partes da oração que não têm significação
determinada, ou é composto de tais, como é o caso da oração. E,
assim tomado, o vocábulo ‘signo’ não é um signo natural de nada.”
(OCKHAM, 1999, p.120).”

Nosso autor entende o que é um signo mediante dois critérios


básicos de classificação. Examinamos agora como se aplica esses
critérios de modo a classificar os quatro tipos de signos sugeridos por
Ockham, isto é, o signo natural representativo, o signo natural
lingüístico, o signo convencional representativo e o signo convencional
lingüístico70.
O primeiro critério para entender o que é um signo e,
conseqüentemente, um termo, é relativo à condição de o signo
significar algo naturalmente (naturaliter significat quidquid significat) ou de
significar algo por instituição voluntária (secundum voluntariam

70 Esses quatro tipos de signos resultam, em grande medida, de uma


reconstrução teórica, apesar de haver elementos textuais que corroborem para
tal classificação geral dos signos em Ockham, como mostramos a seguir.

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 395

institutionem)71. Um signo constituído naturalmente não pode ter sua


significação modificada por uma vontade ou convenção humana,
enquanto um signo voluntariamente instituído pode ter sua significação
transformada de acordo com convenções ulteriores: “(...) o termo
proferido ou escrito pode mudar seu significado convencionalmente,
mas o termo concebido não pode mudar o seu significado pela
convenção de quem quer que seja” (OCKHAM, 1999, p.120). Essas
duas opções perfazem o primeiro critério que diz respeito ao modo de
origem de um signo, indicando as possibilidades de como algo se torna
um signo.

O segundo critério de classificação de um signo é relacionado


ao modo de aplicar sua significação, que já é constituída naturalmente
ou convencionalmente. O elemento central de demarcação é
estritamente lingüístico. De fato, um signo pode funcionar com outros
signos, ditos termos sincategoremáticos, formando assim proposições,
que possibilitam a propriedade de suposição, ou pode ser usado isolado
e sem relacionamento com o contexto lingüístico72. Essas opções, de
ser um signo lingüístico e um signo representativo, que significa
amplamente sem nexo com o contexto lingüístico, dizem respeito ao
modo de funcionamento do signo, relativo à maneira de efetivar sua
significação.
A formação dos quatro tipos de signo é baseada nas
combinações desses dois critérios de classificação. Toda e qualquer
coisa que seja considerada como um signo tem um tipo específico de
origem e tem um tipo específico de funcionamento, segundo as opções
já indicadas. Esses dois critérios são independentes entre si, visto que a
gênese de um signo não implica necessariamente um tipo específico de

71 Cf. OCKHAM, 1999, p.120; ADAMS, 1987, p.71-72; CHALMERS, 1999,


p.76.
72 Cf. ADAMS, 1987, p.317.

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396 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

modo de funcionamento para ele, da mesma maneira que a significação


de um signo pode ser conduzida de modo alheio a como esse signo em
particular adquiriu sua capacidade de significar. Enfim, os quatro tipos
de signos resultam da associação entre as possibilidades oferecidas
pelos modos de origem e de significação. Agora podemos examinar o
resultado da combinação desses critérios.
O primeiro tipo de signo, gerado a partir de um contato direto
com o objeto significado, é o natural representativo, pois possui ao
mesmo tempo uma origem natural e uma significação representativa,
ou seja, significa sem auxílio de nenhum elemento lingüístico. A pegada
é um exemplo desse tipo de signo e significa a existência passada de um
determinado ser, assim como a fumaça, que significa o fogo. O
segundo tipo de signo, o natural lingüístico, também possui tanto uma
origem natural, como seu nome indica, quanto um tipo de
funcionamento lingüístico. O exemplo por excelência desse signo é o
conceito (terminus conceptus), ou o termo mental (terminus mentis). Quanto
ao terceiro tipo de signo, o convencional representativo, sua origem é
estabelecida por instituição voluntária, relacionada a imposições
humanas, e seu funcionamento ocorre sem relação direta com
contextos lingüísticos. Um exemplo desse tipo de signo é a bandeira
militar. Enfim, o quarto tipo de signo é o convencional lingüístico, que
possui tanto uma origem convencional, quanto um funcionamento
linguístico. É o caso das palavras faladas e escritas da linguagem
convencional73.
Ao mencionar seus critérios de distinção geral dos signos,
Ockham está interessado em localizar apenas aqueles signos que dizem

73Esse total de quatro tipos de signos é reconstruído, como indicamos acima,


a partir dos critérios utilizados pelo próprio Ockham para entender um signo e
segundo modelos de combinações retirados da obra e do pensamento de
Charles Sanders Peirce. Cf. PEIRCE, 1931-1958, p.369. Ockham menciona
explicitamente apenas dois dos seus tipos de signos, o natural representativo e
o convencional lingüístico. Cf. SPADE, 1996, p.62-63.

Cad. Hist. Fil. Ci., Campinas, Série 3, v. 21, n. 2, pp. 373-416, jul.-dez. 2011.
SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 397

respeito propriamente à lógica, ou seja, foca somente os signos que


possuem um funcionamento lingüístico, que sejam naturais ou
convencionais. Dentre os signos lingüísticos, o exemplo mais elementar
pertinente ao preâmbulo da lógica de Ockham é o termo (terminus).

II. II. TERMINUS

A principal divisão dos termos é a entre termo falado (terminus


prolatus), termo escrito (terminus scriptus) e termo mental (terminus
conceptus)74. A diferença entre eles reside não apenas em seu aspecto
ontológico, mas também em seu modo de origem enquanto signo
lingüístico. Há uma origem tanto natural, como convencional para um
signo lingüístico. Os termos falado e escrito se enquadram no quarto
tipo de signo visto anteriormente, que se refere aos signos
convencionais lingüísticos. O termo mental, por outro lado, não é dessa
mesma categoria, já que se encontra, antes, incluído no segundo tipo de
signo examinado, que é o signo natural linguístico.
Além dessa classificação do termo, baseada na sua constituição
ontológica e na sua origem, há outra divisão fundada, desta vez, em sua
função gramatical e lógica. Qualquer termo escrito, falado ou mental
pode exercer a função gramatical de nome, verbo, adjetivo, advérbio,
conjunção, particípio, pronome e preposição, ou seja, cumpre o papel
de um ou outro tipo de palavra que componha as partes lingüísticas
tradicionais do discurso75. De maneira estrita, os elementos necessários

74 Cf. OCKHAM, 1999, p.118.


75 As partes do discurso da linguagem mental são em menor número que as da
linguagem convencional, que seja falada ou escrita. Os particípios e os
pronomes, por exemplo, são elementos que compõem o discurso
convencional, mas são postas em dúvida como partes do discurso mental e
natural: “(...) non oportet participiis vocalibus distinctos conceptus in mente
correspondere. Et de pronominibus posset esse consimilis dubitatio.”
OCKHAM, 1993, p.11.

Cad. Hist. Fil. Ci., Campinas, Série 3, v. 21, n. 2, pp. 373-416, jul.-dez. 2011.
398 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

e suficientes para assumir a função de um termo lógico são o nome


(nomen) e o verbo (verbum), o que corresponde à concepção aristotélica e
boeciana, que ressalta que se trata das partes centrais do discurso para
os lógicos76. Os advérbios, as preposições, as conjunções e as demais
partes do discurso servem para incrementar a significação de um termo
e, como no caso das conjunções, para ligar proposições categóricas e
hipotéticas entre si77.
Conforme a tradição aristotélica, Ockham afirma que o termo
é o componente semântico mais básico da proposição78. O termo serve
para indicar em uma proposição algo ao qual o predicado se aplica, isto
é, o sujeito (subiectum), que precede a cópula. Além disso, o termo
constitui aquilo que é predicado do sujeito, isto é, o próprio predicado
(praedicatum), que se segue ao verbo da proposição79. Entre os verbos, o
mais essencial para a lógica é o verbo ser (esse), que exerce
principalmente a função de cópula (copulatio) entre sujeito e predicado80.
Segundo sua função lógica de sujeito ou de predicado, o termo
divide-se em incomplexo e complexo. Um termo incomplexo é um dos
extremos de uma proposição categórica, que não forma nenhum tipo
de palavras ou frases compostas, de modo que se resolva apenas em
nomes, como ‘homem’, ‘branco’ e ‘animal’. Já o termo complexo é
definido como um extremo de uma proposição categórica composto
por mais de um termo incomplexo, assim como uma frase. Por
exemplo, na oração “Homem branco é animal”, ‘homem branco’ é um
termo composto a partir de dois termos incomplexos, enquanto no

76 Cf. OCKHAM, 1999, p.126; PANACCIO, 1999ª, p.265-266; SPADE, 1996,


p.74.
77 Essas palavras exercem a função de termos sincategoremáticos. Cf.

OCKHAM, 1980, p.79-80.


78Cf. OCKHAM, 1999, p.118.
79 Cf. OCKHAM, 1999, p.204-205.
80 As demais formações verbais podem ser reduzidas à cópula acompanhada

do particípio presente do verbo da frase. Por exemplo, a oração “Sócrates


corre” corresponde a “Sócrates está/é correndo”. Cf. SPADE, 1996, p.104.

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 399

período “‘O homem é um animal’ é verdadeira”, ‘O homem é um


animal’ constitui uma proposição, mas ocupa a função de termo
complexo na frase em questão81.
Os termos incomplexos, por sua vez, subdividem-se em termos
incomplexos categoremáticos e em termos incomplexos
sincategoremáticos, classificação que ocupa um lugar central na lógica.
Os termos sincategoremáticos correspondem às palavras que não
possuem significação definida, mas exercem influência semântica
quando ligados a termos categoremáticos em contextos
proposicionais82. Quanto aos termos categoremáticos, são aqueles que
possuem autonomia semântica, ou seja, conservam a sua capacidade de
significar objetos de modo determinado e certo, independentemente de
um contexto proposicional83. Os categoremáticos são os elementos
centrais para a constituição da linguagem mental de Ockham e possuem
outras subdivisões e classificações, baseadas nos diversos tipos de
significação que um termo incomplexo pode apresentar84. Os termos
abstratos e concretos, assim como os termos absolutos e conotativos,
são exemplos de subdivisões dos termos categoremáticos85.

II. III. PROPRIETATES TERMINORUM:


SIGNIFICATIO E SUPPOSITIO

A propriedade semântica de significação (significatio) entra como


elemento decisivo na separação entre termos categoremáticos e
sincategoremáticos, já que somente os primeiros possuem uma
significação determinada. A distinção não reside no fato de que os
termos sincategoremáticos não possuam qualquer tipo de significação.

81 Cf. OCKHAM, 1999, p.121.


82 Cf. OCKHAM, 1999, p.126-127; ADAMS, 1987, p.317.
83 Cf. OCKHAM, 1999, p.126-127.
84 Cf. PANACCIO, 1999b, p.55.
85 Cf. NORMORE, 1999, p.34.

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400 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

De fato, eles constituem um elemento importante na semântica


ockhamista, sendo classificados de maneira mais ampla na divisão dos
vários tipos de significação linguística. Todavia, apenas os termos
categoremáticos apresentam stricto sensu a propriedade de significação,
por causa da sua autonomia semântica86. É esse último sentido de
significação que convém agora discutir.
A significação se define, de maneira breve, como a capacidade
de um signo, no caso um termo categoremático, para trazer algo à
mente, algo distinto do próprio signo ou termo: “(…) for Ockham,
strictly speaking, to signify is to bring to mind or make understood.”
(ADAMS, 1987, p.318). Essa propriedade exerce, para Ockham, o
papel mais fundamental entre as propriedades semânticas encontradas
em toda lógica87. De fato, é ela que expressa as relações mais básicas
entre os signos, notadamente os signos lingüísticos, e as coisas88.
A significação lingüística, nesse sentido específico, possui
quatro acepções distintas em Ockham, que são as próprias (propria),
quando intervém a propriedade de suposição (suppositio) e uma
predicação usual e apropriada do termo, ou as impróprias (impropria),
quando não aparecem essas mesmas características89. Nós nos
interessamos somente pelas primeiras neste trabalho. As duas acepções
próprias da significação dividem-se em uma versão estrita e uma outra

86 Cf. ADAMS, 1987, p.318.


87 Cf. PANACCIO, 1999ª, p.272.
88 Cf. OCKHAM, 1999, p.126-127.
89 Cf. OCKHAM, 1999, p.208-209. A distinção entre as acepções próprias e

impróprias da significação é baseada numa analogia teórica com as divisões


próprias e impróprias da suposição dos termos: “(...) sicut est suppositio
propria, quando scilicet terminus supponit pro eo quod significat proprie, ita
est suppositio impropria, quando terminus accipitur improprie.” OCKHAM,
1993, p.240. As duas últimas acepções não são acepções próprias da
significação, pois não permitem que o termo seja tomado significativamente
em predicações usuais, sendo relegadas a um tipo de significação secundária ou
conotativa. Cf. SPADE, 1996, p.148.

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 401

ampla. A significação própria e estrita corresponde à capacidade de um


termo supor no tempo presente e ser verificado, ao predicar, em seu
lugar, um demonstrativo ostensivamente na presença do objeto. Já a
significação própria tomada em sentido amplo equivale à competência
do termo supor no tempo passado, presente e futuro, e receber
determinações modais, como ‘pode’ (potest), de modo a conservar a
verdade da proposição90.
A suposição (suppositio) mencionada na definição das
significações lingüísticas próprias é uma propriedade semântica de
grande importância na lógica nos últimos séculos da Idade Média91. Ela
se define, em breve, como a capacidade de um termo poder tomar
posição, enquanto sujeito ou predicado lógico, por outra coisa (pro alio
positio) em uma proposição92. A suposição de um sujeito precisa ser
ligada àquilo que o predicado da proposição designa, enquanto a
suposição de um predicado deve, por sua vez,ser unida àquilo ao qual o
sujeito da proposição alude, de modo que sujeito e predicado de uma
proposição mantêm a referência a um único e mesmo objeto ou,
segundo o contexto, aos mesmos objetos, para a proposição poder ser
verdadeira93.
A principal função da propriedade de suposição é a de
expressar a diversidade semântica que um termo pode assumir no
discurso. Mediante sua divisão inicial em suposição pessoal, material e
simples94, fica estabelecido um aparato semântico eficaz para explicar a

90 Cf. NORMORE, 1999, p.38.


91 Cf. SPADE, 1996, p.241-242.
92 Cf. OCKHAM, 1999, p.313-314.
93 Cf. OCKHAM, 1999, p.138.
94 A suposição pessoal ocorre quando o termo se refere àquilo que é sua

significação de origem, como o termo ‘homem’ em “Homem é animal”. A


suposição material aparece quando o termo se refere a seu teor como palavra,
como o termo ‘homem’ em “Homem é substantivo”, Por fim, a suposição
simples ocorre quando o termo se refere a seu teor como conceito, como o
termo ‘homem’ em “Homem é espécie”. Cf. ADAMS, 1987, p.328-329.

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402 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

capacidade de um termo se referir não apenas a seu objeto de


significação original, mas também a seu conceito correspondente e ao
seu próprio aspecto material e lingüístico95.
O que distingue a propriedade de suposição da de significação
é, basicamente, o contexto proposicional, no qual deve se apoiar a
suposição e não a significação. Em relação à formação dessas mesmas
propriedades dos termos, a significação possui primazia sobre a
suposição de um termo. Ela aparece anteriormente à suposição e torna
possível a formação dela. A suposição de um termo pressupõe então
que tenha uma significação prévia, de tal modo que ela se manifesta
somente após um termo possuir uma significação determinada.
Todavia, no âmbito do funcionamento semântico e da aplicação ao
discurso, é a suposição do termo que possui maior relevância e, na
prática lingüística, essa propriedade é mais efetiva que a mera
significação dos termos96.
A constituição primária da propriedade de significação explica-
se tanto pela relação causal natural, que se estabelece no contato entre
os objetos da sensação e o aparato cognitivo do ser humano, quanto
pela relação de similaridade natural, onde os objetos captados pelos
órgãos sensoriais geram uma ficção mental (ficta), que mantém certa
semelhança com a coisa97. Apesar de Ockham ter defendido a teoria da
ficção mental (fictum) em textos de juventude em relação à questão da
constituição dos conceitos, sua posição mais bem acabada privilegia a

95 Cf. OCKHAM, 1999, p.315; NORMORE, 1999, p.35.


96 A definição da significação lingüística própria por meio da noção de
suposição dos termos apóia essa afirmação. Cf. ADAMS, 1987, p.327-328.
97 A teoria do fictum de Ockham pressupõe que haja certa semelhança entre

uma ficção mental e a coisa à qual tal ficção se refere. Por outro lado, a teoria
do ato de intelecção dispensa a existência de ficções mentais geradas no
contato com o mundo, e indica a própria atividade de inteligir (fazer
intelecções) – gerada em contato causal com o mundo – como central para
explicar o fenômeno cognitivo humano. Cf. ADAMS, 1987, p.73-74.

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 403

teoria do ato mental98. De qualquer modo que se entenda em Ockham


a constituição de um conceito e o processo pelo qual surge a sua
significação, o importante é que os próprios objetos da percepção
sensorial produzem certa marca na mente, que se personifica em um
signo mental com capacidade de significar naturalmente aquelas coisas,
captadas de maneira espontânea e direta. Essas configurações mentais
básicas, ou signos mentais, são derivadas diretamente de contatos
empíricos e intuitivos, e a presença de uma estrutura gramatical mental
básica e inata a todo ser humano é o que direciona e permite toda
regulação desses mesmos signos mentais99. Esses últimos são
exemplificações daqueles signos de segundo tipo, que vimos
anteriormente, isto é, dos signos naturais lingüísticos, que possuem um
funcionamento lingüístico e uma origem natural. Na visão lógica de
Ockham, são simplesmente chamados de termos mentais (terminus
mentis)100.
A origem natural de um termo mental pode ser expressa por
meio de sua geração como intenção da alma (intentio animae). Esse
processo de formação dos termos mentais passa por dois estágios, um
chamado de primeira intenção (prima intentio) e outro, de segunda
intenção (secunda intentio), que vamos examinar agora.

98 Cf. SPADE, 1996, p.156-158.


99 A potência inata de uma gramática mental indica não uma natureza humana
comum, mas habilidades conceituais semelhantes a todos os seres humanos
particulares, o que não compromete, a rigor, a posição nominalista de
Ockham. Cf. PANACCIO, 1999b, p.53.
100 O trecho em que Ockham fala claramente que o pensamento conceitual

(intellectio) é um termo mental, que funciona como signo natural e linguístico


das coisas é o seguinte: “(...) dicunt quod intellectio qua inteligo hominem est
signum naturale hominum, ita naturale sicut gemitus est signum infirmitas vel
tristitiae seu doloris; et est tale signum quod potest stare pro rebus in
propositionibus mentalis, sicut vox potest stare pro rebus in propositionibus
vocalibus.” OCKHAM, 1993, p.54.

Cad. Hist. Fil. Ci., Campinas, Série 3, v. 21, n. 2, pp. 373-416, jul.-dez. 2011.
404 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

II. IV. INTENTIO ANIMAE E IMPOSITIO PROLATI


E SCRIPTI

A primeira intenção indica a geração de um termo mental, o


qual significa apenas coisas que não sejam nomes, nem qualquer outro
tipo de signo. De modo amplo, é possível tomar como exemplos de
termos de primeira intenção todos os verbos e conjunções mentais.
Porém, no sentido mais estrito estabelecido por Ockham, somente os
nomes propriamente ditos são considerados termos de primeira
intenção, ou seja, trata-se dos termos categoremáticos como ‘homem’,
‘branco’ e ‘animal’101.
A segunda intenção trata da origem de termos mentais que
significam estritamente aqueles termos mentais de primeira intenção.
Ou seja, esses termos mentais de segunda ordem não significam
nenhuma coisa, que possa ser considerada como existente fora da
mente e da estrutura cognitiva humana. Os exemplos clássicos desses
termos de segunda intenção são as palavras ‘espécie’ e ‘gênero’, que
designam apenas termos mentais categoremáticos de primeira intenção,
como ‘homem’ e ‘animal’, sem conotar qualquer natureza comum
existente fora da alma102.
Os termos mentais de primeira e de segunda intenção são os
únicos provenientes de e pertencentes à linguagem mental. Quanto aos
termos da linguagem convencional, como as palavras faladas ou
escritas, são derivados desses termos gerados naturalmente na
linguagem mental103. Esses signos lingüísticos de origem convencional
procedem de uma instituição voluntária, na medida em que uma palavra
falada é designada para significar aquilo que um termo mental significa
inicialmente de modo natural. Essa convenção instituída é baseada na

101 Cf. OCKHAM, 1999, p.152-155.


102 Cf. PANACCIO, 1999b, p.66.
103 Cf. OCKHAM, 1999, p.118-119; PANACCIO, 1999b, p.54.

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 405

necessidade de comunicar informações inicialmente captadas e


processadas pela mente por meio dos signos mentais104.
O processo de imposição dos nomes convencionais (impositio
nominum significantium ad placitum) também é estabelecido de duas
maneiras105. A primeira imposição (prima impositio) basicamente diz
respeito a todos aqueles nomes que significam convencionalmente, mas
que não significam, de modo nenhum, outros nomes. Estritamente
falando, somente os termos categoremáticos falados e escritos são
termos de primeira imposição, tais como ‘Sócrates’ e ‘homem’. A
segunda imposição (secunda impositio), por sua vez, refere-se a nomes que
são estabelecidos com o intuito de significar outras palavras, como é o
caso dos nomes ‘substantivo’ e ‘verbo’, dado que designam apenas
coisas que são palavras106.
Em última análise, podemos acrescentar que os termos mentais
são signos lingüísticos originados naturalmente, ao passo que os termos
falados são signos lingüísticos instituídos para significarem o que os
termos mentais significam, e os termos escritos, signos impostos
convencionalmente para significarem o que os termos falados
significam107. A subordinação semântica da linguagem convencional à
linguagem mental está circunscrita a esse estabelecimento primitivo e
fundamental da significação dos termos convencionais. Contudo, não
há necessariamente uma subordinação da atividade de significação
propriamente dita desses termos convencionais, como mostramos a
seguir.

104 Cf. SPADE, 1996, p.76-77.


105 Cf. CHALMERS, 1999, p.76.
106 Cf. OCKHAM, 1999, p.149-150.
107 Cf. CHALMERS, 1999, p.76.

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406 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

II. V. SUBORDINAÇÃO DAS PALAVRAS (PROLATA)


AOS CONCEITOS (CONCEPTI)

As palavras convencionais são subordinadas aos conceitos, ou


seja, os termos falados e, indiretamente, os escritos são
hierarquicamente dependentes dos termos mentais108. Esse modelo
remete à triangulação tradicional entre palavras, conceitos e coisas e
implica, como condição necessária para haver palavras significativas, o
estabelecimento prévio de uma relação semântica entre as palavras e os
conceitos109. Tal condição tradicional se mantém presente no
pensamento de Ockham. Contudo, a teoria da subordinação de
Ockham possui características próprias, por causa principalmente do
tratamento reservado ao conceito de termo mental natural110. Segundo
Ockham, a subordinação está baseada somente no processo de
imposição dos termos convencionais, falados ou escritos, ou seja, ela
encontra-se apenas na origem desses termos. Na atividade
propriamente dita de significar, as palavras faladas e escritas não
significam ou se referem a conceitos111. Há passagens em que Ockham
veementemente sugere que a subordinação seja restrita somente ao
processo de origem das palavras convencionais, apesar de não dar
nenhumas justificativas teóricas:

108 Cf. SPADE, 1996, p.77.


109 Cf. KLIMA, 1999, p.118-142.
110 Cf. KLIMA, 1999, p.120; PEIRCE, 1931-58, p.2531-2532.
111 “By denying that R2 and R3are signification relations, Ockham is making a

substantive point. He is saying that spoken words do not make me think of


concepts, and written words do not make me think of spoken words.” SPADE,
1996, p.77. Note que, no contexto da argumentação de Spade, R2 e R3 são
expressões que designam tipos de relações de subordinação entre palavras,
faladas ou escritas, e conceitos. Para Ockham, a subordinação não implica
relação de significação direta.

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 407

“(...) termos concebidos (...) permanecem apenas na mente e não


podem ser proferidos ao exterior, embora as palavras faladas,
como sinais subordinados a eles, se pronunciem exteriormente.
Digo, porém, que as palavras faladas são signos subordinados aos
conceitos ou intenções da alma, não porque, tomando
propriamente o vocábulo ‘signos’, as palavras faladas sempre
signifiquem primeiro e propriamente os conceitos da alma, mas
porque as palavras faladas se impõem para significar aquilo que é
significado pelo conceito da mente, de tal sorte que, em primeiro
lugar, o conceito significa naturalmente algo e, secundariamente, a
palavra falada significa aquilo mesmo (...).” (OCKHAM, 1999,
p.119)112”

A subordinação semântica para Ockham é circunscrita ao


âmbito de origem da significação dos termos convencionais. Os signos
convencionais lingüísticos possuem então a capacidade de se referir
diretamente às coisas, sem que seja necessário mencionar ou conotar o
seu conceito correspondente. Dito de outra maneira, para que os signos
convencionais possam exibir qualquer significação que seja, deve haver
uma imposição prévia de sua significação, de modo a subordiná-los à
significação de algum signo natural, isto é, os termos mentais ou os
conceitos. Porém, após ter sido imposto, um signo convencional não
necessita significar o conceito, que deu origem a sua significação, e tem
aptidão para se referir diretamente à coisa significada
convencionalmente por ele.
Os termos convencionais são estabelecidos para se
relacionarem diretamente com as coisas e não com os conceitos. É o
caso mesmo quando se trata da equivocidade, que consiste em um
mesmo termo convencional designar duas coisas diferentes, como

112Essa perspectiva, de que palavras convencionais devem significar


diretamente coisas no mundo, apesar de se subordinar a conceitos, é vista
como uma posição teórica primitiva adotada por Ockham: “I know of
nowhere Ockham actually argues that words do not in general signify
concepts; he just takes it for granted that they don’t. Sometimes we hear words
and we aren’t made to think of concepts at all; we are made to think of other
things instead: rocks, trees, houses, and so on.” SPADE, 1996, p.81-82.

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408 GUY HAMELIN & DANILO MAIA

‘banco’, e da sinonímia, em que dois termos designam uma única coisa,


tais como ‘solteiro’ e ‘não casado’113. Ressaltamos que a utilização
comum de um termo ocorre sempre através da sua suposição e em
contexto proposicional. Dessa forma, nas proposições “O banco é de
madeira” e “O banco está aberto”, onde ‘banco’ é equívoco em suas
ocorrências, tal termo, em seu respectivo contexto proposicional,
continua a remeter diretamente a coisas. Na primeira proposição o
termo ‘banco’ refere-se a um tipo de móvel para assento, enquanto na
segunda, alude a uma instituição financeira. Mas, em ambos os casos, as
duas ocorrências do termo significam diretamente as coisas, sem
precisar conotar os conceitos correspondentes. Enfim, os termos
convencionais não são instituídos, na concepção ockhamista, para
evocar primeiramente eventos de natureza mental, nem outros tipos de
palavras, mas são estabelecidos para expressar diretamente as coisas do
mundo114. Isso ocorre notadamente por meio da propriedade de
suposição dos termos e de seus mecanismos semânticos.
Em conclusão, queremos ressaltar o essencial das discórdias e
dos acordos que encontramos em nossa análise das teorias semânticas
de Abelardo e Ockham. Por um lado, apesar de representar certa
curiosidade histórica, defendem idéias parecidas e dessemelhantes sem
grande conseqüência teórica para nossa comparação, como o fato de
que Abelardo, ao contrário de Ockham, não se refere explicitamente a
Agostinho na sua explicação do signo, mesmo que seja um grande
defensor de várias de suas concepções filosóficas e não obstante a
importante contribuição agostiniana nesse assunto115. Por outro lado,
outros pontos examinados das suas teses respectivas constituem

113 Cf. SPADE, 1996, p.77.


114 Cf. SPADE, 1996, p.81-82.
115 O caso da cópula é parecido. Ainda que Abelardo e Ockham defendam

uma concepção semelhante do verbo ‘esse’, que é importante na teoria


semântica de cada um deles, não avaliamos esse ponto, já que não foi
explicitamente considerado em nosso estudo.

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 409

elementos fundamentais de sua teoria semântica. Nesta parte final,


queremos ressaltar aqueles componentes, que podem ser reduzidos a
um aspecto preciso de sua concepção.
Em primeiro lugar, é claro que ambos defendem idéias
bastante semelhantes acerca do signo convencional, que seja a palavra
oral ou a escrita. Mesmo que Abelardo entre em discussões de natureza
mais fonológicas sobre esse tipo de signos, em razão sobretudo do seu
interesse geral pelo trivium, o que não faz Ockham, que se limita aos
aspectos estritamente semânticos, os dois concordem sobre a
necessidade de uma imposição voluntária para constituir a sua
significação. Por outro lado, a maior distinção entre eles
incontestavelmente diz respeito à questão do papel da mente nas
relações semânticas entre esses signos convencionais e as coisas. Sem
entrar em discussão detalhada sobre a importância em Ockham da
linguagem mental natural, que se caracteriza notadamente por seu
caráter universal, examinamos a função principal do intelecto nas duas
teorias examinadas.
A definição de significação por parte de Abelardo é clara:
significar é gerar uma idéia ou, em seus termos, uma intelecção
(intellectum generare)116. Não usa aparentemente a palavra ‘significar’
(significare) para indicar a relação entre intelecções e coisas, mas antes
termos e expressões como ‘dizer respeito a’ (pertinere), ‘conceber’
(concipere), ‘considerar’ (considerare), ‘perceber’ (percipere) e ‘dirigir-se’
(dirigi)117. Em suma, uma palavra convencional necessariamente
significa, segundo Mestre Pedro, um conceito ou uma idéia subjetiva,
que diz respeito, por sua vez, a uma coisa. Todavia, quando falamos e
comunicamos nosso pensamento a outros, nós nos referimos, insiste

116 O contexto no qual aparece essa explicação é o seguinte: “(...) alia autem
per generationem, veluti cum intellectus per vocem prolatam vel animo
audientis constituitur ac per ipsam in mente ipsius generatur (...)”
ABELARDO, 1970, p.112 4-6. Cf. JOLIVET, 1974, p.163-178.
117 Cf. JOLIVET, 1974, p.172.

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ele, às coisas do mundo e não a nossas intelecções, a não ser que


queremos explicitamente aludir a elas. Vimos as principais razões, pelas
quais Abelardo defende a necessidade das palavras passarem
anteriormente pela mente antes de aludir às coisas, razões que podem
se reduzir à idéia, segundo a qual as palavras não sempre se referem ao
mundo sensível, como os termos universais e imaginários,notadamente
elas não denotam nenhuma coisa em contexto proposicional, nem as
representam, essas coisas, corretamente em todas as ocasiões. Nessas
circunstâncias, os termos convencionais significam, contudo, um
conceito ou, no caso das proposições, um significado, que não é uma
coisa na ontologia abelardiana.
Ockham defende uma teoria distinta da de Abelardo acerca
dessa questão precisa da intermediação do intelecto no processo de
significação. O Venerabilis inceptor apresenta pelo menos dois motivos
principais para justificar a significação direta das coisas pelos termos
convencionais. Ainda que não impeça que as palavras convencionais
eventualmente pudessem se vincular aos conceitos, como é o caso dos
termos ‘espécie’ e ‘gênero’ tomados em imposição simples (impositio
simplex), Ockham insiste sobre o fato de que as palavras são impostas
em geral para significar, sem intermediário nenhum, as coisas. Nesse
sentido, não são todos os termos que se referem diretamente às coisas
na concepção ockhamista, o que contempla alguns dos casos
levantados por Abelardo para justificar a passagem necessária das
palavras pela mente antes de se referir ao mundo, isto é, cada vez que
um termo não possui significados concretos. A segunda razão
apresentada por Ockham para desqualificar a intermediação mental
tradicional diz respeito à sua acepção mais aprimorada da significação,
que envolve a suposição dos termos em relação à modalidade e à
temporalidade118. Desta forma, a inexistência fatual de um objeto

118Essa
acepção da significação sugere fortemente que também Ockham deve
se comprometer, de alguma forma, com entidades possíveis (possibilia). Cf.

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SIGNUM, SIGNIFICATIO E INTELLECTUS 411

significado por um termo não impede que permaneça certa ligação


entre eles, já que as noções de tempo e de modo interferem na
significação em contexto proposicional. Não é preciso mais a passagem
obrigatória dos termos pelo intelecto na ausência atual do objeto
referido ou na sua mudança119. Portanto, a significação direta das
palavras convencionais explica-se, entre outras coisas, pelo fato de que
o objeto significado é entendido de maneira mais ampla em Ockham,
ou seja, não é simplesmente considerada a coisa presente atualmente,
mas também a coisa passada e futura, que seja necessária ou possível120.
Em suma, a conseqüência imediata de as intelecções não
significarem coisas em Abelardo é a seguinte. Os conceitos não são
signos. Na teoria de Ockham, há uma dupla significação paralela: a dos
termos convencionais e a dos termos mentais. Trata-se verossimilmente
da distinção mais importante entre o nominalismo de Abelardo e o de
Ockham e dos seus sucessores121. Como pensador do seu tempo,
Mestre Pedro interessa-se especialmente com a linguagem
convencional, notadamente o latim, enquanto que o Venerabilis inceptor
se preocupe em cima de tudo da linguagem mental, cujas características
gramaticais e semânticas são de natureza universal. Todavia, a diferença
entre esses dois lógicos pode ser amenizada pelo fato de que não
discutem exatamente esse assunto a partir do mesmo ângulo ou da
mesma perspectiva. Por um lado, Abelardo trata geralmente da
significação das palavras convencionais discretas, ao passo Ockham

NORMORE, 1999, p.34. Temos que enfatizar que a noção de tempo dos
nomes e dos verbos também constitui, como vivos, um elemento determinante
na concepção abelardiana.
119Ockham afirma: “Secundo modo accipiendo ‘significare’ et ‘significatum’

sibi correspondens, vox vel conceptus per solam mutationem rei extra non
cadit a suo significatio.” OCKHAM, 199, p.208.
120 Cf. OCKHAM, 1999, p.208-209.
121 “Il est donc clair que pour Abélard les intellections ne sauraient être des

signes, et cela confirme, très logiquement, que sa pensée diffère profondément


de celle des nominalistes du 14e siècle.” JOLIVET, 1974, p.172.

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praticamente sempre use a propriedade de suposição para abordar esse


tema da significação lingüística e para resolver eventualmente os casos
que precisam, na concepção do primeiro, da passagem pelo intelecto.
Em outras palavras, a significação dos termos convencionais está muito
mais ligada ao contexto proposicional em Ockham que em Abelardo,
cuja visão acerca da significação e da referência das frases implica não
somente uma intelecção particular e distinta da dos seus componentes,
mas também um significado inteligível. Além das palavras, dos
conceitos e das coisas, essa quarta esfera dos significados desenvolvida
por Abelardo representa certamente, a nosso ver, a maior distinção em
relação a Ockham122.

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122“Quippe eas (communes formas) concipere per nomina quid aliud est,
quam per ea significari? Sed profecto cum eas ab intellectibus diversas facimus,
iam praeter rem et intellectum tertia exiit nominum significatio” ABELARDO,
1919-1927, p.24 27-30. Aqui Abelardo afirma que, além da coisa e do intelecto, o
nome diz respeito a uma terceira esfera, que chama de ‘significação’.

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