„
„„A Liga é indispensável para nós. Ela é um símbolo de
autoridade árabe e o centro de nossa vida política. Seu espírito
unificador é mais importante do que todas as outras coisas.‟‟ –
(Ministro Sírio no Cairo; 12 de maio de 1949)1.
1
Kightlinger, Dana.The Arab League Final Paper.StudyMode.com, 2013. Disponível em:
<http://www.studymode.com/essays/The-Arab-League-Final-Paper-1346285.html>. Acesso em abr. 2013.
ÍNDICE DE ABREVIAÇÕES
Bem-vindos a um dos comitês mais exóticos da SOI 2013, a Liga dos Estados Árabes!
(LEA) A diretoria da LEA não poderia estar mais feliz em entregar este guia a vocês que nos
acompanhou (assombrou) por manhãs, tardes, noites e madrugadas, mas que foi feito com
muito carinho, muita dança do ventre, muito Kebab, muitas orações à Alá e muitas risadas
entre os diretores que não podem ser considerados pessoas normais. Então, preparem-se para
encarar esse desafio com a gente! Agora é hora da SOI nas Arábias!
Entretanto, antes de começar com a parte séria do comitê, precisamos primeiro
apresentar cada um dos diretores para que os delegados possam ter a exata dimensão de quem
são essas pessoas com quem eles terão que implorar para ouvir um “sua moção está em
ordem, senhor delegado”. Vejamos:
Comecemos pela menina Cindy Lessa. Solteira (até o fechamento dessa edição), 20
anos, 8 simulações em 2 anos, cursando o 6º período de Direito da UFRN. Cindão mantém a
calma e a serenidade do comitê com seus comentários sempre ponderados e conclusivos. É
muito difícil falar mal dela, mas, já que estamos aqui...
Ela não anda, ela desfila... Mc Bola, escreveu essa canção, inspirado no caminhar
magnífico de Cindão vestindo seu ShorCindy™. O ShorCindy™, uma das maiores criações
da nossa querida diretora, gerou tantos lucros que pela segundo ano seguido ela não está aqui
para a reunião de correção material do guia, na qual esta pequena homenagem está sendo
escrita. Nesse exato momento, Cindão está em Veneza (curtindo esse verão maravilhoso da
Europa, da Itália) seduzindo os italianos com seus brownies mágicos e afrodisíacos. Portanto,
cuidado se ela te oferecer um. Experiências extracorpóreas não são raras. Para os interessados,
é uma pessoa deveras intelectualizada, exceto quando se trata de músicas de
ValeskaPopozuda, Mc Beyoncé e Faringes da Paixão. Portanto, para conquistar o coração da
menina Cindy, você precisa ser um rapaz, acima de tudo, versátil.
Passemos agora para nossa amada Giovanna Zan, presidente oficial do fã clube
“Bieber é Hétero, Sim!”Solteira, 19 anos, estrela das duas simulações de que participou, aluna
do 4º período de Direito UFRN. Romântica, estudiosa e dedicada, Giovanna é a nora que sua
mãe sonhou. Então fique de olho, principalmente se você se parece com seu amado Justin.
Giovanna representa a BieberFever no comitê. Maior advogada do ídolo teen, sempre
preparada para defendê-lo das injustas acusações dos outros membros do comitê. A moça
alega que as músicas de Justin Bieber fazem parte de sua história de vida (apesar de
reconhecer que ele é “um pouco imaturo”. Tem habilidades sobrenaturais de notar
características peculares nas pessoas. Qual característica é essa? Fica a seu critério descobrir.
Mas se você for homem e fã de Rihanna, Madonna, Ivete e Claudinha Leitte, pode ter certeza,
ela vai saber. (Ex) fã de rebelde, Giovanna julga pessoas por suas comunidades no Orkut. E
sim, ela é a favor do sistema!
PRE-PA-RA que agora é hora de Natália Pegado.Solteira por opção, 20 anos, 5
simulações, aluna do 6º período de Direito UFRN. Nossa querida Direcantora segue a vida
conforme o roteiro. É quase normal por fora, pra ninguém desconfiar, mas por dentro é uma
pessoa sui generis. Segundo seu perfil do Orkut, ela não quer uma vida pequena, um amor
pequeno, uma alegria que caiba dentro da bolsa. Afinal, nossa diretora quer coisas grandes,
pois nada raso satisfaz essa intrépida aventureira.
DeleFashion em todas as simulações que já participou, tem o Brasil como destino
favorito de férias, já que no resto do ano faz turnê pela Europa com sua banda Forró Pegado, e
tem planos de lançar sua carreira solo com seu single versão funk de Per Amore, em parceria
com sua musa e amiga íntima Inês Brasil. Fã de homens com iniciativa, Natália afirma que
seu cupido é adepto à filosofia RastaFeelings e fuma baseado.
É uma garota positiva, que deseja vida longa a todas as inimigas pra que elas vejam a
cada dia mais sua vitória. O lema da sua vida é „„keepcalm e deixa de recalque‟‟. Beijinho no
ombro, Nath!
E agora, o nosso bravo guerreiro. Comprometido seriamente com uma das diretoras da
Mini-SOI, 21 anos, 2 simulações, Luís é estudante do 2º período de Direito na Uni-RN. É o
bendito fruto entre as mulheres, fardo que carrega bravamente.
Possui diversos apelidos. Nunca será chamado de Luís Augusto. Entre eles, se
destacam Kiwi, Che, Khal Drogo e Momô (este último é restrito à sua namorada). Suas
missões extra acadêmicas no comitê envolvem ensinar as prendadas diretoras a sobreviver na
cozinha, visto que estas são capazes de estragar até 3 lasanhas pré-prontas e quebrar o micro-
ondas no mesmo dia. Também possui uma vertente de Hitch, o conselheiro amoroso, quando
profere ensinamentos como: „„às vezes, os homens preferem alguém que você possa passar
mais tempo ao lado do que em cima‟‟.
O nosso chef, psicólogo, comediante e Khal Drogo potiguar (note sua barba), supre
muito bem a falta de testosterona no comitê, e a sua ilibada reputação só poderá ser quebrada
por 18 doses de cachaça em 10 minutos.
Luz na passarela que lá vem elaaaaa! Jasminne Mascarenhas, solteira, 19 anos, recém-
motorizada, duas simulações, Minne é a nossa garota festeira. Ela é a sensação da
nightlifenatalense. Jasminne não resiste a uma fextcheeenha com azamigas. Minne exala
ousadia e alegria.
Pra ela, olho no olho já é suficiente. Nossa Neymar de saias é uma das responsáveis
apesar da recente contusão na última competição, pelo tricampeonato de futebol da turma
2011.1 + convidados. Ao contrário do original, não cai aos pés do primeiro homem que
encosta nela. Afinal, ela fez um pacto com o amor: nem ela o persegue, nem ele persegue ela.
Na hora certa, eles se encontrarão, apesar de Minne viver em busca do seu Mickey, ou do seu
Aladim. Então, se você quer tirar Jasminne da vida boa de solteira, vai precisar de muito mais
do que um belo gol, pois isso ela já sabe fazer.
Por fim, Carol (sobrenome ryco) Beghelli, comprometida, 19 anos, duas simulações,
Carol é a nossa Jessica Alba tupiniquim. Linda e loira, Carol é professora de inglês, fala
francês fluentemente, mas ainda não aprendeu a diferença entre o cream cracker e a bolacha
Maria e ficou chocada ao saber que, de fato, essa diferença existe.
Nas horas vagas faz a linha garota-propaganda da escola de línguas Open Doors e,
segundo seu perfil no site da instituição é descrita pelos seus alunos como “crazy, butkind”.
No entanto, o talento para a carreira de modelo e professora não se reflete na direção. Carol
lda constantemente com ligações do seguro, ou de vítimas das suas leves “encostadinhas” nos
toscos engarrafamentos da pacata cidade de Natal. A situação é tão grave que a sua própria
mãe a presenteou com um porta documento de carro com os dizeres “beijo melhor que
dirijo”.Com cara de menina boazinha, não se engane, Carol, recentemente, revelou que seu
maior ídolo nas redes sociais é Félix Bicha Má: “Só não sambo na sua cara, porque não gosto
de pisar em falso”. Fique de olho, senhor delegado, ela pode estar lá, da mesa, julgando você!
Então é isso! Chegou a hora de começar a brincadeira, de fato! Bons estudos, até
outubro e que Alá esteja com vocês!
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO......................................................................................................................9
2. HISTÓRICO DA LIGA ÁRABE.......................................................................................................10
2.1. Formação da Liga dos Estados Árabes...........................................................................................10
2.2. Dissensões internas....................................................................................................................12
3. FUNCIONAMENTO INTERNO DA LIGA ÁRABE.........................................................13
3.1. Secretariado Geral..............................................................................................................13
3.2. Conselho de Defesa Conjunta............................................................................................14
3.3. Conselho da Liga Árabe.....................................................................................................14
4. NORMATIZAÇÃO INTERNA DA LIGA DOS ESTADOS ÁRABES..............................14
4.1Tratado de Cooperação Econômico-Defensiva....................................................................15
4.2. Carta Árabe dos Direitos Humanos...................................................................................16
4.3. Resolução 7446 de 12 de fevereiro de 2012......................................................................19
4.4 Resolução de 24 de março de 2013.....................................................................................19
4.5 Declaração de Doha............................................................................................................20
5. FORMAÇÃO DOS ESTADOS ÁRABES...........................................................................21
6. BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA QUESTÃO DO PETRÓLEO NO
ORIENTE..................................................................................................................................29
7. AS INTERVENÇÕES MILITARES NO DIREITO INTERNACIONAL...........................31
7.1 A relativização da soberania e a intervenção no âmbito das Nações Unidas......................32
8. INTERVENÇÕES ESTRANGEIRAS NO SÉCULO XX E INÍCIO DOS
ANOS 2000..............................................................................................................................37
8.1.Guerra do Irã-Iraque (1980-1988).......................................................................................38
8.2 Guerra do Golfo (1990-1991).............................................................................................39
8.3 A invasão ao Afeganistão (2001)........................................................................................41
8.4A invasão ao Iraque (2003)..................................................................................................42
9. PRIMAVERA ÁRABE........................................................................................................44
9.1. Análise específica dos países........................................................,....................................50
9.1.1. Arábia Saudita.................................................................................................................50
9.1.2. Argélia.............................................................................................................................51
9.1.3Bahrein..............................................................................................................................51
9.1.4. Egito................................................................................................................................52
9.1.5. Jordânia...........................................................................................................................53
9.1.6. Kuwait.............................................................................................................................54
9.1.7. Líbia................................................................................................................................54
9.1.8. Marrocos.........................................................................................................................56
9.1.9. Omã.................................................................................................................................56
9.1.10. Síria...............................................................................................................................56
9.1.11. Tunísia...........................................................................................................................58
9.1.12. Iêmen.............................................................................................................................59
10. DESAFIOS ATUAIS DA LIGA DOS ESTADOS ÁRABES............................................60
11. INDICAÇÕES....................................................................................................................62
REFERÊNCIAS........................................................................................................................64
9
1. INTRODUÇÃO
A Liga dos Estados Árabes (LEA) é uma organização regional que inclui nações
da Península Arábica e do norte da África, a primeira a ser criada após a II Guerra
Mundial. Baseada em princípios que dão suporte e promovem um nacionalismo árabe
unificado, tem como escopo procurar padronizar as posições dos países árabes com
relação aos mais diversos assuntos.
A Carta da Liga Árabe, ato institucional da organização, endossa o princípio de
um lar árabe comum, ao mesmo tempo em que respeita a soberania de seus países-
membros. A regulação interna do Conselho da Liga e de seus comitês foi acordada em
outubro de 1951, enquanto a do Secretariado Geral apenas em maio de 1953.
Desde então, a administração da Liga Árabe tem se baseado na dualidade da
instituição supranacional e na soberania dos Estados. A preservação dessa soberania
deveu-se, naturalmente, à preferência intrínseca das elites dirigentes em manter seu
poder e independência na tomada de decisões internas. Assim, a Liga se consolidou
como uma organização inócua, que pouco fazia para concretizar seus objetivos.
No entanto, face à ameaça constante da intervenção estrangeira, especialmente
militar, à Liga cabe demonstrar que o papel de liderança confiado a ela pelas nações do
Mundo Árabe não é em vão. Os delegados precisarão ter conhecimento das disposições
sobre as intervenções à luz do Direito Internacional, bem como deverão estar a par das
condições que moldaram o Mundo Árabe e que, muito frequentemente, envolveram a
influência dos interesses das potências estrangeiras, além de demonstrarem bom
entendimento do equilíbrio de forças em que se encontram os países da região e a
situação em que estão inseridos na atualidade. Uma tarefa nada fácil, é verdade, mas
que ajudará os delegados a compreender um pouco mais do que se passa nessa parte do
planeta, aparentemente tão distante de nós.
10
A história da Liga dos Estados Árabes se confunde com a dos próprios países
árabes ao longo do século XX. A compreensão das motivações por trás da organização
passa, portanto, pelo conhecimento de sua história, desde o contexto de sua formação e
seu funcionamento interno até os aspectos mais relevantes de sua atuação nos dias de
hoje. Os tópicos a seguir procuram apresentar, brevemente, algumas dessas questões.
2
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15 ed. rev. e amp. Rio de
Janeiro: Renovar, 2004. vol. I, p. 759.
3
PROTOCOLO de Alexandria: tratado de formação da Liga Árabe. Disponível em:
<http://www.mideastweb.org/alexandria.htm>. Acesso em: 20 dez. 2012.
4
Três outros nomes foram considerados: a Aliança Árabe, a Federação Árabe e simplesmente Liga
Árabe.
11
5
LIGA DOS ESTADOS ÁRABES. Tratado para Defesa Conjunta e Cooperação Econômica.
Disponível em:
<http://www.internationaldemocracywatch.org/attachments/265_Treaty%20of%20Joint%20Defense%20
and%20Economic%20Cooperation%20Between%20the%20States%20of%20the%20Arab%20League.pd
f>. Acesso em: 08 abr. 2013.
6
Hoje, Conselho Econômico e Social.
12
7
SEVENTH Arab League Summit Conference, Resolutiono nPalestine. Paris: Le Monde
Diplomatique, 2006. Disponível em: <http://www.monde-diplomatique.fr/cahier/proche-orient/rabat74-
en>. Acesso em: 11 maio 2013.
8
KOPPEL, Andrea; LABOTT , Elise. Libya offers $2.7 billion Pan Am 103 settlement. Washington:
CNN, 2013. Disponível em:
<http://edition.cnn.com/2002/US/05/28/libya.lockerbie.settlement/index.html>. Acesso em 14 abr. 2013.
9
LIGA Árabe concede assento da Síria aos rebeldes. BBC, 2013. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/ultimas_noticias/2013/03/130307_liga_arabe_siria_jp_rn.shtml>.
Acesso em 14 abr.2013
10
LAKHDAR Brahimi pode deixar o cargo Enviado da ONU e da Liga Árabe para a Síria. Diário da
Rússia, 2013. Disponível em:
<http://www.diariodarussia.com.br/internacional/noticias/2013/04/12/lakhdar-brahimi-pode-deixar-o-
cargo-enviado-da-onu-e-da-liga-arabe-para-a-siria/>. Acesso em: 14 abr. 2013
13
11
CARTA da Liga dos Estados Árabes (em inglês). Disponível em:
<http://www.unhcr.org/refworld/publisher,LAS,,,3ae6b3ab18,0.html/>. Acesso em: 11 mai. 2013.
15
foram propostas, discutidas e acatadas durante suas décadas de existência. Além disso,
faz-se necessária a contextualização sociopolítica de tais resoluções, para que seja
possível ampla compreensão de seus termos e suas medidas.
12
UNIDAS, Organização Das Nações. Carta das Nações Unidas. Disponível em:
<http://www.oas.org/dil/port/1945%20Carta%20das%20Na%C3%A7%C3%B5es%20Unidas.pdf>.
Acesso em: 28 jul. 2013.
13
Artigo primeiro do Tratado de Cooperação Econômico-Defensiva.TREATY of Joint Defense and
Economic Cooperation Between the States of the Arab League, June 17, 1950 Disponívelem:
<http://avalon.law.yale.edu/20th_century/arabjoin.asp>. Acesso em: 13 maio 2013. Página em inglês.
14
Artigo segundo, idem.
15
Artigo sexto do Pacto da Liga Árabe: regulação da interação em caso de desavenças entre países-
membros da Liga.
16
Artigo quinquagésimo primeiro da Carta das Nações Unidas: estabelecimento do acordo de defesa
conjunta em relação a ameaças externas.
17
Artigo oitavo do Tratado de Cooperação Econômico-Defensiva.TREATY of Joint Defense and
Economic Cooperation Between the States of the Arab League, June 17, 1950 Disponívelem:
<http://avalon.law.yale.edu/20th_century/arabjoin.asp>. Acesso em: 13 mai. 2013. Página em inglês.
18
Artigo sexto, idem.
16
Foi criada também uma Comissão Militar Permanente19, da qual fazem parte
representantes dos exércitos nacionais dos Estados-membros, com o objetivo de
conceber e implementar planos para a defesa conjunta.
Uma importante característica do Tratado é que, uma vez ratificado, esse
documento é válido por dez anos, só sendo possível a retirada do país signatário após
passado esse período20.
19
Artigo sexto, idem.
20
Artigo décimo segundo, idem.
21
O doutor Bruce Maddy-Weitzman, da Universidade de TelAviv, cita a cúpula de 2004 na Tunísia, onde
a Liga proclamou seu comprometimento quanto a reformas no âmbito político com o estabelecimento de
práticas democráticas e o encorajamento da participação dos cidadãos na vida política e social. O que foi
visto, entretanto, foi o comprometimento da habilidade e compromisso de tais governos para que fosse
iniciado algum processo de reforma. MADDY-WEITZMAN, Bruce. The Arab League Comes Alive.
Middle East Quarterly, Filadélfia, n. 3, p.71-78, 2012.Trimestral.
22
AL-MIDANI, Mohammed Amin.The Enforcement Mechanisms of the Arab Charter on Human
Rights and the Need for an Arab Court of Human Rights. In: REGIONAL HUMAN RIGHTS
MECHANISMS THE EUROPEAN CONVENTION AND THE ARAB CHARTER, 2008, Bolonha,
Itália. The Enforcement Mechanisms of the Arab Charter on Human Rights and the Need for an Arab
Court of Human Rights. Bolonha, Itália: Johns Hopkins University Sais Bologna Center, 2008. v. 1, p. 1 -
1. Disponível em: <http://www.acihl.org/articles.htm?article_id=22>. Acesso em: 11 maio 2013. Página
em inglês.
17
23
Artigo quadragésimo quarto da Carta Árabe dos Direitos Humanos.ARAB Charter on Human Rights
Disponívelem: <http://www1.umn.edu/humanrts/instree/arabhrcharter.html>. Acesso em: 13 maio 2013.
Página em inglês.
24
„„Movimento político e religioso judaico iniciado no séc. XIX, que visava ao restabelecimento, na
Palestina, de um Estado judaico, e que se tornou vitorioso em maio de 1948, quando foi proclamado o
Estado de Israel‟‟. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua
Portuguesa. In: FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua
Portuguesa. Brasil: Editora Positivo, 2010.
25
Artigo primeiro da Carta Árabe dos Direitos Humanos.ARAB Charter on Human Rights Disponívelem:
<http://www1.umn.edu/humanrts/instree/arabhrcharter.html>. Acesso em: 15 maio 2013. Página em
inglês.
26
Artigo segundo, idem.
27
Artigo terceiro, idem.
28
Artigo segundo, idem.
18
ressalva29 de que esta deve se dar dentro dos princípios estabelecidos pela Charia30, que
traz distinções nas funções sociais dos homens e das mulheres.
Tais direitos são revogáveis em caso de situações de emergência excepcional,
entretanto, alguns são impassíveis de revogação, tais como o direito à vida 31; o da não-
subjeção à tortura32; o da proibição do uso do corpo sem total consentimento (em caso
de experimentos médicos e científicos, ou mesmo tráfico de órgãos)33; o da proibição da
escravidão34; o de um julgamento justo e com garantias, de preferência público35; o da
legalidade da prisão, que deve ser provada36; o do princípio da legalidade (toda pena
provém da lei), junto à aplicação da lei mais favorável ao réu37; o da proibição da prisão
por dívidas38; o do julgamento único por ofensa e o da indenização em caso de
inocência39; o do tratamento humanizado em relação aos presos40; o do reconhecimento
como pessoa diante da lei41; o da proibição do exílio ou da obrigação de moradia em
alguma parte do país42; o do asilo político43; o direito à nacionalidade44; o da liberdade
de pensamento e opinião45.
De grande importância para a nova versão são os artigos que tratam da igualdade
entre homens e mulheres, dos direitos dos idosos e dos direitos da criança46, que devem
ser protegidas pelos Estados47e privadas da pena de morte48.
Atualmente, o Comitê de Direitos Humanos é formado por sete dos países
membros, que recebem relatórios periódicos de todos os Estados da Liga. É notório o
desrespeito por parte da política dos países do grupo à Carta da Liga dos Estados
29
Preâmbulo, idem.
30
Charia: conjunto de leis de fonte religiosa do povo islâmico, sendo a maior fonte de jurisprudência por
eles conhecida.
31
Artigo quinto da Carta Árabe dos Direitos Humanos.ARAB Charter on Human Rights Disponívelem:
<http://www1.umn.edu/humanrts/instree/arabhrcharter.html>. Acesso em: 15 maio 2013. Página em
inglês.
32
Artigo oitavo, idem.
33
Artigo nono, idem.
34
Artigo 10º, idem.
35
Artigo 13º, idem.
36
Artigo 14º, idem.
37
Artigo 15º, idem.
38
Artigo 18º, idem.
39
Artigo 19º, idem.
40
Artigo 20º, idem.
41
Artigo 22º, idem.
42
Artigo 27º, idem.
43
Artigo 28º, idem.
44
Artigo 29º, idem.
45
Artigo 30º, idem.
46
Artigo 38º, idem.
47
Artigo 38º, idem.
48
Artigo 12º, idem.
19
49
Artigo quarto da Carta Árabe dos Direitos Humanos.
50
ÁRABE, Liga. Resolução de 12 de fevereiro de 2012. Disponível em:
<http://fanack.com/fileadmin/user_upload/Documenten/Links/Syria/AL_Res._7446.pdf>. Acesso em: 28
jul. 2013.
51
Artigo quinto, idem.
52
DANIN, Robert M. The Arab League Doubles Down Against Bashar. Disponível em:
<http://blogs.cfr.org/danin/2012/02/13/the-arab-league-doubles-down-against-bashar/>. Acesso em: 27
jul. 2013. Página em inglês.
53
ONU, Relatório da.Arab League draft resolution on Syria in the General Assembly. Disponível em:
<http://un-report.blogspot.com.br/2012/07/arab-league-draft-resolution-on-syria.html>. Acesso em: 28
jul. 2013. Página em inglês.
20
vista os 70 mil mortos que o embate deixou, e tal decisão teve o objetivo de acelerar a
busca por uma solução, se tratando assim de um caso excepcional. A Argélia e o Iraque
apresentaram reservas, enquanto o Líbano não ratificou o documento. Segundo o Iraque,
a Liga representa os Estados árabes, e não suas oposições54.
Como representante da Síria, a Coalizão Nacional obteve o direito de armar seus
militantes, em razão da própria defesa, legitimando a resistência ao governo de Bashar
al-Assad.
54
ARABIYA, Al. ArabLeagueallowsmemberstatestoarmSyrianopposition. Disponível em:
<http://english.alarabiya.net/en/News/2013/03/06/Arab-League-denies-giving-Syrian-National-Coalition-
a-seat.html>. Acesso em: 28 jul. 2013.Página em inglês.
55
ÁRABE, Liga. ArabLeagueIssues Doha Declaration. Disponível em:
<http://arableaguesummit2013.qatarconferences.org/news/news-details-17.html>. Acesso em: 28 jul.
2013. Página em inglês.
56
ARAB LeagueSummit 2013 Disponível em: <http://arableaguesummit2013.qatarconferences.org/>.
Acesso em: 10 maio 2013. Página em inglês.
21
57
CAABA. Disponível em: <http://www.mundoislamico.com/caaba.htm>. Acesso em 8 abr. 2013.
22
na época, era o guardião da Caaba58. Aos oito anos, perdeu seu avô e passou a viver
com seu tio e líder da tribo, Abu Talib. Foi nessa época que aprendeu a arte do
comércio, tendo os primeiros relatos de sua natureza iluminada surgido através de uma
viagem de negócios59.
Na “Noite do Poder”, como depois ficou conhecida pelos muçulmanos, no mês
do Ramadão, durante o ano de 610, Maomé recebeu o chamado de Alá, por intermédio
do Anjo Gabriel. Maomé, então, percebeu que era o escolhido para difundir essa nova
religião. No começo, os habitantes ricos de Meca não se entusiasmaram com esse
acontecimento, muito pelo contrário: Maomé foi perseguido por difundir ideias que iam
contra os interesses econômicos e políticos dos poderosos da cidade.
Em 622, ocorreu a Hégira, a saída de Maomé, sua família e seus seguidores em
direção à cidade de Yathrib. Lá, operou como mediador entre duas tribos locais e,
assim, ganhou sua confiança, conseguindo, a partir daí, unir os grupos políticos em um
único bloco, abraçando o Islã como a sua religião e ele como chefe político e religioso.
Essa comunidade ganhou o nome de Umma, e a cidade, mais tarde, ficou conhecida
como “cidade do Profeta‟‟ – Medina.
O tempo passou, as empreitadas contra a vida do Profeta e as batalhas vieram.
Porém, em uma reviravolta de eventos, Maomé e seus seguidores tomaram Meca. Esse
fato, por si só, conseguiu atrair mais seguidores para o Islã. Contudo, tempos sombrios
pairavam sobre o horizonte da religião. Em 632, o que parecia ser um simples estado
febril acaba por levar Maomé, o Profeta, à morte. A disputa pela sucessão da Umma
gerou a primeira e mais importante divisão no seio do Islã, dando origem às duas
“famílias” desta religião: os Sunitas, fiéis a Abu Bakr, sogro do Profeta; e os Xiitas,
seguidores de Ali Ibn Abu Talib, primo de Maomé60.
Os primeiros, a qual pertencem cerca de 85%61 dos muçulmanos, são reticentes
em relação aos excessos cometidos pelos extremistas de todas as tendências. Acreditam,
também, que a missão de revelar as leis de Alá acabou com Maomé, além de rejeitar a
tradição popular árabe de cultuar túmulos de santos, visto que não é uma prática
islâmica, considerada por eles um desvio perigoso do verdadeiro louvor a Alá.
58
SILVA, Teresa de Almeida e. Islão e fundamentalismo Islâmico: das origens ao século XXI. Lisboa:
Pactor, 2011, p. 9.
59
Idem, p. 10.
60
Idem, p. 14
61
Idem, p. 23
23
Os Xiitas, por outro lado, acreditam que Alá não deixaria de se fazer presente,
iluminando os seus lideres, e que esses teriam sim a legitimidade para interpretar o
Alcorão. Também creem que a interação com os santos é uma parte fundamental do
plano para a salvação dos crentes. Esta segunda família ainda se ramifica entre
Kharijitas, Zayditas e os fieis a ImamJafaral-Sadiq. Este último grupo, então, se divide
entre Imamitas (Duodecimanos) e Ismaelitas (Septimanos), que, por sua vez, também se
ramifica62.
Apesar de todas as diferenças entre essas duas famílias religiosas, seus
seguidores obedecem fielmente aos que são chamados de os Cinco Pilares do Islã: a
profissão de fé (Shehada), a oração (Salat), a esmola legal (Zakat), o jejum (Swam) e a
peregrinação (Hajj). Os ativistas radicais ainda acrescentam mais uma pilar aos
princípios basilares da religião, a Jihad (traduzida por muitos como “guerra santa”)63.
Agora que já descrevemos brevemente esta que é uma das religiões mais
complexas e emblemáticas da atualidade, e a que mais cresce em número de seguidores
no mundo, podemos começar a entender um pouco a respeito de como se deu a
formação dos Estados árabes, desde suas origens coloniais e suas revoltas contra as
capitais, até os levantes que moldaram os países até o final do século XX.
Os países sobre os quais iremos tratar localizam-se entre a Península Árabe
(Arábia Saudita, Iêmen, Omã, Emirados Árabes, Qatar, Bahreim e Kuwait), o Crescente
Fértil (Egito, Israel, Palestina, Jordânia, Líbano, Síria e Iraque), o Magreb (Líbia,
Tunísia, Argélia e Marrocos) e os países do chifre da África que integram a Liga Árabe
(Sudão, Eritreia, Djibuti e Somália).
O Oriente Médio foi o berço das primeiras civilizações, na região do Crescente
Fértil, e representa a área de encontro entre os continentes europeu, africano e asiático.
As terras que antes eram divididas entre várias tribos árabes e suas monarquias foram
conquistadas, no século XV, pelo Império Turco Otomano. Já na segunda metade do
século XIX, com a decadência do império Turco, os olhos das duas grandes potências
da época foram atraídos para lá: Inglaterra e França, que se encontravam em plena
segunda revolução industrial e miravam o petróleo da região.
Eram tempos de guerra, e alianças tinham que ser formadas. Em 1915, a
Inglaterra negociou apoio à independência das províncias árabes dos desertos do
Oriente Médio que se encontravam sob o domínio da Turquia (que era aliada da
62
Idem,p. 35
63
Idem, ps. 47 a 58
24
64
PAYNE, David. 2008. The Sykes-Picot Agreement and the Balfour Declaration.Disponível em:
<http://www.westernfrontassociation.com/great-war-people/politics/political-intrigue/378-sykes-picot-
balfour.html>. Acesso em 8 abr. 2013. Documento em inglês.
65
Para saber mais: <http://pt.goldenmap.com/Declara%C3%A7%C3%A3o_de_Balfour>. Acesso em: 07
de maio de 2013.
66
Para saber mais: <http://www.mideastweb.org/leaguemand.htm>. Acesso em: 07 de maio de 2013.
Documento em inglês.
67
VISENTINI, Paulo Fagundes. A Primavera Árabe: Entre a democracia e a geopolítica do petróleo.
Porto Alegre: Leitura XXI, 2012.
68
Idem.
25
Após a Primeira Guerra Mundial, a perseguição aos judeus, que já vinha desde a
Rússia Czarista, se agravou. Desde a elaboração do ChoweweZion69, ondas migratórias
de judeus se dirigiam à Palestina, ocupando terras compradas pela Agência Judaica70 e
formando comunidades chamadas de Kibbutz (fazendas coletivas militarmente
fortificadas). Não obstante, mantinham, também, organizações armadas e até terroristas
que serviam como forma de defesa contra os palestinos (árabes) e a ainda presente
autoridade britânica. O fluxo de imigrantes, que antes era controlado, ganhou
proporções monstruosas com a Segunda Guerra Mundial e a perseguição aos judeus
pelo regime nazista, o que resultou em um levante palestino (1936-1939). Porém, sem
uma liderança firme, o movimento acabou sendo reprimido. O movimento Sionista
buscava a criação de um Estado Judeu na Palestina, funcionando como combustível
para o sentimento nacionalista dos árabes palestinos.
A Sérvia e o Líbano, além da Transjordânia, já haviam se separado da França e
Inglaterra, respectivamente, até o ano de 1946. Contudo, um fato ocorrido um ano antes
viria a dar um impulso aos países árabes:em março de 1945 foi criada, no Cairo, a Liga
dos Estados Árabes, sendo seus membros fundadores a Arábia Saudita, Egito, Iraque,
Iêmen, Líbano, Síria e Transjordânia.
Em 1947, foi aprovado o Plano de Partilha da Palestina71, em que ficou acordada
a divisão da região e a extinção do mandato britânico. Os judeus aceitaram, embora
receosos, as especificações geográficas do Plano, o que não ocorreu pela parte dos
árabes palestinos. O assassinato de um mediador da ONU e a consequente retirada
britânica da Palestina deixou um vazio no poder que, rapidamente, foi ocupado por
judeus, que declaram a criação do Estado de Israel. Os árabes palestinos, juntamente
com a Liga Árabe, entram em guerra contra os israelenses. No entanto, suas forças
foram rapidamente sobrepujadas pelo exército superior de Israel. Um primeiro cessar
fogo foi negociado e, cerca de um mês depois, foi quebrado, tendo sido instaurado
novamente pouco tempo depois. Entre dezembro de 1948 e janeiro de 1949, Israel
conquistou parte do território que cabia aos palestinos, ficando com 80% da Palestina.
Os árabes palestinos, que dessa vez não contavam com o apoio de nenhum outro grupo,
69
KOENIG, Adolf. Historyofthe J.N.A.V. Hasmonaea in Czernowitz.Traduzido por Jerome Silverbush.
Disponível em: <http://www.jewishgen.org/yizkor/bukowinabook/buk1_113.html>. Acesso em: 14 abr.
2013. Documento em inglês.
70
Para saber mais: <http://www.jafi.org.il/JewishAgency/English/About/History>. Acesso em 7 de maio
de 2013. Documento em inglês
71
THE United Nationspartitionplan.Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/2001/meast_maps/1.shtml>. Acesso em 8 abr. 2013.
Documento em inglês.
26
acabaram fugindo do país para territórios vizinhos. Isso levou a Organização para
Libertação da Palestina (OLP) a ser criada em 196472, que seguiu sob controle egípcio
durante algum tempo.
O Egito se tornou totalmente livre das amarras coloniais em 1952, depoisde um
golpe militar liderado por Amal Abdul Nasser. Nasser foi o fundador de uma corrente
política que seria posteriormente chamada de Nasserismo73. Baseando-se em uma
burocracia civil-militar e fazendo uso da repressão, promoveu a reforma agrária,
investiu na educação e dificultou a vida da elite no país, já que se moldava em aspectos
socialistas. O presidente egípcio apoiou a guerra de independência da Argélia, ainda
colônia francesa, em 1954, criando mais um inimigo. Em 1956, sufocado por suas
promessas ao povo de seu país, Nasser viu na nacionalização do Canal de Suez uma
ótima oportunidade para angariar fundos para suas obras, desafiando os interesses dos
países colonialistas que agora lutavam desesperadamente para manter algum poder na
região. Israel se juntou à França e à Inglaterra, entrando em guerra contra o Egito74.
O que foi uma derrota militar para o país de Nasser (o Egito perdeu o Canal de
Suez e a Península do Sinai) acabou se tornando uma vitória no campo político. Os
soviéticos, aliados dos egípcios, lançaram um ultimato exigindo a retirada das tropas
inimigas dos territórios conquistados, sob ameaça de uma intervenção militar. Os
Estados Unidos da América (EUA) por sua vez, também pressionaram seus aliados a
deixar as áreas em questão. No final, Nasser se consolidou como a maior liderança no
Mundo Árabe, aumentando ainda mais a ideia da unificação dos países árabes. Porém, o
partido Baas aumentava cada vez mais o seu poder de influência.
Sem uma conotação marxista, ao contrário do Nasserismo, o Baas foi criado na
Síria, no começo dos anos 1920, e também pregava a unificação das nações árabes (a
conservação dos Estados existentes, sendo eles parte de uma mesma nação). Ao longo
do tempo, ambos os partidos acabaram virando autoritários e militarizados e, em 1954,
foi aberto o caminho para a participação política do Baas na Síria. Já no ano de 1961,
um golpe, realizado pela corrente esquerdista do Baas, colocou o partido no poder da
Síria. Desenvolvimento econômico e modernização social fizeram com que o partido
72
CARTA DA OLP. Disponível em: <http://www.iris.org.il/plochart.htm>. Acesso em 8 abr. 2013.
Documento em inglês.
73
O Nasserismo, como foi chamado posteriormente, foi a ideologia política nacionalista árabe criada pelo
então presidente do Egito, Gamal Abdel Nasser. Essa linha de pensamento se baseava em um Estado
forte, controlador dos meios de produção, e na redistribuição de renda: o socialismo árabe.
74
VISENTINI, Paulo Fagundes. A Primavera Árabe: Entre a democracia e a geopolítica do petróleo.
Porto Alegre: Leitura XXI, 2012.
27
ganhasse mais adeptos, porém, a ausência de petróleo no país fez com que essas
mudanças fossem gradativas.
No começo no ano de 1958, uma revolta popular, acompanhada de um golpe de
Estado, derrubou a Monarquia Iraquiana, mas não consegue se consolidar, graças à
instabilidade interna e externa do país. Mais uma vez, ainda no mesmo ano, uma
corrente modernizadora do Baas conquistou o poder e se consolidou firmemente, tendo
como líderes Hassan al-Bakr e Saddan Hussein. Eles se concentram na evolução do
país, fundamentados no desenvolvimento industrial e na política de militarização.
Já no ano de 1965, ocorre na Líbia outro golpe militar, liderado pelo Coronel
Muammar Al-Kadafi. Dotado de uma visão progressista do Islã, implantou um
socialismo islâmico, modernizador, voltado para o bem estar social. A Líbia, como
detentora de recursos abundantes proeminentes do petróleo, era vista com maus olhos
pelos EUA, Israel e as petromonarquias75 (que também usavam o Islã, porém braços
conservadores, como forma de justificar seu governo e controlar a população).
No mesmo ano, chegava ao poder no Iêmen do Sul a esquerda Marxista. Outros
países, como Omã e os demais protetorados britânicos do Golfo Pérsico também
lutavam pela implantação de repúblicas democrático-populares de orientação socialista.
Isso obrigou a Inglaterra a contrair alianças com os sultões que ainda reinavam nesses
países, mantendo tropas nessas regiões até o início dos anos 1970 e só então
concedendo, a custo de protestos, e gradativamente, suas independências.
A Guerra dos Seis Dias76 teve como fruto dois desdobramentos de extrema
relevância: o enfraquecimento do governo de Nasser, já que este perdeu a guerra; e a
maior autonomia das organizações palestinas frente aos países árabes. Todavia, o
fortalecimento político, principalmente os de via Marxista, e militar dos palestinos
começava a preocupar o rei Hussein, da Jordânia, que não via com bons olhos o
fortalecimento de um poder paralelo ao seu dentro de seu território (nessa época, a
maior parte dos refugiados palestinos se encontrava lá). Foi o medo de não ser o único
poder no país que o impeliu a deslocar o Exército Real para os campos de refugiados
palestinos dentro do seu território e começar um massacre. As ordens eram de caçar
apenas os fedayins(guerrilheiros palestinos), porém, o resultado foi uma chacina com
75
Termo galgado para indicar monarquias, em sua maioria árabes, cuja maior fonte de renda e poder seja
eminente da exploração petrolífera. Para saber mais VISENTINI, Paulo Fagundes. A Primavera Árabe:
Entre a democracia e a geopolítica do petróleo. Porto Alegre: Leitura XXI, 2012.
76
SHARPE, Victor. 2012. The Six-Day War: Israel’s miraculous
Victory.<http://www.americanthinker.com/2012/06/the_six-day_war_israels_miraculous_victory.html>.
Acesso em 07 de maio de 2013. Documento em inglês.
28
mais de 10 mil mortes e que ficou conhecida como Setembro Negro. A massa de
refugiados foi empurrada para fora do país em direção ao Líbano, adicionando mais um
poder na equação deste país, aumentando ainda mais a desigualdade já existente. Isso
levou o Líbano a uma guerra civil com intervenções da Síria e de Israel.
Em 1973, impulsionados, entre outros motivos, pela situação econômica de seus
países, os governos de Egito e Síria declaram guerra a Israel (guerra do YomKippur77).
À primeira vista, a empreitada organizada por esses dois países surtiu efeito,
conquistando parte dos territórios que foram perdidos anteriormente para Israel durante
a Guerra dos Seis Dias. Entretanto, as forças israelenses, apoiadas pelo governo norte-
americano, conseguiram reverter a situação, expulsando os invasores de suas terras. E
apesar de ter ganhado esse conflito, a batalha trouxe, aos olhos do mundo árabe, a
certeza de que Israel não era invencível. Egito e Síria, portanto, acabaram ganhando no
plano político e psicológico. Dessa forma, em 1974, Israel entrega o controle do Canal
de Suez de volta ao governo egípcio.
Posteriormente, em 1979, foi firmado o Tratado de Paz de Camp David78, que
acordava a devolução do Sinai ao Egito e a liberação do Canal de Suez e do Golfo de
Ákaba à livre navegação. Também por meio desse tratado, Egito e Israel recomeçaram
suas atividades diplomáticas entre si. Se, para o Egito, o acordo teve pontos negativos (a
expulsão do país da Liga Árabe, do Fundo Monetário Árabe e da Organização de Países
Exportadores de Petróleo), para Israel, foi muito mais proveitoso: neutralizou sua
principal ameaça militar e rompeu seu isolamento diplomático.
Ainda em 1979, o Aiatolá Khomeini chegava ao poder no Irã, fruto de uma onda
de revoltas contra o Xá Reza Pahlevi, aliado norte americano. As revoltas que haviam
começado no ano anterior eram resultado de vinte e cinco anos de ditadura do Xá, de
uma imensa desigualdade social e de uma crescente fermentação do sentimento islâmico
nacionalista contra a cultura ocidental. O fundamentalismo islâmico Xiita chega ao
poder, revivendo práticas obscuras.
No Afeganistão, em 1973, mais um golpe de Estado ocorreu, desta vez colocando
o príncipe Daud no poder, proclamando, assim, a República nesse país. Vale lembrar
que o país sempre mostrou ótimas relações com a URSS, sendo, inclusive, o primeiro
Estado a reconhecê-la, em 1919. Entretanto, frente a problemas econômicos, em 1978,
77
MISHAL, Nissim. 1998. Those Were the Years: Israel's Jubilee. Disponível em:
<http://www.torahweb.net/h4-yom-kipur-guerra >. Acesso em 8 abr. 2013
78
Para saber mais: <http://www.jimmycarterlibrary.gov/documents/campdavid/accords.phtml>. Acessado
em 07 de maio de 2013. Documento em inglês.
29
ocorre outro golpe, tendo como protagonistas os partidos da burguesia local, Khalq, e o
Partido Democrático do Povo Afegão (PDPA), tendo a liderança de Tanik. Porém, a
luta dentro do partido continuou e as disputas com o clero e a burguesia local também.
Isso fez com que Hafizullah Amin, também do Khalq, assassinasse Tanik e tomasse seu
lugar. Esse golpe, entretanto, foi de encontro aos interesses soviéticos. A URSS decidiu
intervir militarmente e apoiar um golpe para derrubar Amin, o que aconteceria em 29 de
setembro de 1979, deixando o Afeganistão no controle de Babrak Karmal.
Em 1980, o Iêmen do Sul, que se tornou independente em 1967, estreitava as
relações políticas com o bloco soviético, a mando de Ali Nasser Mohammed. Após
parcerias geológicas e, posteriormente, econômicas (descoberta, divisão e exploração de
petróleo da região), o Iêmen do Norte e do Sul se fundem em 1990, cumprindo um
acordo que fora firmado em 1973. Entretanto, um descontentamento com relação ao
número de representantes do que antes era o Iêmen do Sul gera um levante popular de
cunho separatista, que veio a ser brutalmente abafado pelas forças que antes
representavam o Iêmen do Norte.
Duas Guerras do Golfo, crises no petróleo, a internacionalização dos movimentos
separatistas (ataques terroristas) entre outros acontecimentos vieram nos anos que se
seguiram e seus efeitos ecoam até os dias de hoje.
Como podemos perceber, a formação e a consolidação dos Estados árabes se
deram na interseção de várias forças, muitas vezes com resultados drásticos: a
influência das potências europeias do século XIX, Inglaterra e França, explorando suas
colônias para obter delas o máximo de retorno econômico possível; a perseguição e
migração judaica para Israel e a consequente onda de refugiados palestinos; as
petromonarquias e as revoltas sociais; a briga pelo controle do petróleo e o jogo de
poderes do mundo divido na Guerra Fria. Todos esses fatores e outros foram decisivos
na construção desses Estados, cada um sendo uma variável nessa equação.
79
ROCHE, Alexandre. O Oriente Médio pós-Guerra Fria: a geopolítica e o processo de paz Israel-OLP.
Ciências & Letras, Porto Alegre, n. 51, p. 19, jan./jun. 2012.
80
Autor do livro “Petróleo e Poder – O Envolvimento Militar dos Estados Unidos no Golfo Pérsico”,
Editora Unesp, 2008
81
Juntamente com Irã, Iraque, Venezuela, Qatar, Líbia, Argélia, Nigéria, Equador, e Angola. O Gabão
encerrou a sua participação em 1995, e a Indonésia está suspensa desde janeiro de 2009. Disponível em:
<http://www.opec.org/opec_web/en/about_us/25.htm>. Acesso em: 11 mai. 2013.
82
FUSER, Igor. A região ampliada do Oriente Médio guarda mais de 2/3 do petróleo do mundo. São
Paulo: 20 abr. 2011. Disponível em: <http://www.icarabe.org/entrevistas/a-regiao-ampliada-do-oriente-
medio-guarda-mais-de-23-das>. Acesso em: 10 abr. 2013. Entrevista concedida a Ana Maria Strauber.
31
83
Idem.
84
HALLIDAY, F. The Middle East in International Relations: Power, Politics and Ideology. Cambridge:
Cambridge University Press, 2005. Resenha de: MAMEDE, A. P. R. A. O Oriente Médio nas Relações
Internacionais. Conjuntura Internacional, p. 2, 2010. Disponível em:
<http://www.pucminas.br/imagedb/conjuntura/CNO_ARQ_NOTIC20100504163228.pdf>. Acesso em: 9
maio 2013.
32
Desde logo, alertamos que não será possível analisar as ingerências militares
estrangeiras nos países árabes sem levar em consideração o aparato jurídico
internacional que as legitima ou que as condena. As resoluções produzidas pela Liga
Árabe, assim como aquelas produzidas por outras organizações regionais, estão
inseridas dentro do sistema normativo internacional e, por isso, não podem ir de
encontro às suas normas basilares, estando sua autonomia vinculada ao jus cogens85 e à
Carta da ONU.
Qualquer decisão que seja tomada no âmbito da Reunião de Cúpula deverá levar
em conta o artigo 10386 da Carta das Nações Unidas, que destaca a supremacia desta
sobre todos os acordos internacionais. Esta noção de norma impositiva, relativizando o
princípio da soberania dos Estados, anteriormente pétreo para o Direito Internacional,
surge a partir de um determinado contexto histórico, em que a necessidade de proteção
dos direitos humanos tornou-se evidente.
85
Jus cogenssão um conjunto de regras imperativas e inderrogáveis às quais todos os tratados
internacionais (lato sensu) estão submetidos, como definem o artigo 53 e 64 da Convenção de Viena
sobre o Direito dos Tratados de 1969.
86
“No caso de conflito entre as obrigações de Membros das Nações Unidas, em virtude da presente Carta
e as obrigações resultantes de qualquer outro acordo internacional, prevalecerão as obrigações assumidas
em virtude da presente carta”(artigo 103º da Carta das Nações Unidas)
87
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 6. ed. São Paulo: Revista
Dos Tribunais, 2012. p. 833
33
artigo 2o, parágrafos 3o e 4o da Carta da ONU88, o uso da força deixa de ser um direito
do Estado de impor sua vontade sobre os demais, passando a ser um ilícito
internacional89. No entanto, é importante ressaltar que o jus ad bellum, direito de
promover a guerra, continuou válido em casos de legítima defesa de direitos
fundamentada por uma agressão injusta90 ou por um perigo de dano atual e iminente91.
Dessa forma, percebe-se que há uma limitação do uso da força militar, princípio
evidente no direito internacional pós-1945. No entanto, vigora uma exceção a esse
princípio no que concerne à atuação de organizações internacionais na coibição de
excessos estatais que culminem em ameaça ou em violação da segurança das relações
internacionais92, como será mais bem explicado adiante.
Essa limitação, além de evitar novas guerras, também buscou preservar a
soberania e a igualdade entre os Estados. Esta se expressa no parágrafo 1 o do artigo 2o
da Carta da ONU, que dispõe “A Organização é baseada no princípio da igualdade de
todos os seus membros”, enquanto a soberania ficou protegida pelo parágrafo 7 o do
mesmo princípio, que expressa:
94
Os Tratados de Westfália, firmados em 1648, pondo fim à Guerra dos Trinta Anos, representam um
marco do Direito internacional moderno uma vez que neles foi reconhecido, pela primeira vez, o princípio
da igualdade entre os Estados, formando-se assim uma sociedade internacional regulada por determinadas
regras derivadas de tal princípio.
95
RÉGIS, André. Intervenções Humanitárias, soberania e a emergência da Responsabilidade de Proteger
no Direito Internacional Humanitário. Prim@ Facie, João Pessoa, n., p.5-17, jul. 2009. p. 8-9
96
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. p. 493
97
ALMEIDA, João Marques de. International Political Theory and the Issue of Legitimate
Intervention. Nação e Defesa, Lisboa, n. 102, p.155-170, jul. 2002. P. 158
98
Artigo 2o parágrafo 7o
35
99
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 6. ed. São Paulo: Revista
Dos Tribunais, 2012. p. 1072
100
Idem p. 1075
101
Ver nota de rodapé número 12.
102
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. p. 648
36
cabíveis, de acordo com os artigos 41º e 42º do mesmo instrumento. Estes artigos
relacionam-se, respectivamente, às medidas coercitivas não militares e militares, estas
só podendo ser levadas a cabo quando aquelas mostrarem-se insuficientes, como bem
ressalva o artigo 42o:
Sendo assim, percebe-se que o Capítulo VII oferece duas vias de ação para o
Conselho de Segurança. Como bem ressalta Antônio Patriota104, as possibilidades
apresentadas pelos dispositivos 41 e 42 expressam dois caminhos distintos para o
restabelecimento da paz: o isolamento e a intervenção. O isolamento pode ser
diplomático, de armas ou até comercial; já a intervenção dá-se pela utilização de forças
armadas chefiadas pelas Nações Unidas.105 Cabe ressaltar que ambas as medidas
poderão ser tomadas sem o consentimento do Estado afetado, por força do artigo 25o da
Carta da ONU, que obriga os membros da Organização a aceitar as decisões do
Conselho de Segurança.
No entanto, principalmente após a Guerra Fria, começou-se a defender outra
forma de relativização da soberania. A chamada intervenção humanitária foi defendida,
em 1999, pelo então Secretário-Geral das Nações Unidas, Kofi Annan, como um
imperativo na defesa dos Direitos Humanos que se sobrepunha à soberania dos
Estados106.
Para o então Secretário-Geral, seguindo a linha de raciocínio de outros analistas,
a manutenção da paz e segurança mundial perpassam pela capacidade dos Estados em
prover proteção aos seus cidadãos. Em caso de violação de direitos humanos, guerra
civil, fome ou genocídio,segundo essa nova corrente que se consolidou por meio do
103
Artigo 42 da Carta da ONU.
104
Disponível em:
<http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/2625(XXV)&Lang=E&Area=RESOLUTIO
N > Acesso em: 9 de Abr. 2013
105
PATRIOTA,Antônio de Aguiar. O Conselho de Segurança após a Guerra do Golfo: a articulação
de um novo paradigma de segurança coletiva. Brasília: Instituto Rio Branco; Fundação Alexandre de
Gusmão; Centro de Estudos Estratégicos, 1998.
106
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. p. 496
37
107
RÉGIS, André. Intervenções Humanitárias, soberania e a emergência da Responsabilidade de
Proteger no Direito Internacional Humanitário. Prim@ Facie, João Pessoa, n., p.5-17, jul. 2009. p. 10
108
Disponível em:
<http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/2131(XX)&Lang=E&Area=RESOLUTION
> Acesso em: 9 abr. 2013.
109
Disponível em:
<http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/2625(XXV)&Lang=E&Area=RESOLUTIO
N > Acesso em: 9 abr. 2013.
110
Disponível em:
<http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/2625(XXV)&Lang=E&Area=RESOLUTIO
N > Acesso em: 9 abr. 2013
111
Disponível em:
<http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/36/103&Lang=E&Area=RESOLUTION >
Acesso em: 9 abr. 2013
38
112
Em março de 1975, na sequência de discussões em uma reunião da OPEP, o Irã e o Iraque
concordaram em se reunir e negociar a disputa sobre as fronteiras e direitos de navegação. Este encontro
resultou no acordo de Argel entre os dois países, o qual se baseou nos princípios de integridade territorial,
inviolabilidade das fronteiras e não-interferência nos assuntos internos. Disponível em:
<http://www.mideastweb.org/algiersaccord.htm>. Acesso em: 9 mai. 2013. Documento em inglês.
113
ENCICLOPAEDIA Iranica. Indiana: EnciclopaediaIranica Foundation, 2012. 13 v. Disponível em:
<http://www.iranicaonline.org/articles/iraq-vii-iran-iraq-war>. Acessoem: 9 mai. 2013.
114
SHALOM, Stephen R. The United States and Iran-Iraq War 1980-1988. Disponível em:
<http://www.iranchamber.com/history/articles/united_states_iran_iraq_war1.php>. Acesso em: 11 abr.
2013. Documento em inglês.
115
CONSELHO DE SEGURANÇA DAS NAÇÕES UNIDAS. Resolução 598, de 20 de julho de 1987.
Disponível em: <http://daccess-dds-
ny.un.org/doc/RESOLUTION/GEN/NR0/524/70/IMG/NR052470.pdf?OpenElement>. Acesso em: 9
mai. 2013. Documento em inglês.
116
PBS NEWSHOUR. Timeline: A ModernHistoryof Iran, 2010. Disponível em:
<http://www.pbs.org/newshour/updates/middle_east/jan-june10/timeline.html>. Acesso em: 9 mai. 2013.
Documento em inglês.
117
BBC BRASIL. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1314_saddamsiraq2/page5.shtml>. Acesso em: 9 mai. 2013.
39
tendo em vista que o xá Reza Pahlevi, cuja política se posicionava a favor do Ocidente,
foi substituído pelo regime Xiita radical do aiatolá Khomeini, que, não se contentando
apenas com o domínio no país, quis espalhar sua ideologia por todo o Oriente Médio,
incluindo, portanto, o Iraque, onde a elite sunita sofria dificuldades em conter a maioria
Xiita. Esse fato culminou na oposição do regime de Saddam Hussein entre os xiitas
iraquianos e, consequentemente, na inimizade entre tais governos118.
A partir de 1984, momento em que esses passaram a atacar tanques de petróleo
no Golfo Pérsico com o fito de sabotar as exportações um do outro, os EUA e vários
países da Europa Ocidental, como a França e a Grã-Bretanha, tornaram-se mais
envolvidos na guerra, preocupados com a possibilidade de que o Irã derrotasse o Iraque
e ameaçasse toda essa região rica em petróleo. Como o Iraque era um importante
fornecedor de petróleo para o Ocidente e repressor do fundamentalismo islâmico xiita,
os EUA forneceu-lhe armamento pesado e acesso a tecnologias, além de destruir várias
plataformas de petróleo iranianas e – de forma acidental, segundo Washington – um
Airbus iraniano, onde estavam a bordo 290 civis119.
A União Soviética, por sua vez, passou a fornecer armamentos ao Iraque a partir
de 1982, quando Khomeini declarou a ilicitude do partido comunista iraniano, o Tudeh,
executando muitos de seus líderes120. Além disso, algumas nações árabes consideravam
o Irã uma ameaça para a sua segurança. Por esta razão, a Arábia Saudita e o Kuwait
forneceram bilhões de dólares em empréstimos e doações para os iraquianos, e o Egito e
a Jordânia forneceram-lhes algumas armas e suprimentos. A Síria e a Líbia, no entanto,
juntamente com Coreia do Norte e China, apoiaram os iranianos121.
118
BBC BRASIL. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1314_saddamsiraq2/>.
Acesso em: 9 mai. 2013.
119
BBC BRASIL. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1314_saddamsiraq2/page4.shtml>. Acesso em: 9 mai. 2013.
120
TRAUMANN, Andrew Patrick. No meio do fogo cruzado: a participação do Brasil no Conflito Irã-
Iraque. Revista Litteris, n. 7, mar. 2011. Disponível em:
<http://revistaliter.dominiotemporario.com/doc/Artigo-_Guerra_Ira-Iraque_Patrick.pdf>. Acesso em: 9
mai. 2013.
121
JEWISH VIRTUAL LIBRARY. Disponível em:
<http://www.jewishvirtuallibrary.org/jsource/arabs/iraniraq.html>. Acesso em: 9 mai. 2013.
40
britânicos, e que ele não deveria ser um Estado independente”122. Nessa época, o Iraque
possuía grandes dívidas decorrentes da guerra de oito anos com o Irã, e acusou o Kuwait
de prejudicá-lo no comércio de petróleo, vendendo o produto por um preço abaixo da
média de mercado, além de explorar mais do que tinha direito em um campo de
extração dividido pelos dois países123.
Logo, quando o Kuwait se recusou a perdoar suas dívidas de guerra, o Iraque o
invadiu, ao mesmo tempo em que a União Soviética passava por um processo de
esfacelamento. No entanto, o Conselho de Segurança da ONU não aprovou essa
agressão iraquiana, impondo sanções econômicas e aprovando diversas resoluções
condenando o Iraque. A Resolução 678 de 29 de novembro de 1990 , por exemplo,
autorizou os Estados-membros a utilizarem “todos os meios necessários” para restaurar
a paz e a segurança na região, se o Iraque não se retirasse do Kuwait até 15 de janeiro de
1991, com a ressalva de que o Conselho deveria ser informado em relação às decisões
tomadas. Foi adotada por doze votos favoráveis, dois contrários (Cuba e Iêmen) e uma
abstenção (China).
Dois dias após o prazo estabelecido, um ataque aéreo às 2 da madrugada iniciou
a guerra. Nesse ínterim, uma coalizão de 32 países – dentre eles, Inglaterra, França, e
países árabes, como Egito, Síria, Paquistão, Bangladesh e Marrocos – foi formada e
milhares de soldados foram enviados para o Golfo Pérsico, surgindo a operação
denominada de “Tempestade no Deserto”124, liderada pelos americanos. Há de se
afirmar que os EUA deslocaram para essa região o maior efetivo militar desde a Guerra
do Vietnã, pois até o final de 1990, já havia mais de 400 mil soldados próximos às
fronteiras iraquianas125. Em 24 de fevereiro de 1991, as tropas aliadas lançaram uma
ofensiva aérea, terrestre e marítima, que derrotou o Exército iraquiano em 100 horas126,
ocasionando a rendição de Saddam Hussein, que mesmo assim, se manteve no poder.
122
FAY, Claudia Musa. A questão do petróleo e suas implicações na Guerra do Iraque. Indic. Econ.
FEE, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 69, jun. 2003. Disponível em:
<http://revistas.fee.tche.br/index.php/indicadores/article/download/193/242>. Acesso em: 9 mai. 2013.
123
BBC BRASIL. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1813_saddamsiraq/index.shtml>. Acesso em: 9 mai. 2013.
124
FAY, Claudia Musa. A questão do petróleo e suas implicações na Guerra do Iraque.Indic. Econ.
FEE, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 69, jun. 2003. Disponível em:
<http://revistas.fee.tche.br/index.php/indicadores/article/download/193/242>. Acesso em: 9 mai. 2013.
125
FERABOLLI, Silvia. A (des) Construção da Grande Nação árabe: condicionantes sistêmicos,
regionais e estatais para a ausência da integração política no Mundo Árabe. p. 154. Disponível em:
<http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/7126/000539529.pdf?sequence=1>. Acesso em: 9
mai. 2013.
126
BBC BRASIL. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1314_saddamsiraq2/page5.shtml>. Acesso em: 9 mai. 2013.
41
127
FERABOLLI, Silvia. A (des) Construção da Grande Nação árabe: condicionantes sistêmicos,
regionais e estatais para a ausência da integração política no Mundo Árabe. p. 155. Disponível em:
<http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/7126/000539529.pdf?sequence=1>. Acesso em: 9
mai. 2013.
128
BBC. Who are Taliban?, 2012. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-south-asia-
11451718>. Acesso em 10 de abr. de 2013. Documento em inglês.
129
A Aliança do Norte é formada por grupos rebeldes com características étnicas e religiosas diferentes,
unidos apenas pelo desejo depor o Talibã, milícia que controla 90% do Afeganistão. Disponível em:
<http://www.cefetsp.br/edu/eso/terrorismousa/conhecaaliancanorte.html>. Acessoem 11 de abr. de 2013.
130
AFGHANISTAN: Civil War, the Taliban, and American Intervention. Disponível em:
<http://berkleycenter.georgetown.edu/essays/afghanistan-civil-war-the-taliban-and-american-
intervention>. Acesso em: 11 abr. 2013. Documento em inglês.
131
MCMAHON, Robert. U.S. War in Afghanistan. Disponível em: <http://www.cfr.org/afghanistan/us-
war-afghanistan/p20018>. Acesso em: 11 abr. 2013. Documento em inglês.
42
132
Idem.
133
Idem.
134
Idem.
135
PINHEIRO, Leandro Guerreiro C. Guerra do Iraque: análise de sua legalidade frente ao direito
internacional contemporâneo. Jus Navigandi: Teresina, ano 14, n. 2178, 18 jun. 2009. Disponível
em: <http://jus.com.br/revista/texto/13002>. Acesso em: 10 abr. 2013.
43
algo que nunca foi comprovado. Mas será que a garantia da segurança mundial seria,
realmente, a única motivação do governo americano?
Não podemos esquecer que antes da invasão, em 2003, a indústria nacional de
petróleo do Iraque era totalmente nacionalizada e fechada para as empresas petrolíferas
ocidentais. Uma década mais tarde, ela encontra-se largamente privatizada e totalmente
dominada por empresas estrangeiras, como a ExxonMobil, Chevron, BP e Shell,
grandes empresas de petróleo do Ocidente136.
Além do exército iraquiano ter se mostrado extremamente despreparado, o Reino
Unido, a Austrália e a Polônia auxiliaram militarmente a intervenção, fazendo com que
o conflito durasse apenas algumas semanas. Assim, o controle de tomada da cidade-
natal de Saddam Hussein, Tikrit, no dia 14 de abril de 2003, marcou efetivamente o
término do conflito militar principal. O ex-presidente Bush, por sua vez, anunciou o fim
das "principais operações militares" no dia 1º de maio de 2003137.
Apesar da inexistência de uma disposição expressa do Conselho autorizando a
intervenção no Iraque, os países invasores buscaram legalizar a guerra com base na
Resolução 1441, de 8 de novembro de 2002138. Esta, segundo esse ponto de vista, teria
reavivado todo o conteúdo disposto nas antigas resoluções da ONU que abordavam o
aludido caso da invasão do Iraque no território do Kuwait, em 1990. Será mesmo? Ou a
intenção da criação dessa resolução foi a de conceder uma última oportunidade para que
esse país respeitasse o disposto nas antigas resoluções do Conselho de Segurança?
Tendo em vista essa hipótese, cumpre destacar o trecho contido no seu primeiro
parágrafo, onde o Conselho "decide que o Iraque tem estado e permanece em violação
substancial das obrigações contidas nas resoluções, incluindo a Resolução 687139”, a
qual impôs os requisitos ao Iraque para o cessar fogo.
Dessa forma, instaurou-se uma verdadeira batalha diplomática: em defesa da
intervenção, o então presidente George W. Bush afirmava que quem não estivesse ao
lado dos Estados Unidos, estaria a favor dos terroristas, exercendo uma grande pressão
136
CNN.Why the war in Iraq was fought for Big Oil, 2013. Disponível em:
<http://edition.cnn.com/2013/03/19/opinion/iraq-war-oil-juhasz>. Acesso em 10 mai. 2013.
137
Idem.
138
CONSELHO DE SEGURANÇA DAS NAÇÕES UNIDAS. Resolução 1441, de 8 de novembro de
2002. Disponível em: <http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=S/RES/1441(2002)>. Acesso
em 10 mai. 2013.
139
CONSELHO DE SEGURANÇA DAS NAÇÕES UNIDAS. Resolução 687, de 29 de novembro de
1990. Disponível em:<http://daccess-dds-
ny.un.org/doc/RESOLUTION/GEN/NR0/596/23/IMG/NR059623.pdf?OpenElement>. Acesso em 27 jun.
2013.
44
contra os demais países para conseguir apoio e lançar um ataque militar ao Iraque; por
outro lado, países liderados por França e Alemanha, lutavam por uma saída diplomática.
Mesmo com muitos esforços da comunidade internacional, apoiados ainda por inúmeras
manifestações em todo o mundo contra a guerra, inclusive no próprio Estados Unidos, a
ONU decidiu abandonar os serviços humanitários e assistenciais a população do Iraque,
ocorrendo posteriormente a intervenção140.
Em 18 de dezembro de 2011, os EUA confirmaram a saída da última tropa do
país em terras iraquianas141.Comandantes militares dos americanos argumentam que o
conflito, cujo custo monetário excedeu a US$ 3 trilhões, trouxe mudanças importantes,
pois os iraquianos estão vivendo melhor sem Saddam Hussein, por meio de uma nova
democracia. Contudo, cerca de 4.500 soldados americanos foram mortos e mais de 32
mil ficaram feridos, sem contar com a quantidade surpreendente de mortes de civis
iraquianos, que vão de 100.000 a 600.000142.
9. PRIMAVERA ÁRABE
140
ARAÚJO, Bruno Manoel Viana de. Antecedentes da Guerra contra o Iraque baseados
em documentos internos das Nações Unidas. Disponível em
<http://www.datavenia.net/artigos/Antecedentesdaguerracontrairaque.htm>. Acessoem 27 jun. 2006.
141
REUTERS. Last U.S. troops leave Iraq, ending war, 2011. Disponível em:
<http://www.reuters.com/article/2011/12/18/us-iraq-withdrawal-idUSTRE7BH03320111218>. Acessoem
10 mai. 2013.
142
NBC NEWS.Ten years after Iraq invasion, US troops ask: 'Was it worth it?, 2013. 'Disponível em:
<http://worldnews.nbcnews.com/_news/2013/03/18/17326297-ten-years-after-iraq-invasion-us-troops-
ask-was-it-worth-it?lite>. Acesso em 10 mai. 2013.
45
associadas a fatores externos. Todavia, apesar das bases comuns, cada país
revolucionário possui suas próprias peculiaridades, que serão analisadas posteriormente.
No âmbito político, tem-se, durante o século XX, o surgimento de uma
identidade entre os povos da região formada após a queda e o desmembramento do
Império Turco-Otomano, o nacionalismo árabe, devido à semelhança linguística e
cultural, que leva à independência vários países, como Arábia Saudita, Iraque, Síria,
Líbano, Egito, Transjordânia, Iêmen, entre outros, antes dominados pela colonização
neoimperialista dos países europeus. Ao poder ascenderam, então, governos ligados às
elites árabes, em sua maioria, autoritários143. Alguns deles eram, inclusive, aliados de
potências ocidentais, como os Estados Unidos e a Inglaterra, a exemplo das
petromonarquias como a Arábia Saudita, Bahrein, Qatar e Omã. Portanto, apesar de
certos regimes se declararem antiocidentais, a intervenção do Ocidente sempre esteve
presente na região, antes, durante e após a descolonização, devido à sua posição
estratégica e à presença do petróleo144.
Nas petromonarquias, não havia distinção entre o patrimônio público e privado.
Os líderes destes países não realizavam mudanças sociais, rejeitando qualquer noção de
democracia e gastando o dinheiro em cassinos europeus, enquanto a maioria da
população era mantida na ignorância e na pobreza. Também outros países da região
sofriam com a corrupção, como o Egito, onde, segundo divulgação da mídia britânica, o
ditador Hosni Mubarak acumulou mais de 70 bilhões de dólares em bancos europeus145.
Com a conivência das transnacionais, os lucros obtidos com o comércio de petróleo
eram destinados às contas dos chefes de Estado e não aos cofres públicos, não sendo,
dessa forma, investidos em melhorias para a sociedade146, o que propiciava uma
alarmante concentração de renda e aumentava as desigualdades sociais.
A esse fato, juntava-se o apoio oriundo do campo externo, que se destinava a
garantir uma maior estabilidade e legitimidade ao governo dos países desta região.
143
Para uma maior abrangência sobre a parte histórica, consultar VISENTINI, Paulo Fagundes. A
Primavera Árabe: Entre a democracia e a geopolítica do petróleo. Porto Alegre: Leitura XXI, 2012.
144
HABIB, Mohamed. Primavera Árabe de 2012: mais tempestades do que flores. Carta Maior, São
Paulo, 13 jan. 2012. Disponível em:
<http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19373>. Acesso em: 03 abr.
2013.
145
HABIB, Mohamed. Primavera Árabe de 2012: mais tempestades do que flores. Carta Maior, São
Paulo, 13 jan. 2012. Disponível em:
<http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19373>. Acesso em: 03 abr.
2013.
146
AITA, Samir. Por mais Estado, e menos poder. Le Monde Diplomatique, São Paulo, n., p.1-1, 01 abr.
2011. Disponível em: <http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=922>. Acessoem: 03 abr. 2013.
46
Assim, durante o período da Guerra Fria, Estados Unidos e URSS dividiam-se no apoio
aChefes de Estado autoritários, os quais os ajudariam a atingir seus objetivos na área,
por meio do fornecimento de armamentos e dinheiro, em suma, proteção militar e
econômica no cenário internacional, assim como ajuda no combate a conflitos internos.
Tendo isso em vista, os regimes tinham liberdade para proibir o pluripartidarismo,
restringindo as liberdades políticas da população e também de expressão, expandindo a
opressão social e destruindo qualquer oposição à administração existente. Países como a
Arábia Saudita, por exemplo, contavam com o apoio dos capitalistas americanos,
enquanto outros, como Síria e Algéria, respaldavam-se no apoio da URSS147148.
Com o fim da bipolaridade mundial, a ideia da democracia liberal, que consiste
no governo pautado pela ampla liberdade política dos cidadãos - abrangendo desde a
necessidade do sufrágio universal e a garantia dos direitos fundamentais à intervenção
da sociedade na vida política149 -, expande-se ao redor do mundo e a ideia de ditaduras
autoritárias no Mundo Árabe não se torna interessante para os países que antes eram
seus sustentáculos.
No entanto, a fim de reafirmar sua legitimidade, tanto na sociedade quanto no
tocante às relações com os outros países, os governantes promoveram democratizações
parciais em seus territórios, que foram denominadas por Daniel Brumberg como
“autocracias liberalizadas”150. Assim, passaram a ser permitidas instituições que
discutam a sociedade civil, bem como mais de um partido político, apesar dessas
liberdades serem controladas pelo governo. No Egito, durante o governo de Mubarak,
por exemplo, permitia-se um relativo pluralismo político e liberdade dos meios de
comunicação, ainda que com constante ameaça de repressão, enquanto na Argélia houve
um aumento da liberdade de expressão. Já em países como Jordânia e Marrocos,
utilizava-se a religião como forma de legitimação do regime151.
Para os países ocidentais, essa “fachada democrática” já era o suficiente para que
eles não rompessem as relações com os árabes alegando a falta de garantias individuais
e fundamentais à sua população, uma vez que o vínculo era necessário, em razão da
importância militar e comercial da região. E, internamente, essa abertura, apesar de
147
ARDIC, Nurullah. 2012. Understanding the Arab Spring: Justice, Dignity, Religion and
International Politics. Afro EurasianStudies1(1):8–52.
148
JOFFE, George. A Primavera Árabe no Norte de África: origens e perspectivas de futuro. Relações
Internacionais [online]. 2011, n.30, pp. 85-116.
149
Ibidem, p. 87
150
Apud JOFFE, George. A Primavera Árabe no Norte de África: origens e perspectivas de futuro.
Relações Internacionais [online]. 2011, n.30, p.87.
151
Ibidem, p.94
47
152
Ibidem, pp. 85-116.
153
Ibidem, pp. 85-116
154
AWADALLAH, Bassem, and ADEEL, Malik, 2011, The Economics of the Arab Spring, Center for
the Study of African Economies (CSAE) Working Paper WPS/2011 23 (Oxford, UK: CSAE), p.5.
155
ARDIC, Nurullah. 2012. Understanding the Arab Spring: Justice, Dignity, Religion and
International Politics. Afro Eurasian Studies 1(1):8–52, p.10.
48
com menos de 30 anos. Devido a esse fato, a força de trabalho aumenta, por ano, três
vezes mais do que nos outros países em desenvolvimento156. Esta situação torna-se
preocupante, porque reflete diretamente nos índices de desemprego. Expressando-a em
números, na Tunísia, onde 25% da população tem menos de 25 anos, há cerca de três
milhões de desempregados e, destes, 75% ainda não ultrapassaram os 30 anos157. As
taxas de desemprego verificam-se também maiores entre aqueles com mais estudo e a
média das mulheres desempregadas é três vezes maior que a de homens158.
Além disso, diversos postos de trabalho, principalmente no setor privado, eram
destinados a imigrantes estrangeiros, excluindo os nacionais e deixando para o setor
público a responsabilidade de suprir a demanda empregatícia. Os poucos nacionais
empregados no setor privado não assinam contratos de trabalho e, por isso, não possuem
direitos trabalhistas básicos, como a aposentadoria ou direitos sindicais159. Vale
ressaltar, ainda, que a maioria dos empregos era cedida com base em favoritismos160,
como, por exemplo, o nepotismo e também a cessão de cargos a amigos ou conhecidos.
Há, ainda, uma parte da população economicamente ativa que, por não conseguir
empregos regulares, acaba partindo para o setor informal, onde também não goza de
direitos trabalhistas. Essa estrutura dificultava a mobilidade social,trazendo indignação
à população161.
Por último, mas não menos importante, deve também ser exposta a faceta cultural
da situação. A religião é de uma importância essencial entre os árabes, pois a partir dela
estabelecem-se as relações jurídicas, políticas e sociais. O Islã, por ser a mais adotada, é
considerada a religião oficial no mundo árabe e se divide em duas vertentes, a dos
Sunitas e a dos Xiitas. Mais de 80% dos islamistas adotam o sunismo162, o qual, por sua
vez, subdivide-se em quatro grupos diferentes em relação à abordagem dos fundamentos
do Alcorão, sendo alguns de visão mais radical e outros mais moderados.
156
AWADALLAH, Bassem, and ADEEL, Malik, 2011, The Economics of the Arab Spring, Center for
the Study of African Economies: Working Paper WPS/2011. Oxford, UK: CSAE, 2011, p.2
157
Especial TV Cultura: Primavera Árabe. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=KOm-
2JhmbnI&feature=player_embedded>. Acessoem 14 abr. 2013.
158
ARDIC, Nurullah. 2012. Understanding the Arab Spring: Justice, Dignity, Religion and
International Politics. Afro EurasianStudies1(1):8–52, p.41.
159
AITA, Samir. Por mais Estado, e menos poder. Le Monde Diplomatique, São Paulo, n., p.1-1, 01 abr.
2011. Disponível em: <http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=922>. Acesso em: 03 abr. 2013.
160
161
AITA, Samir. Por mais Estado, e menos poder. Le Monde Diplomatique, São Paulo, n., p.1-1, 01 abr.
2011. Disponível em: <http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=922>. Acesso em: 03 abr. 2013.
162
VISENTINI, Paulo Fagundes; PEREIRA, AnalúciaDanilevicz (Org.). Tensões da Primavera do mundo
arábe-sunita: entre o wahhabismo conservador e o espírito crítico, entre a política do petróleo e a
independência econômica. Ciências&letras: Revista da Faculdade Porto-alegrense , Porto Alegre, n. ,
p.49-51, 2012.
49
No mundo sunita prevalece a concepção do grupo dos hambanitas, que são mais
radicais, pois defendem a aplicação rigorosa das leis do Alcorão, sem interpretações
extensivas ou analógicas, o que origina o Integrismo árabe163. Além desse grupo, há
também o wahhabismo, doutrina também radical e a oficial da Árabia Saudita, originada
por Muhammad IbnAbd-El-Wahhab e mais rígida que a anterior.Este Integrismo árabe,
sustentado pelas doutrinas expostas acima, foi o idealismo religioso espalhado entre a
população e que foi muitas vezes útil como forma de legitimação dos governos
ditatoriais. No entanto, houve uma mudança de mentalidade, influenciada
principalmente pelo advento da globalização e pela melhoria da educação. Durante os
anos 1980-2000, houve uma expansão do acesso à educação, atingindo, inclusive, as
mulheres, e uma evolução nos seus níveis primário e secundário na região, registrada
nos índices responsáveis por medir o desenvolvimento dos países164. Une-se a isso a
inclusão global, a partir dos anos 1990, com a admissão mais frequente de instrumentos
de comunicação como a internet, revistas, televisões, telefones celulares etc., o que
permitiu o contato com o modo de vida de outros países e um maior acesso à
informação.
Ambos os fatores favoreceram o surgimento de um pensamento crítico, que era
ainda mais incentivado a expandir-se, devido às condições de instabilidade econômica e
de repressão dos regimes. Assim, as camadas sociais passaram a questionar a situação
em que viviam. A partir daí, começaram a surgir protestos provenientes da situação
atual, como o que ocorreu entre 2004 e 2005 no Egito, o movimento Kefaya (traduzido
como “Chega!”) objetivando impedir a manipulação das eleições por Hosni Mubarak165.
Também emergiram movimentos sociais baseados no islamismo que foram
essenciais para impulsionar os levantes ocorridos, a exemplo do Ikhwan na Síria, o al-
Nahda na Tunísia e a Irmandade Muçulmana. Líderes religiosos tiveram importante
participação ao estimular a população a aderir aos protestos por meio da mídia e de
163
Corrente religiosa que defende o respeito à integridade dos textos sagrados, como os do Alcorão, pois
este são Lei e, portanto, não deve ser alvo de críticas, analogias ou comparações.InVISENTINI, Paulo
Fagundes; PEREIRA, AnalúciaDanilevicz (Org.). Tensões da Primavera do mundo arábe-sunita: entre o
wahhabismo conservador e o espírito crítico, entre a política do petróleo e a independência econômica.
Ciências&letras: Revista da Faculdade Porto-alegrense , Porto Alegre, n. , p.50, 2012.
164
AWADALLAH, Bassem, and ADEEL, Malik, 2011, The Economics of the Arab Spring, Center for
the Study of African Economies (CSAE) Working Paper WPS/2011 23 (Oxford, UK: CSAE), p.2-3.
165
SHOURBAGY, Manar. The Egyptian Movement for Change - Kefaya: Redefining Politics in Egypt.
PublicCulture, New York. 2007. Disponível em: <http://publicculture.org/articles/view/19/1/the-egyptian-
movement-for-change-kefaya-redefin/>. Acesso em: 03 abr. 2013. Documento em inglês.
50
166
Corrente religiosa difundida a partir de Abdel Wahhab, que foca na ligação direta do religioso, do
político e do social com a Sharia, a lei corânica. Segundo Wahhab, a Sharia liga o Príncipe a seus súditos,
o que justifica religiosamente a autoridade política e social do soberano. Portanto, se o súdito sunita é fiel
à Sharia, também será ao soberano. In: VISENTINI, Paulo Fagundes; PEREIRA, AnalúciaDanilevicz
(Org.). Tensões da Primavera do mundo arábe-sunita: entre o wahhabismo conservador e o espírito
crítico, entre a política do petróleo e a independência econômica. Ciências&letras: Revista da Faculdade
Porto-alegrense , Porto Alegre, 2012, p.51.
51
9.1.2. Argélia
A Argélia é um país do Norte da África, ex-colônia francesa, que conquistou sua
independência em 1962, por meiode violenta luta interna contra os colonizadores,
comandada pela Frente de Libertação Nacional (FLN), partido argelino criado com o
objetivo de obter a independência e que assumiu o poder após a vitória.
Em 1992, desencadeou-se uma guerra civil no país, entre o exército e militantes
islamistas, devido a divergências entre partidos políticos, que teve como estopim o
cancelamento de uma eleição em que o candidato do partido islamista havia ganhado.
Desde essa data, foi declarado o Estado de Emergência, o qual durou até muito
recentemente e impedia a ocorrência de manifestações populares167. Entretanto, isso não
foi empecilho para o levante dos protestos contra o governo do atual presidente,
Abdelaziz Bouteflika, no poder desde 1999 e pertencente à FLN,que possui
preponderância no governo argelino desde a independência.
Após as insurgências relacionadas à Primavera Árabe, o presidente revogou o
Estado de Emergência, adotou medidas democráticas e a possibilidade de reformas,
visando amainar a situação. Entre elas, a convocação de eleições legislativas, em 2012,
com o objetivo de promover modificações relacionadas à imprensa, o voto às mulheres,
entre outras, oferecendo, também, aumentos de salários, mais habitações e corte nos
preços dos alimentos.
Atualmente, a saída do presidente está prevista para 2014, com o advento das
eleições presidenciais168.
9.1.3. Bahrein
Pequena ilha com cerca de 1 milhão de habitantes, cujo governo é uma
monarquia, controlada, desde 1783, pela família Khalifah, que continuou na
administração do país também durante a colonização pela Inglaterra e depois de sua
167
ALGERIA Profile: Timeline. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-africa-14118856>.
Acesso em: 08 abr. 2013.
168
NEUMANN, Rui. Argélia: Primavera Árabe sem mudança de estação. Jornal Digital: Notícias em
tempo real, Lisboa, 11 maio 2012. Disponível em:
<http://www.jornaldigital.com/noticias.php?noticia=30599>. Acesso em: 03 abr. 2013.
52
independência, em 1971. O rei tem autoridade absoluta e a maioria dos cargos políticos
e militares pertence à nobreza169. Internamente, também vivencia conflitos políticos,
pois a maioria da população é xiita, enquanto a família real é sunita.
Nas últimas décadas ocorreu uma melhoria da situação relativa aos direitos
humanos no país, devido à implementação da liberdade de expressão e reformas
políticas realizadas em 2001 que transformaram o Bahrein em uma monarquia
constitucional.Apesar disso, em 2011, o Bahrein também foi influenciado pela onda de
protestos da região e iniciou os seus, com o objetivo de derrubar o rei Hamadbin Isa Al
Khalifah, no poder desde 1999.
A reação do monarca foi decretar Estado de Emergência para o país e enviar o
Exército para conter as manifestações, pedindo suporte às forças militares da Arábia
Saudita170, que usaram métodos repressivos contra a população, como a tortura. Após a
repercussão internacional, o rei fez promessas de reformas para prevenir tais tipos de
abusos e aceitou a criação da Comissão Independente de Inquérito do Bahrein171 para
investigar os protestos e suas consequências, em relação às violações dos direitos
humanos. Porém, acusa-se Hamad de não fazer o suficiente para contribuir com o
trabalho dessa comissão. Os protestos no país continuam a ocorrer até a presente data172
e o governo recusa-se a negociar com a oposição em busca de soluções.
9.1.4. Egito173
Segundo a aderir às ondas de protesto e o maior país árabe em extensão
territorial, estava declarado como em Estado de Emergência desde 1967174. Já em 2011
conseguiu depor seu presidente, Hosni Mubarak, que estava há 30 anos no poder, após
18 dias de protesto. Inicialmente, Mubarak tentou fazer concessões parciais aos pedidos
da população, porém não foi bem-sucedido em sua tentativa.
Durante a revolução, o país teve o apoio e pressão dos Estados Unidos para a
renúncia de Mubarak, apesar de todo o apoio econômico e militar que estes concediam
169
BAHREIN Profile: Overview. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-
14540571>. Acessoem: 08 abr. 2013.
170
BAHREIN Unrest: UN rights chief criticises crackdown. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-12769168>. Acesso em: 06 abr. 2013. Documento em
inglês.
171
BAHREIN IndependentComissionofinquiry. Disponível em: <http://www.bici.org.bh/>. Acesso em:
06 abr. 2013. Documento em inglês.
172
Maio de 2013.
173
Texto atualizado até junho de 2013. País a ser analisado em anexo a ser divulgado em breve.
174
EGYPT Profile: Overview. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-africa-13313370>.
Acesso em: 03 abr. 2013.
53
àquele território, a despeito dos inúmeros problemas sociais ali vivenciados. No entanto,
acredita-se que essa ajuda deveu-se apenas ao temor dos norte-americanos pelas forças
políticas que poderiam se articular, já que, interferindo previamente, eles mesmos
poderiam controlar a transição de poder, e pela paralização da economia egípcia.
A ajuda do exército também foi essencial na realização deste feito, pois a
instituição se recusou a atirar em civis e funcionou como mediador da transição de
governo após a queda do presidente, auxiliando na negociação entre as forças
oposicionistas.
Um ano após o levante, o candidato Mohammed Morsi, da Irmandade
Mulçumana, foi eleito por meio da primeira eleição presidencial democrática do país.
Porém, os protestos continuam por parte da população, que temem a não realização de
mudanças significativas, já que Morsi expediu um decreto que o dava poderes extras,
além dos necessários. Vários partidos da oposição se uniram e formaram a Frente de
Salvação Nacional (FSN), em busca de retirar o decreto estabelecido pelo presidente e
garantir as mudanças na sociedade175.
E, além disso, há os conflitos existentes entre os diversos segmentos políticos
que exigem diferentes mudanças, como os liberais, os conservadores, os islamistas e os
cristãos. Estes conflitos são, muitas vezes, violentos, o que prova o aumento da
violência sectária na região.
9.1.5. Jordânia
País que não conta com muitos recursos naturais em seu território, aliado dos
Estados Unidos, dependente da ajuda estrangeira para sustentar sua economia e,
juntamente ao Egito, se constitui uma das duas únicas nações árabes que não são contra
Israel. O rei Abdullah II é o governante da Jordânia desde 1999176.
Nos protestos ali ocorridos, a população clama por melhorias econômicas e
sociais, além de reformas eleitorais que garantam mais poderes ao parlamento e a
eleição direta do primeiro ministro. Após os protestos, o rei prometeu que iria abdicar
de seu poder de indicar o primeiro ministro, porém não especificou data para que isso
ocorresse. Atualmente, a situação do país é ainda indefinida e percebe-se uma forte
175
PROFILE: Egypt's National Salvation Front.Londres: BBC News, 2012. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-20667661>. Acesso em: 03 abr. 2013.
176
JORDAN Profile: Overview. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-
14631981>. Acesso em: 03 abr. 2013.
54
9.1.6. Kuwait
O Kuwait, governado pelo Sheik Sabah al Sabah, no poder desde 2006, é um
emirado árabe constitucional, que conseguiu sua independência do Reino Unido no ano
de 1961178.
Neste país, o objetivo não é depor a família real, mas sim a redução da corrupção
e a concessão da cidadania aos Bidun, que são habitantes do Kuwait, mas, como não
possuem a cidadania do país, não podem gozar dos direitos e privilégios cedidos aos
“verdadeiros” cidadãos. Os protestos foram contidos com forte repressão por parte do
governo e não obtiveram mudanças significativas.
9.1.7. Líbia
A Líbia é um país dividido entre diferentes tribos, com o maior IDH da África
(0,755)179, nível de educação e alfabetização elevado, além de uma renda média alta
para sua população. Todavia, em contraste com esses pontos positivos, é alto o nível de
desemprego e corrupção, há violação dos direitos humanos e péssima infraestrutura para
a saúde pública180.
Em 1970, após a derrubada da monarquia líbia, assume o poder o Coronel
Muammar Kadafi, que iria governar durante 42 anos, até a insurgência dos rebeldes
durante a Primavera Árabe.
Assim que iniciaram as possibilidades de levantes, influenciados pelos protestos
já em curso na Tunísia, Argélia e Egito, a primeira medida tomada por Kadafi foi
bloquear sites como o YouTube e as redes sociais. Apesar disso, surgiram agitações em
várias cidades, em um dia que ficou conhecido como “Dia da Fúria”. Os rebeldes
estavam armados, os protestos eram violentos e eles conseguiram tomar as cidades de
Aydabiya e Bengazi.
177
JORDAN Profile:Timeline. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-
14636713>. Acesso em: 03 abr. 2013.
178
KUWAIT. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Kuwait>. Acesso em: 03 abr. 2013.
179
RELATÓRIO do Desenvolvimento Humano de 2011. Disponível em:
<http://hdr.undp.org/en/media/HDR_2011_PT_Complete.pdf>. Acesso em: 03 abr. 2013.
180
VISENTINI, Paulo Fagundes; PEREIRA, AnalúciaDanilevicz (Org.). O Verão Árabe: guerra civil e
intervenção internacional na Líbia, Síria e Iêmen. Ciências&letras: Revista da Faculdade Porto-alegrense ,
Porto Alegre, p.59-60, 2012.
55
181
VISENTINI, Paulo Fagundes; PEREIRA, AnalúciaDanilevicz (Org.). O Verão Árabe: guerra civil e
intervenção internacional na Líbia, Síria e Iêmen. Ciências&letras: Revista da Faculdade Porto-alegrense ,
Porto Alegre, 2012, p.59-61.
56
9.1.8. Marrocos
O Marrocos foi um protetorado francês de 1912 a 1956, até transformar-se em
monarquia em 1952 e, atualmente, é uma monarquia constitucional. Seu atual rei é
Mohammed VI, que está no poder desde 1999182.
Com os protestos na Primavera Árabe, a população pedia por reformas políticas e
a elaboração de uma nova constituição. Em resposta, Mohammed apresentou algumas
emendas à constituição que reduziam uma parte de seus poderes e modificou os
membros do parlamento. Porém, os revolucionários não acharam as mudanças
suficientes e os protestos continuam a ocorrer183.
9.1.9. Omã
O Omã passou décadas isolado internacionalmente, a partir de 1932, sob o
governo do Sultão Said binTamur, com sua sociedade baseada em um sistema feudal e
em rebeliões internas. Este isolamento durou até 1970, quando o sucessor do trono, o
atual governante, Sultão Qaboosbin Said, promoveu a abertura econômica, tornando-se
o principal aliado dos Estados Unidos e do Reino Unido.
A população não exigia reformas políticas muito radicais, mas, primordialmente,
criações de postos de trabalho e controle do preço dos alimentos. As autoridades do país
passaram, então, a exercer um grande controle sobre o uso da internet e a prender
ativistas e blogueiros, acusados de incitar a população por meio de redes sociais,
difamar o sultão ou exaltar a incapacidade das autoridades locais de promover reformas
na área.
9.1.10. Síria
A Síria conseguiu sua independência da França em 1946 e é governada pelo
presidente Bashar al-Assad desde o ano 2000. Possui relações com grupos extremistas
como o Hamas e o Hezbollah, o que desagrada alguns governos ocidentais, como o
norte-americano. Durante o governo Bush, a Síria foi incluída na lista dos países
pertencentes ao “Eixo do Mal”, pois era acusada de produzir armas nucleares e oferecer
auxílio a fugitivos iraquianos.
182
MOROCCO Profile: Overview. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-africa-
14121438>. Acesso em: 03 abr. 2013.
57
184
LIGA Árabe concede assento sírio aos rebeldes. BBC Brasil, 2013. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/ultimas_noticias/2013/03/130307_liga_arabe_siria_jp_rn.shtml>.
Acesso em: 06 abr. 2013.
58
9.1.11. Tunísia
Foi onde ocorreu o estopim dos protestos, que influenciaram os outros países
árabes a aderirem ao movimento. É um dos países mais avançados em termos de
direitos humanos, tendo instaurado, desde 1956, a emancipação da mulher e a educação
gratuita obrigatória em todo o país, reformas estabelecidas pelo primeiro presidente
eleito após a independência da França.
Em 1987, este presidente foi sucedido por Zine al-Abidine Ben Ali, acusado de
corrupção, mesmo com todo o declínio econômico do país, submetendo, a população a
políticas extremamente repressivas. Rapidamente, foi deposto do cargo, procurando
exílio na Arábia Saudita185. Em seu governo, partidos de oposição legítimos eram
proibidos, mas, depois da retirada, o regime de partido único foi extinto e as
providências para a elaboração de uma nova constituição foram tomadas.
O exército foi também importante chave desta resolução, pois se recusou a
colaborar com o governo, já que Ben Ali, desde o início de seu governo, decidira mantê-
lo como um órgão apolítico, deixando a segurança nas mãos da polícia e das forças de
segurança, que não foram capazes de conter os levantes. Em 2012, o presidente Ben Ali
foi condenado à prisão perpétua pela morte dos tunisianos durante a repressão realizada
aos protestos186.
Por fim, apesar de terem alcançado uma mudança bastante significativa, ainda
observa-se dissidências no país, a exemplo do surgimento de movimentos islãos
extremistas, como o Salafismo, que requer a lei do Alcorão como base da nova
Constituição. E, guiados por esse ideal, os salafistasrealizam manifestações contra
aquilo que eles acreditam ser influências anti-islâmicas. Além disso, outra preocupação
de parte da sociedade e que estimula novos protestos é o fato de a nova Constituição
considerar as mulheres como “complementares aos homens”, enquanto que a anterior
considerava-as no mesmo patamar que eles.
185
TUNISIA:Ex-President Ben Ali fleesto Saudi Arabia. Londres: BBC News, 2011. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/news/world-africa-12198106>. Acesso em: 14 maio 2013.
186
BLOMFIELD, Adrian. Zine el Abidine Ben Ali avoids death penalty in Tunisia. Londres: The
Telegraph, 2012. Disponível em:
<http://www.telegraph.co.uk/news/worldnews/africaandindianocean/tunisia/9329926/Zine-el-Abidine-
Ben-Ali-avoids-death-penalty-in-Tunisia.html>. Acesso em: 14 maio 2013.
59
9.1.12. Iêmen
A maioria da população deste país, um dos mais pobres do mundo árabe, é rural e
as comunicações internas são limitadas. É marcado por guerras civis, devido às
disparidades existentes entre o norte e o sul, e também um forte aliado dos Estados
Unidos. Seu presidente era Ali Abdullah Saleh, no poder por 33 anos.
Para minorar a oposição contra seu governo, Saleh distribuiu rendas e favores
entre as diferentes tribos e partidos políticos, bem como ofereceu posições no governo e
no exército a seus membros. Em suma, uma troca entre grupos de poderes, sistema que
se mantém pelas rendas petrolíferas187.
Devido aos arraigados problemas sociais e econômicos, parte da população se
volta para atividades ilícitas, como pirataria, tráfico de armas, de pessoas e de drogas188,
as quais são facilitadas e favorecidas por autoridades corruptas. Além disso, verifica-se
uma forte presença da Al-Qaeda na região, fato que preocupa os EUA e levou a uma
aproximação do país com os manifestantes durante as insurgências da Primavera Árabe,
temendo que esse grupo terrorista consiga chegar ao poder com o futuro vácuo político.
Assim, os norte-americanos, que antes defendiam o governo do presidente, passaram a
ser a favor de sua retirada.
Tais protestos começaram por influência da Tunísia, com manifestações
pacíficas, para as quais o presidente ofereceu algumas concessões, como a retirada dele
e de seu filho das próximas eleições, previstas, inicialmente, para 2013. Como os
protestos continuaram, a repressão foi iniciada, quebrando a pacificidade da revolução e
causando a morte de civis. Esta forma de reação causou grande choque à população,
fazendo com que até mesmo alguns membros da elite, como certos chefes tribais,
apoiassem a deposição do presidente.
No final de 2011, pressionado pela ONU, União Europeia e Estados Unidos,
Abdullah Saleh assinou o acordo proposto pelo Conselho de Cooperação do Golfo
(CCG) segundo o qual ele deixa o governo em troca de não ser julgado por crimes de
guerra, o que não agradou a oposição, por não haver justiça na resolução, já que ele não
responderá pelas mortes causadas pela violenta repressão durante as manifestações. O
poder passou para o vice-presidente Abd-Rabbu Mansour Hadi, que assumiu após
187
VISENTINI, Paulo Fagundes. A Primavera Árabe: Entre a democracia e a geopolítica do petróleo.
Porto Alegre: Leitura XXI, 2012.
188
Tais assuntos são do escopo específico de outras organizações, como a Organização Marítima
Internacional (OMI) a INTERPOL e o Escritório das Nações Unidas para Drogas e Crimes (UNODC) e,
embora não se incluam no foco das discussões na 25ª Reunião de Cúpula do Conselho da Liga Árabe,
podem ser referenciados brevemente pelos delegados.
60
189
CONSELHO de Segurança da ONU elogia eleições no Iêmen.Notícias Terra, 2012. Disponível em:
<http://noticias.terra.com.br/mundo/oriente-medio/conselho-de-seguranca-da-onu-elogia-eleicoes-no-
iemen,34a9ec09b57da310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html>. Acesso em: 14 maio 2013.
190
A ideia dos BRICS foi formulada pelo economista-chefe da Goldman Sachs, Jim O´Neil, em estudo de
2001, intitulado “BuildingBetter Global EconomicBRICs”. Fixou-se como categoria da análise nos meios
econômico-financeiros, empresariais, acadêmicos e de comunicação. Em 2006, o conceito deu origem a
um agrupamento, propriamente dito, incorporado à política externa de Brasil, Rússia, Índia e China. Em
2011, por ocasião da III Cúpula, a África do Sul passou a fazer parte do agrupamento, que adotou a sigla
BRICS. Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/temas/mecanismos-inter-regionais/agrupamento-
brics>. Acesso em: 10 mai. 2013.
61
que o Mundo Árabe precisa alcançar a sua independência por meio do fortalecimento
político e econômico das suas nações frente às potencias globais, como, também, pelo
empoderamento da população, muitas vezes subjugada em situações de
intervencionismo estrangeiro que desrespeitam a soberania dos Estados e
desconsideram aspectos culturais e religiosos inerentes à região.
Nesse sentido, é urgente um pronunciamento da Liga Árabe, por meio da 25ª
Reunião de Cúpula, principalmente após a aprovação de novos documentos como a
Carta da Liga Árabe sobre Direitos Humanos, adotada em 2004, e da insurgência de
processos de transição, emergidos pelo estopim da Primavera Árabe.
11. INDICAÇÕES
Para saber mais sobre alguns assuntos que envolvem a Liga Árabe, seus países-
membros, observadores, convidados e a intervenção militar internacional, bem como o
contexto da 25ª Reunião de Cúpula do Conselho da Liga, seguem algumas indicações
de links e outros materiais interessantes.
Para se ter uma visão oficial da organização, sugerimos a visita ao seu website
oficial, encontrado em http://www.lasportal.org>.
Para se ter uma noção dos principais pontos de que trata a Liga, bem como ter
uma noção de como o Ocidente enxerga a organização, recomendamos a página da BBC
sobre a Liga Árabe, disponível em: http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-
15747941.
Para saber o que ficou decidido na última Reunião de Cúpula da Liga Árabe e ter
uma ideia do teor das resoluções da Reunião de Cúpula do Conselho, recomendamos a
leitura da Declaração de Doha, disponível em:
http://arableaguesummit2013.qatarconferences.org/index.html. O documento está em
inglês.
No mesmo sentido, disponibilizamos o link da Resolução de Cartum, de 1967,
também em inglês, que trata especificamente da questão árabe-palestina, possibilitando
a compreensão da atuação da organização quanto a conflitos armados:
http://arableaguesummit2013.qatarconferences.org/news/news-details-17.html.
63
REFERÊNCIAS
AFGHANISTAN: Civil War, the Taliban, and American Intervention. Disponível em:
<http://berkleycenter.georgetown.edu/essays/afghanistan-civil-war-the-taliban-and-
american-intervention>. Acesso em: 11 abr. 2013.
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n., p.1-1, 2011. Disponível em: <http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=922>.
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em: <http://www.foreignaffairs.com/articles/137053/fouad-ajami/the-arab-spring-at-
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ALMEIDA, João Marques de. International Political Theory and the Issue of Legitimate
Intervention. Nação e Defesa, Lisboa, n. 102, p.155-170, jul. 2002.
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International Politics.Afro Eurasian Studies, 2012.
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do mundo. São Paulo, 2011. Disponível em: <http://www.icarabe.org/entrevistas/a-
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65
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