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LIGA DOS ESTADOS ÁRABES - LEA


„„A Liga é indispensável para nós. Ela é um símbolo de
autoridade árabe e o centro de nossa vida política. Seu espírito
unificador é mais importante do que todas as outras coisas.‟‟ –
(Ministro Sírio no Cairo; 12 de maio de 1949)1.

1
Kightlinger, Dana.The Arab League Final Paper.StudyMode.com, 2013. Disponível em:
<http://www.studymode.com/essays/The-Arab-League-Final-Paper-1346285.html>. Acesso em abr. 2013.
ÍNDICE DE ABREVIAÇÕES

CCG – Conselho de Cooperação do Golfo

CNL – Conselho Nacional Líbio

CNS – Conselho Nacional Sírio

CNT – Conselho Nacional de Transição da Líbia

CSNU – Conselho de Segurança das Nações Unidas

CNT –Comitê de Alto Nível

EUA – Estados Unidos da América

FAO – Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação

FLN –Frente de Libertação Nacional

FSN –Frente de Salvação Nacional

OLP –Organização para Libertação da Palestina

OIT – Organização Internacional do Trabalho

ONU –Organização das Nações Unidas

OPEP –Organização dos Países Exportadores de Petróleo

OTAN –Organização do Tratado do Atlântico Norte

UNESCO –Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura

URSS –União das Repúblicas Socialistas Soviéticas


CARTA DE APRESENTAÇÃO

Bem-vindos a um dos comitês mais exóticos da SOI 2013, a Liga dos Estados Árabes!
(LEA) A diretoria da LEA não poderia estar mais feliz em entregar este guia a vocês que nos
acompanhou (assombrou) por manhãs, tardes, noites e madrugadas, mas que foi feito com
muito carinho, muita dança do ventre, muito Kebab, muitas orações à Alá e muitas risadas
entre os diretores que não podem ser considerados pessoas normais. Então, preparem-se para
encarar esse desafio com a gente! Agora é hora da SOI nas Arábias!
Entretanto, antes de começar com a parte séria do comitê, precisamos primeiro
apresentar cada um dos diretores para que os delegados possam ter a exata dimensão de quem
são essas pessoas com quem eles terão que implorar para ouvir um “sua moção está em
ordem, senhor delegado”. Vejamos:
Comecemos pela menina Cindy Lessa. Solteira (até o fechamento dessa edição), 20
anos, 8 simulações em 2 anos, cursando o 6º período de Direito da UFRN. Cindão mantém a
calma e a serenidade do comitê com seus comentários sempre ponderados e conclusivos. É
muito difícil falar mal dela, mas, já que estamos aqui...
Ela não anda, ela desfila... Mc Bola, escreveu essa canção, inspirado no caminhar
magnífico de Cindão vestindo seu ShorCindy™. O ShorCindy™, uma das maiores criações
da nossa querida diretora, gerou tantos lucros que pela segundo ano seguido ela não está aqui
para a reunião de correção material do guia, na qual esta pequena homenagem está sendo
escrita. Nesse exato momento, Cindão está em Veneza (curtindo esse verão maravilhoso da
Europa, da Itália) seduzindo os italianos com seus brownies mágicos e afrodisíacos. Portanto,
cuidado se ela te oferecer um. Experiências extracorpóreas não são raras. Para os interessados,
é uma pessoa deveras intelectualizada, exceto quando se trata de músicas de
ValeskaPopozuda, Mc Beyoncé e Faringes da Paixão. Portanto, para conquistar o coração da
menina Cindy, você precisa ser um rapaz, acima de tudo, versátil.
Passemos agora para nossa amada Giovanna Zan, presidente oficial do fã clube
“Bieber é Hétero, Sim!”Solteira, 19 anos, estrela das duas simulações de que participou, aluna
do 4º período de Direito UFRN. Romântica, estudiosa e dedicada, Giovanna é a nora que sua
mãe sonhou. Então fique de olho, principalmente se você se parece com seu amado Justin.
Giovanna representa a BieberFever no comitê. Maior advogada do ídolo teen, sempre
preparada para defendê-lo das injustas acusações dos outros membros do comitê. A moça
alega que as músicas de Justin Bieber fazem parte de sua história de vida (apesar de
reconhecer que ele é “um pouco imaturo”. Tem habilidades sobrenaturais de notar
características peculares nas pessoas. Qual característica é essa? Fica a seu critério descobrir.
Mas se você for homem e fã de Rihanna, Madonna, Ivete e Claudinha Leitte, pode ter certeza,
ela vai saber. (Ex) fã de rebelde, Giovanna julga pessoas por suas comunidades no Orkut. E
sim, ela é a favor do sistema!
PRE-PA-RA que agora é hora de Natália Pegado.Solteira por opção, 20 anos, 5
simulações, aluna do 6º período de Direito UFRN. Nossa querida Direcantora segue a vida
conforme o roteiro. É quase normal por fora, pra ninguém desconfiar, mas por dentro é uma
pessoa sui generis. Segundo seu perfil do Orkut, ela não quer uma vida pequena, um amor
pequeno, uma alegria que caiba dentro da bolsa. Afinal, nossa diretora quer coisas grandes,
pois nada raso satisfaz essa intrépida aventureira.
DeleFashion em todas as simulações que já participou, tem o Brasil como destino
favorito de férias, já que no resto do ano faz turnê pela Europa com sua banda Forró Pegado, e
tem planos de lançar sua carreira solo com seu single versão funk de Per Amore, em parceria
com sua musa e amiga íntima Inês Brasil. Fã de homens com iniciativa, Natália afirma que
seu cupido é adepto à filosofia RastaFeelings e fuma baseado.
É uma garota positiva, que deseja vida longa a todas as inimigas pra que elas vejam a
cada dia mais sua vitória. O lema da sua vida é „„keepcalm e deixa de recalque‟‟. Beijinho no
ombro, Nath!
E agora, o nosso bravo guerreiro. Comprometido seriamente com uma das diretoras da
Mini-SOI, 21 anos, 2 simulações, Luís é estudante do 2º período de Direito na Uni-RN. É o
bendito fruto entre as mulheres, fardo que carrega bravamente.
Possui diversos apelidos. Nunca será chamado de Luís Augusto. Entre eles, se
destacam Kiwi, Che, Khal Drogo e Momô (este último é restrito à sua namorada). Suas
missões extra acadêmicas no comitê envolvem ensinar as prendadas diretoras a sobreviver na
cozinha, visto que estas são capazes de estragar até 3 lasanhas pré-prontas e quebrar o micro-
ondas no mesmo dia. Também possui uma vertente de Hitch, o conselheiro amoroso, quando
profere ensinamentos como: „„às vezes, os homens preferem alguém que você possa passar
mais tempo ao lado do que em cima‟‟.
O nosso chef, psicólogo, comediante e Khal Drogo potiguar (note sua barba), supre
muito bem a falta de testosterona no comitê, e a sua ilibada reputação só poderá ser quebrada
por 18 doses de cachaça em 10 minutos.
Luz na passarela que lá vem elaaaaa! Jasminne Mascarenhas, solteira, 19 anos, recém-
motorizada, duas simulações, Minne é a nossa garota festeira. Ela é a sensação da
nightlifenatalense. Jasminne não resiste a uma fextcheeenha com azamigas. Minne exala
ousadia e alegria.
Pra ela, olho no olho já é suficiente. Nossa Neymar de saias é uma das responsáveis
apesar da recente contusão na última competição, pelo tricampeonato de futebol da turma
2011.1 + convidados. Ao contrário do original, não cai aos pés do primeiro homem que
encosta nela. Afinal, ela fez um pacto com o amor: nem ela o persegue, nem ele persegue ela.
Na hora certa, eles se encontrarão, apesar de Minne viver em busca do seu Mickey, ou do seu
Aladim. Então, se você quer tirar Jasminne da vida boa de solteira, vai precisar de muito mais
do que um belo gol, pois isso ela já sabe fazer.
Por fim, Carol (sobrenome ryco) Beghelli, comprometida, 19 anos, duas simulações,
Carol é a nossa Jessica Alba tupiniquim. Linda e loira, Carol é professora de inglês, fala
francês fluentemente, mas ainda não aprendeu a diferença entre o cream cracker e a bolacha
Maria e ficou chocada ao saber que, de fato, essa diferença existe.
Nas horas vagas faz a linha garota-propaganda da escola de línguas Open Doors e,
segundo seu perfil no site da instituição é descrita pelos seus alunos como “crazy, butkind”.
No entanto, o talento para a carreira de modelo e professora não se reflete na direção. Carol
lda constantemente com ligações do seguro, ou de vítimas das suas leves “encostadinhas” nos
toscos engarrafamentos da pacata cidade de Natal. A situação é tão grave que a sua própria
mãe a presenteou com um porta documento de carro com os dizeres “beijo melhor que
dirijo”.Com cara de menina boazinha, não se engane, Carol, recentemente, revelou que seu
maior ídolo nas redes sociais é Félix Bicha Má: “Só não sambo na sua cara, porque não gosto
de pisar em falso”. Fique de olho, senhor delegado, ela pode estar lá, da mesa, julgando você!
Então é isso! Chegou a hora de começar a brincadeira, de fato! Bons estudos, até
outubro e que Alá esteja com vocês!
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO......................................................................................................................9
2. HISTÓRICO DA LIGA ÁRABE.......................................................................................................10
2.1. Formação da Liga dos Estados Árabes...........................................................................................10
2.2. Dissensões internas....................................................................................................................12
3. FUNCIONAMENTO INTERNO DA LIGA ÁRABE.........................................................13
3.1. Secretariado Geral..............................................................................................................13
3.2. Conselho de Defesa Conjunta............................................................................................14
3.3. Conselho da Liga Árabe.....................................................................................................14
4. NORMATIZAÇÃO INTERNA DA LIGA DOS ESTADOS ÁRABES..............................14
4.1Tratado de Cooperação Econômico-Defensiva....................................................................15
4.2. Carta Árabe dos Direitos Humanos...................................................................................16
4.3. Resolução 7446 de 12 de fevereiro de 2012......................................................................19
4.4 Resolução de 24 de março de 2013.....................................................................................19
4.5 Declaração de Doha............................................................................................................20
5. FORMAÇÃO DOS ESTADOS ÁRABES...........................................................................21
6. BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA QUESTÃO DO PETRÓLEO NO
ORIENTE..................................................................................................................................29
7. AS INTERVENÇÕES MILITARES NO DIREITO INTERNACIONAL...........................31
7.1 A relativização da soberania e a intervenção no âmbito das Nações Unidas......................32
8. INTERVENÇÕES ESTRANGEIRAS NO SÉCULO XX E INÍCIO DOS
ANOS 2000..............................................................................................................................37
8.1.Guerra do Irã-Iraque (1980-1988).......................................................................................38
8.2 Guerra do Golfo (1990-1991).............................................................................................39
8.3 A invasão ao Afeganistão (2001)........................................................................................41
8.4A invasão ao Iraque (2003)..................................................................................................42
9. PRIMAVERA ÁRABE........................................................................................................44
9.1. Análise específica dos países........................................................,....................................50
9.1.1. Arábia Saudita.................................................................................................................50
9.1.2. Argélia.............................................................................................................................51
9.1.3Bahrein..............................................................................................................................51
9.1.4. Egito................................................................................................................................52
9.1.5. Jordânia...........................................................................................................................53
9.1.6. Kuwait.............................................................................................................................54
9.1.7. Líbia................................................................................................................................54
9.1.8. Marrocos.........................................................................................................................56
9.1.9. Omã.................................................................................................................................56
9.1.10. Síria...............................................................................................................................56
9.1.11. Tunísia...........................................................................................................................58
9.1.12. Iêmen.............................................................................................................................59
10. DESAFIOS ATUAIS DA LIGA DOS ESTADOS ÁRABES............................................60
11. INDICAÇÕES....................................................................................................................62
REFERÊNCIAS........................................................................................................................64
9

1. INTRODUÇÃO

A Liga dos Estados Árabes (LEA) é uma organização regional que inclui nações
da Península Arábica e do norte da África, a primeira a ser criada após a II Guerra
Mundial. Baseada em princípios que dão suporte e promovem um nacionalismo árabe
unificado, tem como escopo procurar padronizar as posições dos países árabes com
relação aos mais diversos assuntos.
A Carta da Liga Árabe, ato institucional da organização, endossa o princípio de
um lar árabe comum, ao mesmo tempo em que respeita a soberania de seus países-
membros. A regulação interna do Conselho da Liga e de seus comitês foi acordada em
outubro de 1951, enquanto a do Secretariado Geral apenas em maio de 1953.
Desde então, a administração da Liga Árabe tem se baseado na dualidade da
instituição supranacional e na soberania dos Estados. A preservação dessa soberania
deveu-se, naturalmente, à preferência intrínseca das elites dirigentes em manter seu
poder e independência na tomada de decisões internas. Assim, a Liga se consolidou
como uma organização inócua, que pouco fazia para concretizar seus objetivos.
No entanto, face à ameaça constante da intervenção estrangeira, especialmente
militar, à Liga cabe demonstrar que o papel de liderança confiado a ela pelas nações do
Mundo Árabe não é em vão. Os delegados precisarão ter conhecimento das disposições
sobre as intervenções à luz do Direito Internacional, bem como deverão estar a par das
condições que moldaram o Mundo Árabe e que, muito frequentemente, envolveram a
influência dos interesses das potências estrangeiras, além de demonstrarem bom
entendimento do equilíbrio de forças em que se encontram os países da região e a
situação em que estão inseridos na atualidade. Uma tarefa nada fácil, é verdade, mas
que ajudará os delegados a compreender um pouco mais do que se passa nessa parte do
planeta, aparentemente tão distante de nós.
10

2. HISTÓRICO DA LIGA ÁRABE

A história da Liga dos Estados Árabes se confunde com a dos próprios países
árabes ao longo do século XX. A compreensão das motivações por trás da organização
passa, portanto, pelo conhecimento de sua história, desde o contexto de sua formação e
seu funcionamento interno até os aspectos mais relevantes de sua atuação nos dias de
hoje. Os tópicos a seguir procuram apresentar, brevemente, algumas dessas questões.

2.1. Formação da Liga dos Estados Árabes


A ideia de uma organização que reunisse os recém-criados Estados árabes contra
o poder do Eixo foi proposta pelo Reino Unido, no decorrer da Segunda Guerra
Mundial. Sugere-se que a verdadeira intenção dos britânicos era manter o domínio
neoimperialista sobre a região2.
Em agosto de 1942, o Egito convidou representantes do Iraque, da então
Transjordânia – que se tornou Jordânia no ano de 1949 –, da Arábia Saudita, da Síria,
do Líbano e do Iêmen para discutir suas respectivas visões acerca da unidade árabe.
Logo, um Comitê Preparatório, composto por esses países e mais um representante dos
Palestinos, se reuniu na cidade de Alexandria, durante duas semanas, no que ficou
conhecido como fase de Consultas sobre a Unidade Árabe.
Apenas em 1944 essas consultas levaram a um resultado concreto, com a
assinatura do Protocolo de Alexandria3 pelos países anteriormente citados. Nesse
documento constam os princípios responsáveis pelo estabelecimento e manutenção de
uma organização que incluiria os Estados árabes independentes até então, e que seriam,
posteriormente, a base da Carta da Liga Árabe, elaborada em 1945 e assinada no mesmo
ano, pelos chefes de Governo do Egito, Iraque, Síria, Arábia Saudita, Transjordânia e
Líbano. A Carta contém 20 artigosque definem os objetivos da recém-criada Liga dos
Estados Árabes4, sua estrutura e funcionamento.O Protocolo trata, ainda, do objetivo de
existência da Liga, que seria o controle da execução de tratados entre os Estados-
membros, o fortalecimento das relações entre os mesmos através de reuniões periódicas

2
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15 ed. rev. e amp. Rio de
Janeiro: Renovar, 2004. vol. I, p. 759.
3
PROTOCOLO de Alexandria: tratado de formação da Liga Árabe. Disponível em:
<http://www.mideastweb.org/alexandria.htm>. Acesso em: 20 dez. 2012.
4
Três outros nomes foram considerados: a Aliança Árabe, a Federação Árabe e simplesmente Liga
Árabe.
11

e a proteção da independência e soberania contra futuras agressões. Além disso, a fim


de garantir a tomada de decisões que favoreçam os interesses do Mundo Árabe, foram
proibidos os acordos entre países-membros que contradissessem o texto ou os princípios
do Protocolo. Políticas internacionais que fossem prejudiciais à Liga como um todo ou a
um de seus participantes não seriam permitidas. O Iêmen, que estava presente durante a
fase de Consultas, foi o sétimo país a assinar a Carta, em maio do mesmo ano,
determinando sua entrada em vigor.
Diversos tratados e acordos sobre os mais variados temas, inclusive cultura,
aviação, atividades postais, extradição de criminosos, economia e defesa conjunta,
foram assinados no âmbito da Liga no decorrer dos anos seguintes. O mais importante
deles foi o Tratado para Defesa Conjunta e Cooperação Econômica 5, que entrou em
vigor em 1952 e acarretou a criação do Conselho Econômico6 da Liga dos Estados
Árabes.
A Liga Árabe recebeu seu primeiro sinal de reconhecimento por parte das Nações
Unidas em novembro de 1950, quando uma resolução da Assembleia Geral pediu ao
Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas que convidasse o Secretário-Geral
da Liga para participar de sessões da Assembleia Geral na condição de observador. Em
1956, um acordo com a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e
Cultura (UNESCO) sobre matéria de cooperação educacional, científica e cultural
fortaleceu os laços entre as duas organizações internacionais. Acordos com outras
organizações das Nações Unidas, como a Organização Internacional do Trabalho (OIT)
e a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), também
se concretizaram nos anos seguintes.
Em 1974, a Liga dos Estados Árabes, em reunião de cúpula do Conselho
realizada em Riad, decidiu creditar a Organização para Liberação da Palestina (OLP)
como única representante legítima do povo palestino. Ao mesmo tempo, reconheceu o
direito do povo palestino de estabelecer um Estado no território que lhe fora destinado
pela ONU e o dever do Mundo Árabe de apoiar esse Estado, quando finalmente criado.

5
LIGA DOS ESTADOS ÁRABES. Tratado para Defesa Conjunta e Cooperação Econômica.
Disponível em:
<http://www.internationaldemocracywatch.org/attachments/265_Treaty%20of%20Joint%20Defense%20
and%20Economic%20Cooperation%20Between%20the%20States%20of%20the%20Arab%20League.pd
f>. Acesso em: 08 abr. 2013.
6
Hoje, Conselho Econômico e Social.
12

Mais tarde, em 1976, a Palestina se tornou membro oficial da Liga, devidamente


representada pela OLP7.
A atuação da Liga Árabe foi frequentemente caracterizada como inócua pela
comunidade internacional, em virtude de sua incapacidade de concretizar os objetivos
que levaram à formação da organização. Mesmo assim, ela estabeleceu um boicote
econômico quase total a Israel, vigente entre 1948 e 1993; mobilizou-se para encontrar
uma solução para a crise causada pelo Atentado de Lockerbie8, de 1988, orquestrado
pelo governo da Líbia; condenou o ataque iraquiano ao Kuwait em 1990, que deu início
à primeira Guerra do Golfo, entre outras ações significativas.
Nos últimos anos, a Liga vem apresentando uma força renovada, apoiando os
esforços de reconhecimento internacional do Estado da Palestina e condenando o uso de
violência no decorrer das manifestações na Primavera Árabe, chegando mesmo a
suspender a Síria e a entregar, recentemente, seu assento à oposição9. Além disso, a
constante cooperação entre a Liga e a ONU, com a designação de um enviado especial
comum10, fortaleceu a imagem da organização perante a comunidade internacional, e
hoje a Liga reconhecidamente apresenta-se como porta-voz oficial do Mundo Árabe.

2.2. Dissensões internas


A efetividade da Liga Árabe tem sido severamente diminuída em razão de
divisões entre seus Estados-membros. À época da Guerra Fria, por exemplo, alguns
membros aliavam-se à União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), enquanto
outros se encontravam na área de influência ocidental. A liderança da organização
também foi causa de disputas, especialmente entre o Egito e o Iraque.
Hostilidades entre os Estados tradicionalmente monárquicos – tais como a Arábia
Saudita, a Jordânia e o Marrocos – e as novas repúblicas, ou “Estados revolucionários”,

7
SEVENTH Arab League Summit Conference, Resolutiono nPalestine. Paris: Le Monde
Diplomatique, 2006. Disponível em: <http://www.monde-diplomatique.fr/cahier/proche-orient/rabat74-
en>. Acesso em: 11 maio 2013.
8
KOPPEL, Andrea; LABOTT , Elise. Libya offers $2.7 billion Pan Am 103 settlement. Washington:
CNN, 2013. Disponível em:
<http://edition.cnn.com/2002/US/05/28/libya.lockerbie.settlement/index.html>. Acesso em 14 abr. 2013.
9
LIGA Árabe concede assento da Síria aos rebeldes. BBC, 2013. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/ultimas_noticias/2013/03/130307_liga_arabe_siria_jp_rn.shtml>.
Acesso em 14 abr.2013
10
LAKHDAR Brahimi pode deixar o cargo Enviado da ONU e da Liga Árabe para a Síria. Diário da
Rússia, 2013. Disponível em:
<http://www.diariodarussia.com.br/internacional/noticias/2013/04/12/lakhdar-brahimi-pode-deixar-o-
cargo-enviado-da-onu-e-da-liga-arabe-para-a-siria/>. Acesso em: 14 abr. 2013
13

a exemplo do Egito de Gamal Abdel Nasser e da Líbia de Muamar Kadafi, também


eram frequentes.
O maior teste da unidade da Liga veio com a invasão americana ao Iraque, em
2003, em que alguns membros, como o Kuwait, o Qatar e o Bahrein, apoiaram a guerra,
chegando até mesmo a oferecer instalações para facilitar a invasão ao país, enquanto
outros a condenaram e outros, ainda, permaneceram neutros.
Como as decisões da Liga Árabe são vinculantes apenas para os membros que
votaram a favor delas, essas discordâncias têm, frequentemente, contribuído para
incapacitar o funcionamento da organização, principalmente na esfera da “alta política”.

3. FUNCIONAMENTO INTERNO DA LIGA ÁRABE

Ao mesmo tempo em que se comprometeu a respeitar a soberania do governo


estabelecido em cada um de seus países-membros, a Liga determinou, desde seu início,
como já foi notado, um conjunto de objetivos a serem alcançados, que incluem o
fortalecimento e manutenção da solidariedade entre as nações árabes diante de ameaças
externas, a garantia de coesão e paz entre os seus membros por meio da proposta de
mediar qualquer conflito entre dois ou mais países-membros e pela oposição do recurso
à força, além de assegurar a cooperação entre os Estados árabes em diversas áreas,
como social, legal, parlamentar, financeiro, econômico e cultural.
Para garantir a consecução desses fins, a Carta da Liga Árabe instituiu, para a
administração da organização, o Secretariado Geral, o Conselho da Liga e o Conselho
de Defesa Conjunta, entre outros órgãos internos afiliados.

3.1. Secretariado Geral


O Secretariado Geral da Liga Árabe é a instituição interna responsável pela
implementação das decisões tomadas pelo Conselho da Liga. É presidido pelo
Secretário Geral – atualmente, o egípcio Nabil El Araby – com o auxílio de diversos
Secretários Assistentes e uma equipe composta por membros permanentes e
temporários. O Secretário Geral é eleito por uma maioria de 2/3 dos membros, embora,
na prática, ele sempre tenha sido escolhido por unanimidade, ocupando o cargo por
cinco anos. O papel do Secretário-Geral é de extrema importância, pois é ele que
representa o Mundo Árabe em nível internacional.
14

3.2. Conselho de Defesa Conjunta


Esse Conselho foi criado após a assinatura do Tratado para Defesa Mútua e
Cooperação Econômica, em 1950. É composto pelos ministros de Relações Exteriores e
de Defesa de todos os Estados-membros.

3.3. Conselho da Liga Árabe


É o instituto supremo da organização, composto por representantes – geralmente,
os Ministros de Relações Exteriores – de todos os Estados-membros. O Conselho
organiza Sessões Ordinárias duas vezes por ano, em março e em setembro, podendo,
ainda, se reunir extraordinariamente a pedido de, no mínimo, dois membros, sempre que
for necessário. Esse órgão controla e coordena as atividades da Liga, garantindo que os
acordos efetuados em seu âmbito sejam efetivamente implementados, além de, como já
foi comentado, indicar o Secretário-Geral.
Outras atividades de competência do Conselho incluem a análise de pedidos para
tornar-se membro da Liga e para retirar-se dela, a mediação para a solução de disputas
entre dois Estados-membros ou entre um Estado-membro e um terceiro e a criação de
estatutos para os demais órgãos subsidiários e associados da Liga.
Cada Estado-membro conta com somente um voto no Conselho, cujas decisões
são vinculantes apenas para aqueles que votaram a favor delas. Em questões financeiras
e administrativas, uma maioria de 2/3 é suficiente para tornar a decisão vinculante para
todos os membros. Obviamente, em casos de discussões acerca de hostilidades entre
dois membros, não será permitido direito de voto ao Estado agressor, de acordo com o
disposto no artigo VI da Carta da Liga Árabe11.
A 25ª Reunião de Cúpula do Conselho da Liga dos Estados Árabes, a ser
realizada em outubro de 2013, terá os próprios chefes de Estado árabes – presidentes,
reis e emires – como representantes dos Estados-membros da Liga.

4. NORMATIZAÇÃO INTERNA DA LIGA DOS ESTADOS


ÁRABES

Explicitaremos aqui os princípios normativos que regem a Liga dos Estados


Árabes, a fim de mostrarmos as características de sua organização e funcionamento, que

11
CARTA da Liga dos Estados Árabes (em inglês). Disponível em:
<http://www.unhcr.org/refworld/publisher,LAS,,,3ae6b3ab18,0.html/>. Acesso em: 11 mai. 2013.
15

foram propostas, discutidas e acatadas durante suas décadas de existência. Além disso,
faz-se necessária a contextualização sociopolítica de tais resoluções, para que seja
possível ampla compreensão de seus termos e suas medidas.

4.1. Tratado de Cooperação Econômico-Defensiva


Logo após sua consolidação, a Liga Árabe tomou grande passo na direção de
reassegurar e solidificar a segurança de seus Estados, tanto econômica como militar.
Aprovado em 17 de junho de 1950, com o objetivo da manutenção da independência e
patrimônio dos países árabes, o Tratado de Cooperação Econômico-Defensiva busca
consolidar a paz com base nos princípios do Pacto da Liga dos Estados Árabes e da
Carta das Nações Unidas de 194512.
Primeiramente, seu texto determina o desejo dos países contratantes de
resolverem seus conflitos internacionais por meios pacíficos, sejam em relações entre
países da Liga ou não13. Em seguida, é determinado14 que cada ato de agressão armada
destinado a um dos Estados será considerado como direcionado a todos os demais,
numa espécie de legítima defesa coletiva, sendo justificada a resposta por meio de força
armada pelo Pacto da Liga dos Estados Árabes15 e pela Carta das Nações Unidas16.
O documento estabelece duas das principais instituições da Liga: os Conselhos
Econômico17 – renomeado Conselho Econômico e Social em 1980 – e o de Junta
Defesa18, este último supervisionado diretamente pelo Conselho da Liga Árabe e
responsável pela implementação das condições tratadas no documento.

12
UNIDAS, Organização Das Nações. Carta das Nações Unidas. Disponível em:
<http://www.oas.org/dil/port/1945%20Carta%20das%20Na%C3%A7%C3%B5es%20Unidas.pdf>.
Acesso em: 28 jul. 2013.
13
Artigo primeiro do Tratado de Cooperação Econômico-Defensiva.TREATY of Joint Defense and
Economic Cooperation Between the States of the Arab League, June 17, 1950 Disponívelem:
<http://avalon.law.yale.edu/20th_century/arabjoin.asp>. Acesso em: 13 maio 2013. Página em inglês.
14
Artigo segundo, idem.
15
Artigo sexto do Pacto da Liga Árabe: regulação da interação em caso de desavenças entre países-
membros da Liga.
16
Artigo quinquagésimo primeiro da Carta das Nações Unidas: estabelecimento do acordo de defesa
conjunta em relação a ameaças externas.
17
Artigo oitavo do Tratado de Cooperação Econômico-Defensiva.TREATY of Joint Defense and
Economic Cooperation Between the States of the Arab League, June 17, 1950 Disponívelem:
<http://avalon.law.yale.edu/20th_century/arabjoin.asp>. Acesso em: 13 mai. 2013. Página em inglês.
18
Artigo sexto, idem.
16

Foi criada também uma Comissão Militar Permanente19, da qual fazem parte
representantes dos exércitos nacionais dos Estados-membros, com o objetivo de
conceber e implementar planos para a defesa conjunta.
Uma importante característica do Tratado é que, uma vez ratificado, esse
documento é válido por dez anos, só sendo possível a retirada do país signatário após
passado esse período20.

4.2.Carta Árabe dos Direitos Humanos


A Carta Árabe dos Direitos Humanos foi adotada em 15 de setembro de 1994, e
sua primeira versão não foi ratificada por nenhum dos países signatários. Dez anos
depois, fez-se necessária sua atualização em um esforço para modernizar a Liga,
acusada por estudiosos como de irrelevante ação21. Sendo assim, em 15 de março de
2008, a Carta foi finalmente declarada vigente.
A principal lacuna deixada pela Carta de 1994 foi em relação aos mecanismos de
reforço para o cumprimento dos direitos nela declarados, que não foram explicitados em
seu texto, deixando margens à não-eficácia do texto concebido. Sendo assim,
organismos internacionais e acadêmicos pressionaram a Liga a adotar nova posição,
tomando por base as convenções europeias de direitos humanos e a Carta Africana dos
Direitos Humanos. Em 2004, durante a revisão e atualização do texto, as expectativas
dos que temiam por sua eficácia foram frustradas, pois novamente não foi apresentado
mecanismo concreto de reforço aos valores estabelecidos, segundo Mohammed Amin
Al-Midani22, acadêmico da Universidade de Estrasburgo, França. Ficou estabelecido

19
Artigo sexto, idem.
20
Artigo décimo segundo, idem.
21
O doutor Bruce Maddy-Weitzman, da Universidade de TelAviv, cita a cúpula de 2004 na Tunísia, onde
a Liga proclamou seu comprometimento quanto a reformas no âmbito político com o estabelecimento de
práticas democráticas e o encorajamento da participação dos cidadãos na vida política e social. O que foi
visto, entretanto, foi o comprometimento da habilidade e compromisso de tais governos para que fosse
iniciado algum processo de reforma. MADDY-WEITZMAN, Bruce. The Arab League Comes Alive.
Middle East Quarterly, Filadélfia, n. 3, p.71-78, 2012.Trimestral.
22
AL-MIDANI, Mohammed Amin.The Enforcement Mechanisms of the Arab Charter on Human
Rights and the Need for an Arab Court of Human Rights. In: REGIONAL HUMAN RIGHTS
MECHANISMS THE EUROPEAN CONVENTION AND THE ARAB CHARTER, 2008, Bolonha,
Itália. The Enforcement Mechanisms of the Arab Charter on Human Rights and the Need for an Arab
Court of Human Rights. Bolonha, Itália: Johns Hopkins University Sais Bologna Center, 2008. v. 1, p. 1 -
1. Disponível em: <http://www.acihl.org/articles.htm?article_id=22>. Acesso em: 11 maio 2013. Página
em inglês.
17

pelo documento a transferência aos países signatários da incumbência de garantir a


eficácia de tais princípios, por meio de manobras legislativas ou não legislativas23.
Afirmando os princípios contidos na Carta das Nações Unidas, na Declaração
Universal dos Direitos Humanos, nos Pactos Internacionais dos Direitos Humanos e na
Declaração do Cairo sobre Direitos Humanos no Islã, o documento posterior possui 53
artigos, com as temáticas de direitos individuais, as regras de justiça, os direitos civis e
políticos, além de direitos sociais, econômicos e culturais.
Em seu preâmbulo, fica clara a noção religiosa –islâmica – dos direitos
humanos, onde é ressaltada a dignidade da pessoa humana como principal valor, além
da liberdade, justiça e igualdade inerentes a todos os seres humanos. É ressaltada a luta
árabe por liberdade e autodeterminação, bem como a rejeição a qualquer forma de
discriminação – em especial o sionismo24.
O texto da Carta trata do valor do indivíduo árabe perante sua sociedade, cujo
bem-estar deve ser colocado em primeiro lugar, e que, por sua vez, deve respeitar as leis
e a cultura de onde vive, sendo este apegado à sua terra e história. Todos os direitos
humanos são tidos como universais, indivisíveis, independentes einter-relacionados25.
Dessa forma, são reafirmadas as soberanias nacionais de tais países quanto a
seus recursos naturais, sistemas políticos e obtenção de desenvolvimento econômico,
social e cultural. Todos têm o direito à soberania, e, mais importante, todos têm o direito
de resistir a ocupações estrangeiras26.
A liberdade é garantida sem distinção de sexo, raça, cor, idioma, crença
religiosa, opinião, pensamento, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou
deficiência física ou mental27. Cabe aos Estados signatários da Carta a criação de
mecanismos que assegurem o cumprimento de tais preceitos. É ressaltada a igualdade
entre homens e mulheres quanto à dignidade, direitos e obrigações28, entretanto, há a

23
Artigo quadragésimo quarto da Carta Árabe dos Direitos Humanos.ARAB Charter on Human Rights
Disponívelem: <http://www1.umn.edu/humanrts/instree/arabhrcharter.html>. Acesso em: 13 maio 2013.
Página em inglês.
24
„„Movimento político e religioso judaico iniciado no séc. XIX, que visava ao restabelecimento, na
Palestina, de um Estado judaico, e que se tornou vitorioso em maio de 1948, quando foi proclamado o
Estado de Israel‟‟. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua
Portuguesa. In: FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua
Portuguesa. Brasil: Editora Positivo, 2010.
25
Artigo primeiro da Carta Árabe dos Direitos Humanos.ARAB Charter on Human Rights Disponívelem:
<http://www1.umn.edu/humanrts/instree/arabhrcharter.html>. Acesso em: 15 maio 2013. Página em
inglês.
26
Artigo segundo, idem.
27
Artigo terceiro, idem.
28
Artigo segundo, idem.
18

ressalva29 de que esta deve se dar dentro dos princípios estabelecidos pela Charia30, que
traz distinções nas funções sociais dos homens e das mulheres.
Tais direitos são revogáveis em caso de situações de emergência excepcional,
entretanto, alguns são impassíveis de revogação, tais como o direito à vida 31; o da não-
subjeção à tortura32; o da proibição do uso do corpo sem total consentimento (em caso
de experimentos médicos e científicos, ou mesmo tráfico de órgãos)33; o da proibição da
escravidão34; o de um julgamento justo e com garantias, de preferência público35; o da
legalidade da prisão, que deve ser provada36; o do princípio da legalidade (toda pena
provém da lei), junto à aplicação da lei mais favorável ao réu37; o da proibição da prisão
por dívidas38; o do julgamento único por ofensa e o da indenização em caso de
inocência39; o do tratamento humanizado em relação aos presos40; o do reconhecimento
como pessoa diante da lei41; o da proibição do exílio ou da obrigação de moradia em
alguma parte do país42; o do asilo político43; o direito à nacionalidade44; o da liberdade
de pensamento e opinião45.
De grande importância para a nova versão são os artigos que tratam da igualdade
entre homens e mulheres, dos direitos dos idosos e dos direitos da criança46, que devem
ser protegidas pelos Estados47e privadas da pena de morte48.
Atualmente, o Comitê de Direitos Humanos é formado por sete dos países
membros, que recebem relatórios periódicos de todos os Estados da Liga. É notório o
desrespeito por parte da política dos países do grupo à Carta da Liga dos Estados

29
Preâmbulo, idem.
30
Charia: conjunto de leis de fonte religiosa do povo islâmico, sendo a maior fonte de jurisprudência por
eles conhecida.
31
Artigo quinto da Carta Árabe dos Direitos Humanos.ARAB Charter on Human Rights Disponívelem:
<http://www1.umn.edu/humanrts/instree/arabhrcharter.html>. Acesso em: 15 maio 2013. Página em
inglês.
32
Artigo oitavo, idem.
33
Artigo nono, idem.
34
Artigo 10º, idem.
35
Artigo 13º, idem.
36
Artigo 14º, idem.
37
Artigo 15º, idem.
38
Artigo 18º, idem.
39
Artigo 19º, idem.
40
Artigo 20º, idem.
41
Artigo 22º, idem.
42
Artigo 27º, idem.
43
Artigo 28º, idem.
44
Artigo 29º, idem.
45
Artigo 30º, idem.
46
Artigo 38º, idem.
47
Artigo 38º, idem.
48
Artigo 12º, idem.
19

Árabes49, que traz os direitos humanos impassíveis de revogação em casos de


emergência excepcional, como veremos no tocante à Síria, por exemplo, mais adiante
neste Guia de Estudos.

4.3.Resolução nº 7446 de 12 de fevereiro de 201250


Em mais uma sessão extraordinária, a Liga dos Estados Árabes reforça que
precisa de ajuda para combater o governo de Assad na Síria. Em medida extraordinária,
pede ao Conselho de Segurança da ONU a adoção de resolução que ponha fim aos atos
de violência contra civis, considerando uma possível intervenção militar em conjunto
com não árabes em um país-membro da Liga51 (ainda que suspenso). Tal decisão vai de
encontro à consolidada refusa da Liga em aceitar apoio externo em suas ações52, de
forma a manter intacta a soberania de seus países e a primazia dos interessesinerentes ao
mundo árabe, sendo assim, o comitê demonstra a urgência de um cessar-fogo para a
situação na Síria.
O apoio da Liga Árabe à oposição síria foi demonstrado por meio do pedido de
qualquer forma de ajuda internacional – política ou financeira – à Coalizão Nacional
Síria. Contra o atual governo, a principal medida tomada foi o pedido de interrupção de
qualquer tipo de cooperação diplomática com seus representantes, o que levou muitos
Estados árabes a fecharem suas embaixadas no país.

4.4.Resolução de 24 de março de 201353


Em reunião em Doha, Qatar, foi decidido pela Liga Árabe que o assento da
representação síria na Liga seria cedido à Coalizão Nacional Síria na cúpula seguinte da
organização, que estava marcada para o dia 27 de março.
De grande repercussão, esse importante passo tomado pela Liga não foi de
aceitação geral, porém, a resolução do conflito é de prioridade para a organização, haja

49
Artigo quarto da Carta Árabe dos Direitos Humanos.
50
ÁRABE, Liga. Resolução de 12 de fevereiro de 2012. Disponível em:
<http://fanack.com/fileadmin/user_upload/Documenten/Links/Syria/AL_Res._7446.pdf>. Acesso em: 28
jul. 2013.
51
Artigo quinto, idem.
52
DANIN, Robert M. The Arab League Doubles Down Against Bashar. Disponível em:
<http://blogs.cfr.org/danin/2012/02/13/the-arab-league-doubles-down-against-bashar/>. Acesso em: 27
jul. 2013. Página em inglês.
53
ONU, Relatório da.Arab League draft resolution on Syria in the General Assembly. Disponível em:
<http://un-report.blogspot.com.br/2012/07/arab-league-draft-resolution-on-syria.html>. Acesso em: 28
jul. 2013. Página em inglês.
20

vista os 70 mil mortos que o embate deixou, e tal decisão teve o objetivo de acelerar a
busca por uma solução, se tratando assim de um caso excepcional. A Argélia e o Iraque
apresentaram reservas, enquanto o Líbano não ratificou o documento. Segundo o Iraque,
a Liga representa os Estados árabes, e não suas oposições54.
Como representante da Síria, a Coalizão Nacional obteve o direito de armar seus
militantes, em razão da própria defesa, legitimando a resistência ao governo de Bashar
al-Assad.

4.5. Declaração de Doha55


A vigésima quarta cúpula da Liga dos Estados Árabes56, ocorrida em Doha, em
27 de março de 2013, teve como resultado a Declaração de Doha, que trata da visão
árabe dos diversos conflitos e preocupações de seu mundo, que tem suas bases abaladas
em meio a inúmeros conflitos de interesses em plano nacional, regional e internacional.
Enfatizando a solidariedade para com o povo líbio, o documento preza pela
preservação de sua soberania, independência e integridade territorial, aprovando as
tentativas puramente internas para a obtenção da estabilidade.
Foi expresso o comprometimento geral pela manutenção da unidade do Iêmen,
também acompanhado da característica rejeição por parte da Liga com relação a
interferências internacionais.
A perpetuação da ocupação iraniana de terras dos Emirados Árabes Unidos foi
condenada, por ameaçar a segurança e estabilidade nas regiões e por consistir em
violação da soberania dos Emirados Árabes. As medidas tomadas pelo último, a fim de
restaurar sua soberania, são apoiadas pela Liga, desde que se dêem de forma pacífica.
O governo do Líbano é aqui apoiado e recebe ajuda militar para manter sua
soberania por meio do reforço dado à capacitação do exército libanês e suas forças de
segurança.

54
ARABIYA, Al. ArabLeagueallowsmemberstatestoarmSyrianopposition. Disponível em:
<http://english.alarabiya.net/en/News/2013/03/06/Arab-League-denies-giving-Syrian-National-Coalition-
a-seat.html>. Acesso em: 28 jul. 2013.Página em inglês.
55
ÁRABE, Liga. ArabLeagueIssues Doha Declaration. Disponível em:
<http://arableaguesummit2013.qatarconferences.org/news/news-details-17.html>. Acesso em: 28 jul.
2013. Página em inglês.
56
ARAB LeagueSummit 2013 Disponível em: <http://arableaguesummit2013.qatarconferences.org/>.
Acesso em: 10 maio 2013. Página em inglês.
21

Em relação à Síria, foram novamente condenadas as violências e ameaças


praticadas pelo governo, ressaltando a ilegal escalação de militares e os continuados
massacres de civis.
Ainda que esta não tenha sido a opinião geral dentro do comitê, o documento
traz como bem-vinda a tomada do assento da representação síria na Liga Árabe por
parte da Coalizão Nacional, reforçando o caráter prioritário que o conflito apresenta à
comunidade árabe e demonstrando o poder de cada Estado de se defender – mesmo que
contra seu soberano. Foi requisitada uma conferência internacional para a reconstrução
do país, com a ajuda da comunidade internacional para a obtenção da justiça e
equilíbrio, num gesto surpreendente de apoio da Liga à população revoltosa de um de
seus membros, que assume, por fim, sua soberania.

5. FORMAÇÃO DOS ESTADOS ÁRABES

Antes de falarmos sobre o surgimento e formação dos Estados árabes, devemos


primeiro abordar alguns aspectos históricos, entender, mesmo que superficialmente, um
pouco sobre a religião que moldou, tenha sido pela sua presença direta ou indireta, a
construção dessas nações. Muitos dos países árabes foram e são até hoje comandados
por partidos islâmicos, variando, de país a país, ao longo dos anos, o nível de
conservadorismo e assim toda a sua estrutura política, seus direitos individuais, sua
forma de ser visto pelo mundo57.
Alá é o deus da religião Islâmica. Onipresente, onipotente e onisciente,
características presentes em outras divindades de religiões monoteístas, sua imagem
desperta o interesse de muitos. Assim como os seguidores de outras religiões, os
muçulmanos acreditam que ele recompensa os que praticam o bem e pune os que
causam o mal. Acreditam, também, que a obediência dos crentes não deve ser motivada
pelo sentimento do medo, mas que ela deve ser espontânea, fruto da percepção de que
seu Deus é bondoso e misericordioso.
Maomé foi o último profeta do Islã. Não se sabe ao certo, porém, o ano de seu
nascimento, com fontes que variam de 560 a 580. Sabe-se, com certeza, apenas que ele
nasceu em Meca, como membro da tribo dos Quarashi e do clã Hashim. Veio ao mundo
órfão de pai e, aos seis anos, perdeu sua mãe, sendo deixado aos cuidados do avô que,

57
CAABA. Disponível em: <http://www.mundoislamico.com/caaba.htm>. Acesso em 8 abr. 2013.
22

na época, era o guardião da Caaba58. Aos oito anos, perdeu seu avô e passou a viver
com seu tio e líder da tribo, Abu Talib. Foi nessa época que aprendeu a arte do
comércio, tendo os primeiros relatos de sua natureza iluminada surgido através de uma
viagem de negócios59.
Na “Noite do Poder”, como depois ficou conhecida pelos muçulmanos, no mês
do Ramadão, durante o ano de 610, Maomé recebeu o chamado de Alá, por intermédio
do Anjo Gabriel. Maomé, então, percebeu que era o escolhido para difundir essa nova
religião. No começo, os habitantes ricos de Meca não se entusiasmaram com esse
acontecimento, muito pelo contrário: Maomé foi perseguido por difundir ideias que iam
contra os interesses econômicos e políticos dos poderosos da cidade.
Em 622, ocorreu a Hégira, a saída de Maomé, sua família e seus seguidores em
direção à cidade de Yathrib. Lá, operou como mediador entre duas tribos locais e,
assim, ganhou sua confiança, conseguindo, a partir daí, unir os grupos políticos em um
único bloco, abraçando o Islã como a sua religião e ele como chefe político e religioso.
Essa comunidade ganhou o nome de Umma, e a cidade, mais tarde, ficou conhecida
como “cidade do Profeta‟‟ – Medina.
O tempo passou, as empreitadas contra a vida do Profeta e as batalhas vieram.
Porém, em uma reviravolta de eventos, Maomé e seus seguidores tomaram Meca. Esse
fato, por si só, conseguiu atrair mais seguidores para o Islã. Contudo, tempos sombrios
pairavam sobre o horizonte da religião. Em 632, o que parecia ser um simples estado
febril acaba por levar Maomé, o Profeta, à morte. A disputa pela sucessão da Umma
gerou a primeira e mais importante divisão no seio do Islã, dando origem às duas
“famílias” desta religião: os Sunitas, fiéis a Abu Bakr, sogro do Profeta; e os Xiitas,
seguidores de Ali Ibn Abu Talib, primo de Maomé60.
Os primeiros, a qual pertencem cerca de 85%61 dos muçulmanos, são reticentes
em relação aos excessos cometidos pelos extremistas de todas as tendências. Acreditam,
também, que a missão de revelar as leis de Alá acabou com Maomé, além de rejeitar a
tradição popular árabe de cultuar túmulos de santos, visto que não é uma prática
islâmica, considerada por eles um desvio perigoso do verdadeiro louvor a Alá.

58
SILVA, Teresa de Almeida e. Islão e fundamentalismo Islâmico: das origens ao século XXI. Lisboa:
Pactor, 2011, p. 9.
59
Idem, p. 10.
60
Idem, p. 14
61
Idem, p. 23
23

Os Xiitas, por outro lado, acreditam que Alá não deixaria de se fazer presente,
iluminando os seus lideres, e que esses teriam sim a legitimidade para interpretar o
Alcorão. Também creem que a interação com os santos é uma parte fundamental do
plano para a salvação dos crentes. Esta segunda família ainda se ramifica entre
Kharijitas, Zayditas e os fieis a ImamJafaral-Sadiq. Este último grupo, então, se divide
entre Imamitas (Duodecimanos) e Ismaelitas (Septimanos), que, por sua vez, também se
ramifica62.
Apesar de todas as diferenças entre essas duas famílias religiosas, seus
seguidores obedecem fielmente aos que são chamados de os Cinco Pilares do Islã: a
profissão de fé (Shehada), a oração (Salat), a esmola legal (Zakat), o jejum (Swam) e a
peregrinação (Hajj). Os ativistas radicais ainda acrescentam mais uma pilar aos
princípios basilares da religião, a Jihad (traduzida por muitos como “guerra santa”)63.
Agora que já descrevemos brevemente esta que é uma das religiões mais
complexas e emblemáticas da atualidade, e a que mais cresce em número de seguidores
no mundo, podemos começar a entender um pouco a respeito de como se deu a
formação dos Estados árabes, desde suas origens coloniais e suas revoltas contra as
capitais, até os levantes que moldaram os países até o final do século XX.
Os países sobre os quais iremos tratar localizam-se entre a Península Árabe
(Arábia Saudita, Iêmen, Omã, Emirados Árabes, Qatar, Bahreim e Kuwait), o Crescente
Fértil (Egito, Israel, Palestina, Jordânia, Líbano, Síria e Iraque), o Magreb (Líbia,
Tunísia, Argélia e Marrocos) e os países do chifre da África que integram a Liga Árabe
(Sudão, Eritreia, Djibuti e Somália).
O Oriente Médio foi o berço das primeiras civilizações, na região do Crescente
Fértil, e representa a área de encontro entre os continentes europeu, africano e asiático.
As terras que antes eram divididas entre várias tribos árabes e suas monarquias foram
conquistadas, no século XV, pelo Império Turco Otomano. Já na segunda metade do
século XIX, com a decadência do império Turco, os olhos das duas grandes potências
da época foram atraídos para lá: Inglaterra e França, que se encontravam em plena
segunda revolução industrial e miravam o petróleo da região.
Eram tempos de guerra, e alianças tinham que ser formadas. Em 1915, a
Inglaterra negociou apoio à independência das províncias árabes dos desertos do
Oriente Médio que se encontravam sob o domínio da Turquia (que era aliada da

62
Idem,p. 35
63
Idem, ps. 47 a 58
24

Alemanha) e, no ano seguinte, o Xerife Hussein conquistou a cidade sagrada de Meca.


Ao mesmo tempo, ingleses e franceses assinavam o acordo de Sykes-Picot64, dividindo
o Crescente Fértil entre eles: Palestina, Transjordânia e Iraque aos primeiros; e Líbia e
Síria, aos segundos. Aos aliados ingleses da família Hussein, caberia a Península
Arábica, o que ia contra as expectativas dos Hussein, já que esses pretendiam criar uma
única nação árabe, abrangendo o Crescente Fértil e a Península Arábica. No ano
seguinte, para deter qualquer tipo de aliciação dos judeus por parte dos alemães, os
ingleses divulgam a Declaração de Balfour65, acordando a criação de um lar nacional
para os judeus na Palestina.
Com o fim da Primeira Guerra, levantes populares contra esse sistema colonial
eclodiram, mas surtiram pouco efeito físico e imediato, exceto na Turquia, onde um
nacionalismo modernizador (exatamente o medo dos ingleses) subiu ao poder,
atualizando as estruturas políticas e sociais do país. Um destino um pouco diferente da
Síria e da Líbia, que, no ano de 1920, passaram a ser mandato francês 66. A Inglaterra,
por sua vez, colocou os filhos do Xerife Hussein, Faissal e Abdallah, nos tronos do
Iraque e Transjordânia, respectivamente. O destino de Hussein, porém, não seria tão
fácil: foi derrotado por IbmSaud, que uniu seus territórios em 1932, construindo um
reino que posteriormente viria a ser conhecido como Arábia Saudita. O Egito também
mostrava sinais de revolta. Após pressão popular organizada pelo partido wafd, a
Inglaterra concedeu uma independência formal ao país, mas ainda mantendo sua
presença econômica e militar (especialmente no Canal de Suez e no Porto de
Alexandria)67.
O anticolonialismo já se fazia presente e ganhava força e, graças à Arábia
Saudita, que abriu as portas para a exploração de seu petróleo por empresas norte-
americanas, outro sentimento se agregava a ele: um antagonismo anglo-americano
movido pelo controle do petróleo na região68.

64
PAYNE, David. 2008. The Sykes-Picot Agreement and the Balfour Declaration.Disponível em:
<http://www.westernfrontassociation.com/great-war-people/politics/political-intrigue/378-sykes-picot-
balfour.html>. Acesso em 8 abr. 2013. Documento em inglês.
65
Para saber mais: <http://pt.goldenmap.com/Declara%C3%A7%C3%A3o_de_Balfour>. Acesso em: 07
de maio de 2013.
66
Para saber mais: <http://www.mideastweb.org/leaguemand.htm>. Acesso em: 07 de maio de 2013.
Documento em inglês.
67
VISENTINI, Paulo Fagundes. A Primavera Árabe: Entre a democracia e a geopolítica do petróleo.
Porto Alegre: Leitura XXI, 2012.
68
Idem.
25

Após a Primeira Guerra Mundial, a perseguição aos judeus, que já vinha desde a
Rússia Czarista, se agravou. Desde a elaboração do ChoweweZion69, ondas migratórias
de judeus se dirigiam à Palestina, ocupando terras compradas pela Agência Judaica70 e
formando comunidades chamadas de Kibbutz (fazendas coletivas militarmente
fortificadas). Não obstante, mantinham, também, organizações armadas e até terroristas
que serviam como forma de defesa contra os palestinos (árabes) e a ainda presente
autoridade britânica. O fluxo de imigrantes, que antes era controlado, ganhou
proporções monstruosas com a Segunda Guerra Mundial e a perseguição aos judeus
pelo regime nazista, o que resultou em um levante palestino (1936-1939). Porém, sem
uma liderança firme, o movimento acabou sendo reprimido. O movimento Sionista
buscava a criação de um Estado Judeu na Palestina, funcionando como combustível
para o sentimento nacionalista dos árabes palestinos.
A Sérvia e o Líbano, além da Transjordânia, já haviam se separado da França e
Inglaterra, respectivamente, até o ano de 1946. Contudo, um fato ocorrido um ano antes
viria a dar um impulso aos países árabes:em março de 1945 foi criada, no Cairo, a Liga
dos Estados Árabes, sendo seus membros fundadores a Arábia Saudita, Egito, Iraque,
Iêmen, Líbano, Síria e Transjordânia.
Em 1947, foi aprovado o Plano de Partilha da Palestina71, em que ficou acordada
a divisão da região e a extinção do mandato britânico. Os judeus aceitaram, embora
receosos, as especificações geográficas do Plano, o que não ocorreu pela parte dos
árabes palestinos. O assassinato de um mediador da ONU e a consequente retirada
britânica da Palestina deixou um vazio no poder que, rapidamente, foi ocupado por
judeus, que declaram a criação do Estado de Israel. Os árabes palestinos, juntamente
com a Liga Árabe, entram em guerra contra os israelenses. No entanto, suas forças
foram rapidamente sobrepujadas pelo exército superior de Israel. Um primeiro cessar
fogo foi negociado e, cerca de um mês depois, foi quebrado, tendo sido instaurado
novamente pouco tempo depois. Entre dezembro de 1948 e janeiro de 1949, Israel
conquistou parte do território que cabia aos palestinos, ficando com 80% da Palestina.
Os árabes palestinos, que dessa vez não contavam com o apoio de nenhum outro grupo,
69
KOENIG, Adolf. Historyofthe J.N.A.V. Hasmonaea in Czernowitz.Traduzido por Jerome Silverbush.
Disponível em: <http://www.jewishgen.org/yizkor/bukowinabook/buk1_113.html>. Acesso em: 14 abr.
2013. Documento em inglês.
70
Para saber mais: <http://www.jafi.org.il/JewishAgency/English/About/History>. Acesso em 7 de maio
de 2013. Documento em inglês
71
THE United Nationspartitionplan.Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/2001/meast_maps/1.shtml>. Acesso em 8 abr. 2013.
Documento em inglês.
26

acabaram fugindo do país para territórios vizinhos. Isso levou a Organização para
Libertação da Palestina (OLP) a ser criada em 196472, que seguiu sob controle egípcio
durante algum tempo.
O Egito se tornou totalmente livre das amarras coloniais em 1952, depoisde um
golpe militar liderado por Amal Abdul Nasser. Nasser foi o fundador de uma corrente
política que seria posteriormente chamada de Nasserismo73. Baseando-se em uma
burocracia civil-militar e fazendo uso da repressão, promoveu a reforma agrária,
investiu na educação e dificultou a vida da elite no país, já que se moldava em aspectos
socialistas. O presidente egípcio apoiou a guerra de independência da Argélia, ainda
colônia francesa, em 1954, criando mais um inimigo. Em 1956, sufocado por suas
promessas ao povo de seu país, Nasser viu na nacionalização do Canal de Suez uma
ótima oportunidade para angariar fundos para suas obras, desafiando os interesses dos
países colonialistas que agora lutavam desesperadamente para manter algum poder na
região. Israel se juntou à França e à Inglaterra, entrando em guerra contra o Egito74.
O que foi uma derrota militar para o país de Nasser (o Egito perdeu o Canal de
Suez e a Península do Sinai) acabou se tornando uma vitória no campo político. Os
soviéticos, aliados dos egípcios, lançaram um ultimato exigindo a retirada das tropas
inimigas dos territórios conquistados, sob ameaça de uma intervenção militar. Os
Estados Unidos da América (EUA) por sua vez, também pressionaram seus aliados a
deixar as áreas em questão. No final, Nasser se consolidou como a maior liderança no
Mundo Árabe, aumentando ainda mais a ideia da unificação dos países árabes. Porém, o
partido Baas aumentava cada vez mais o seu poder de influência.
Sem uma conotação marxista, ao contrário do Nasserismo, o Baas foi criado na
Síria, no começo dos anos 1920, e também pregava a unificação das nações árabes (a
conservação dos Estados existentes, sendo eles parte de uma mesma nação). Ao longo
do tempo, ambos os partidos acabaram virando autoritários e militarizados e, em 1954,
foi aberto o caminho para a participação política do Baas na Síria. Já no ano de 1961,
um golpe, realizado pela corrente esquerdista do Baas, colocou o partido no poder da
Síria. Desenvolvimento econômico e modernização social fizeram com que o partido

72
CARTA DA OLP. Disponível em: <http://www.iris.org.il/plochart.htm>. Acesso em 8 abr. 2013.
Documento em inglês.
73
O Nasserismo, como foi chamado posteriormente, foi a ideologia política nacionalista árabe criada pelo
então presidente do Egito, Gamal Abdel Nasser. Essa linha de pensamento se baseava em um Estado
forte, controlador dos meios de produção, e na redistribuição de renda: o socialismo árabe.
74
VISENTINI, Paulo Fagundes. A Primavera Árabe: Entre a democracia e a geopolítica do petróleo.
Porto Alegre: Leitura XXI, 2012.
27

ganhasse mais adeptos, porém, a ausência de petróleo no país fez com que essas
mudanças fossem gradativas.
No começo no ano de 1958, uma revolta popular, acompanhada de um golpe de
Estado, derrubou a Monarquia Iraquiana, mas não consegue se consolidar, graças à
instabilidade interna e externa do país. Mais uma vez, ainda no mesmo ano, uma
corrente modernizadora do Baas conquistou o poder e se consolidou firmemente, tendo
como líderes Hassan al-Bakr e Saddan Hussein. Eles se concentram na evolução do
país, fundamentados no desenvolvimento industrial e na política de militarização.
Já no ano de 1965, ocorre na Líbia outro golpe militar, liderado pelo Coronel
Muammar Al-Kadafi. Dotado de uma visão progressista do Islã, implantou um
socialismo islâmico, modernizador, voltado para o bem estar social. A Líbia, como
detentora de recursos abundantes proeminentes do petróleo, era vista com maus olhos
pelos EUA, Israel e as petromonarquias75 (que também usavam o Islã, porém braços
conservadores, como forma de justificar seu governo e controlar a população).
No mesmo ano, chegava ao poder no Iêmen do Sul a esquerda Marxista. Outros
países, como Omã e os demais protetorados britânicos do Golfo Pérsico também
lutavam pela implantação de repúblicas democrático-populares de orientação socialista.
Isso obrigou a Inglaterra a contrair alianças com os sultões que ainda reinavam nesses
países, mantendo tropas nessas regiões até o início dos anos 1970 e só então
concedendo, a custo de protestos, e gradativamente, suas independências.
A Guerra dos Seis Dias76 teve como fruto dois desdobramentos de extrema
relevância: o enfraquecimento do governo de Nasser, já que este perdeu a guerra; e a
maior autonomia das organizações palestinas frente aos países árabes. Todavia, o
fortalecimento político, principalmente os de via Marxista, e militar dos palestinos
começava a preocupar o rei Hussein, da Jordânia, que não via com bons olhos o
fortalecimento de um poder paralelo ao seu dentro de seu território (nessa época, a
maior parte dos refugiados palestinos se encontrava lá). Foi o medo de não ser o único
poder no país que o impeliu a deslocar o Exército Real para os campos de refugiados
palestinos dentro do seu território e começar um massacre. As ordens eram de caçar
apenas os fedayins(guerrilheiros palestinos), porém, o resultado foi uma chacina com

75
Termo galgado para indicar monarquias, em sua maioria árabes, cuja maior fonte de renda e poder seja
eminente da exploração petrolífera. Para saber mais VISENTINI, Paulo Fagundes. A Primavera Árabe:
Entre a democracia e a geopolítica do petróleo. Porto Alegre: Leitura XXI, 2012.
76
SHARPE, Victor. 2012. The Six-Day War: Israel’s miraculous
Victory.<http://www.americanthinker.com/2012/06/the_six-day_war_israels_miraculous_victory.html>.
Acesso em 07 de maio de 2013. Documento em inglês.
28

mais de 10 mil mortes e que ficou conhecida como Setembro Negro. A massa de
refugiados foi empurrada para fora do país em direção ao Líbano, adicionando mais um
poder na equação deste país, aumentando ainda mais a desigualdade já existente. Isso
levou o Líbano a uma guerra civil com intervenções da Síria e de Israel.
Em 1973, impulsionados, entre outros motivos, pela situação econômica de seus
países, os governos de Egito e Síria declaram guerra a Israel (guerra do YomKippur77).
À primeira vista, a empreitada organizada por esses dois países surtiu efeito,
conquistando parte dos territórios que foram perdidos anteriormente para Israel durante
a Guerra dos Seis Dias. Entretanto, as forças israelenses, apoiadas pelo governo norte-
americano, conseguiram reverter a situação, expulsando os invasores de suas terras. E
apesar de ter ganhado esse conflito, a batalha trouxe, aos olhos do mundo árabe, a
certeza de que Israel não era invencível. Egito e Síria, portanto, acabaram ganhando no
plano político e psicológico. Dessa forma, em 1974, Israel entrega o controle do Canal
de Suez de volta ao governo egípcio.
Posteriormente, em 1979, foi firmado o Tratado de Paz de Camp David78, que
acordava a devolução do Sinai ao Egito e a liberação do Canal de Suez e do Golfo de
Ákaba à livre navegação. Também por meio desse tratado, Egito e Israel recomeçaram
suas atividades diplomáticas entre si. Se, para o Egito, o acordo teve pontos negativos (a
expulsão do país da Liga Árabe, do Fundo Monetário Árabe e da Organização de Países
Exportadores de Petróleo), para Israel, foi muito mais proveitoso: neutralizou sua
principal ameaça militar e rompeu seu isolamento diplomático.
Ainda em 1979, o Aiatolá Khomeini chegava ao poder no Irã, fruto de uma onda
de revoltas contra o Xá Reza Pahlevi, aliado norte americano. As revoltas que haviam
começado no ano anterior eram resultado de vinte e cinco anos de ditadura do Xá, de
uma imensa desigualdade social e de uma crescente fermentação do sentimento islâmico
nacionalista contra a cultura ocidental. O fundamentalismo islâmico Xiita chega ao
poder, revivendo práticas obscuras.
No Afeganistão, em 1973, mais um golpe de Estado ocorreu, desta vez colocando
o príncipe Daud no poder, proclamando, assim, a República nesse país. Vale lembrar
que o país sempre mostrou ótimas relações com a URSS, sendo, inclusive, o primeiro
Estado a reconhecê-la, em 1919. Entretanto, frente a problemas econômicos, em 1978,

77
MISHAL, Nissim. 1998. Those Were the Years: Israel's Jubilee. Disponível em:
<http://www.torahweb.net/h4-yom-kipur-guerra >. Acesso em 8 abr. 2013
78
Para saber mais: <http://www.jimmycarterlibrary.gov/documents/campdavid/accords.phtml>. Acessado
em 07 de maio de 2013. Documento em inglês.
29

ocorre outro golpe, tendo como protagonistas os partidos da burguesia local, Khalq, e o
Partido Democrático do Povo Afegão (PDPA), tendo a liderança de Tanik. Porém, a
luta dentro do partido continuou e as disputas com o clero e a burguesia local também.
Isso fez com que Hafizullah Amin, também do Khalq, assassinasse Tanik e tomasse seu
lugar. Esse golpe, entretanto, foi de encontro aos interesses soviéticos. A URSS decidiu
intervir militarmente e apoiar um golpe para derrubar Amin, o que aconteceria em 29 de
setembro de 1979, deixando o Afeganistão no controle de Babrak Karmal.
Em 1980, o Iêmen do Sul, que se tornou independente em 1967, estreitava as
relações políticas com o bloco soviético, a mando de Ali Nasser Mohammed. Após
parcerias geológicas e, posteriormente, econômicas (descoberta, divisão e exploração de
petróleo da região), o Iêmen do Norte e do Sul se fundem em 1990, cumprindo um
acordo que fora firmado em 1973. Entretanto, um descontentamento com relação ao
número de representantes do que antes era o Iêmen do Sul gera um levante popular de
cunho separatista, que veio a ser brutalmente abafado pelas forças que antes
representavam o Iêmen do Norte.
Duas Guerras do Golfo, crises no petróleo, a internacionalização dos movimentos
separatistas (ataques terroristas) entre outros acontecimentos vieram nos anos que se
seguiram e seus efeitos ecoam até os dias de hoje.
Como podemos perceber, a formação e a consolidação dos Estados árabes se
deram na interseção de várias forças, muitas vezes com resultados drásticos: a
influência das potências europeias do século XIX, Inglaterra e França, explorando suas
colônias para obter delas o máximo de retorno econômico possível; a perseguição e
migração judaica para Israel e a consequente onda de refugiados palestinos; as
petromonarquias e as revoltas sociais; a briga pelo controle do petróleo e o jogo de
poderes do mundo divido na Guerra Fria. Todos esses fatores e outros foram decisivos
na construção desses Estados, cada um sendo uma variável nessa equação.

6. BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA QUESTÃO DO


PETRÓLEO NO ORIENTE MÉDIO

O Oriente Médio, região responsável por mais da metade do petróleo exportado e


detentor de mais de dois terços das reservas mundiais, tornou-se uma área de grande
interesse para o mundo ocidental e para o comércio internacional, como foi visto
30

anteriormente. Este é guardado, ao norte, por um “teto” terrestre (Turquia, Irã e


Afeganistão), e a leste, ao sul, e a oeste, por extensões marítimas e por um canal
estratégico79.
Uma boa parte dessas reservas está sob o controle político dos EUA, por meio de
regimes monárquicos que governam sob a sua tutela militar, como os da Arábia Saudita,
Kuwait e Emirados Árabes Unidos. Segundo o jornalista e professor Igor Fuser80, esse
controle político não significa domínio absoluto, pois tais países, integrantes da OPEP81,
costumam entrar em conflito com os interesses estadunidenses em questões comerciais
relativas ao preço e aos volumes de produção petrolífero82. É em decorrência disso que,
desde a década de 1970 – período em que dois choques do petróleo abalaram a
economia internacional por causa do aumento brusco de preço –, os EUA têm se
esforçado em ampliar o seu controle geopolítico no Oriente Médio, recorrendo não
somente a meios políticos, mas principalmente à presença militar.
Nesse sentido, Fuser aponta que o interesse dos EUA está ligado a dois
problemas:

O primeiro é dependência da economia estadunidense em relação às


importações de combustíveis -- outrora o maior produtor e exportador
de petróleo, os EUA atualmente se vêem obrigados, devido ao
esgotamento das suas reservas, a importar mais de 60% do óleo que
consomem. O segundo problema se refere ao panorama mundial da
energia, marcado pelo desequilíbrio entre a oferta e a demanda de
combustíveis. Com o aumento geral do consumo de energia, cuja
causa principal é forte crescimento econômico em países como a
China e a Índia, cria-se uma situação em que os países produtores de
petróleo alcançam o limite da sua capacidade produtiva, o que deixa o
mercado na beira da escassez. Para evitar um colapso no fornecimento
de energia, o chamado "Ocidente" (EUA, Europa Ocidental e demais
países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico) exerce pressão sobre os demais produtores para que
ampliem a oferta de petróleo e gás natural na máxima capacidade
possível. Essas pressões se deparam com a resistência de governos
que adotam posturas nacionalistas em relação à produção e exportação
de petróleo, seja reduzindo a oferta a fim de elevar a renda das
exportações e de preservar as reservas para as gerações futuras, seja

79
ROCHE, Alexandre. O Oriente Médio pós-Guerra Fria: a geopolítica e o processo de paz Israel-OLP.
Ciências & Letras, Porto Alegre, n. 51, p. 19, jan./jun. 2012.
80
Autor do livro “Petróleo e Poder – O Envolvimento Militar dos Estados Unidos no Golfo Pérsico”,
Editora Unesp, 2008
81
Juntamente com Irã, Iraque, Venezuela, Qatar, Líbia, Argélia, Nigéria, Equador, e Angola. O Gabão
encerrou a sua participação em 1995, e a Indonésia está suspensa desde janeiro de 2009. Disponível em:
<http://www.opec.org/opec_web/en/about_us/25.htm>. Acesso em: 11 mai. 2013.
82
FUSER, Igor. A região ampliada do Oriente Médio guarda mais de 2/3 do petróleo do mundo. São
Paulo: 20 abr. 2011. Disponível em: <http://www.icarabe.org/entrevistas/a-regiao-ampliada-do-oriente-
medio-guarda-mais-de-23-das>. Acesso em: 10 abr. 2013. Entrevista concedida a Ana Maria Strauber.
31

destinando a maior parte da renda para gastos sociais, como faz a


Venezuela, em vez de investir esse dinheiro no aumento da
produção.83

Observa-se, portanto, que a situação política, econômica e social dessa área é


afetada diretamente pela geopolítica do petróleo, o que, em conjunto com os problemas
territoriais e religiosos, gera grande instabilidade na região, tanto pelos seus conflitos
internos, quanto pelas intervenções militares externas.
Vale ressaltar que a extinta União Soviética, por sua vez, também buscou
dominar as regiões estratégicas do Oriente Médio durante o período da Guerra Fria,
visando desequilibrar as posições do capitalismo americano84. Contudo, o colapso
soviético, em dezembro de 1991, facilitou o fortalecimento do domínio estadunidense
na região.
Instaura-se, portanto, uma questão extremamente complexa e perigosa e que
necessita de muita cautela e atenção, pois a partir do momento em que se aceita a
legitimidade das intervenções militares estrangeiras, haverá o consentimento de um
direito de ingerência, pelo qual as grandes potências poderão recorrer naqueles casos em
que o seu exercício lhes parecer adequado. Isso porque o poder político dos Estados e
suas diferentes visões de como o mundo deve ser ordenado possuem íntima ligação com
as divergências existentes sobre a legalidade de determinados tipos de intervenção.
Face ao exposto, abordar-se-ão, a seguir, alguns emblemáticos casos de
intervenção nas nações árabes, por parte, principalmente, dos Estados Unidos, desde o
século XX até a atualidade, em que se configura a Primavera Árabe.

7. AS INTERVENÇÕES MILITARES NO DIREITO


INTERNACIONAL

Neste tópico, analisaremos o fundamento jurídico da intervenção militar, seu


contexto de surgimento e, principalmente, sua regulação. Para isso, faremos uma
exposição sobre o direito de ingerência militar tanto no escopo das Nações Unidas, visto
que é nesse âmbito que é legitimado, ou não, internacionalmente o uso da força.

83
Idem.
84
HALLIDAY, F. The Middle East in International Relations: Power, Politics and Ideology. Cambridge:
Cambridge University Press, 2005. Resenha de: MAMEDE, A. P. R. A. O Oriente Médio nas Relações
Internacionais. Conjuntura Internacional, p. 2, 2010. Disponível em:
<http://www.pucminas.br/imagedb/conjuntura/CNO_ARQ_NOTIC20100504163228.pdf>. Acesso em: 9
maio 2013.
32

Desde logo, alertamos que não será possível analisar as ingerências militares
estrangeiras nos países árabes sem levar em consideração o aparato jurídico
internacional que as legitima ou que as condena. As resoluções produzidas pela Liga
Árabe, assim como aquelas produzidas por outras organizações regionais, estão
inseridas dentro do sistema normativo internacional e, por isso, não podem ir de
encontro às suas normas basilares, estando sua autonomia vinculada ao jus cogens85 e à
Carta da ONU.
Qualquer decisão que seja tomada no âmbito da Reunião de Cúpula deverá levar
em conta o artigo 10386 da Carta das Nações Unidas, que destaca a supremacia desta
sobre todos os acordos internacionais. Esta noção de norma impositiva, relativizando o
princípio da soberania dos Estados, anteriormente pétreo para o Direito Internacional,
surge a partir de um determinado contexto histórico, em que a necessidade de proteção
dos direitos humanos tornou-se evidente.

7.1 A relativização da soberania e a intervenção no âmbito das


Nações Unidas
A descoberta da face mais brutal do Nazismo, o Holocausto, com o fim da
Segunda Guerra Mundial, em 1945, horrorizou a sociedade internacional. Esta, por
meio da criação das Nações Unidas, no mesmo ano, decidiu criar meios coercitivos que
evitassem novos episódios de massacre e genocídio.
Sendo assim, em 1948, a legislação sobre direitos humanos, que antes era restrita
ao ordenamento interno de alguns países, tornou-se global por meio da Declaração
Universal dos Direitos Humanos. Como bem pontua Mazzuoli87, o contexto de
sensibilização do pós-1945 fomentou o desenvolvimento de um Direito Internacional
dos Direitos Humanos que já havia sido posto em destaque em outros momentos
históricos, principalmente após guerras, mas que nunca havia encontrado solo fértil para
se desenvolver, por sempre esbarrar na questão da soberania inabalável dos Estados.
Em paralelo, consolida-se na Carta da ONU o princípio da proibição da guerra
surgido no Pacto Briand-Kellog, assinado em 1928. Sendo assim, tendo em vista o

85
Jus cogenssão um conjunto de regras imperativas e inderrogáveis às quais todos os tratados
internacionais (lato sensu) estão submetidos, como definem o artigo 53 e 64 da Convenção de Viena
sobre o Direito dos Tratados de 1969.
86
“No caso de conflito entre as obrigações de Membros das Nações Unidas, em virtude da presente Carta
e as obrigações resultantes de qualquer outro acordo internacional, prevalecerão as obrigações assumidas
em virtude da presente carta”(artigo 103º da Carta das Nações Unidas)
87
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 6. ed. São Paulo: Revista
Dos Tribunais, 2012. p. 833
33

artigo 2o, parágrafos 3o e 4o da Carta da ONU88, o uso da força deixa de ser um direito
do Estado de impor sua vontade sobre os demais, passando a ser um ilícito
internacional89. No entanto, é importante ressaltar que o jus ad bellum, direito de
promover a guerra, continuou válido em casos de legítima defesa de direitos
fundamentada por uma agressão injusta90 ou por um perigo de dano atual e iminente91.
Dessa forma, percebe-se que há uma limitação do uso da força militar, princípio
evidente no direito internacional pós-1945. No entanto, vigora uma exceção a esse
princípio no que concerne à atuação de organizações internacionais na coibição de
excessos estatais que culminem em ameaça ou em violação da segurança das relações
internacionais92, como será mais bem explicado adiante.
Essa limitação, além de evitar novas guerras, também buscou preservar a
soberania e a igualdade entre os Estados. Esta se expressa no parágrafo 1 o do artigo 2o
da Carta da ONU, que dispõe “A Organização é baseada no princípio da igualdade de
todos os seus membros”, enquanto a soberania ficou protegida pelo parágrafo 7 o do
mesmo princípio, que expressa:

Nenhum dispositivo da presente Carta autorizará as Nações Unidas a


intervirem em assuntos que dependam essencialmente da jurisdição de
qualquer Estado ou obrigará os Membros a submeterem tais assuntos a
uma solução, nos termos da presente Carta; este princípio, porém, não
prejudicará a aplicação das medidas coercitivas constantes no Capítulo
VII93.

Segundo Krasner, a soberania é definida por quatro características determinadas


a partir da relação do Estado com a sua população e com a sociedade internacional. A
primeira seria a chamada soberania doméstica, que está vinculada ao monopólio estatal
do uso da violência; a segunda é a soberania interdependente, que corresponde à
88
“Art. 2o: A Organização e seus Membros, para a realização dos propósitos mencionados
Artigo 1, agirão de acordo com os seguintes Princípios (...)
3. Todos os Membros deverão resolver suas controvérsias internacionais por meios pacíficos, de
modo que não sejam ameaçadas a paz, a segurança e a justiça internacionais.
4. Todos os Membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da
força contra a integridade territorial ou a dependência política de qualquer Estado, ou qualquer
outra ação incompatível com os Propósitos das Nações Unidas.
89
Idem p. 1099
90
A Resolução no 3.314 da Assembleia Geral das Nações Unidas define “agressão” em seu artigo 1 o:
“Agressão é o uso de força armada por um Estado contra a soberania, integridade territorial ou
independência política de outro Estado, ou qualquer outra atitude que seja inconsistente com a Carta das
Nações Unidas, conforme determinado por esta definição.”
91
PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito Internacional Público e Privado. 4. ed. Salvador:
Juspodvm, 2012. p. 607
92
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 6. ed. São Paulo: Revista
Dos Tribunais, 2012. p. 1099
93
Artigo 2o, parágrafo 7o da Carta da ONU.
34

capacidade do Estado em manter o controle do fluxo de bens, capitais, mercadorias e


pessoas em suas fronteiras transnacionais; em seguida, a soberania internacional legal
que está relacionada ao reconhecimento do Estado por outros Estados e pelas
organizações internacionais governamentais; enfim, a soberania Vestifaliana94, que
está relacionada ao princípio da não-intervenção de outros Estados em assuntos
internos95.
O princípio da não-intervenção foi citado pela primeira vez por Kant em sua
obra Ensaio Filosófico Sobre a Paz Perpétua (1795). Desde então, o princípio passou a
ser incorporado às convenções internacionais, especialmente, em âmbito americano,
como no caso da Convenção sobre Direitos e Deveres dos Estados (Montevidéu, 1933)
e do protocolo adicional da Convenção de Consolidação da Paz (Buenos Aires, 1936)96.
Para entender melhor este princípio, devemos, antes de tudo, conceituar a
intervenção. Segundo Hedley Bull, a intervenção é uma interferência forçada impetrada
por uma ou mais partes na esfera de jurisdição de um estado soberano97. Sendo assim,
percebemos que a intervenção é composta por três elementos: a ingerência sem o
consentimento da autoridade do local objeto da intervenção, podendo aquela ser
unilateral ou coletiva e, por fim, ocorrendo em um Estado dotado de soberania, conceito
detalhado anteriormente.
No entanto, como já foi explicitado alhures, a Carta da ONU traz limitações à
capacidade interventiva dos Estados e das organizações internacionais, por ser, o
princípio da não-intervenção, corolário dos direitos fundamentais dos Estados. Essa
capacidade interventiva fica restrita a algumas situações que serão analisadas a seguir.
A limitação da ingerência dos Estados e da própria ONU por força do artigo 2o,
parágrafo 7o está vinculada aos “assuntos que dependam essencialmente da jurisdição
de qualquer Estado”98. No entanto, no atual sistema de proteção dos direitos humanos,
alguns assuntos tipicamente internos passaram a ser de competência internacional. Entre
esses novos temas de responsabilidade conjunta da sociedade internacional, encontram-

94
Os Tratados de Westfália, firmados em 1648, pondo fim à Guerra dos Trinta Anos, representam um
marco do Direito internacional moderno uma vez que neles foi reconhecido, pela primeira vez, o princípio
da igualdade entre os Estados, formando-se assim uma sociedade internacional regulada por determinadas
regras derivadas de tal princípio.
95
RÉGIS, André. Intervenções Humanitárias, soberania e a emergência da Responsabilidade de Proteger
no Direito Internacional Humanitário. Prim@ Facie, João Pessoa, n., p.5-17, jul. 2009. p. 8-9
96
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. p. 493
97
ALMEIDA, João Marques de. International Political Theory and the Issue of Legitimate
Intervention. Nação e Defesa, Lisboa, n. 102, p.155-170, jul. 2002. P. 158
98
Artigo 2o parágrafo 7o
35

se os direitos humanos e as liberdades fundamentais, assim como imigração,


nacionalidade, trabalho e armamentos, que deixaram de ser considerados assuntos de
jurisdição interna99.
Vale ressaltar, ainda, que o dispositivo em estudo preconiza que não prejudicará
a aplicação das medidas previstas pelo Capítulo VII, e é pela análise desse capítulo da
Carta que enveredaremos agora.
O Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) é, por força do art. 24 da
Carta da ONU, o responsável pela manutenção da paz e da segurança internacionais.
Nesse sentido, o Capítulo VII do mesmo dispositivo atribui ao órgão a capacidade de
empregar meios coercitivos para salvaguardar os bens jurídicos internacionais que fora
designado para proteger.
Sendo assim, o artigo 39 do ato constitutivo das Nações Unidas atribui ao
Conselho de Segurança a capacidade de “determinar a existência de qualquer ameaça à
paz, ruptura de paz ou ato de agressão”. Segundo Jean-Marie Lambert100, a expressão
“ameaça à paz” engloba faltas menos graves, como declarações agressivas ou belicosas,
concentrações de tropas militares em regiões fronteiriças, ou outras atitudes ou
encadeamento de acontecimentos que possam vir a gerar uma situação de conflito
armado. No caso de “ruptura de paz”, já existe um confronto armado, apesar de não ser
possível a responsabilização de uma só parte. Por último, em caso de “atos de agressão”
existe um confronto militar em que está delineada a parte a qual deverá ser
responsabilizada. Este conceito também fora definido pela Resolução no3.314, emitida
pela Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU)101.
Apesar das tentativas de exemplificação do conceito de cada expressão utilizada
no artigo 39o, ainda persiste uma relativa discricionariedade no que tange à aplicação
destes “rótulos” ao caso concreto. Sendo assim, a ausência de um controle de legalidade
sobre os atos do Conselho de Segurança102 muitas vezes o torna um mecanismo de
legitimação da força pelas potências mundiais sobre os países mais fracos militar e
politicamente.
De toda forma, uma vez diagnosticada a existência das situações elencadas pelo
artigo 39º, o Conselho deverá elaborar recomendações ou decidir entre as medidas

99
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 6. ed. São Paulo: Revista
Dos Tribunais, 2012. p. 1072
100
Idem p. 1075
101
Ver nota de rodapé número 12.
102
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. p. 648
36

cabíveis, de acordo com os artigos 41º e 42º do mesmo instrumento. Estes artigos
relacionam-se, respectivamente, às medidas coercitivas não militares e militares, estas
só podendo ser levadas a cabo quando aquelas mostrarem-se insuficientes, como bem
ressalva o artigo 42o:

No caso de o Conselho de Segurança considerar que as medidas


previstas no artigo 41 seriam ou demonstraram que são inadequadas,
poderá levar a efeito, por meio de forças aéreas, navais ou terrestres,
ação que julgar necessária para manter ou restabelecer a paz e a
segurança internacionais. Tal ação poderá compreender
demonstrações, bloqueios e outras operações, por parte das forças
aéreas, navais ou terrestres dos membros das Nações Unidas.103

Sendo assim, percebe-se que o Capítulo VII oferece duas vias de ação para o
Conselho de Segurança. Como bem ressalta Antônio Patriota104, as possibilidades
apresentadas pelos dispositivos 41 e 42 expressam dois caminhos distintos para o
restabelecimento da paz: o isolamento e a intervenção. O isolamento pode ser
diplomático, de armas ou até comercial; já a intervenção dá-se pela utilização de forças
armadas chefiadas pelas Nações Unidas.105 Cabe ressaltar que ambas as medidas
poderão ser tomadas sem o consentimento do Estado afetado, por força do artigo 25o da
Carta da ONU, que obriga os membros da Organização a aceitar as decisões do
Conselho de Segurança.
No entanto, principalmente após a Guerra Fria, começou-se a defender outra
forma de relativização da soberania. A chamada intervenção humanitária foi defendida,
em 1999, pelo então Secretário-Geral das Nações Unidas, Kofi Annan, como um
imperativo na defesa dos Direitos Humanos que se sobrepunha à soberania dos
Estados106.
Para o então Secretário-Geral, seguindo a linha de raciocínio de outros analistas,
a manutenção da paz e segurança mundial perpassam pela capacidade dos Estados em
prover proteção aos seus cidadãos. Em caso de violação de direitos humanos, guerra
civil, fome ou genocídio,segundo essa nova corrente que se consolidou por meio do

103
Artigo 42 da Carta da ONU.
104
Disponível em:
<http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/2625(XXV)&Lang=E&Area=RESOLUTIO
N > Acesso em: 9 de Abr. 2013
105
PATRIOTA,Antônio de Aguiar. O Conselho de Segurança após a Guerra do Golfo: a articulação
de um novo paradigma de segurança coletiva. Brasília: Instituto Rio Branco; Fundação Alexandre de
Gusmão; Centro de Estudos Estratégicos, 1998.
106
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. p. 496
37

Secretário-Geral da ONU, a soberania restaria afastada e uma intervenção humanitária


seria cabível. Para esta corrente, o princípio da soberania não deve, jamais, ser utilizado
como escudo por regimes sanguinários ou por Estados que falharam no seu dever
originário de proteção de civis, pois esta resta fora da área de jurisdição interna
exclusiva107. Esta postura justificou as intervenções tanto na Somália quanto em
Ruanda.
Concluindo a análise do elemento normatizador das intervenções no sistema das
Nações Unidas, cabe ressaltar, também, as resoluções aprovadas pela Assembleia Geral
que tratam do princípio da não-intervenção. São estas a Declaração sobre a
Inadmissibilidade de Intervenção em Assuntos Internos de Estados e Proteção de sua
Soberania e Independência (1965)108; a Declaração sobre Princípios do Direito
Internacional Referente à Relações Amigáveis e Cooperação entre os Estados em
Concordância à Carta da ONU (1970)109; a Resolução sobre a Não-Intervenção em
Assuntos Internos dos Estados (1976)110; e a Declaração sobre a Inadmissibilidade de
Intervenção e Interferência nos Assuntos Internos dos Estados (1981)111.
Estas resoluções, apesar de não terem o caráter coercitivo daquelas produzidas
pelo Conselho de Segurança, são de extrema importância para o reconhecimento a
evolução histórica do princípio em estudo que hoje já carece de uma definição mais
atualizada, visto a sua relevância, não só no Direito, mas na política internacional.

8. INTERVENÇÕES ESTRANGEIRAS NO SÉCULO XX E INÍCIO


DOS ANOS 2000

A partir de agora serão apresentados alguns exemplos expressivos de


intervenções estrangeiras que ocorreram no Oriente, anteriores ao período denominado
Primavera Árabe, quais sejam na Guerra do Irã-Iraque, na Guerra do Golfo, na invasão

107
RÉGIS, André. Intervenções Humanitárias, soberania e a emergência da Responsabilidade de
Proteger no Direito Internacional Humanitário. Prim@ Facie, João Pessoa, n., p.5-17, jul. 2009. p. 10
108
Disponível em:
<http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/2131(XX)&Lang=E&Area=RESOLUTION
> Acesso em: 9 abr. 2013.
109
Disponível em:
<http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/2625(XXV)&Lang=E&Area=RESOLUTIO
N > Acesso em: 9 abr. 2013.
110
Disponível em:
<http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/2625(XXV)&Lang=E&Area=RESOLUTIO
N > Acesso em: 9 abr. 2013
111
Disponível em:
<http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/36/103&Lang=E&Area=RESOLUTION >
Acesso em: 9 abr. 2013
38

do Afeganistão e, posteriormente, na do Iraque. Será que a presença militar estrangeira


nesses casos pode ser considerada legítima?

8.1 Guerra do Irã-Iraque (1980-1988)


A Guerra do Irã-Iraque começou em 22 de setembro de 1980, quando as tropas
iraquianas invadiram o Irã, utilizando-se de ampla ofensiva para tomar a província
iraniana de Khuzestan, rica em petróleo. No final desse mesmo mês, o Iraque
abandonou seu tratado de 1975 com o Irã – Acordo de Argel112 – passando a reivindicar
o canal estratégico controlado por este, o Shattal-Arab, localizado próximo a grandes
instalações petrolíferas de ambos os países113. Desse modo, começaram os bombardeios.
O Iraque acreditava em uma vitória rápida contra um vizinho internacionalmente
isolado e enfraquecido, porém, os iranianos se reuniram e, contando com um maior
contingente populacional, foram capazes de expulsar os invasores114. Não obstante, o
Iraque, com uma vantagem significativa em armamento pesado, foi capaz de impedir
um avanço decisivo iraniano em junho de 1982, fator que motivou o Irã, anos mais
tarde, a aceitar a Resolução 598 do Conselho de Segurança da ONU 115, estabelecendo,
assim, um cessar-fogo em 20 de agosto de 1988116. Embora a guerra não tenha alterado
significativamente as fronteiras do Irã e do Iraque, houve grandes perdas humanas e
econômicas (cerca de 400 mil mortos, 750 mil feridos, e um prejuízo de mais de US$
400 bilhões, segundo estimativas117).
Importante ressaltar que antes da eclosão da guerra, as relações entre os dois já
estavam deterioradas, com a supramencionada Revolução Islâmica de 1979, no Irã,

112
Em março de 1975, na sequência de discussões em uma reunião da OPEP, o Irã e o Iraque
concordaram em se reunir e negociar a disputa sobre as fronteiras e direitos de navegação. Este encontro
resultou no acordo de Argel entre os dois países, o qual se baseou nos princípios de integridade territorial,
inviolabilidade das fronteiras e não-interferência nos assuntos internos. Disponível em:
<http://www.mideastweb.org/algiersaccord.htm>. Acesso em: 9 mai. 2013. Documento em inglês.
113
ENCICLOPAEDIA Iranica. Indiana: EnciclopaediaIranica Foundation, 2012. 13 v. Disponível em:
<http://www.iranicaonline.org/articles/iraq-vii-iran-iraq-war>. Acessoem: 9 mai. 2013.
114
SHALOM, Stephen R. The United States and Iran-Iraq War 1980-1988. Disponível em:
<http://www.iranchamber.com/history/articles/united_states_iran_iraq_war1.php>. Acesso em: 11 abr.
2013. Documento em inglês.
115
CONSELHO DE SEGURANÇA DAS NAÇÕES UNIDAS. Resolução 598, de 20 de julho de 1987.
Disponível em: <http://daccess-dds-
ny.un.org/doc/RESOLUTION/GEN/NR0/524/70/IMG/NR052470.pdf?OpenElement>. Acesso em: 9
mai. 2013. Documento em inglês.
116
PBS NEWSHOUR. Timeline: A ModernHistoryof Iran, 2010. Disponível em:
<http://www.pbs.org/newshour/updates/middle_east/jan-june10/timeline.html>. Acesso em: 9 mai. 2013.
Documento em inglês.
117
BBC BRASIL. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1314_saddamsiraq2/page5.shtml>. Acesso em: 9 mai. 2013.
39

tendo em vista que o xá Reza Pahlevi, cuja política se posicionava a favor do Ocidente,
foi substituído pelo regime Xiita radical do aiatolá Khomeini, que, não se contentando
apenas com o domínio no país, quis espalhar sua ideologia por todo o Oriente Médio,
incluindo, portanto, o Iraque, onde a elite sunita sofria dificuldades em conter a maioria
Xiita. Esse fato culminou na oposição do regime de Saddam Hussein entre os xiitas
iraquianos e, consequentemente, na inimizade entre tais governos118.
A partir de 1984, momento em que esses passaram a atacar tanques de petróleo
no Golfo Pérsico com o fito de sabotar as exportações um do outro, os EUA e vários
países da Europa Ocidental, como a França e a Grã-Bretanha, tornaram-se mais
envolvidos na guerra, preocupados com a possibilidade de que o Irã derrotasse o Iraque
e ameaçasse toda essa região rica em petróleo. Como o Iraque era um importante
fornecedor de petróleo para o Ocidente e repressor do fundamentalismo islâmico xiita,
os EUA forneceu-lhe armamento pesado e acesso a tecnologias, além de destruir várias
plataformas de petróleo iranianas e – de forma acidental, segundo Washington – um
Airbus iraniano, onde estavam a bordo 290 civis119.
A União Soviética, por sua vez, passou a fornecer armamentos ao Iraque a partir
de 1982, quando Khomeini declarou a ilicitude do partido comunista iraniano, o Tudeh,
executando muitos de seus líderes120. Além disso, algumas nações árabes consideravam
o Irã uma ameaça para a sua segurança. Por esta razão, a Arábia Saudita e o Kuwait
forneceram bilhões de dólares em empréstimos e doações para os iraquianos, e o Egito e
a Jordânia forneceram-lhes algumas armas e suprimentos. A Síria e a Líbia, no entanto,
juntamente com Coreia do Norte e China, apoiaram os iranianos121.

8.2 Guerra do Golfo (1990-1991)


Em dois de agosto de 1990, Saddam Hussein decide realizar outra invasão, dessa
vez no Kuwait, alegando que o país era “uma criação artificial dos colonizadores

118
BBC BRASIL. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1314_saddamsiraq2/>.
Acesso em: 9 mai. 2013.
119
BBC BRASIL. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1314_saddamsiraq2/page4.shtml>. Acesso em: 9 mai. 2013.
120
TRAUMANN, Andrew Patrick. No meio do fogo cruzado: a participação do Brasil no Conflito Irã-
Iraque. Revista Litteris, n. 7, mar. 2011. Disponível em:
<http://revistaliter.dominiotemporario.com/doc/Artigo-_Guerra_Ira-Iraque_Patrick.pdf>. Acesso em: 9
mai. 2013.
121
JEWISH VIRTUAL LIBRARY. Disponível em:
<http://www.jewishvirtuallibrary.org/jsource/arabs/iraniraq.html>. Acesso em: 9 mai. 2013.
40

britânicos, e que ele não deveria ser um Estado independente”122. Nessa época, o Iraque
possuía grandes dívidas decorrentes da guerra de oito anos com o Irã, e acusou o Kuwait
de prejudicá-lo no comércio de petróleo, vendendo o produto por um preço abaixo da
média de mercado, além de explorar mais do que tinha direito em um campo de
extração dividido pelos dois países123.
Logo, quando o Kuwait se recusou a perdoar suas dívidas de guerra, o Iraque o
invadiu, ao mesmo tempo em que a União Soviética passava por um processo de
esfacelamento. No entanto, o Conselho de Segurança da ONU não aprovou essa
agressão iraquiana, impondo sanções econômicas e aprovando diversas resoluções
condenando o Iraque. A Resolução 678 de 29 de novembro de 1990 , por exemplo,
autorizou os Estados-membros a utilizarem “todos os meios necessários” para restaurar
a paz e a segurança na região, se o Iraque não se retirasse do Kuwait até 15 de janeiro de
1991, com a ressalva de que o Conselho deveria ser informado em relação às decisões
tomadas. Foi adotada por doze votos favoráveis, dois contrários (Cuba e Iêmen) e uma
abstenção (China).
Dois dias após o prazo estabelecido, um ataque aéreo às 2 da madrugada iniciou
a guerra. Nesse ínterim, uma coalizão de 32 países – dentre eles, Inglaterra, França, e
países árabes, como Egito, Síria, Paquistão, Bangladesh e Marrocos – foi formada e
milhares de soldados foram enviados para o Golfo Pérsico, surgindo a operação
denominada de “Tempestade no Deserto”124, liderada pelos americanos. Há de se
afirmar que os EUA deslocaram para essa região o maior efetivo militar desde a Guerra
do Vietnã, pois até o final de 1990, já havia mais de 400 mil soldados próximos às
fronteiras iraquianas125. Em 24 de fevereiro de 1991, as tropas aliadas lançaram uma
ofensiva aérea, terrestre e marítima, que derrotou o Exército iraquiano em 100 horas126,
ocasionando a rendição de Saddam Hussein, que mesmo assim, se manteve no poder.

122
FAY, Claudia Musa. A questão do petróleo e suas implicações na Guerra do Iraque. Indic. Econ.
FEE, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 69, jun. 2003. Disponível em:
<http://revistas.fee.tche.br/index.php/indicadores/article/download/193/242>. Acesso em: 9 mai. 2013.
123
BBC BRASIL. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1813_saddamsiraq/index.shtml>. Acesso em: 9 mai. 2013.
124
FAY, Claudia Musa. A questão do petróleo e suas implicações na Guerra do Iraque.Indic. Econ.
FEE, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 69, jun. 2003. Disponível em:
<http://revistas.fee.tche.br/index.php/indicadores/article/download/193/242>. Acesso em: 9 mai. 2013.
125
FERABOLLI, Silvia. A (des) Construção da Grande Nação árabe: condicionantes sistêmicos,
regionais e estatais para a ausência da integração política no Mundo Árabe. p. 154. Disponível em:
<http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/7126/000539529.pdf?sequence=1>. Acesso em: 9
mai. 2013.
126
BBC BRASIL. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1314_saddamsiraq2/page5.shtml>. Acesso em: 9 mai. 2013.
41

Contudo, a guerra marcou o fim de sua caminhada à liderança do Mundo Árabe e


da construção do seu país como uma potência regional, em razão da série de sanções e
embargos econômicos impostos pela ONU, mesmo após a rendição, o que prejudicou
ainda mais a economia do país, que estava com a infraestrutura básica completamente
destruída127.

8.3 A invasão do Afeganistão (2001)


Durante os anos 1990, o Talibã128 conseguiu ganhar o controle de grande parte do
Afeganistão, situação em que os direitos de todos os habitantes, especialmente das
mulheres, foram severamente restritos e muitos símbolos da era pré-islâmica foram
destruídos. O Talibã também permitiu que Osama Bin Laden, líder da Al-Qaeda e uma
figura influente na luta contra a ocupação soviética nos anos 1980, permanecesse em
território afegão.
Após os ataques de 11 de setembro de 2001 aos EUA, e da subsequente recusa do
Talibã para expulsar Bin Laden, as forças americanas ajudaram a Aliança do Norte129 a
assumir o controle do país130. Nessa data, a Al-Qaeda sequestrou quatro aviões
comerciais, derrubando-os no World Trade Center, em Nova York; no Pentágono, em
Washington, DC; e em um campo em Shanksville, na Pensilvânia, matando
aproximadamente 3 mil pessoas131. O então presidente George W. Bush, diante do
ocorrido, apelou ao regime talibã para que entregasse às autoridades dos EUA todos os
líderes da Al-Qaeda que se escondiam em seu território.
Com o intuito de obter uma justificativa legal que fundamentasse sua decisão de
combater o terrorismo, invadindo o Afeganistão, o ex-presidente americano assinou
uma lei para uma resolução conjunta que autorizava o uso da força contra os
responsáveis por atacar os EUA. Assim, com o apoio dos demais países membros da

127
FERABOLLI, Silvia. A (des) Construção da Grande Nação árabe: condicionantes sistêmicos,
regionais e estatais para a ausência da integração política no Mundo Árabe. p. 155. Disponível em:
<http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/7126/000539529.pdf?sequence=1>. Acesso em: 9
mai. 2013.
128
BBC. Who are Taliban?, 2012. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-south-asia-
11451718>. Acesso em 10 de abr. de 2013. Documento em inglês.
129
A Aliança do Norte é formada por grupos rebeldes com características étnicas e religiosas diferentes,
unidos apenas pelo desejo depor o Talibã, milícia que controla 90% do Afeganistão. Disponível em:
<http://www.cefetsp.br/edu/eso/terrorismousa/conhecaaliancanorte.html>. Acessoem 11 de abr. de 2013.
130
AFGHANISTAN: Civil War, the Taliban, and American Intervention. Disponível em:
<http://berkleycenter.georgetown.edu/essays/afghanistan-civil-war-the-taliban-and-american-
intervention>. Acesso em: 11 abr. 2013. Documento em inglês.
131
MCMAHON, Robert. U.S. War in Afghanistan. Disponível em: <http://www.cfr.org/afghanistan/us-
war-afghanistan/p20018>. Acesso em: 11 abr. 2013. Documento em inglês.
42

Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) - a exemplo do Canadá, Austrália,


Alemanha, França -, começaram os bombardeios contra as forças do Talibã, sendo
lançada oficialmente a “Operação Liberdade Duradoura”132.
Em 14 de novembro de 2001, o Conselho de Segurança, por meio da Resolução
1378 , solicitou às Nações Unidas o estabelecimento de um governo de transição e
convidou os Estados membros a enviarem forças de paz para prestarem ajuda. Ao final
de 2001, apesar da queda oficial do regime talibã, os líderes da Al-Qaeda continuavam a
se esconder. Assim, a OTAN expandiu seu papel, assumindo o controle das Forças de
Segurança Internacional no Afeganistão.
Em 29 de outubro de 2004, Osama Bin Laden provocou a administração Bush ao
vivo na rede de televisão árabe Al Jazeera, assumindo a responsabilidade pelos ataques
de 11 de setembro de 2001.133 Após muita procura, o terrorista foi morto por forças
militares americanas no Paquistão no dia 1º de maio de 2011, o que trouxe à tona o
debate sobre a continuação da guerra, que já durava 10 longos anos.
Em janeiro de 2012, o Talibã fez um acordo para abrir um escritório no Qatar,
evidenciando um movimento em direção a negociações de paz, mas, dois meses depois,
suspendeu as negociações preliminares, acusando Washington de não cumprir as
promessas em relação a uma troca de prisioneiros. Em fevereiro do mesmo ano, o então
Secretário de Defesa dos EUA, Leon Panetta, anunciou o plano do Pentágono de
concluir as missões de combate em meados de 2013, assumindo, a partir desse ano,
somente o papel de assegurar assistência e, principalmente, segurança no
Afeganistão134.

8.4 A invasão do Iraque (2003)


A invasão do Iraque começou no dia 20 de março de 2003, por meio da
intervenção militar americana conhecida como "Operação Liberdade Iraquiana", cuja
principal justificativa foi a busca de armas de destruição em massa que o governo
iraquiano supostamente mantinha em seus arsenais135. Outra justificativa para a
intervenção seria o fato de que Saddam Hussein teria ligações com grupos terroristas,

132
Idem.
133
Idem.
134
Idem.
135
PINHEIRO, Leandro Guerreiro C. Guerra do Iraque: análise de sua legalidade frente ao direito
internacional contemporâneo. Jus Navigandi: Teresina, ano 14, n. 2178, 18 jun. 2009. Disponível
em: <http://jus.com.br/revista/texto/13002>. Acesso em: 10 abr. 2013.
43

algo que nunca foi comprovado. Mas será que a garantia da segurança mundial seria,
realmente, a única motivação do governo americano?
Não podemos esquecer que antes da invasão, em 2003, a indústria nacional de
petróleo do Iraque era totalmente nacionalizada e fechada para as empresas petrolíferas
ocidentais. Uma década mais tarde, ela encontra-se largamente privatizada e totalmente
dominada por empresas estrangeiras, como a ExxonMobil, Chevron, BP e Shell,
grandes empresas de petróleo do Ocidente136.
Além do exército iraquiano ter se mostrado extremamente despreparado, o Reino
Unido, a Austrália e a Polônia auxiliaram militarmente a intervenção, fazendo com que
o conflito durasse apenas algumas semanas. Assim, o controle de tomada da cidade-
natal de Saddam Hussein, Tikrit, no dia 14 de abril de 2003, marcou efetivamente o
término do conflito militar principal. O ex-presidente Bush, por sua vez, anunciou o fim
das "principais operações militares" no dia 1º de maio de 2003137.
Apesar da inexistência de uma disposição expressa do Conselho autorizando a
intervenção no Iraque, os países invasores buscaram legalizar a guerra com base na
Resolução 1441, de 8 de novembro de 2002138. Esta, segundo esse ponto de vista, teria
reavivado todo o conteúdo disposto nas antigas resoluções da ONU que abordavam o
aludido caso da invasão do Iraque no território do Kuwait, em 1990. Será mesmo? Ou a
intenção da criação dessa resolução foi a de conceder uma última oportunidade para que
esse país respeitasse o disposto nas antigas resoluções do Conselho de Segurança?
Tendo em vista essa hipótese, cumpre destacar o trecho contido no seu primeiro
parágrafo, onde o Conselho "decide que o Iraque tem estado e permanece em violação
substancial das obrigações contidas nas resoluções, incluindo a Resolução 687139”, a
qual impôs os requisitos ao Iraque para o cessar fogo.
Dessa forma, instaurou-se uma verdadeira batalha diplomática: em defesa da
intervenção, o então presidente George W. Bush afirmava que quem não estivesse ao
lado dos Estados Unidos, estaria a favor dos terroristas, exercendo uma grande pressão

136
CNN.Why the war in Iraq was fought for Big Oil, 2013. Disponível em:
<http://edition.cnn.com/2013/03/19/opinion/iraq-war-oil-juhasz>. Acesso em 10 mai. 2013.
137
Idem.
138
CONSELHO DE SEGURANÇA DAS NAÇÕES UNIDAS. Resolução 1441, de 8 de novembro de
2002. Disponível em: <http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=S/RES/1441(2002)>. Acesso
em 10 mai. 2013.
139
CONSELHO DE SEGURANÇA DAS NAÇÕES UNIDAS. Resolução 687, de 29 de novembro de
1990. Disponível em:<http://daccess-dds-
ny.un.org/doc/RESOLUTION/GEN/NR0/596/23/IMG/NR059623.pdf?OpenElement>. Acesso em 27 jun.
2013.
44

contra os demais países para conseguir apoio e lançar um ataque militar ao Iraque; por
outro lado, países liderados por França e Alemanha, lutavam por uma saída diplomática.
Mesmo com muitos esforços da comunidade internacional, apoiados ainda por inúmeras
manifestações em todo o mundo contra a guerra, inclusive no próprio Estados Unidos, a
ONU decidiu abandonar os serviços humanitários e assistenciais a população do Iraque,
ocorrendo posteriormente a intervenção140.
Em 18 de dezembro de 2011, os EUA confirmaram a saída da última tropa do
país em terras iraquianas141.Comandantes militares dos americanos argumentam que o
conflito, cujo custo monetário excedeu a US$ 3 trilhões, trouxe mudanças importantes,
pois os iraquianos estão vivendo melhor sem Saddam Hussein, por meio de uma nova
democracia. Contudo, cerca de 4.500 soldados americanos foram mortos e mais de 32
mil ficaram feridos, sem contar com a quantidade surpreendente de mortes de civis
iraquianos, que vão de 100.000 a 600.000142.

9. PRIMAVERA ÁRABE

“Primavera Árabe” é o termo utilizado para os protestos populares que


ocorreram e ainda ocorrem em países árabes do norte da África e do Oriente Médio,
desde o Marrocos até o Golfo Árabe, a partir de dezembro de 2010. Com esses
movimentos revolucionários se alastrando pela região, foram depostos vários chefes de
Estado, de governos monárquicos a repúblicas modernizadoras, todos regimes
autoritários que estavam no poder há muitos anos.
Nada mais é do que a luta de sociedades civis pela democracia e consequente
liberdade e melhores condições de vida, que altera, de forma considerável, a geopolítica
da região. Os protestos incluem pessoas de todas as classes sociais e etárias, assim como
mulçumanos e cristãos, sendo, porém, jovens em sua maioria. Dentre os motivos
comuns entre todos os países participantes para a eclosão das revoltas estão as
evoluções políticas, sociais, econômicas e culturais ocorridas dentro do mundo árabe,

140
ARAÚJO, Bruno Manoel Viana de. Antecedentes da Guerra contra o Iraque baseados
em documentos internos das Nações Unidas. Disponível em
<http://www.datavenia.net/artigos/Antecedentesdaguerracontrairaque.htm>. Acessoem 27 jun. 2006.
141
REUTERS. Last U.S. troops leave Iraq, ending war, 2011. Disponível em:
<http://www.reuters.com/article/2011/12/18/us-iraq-withdrawal-idUSTRE7BH03320111218>. Acessoem
10 mai. 2013.
142
NBC NEWS.Ten years after Iraq invasion, US troops ask: 'Was it worth it?, 2013. 'Disponível em:
<http://worldnews.nbcnews.com/_news/2013/03/18/17326297-ten-years-after-iraq-invasion-us-troops-
ask-was-it-worth-it?lite>. Acesso em 10 mai. 2013.
45

associadas a fatores externos. Todavia, apesar das bases comuns, cada país
revolucionário possui suas próprias peculiaridades, que serão analisadas posteriormente.
No âmbito político, tem-se, durante o século XX, o surgimento de uma
identidade entre os povos da região formada após a queda e o desmembramento do
Império Turco-Otomano, o nacionalismo árabe, devido à semelhança linguística e
cultural, que leva à independência vários países, como Arábia Saudita, Iraque, Síria,
Líbano, Egito, Transjordânia, Iêmen, entre outros, antes dominados pela colonização
neoimperialista dos países europeus. Ao poder ascenderam, então, governos ligados às
elites árabes, em sua maioria, autoritários143. Alguns deles eram, inclusive, aliados de
potências ocidentais, como os Estados Unidos e a Inglaterra, a exemplo das
petromonarquias como a Arábia Saudita, Bahrein, Qatar e Omã. Portanto, apesar de
certos regimes se declararem antiocidentais, a intervenção do Ocidente sempre esteve
presente na região, antes, durante e após a descolonização, devido à sua posição
estratégica e à presença do petróleo144.
Nas petromonarquias, não havia distinção entre o patrimônio público e privado.
Os líderes destes países não realizavam mudanças sociais, rejeitando qualquer noção de
democracia e gastando o dinheiro em cassinos europeus, enquanto a maioria da
população era mantida na ignorância e na pobreza. Também outros países da região
sofriam com a corrupção, como o Egito, onde, segundo divulgação da mídia britânica, o
ditador Hosni Mubarak acumulou mais de 70 bilhões de dólares em bancos europeus145.
Com a conivência das transnacionais, os lucros obtidos com o comércio de petróleo
eram destinados às contas dos chefes de Estado e não aos cofres públicos, não sendo,
dessa forma, investidos em melhorias para a sociedade146, o que propiciava uma
alarmante concentração de renda e aumentava as desigualdades sociais.
A esse fato, juntava-se o apoio oriundo do campo externo, que se destinava a
garantir uma maior estabilidade e legitimidade ao governo dos países desta região.

143
Para uma maior abrangência sobre a parte histórica, consultar VISENTINI, Paulo Fagundes. A
Primavera Árabe: Entre a democracia e a geopolítica do petróleo. Porto Alegre: Leitura XXI, 2012.
144
HABIB, Mohamed. Primavera Árabe de 2012: mais tempestades do que flores. Carta Maior, São
Paulo, 13 jan. 2012. Disponível em:
<http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19373>. Acesso em: 03 abr.
2013.
145
HABIB, Mohamed. Primavera Árabe de 2012: mais tempestades do que flores. Carta Maior, São
Paulo, 13 jan. 2012. Disponível em:
<http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19373>. Acesso em: 03 abr.
2013.
146
AITA, Samir. Por mais Estado, e menos poder. Le Monde Diplomatique, São Paulo, n., p.1-1, 01 abr.
2011. Disponível em: <http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=922>. Acessoem: 03 abr. 2013.
46

Assim, durante o período da Guerra Fria, Estados Unidos e URSS dividiam-se no apoio
aChefes de Estado autoritários, os quais os ajudariam a atingir seus objetivos na área,
por meio do fornecimento de armamentos e dinheiro, em suma, proteção militar e
econômica no cenário internacional, assim como ajuda no combate a conflitos internos.
Tendo isso em vista, os regimes tinham liberdade para proibir o pluripartidarismo,
restringindo as liberdades políticas da população e também de expressão, expandindo a
opressão social e destruindo qualquer oposição à administração existente. Países como a
Arábia Saudita, por exemplo, contavam com o apoio dos capitalistas americanos,
enquanto outros, como Síria e Algéria, respaldavam-se no apoio da URSS147148.
Com o fim da bipolaridade mundial, a ideia da democracia liberal, que consiste
no governo pautado pela ampla liberdade política dos cidadãos - abrangendo desde a
necessidade do sufrágio universal e a garantia dos direitos fundamentais à intervenção
da sociedade na vida política149 -, expande-se ao redor do mundo e a ideia de ditaduras
autoritárias no Mundo Árabe não se torna interessante para os países que antes eram
seus sustentáculos.
No entanto, a fim de reafirmar sua legitimidade, tanto na sociedade quanto no
tocante às relações com os outros países, os governantes promoveram democratizações
parciais em seus territórios, que foram denominadas por Daniel Brumberg como
“autocracias liberalizadas”150. Assim, passaram a ser permitidas instituições que
discutam a sociedade civil, bem como mais de um partido político, apesar dessas
liberdades serem controladas pelo governo. No Egito, durante o governo de Mubarak,
por exemplo, permitia-se um relativo pluralismo político e liberdade dos meios de
comunicação, ainda que com constante ameaça de repressão, enquanto na Argélia houve
um aumento da liberdade de expressão. Já em países como Jordânia e Marrocos,
utilizava-se a religião como forma de legitimação do regime151.
Para os países ocidentais, essa “fachada democrática” já era o suficiente para que
eles não rompessem as relações com os árabes alegando a falta de garantias individuais
e fundamentais à sua população, uma vez que o vínculo era necessário, em razão da
importância militar e comercial da região. E, internamente, essa abertura, apesar de
147
ARDIC, Nurullah. 2012. Understanding the Arab Spring: Justice, Dignity, Religion and
International Politics. Afro EurasianStudies1(1):8–52.
148
JOFFE, George. A Primavera Árabe no Norte de África: origens e perspectivas de futuro. Relações
Internacionais [online]. 2011, n.30, pp. 85-116.
149
Ibidem, p. 87
150
Apud JOFFE, George. A Primavera Árabe no Norte de África: origens e perspectivas de futuro.
Relações Internacionais [online]. 2011, n.30, p.87.
151
Ibidem, p.94
47

relativa, foi bastante importante, pois possibilitou o surgimento de organizações


dedicadas a discutir as preocupações sociais e políticas e também de sindicatos152, que,
futuramente, influiriam nos levantes da população. Também foi a responsável pelo
renascimento de organizações como a Irmandade Mulçumana, que atualmente constitui
o principal partido de oposição do Egito153.
Ademais, outro aspecto essencial para a eclosão das revoltas foi o social,
que,influenciado pela situação econômica, levou tais paísesa uma situação de crescente
insatisfação, devido aos baixos salários, pobreza generalizada, alta inflação, elevados
índices de desemprego, falta de investimento público em infraestrutura, sendo todos
esses fatores agravados pela corrupção existente e contribuindo para o desânimo geral
das populações, formadas por jovens, em sua maioria, em relação a expectativas para o
futuro.
A economia árabe é, de uma forma geral, concentrada no Estado, que é o
responsável por fornecer suprimentos essenciais como comida, energia, emprego e
outros serviços públicos. Seu capital provém, essencialmente, da exportação do petróleo
e gás, que domina até mesmo a economia dos países nos quais esses minerais são mais
escassos, como é o caso da Síria, onde, até 2005, esta fonte constituía cerca de 67% do
total de suas exportações154. E, como forma complementar à exportação destes minerais,
os Estados sustentam-se com ajuda e financiamentos estrangeiros.
Por causa da dependência econômica existente, a região está bastante submetida
à influência de fatores externos. A inflação ali desencadeada, responsável também pelo
aumento no preço dos alimentos, foi consequência da crise econômica global, já que na
região não há expressiva produção agrícola e a maior parte dos alimentos necessita ser
importada. Esta alta atingiu diretamente a parcela mais pobre da população, a qual se
concentra principalmente no Médio Oriente e Norte da África (região conhecida como
MENA), que, durante os levantes, protestava com o slogan “Pão, liberdade e justiça
social”155.
No que concerne ao desemprego, o Norte da África e o Oriente Médio vêm
presenciando, durante as últimas décadas, um rápido aumento demográfico, fazendo
com que mais de 50% da população desses países, atualmente, seja composta por jovens

152
Ibidem, pp. 85-116.
153
Ibidem, pp. 85-116
154
AWADALLAH, Bassem, and ADEEL, Malik, 2011, The Economics of the Arab Spring, Center for
the Study of African Economies (CSAE) Working Paper WPS/2011 23 (Oxford, UK: CSAE), p.5.
155
ARDIC, Nurullah. 2012. Understanding the Arab Spring: Justice, Dignity, Religion and
International Politics. Afro Eurasian Studies 1(1):8–52, p.10.
48

com menos de 30 anos. Devido a esse fato, a força de trabalho aumenta, por ano, três
vezes mais do que nos outros países em desenvolvimento156. Esta situação torna-se
preocupante, porque reflete diretamente nos índices de desemprego. Expressando-a em
números, na Tunísia, onde 25% da população tem menos de 25 anos, há cerca de três
milhões de desempregados e, destes, 75% ainda não ultrapassaram os 30 anos157. As
taxas de desemprego verificam-se também maiores entre aqueles com mais estudo e a
média das mulheres desempregadas é três vezes maior que a de homens158.
Além disso, diversos postos de trabalho, principalmente no setor privado, eram
destinados a imigrantes estrangeiros, excluindo os nacionais e deixando para o setor
público a responsabilidade de suprir a demanda empregatícia. Os poucos nacionais
empregados no setor privado não assinam contratos de trabalho e, por isso, não possuem
direitos trabalhistas básicos, como a aposentadoria ou direitos sindicais159. Vale
ressaltar, ainda, que a maioria dos empregos era cedida com base em favoritismos160,
como, por exemplo, o nepotismo e também a cessão de cargos a amigos ou conhecidos.
Há, ainda, uma parte da população economicamente ativa que, por não conseguir
empregos regulares, acaba partindo para o setor informal, onde também não goza de
direitos trabalhistas. Essa estrutura dificultava a mobilidade social,trazendo indignação
à população161.
Por último, mas não menos importante, deve também ser exposta a faceta cultural
da situação. A religião é de uma importância essencial entre os árabes, pois a partir dela
estabelecem-se as relações jurídicas, políticas e sociais. O Islã, por ser a mais adotada, é
considerada a religião oficial no mundo árabe e se divide em duas vertentes, a dos
Sunitas e a dos Xiitas. Mais de 80% dos islamistas adotam o sunismo162, o qual, por sua
vez, subdivide-se em quatro grupos diferentes em relação à abordagem dos fundamentos
do Alcorão, sendo alguns de visão mais radical e outros mais moderados.

156
AWADALLAH, Bassem, and ADEEL, Malik, 2011, The Economics of the Arab Spring, Center for
the Study of African Economies: Working Paper WPS/2011. Oxford, UK: CSAE, 2011, p.2
157
Especial TV Cultura: Primavera Árabe. Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=KOm-
2JhmbnI&feature=player_embedded>. Acessoem 14 abr. 2013.
158
ARDIC, Nurullah. 2012. Understanding the Arab Spring: Justice, Dignity, Religion and
International Politics. Afro EurasianStudies1(1):8–52, p.41.
159
AITA, Samir. Por mais Estado, e menos poder. Le Monde Diplomatique, São Paulo, n., p.1-1, 01 abr.
2011. Disponível em: <http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=922>. Acesso em: 03 abr. 2013.
160
161
AITA, Samir. Por mais Estado, e menos poder. Le Monde Diplomatique, São Paulo, n., p.1-1, 01 abr.
2011. Disponível em: <http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=922>. Acesso em: 03 abr. 2013.
162
VISENTINI, Paulo Fagundes; PEREIRA, AnalúciaDanilevicz (Org.). Tensões da Primavera do mundo
arábe-sunita: entre o wahhabismo conservador e o espírito crítico, entre a política do petróleo e a
independência econômica. Ciências&letras: Revista da Faculdade Porto-alegrense , Porto Alegre, n. ,
p.49-51, 2012.
49

No mundo sunita prevalece a concepção do grupo dos hambanitas, que são mais
radicais, pois defendem a aplicação rigorosa das leis do Alcorão, sem interpretações
extensivas ou analógicas, o que origina o Integrismo árabe163. Além desse grupo, há
também o wahhabismo, doutrina também radical e a oficial da Árabia Saudita, originada
por Muhammad IbnAbd-El-Wahhab e mais rígida que a anterior.Este Integrismo árabe,
sustentado pelas doutrinas expostas acima, foi o idealismo religioso espalhado entre a
população e que foi muitas vezes útil como forma de legitimação dos governos
ditatoriais. No entanto, houve uma mudança de mentalidade, influenciada
principalmente pelo advento da globalização e pela melhoria da educação. Durante os
anos 1980-2000, houve uma expansão do acesso à educação, atingindo, inclusive, as
mulheres, e uma evolução nos seus níveis primário e secundário na região, registrada
nos índices responsáveis por medir o desenvolvimento dos países164. Une-se a isso a
inclusão global, a partir dos anos 1990, com a admissão mais frequente de instrumentos
de comunicação como a internet, revistas, televisões, telefones celulares etc., o que
permitiu o contato com o modo de vida de outros países e um maior acesso à
informação.
Ambos os fatores favoreceram o surgimento de um pensamento crítico, que era
ainda mais incentivado a expandir-se, devido às condições de instabilidade econômica e
de repressão dos regimes. Assim, as camadas sociais passaram a questionar a situação
em que viviam. A partir daí, começaram a surgir protestos provenientes da situação
atual, como o que ocorreu entre 2004 e 2005 no Egito, o movimento Kefaya (traduzido
como “Chega!”) objetivando impedir a manipulação das eleições por Hosni Mubarak165.
Também emergiram movimentos sociais baseados no islamismo que foram
essenciais para impulsionar os levantes ocorridos, a exemplo do Ikhwan na Síria, o al-
Nahda na Tunísia e a Irmandade Muçulmana. Líderes religiosos tiveram importante
participação ao estimular a população a aderir aos protestos por meio da mídia e de

163
Corrente religiosa que defende o respeito à integridade dos textos sagrados, como os do Alcorão, pois
este são Lei e, portanto, não deve ser alvo de críticas, analogias ou comparações.InVISENTINI, Paulo
Fagundes; PEREIRA, AnalúciaDanilevicz (Org.). Tensões da Primavera do mundo arábe-sunita: entre o
wahhabismo conservador e o espírito crítico, entre a política do petróleo e a independência econômica.
Ciências&letras: Revista da Faculdade Porto-alegrense , Porto Alegre, n. , p.50, 2012.
164
AWADALLAH, Bassem, and ADEEL, Malik, 2011, The Economics of the Arab Spring, Center for
the Study of African Economies (CSAE) Working Paper WPS/2011 23 (Oxford, UK: CSAE), p.2-3.
165
SHOURBAGY, Manar. The Egyptian Movement for Change - Kefaya: Redefining Politics in Egypt.
PublicCulture, New York. 2007. Disponível em: <http://publicculture.org/articles/view/19/1/the-egyptian-
movement-for-change-kefaya-redefin/>. Acesso em: 03 abr. 2013. Documento em inglês.
50

sermões religiosos. Todavia, a presença desses grupos na oposição não agradou o


Ocidente, que teme a ascensão de governos extremistas e antiocidentais.
Enfim, como consequência da junção de todos os fatores expostos acima e da
saturação da população, ocorre na Tunísia, em dezembro de 2010, o ato que foi
considerado o estopim da Primavera Árabe. Em 17 de dezembro, um tunisiano,
Mohamed Bouazizi, toca fogo em si mesmo, após ser humilhado e proibido de vender
legumes na rua pela polícia local, como forma de protesto contra as injustiças que
vivenciava. Ele era mais um jovem, entre vários existentes no país, que vivia em
precárias condições de vida, graduado, porém trabalhando informalmente como
vendedor ambulante e sem perspectivas para o futuro. Seu ato chocou tanto a sociedade
tunisiana como a internacional e desencadeou, em um efeito dominó, protestos em seu
país e vários outros, que terão suas especificidades analisadas no tópico seguinte.

9.1 Análise específica dos países

9.1.1. Arábia Saudita


O país tem como principal corrente religiosa o wahabbismo166, é o maior
produtor e possui as maiores reservas de petróleo do mundo, sendo controlado pela
dinastia Al Saudi desde o século XVIII. Logo, é uma potência econômica regional,
sendo considerada relativamente estável por manter uma inflação controlada, apesar do
aumento de outros problemas, como o desemprego. Além disso, é o maior aliado dos
Estados Unidos na região.
A Arábia Saudita também é conhecida pelo extremismo religioso. A proibição de
partidos de oposição levou à criação de grupos independentes, inclusive terroristas
islâmicos, que, além de lutarem por uma maior abertura política, também contestam o
papel dos países estrangeiros em seu território.
Ali, os protestos começaram logo após os do Bahrein e, como forma de contê-
los, o rei Abdullah Bin-Abd-al-Aziz Al Saud prometeu garantir para as mulheres o

166
Corrente religiosa difundida a partir de Abdel Wahhab, que foca na ligação direta do religioso, do
político e do social com a Sharia, a lei corânica. Segundo Wahhab, a Sharia liga o Príncipe a seus súditos,
o que justifica religiosamente a autoridade política e social do soberano. Portanto, se o súdito sunita é fiel
à Sharia, também será ao soberano. In: VISENTINI, Paulo Fagundes; PEREIRA, AnalúciaDanilevicz
(Org.). Tensões da Primavera do mundo arábe-sunita: entre o wahhabismo conservador e o espírito
crítico, entre a política do petróleo e a independência econômica. Ciências&letras: Revista da Faculdade
Porto-alegrense , Porto Alegre, 2012, p.51.
51

direito de voto e de concorreràs eleições municipais, a partir de 2015. Entretanto, outras


propostas de reformas feitas pela população não estão sendo exitosas. Por enquanto, não
há previsões para reformas mais profundas.

9.1.2. Argélia
A Argélia é um país do Norte da África, ex-colônia francesa, que conquistou sua
independência em 1962, por meiode violenta luta interna contra os colonizadores,
comandada pela Frente de Libertação Nacional (FLN), partido argelino criado com o
objetivo de obter a independência e que assumiu o poder após a vitória.
Em 1992, desencadeou-se uma guerra civil no país, entre o exército e militantes
islamistas, devido a divergências entre partidos políticos, que teve como estopim o
cancelamento de uma eleição em que o candidato do partido islamista havia ganhado.
Desde essa data, foi declarado o Estado de Emergência, o qual durou até muito
recentemente e impedia a ocorrência de manifestações populares167. Entretanto, isso não
foi empecilho para o levante dos protestos contra o governo do atual presidente,
Abdelaziz Bouteflika, no poder desde 1999 e pertencente à FLN,que possui
preponderância no governo argelino desde a independência.
Após as insurgências relacionadas à Primavera Árabe, o presidente revogou o
Estado de Emergência, adotou medidas democráticas e a possibilidade de reformas,
visando amainar a situação. Entre elas, a convocação de eleições legislativas, em 2012,
com o objetivo de promover modificações relacionadas à imprensa, o voto às mulheres,
entre outras, oferecendo, também, aumentos de salários, mais habitações e corte nos
preços dos alimentos.
Atualmente, a saída do presidente está prevista para 2014, com o advento das
eleições presidenciais168.

9.1.3. Bahrein
Pequena ilha com cerca de 1 milhão de habitantes, cujo governo é uma
monarquia, controlada, desde 1783, pela família Khalifah, que continuou na
administração do país também durante a colonização pela Inglaterra e depois de sua

167
ALGERIA Profile: Timeline. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-africa-14118856>.
Acesso em: 08 abr. 2013.
168
NEUMANN, Rui. Argélia: Primavera Árabe sem mudança de estação. Jornal Digital: Notícias em
tempo real, Lisboa, 11 maio 2012. Disponível em:
<http://www.jornaldigital.com/noticias.php?noticia=30599>. Acesso em: 03 abr. 2013.
52

independência, em 1971. O rei tem autoridade absoluta e a maioria dos cargos políticos
e militares pertence à nobreza169. Internamente, também vivencia conflitos políticos,
pois a maioria da população é xiita, enquanto a família real é sunita.
Nas últimas décadas ocorreu uma melhoria da situação relativa aos direitos
humanos no país, devido à implementação da liberdade de expressão e reformas
políticas realizadas em 2001 que transformaram o Bahrein em uma monarquia
constitucional.Apesar disso, em 2011, o Bahrein também foi influenciado pela onda de
protestos da região e iniciou os seus, com o objetivo de derrubar o rei Hamadbin Isa Al
Khalifah, no poder desde 1999.
A reação do monarca foi decretar Estado de Emergência para o país e enviar o
Exército para conter as manifestações, pedindo suporte às forças militares da Arábia
Saudita170, que usaram métodos repressivos contra a população, como a tortura. Após a
repercussão internacional, o rei fez promessas de reformas para prevenir tais tipos de
abusos e aceitou a criação da Comissão Independente de Inquérito do Bahrein171 para
investigar os protestos e suas consequências, em relação às violações dos direitos
humanos. Porém, acusa-se Hamad de não fazer o suficiente para contribuir com o
trabalho dessa comissão. Os protestos no país continuam a ocorrer até a presente data172
e o governo recusa-se a negociar com a oposição em busca de soluções.

9.1.4. Egito173
Segundo a aderir às ondas de protesto e o maior país árabe em extensão
territorial, estava declarado como em Estado de Emergência desde 1967174. Já em 2011
conseguiu depor seu presidente, Hosni Mubarak, que estava há 30 anos no poder, após
18 dias de protesto. Inicialmente, Mubarak tentou fazer concessões parciais aos pedidos
da população, porém não foi bem-sucedido em sua tentativa.
Durante a revolução, o país teve o apoio e pressão dos Estados Unidos para a
renúncia de Mubarak, apesar de todo o apoio econômico e militar que estes concediam

169
BAHREIN Profile: Overview. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-
14540571>. Acessoem: 08 abr. 2013.
170
BAHREIN Unrest: UN rights chief criticises crackdown. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-12769168>. Acesso em: 06 abr. 2013. Documento em
inglês.
171
BAHREIN IndependentComissionofinquiry. Disponível em: <http://www.bici.org.bh/>. Acesso em:
06 abr. 2013. Documento em inglês.
172
Maio de 2013.
173
Texto atualizado até junho de 2013. País a ser analisado em anexo a ser divulgado em breve.
174
EGYPT Profile: Overview. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-africa-13313370>.
Acesso em: 03 abr. 2013.
53

àquele território, a despeito dos inúmeros problemas sociais ali vivenciados. No entanto,
acredita-se que essa ajuda deveu-se apenas ao temor dos norte-americanos pelas forças
políticas que poderiam se articular, já que, interferindo previamente, eles mesmos
poderiam controlar a transição de poder, e pela paralização da economia egípcia.
A ajuda do exército também foi essencial na realização deste feito, pois a
instituição se recusou a atirar em civis e funcionou como mediador da transição de
governo após a queda do presidente, auxiliando na negociação entre as forças
oposicionistas.
Um ano após o levante, o candidato Mohammed Morsi, da Irmandade
Mulçumana, foi eleito por meio da primeira eleição presidencial democrática do país.
Porém, os protestos continuam por parte da população, que temem a não realização de
mudanças significativas, já que Morsi expediu um decreto que o dava poderes extras,
além dos necessários. Vários partidos da oposição se uniram e formaram a Frente de
Salvação Nacional (FSN), em busca de retirar o decreto estabelecido pelo presidente e
garantir as mudanças na sociedade175.
E, além disso, há os conflitos existentes entre os diversos segmentos políticos
que exigem diferentes mudanças, como os liberais, os conservadores, os islamistas e os
cristãos. Estes conflitos são, muitas vezes, violentos, o que prova o aumento da
violência sectária na região.

9.1.5. Jordânia
País que não conta com muitos recursos naturais em seu território, aliado dos
Estados Unidos, dependente da ajuda estrangeira para sustentar sua economia e,
juntamente ao Egito, se constitui uma das duas únicas nações árabes que não são contra
Israel. O rei Abdullah II é o governante da Jordânia desde 1999176.
Nos protestos ali ocorridos, a população clama por melhorias econômicas e
sociais, além de reformas eleitorais que garantam mais poderes ao parlamento e a
eleição direta do primeiro ministro. Após os protestos, o rei prometeu que iria abdicar
de seu poder de indicar o primeiro ministro, porém não especificou data para que isso
ocorresse. Atualmente, a situação do país é ainda indefinida e percebe-se uma forte

175
PROFILE: Egypt's National Salvation Front.Londres: BBC News, 2012. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-20667661>. Acesso em: 03 abr. 2013.
176
JORDAN Profile: Overview. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-
14631981>. Acesso em: 03 abr. 2013.
54

atuação da principal oposição, que é a Frente de Ação Islâmica, uma facção da


Irmandade Mulçumana no país177.

9.1.6. Kuwait
O Kuwait, governado pelo Sheik Sabah al Sabah, no poder desde 2006, é um
emirado árabe constitucional, que conseguiu sua independência do Reino Unido no ano
de 1961178.
Neste país, o objetivo não é depor a família real, mas sim a redução da corrupção
e a concessão da cidadania aos Bidun, que são habitantes do Kuwait, mas, como não
possuem a cidadania do país, não podem gozar dos direitos e privilégios cedidos aos
“verdadeiros” cidadãos. Os protestos foram contidos com forte repressão por parte do
governo e não obtiveram mudanças significativas.

9.1.7. Líbia
A Líbia é um país dividido entre diferentes tribos, com o maior IDH da África
(0,755)179, nível de educação e alfabetização elevado, além de uma renda média alta
para sua população. Todavia, em contraste com esses pontos positivos, é alto o nível de
desemprego e corrupção, há violação dos direitos humanos e péssima infraestrutura para
a saúde pública180.
Em 1970, após a derrubada da monarquia líbia, assume o poder o Coronel
Muammar Kadafi, que iria governar durante 42 anos, até a insurgência dos rebeldes
durante a Primavera Árabe.
Assim que iniciaram as possibilidades de levantes, influenciados pelos protestos
já em curso na Tunísia, Argélia e Egito, a primeira medida tomada por Kadafi foi
bloquear sites como o YouTube e as redes sociais. Apesar disso, surgiram agitações em
várias cidades, em um dia que ficou conhecido como “Dia da Fúria”. Os rebeldes
estavam armados, os protestos eram violentos e eles conseguiram tomar as cidades de
Aydabiya e Bengazi.

177
JORDAN Profile:Timeline. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-
14636713>. Acesso em: 03 abr. 2013.
178
KUWAIT. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Kuwait>. Acesso em: 03 abr. 2013.
179
RELATÓRIO do Desenvolvimento Humano de 2011. Disponível em:
<http://hdr.undp.org/en/media/HDR_2011_PT_Complete.pdf>. Acesso em: 03 abr. 2013.
180
VISENTINI, Paulo Fagundes; PEREIRA, AnalúciaDanilevicz (Org.). O Verão Árabe: guerra civil e
intervenção internacional na Líbia, Síria e Iêmen. Ciências&letras: Revista da Faculdade Porto-alegrense ,
Porto Alegre, p.59-60, 2012.
55

Logo após, anunciou-se um governo de oposição, o Conselho Nacional Líbio


(CNL), dando origem a uma guerra civil, para a qual se pedia ajuda a outros países, por
parte das forças antikadafistas, para combater o atual governo. No início da guerra,
criou-se o Conselho Nacional de Transição da Líbia (CNT), o qual deveria durar apenas
até a realização das eleições parlamentares181.
Em vista da intensa agitação no país, o Conselho de Segurança da ONU aprovou
uma resolução, a de número 1.973, baseada no capítulo VII da Carta das Nações
Unidas, o qual versa sobre as atitudes a serem tomadas no caso de ameaça ou ruptura da
paz e ato de agressão. Tal resolução autoriza o uso da força pela ONU na Líbia e impõe
uma zona de exclusão aérea sobre o país. A partir desse fato, tem início, no dia 19 de
março de 2011,a intervenção da OTAN, com bombardeios aéreos no território líbio.
Outras intervenções foram realizadas, especificamente, pela França e Inglaterra, que
enviaram tropas e armas para auxiliar na luta contra o ditador. Enquanto isso, a União
Africana, Liga Árabe, Rússia, China, Venezuela, Cuba, Bolívia, Brasil, Índia, Turquia e
África do Sulpediam pelo fim da violência e criticavam a intervenção realizada pela
OTAN.
Houve, também, sanções impostas ao país, designação de enviados especiais pela
ONU para mediar o conflito e a criação do Comitê de Alto Nível para a Líbia. Kadafi,
porém,ainda negava sua rendição. Após oito meses de conflitos, a guerra civil encerra-
se com a captura e morte do governante, sendo o CNT reconhecido internacionalmente–
embora não por todos os países, vale ressaltar –, como o governo legítimo da Líbia e
estabelecendo-se prazos de oito meses para a realização de assembleia constituinte e
vinte meses para as eleições gerais.
As declarações do líder do CNT levam à conclusão de que haverá uma regressão
nas questões concernentes aos direitos das mulheres, por exemplo, pois o novo governo
pretende ter a Sharia (lei islâmica) como única base para a elaboração da nova
constituição.

181
VISENTINI, Paulo Fagundes; PEREIRA, AnalúciaDanilevicz (Org.). O Verão Árabe: guerra civil e
intervenção internacional na Líbia, Síria e Iêmen. Ciências&letras: Revista da Faculdade Porto-alegrense ,
Porto Alegre, 2012, p.59-61.
56

9.1.8. Marrocos
O Marrocos foi um protetorado francês de 1912 a 1956, até transformar-se em
monarquia em 1952 e, atualmente, é uma monarquia constitucional. Seu atual rei é
Mohammed VI, que está no poder desde 1999182.
Com os protestos na Primavera Árabe, a população pedia por reformas políticas e
a elaboração de uma nova constituição. Em resposta, Mohammed apresentou algumas
emendas à constituição que reduziam uma parte de seus poderes e modificou os
membros do parlamento. Porém, os revolucionários não acharam as mudanças
suficientes e os protestos continuam a ocorrer183.

9.1.9. Omã
O Omã passou décadas isolado internacionalmente, a partir de 1932, sob o
governo do Sultão Said binTamur, com sua sociedade baseada em um sistema feudal e
em rebeliões internas. Este isolamento durou até 1970, quando o sucessor do trono, o
atual governante, Sultão Qaboosbin Said, promoveu a abertura econômica, tornando-se
o principal aliado dos Estados Unidos e do Reino Unido.
A população não exigia reformas políticas muito radicais, mas, primordialmente,
criações de postos de trabalho e controle do preço dos alimentos. As autoridades do país
passaram, então, a exercer um grande controle sobre o uso da internet e a prender
ativistas e blogueiros, acusados de incitar a população por meio de redes sociais,
difamar o sultão ou exaltar a incapacidade das autoridades locais de promover reformas
na área.

9.1.10. Síria
A Síria conseguiu sua independência da França em 1946 e é governada pelo
presidente Bashar al-Assad desde o ano 2000. Possui relações com grupos extremistas
como o Hamas e o Hezbollah, o que desagrada alguns governos ocidentais, como o
norte-americano. Durante o governo Bush, a Síria foi incluída na lista dos países
pertencentes ao “Eixo do Mal”, pois era acusada de produzir armas nucleares e oferecer
auxílio a fugitivos iraquianos.

182
MOROCCO Profile: Overview. Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/news/world-africa-
14121438>. Acesso em: 03 abr. 2013.
57

Entretanto, durante os últimos cinco anos, houve uma liberalização da economia


e uma abertura diplomática, durante a qual relações com os Estados Unidos e a União
Europeia foram restabelecidas, mas não duraram muito, em razão do desencadeamento
dos protestos na região, em março de 2011.
Os insurgentes sírios demandavam o fim do estado de emergência, liberdade
política, a expulsão de autoridades corruptas do governo, redução da pobreza e a
deposição do presidente. Para conter os levantes, o exército foi enviado e logo a
situação se transformou em uma guerra civil, ao mesmo tempo em que o governo tentou
fazer algumas concessões para acalmar os ânimos da população, como suspender o
estado de emergência do país, que durou 48 anos. Entretanto, Assad se recusa a
renunciar ao cargo,alegando que as revoltas são uma conspiração internacional para
desestabilizar o país e os protestantes são parte de grupos terroristas.
Como forma de pressão, Estados Unidos e União Europeia impuseram sanções
econômicas e embargo de armas à Síria, enquanto China e Rússia tentam vetar, no
Conselho de Segurança da ONU, qualquer iniciativa de imposição de sanções, devido à
existência de acordos econômicos entre os países. Em novembro de 2011, a Liga Árabe
suspendeu a atuação da Síria em suas atividades, impôs sanções ao país e enviou
observadores para tentar chegar a uma solução para o conflito, ação que acabou sendo
suspensa, devido à grande violência presente na área.
Para legitimar sua atuação, a oposição se reuniu e formou o Conselho Nacional
Sírio (CNS), que articula a formação de uma milícia composta por desertores do
exército oficial, o Exército Sírio Livre. Diante desse fato, o Conselho Nacional Sírio foi
reconhecido por países como Líbia, EUA, Reino Unido, França, Turquia e os países do
Golfo Árabe como o legítimo representante do povo. E, já em 2013, a Liga Árabe
concedeu o assento sírio na organização aos rebeldes, além de declarar que todos os
países-membros estão livres para ajudá-los militarmente184.
Recentemente, houve um referendo lançado pelo governo sobre uma nova
constituição e eleições parlamentares, propostas que não agradaram os rebeldes. Enfim,
os protestos e ataques continuam, não havendo previsão para a resolução do conflito na
região.

184
LIGA Árabe concede assento sírio aos rebeldes. BBC Brasil, 2013. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/portuguese/ultimas_noticias/2013/03/130307_liga_arabe_siria_jp_rn.shtml>.
Acesso em: 06 abr. 2013.
58

9.1.11. Tunísia
Foi onde ocorreu o estopim dos protestos, que influenciaram os outros países
árabes a aderirem ao movimento. É um dos países mais avançados em termos de
direitos humanos, tendo instaurado, desde 1956, a emancipação da mulher e a educação
gratuita obrigatória em todo o país, reformas estabelecidas pelo primeiro presidente
eleito após a independência da França.
Em 1987, este presidente foi sucedido por Zine al-Abidine Ben Ali, acusado de
corrupção, mesmo com todo o declínio econômico do país, submetendo, a população a
políticas extremamente repressivas. Rapidamente, foi deposto do cargo, procurando
exílio na Arábia Saudita185. Em seu governo, partidos de oposição legítimos eram
proibidos, mas, depois da retirada, o regime de partido único foi extinto e as
providências para a elaboração de uma nova constituição foram tomadas.
O exército foi também importante chave desta resolução, pois se recusou a
colaborar com o governo, já que Ben Ali, desde o início de seu governo, decidira mantê-
lo como um órgão apolítico, deixando a segurança nas mãos da polícia e das forças de
segurança, que não foram capazes de conter os levantes. Em 2012, o presidente Ben Ali
foi condenado à prisão perpétua pela morte dos tunisianos durante a repressão realizada
aos protestos186.
Por fim, apesar de terem alcançado uma mudança bastante significativa, ainda
observa-se dissidências no país, a exemplo do surgimento de movimentos islãos
extremistas, como o Salafismo, que requer a lei do Alcorão como base da nova
Constituição. E, guiados por esse ideal, os salafistasrealizam manifestações contra
aquilo que eles acreditam ser influências anti-islâmicas. Além disso, outra preocupação
de parte da sociedade e que estimula novos protestos é o fato de a nova Constituição
considerar as mulheres como “complementares aos homens”, enquanto que a anterior
considerava-as no mesmo patamar que eles.

185
TUNISIA:Ex-President Ben Ali fleesto Saudi Arabia. Londres: BBC News, 2011. Disponível em:
<http://www.bbc.co.uk/news/world-africa-12198106>. Acesso em: 14 maio 2013.
186
BLOMFIELD, Adrian. Zine el Abidine Ben Ali avoids death penalty in Tunisia. Londres: The
Telegraph, 2012. Disponível em:
<http://www.telegraph.co.uk/news/worldnews/africaandindianocean/tunisia/9329926/Zine-el-Abidine-
Ben-Ali-avoids-death-penalty-in-Tunisia.html>. Acesso em: 14 maio 2013.
59

9.1.12. Iêmen
A maioria da população deste país, um dos mais pobres do mundo árabe, é rural e
as comunicações internas são limitadas. É marcado por guerras civis, devido às
disparidades existentes entre o norte e o sul, e também um forte aliado dos Estados
Unidos. Seu presidente era Ali Abdullah Saleh, no poder por 33 anos.
Para minorar a oposição contra seu governo, Saleh distribuiu rendas e favores
entre as diferentes tribos e partidos políticos, bem como ofereceu posições no governo e
no exército a seus membros. Em suma, uma troca entre grupos de poderes, sistema que
se mantém pelas rendas petrolíferas187.
Devido aos arraigados problemas sociais e econômicos, parte da população se
volta para atividades ilícitas, como pirataria, tráfico de armas, de pessoas e de drogas188,
as quais são facilitadas e favorecidas por autoridades corruptas. Além disso, verifica-se
uma forte presença da Al-Qaeda na região, fato que preocupa os EUA e levou a uma
aproximação do país com os manifestantes durante as insurgências da Primavera Árabe,
temendo que esse grupo terrorista consiga chegar ao poder com o futuro vácuo político.
Assim, os norte-americanos, que antes defendiam o governo do presidente, passaram a
ser a favor de sua retirada.
Tais protestos começaram por influência da Tunísia, com manifestações
pacíficas, para as quais o presidente ofereceu algumas concessões, como a retirada dele
e de seu filho das próximas eleições, previstas, inicialmente, para 2013. Como os
protestos continuaram, a repressão foi iniciada, quebrando a pacificidade da revolução e
causando a morte de civis. Esta forma de reação causou grande choque à população,
fazendo com que até mesmo alguns membros da elite, como certos chefes tribais,
apoiassem a deposição do presidente.
No final de 2011, pressionado pela ONU, União Europeia e Estados Unidos,
Abdullah Saleh assinou o acordo proposto pelo Conselho de Cooperação do Golfo
(CCG) segundo o qual ele deixa o governo em troca de não ser julgado por crimes de
guerra, o que não agradou a oposição, por não haver justiça na resolução, já que ele não
responderá pelas mortes causadas pela violenta repressão durante as manifestações. O
poder passou para o vice-presidente Abd-Rabbu Mansour Hadi, que assumiu após
187
VISENTINI, Paulo Fagundes. A Primavera Árabe: Entre a democracia e a geopolítica do petróleo.
Porto Alegre: Leitura XXI, 2012.
188
Tais assuntos são do escopo específico de outras organizações, como a Organização Marítima
Internacional (OMI) a INTERPOL e o Escritório das Nações Unidas para Drogas e Crimes (UNODC) e,
embora não se incluam no foco das discussões na 25ª Reunião de Cúpula do Conselho da Liga Árabe,
podem ser referenciados brevemente pelos delegados.
60

eleições presidenciais realizadas em fevereiro de 2012189. Novas eleições estão previstas


para ocorrerem em 2014.
Os ativistas, entretanto, afirmaram que não vão cessar os protestos até que
consigam aprovar todas as suas demandas. A instabilidade política na região é
preocupante, pois agrava os problemas relacionados à guerra civil e permite o
fortalecimento da al-Qaeda, prejudicando ainda mais o país.

10. DESAFIOS ATUAIS DA LIGA DOS ESTADOS ÁRABES

A Primavera Árabe ainda é um movimento inconcluso, contudo irreversível,


pois, apesar dos vários levantes, a situação dos países ainda precisa ser resolvida.
Tunísia e Egito, ainda que tenham deposto seus presidentes, não conseguiram alcançar
um governo estável; Líbano, Jordânia, Kuwait, Omã, Arábia Saudita, Argélia, Marrocos
e Bahrein não conseguiram mudanças significativas com suas revoltas; e Síria, Iêmen e
Líbia vivenciam uma situação de grande instabilidade, já que os dois primeiros
sustentam uma guerra civil em seu território e o terceiro sofreu uma recente intervenção
militar internacional e restaurou um modelo social mais atrasado.
Assim, passa a questionar-se qual seriam os rumos tomados por cada país, se a
democracia será realmente a forma de governo adotada, se os antigos regimes serão
restaurados ou se a instabilidade política dará espaço para a ascensão de grupos
extremistas ao poder. Um fato que deve ser levado em consideração é a influência que
os movimentos sofrem das relações que se estabelecem no cenário internacional e que
incitam os países ocidentais a intervirem na resolução dos conflitos, o que já se observa
nos noticiários.
E, além dos já tradicionais interventores, que seriam os Estados Unidos e a União
Europeia, tem-se a intensificação das relações políticas, econômicas e diplomáticas da
região com países como o Brasil, Rússia, Índia e China – os BRICs190 –, devido às suas

189
CONSELHO de Segurança da ONU elogia eleições no Iêmen.Notícias Terra, 2012. Disponível em:
<http://noticias.terra.com.br/mundo/oriente-medio/conselho-de-seguranca-da-onu-elogia-eleicoes-no-
iemen,34a9ec09b57da310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html>. Acesso em: 14 maio 2013.
190
A ideia dos BRICS foi formulada pelo economista-chefe da Goldman Sachs, Jim O´Neil, em estudo de
2001, intitulado “BuildingBetter Global EconomicBRICs”. Fixou-se como categoria da análise nos meios
econômico-financeiros, empresariais, acadêmicos e de comunicação. Em 2006, o conceito deu origem a
um agrupamento, propriamente dito, incorporado à política externa de Brasil, Rússia, Índia e China. Em
2011, por ocasião da III Cúpula, a África do Sul passou a fazer parte do agrupamento, que adotou a sigla
BRICS. Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/temas/mecanismos-inter-regionais/agrupamento-
brics>. Acesso em: 10 mai. 2013.
61

rápidas expansões econômicas, os quais não querem perder o mercado oriundo do


Oriente Médio e Norte da África.
Com certeza, a religião terá um papel fundamental na formação dos novos
governos e, sabendo disso, os países ocidentais, principalmente os EUA, buscam
maneiras de fazer acordos favoráveis com os partidos islâmicos da oposição e com
aqueles já no poder. O processo de transição e de mudanças será difícil, devido à
diversidade de pensamentos existentes dentro de cada país. Se este apresentar-se muito
longo e demorado, corre também o risco de perder credibilidade por parte da população,
enfraquecendo sua autoridade, pois as expectativas para as demandas requisitadas são
altas.
Ademais, para que a revolução seja satisfatória e efetiva, as reformas políticas
devem estar associadas também à melhoria das condições socioeconômicas dos países,
oferecendo acesso a oportunidades econômicas para a população. Outra questão
bastante visada é a garantia dos direitos das mulheres.
Em suma, podemos elencar os desafios que o “Novo Mundo Árabe” precisará
enfrentar da seguinte maneira: estabelecer direitos básicos e liberdades civis; alcançar
um consenso entre os diferentes grupos políticos para a elaboração de novas
constituições; discutir o papel do Exército na nova forma de governo; garantir a
participação das diversas camadas sociais nas discussões e resoluções tomadas, o que
garante o processo democrático; encontrar formas de conter a violência desencadeada
pelos protestos; fortalecer o poder do judiciário, para que sejam garantidos os direitos
humanos a todos os cidadãos, inclusive as mulheres; restabelecer a economia e reduzir o
desemprego; melhorar a infraestrutura dos serviços públicos; e estabelecer governos
mais transparentes, que conquistem a confiança de sua população.
Logo, conclui-se que o mundo árabe ainda possui um longo caminho pela frente,
pois todas essas reformas demandam tempo, além de serem de difícil execução, pois as
reformas econômicas, por exemplo, não podem se realizar sem que antes haja uma
estabilidade política, ou seja, há uma interdependência entre as mudanças necessárias.
Neste ponto, a ajuda financeira de outros países e de organizações internacionais, bem
como suporte técnico e assistência humanitária facilita o processo e são necessárias.
Porém, o real interesse de países ocidentais, como os Estados Unidos, na transição
democrática dos regimes árabes é, no mínimo, questionável.
Portanto, torna-se necessário que os problemas regionais sejam solucionados
pelos próprios envolvidos e, principalmente, que haja um debate pela consciência de
62

que o Mundo Árabe precisa alcançar a sua independência por meio do fortalecimento
político e econômico das suas nações frente às potencias globais, como, também, pelo
empoderamento da população, muitas vezes subjugada em situações de
intervencionismo estrangeiro que desrespeitam a soberania dos Estados e
desconsideram aspectos culturais e religiosos inerentes à região.
Nesse sentido, é urgente um pronunciamento da Liga Árabe, por meio da 25ª
Reunião de Cúpula, principalmente após a aprovação de novos documentos como a
Carta da Liga Árabe sobre Direitos Humanos, adotada em 2004, e da insurgência de
processos de transição, emergidos pelo estopim da Primavera Árabe.

11. INDICAÇÕES

Para saber mais sobre alguns assuntos que envolvem a Liga Árabe, seus países-
membros, observadores, convidados e a intervenção militar internacional, bem como o
contexto da 25ª Reunião de Cúpula do Conselho da Liga, seguem algumas indicações
de links e outros materiais interessantes.
Para se ter uma visão oficial da organização, sugerimos a visita ao seu website
oficial, encontrado em http://www.lasportal.org>.
Para se ter uma noção dos principais pontos de que trata a Liga, bem como ter
uma noção de como o Ocidente enxerga a organização, recomendamos a página da BBC
sobre a Liga Árabe, disponível em: http://www.bbc.co.uk/news/world-middle-east-
15747941.
Para saber o que ficou decidido na última Reunião de Cúpula da Liga Árabe e ter
uma ideia do teor das resoluções da Reunião de Cúpula do Conselho, recomendamos a
leitura da Declaração de Doha, disponível em:
http://arableaguesummit2013.qatarconferences.org/index.html. O documento está em
inglês.
No mesmo sentido, disponibilizamos o link da Resolução de Cartum, de 1967,
também em inglês, que trata especificamente da questão árabe-palestina, possibilitando
a compreensão da atuação da organização quanto a conflitos armados:
http://arableaguesummit2013.qatarconferences.org/news/news-details-17.html.
63

Para compreender a Primavera Árabe, sugerimos oEspecial TV Cultura:


Primavera Árabe. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=KOm-
2JhmbnI&feature=player_embedded.
Para saber mais sobre o Conselho da Liga Árabe, recomendamos ainda a leitura
do seu próprio regulamento, em inglês, disponível em:
http://web.archive.org/web/20080406061423/http://faculty.winthrop.edu/haynese/mlas/
CouncilRegs.html.
Para saber mais sobre o funcionamento do Conselho da Liga de uma maneira
resumida, sugerimos o site da representação da LEA no Reino Unido, em inglês,
disponível em:http://www.arableague.org.uk/league/internal_system.html.
Para compreender as críticas dos próprios Estados-membros à Carta de Direitos
Humanos da Liga dos Estados Árabes, sugerimos a leitura da carta disponível em:
http://www.cihrs.org/?p=1889&lang=en#.
Para saber mais sobre o islamismo, religião que marcou o desenvolvimento do
Mundo Árabe, sugerimos visita ao website http://www.mundoislamico.com/.
64

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