Não é objetivo aqui, tratar a agressão e a violência sob a ótica dos elementos psicodinâmicos, das
variáveis sócio-culturais ou do ponto de vista ético e estético. Esse trabalho se atrelaria mais à
psicologia, antropologia, à moral e à ética. Nossa questão será neuropsiquiátrica, por excelência.
Como analogia, para fins didáticos, vamos considerar a relação mente-cérebro como se fosse
uma unidade de trabalho composta de um cavalo e um cavaleiro. O cavalo, nesse exemplo,
representa a parte cerebral e o cavaleiro a parte mental. Assim, podemos aventar a possibilidade
de um cavaleiro muito virtuoso, capaz de conduzir com maestria um animal pouco domado, ainda
que esse animal fosse portador de alguma impetuosidade constitucional. Um cavaleiro frágil,
entretanto, pode fazer um mau trabalho mesmo se o cavalo for bom.
Experimentalmente, o inverso da seqüência acima parece ser também verdadeiro, de acordo com o
que sugere os experimentos de Raynes (1970) com peixes lutadores. O pesquisador estimulou a
agressividade nestes peixes colocando álcool na água, enquanto A mesma coisa foi feita com
noradrenalina. Outros experimentos demonstram que a agressividade pode ser alterada
modificando-se a taxa metabólica de certos neurotransmissores do sistema nervoso central, mais
precisamente da noradrenalina, serotonina e dopamina. Parece ser também de importância
fundamental o papel dos hormônios sexuais no perfil da agressividade do indivíduo.
Existe, inegavelmente, uma sólida inter-relação entre estímulos externos e a fisiologia interna no
mundo animal. Mais importante ainda, é a relação entre a fisiologia interna e a resposta
comportamental. Vimos que um estímulo estressor pode determinar um aumento na secreção de
substâncias químicas do tipo adrenalina, hormônios e neurotransmissores, colocando o indivíduo
numa posição de alarme, pronto para a luta ou para a fuga. Por outro lado, esta posição de alarme
também pode ser determinada a partir do aumento (experimental) destas substâncias sem,
necessariamente, a presença do agente estressor vivencial.
Em relação aos hormônios sexuais, durante séculos o conhecimento geral atesta o fato de um
garanhão selvagem castrado tornar-se muito mais dócil. Da mesma forma que a castração de um
touro selvagem transforma-o num boi trabalhador e submisso. Nos seres humanos a castração
terapêutica foi institucionalizada nos países escandinavos, particularmente na Dinamarca, e seu
uso restringe-se praticamente aos criminosos sexuais.
A legislação desses países coloca a castração terapêutica como uma opção voluntária do
prisioneiro, cuja não concordância implica em reduzidas chances de sair da prisão. Baseado nas
poucas centenas de casos estudados, pode-se dizer que a castração proporciona uma pacificação
geral nestes prisioneiros e há um número relativamente pequeno de recidivas, segundo Johnson.
Entre estas duas correntes principais e opostas devemos entender todos os casos de nossa
observação de forma individualizada, considerando as peculiares circunstanciais de cada um,
lembrando sempre que comportamentos, atitudes, sentimentos e emoções costumam ultrapassar
os conhecimentos que temos dos neurotransmissores, da topografia e fisiologia cerebrais.
Enfim, a fisiopatologia da agressão e violência é um vasto campo por onde deverão desfilar
infindáveis hipóteses e pesquisas. Além disso, as circunstâncias existenciais a que se submete o
indivíduo durante sua trajetória de vida tendem a inviabilizar uma sistematização mecanicista
acerca deste tipo de comportamento motivado.
O Sistema Límbico inteiro pode ser considerado o substrato neural para o comportamento
relacionado à motivação e à emoção. Desta forma, o Sistema Límbico inclui estruturas como o
Tálamo, o Epitálamo, o Hipocampo, o Hipotálamo, as Amígdalas, o Cíngulo e a região do Septo .
Todas estas áreas têm sido aplicadas na regulação do comportamento agressivo, juntamente com
os lobos temporais.
O Cérebro Superior, encontrado filogeneticamente nos atuais mamíferos superiores, tais como
nos primatas, golfinhos e seres humanos, compreende a maior parte dos hemisférios cerebrais,
formado por um tipo de córtex mais recente e denominado neocórtex e por alguns grupos
neuronais subcorticais.
Essas três camadas cerebrais vão aparecendo, uma após a outra, durante o desenvolvimento do
embrião e do feto (ontogenia), representando cronologicamente, a evolução (filogenia) das
espécies, do lagarto até o Homo Sapiens.
Observou-se na superfície medial do cérebro dos mamíferos uma região constituída por células
cinzentas (neurônios) que foi chamado de Lobo Límbico. Uma vez que ela forma uma espécie de
borda ao redor do tronco encefálico.
Como vimos então, a parte de nosso cérebro mais primitiva é herança evolutiva dos répteis, e
abriga os mecanismos neuronais básicos da reprodução e da autoconservação, o que inclui o ritmo
cardíaco, circulação sanguínea e respiração. Num anfíbio, este é quase todo Sistema Nervoso
Central que existe.
Salvo algumas exceções, parece que estes comportamentos formam parte das condutas
burocráticas e políticas do ser humano atual. Talvez, conforme diz Eduardo A. Mata, quando
falamos que "matou a sangue frio", estamos fazendo uma didática metáfora ao sangue frio dos
répteis.
O Sistema Límbico já se encontra em torno desse cérebro de réptil primitivo, sob a forma de
rudimentos do Sistema Límbico que existe no ser humano. O comportamento dos mamíferos,
desde as classes mais inferiores, até as mais desenvolvidas, incluindo os humanos, difere dos
répteis não só na maior quantidade de comportamentos possíveis, mas também na qualidade
desses comportamentos, surgindo nos mamíferos mais evoluídos a emoção.
É muito importante saber que as expressões da fúria, gerenciadas por este Sistema Límbico, são
notavelmente similares entre um gato, um cão e um ser humano submetidos à mesma situação.
Isto significa que esse tipo de reação não sofreu mudanças na escala filogenética evolutiva dos
mamíferos.
Chama atenção também, para a importância do Sistema Límbico, o fato da quase totalidade dos
psicofármacos atuarem exatamente nesse local. Os sistemas neuroendócrino, neuroimune,
neurovegetativo e os ritmos circadianos, todos têm no Sistema Límbico sua sede e, por isso, são
todos fortemente influenciados pelas emoções.
A chamada Amígdala, que veremos mais detalhadamente adiante, é uma parte importantíssima
dessa região límbica e tem um papel transcendente na agressividade. Também existem motivos
para acreditar que a base do comportamento altruísta se encontra no Sistema Límbico. O amor,
que pode corresponder ao instinto de vida, parece ser uma aquisição deste Sistema Límbico.
Muitas investigações documentam que as emoções são patrimônio dos mamíferos e de algumas
aves. Precisamente as espécies que, fora os insetos sociais, cuidam de sus crias.
As regiões cerebrais mais primitivas da agressão, precisamente da agressão predatória, têm sido
amplamente estudadas e numerosas estruturas filogeneticamente mais primitivas têm sido
implicadas nesse tipo de agressão. Essas estruturas incluem o hipotálamo, o tálamo, o
mesencéfalo, o hipocampo e o núcleo amigdalino. A Amígdala e o hipotálamo trabalham em
estreita harmonia, e o comportamento de ataque pode ser acelerado ou retardado segundo a
interação entre estas duas estruturas.
Por último, aparece o Neocórtex, que se apresenta em estado rudimentar nos mamíferos
inferiores, sofre uma modificação impressionante nos primatas e, finalmente, tem um
desenvolvimento explosivo nos hominídeos e nos grandes mamíferos aquáticos.
Uma vez que ela forma uma espécie de borda ao redor do tronco encefálico esse conjunto de
estruturas mais tarde foi denominado Sistema Límbico. É esse sistema que comanda certos
comportamentos necessários á sobrevivência de todos os mamíferos.
Amídala
A destruição experimental das Amígdalas (são duas, uma para cada um dos hemisférios cerebrais)
faz com que o animal se torne dócil, sexualmente indistinto, afetivamente descaracterizado e
indiferente ás situações de risco. O estímulo elétrico agindo nessas estruturas provoca crises de
violenta agressividade.
Em humanos, a lesão da Amígdalas faz, entre outras coisas, com que o indivíduo perca o sentido
afetivo da percepção de uma informação vinda de fora, como por exemplo, a perdavaloração de
uma pessoa conhecida. Ele sabe quem está vendo mas não sabe se gosta ou desgosta da
pessoa em questão.
Localizada na profundidade de cada lobo temporal anterior, a Amígdala funciona de modo íntimo
com o Hipotálamo. É o centro identificador de perigo, gerando medo e ansiedade e colocando o
animal em situação de alerta, preparando-o para fugir ou lutar.
Hipocampo
O Hipocampo é envolvido com os fenômenos da memória de longa duração. Quando ambos os
hipocampos (direito e esquerdo) são destruídos, nada mais é gravado na memória.
Um Hipocampo intacto possibilita ao animal comparar as condições de uma ameaça atual com
experiências passadas similares, permitindo-lhe, assim, escolher qual a melhor opção a ser tomada
para garantir sua preservação.
Tálamo
As lesões ou estimulações do dorso medial e dos núcleos anteriores do Tálamo estão
correlacionadas com a reatividade emocional do homem e dos animais. A importância dos núcleos
na regulação do comportamento emocional, possivelmente não decorre de uma atividade própria
do Tálamo, mas das conexões com outras estruturas do Sistema Límbico.
O núcleo dorso-medial do Tálamo se conecta com as estruturas corticais da área pré-frontal e com
o hipotálamo. Os núcleos anteriores ligam-se aos corpos mamilares no Hipotálamo e, através
destes, via fórnix, com o hipocampo e com o giro cingulado.
Hipotálamo
O Hipotálamo é uma das áreas mais importante do Sistema Límbico. Além de seus papéis no
controle do comportamento, essa área também controla várias condições internas do corpo,
como por exemplo, a temperatura, o impulso para comer e beber, etc. Essas funções internas são,
em conjunto, denominadas funções vegetativas do encéfalo, e seu controle está relacionado com o
comportamento. O Hipotálamo mantém vias de comunicação com todos níveis do Sistema
Límbico.
O Hipotálamo desempenha, ainda, um papel nas emoções. Especificamente, as partes laterais
parecem envolvidas com o prazer e a raiva, enquanto que a porção mediana parece mais ligada à
aversão, ao desprazer e à tendência ao riso (gargalhada) incontrolável.
Giro Cingulo
O Giro Cingulado está situado na face medial do cérebro entre o sulco cingulado e o corpo caloso,
que é um feixe nervoso que liga os 2 hemisférios cerebrais.
Há ainda muito por conhecer a respeito desse giro, mas sabe-se que a sua porção frontal
coordena odores e visões com memórias agradáveis de emoções anteriores. Esta região
ainda participa da reação emocional à dor e da regulação do comportamento agressivo. A ablação
do giro cingulado (cingulectomia) em animais selvagens, domestica-os totalmente. A simples
secção de um feixe desse giro (cingulomia), interrompendo a comunicação neural do circuito de
Papez, reduz o nível de depressão e de ansiedade pré-existentes.
Tronco Cerebral
O Tronco Cerebral também é a região responsável pelas reações emocionais, porém, de forma
mais primitiva. Na verdade, apenas respostas reflexas, de vertebrados inferiores, como répteis
e os anfíbios.
O Tronco Cerebral se compõe da Formação Reticular e do Locus Ceruleus, que é uma massa
concentrada de neurônios secretores de noradrenalina. É importante assinalar que, até mesmo
em humanos, essas estruturas primitivas continuam participando, não só dos mecanismos de
alerta, vitais para a sobrevivência, mas também da manutenção do ciclo vigília-sono.
Indivíduos que apresentam, por defeito genético, redução no número de receptores das células
neurais dessa área, tornam-se incapazes de se sentirem recompensados pelas satisfações comuns
da vida e buscam alternativas "prazerosas" atípicas e nocivas como, por exemplo, alcoolismo,
cocainomania, compulsividade por alimentos doces e pelo jogo desenfreado.
Septo
O Septo é uma estrutura situada à frente do Tálamo, por cima do Hipotálamo. A estimulação de
diferentes partes desse septo pode causar muitos efeitos comportamentais distintos. Na frente do
Tálamo, situa-se a área septal onde estão localizados os centros do orgasmo (quatro para mulher
e um para o homem). Certamente por isto, esta região se relaciona com as sensações de prazer,
mormente aquelas associadas às experiências sexuais.
Área Pré-Frontal
A Área Pré-Frontal não faz parte do circuito límbico tradicional, mas suas intensas conexões com o
tálamo, amígdala e outras áreas sub-corticais, explicam o importante papel que desempenha na
expressão dos estados afetivos.
Quando o córtex da Área Pré-Frontal é lesado, o indivíduo perde o senso das responsabilidades
sociais, bem como a capacidade de concentração e de abstração. Em alguns casos, a pessoa,
mantém intactas a consciência e algumas funções cognitivas, como a linguagem, mas não
consegue resolver problemas mais elementares.
Quando se praticava a lobotomia pré-frontal, para tratamento de certos distúrbios psiquiátricos, os
pacientes entravam em estado de "tamponamento afetivo", e não demonstravam mais quaisquer
sinais de alegria, tristeza, esperança ou desesperança. Em suas palavras ou atitudes não mais se
viam quaisquer resquícios de afetividade.
Essas pesquisas são baseadas fortemente nas imagens funcionais cerebrais (possíveis depois do
advento do SPECT), em pessoas violentas ou predispostas à violência, ou seja, em pessoas que
preenchem os critérios para diagnóstico de Transtorno Explosivo da Personalidade, bem como
aquelas com lesões cerebrais ocorridas na infância e assassinos condenados.
Também foram reavaliadas informações sobre dois indivíduos que sofriam de dano precoce em
duas importantes regiões do cérebro, os quais apresentavam histórias de abuso físico e verbal e
explosões intermitentes de ira.