RESUMO
Este artigo propõe analisar, a partir da crítica do romance de Albert Camus (1957), as diferentes formas
de apreensão quanto a ironia que parece constituir-se como um recurso estético-estilístico que contribui
fortemente na criação de efeitos de sentido da obra-prima do escritor argeliano. É por esta perspectiva que
esse trabalho busca tecer comentários consoantes à realização da ironia no romance L’Entranger.
1. INTRODUÇÃO
2. DESENVOLVIMENTO
2.1. Concepções do conceito de ironia
a ironia romântica não rejeita um dos elementos para realçar outro a categoria
de validade. Tal é a pretensão do moralista ou do sátiro, que (...) se vale da
ironia para ridicularizar o falso e assim revelar o bem (MACEDO apud
LUKÁCS, 2000, p. 75),
1
O que a consideração da existência de situações irônicas no romance em estudo contribui fortamente é
saber que uma interpretação literal da categoria apenas serviria para turvar a compreensão de que uma
verdade transcendental e absoluta se tornou algo questionável e, por isso, insustentável a priori.
2
Il s'est assis avec indignation. Il m'a dit que c'était impossible, que tous les hommes croyaient en Dieu,
même ceux qui sedétournaient de son visage. C'ètait là sa conviction et, s'il devait jamais en douter, sa vie
n'aurait plus de sens. "Voulez-vous, s'est-il exclamé, que ma vie n'ait pas de sens?" (CAMUS, 1957, p.
108)
Meursault, apos ser condenado morte, cogita: “Tão perto da morte, a minha mãe deve
ter-se sentido libertada e pronta a tudo reviver. Ninguém, ninguém tinha o direito de
chorar sobre ela” 3.
Contudo, vale-se fazer uma distinção entre o pensamento schopenhauriana sobre
a morte e o que Camus poderia sugerir ao problematizá-la, quando seria impossível
haver uma conciliação entre ambas as posições, principalmente ao tomarmos a
compreensão extremamente pessimista do filósofo alemão e o otimismo aceso do
escritor argeliano, sendo justamente essa sugestão que podemos acolher na leitura de
L’Entranger.
Nesse ponto de repulsa entre as posições do escritor argeliano e do filósofo
alemão, Meursault não encontra meio pra lamentações, como em uma íntima
desconfiança que daria a existência a aceitação de sua própria cadência, sendo que, para
Camus (2008), o labor de Sísifo deveria ser marcado pela possibilidade de felicidade, ao
vislumbrar de antemão as balizes das ações possíveis.
Por outro lado, alguns filósofos identificariam, em Schopenhauer, um princípio,
antes de tudo, niilista, hostil à própria vida (NIETZSCHE, 2008), em suas contradições,
considerando que “a vida oscila (...) do tédio ao sofrimento” (SCHOPENHAUER apud
GUEROULT, 2000, p. XXX), enquanto o personagem de Camus agarra-se com unhas e
dentes a possibilidade de viver mais algumas horas, sob a luz clara de um dia de sol.
3. CONCLUSÃO
Chegando a tal ponto, podemos dizer que muito foi elencado quanto a
possibilidade de apreensão da importancia que a ironia, enquanto recurso estético-
estilístico, representa ao projeto literário de Albert Camus, em sua obra-prima. Por
questões objetivas, alguns pontos podem ter sido obscuresidos quanto à interseção entre
as considerações de cunho estritamente estilístico e seus efeitos em nível estético-
reflexivo e que podem alimentar novas considerações sobre o romance em estudo.
A esta luz, contudo, L'etranger se torna invariavelmente “uma surpresa rebelde
ao constrangimento de qualquer lei superior” (BORNHEIM, 1984, p. 97) e, se
3
Si prés de la mort, maman devait s'y sentir libérée et prête à tout revivre. Personne, personne n'avait le
droit de pleurer sur elle. (CAMUS, 1957, p. 185)
tentássemos retomar nosso ponto de vista inicial, no qual consideramos alguns aspectos
da linguagem literária de Camus, quanto a suas soluções encontradas no romance,
veríamos como a ironia seria superada por si mesma, se consolidando, em um
solilóquio do protagonista Meursault, nas ultimas páginas do livro, a possibilidade de
uma justificativa complacente para ele não ter chorado no funeral de sua mãe.
Por fim, poderíamos concluir que a sugestão de Ítalo Calvino de consideração de
uma ótica diferenciada, recuperada nesse estudo por Lautiri (2009) é de grande valor
para análises que se proponham avaliar os aspectos estético-estilísticos da obra do
escrito argeliano, especialmente, como tentamos demonstrar, em L’etranger.
REFERÊNCIAS: