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Afinal, existe racismo no Brasil?

17 de março de 2017 Caroline Svitras 0 Comentário

Por André Santos Luigi* e Rodolfo de Souza** | Fotos: Shutterstock / Wikimedia | Adaptação
web Caroline Svitras

Aquele que pesquisar sobre a temática do racismo a partir de um enfoque filosófico certamente
se deparará com um enorme vazio. De fato, não podemos afirmar que o racismo seja um tema
caro à Filosofia. Não porque não seja possível conceituá-lo filosoficamente – conforme definição
de Gilles Deleuze (1925-1995) e Félix Guattari (1930-1992) –, mas simplesmente porque os
filósofos não se apropriaram dele.

Segundo Michel Foucault (1926-1984), “cada sociedade tem seu regime de verdade, sua ‘política
geral’ de verdade: isto é, os tipos de discursos que ela acolhe e faz funcionar como verdadeiros”.
O autor adverte que nossa sociedade criou uma complexa “economia política da verdade”, em
que a produção da verdade “é produzida e transmitida sob o controle, não exclusivo, mas
dominante, de alguns grandes aparelhos políticos e econômicos (universidade, exército,
escritura, meios de comunicação)” tornando-se “objeto de debate político e de confronto
social”. Para que determinadas “verdades” sejam aceitas como tal, é preciso silenciar outras
“verdades”. Trata-se do silêncio como ato de poder, não como ausência da fala. É justamente o
que ocorre com os processos de discriminação: é preciso silenciar o conceito para que o pré-
conceito possa existir. Assim, a produção do conhecimento não se dá apenas para incrementar o
saber humano, mas também para afirmar determinadas verdades e silenciar outras.

Para se ter uma ideia, enquanto o número de mulheres brancas assassinadas diminuiu 9,6%
entre 2003 e 2013, o número de mulheres negras assassinadas no mesmo período disparou
54,2%. Em 2013, 13 mulheres foram assassinadas por dia no Brasil, em média, e 66,3% delas
eram negras. O mesmo processo se dá com os homens. Hoje, 82 jovens com idade entre 15 e 29
anos são assassinados diariamente no Brasil, e 77% são negros. Entre 2003 e 2012 o número de
pessoas brancas mortas por armas de fogo caiu 29%, enquanto que entre os negros o índice
aumentou 14,1%. Hoje, um jovem negro tem 250% mais chances de morrer de forma violenta
do que um jovem branco.

Diante desses dados, Kabengele Munanga (1940) sentencia: “nosso racismo é um crime
perfeito”. Crime, pelos números hediondos que produz, e perfeito porque somos incapazes de
reconhecer quem são os verdadeiros responsáveis. Para melhor compreender esta definição de
crime perfeito é preciso desarticular o racismo desvendando seus mecanismos. De forma
sistemática poderíamos dividir os mecanismos em três etapas: 1) naturalização; 2)
culpabilização; e 3) criminalização.

No Brasil, reconhecemos as consequências do racismo, mas silenciamos sua reprodução


cotidiana. É o silenciamento sobre o racismo que permite a perpetuação da miopia racial

Podemos compreender a naturalização por meio de um exercício autorreflexivo. Pensemos


juntos. Vamos há dezenas de consultas médicas ao longo do ano, quantas vezes já fomos
atendidos por médicos negros? Frequentamos o ambiente acadêmico, quantas vezes
problematizamos a quantidade de professores negros no ensino superior? Acompanhamos as
denúncias sobre corrupção nos telejornais, mas quando questionamos quantos políticos negros
conhecemos? Apresentamo-nos a juízes e recorremos a delegados, entretanto, quantas vezes
observamos quantos deles são negros? Somos educadores bem informados, lemos colunas nos
jornais, assistimos a reportagens na televisão e ouvimos entrevistas nas rádios, mas quando nos
indagamos quantos negros ocupam o papel de formadores de opinião? Quando consumimos
filmes, séries e telenovelas, questionamos a ausência de atores negros ou sua presença
estereotipada? Esta naturalização da ausência do negro em certas posições sociais privilegiadas,
bem como sua proeminência em condições de fragilidade social, é o primeiro passo da prática
do racismo. Ela permite que o racismo se reproduza ao impedir que ele seja problematizado. É o
que se conceitua o lugar social do negro. Esta situação se naturaliza a tal ponto que deixamos de
percebê-la, silenciando-a, como se de fato tal discriminação não existisse.

Spike Lee propõe temáticas que revelam as contradições raciais existentes nos EUA
Entretanto, a acomodação que a naturalização propicia às vezes desmorona. Em situações
extremas, quando o racismo não pode mais ser negado, entra em cena a culpabilização. Sua
função é operar uma inversão. A culpabilização permite afirmar, por exemplo, que não somos
atendidos por médicos negros porque os negros não optam por cursar Medicina. Não
conhecemos políticos negros porque os próprios negros não votam em negros. E assim por
diante. Desta forma, é possível inverter a lógica do problema imputando a culpa do racismo na
própria vítima do racismo. O racismo novamente não é problematizado como fenômeno social e
se torna uma questão individual. Como se o negro pudesse escolher ser vítima do racismo ou
não. Quando denuncia o racismo, logo escuta que está tentando transferir “seu problema”. No
máximo, o que se oferece é compaixão. Mas uma compaixão que reconhece a condição social
desfavorável do negro para logo em seguida lhe impor a cobrança para que se esforce e supere o
racismo. E aqui entra em cena a criminalização. Aqueles que não se esforçam o suficiente para
superar as barreiras sociais impostas pelo racismo devem ser responsabilizados. Se não existe
racismo (naturalização) a culpa pela situação do negro é do próprio negro (culpabilização),
assim, se o negro não é capaz de lidar com esta situação, ele deve arcar com as consequências
(criminalização). Não se trata da criminalização judicial apenas, mas da criminalização que
argumenta a “necessidade” de punição.

O encarte Racismo cordial, publicado pela Folha de São Paulo em 1995, denuncia que mais de
80% dos brasileiros que participaram da pesquisa alegaram que há racismo no País, mas quando
questionados se já haviam discriminado alguém, a maioria disse que não. Significa que há
racismo, mas sem racistas. Portanto, “nosso racismo é um crime perfeito, porque é a própria
vítima que é responsável por seu racismo”.

filme A hora do show retrata críticas sociais fundamentais que mostram ao espectador os limites
morais dos personagens e, consequentemente, da nossa sociedade

Ao compreender como o racismo opera no Brasil, passamos a entender a importância de


abordá-lo em sala de aula. A presença desta temática na educação básica deve perpassar todas
as disciplinas e não apenas História e Artes: § 2°, Art. 26A, Lei 9.394/1996: Os conteúdos
referentes à História e Cultura afro-brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo
escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.
Não se trata apenas de citá-lo ou de fazer referências à cultura afro-brasileira e africana, é
preciso problematizar o racismo, escancarando seus mecanismos. Pelo menos é o que prevê as
Diretrizes Curriculares para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e
Cultura afro-brasileira e africana.

As Diretrizes, elaboradas pela Professora Doutora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, são muito
mais do que um mero mecanismo de regulação legal. Seu texto propõe um projeto pedagógico
que, obviamente, aponta para um projeto de sociedade livre do racismo. Trata-se da educação
antirracista que se funda em três grandes pilares, cada um com um objetivo específico:

Educação para as relações étnico-raciais buscando construir novas relações raciais;

Ensino de História e Cultura afro-brasileira para reconstruir a identidade afro-brasileira;

Ensino de História e Cultura africana para resgatar a memória afro-brasileira.

Não se trata de uma educação voltada apenas para negros e negras, ao contrário, trata-se de
oferecer a oportunidade da construção de uma sociedade mais igualitária. Fica evidente que
estamos falando de atividades pedagógicas que vão muito além da simples realização de feiras e
eventos culturais no dia 20 de novembro.

O Dia da Consciência Negra remete à resistência do negro contra a escravidão

*André Santos Luigi é bacharel e licenciado em História pela USP. Mestre em Educação, estuda
Relações Étnico-Raciais. É membro do grupo de pesquisa ETNS, da UFSCar. Atua como
Coordenador do Cursinho Popular EPA. asluigi@hotmail.com

**Rodolfo de Souza é bacharel em Filosofia pela Puc-Campinas e atua como professor da rede
pública de São Paulo. rodolfoidt@yahoo.com.br

Adaptado dos textos “Brasil e o preconceito racial” e “Essencialismo e as armadilhas da


negritude”

Revista Filosofia Ciência & Vida Ed. 115

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