1. Introdução
A peça Hélices (2009), escrita para flauta, clarinete em si bemol, violino e
violoncelo, foi composta como atividade curricular da disciplina Seminários em
Composição II, dentro do Mestrado em Composição (PPGMUS – UFBA), sob orientação
do Prof. Dr. Paulo Costa Lima.
A ideia central desta atividade composicional era aproveitar os diversos conceitos
aprendidos ao longo das discussões sobre os ciclos e suas relações com o fazer musical.
Deste modo, a abordagem aqui adotada se destinará a identificar e descrever as
ocorrências de elementos cíclicos dentro do processo composicional.
2. Considerações gerais
Hélices é uma peça dividida em três seções. Em cada uma delas, pode-se
perceber o uso de polifonias a três vozes, que logo assumem função de
acompanhamento; isto se dá quando uma quarta voz aparece e se posiciona em relativo
destaque, apresentando características próximas às de um cantabile.
A mudança de uma seção para outra pode ser deduzida a partir da mudança de
fórmula de compasso: a primeira e a terceira seções desenvolvem-se em 5/8, e são
separadas pela segunda, em 6/8. Além da mudança de fórmula de compasso, também
pode-se perceber a redução no andamento da segunda seção: da colcheia em 240bpm,
passamos à colcheia em 208bpm.
algumas precauções, que embora não fossem relacionadas aos ciclos, ajudaram a
resolver eventuais problemas técnicos que pudessem ocorrer. Por exemplo: as nuances
de dinâmica não foram regidas pelo diagrama, e sim decididas de maneira intuitiva, de
modo a estabelecer o caráter certo para cada passagem. Também utilizei alguns
fragmentos transpostos uma oitava abaixo (ou acima), a fim de respeitar algumas
especificidades de cada instrumento. Quanto às vozes solistas, havia o fato de que a
sequência de fragmentos resultava menos extensa do que as de acompanhamento.
Assim, tratei de posicionar as vozes solistas em trechos equidistantes ao início e fim de
cada seção.
4. Considerações finais
Hélices é uma peça onde não tive ambição de deixar explícita a característica
cíclica da utilização dos materiais. Na verdade, procurei dar mais ênfase à questão do
movimento regular, da força motriz embutida por trás da imagem da hélice. Por outro lado,
não evitei de modo algum a inexorável consequência da recursividade nos procedimentos
e do universo motívico reduzido. A impressão de que já se passou por determinado ponto,
o reconhecimento, a familiaridade, estava presente ao reciclar dos gestos musicais. E é
justamente este o ponto: o que “denuncia” a reiteração de operações, os elementos que
clamam pelo próprio nome, é a similaridade dos gestos; é a familiaridade compensando a
intrincação rítmica e o movimento regular que poderiam emplastrar qualquer intenção
expressiva mais profunda.
Talvez tenha faltado um pouco de reflexão (ou de tempo hábil) para que eu
pudesse explorar com mais efeito as possibilidades específicas de cada instrumento.
Ainda que precauções tenham sido tomadas precauções em nível estético, um
planejamento rigoroso pode ironizar a clareza de um gráfico, obscurecendo o resultado
musical, distanciando-se de intenções e ambições poéticas por um bem “duvidoso”, pelo
bem de um capricho metodológico.
Deste modo, ainda considero em aberto o meu exercício individual de ampliar o
raio de ação de procedimentos cíclicos, fazendo um bom planejamento sem no entanto
prejudicar a liberdade de criação. Uma ferramenta como o diagrama que apresentei neste
relato pode ser um bom auxiliar à obtenção de material sonoro, mas ainda é apenas uma
ferramenta. Cabe ao compositor tomar a liberdade de extrapolar seu próprio
planejamento, abrir espaço para elementos externos à sua “obsessão momentânea” (o
ciclo, neste caso). Tais elementos podem somar grandes progressos rumo aos resultados
desejados, cobrindo uma gama consideravelmente maior de possibilidades.
Apêndice 1: Diagrama de operações, rotações e recursões
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