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F I C H A T É C N I C A C U R TA M E T R A G E M

Pesquisa, roteiro e edição Fotografia e capa


Pedro Sá Chão Ateliê

Argumento Mixagem
Pedro Sá Joildson Rocha
Tereza Vasconcelos
Câmera
João Anselmo
Chão Ateliê
Produção Executiva
Imagens de terceiros
Tereza Vasconcelos
Nigeria Filmes
João Anselmo

Orientação
Bruno Lima

FICHA TÉCNICA LIVRO

C L I Q U E PA R A A S S I S T I R A O C U R TA Pesquisa Projeto editorial


Pedro Sá Chão Ateliê

Orientação Fotografia
Bruno Lima Pedro Sá
Eduarda Dantas
Revisão
Tereza Vasconcelos
João Anselmo
Trabalho de conclusão de curso apresentado à Coordenação de Graduação em
Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal de Pernambuco, como re-
quisito à obtenção do diploma de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo, inti-
tulado de Moenda: construção e demolição na cidade do Recife, de autoria do
aluno conluinte Pedro Sá, sob orientação do Prof. Bruno Lima.
SUMÁRIO
7 P R Ó LO G O

10 INVESTIGAÇÃO
Cons i de ra c oe s inic i a i s
P roc e s s o me todológ ic o

15 UNIVERSO CONCEITUAL
Conte xto v is u a l
Condomínio e re p rodu ç ão patr iar cal
Me rc a do e ha b ita ç ã o
Ra c i s mo
Es fe ra p olí tic a

CONTEÚDO 23 CONSIDERAÇÕES
I mp ortâ nc ia do de b a te par a fo r m ação do ar quiteto
Cons i de ra ç õe s fina i s
A S S I S T I R C U R TA M E T R A G E M
27 REFERÊNCIAS
O U V I R E N T R E V I S TA S

L ú ci a L e i tã o

Iana Ludemir

Rudrigo Rafael

C a i o S a n to s

I v a n M o ra e s

E N S A I O F O TO G R Á F I C O TÁV O R A
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 7

PRÓLOGO
P O R Q U Ê FA Z E R U M F I L M E E M A R Q U I T E T U R A

Antes de mergulhar no processo de pesquisa e trabalho algum plano da foto ou do vídeo, revelando-se como cená-
artístico que resultou no curta metragem nomeado Moenda, rio, construindo semioticamente o significado da imagem.
é importante trazer para o início da discussão deste escrito, Recebemos estímulos de todos os lados e somos induzidos a
um pouco das motivações e questionamentos que me fize- viver uma vida cada vez mais compartilhada em redes sociais
ram decidir pela produção de uma peça audiovisual como e o audiovisual tem se consolidado como um instrumento de
resultado de um trabalho de graduação de um curso comunicação que responde à essa demanda crescente.
de arquitetura e urbanismo.
Crianças brincando com seus animais de estimação no
Observo nos trajetos, nos espaços públicos ou nos edi- parque da jaqueira e os pais registrando tudo no facebook.
fícios em que frequento que as pessoas estão mudando em Uma moça que procura apartamento tirando foto de todas
algum nível a sua relação com o espaço e os elementos que as placas de aluga-se nas fachadas dos prédios e casas. Um
o compõem. Não necessariamente uma mudança que se so- jovem que tem um perfil no instagram sobre prédios anti-
brepõe, mas uma nova camada, algo que penetra estrutu- gos andando pela cidade tentando capturar fotos com ângu-
ralmente no comportamento humano, e, que por ser recen- los e perspectivas ainda não vistas. Uma skatista com uma
te, ainda não conseguimos entender com tanta clareza os gopro no capacete registrando suas manobras no bowl do
possíveis desdobramentos e consequências para as diversas parque dona lindu. O camelô postando no stories as fotos
áreas de interesse humano desta mudança. de seus produtos. O avô que manda todo dia para seus ne-
tos uma foto da praia de boa viagem na varanda gourmet do
Para ilustrar o que digo, basta olhar ao seu redor e pro- seu apartamento. Um casal tirando uma selfie no baobá para
vavelmente vai encontrar algum celular. E nesse celular postar no grupo do whatsapp. Pesquisadores com drones
provavelmente terá uma câmera fotográfica. E que por ter sobrevoando e registrando o fluxo de pedestres na conde da
uma câmera, terá também uma galeria de imagens repleta boa vista. A prefeitura monitorando em streaming através
de fotos e vídeos. E provavelmente, nessas fotos e vídeos o de 118 câmeras as ruas do Recife.
ambiente público ou privado aparecem de alguma forma, em Tudo isso acontecendo ao mesmo tempo. Nesse minuto
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 8

aproximadamente 46.200¹ imagens ou vídeos foram pos- 1. Dados da sobre direito à cidade, direito à moradia, impacto ambien-
tadas apenas no Instagram, cerca de 3.800.000 pesquisas pesquisa A tal que nosso habitat causa ao meio ambiente, entre outros.
foram feitas no Google, 4.5000.000 vídeos foram vistos no Minute on the É possível trazer a participação popular através do celular?
Youtube. Que força tem isso? Como essa crescente mudança Internet in Como alcançar esse engajamento? É possível metodologica-
de hábito pode influenciar na forma como nos relacionamos mente? Ou será que a academia precisa de uma renovação no
2019, realizada
e pensamos a cidade? Ou será que é algo sem expressividade olhar para dominar essas questões? Ou tudo isso é um delí-
pela empresa
para tal? rio?
Statista.

Hoje, entrando na segunda década do século 21, é possível Bom, meu trabalho presente neste documento não traz
dizer que se tornou comum utilizar o celular para as mais essas respostas. Acredito que a sua natureza é questiona-
diversas funções. No nosso país, em 2017, já havia telefone 2. Dados do dora e não conclusiva. Meu objetivo foi sair da zona de con-
móvel celular em 93,2% dos domicílios e cerca de 74% com PNAD-IBGE forto e explorar um formato diferente para minha realidade
acesso à internet². Este número mostra que há um alinha- em uma tentativa de deixar registrado a experiência para o
2017.
mento a uma tendência global de acesso à internet através debate futuro. Vale ressaltar que não há ineditismo nessa
de celulares, e que o nosso contexto local, apesar da aparen- escolha, que outras graduações em arquitetura e urbanismo
te desigualdade social, apresenta uma relativa penetração hoje e em décadas passadas, como a FAU-USP e Escola da
dessa tecnologia na vida das pessoas, e por consequência, Cidade - SP, também ofereceram a possibilidade de traba-
em seus hábitos e comportamento. A projeção para o Brasil lhar com audiovisual para realização de suas pesquisas aca-
no ano de 2025, segundo relatório Economia Móvel 2019 da dêmicas.
GSMA, cerca de 204 milhões de pessoas farão uso de smar-
tphone com acesso à internet, quase a totalidade dos 210 Entendo também que o caminho interdisciplinar entre as
milhões de habitantes previstos para este mesmo ano. matérias elementais é algo importante para a formação in-
telectual de ambas áreas do conhecimento. Pensar arquite-
Esse panorama torna evidente uma realidade de produção tura enquanto cinema, nas suas sobreposições de camadas,
de um enorme volume dados e de imagem em que a cidade do movimento tanto da câmera quanto da cena e o tempo, na
inevitavelmente está inserida nesta produção, e que me faz iluminação, no enquadramento é um exercício que enriquece
questionar como ou se a profissão de arquitetura e urba- o repertório artístico da formação do arquiteto bem como o
nismo deve se apropriar dessa realidade para aproximar as pensamento da criação de um lugar, texturas, cores e suas
pessoas da discussão sobre o direcionamento da produção sensações, através dos filmes é algo no mínimo enriquece-
- acadêmica ou não- de nossa cidade. Como tornar mais dor para o cineasta.
acessível - em linguagens verbais e não verbais - as pautas
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 9

A produção do curta metragem foi um exercício de tradu-


ção da uma das realidades ao meu redor em uma peça audio-
visual que é resultado de uma investigação sobre a constru-
ção e consequente demolição da cidade do Recife e a quem
essa transformação beneficia. Portanto, foi uma tentativa de
me aproximar das pessoas, de realizar pesquisa acadêmica
em torno de uma questão, de colher diversos tipos de mate-
rial, de digerir este material, porém transformá-lo em um
documento em vídeo e áudio, adicionando então uma nova
camada de informação neste documento, que é a imagem em
movimento.
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 10

C A P Í T U LO 0 1

INVESTIGAÇÃO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Tomada a decisão da realização de uma peça audiovisual consiga permear harmoniosamente entre conteúdos de di-
como resultado do processo de pesquisa de conclusão de cur- ferentes formatos e plataformas, respeitando cada natureza
so em uma graduação de arquitetura e urbanismo, o primeiro essencial e aproveitando-se da interatividade para fornecer
momento foi a produção propriamente dita que resultou no a possibilidade de uma apreensão ampla e flexível, onde o
curta aqui vinculado e, em segundo, a elaboração deste docu- documento se adapta ao formato, em uma tentativa de se
mento escrito que contemplaria a formalização da pesquisa apropriar dessas ferramentas, a fim de produzir, então, uma
em palavras. As duas peças se apresentam como complemen- comunicação versátil, que atenda não apenas ao público
tares e, juntas, constituem a produção de conhecimento pro- habituado à leitura, mas podendo contemplar informação de
posta pelo exercício de conclusão da etapa final de um curso outras ordens, através de palestras, entrevistas, filmes, re-
de graduação. portagens, imagens, etc, dentro do universo temático desta
pesquisa.
A natureza deste escrito é munir então o debate com in-
formações já produzidas por outros autores e autoras, que dê Há riscos nesse formato não linear de argumentação para
a possibilidade ao leitor e leitora ter acesso à uma experiên- a validação do conhecimento acadêmico, compreendo. Mas
cia expandida transmídia³ dentro do universo conceitual em 3. Transmídia: entendo também que a ciência, assim como a arte, são fi-
que o filme Moenda está fundamentado. Portanto não cabe a conteúdo que lhas do seu tempo. O método científico precisou se adaptar
este documento trazer a mesma linha argumentativa que o se sobressai ao longo da história à diversas inserções de campos de co-
filme já traz, e sim constituir um segundo momento de mer- a uma mídia nhecimentos - principalmente das áreas humanas, onde não
gulho acerca das temáticas e questionamentos propostos no era tão fácil assim mensurar resultados. Também precisou
única. Henry
curta metragem. Fornecendo insumo teórico, contextualiza- se adaptar às tecnologias. Precisou se adaptar quando mais
Jenkins (2003)
ção sobre espírito do tempo em que esta produção está inse- pessoas tiveram acesso à informação. E que siga sempre
em Cultura da
rida, referências visuais e as entrevistas gravadas na íntegra. assim: se moldando ao espírito do seu tempo, pois o conhe-
Convergência.
cimento não deve ser algo feito de cima para baixo, mas de
O objetivo é que a produção de conhecimento aqui presente baixo para cima.
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 11

gada do progresso. Que era “o ônus de algo que vem para me-
P R O C E S S O M E TO D O LÓ G I C O
lhorar”. De fato, para a classe que sempre teve acesso à todos
os privilégios de morar em centros urbanos, esses imóveis
O processo investigativo teve início de fato após a possi- em processo de abandono ou que já foram demolidos, já não
bilidade de, através de uma janela de tempo, entrar em uma representam para eles aquele status de outrora. E por conse-
obra de demolição de um edifício abandonado no bairro da quência, já não o viam como o lugar de suas memórias.
Torre, em Recife, onde consegui realizar uma série foto-
gráfica - que se apresenta neste livro - sobre a destruição Esses imóveis já estão demolidos quando as máquinas che-
daquela matéria carregada de memórias. Depois deste pri- gam. Este processo de demolição, é por fim, apenas a ma-
meiro impacto, conversei com alguns dos antigos moradores terialização de um campo subjetivo para o campo objetivo.
daquela região, entrei em outros edifícios e casas abando- Formalização.
nadas, passei a observar na cidade ao redor a quantidade
de imóveis em situação de abandono. É tão comum que não Essa classe está em um constante processo de consumo
percebemos. de tendências, estimuladas por uma lógica de mercado, sob
ótica de sempre aquisição do “novo”, onde a narrativa do
A partir deste momento, já tinha entendido como um dos progresso, se faz pela manutenção da opinião coletiva des-
eixos do trabalho o recorte da demolição na cidade e como sa classe consumidora de que o que é velho - se não for pa-
essa demolição afeta subjetivamente a memória coletiva. trimônio histórico dos colonizadores europeus - precisa ser
Segui com a investigação, e após a primeira série de entre- demolido para dar lugar a novos empreendimentos. Então,
vistas, principalmente com moradoras e moradores desses para essas pessoas, é unir o útil ao agradável o apagamen-
imóveis que foram abandonados e demolidos, pude perce- to dos registros mais antigos da cidade - e por consequência
ber que uma parcela desta classe média não tem esse afe- as pessoas que habitam esses locais - para dar lugar ao que
to romantizado com o espaço que constituiu o abrigo para essa classe enxerga como o que há de bom agora. Ao Novo. Ao
sua infância. Quando questionados sobre o sentimento de Progresso
constatar que já não estava alí aquele espaço que integrou
as memórias de sua infância, respondiam sobre tristeza de E isso não é novidade.
imediato, mas rapidamente acenavam que era devido a che-
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 12

Mas ainda persistia em meu processo investigativo a


ideia de que aquela espacialidade, presente na tipologia
das casas e edifícios baixos daquela época, com ambien-
tes amplos e térreos abertos e verdes, havia sido perdida
e substituída por vagas de estacionamento e microjardins
oportunos dos novos empreendimentos imobiliários. Que
portanto, a qualidade espacial e arquitetônica tinha caído
com a padronização dos prédios altos. E quem poderia mais
sentir essa diferença era então a classe que tivera acesso a
ambos espaços de morar. Eis então, minha segunda desilu-
são.

Quando questionei-os sobre essa ótica espacial, o que na


visão deles teria mudado, muito se falou sobre a insegu-
rança de viver na cidade nos dias atuais, por isso a neces-
sidade dos muros altos e que pessoas façam a segurança.
Na perspectiva da casa, a maior diferença era no tamanho
da residência, que hoje por ser menor e o metro quadrado
mais caro, “não dá mais para ter três empregadas, você tem
que sobreviver com uma só. [...] Mas na casa de Tamandaré
a gente ainda tem essa possibilidade. Temos uma casinha lá
atrás pra elas bem organizada”.

Para uma parcela da sociedade, essa relação casa gran-


de-senzala freyriana ainda é reproduzida e perpetuada,
tanto para casa grande, quanto para a senzala. Esta classe
dominante não viu os espaços que constituíam sua memó-
ria serem demolidos e substituídos por empreendimentos
que apresentam pior qualidade espacial, pelo contrário,
esta classe reforça essa transformação, não se importam
com a qualidade dos espaços que são construídos objeti-
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 13

vamente, apenas se interessam se os valores da casa grande mentos em algumas ocasiões, não foram todas as entrevis-
vão estar presentes, ou simplesmente se movem para regi- tas que consegui realizar a gravação com o mínimo de quali-
ões de veraneio onde é possível exercer e usufruir os privi- dade para usar no filme.
légios da casa grande, tal qual existem subjetivamente em
suas memórias. Portanto, está tudo lá, só muda a forma. Com as gravações em mãos, o próximo passo foi trabalhar
em cada gravação - cerca de 4h de áudio - para digerir seu
Na mesma semana em que realizei essas entrevistas com conteúdo, recortar trechos importantes e categorizar con-
antigos moradores dos edifícios do bairro da Torre que fo- ceitualmente o que estava sendo dito ali. Depois da produção
ram demolidos, aconteceu o despejo truculento do acam- de extenso panorama geral das falas importantes das entre-
pamento Margarida Alves, do MST, onde 55 famílias, que vistas e os conceitos que estavam lá presentes, pude então
já moravam há 16 anos foram retiradas de suas casas à for- começar a montagem do argumento.
ça, sob ordem do estado. Pessoas ainda estavam dormindo
quando as máquinas chegaram para demolir suas casas. A A primeira etapa do argumento foi definir que tipo de fa-
partir deste momento percebi que as demolições, que para las tinha caráter introdutório, intermediário e final ao tema
4. Centralismo,
uma classe são naturais e necessárias, para outra são a pro- central do filme, depois foi entender quais falas tinham uma
va de como o estado age de forma violenta para expulsá-los domesticidade característica de permear entre blocos e quais trechos ser-
para cada vez mais distante. Daí surgiu o nome moenda na- e privativismo. viam de transição de um bloco para outro.
turalmente. Nome dado a todo instrumento que mói; moi- Análise retida-
nho de engenho. É uma ferramenta de dominação que serve ra de Quando Com o escopo conceitual montado, o próximo passo foi
aos interesses de uma parcela da sociedade apenas. o ambiente é fazer uma longa curadoria de material de áudio de repor-

hostil - uma tagens, propagandas, músicas e outros, que serviriam para


Então, após o entendimento de que o recorte do filme compor a paisagem sonora do filme e contrastar ao que es-
leitura urba-
seria a perpetuação dos valores patriarcais4 através da de- tava sendo dito, a fim de dar uma maior dinâmica ao filme.
nística da vio-
molição, despejo e produção imobiliária, foi desenhado um
lência à luz de
apanhado de subtemas relacionados que direcionaram a Com a faixa de áudio principal montada, o exercício então
Sobrados e
montagem dos perfis de entrevistas a serem realizadas. foi buscar a tradução em imagens e ir em campo para gra-
Mucambos e
var essas imagens. Dentro desse processo, pude contar com
Em um segundo momento, com alguns dos entrevistados outros ensaios a ajuda de terceiros para realizar a captação das imagens,
já definidos, foi definido os tipos de perguntas e temáticas gilbertianos. bem como receber imagens de parceiros. Com o apanhado de
que iriam ser trabalhadas em cada entrevista, para então, (LEITÃO, LU- imagens captadas, o trabalho foi de fazer a edição, monta-
sair para gravação. Devido a limitações técnicas dos equipa- CIA, 2009) gem, os retoques e finalização do filme.
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C A P Í T U LO 0 2

UNIVERSO CONCEITUAL
C O N T E X TO V I S U A L

Hoje, ao final dos anos 10 do nosso século, podemos con- coletiva de realizar um filme onde qualquer pessoa poderia
siderar que essa década foi marcada por um forte debate na contribuir produzindo material que dialogasse com a temá-
cidade do Recife acerca das questões urbanas, sociais, mobi- tica central proposta. Essa atitude reverbera as noções de
lidade, produção imobiliária, denúncia de relações obscuras maior participação popular na produção artística, cultural,
entre políticos e empresários, e crise da representatividade acadêmica e da cidade.
política. Questões que em muitos casos se viram inter rela-
cionadas. Boa parte dessa agenda esteve presente na produ- A partir de 2014, com o projeto Novo Recife e o resistên-
ção acadêmica, trabalhos artísticos em diversos campos, em cia social-cultural que se opunha a este processo através do
pautas dos movimentos sociais e, sobretudo, no audiovisual movimento Ocupe Estelita, se intensificou o debate sobre
pernambucano. as relações de poder por trás dos grandes empreendimen-
tos urbanos e quem se beneficia com essas construções. O
No início da década de 2010, produções como Eiffel, Recife audiovisual teve protagonismo neste cenário onde as pro-
MD, [projetotorresgemeas] trouxeram para o debate a dis- duções como Velho Recife Novo, Recife Cidade Roubada e
cussão acerca da construção de dois espigões com 130 me- Cabeça de Prédio adicionam ao debate um caráter educativo
tros de altura no sítio histórico delicado do bairro de Santo e informativo à população sobre a histórica da formação da
Antônio, onde seus alvarás de construção foram concedidos cidade do Recife, a necessidade do amplo debate, reivindi-
de maneira duvidosa e questionável, deixando evidente a cando participação popular nas decisões sobre projetos de
associação entre construtoras e a gestão pública. A questão impacto, áreas públicas, moradia de interesse social e mo-
despertou o interesse da sociedade civil e através de redes bilidade.
sociais passaram a se articular em prol do questionamento
e o amplo debate sobre a participação social nas tomadas de Ainda sobre grandes empreendimentos, a tese de dou-
decisão sobre empreendimentos dessa magnitude. Como um torado da Profa. Lúcia Veras traz a luz sobre a questão do
reflexo destas novas ferramentas de interação e comunica- impacto na paisagem urbana. Ela estuda a compreensão do
ção digital, o [projetotorresgemeas] desenvolveu uma forma Recife a partir da imagem e da palavra que assim denomina
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 16

de paisagem postal. Como poderiam 13 Torres serem cons-


C O N D O M Í N I O E R E P R O D U Ç Ã O PAT R I A R C A L
truídas no bairro histórico de São José encobrindo mais de
400 anos de história? Uma paisagem imposta sem consulta
popular criando duas cidades antagônicas que foi estudada 5. Mal-Estar, “A lógica do condomínio tem características estruturais: a
por Lúcia sob dois olhares: skyline, mais distante observan- Sofrimento e primeira delas é o muro. O muro como uma realidade objetiva,
do a estética da composição e o landline, mais próximo que Sintoma: Uma como um instrumento político”5 (DUNKER, CHRISTIAN 2015).
avalia a paisagem pela vida vivida no cotidiano. Esta realidade aparta, controla e invisibiliza duas par-
psicopatologia
tes distintas da cidade: a rua e a casa. Do lado de dentro do
do Brasil entre
Explorando temas como os valores das elites brasileiras, muro tudo funciona: segurança, mobilidade, lazer e serviços
muros. Chris-
os longas metragem Doméstica e Um lugar no sol, de Gabriel (e dependência) completos. São ofertas comuns dos empre-
tian Dunker,
Mascaro, e o Som ao Redor, de Kléber Mendonça Filho, re- endimentos de mais alto padrão.
2015.
tratam reprodução os valores patriarcais e relações de po-
der sintomáticas da sociedade brasileira. Recentemente, os O condomínio de hoje é o triunfo da histórica trajetória de
filmes Brasil S/A,de Marcelo Pedroso, e Aquarius, de Kléber desprestígio da rua enquanto espaço de convivência social,
Mendonça Filho, analisam de forma mais abstrata e sen- da capsularização da vida urbana e da perpetuação da cida-
timental o impacto que o modus operandi dissimulador da de enquanto instrumento de manutenção da ordem social
lógica do mercado tem no cotidiano e na vida dos indivíduos. vigente em virtude da sua produção visando quase exclusi-
vamente o lucro de seus produtores. O valor de diferencia-
Tivemos uma produção relevante de curtas e longas me- ção social criado pelo ato de isolar-se do espaço público por
tragens nos últimos 10 anos, que calçaram o contexto visual medo ou ojeriza, associada à lógica crescente de padroniza-
em que o filme Moenda está inserido. ção de projetos em virtude da abrangência cada vez maior
de construtoras e incorporadoras cristaliza não somente a
produção do espaço como também as relações sociais que
partem dele e de sua falta. Os materiais de construção são os
mesmos, as esquadrias são as mesmas, os sistemas constru-
tivos são os mesmos, as plantas são as mesmas, os quartos
de serviço identificados nas plantas como depósitos para
burlar a legislação que garante o mínimo de conforto e dig-
nidade a quem ali habitar são os mesmos. Nota-se a clara
perpetuação de valores e relações econômicas e sociais que
cidades como o Recife abrigam hoje.
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 17

Esse tipo de empreendimento é geralmente construído


nas mais privilegiadas áreas da cidade. O primeiro critério é
o das áreas planas, onde é mais fácil, rápido e barato cons-
truir; depois, áreas onde os serviços como transporte, edu-
cação, saúde, saneamento e lazer sejam de fácil acesso. Essa
escolha deliberada, relega à população pobre as áreas aci-
dentadas onde a construção de qualidade é fatalmente mais
cara e onde os serviços citados anteriormente chegam com
dificuldade sendo eles públicos ou privados. Longe das cen-
tralidades e dos lugares onde a cidade e economia formais
acontecem, os periféricos se veem obrigados a se submeter a
mais um dos instrumentos de manutenção de seu lugar so-
cial: um caduco sistema de transporte público projetado, as-
sim como a cadeia de produção de espaços, para nada além
do lucro de seus provedores trazendo para a escala urbana/
metropolitana a dicotomia do espaço meu e do espaço outro.

“Alienada, inebriada pela obsessiva busca de privilégios, de


distinção de ambientes privés, espera daqueles que exclui, pa-
radoxalmente, um comportamento afável, próprio da urbanida-
de que essa cidade está longe de proporcionar.” (Lúcia Leitão,
2009)

Sobre a temática do estudo da dimensão subjetiva da ar-


quitetura e origens patriarcais da sociedade brasileira, re-
alizei a entrevista com a Prof. Lúcia Leitão, pesquisadora a
frente do Núcleo de Estudos da Subjetividade na Arquitetura
(NusArq), da UFPE.
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 18

M E R C A D O E H A B I TA Ç Ã O

A cidade segregada será sempre território de disputa. ambiente de permissividade resultante das relações eco-
Grupos à margem dos direitos, serviços e espaços urbanos nômicas promíscuas entre agentes de mercado e de estado,
entende, se organiza e reivindica. De um lado debates acer- desequilibrando o cenário de luta pelos direitos urbanos e
ca da qualidade e acesso de nossos espaços, da nossa mobi- colocando no mesmo polo aqueles que detém o poder eco-
lidade, de nossas habitações e do outro uma retórica quase nômico e o poder político instituicional.
que exclusivamente mercadológica de ineficiência econô- Para trazer insumos e enriquecer a análise desse cenário
mica dos imóveis. Polarização didática, mas próxima o sufi- de relações dos agentes produtores dos nossos espaços ur-
ciente da realidade. Basta pensar no problema da habitação banos, entrevistei Rudrigo Rafael mestre em Serviço Social
urbana, questão fundamental nas metrópoles brasileiras, da Universidade Federal de Pernambuco (2012-2014) com
mas que, à despeito do ritmo frenético da produção de uni- atuação junto a organizações da sociedade civil e movi-
dades habitacionais, permanece inquestionavelmente irre- mentos sociais e experiência profissional como Assistente
soluta. Social no campo da política urbana e defesa do direito à
Os mecanismos de produção do espaço obedecem hoje a cidade e também Iana Lurdemir, professora do Departa-
um padrão cíclico de criação da imagem de abandono, obso- mento de Arquitetura e Urbanismo da UFPE e doutora em
lência, insegurança, e inércia econômica seguido da mate- Desenvolvimento Urbano pelo Programa de Pós-Graduação
rialização mais violenta possível da extinção desses valores em Desenvolvimento Urbano da UFPE.
nocivos: a demolição. O ciclo encontra terreno fértil num
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 19

RACISMO

Para compreender o processo de verticalização e condo-


6. Termo de- minização 6 da cidade, que gera segregação urbana e portanto
fendido por abastece as desigualdades espaciais na cidade, é preciso fa-

Christian zer o exercício de dar passos para trás na tentativa de buscar


entender como se deu historicamente e como ainda aconte-
Dunker, em
ce. E não tem como fazer uma discussão sobre desigualda-
Mal-Estar,
des urbanas sem fazer uma contextualização racial devido a
Sofrimento e
história da formação do nosso país.
Sintoma: Uma
psicopatologia “O significado de racismo estrutural carrega uma lógica de
do Brasil entre reprodução sutil. Ao contrário do racismo declarado e explíci-
muros. 2015. to, que é punido pela constituição brasileira, ele opera de for-
ma difusa no cotidiano de instituições, organizações e cidades”
(López, 2012). Até hoje, sua presença está na desproporção
de representação nos espaços políticos, acadêmicos, eco-
nômicos e consequentemente, urbanos. O termo urbanis-
mo daltônico (Joice Berth, 2019), por exemplo, é usado para
diagnosticar o fato da maior parte da construção urbana ser
pensada majoritariamente por pessoas brancas que difi-
cilmente vão ter acesso aos mesmos repertórios culturais e
espaciais de pessoas negras.

O documentário Uma geografia das Desigualdades levan-


ta esse questionamento observando a malha urbana de São
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 20

Paulo e como o racismo institucional até hoje está correla-


cionado com a segregação socioespacial. Enquanto que em
Recife, ao analisar rapidamente o mapa de população negra
por bairro , é possível observar o contraste entre as regiões
população negra abaixo de 28% do total de habitantes e o
resto da cidade. E, é exatamente nessas regiões com menor
população negra que há a maior concentração de prédios
verticais da cidade. Portanto, é possível dizer que essa ló-
gica de condominização, além de reproduzir os valores do-
mésticos e patriarcais da casa grande, também reforça um
racismo institucionalizado, onde cria barreiras que limitam
o acesso de determinados grupos sociais aos espaços da ci-
dade.

Sobre esse assunto, entrevistei Caio Santos, ativista do


movimento negro, cientista político e mestrando pela Uni-
versidade Federal de Pernambuco, especialista em estudos
ESFERA POLÍTICA
do legislativo em pautas relativas a minorias sociais, negros
e frentes parlamentares temáticas, para discutir como o
Além da discussão sobre raça feita anteriormente, é fun-
direito à cidade tem uma correlação com a população negra
damental acrescentar mais uma camada para compreender
e como as demolições se transformam em ferramentas do
o universo que cerca boa parte das construções e das demo-
estado para exercer um racismo institucionalizado.
lições da cidade. Existe uma correlação de forças políticas
e econômica que conduzem o modus operandi do mercado
imobiliário e elas estão atreladas ao formato de represen-
tação política que temos hoje; centralizada na figura de ho-
mens, brancos e que fazem parte da elite econômica da re-
gião. Isso significa que as tomadas de decisão - sobre como
o dinheiro público deve ser investido na cidade - gira em
torno de poucas pessoas, que provavelmente tem a mesma
origem social e econômica.
mo en da CONSTRUÇÃO E DEMOLIÇÃO NA CIDADE DO RECIFE 21

A verdade é que na prática, até temos uma legislação ur- senvolvimento de uma cidade, que passa por processos
banística muito avançada a partir da constituição de 1988. políticos influenciam diretamente nas estruturas da vida
“É um arcabouço legal muito avançado para uma realidade urbana.
atrasada. A aplicação da lei é profundamente subordinada às
relações sociais marcadas pela desigualdade. A questão da pro- Outro exemplo que mostra essa ligação com as escolhas
priedade da terra e dos imóveis no Brasil continua sendo um nó. políticas e administrativos de Recife é a forma como os
Um nó na sociedade brasileira, intermediando as relações so- imóveis antigos do centro da cidade foram abandonados
ciais” (Ermínia Maricato, 2019). e acumularam dívidas milionárias de IPTU. Essa reporta-
gem investigativa do Marcozero Conteúdo, explica todo
Para explicar como esses nó acontece é preciso entender esse fenômeno e aponta que essa inadimplência é apenas a
um pouco sobre as regras do jogo político. Um exemplo que ponta do iceberg da ambição do mercado imobiliário. E um
pode começar a ilustrar essa relação é que até a eleição de dos elementos que mantêm essa relação viva, e esqueci-
2016 o financiamento de campanha se dava através de do- da quando conveniente, são as relações incestuosas entre
ações de pessoas jurídicas. Então, para o setor empresarial proprietários e responsáveis pelas administrações munici-
- como construtoras e imobiliárias - esse período é impor- pais.
tante para fazer investimentos. Porque provavelmente quem
ganhar as eleições vai retribuir o favor em contratações e Foi sobre esses aspectos dos conflitos políticos que con-
licitações públicas para realizar as obras na cidade. E como o versei com Ivan Moraes, vereador da cidade do Recife pelo
objetivo desse setor é lucrar, as construções vão ser voltadas PSOL (Partido Socialismo e Liberdade). Ele faz parte da
para quem pode pagar, a classe média alta. Ficando segun- oposição na Câmara, além de ser jornalista e ativista pelos
do plano a inclusão dos setores mais pobre da sociedade no direitos humanos. Seu mandato tem uma abertura para o
plano urbanístico da cidade. diálogo com a população civil e esteve fiscalizando e de-
nunciando demolições ilegais como a do Cais José Estelita
Essa ilustração resumida simploriamente, é uma das ca- e Caranguejo Tabaiares.
madas que envolve o conflito de interesse por trás do de-
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C A P Í T U LO 0 3

CONSIDERAÇÕES
I M P O R TÂ N C I A D E S T E D E B AT E PA R A
F O R M A Ç Ã O D O A R Q U I T E TO

O ofício da arquitetura e urbanismo, o ato de pensar a da, como bem pontua Lúcia Leitão em entrevista gravada
construção do abrigo humano, seu conjunto e a relação es- e disponibilizada anteriormente, é repleta de reproduções
pacial entre eles, que é a cidade, é, inevitavelmente um pen- inconscientes de um imaginário subjetivo em que o sujeito
samento tradutor de anseios e vontades de uma sociedade. está inserido.
Nesse processo, há de um lado uma lógica de uma ação de
materialização construtiva, um campo objetivo, tectônico, Entender essas reproduções, o que está por trás das li-
e do outro lado, uma dimensão não material, necessidades nhas no papel, é ter maior discernimento sobre o que esta-
humanas não tangíveis, significados e valores de uma so- mos produzindo e qual caminho estamos traçando em prol
ciedade. No exercício de projetar, conscientemente ou não, o de uma sociedade mais justa e igualitária. Porém, na for-
arquiteto busca por alcançar uma interpretação dos diversos mação do arquiteto, pouco se trabalha esse campo subjeti-
parâmetros que estão postos, para, por fim, orientar a cons- vo. Digo isso da minha perspectiva e de acordo com a minha
trução material dos espaços em questão. formação e a de colegas próximos de outras universidades.
Temos cursos de graduação voltados para o entendimento
Porém, enquanto seres humanos e portanto sociais, no de problemáticas acerca do campo construtivo e suas corre-
ato de projetar, os arquitetos também reproduzem uma sé- lações tectônicas, estruturais, materiais e compositivas.
rie de valores, conscientemente ou não, de acordo com sua
classe social, suas experiências individuais e coletivas, seu Ora, de que adianta uma obra arquitetônica plasticamente
acesso à informação, sua visão de mundo. Porque isso é o bela e bem resolvida espacialmente porém reforça segrega-
que o constitui. O ato de criar algo passa pelo crivo desse ções e discrimina grupos sociais minoritários? Se reproduz
repertório de valores, imagens e informações. Nós não so- uma lógica opressora, qual a contribuição que esta obra traz
mos máquinas que reproduzem sem discernimento próprio. para a cidade? Uma boa arquitetura, antes de mais nada,
Portanto, a “genialidade do arquiteto” na concepção arqui- deve ser responsável socialmente e esforçar-se para cons-
tetônica não é fruto de uma criatividade plena e cristaliza- truir um lugar mais justo, inclusivo e igualitário para todas
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as pessoas. Ser plasticamente belo é um detalhe, e essa per- além dessas paredes, pilares e vigas.
cepção também varia de pessoa para pessoa de acordo com
seu repertório individual. Portanto, busquei neste exercício final da graduação, tra-
zer para o debate temas como reprodução patriarcal, racis-
Buscar uma formação que tenha um balanço entre as di- mo e as lógicas políticas e econômicas acerca da produção
mensões construídas e não construídas é ter a responsabili- da cidade no intuito de questionar sobre construção dos
dade de formar profissionais que entendam que a constru- espaços arquitetônicos e urbanos, através de uma perspecti-
ção humana é carregada de signos e valores, e que o ato de va interdisciplinar e de uma visão macro da cidade. Além de
projetar, além de requisitar um entendimento construtivo e contribuir para o amadurecimento de um senso crítico que é
objetivo, se faz necessário ter a noção e o pensamento críti- essencial para melhorar a formação técnica do arquiteto.
co acerca do campo subjetivo que está sendo construído para
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Enquanto realização de um trabalho acadêmico, cujo o não, é essencial para acrescentar insumos no debate sobre
objetivo é se debruçar sobre uma temática, desenvolver as desigualdades sociais e sua influência direta no desen-
método, buscar e analisar de material coletado, e, por fim, volvimento de cidades mais democráticas. Portanto, é nes-
produzir um documento final com os resultados do proces- te sentido de fomento ao debate que o meu exercício neste
so, acredito que uma experiência interdisciplinar, além de trabalho de graduação se faz presente.
alcançar esses objetivos, acrescenta a formação do arquite-
to a possibilidade de abrir os horizontes sobre outras áreas Acredito que a realização deste trabalho, que permeia
de atuação para entender a correlação com a arquitetura e a entre campos autônomos, é legítimo enquanto produção de
cidade. É assim no mundo fora da universidade. Por que não conhecimento, dado que houve uma investigação sobre um
podemos se apropriar dessa realidade? recorte temático, a coleta de informação de diversos forma-
tos e a tradução de seu resultado registrado em documento
O cotidiano da cidade é plural, é diverso e multifacetado. formal audiovisual perpétuo, onde é possível ser arquivado e
O seu dia a dia se faz inevitavelmente por relações políti- perpassado entre o tempo.
cas, expressões de valores sociais, culturais e de poder. Até
mesmo o traço mais puro e ingênuo na prancheta é carrega- Há vários erros aqui presentes agora e outros que só se-
do por essa lógica, e sua possível construção perpassa entre rão percebidos com o tempo, acredito. Porém há também
uma cadeia de pessoas, que são diversas em suas funções, uma legítima vontade de aproveitar o momento para regis-
formações, culturas e pensamentos. trar uma experiência não convencional ao que estava posto
para mim. Fui para campos desconhecidos, na tentativa de
Questionar e tentar entender como este sistema está pos- buscar algo e trazer para casa. Sei que pode não ter havido
to, lançar um olhar crítico sobre a forma com que os arqui- uma execução técnica de alguma parte do todo, seja devido a
tetos lidam com as demandas de construção da cidade, bus- condicionantes da falta de tempo, equipamentos ou técnica.
car compreender o processo de concepção como um lugar de Para mim, o importante foi deixar registrado a experiência,
reprodução de diversos valores, no ambiente acadêmico ou o primeiro passo.
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Outro ponto que julgo como importante para esse proces-


so foi a possibilidade de documentar tudo em um formato
digital. Hoje, o uso desse formato precisa se tornar comum
à produção acadêmica para deixá-la eficaz e atualizada das
novas ferramentas que já estão criadas e que estão por vir.
Falo da possibilidade de enriquecer o documento com conte-
údo de diversos formatos, de facilitar o processo de difusão
desse conteúdo, de diminuir a burocracia interna e desloca-
mentos, de diminuir os custos abusivos com impressão e por
consequência o consumo de papel, entre outros. Novas fer-
ramentas abrem o leque de possibilidades.
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nível em: https://actions.oxfam.org/brasil/uma-geo- tps://habitatbrasil.org.br/wp-content/uplo-

REFERÊNCIAS
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