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ISSN 2318-1095
Revista Científica do Núcleo de Pesquisas Eleitorais
e Políticas da Amazônia - NUPEPA/UFRR

Extrativismo estatal e patrimonialismo


no Brasil de sempre
State extractivism and patrimonialism in Brazil of always

Walter Marcos Knaesel Birkner*


Rennerys Siqueira Silva**
Adriele Nayara do Nascimento Araújo***

RESUMO ABSTRACT

O artigo trata de uma abordagem inicial so- The article is an initial approach on patri-
bre o patrimonialismo e o extrativismo polí- monialism and political extrativism em-
tico entranhados no Estado e na Sociedade bedded in the Brazilian State and Society.
brasileira. Tais fenômenos têm iludido nos- Such phenomena have eluded our expecta-
sas expectativas de desenvolvimento bem- tions of successful development. Over the
-sucedido. Ao longo dos séculos, o Brasil não centuries, Brazil has not got rid of some of
se livrou de algumas de suas características its more archaic features. In this direction,
mais arcaicas. Nessa direção, o patrimonia- patrimonialism is the permanent feature of
lismo é a feição permanente das elites na- national elites, and extractivism is the way
cionais; e o extrativismo é a forma pela qual in which patrimonialist elites rely on po-
as elites patrimonialistas se sustentam no wer. Although extrativist patrimonialism
poder. Conquanto o patrimonialismo extra- is an archaic practice, successive genera-
tivista seja uma prática arcaica, sucessivas tions of extractive elites have formed legal
gerações de elites extrativistas conformaram arrangements for its legitimacy. The mo-
arranjos legais para sua legitimidade. A mo- dernization of the Brazilian political order
dernização da ordem política brasileira não did not extinguish this characteristic, on
extinguiu essa característica, ao contrário, the contrary, it sophisticated and this thre-
sofisticou-a e ameaça a sustentação do inaca- atens the support of the unfinished social
bado Estado social no Brasil. state in Brazil.

Palavras-chave: Centralismo e desenvolvimen- Keywords: Centralism and development.


to. Extrativismo estatal. Patrimonialismo. Re- State extraction. Patrimonialism. Natural
cursos naturais. resources.

1
Doutor em Ciências Sociais pela Unicamp e professor visitante no Programa de Pós-Gradu-
ação em Sociedade e Fronteiras (PPGSOF) do Centro de Ciências Humanas da Universidade
Federal de Roraima | b-walter@hotmail.com | (+55) 47-988188898.
** Graduado em História pela Universidade Estadual de Roraima (UERR), especialista em
História da Amazônia e mestrando no PPGSOF | rennerys.silva@gmail.com | (+55) 95-
991324728
***Graduada em História pela Universidade Estadual de Roraima e mestranda no PPGSOF |
adrieleejeova@hotmail.com | (+55) 95-991324728
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Olhares Amazônicos, Boa Vista, v.6, n.2, jul./dez. de 2018. pp. 1222-1253.
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1 Introdução e sociais. Por extensão, análises das


ciências sociais sobre o extrativismo
O extrativismo é um termo de permitem entender a conformação
múltipla utilidade interpretativa social, cultural e institucional das
nas ciências sociais. Recorrem a ele sociedades que se desenvolvem a
economistas, sociólogos e cientistas partir desse modo de produção. Ele
políticos, entre outros, para alguma transpassa as relações de poder, as-
definição conceitual que explique sim como define a importância es-
possibilidades e constrangimentos tratégica de uma região ou nação
ao desenvolvimento regional ou na- nos cenários econômicos internos e
cional. Seu significado literal relacio- externos. É inerente às estratégias de
na-se com a extração dos recursos governança e governabilidade, ao
fornecidos diretamente pela nature- jogo eleitoral e à manutenção do po-
za, isto é, não produzidos nem culti- der, conformando, por fim, as rela-
vados artificialmente. Nessa direção, ções de dependência recíproca entre
diferencia-se, inclusive, da noção de o Estado e a Sociedade.
agricultura e do agronegócio. Não Decorrência lógica da abundân-
obstante, a ele se somam novos sig- cia dos recursos naturais, o extrati-
nificados, relacionados com os agen- vismo proporciona o paradoxo do
tes sociais influenciados por esse crescimento econômico sem desen-
tipo de atividade econômica. Quan- volvimento sustentável. Apropriada
do em larga escala, o extrativismo por governos e agentes privados com
tipifica a economia de uma socieda- outorga governamental, a extração
de, podendo ser predominante ou desses recursos gera concentração
ao menos significativo na sua com- de riquezas ao longo do tempo. Via
posição. À medida que isso ocorre, de regra, os agentes governamen-
o extrativismo ganha dimensões de tais das economias extrativistas não
importância crucial e exerce influên- combatem com eficácia a desigual-
cia comportamental em outras áreas dade, distribuindo apenas compen-
da organização social. sações. Assim, o resultado político e
Na medida da sua grandeza, a econômico do extrativismo favorece
economia extrativista interfere nas grupos minoritários, reproduzindo
relações sociais, constituindo hábi- historicamente a forma patrimonia-
tos e conformando o entendimento lista, com diferentes roupagens, em
sobre a vida em suas várias esferas, favor de oligarquias privadas e cor-
tornando-se um tema sociológico po- porativistas estatais. Não obstante, a
roso. Resultam daí muitos desdobra- extração e apropriação dos recursos
mentos analíticos e interpretativos. fiscais daí oriundos permite, nas de-
Explicações daí originárias tornam- mocracias, criar um vantajoso e po-
-se reveladoras, desde a caracte- pulista sistema de políticas distribu-
rização dos agentes econômicos e tivas. Nessa perspectiva, a história
políticos que se apropriam desses re- republicana no Brasil continua mar-
cursos ou deles sobrevivem, até suas cada pelos vícios de origem, entre os
consequências econômicas, políticas quais, o extrativismo e suas deriva-
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ções ao longo do tempo, presentes vegetal, animal ou mineral, trata-se de


na democracia de massa e em nosso inegável fonte de geração de riquezas,
peculiar Estado de bem-estar social. ao País, aos governos e aos agentes
Em todas as fases econômicas e econômicos privados. É geração de
políticas demarcadas pela historio- renda, emprego e modo de vida. O
grafia brasileira, o extrativismo não que chama a atenção é o fato de que,
apenas está presente como se apre- na “era da informação”, esse modo de
senta nos fundamentos da economia. produção da economia continue sen-
Incrivelmente, perdura no século do tão importante e sua cadeia pro-
XXI, com toda ou apesar de toda a dutiva seja em geral tão curta, isto é,
evolução de sua economia, de sua po- de pouco valor agregado nos países
lítica e da ordem social na direção da de sua origem.1 O extrativismo eco-
modernização. É assim desde o Bra- nômico ainda é o modo de produção
sil Colônia, extenso período marcado predominante, por vezes, a exclusiva
pelos ciclos dos produtos nativos da base de exportação nacional de muitas
biodiversidade enviados à Metrópo- nações. Desde o período colonial das
le. A extração dos recursos naturais economias primárias e do processo de
foi a exclusiva base econômica de independência política das ex-colô-
geração de riquezas para a aristo- nias, até a modernização econômica e
cracia agrária, assim como foi a pla- política por meio das democracias de
taforma de sustentação econômica e mercado, o extrativismo econômico
política dos governos imperiais. Por ainda é o modo de produção predo-
extensão, atravessou sem ameaças o minante, algumas vezes a exclusiva
período da República Velha, e con- base de exportação nacional. No caso
tinuou importante depois dela. Dois brasileiro, somados os setores mine-
séculos após a vinda de D. João VI, ral (4,9%), vegetal (3,53%) e animal
o extrativismo sobrevive, sob novos (2,87%), representaram 11,3% do PIB
semblantes, desde a redemocratiza- em 2014, tornando-se maior que a par-
ção do Brasil. Inclusive, autores con- ticipação da indústria, inferior a 11%
temporâneos como Gudynas (2012), no mesmo ano (RITTNER, 2015).
por exemplo, observam o fenômeno Para além da óbvia associação
sob renovada perspectiva, usando a entre o extrativismo e a consequen-
denominação de novo extrativismo. te formação e constituição do poder
É evidente que os recursos fartos das elites dos países extrativistas, a
da natureza não poderiam mesmo dupla pergunta que persiste é: por
ser desprezados. Jamais serão. Con- que esse modo de produção e orga-
siderando a importância dos pro- nização do poder permanece atual e
dutos originários do extrativismo sobrevive em tempos de tecnologia

1
Os seis principais produtos de exportação em 2011 foram: minério de ferro, aço e ferro fundi-
do (16,3%), petróleo bruto (8,4%), soja e derivados (6,4%), açúcar (4,5%), café em grãos (3,1%)
e carne de frango in natura (2,8%). Disponível em: <http://www.suapesquisa.com/econo-
mia/produtos_exportados_brasil.htm>.
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da informação e democracia? Ape- passado. Esse elemento incorpóreo


sar de toda a crítica sociológica que permanece contemporâneo, útil e
contribuiu para a democratização aparentemente vantajoso aos grupos
brasileira, e cujas aspirações foram de poder político e econômico que se
de transformação e antítese ao pas- sucedem ou pactuam, beneficiando-
sado oligárquico, patrimonialista e -se amplamente do extrativismo.
extrativista, esses fatos sociais tão
constrangedores ao desenvolvimen- 2 A maldição dos recursos naturais
to nacional permaneceram. Nesse
sentido, são elos histórico-sociológi- Esse espectro que faz perdurar
cos que nos mantêm vinculados ao o caráter político-governamental
passado mais característico de nossa do extrativismo é o que podemos
formação socioeconômica e política chamar de maldição dos recursos
nacional. Tem a ver com as raízes naturais. É uma alusão à “maldi-
mais profundas das nossas caracte- ção do petróleo”, termo cunhado
rísticas psicossociais, e permanecem pelo cientista político Michael Ross
causalmente ligados aos nossos pro- (2015), em livro homônimo, em
blemas contemporâneos. que o autor ressalva que 90% do
Nessa direção, a sociologia, a comércio mundial de minerais de-
economia política, a história política, vem-se a esse hidrocarboneto. Não
como a ciência política, são campos obstante, a ideia da “maldição” é
do conhecimento no interior dos mais antiga e remonta à formação
quais precisa emergir o esforço cons- da Organização dos Países Expor-
tante de responder à dupla pergun- tadores de Petróleo (OPEP), quan-
ta anterior. Trata-se da persistente do seu fundador, o ex-ministro do
tarefa de tentar reconhecer um ou Petróleo venezuelano Juan Pablo
outro aspecto talvez regular e ain- Pérez Afonso chamou o petróleo
da menosprezado na origem ou no de “excremento do Diabo” (ROSS,
desenvolvimento do curso histórico 2015, p. 19). Nesse sentido, as eco-
de nações economicamente extrati- nomias dos países que extraem
vistas e seus governos homônimos. petróleo, em geral, são muitíssimo
Noutros termos, é importante bus- dependentes dessa commodity. A
car características identificáveis em abundância desse recurso natural
vários casos das nações extrativistas acirra muito mais as disputas pelo
que permitam uma ou outra genera- poder a qualquer preço. Ross ob-
lização. No caso da abundância dos serva que, dos vinte maiores pro-
recursos naturais, existe um espectro dutores nacionais na primeira dé-
que mantém ativos os vícios oligár- cada do século XXI, dezesseis eram
quico, patrimonialista e extrativista, ditaduras.2 Na maioria dos casos,
verdadeiros pontos de ligação com o constata-se que as economias des-

2
As exceções eram os EUA, a Rússia, o Canadá e a instável Venezuela.
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sas nações crescem menos, e de for- Quando o autor admite que nem
ma instável, que as nações que não tudo são sombras, reconhece que as
possuem petróleo. Em geral, seus condições de bem-estar melhoraram
problemas sociais são notáveis e em vários países produtores de pe-
seus índices de desenvolvimento tróleo e menciona a diminuição da
não estão entre os melhores. mortalidade infantil em muitos des-
Michael Ross é estudioso do as- ses países (ROSS, 2015, Introdução,
sunto há décadas. Acompanhou o p. 252). Ele também reconhece alguns
boom do preço do petróleo na década índices de crescimento econômico,
de 1970, observando que países pro- mas observa que normalmente esti-
dutores obtiveram lucros extraor- veram aquém do que deveriam, se
dinários, mas isso não tornou essas considerada a riqueza geológica e a
nações mais desenvolvidas. Quatro comparação com países não produto-
décadas depois, Ross chega à mes- res. Nesse sentido, se não cresceram
ma conclusão. Embora reconheça mais do que as nações não produto-
algumas distinções e faça um mea ras de petróleo, significa que não ti-
culpa em seu livro, o autor reafirma raram o devido proveito da riqueza
essa conclusão ao estudar as con- geológica. Fora isso, a fartura do pe-
sequências do aumento dos preços tróleo produziria o paradoxo do atra-
das commodities minerais no início so. Na média, segundo Ross, metade
do século atual. Elas geraram muitos do produto econômico dessas nações
proventos aos governos, no entan- está concentrada no setor público.
to, isso não garantiu o crescimento Nos países de baixa renda, a simples
continuado das respectivas nações. descoberta do petróleo desencade-
Segundo o próprio autor, as obser- aria uma frequente “explosão dos
vações sobre o extrativismo e os efei- gastos públicos” (ROSS, 2015, p. 23),3
tos das commodities nos últimos anos possibilitando a governos autoritá-
têm proporcionado informações rios “silenciar” dissidências e asseve-
importantes para o incremento dos rar reações violentas de opositores.
estudos que relacionam os recursos Por conseguinte, esses países tendem
naturais com economia e política a governos menos transparentes e
(ROSS, 2015, Introdução). Estudos economias mais instáveis. Mostra
de Ross a partir da década de 1980 o autor, governos financiados pelo
sobre o assunto indicam que, em petróleo desperdiçam recursos e são
geral, a riqueza gerada por meio da menos prestadores de contas do que
abundância dos recursos naturais os governos financiados por impos-
produziu, em muitos dos países por tos (ROSS, 2015, p. 24, 29). Com pou-
ele observados, menos democracia e co ou nenhum planejamento, gastam
mais guerra civil. com o propósito explícito de se man-

De 2001 a 2009, as despesas públicas teriam aumentado 600% no Azerbaijão e 800% na Guiné
3

Equatorial (ROSS, 2015, p. 46).


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ter no poder e ganhar eleições. À me- haja homogeneidade em relação ao


dida que os preços caem, sua exces- conjunto de causas, alguns dos casos
siva dependência às commodities os são, novamente, compreensíveis a
atira na instabilidade. partir da perspectiva do extrativis-
Por extensão natural disso, os mo e seu espectro, a maldição das
problemas sociais persistem e seus commodities. Notável é o caso do es-
índices de crescimento e desenvol- tado do Rio de Janeiro, cujos gover-
vimento não se sustentam. A fre- nos entre a primeira e segunda dé-
quência desse fenômeno nos países cada do século XXI se aproveitaram
predominantemente extrativistas é do aumento dos preços do petróleo
alta e indica uma regularidade esta- para aumentar os gastos correntes,
tística. Preços de commodities são na- endividando o estado acima da ca-
turalmente oscilantes e, em alta, um pacidade. Depois de um período de
estímulo quase irresistível ao aumen- gastos excessivos, o estado tornou-
to de gastos governamentais. Mui- -se deficitário e, como de costume,
tos desses gastos são ou se tornam recorreu aos cofres da União, que
permanentes, como a contratação de socorre em troca de apoio político
servidores públicos e aumentos reais e socializa os prejuízos com o País.
de salário. Quando os preços caem, Com a queda do preço do petróleo
a situação torna-se muito difícil, re- em 2015, a situação do governo flu-
dundando em uma condição croni- minense tornou-se calamitosa. O es-
camente insustentável, levando a si- tado é o maior produtor de petróleo
tuações dramáticas do ponto de vista no País e a extração representa um
da má gestão dos recursos públicos e terço de sua economia.4
suas consequências. Nessa perspecti- Como explica Natalie Watkins
va, por exemplo, a situação de endi- no prefácio ao livro de Ross, a maior
vidamento dos estados e municípios parte dos recursos provenientes da
brasileiros é motivo de negociações extração do petróleo acaba nas mãos
intermináveis com os governos fede- dos governos e existe pouca trans-
rais. Trata-se de exemplo notável do parência sobre o seu uso. Quando
problema fiscal crônico, denunciando os preços estão em alta, isso confere
má gestão, além da excessiva concen- grande poder de manobra aos go-
tração de recursos na União. vernantes, além de grandes chances
Por consequência, provoca os de reeleição. Não há, contudo, deter-
questionamentos sobre a tributação minismo na maldição do petróleo.
excessiva e a consequente necessi- Basta que as regras governamentais
dade de um pacto federativo novo. sejam claras para que essa riqueza
Por outro lado, denuncia problemas gere desenvolvimento. Exemplo se-
crônicos de gasto público excessivo ria a Dinamarca, que mantém um
dos estados brasileiros. Embora não fundo de reserva que limita o gasto

4
Em 2014, o estado do Rio de Janeiro foi responsável por mais de 2/3 da produção nacional
(CAOLI, 2016).
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governamental a 4%, a fim de que as Nada, porém, constitui obstáculo ao


futuras gerações usufruam esses re- uso de seus notáveis rendimentos por
cursos. Por outro lado, os exemplos agentes públicos, mas, sobretudo, por
negativos constituem a regra. São inú- governos nacionais que controlam
meros os casos que têm relação com o essa atividade e dela tiram proveito.
desperdício, a falta de planejamento, a Nesse cenário, não se distinguem as
violência, a corrupção e o populismo ações de governos “conservadores”
de governos que aumentam seu po- ou “progressistas”. Com frequência,
der de popularidade e ganho eleito- a propriedade das reservas minerais é
ral. Além disso, é muito comum que a estatal, garantindo excelente fonte de
indústria de transformação seja fragi- receitas, tributadas diretamente.
lizada. Segundo os economistas, isso Na perspectiva da maldição dos
ocorre porque, com a valorização das recursos naturais, é importante a con-
commodities, entram muitos dólares, tribuição do ecólogo social Eduardo
encarecendo a moeda local e estimu- Gudynas. Ele chama a atenção para o
lando as importações, provocando a caráter relativamente novo que o ex-
queda da industrialização nacional; trativismo adquiriu no século XXI com
e ainda há o problema da corrupção os governos de esquerda na América
que afeta governos extrativistas. Latina. Segundo o autor, o “neo-extra-
Nessa direção, a extração do pe- tivismo” está caracterizado por maior
tróleo é apenas o ápice do fenômeno presença do Estado na atividade, não
do extrativismo, seu exemplo mais apenas no controle, mas nos ganhos e
notável, pelo que rende aos “magna- no uso político (GUDYNAS, 2012, p.
tas do petróleo”, aos governos extra- 306). O fato de as empresas não serem
tivistas e seus inúmeros beneficiados sempre estatais não importa. O que
mais próximos. Trata-se, portanto, de importa, afirma Gudynas, “é o lucro”.
compreender a abundância dos recur- Nesse sentido, leis ambientais foram fle-
sos naturais na sua abrangência, inde- xibilizadas e a taxação sobre os royalties
pendentemente da commodity gera- aumentou, permitindo que os governos
da. Essa fartura dos recursos naturais passassem a extrair mais recursos. Nes-
dá origem ao fenômeno do extrativis- se contexto, os impactos sociais e am-
mo em grande escala. A ele estão as- bientais, sempre criticados pelos políti-
sociados problemas conhecidos como cos de esquerda, continuam existindo.
os impactos ambientais, os conflitos Exemplo disso aparece nas denúncias
sociais, as disputas de poder por es- contra a Companhia Vale do Rio Doce,
ses recursos, o uso ineficiente de seus pelas agressões ambientais e aos direitos
proventos, políticas populistas e, com das comunidades atingidas, ocasionan-
frequência, baixa ou nula perspectiva do resistências organizadas de trabalha-
de crescimento sustentado e contínuo. dores e movimentos sociais.5

5
Existe um movimento internacional intitulado “Atingidos pela Vale”, organizado para resis-
tir e denunciar as ações da mencionada empresa. Informações a respeito estão disponíveis em
<https://atingidospelavale.wordpress.com/quem-eh-a-vale/>.
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Sem a devida “cooperação bo- e danos ambientais, entre outras


livariana” entre si, os governos críticas. Outra reclamação sobre o
progressistas sul-americanos pou- extrativismo clássico baseava-se no
co se teriam importado com a sub- fato de que a exploração era contro-
missão ao mercado internacional, lada por empresas estrangeiras. Por-
entregando-se à competição entre tanto, os excedentes capturados na
eles próprios. Em todos os países forma de tributos, royalties e licenças
latino-americanos governados pelas seriam baixos (GUDYNAS, 2015, p.
forças “progressistas”, o conjunto de 311). Essa crítica de cunho pragmá-
efeitos negativos continuaria existin- tico, pode-se dizer, ajuda a compre-
do. Nessa direção, também teriam ender a postura estratégica e oportu-
crescido os conflitos rurais no Brasil nista que os governos progressistas
dos primeiros anos de governo do acabariam adotando no interior da
Partido dos Trabalhadores. Gudynas relação entre recursos naturais, polí-
denuncia a existência de más condi- tica e sociedade.
ções de trabalho, trabalho escravo,
de violência contra indígenas, epi- 3 Extrativismo e programas sociais
sódios que teriam, paradoxalmente,
crescido nesse período, atestando os Nos governos progressistas, ob-
sintomas do neoextrativismo. Na ou- serva Eduardo Gudynas, a eficiência
tra mão, os governos “progressistas” na captação ficou “muito melhor”,
lançaram mão de políticas compen- impulsionada por um fator motiva-
satórias que calaram os dissidentes e dor adicional. Nas primeiras duas
compraram as massas. Para o autor, décadas do século atual, governos
exemplo disso seria o Movimento de esquerda – leia-se, Brasil, Chile,
dos Sem Terra (MST), cujos integran- Argentina, Bolívia, Equador, Peru e
tes se teriam beneficiado do progra- Venezuela – passaram a adotar a es-
ma de transferência de rendas “Bolsa tratégia de aproveitar os recursos do
Família” e desistido da luta política. extrativismo para garantir o finan-
Nesse aspecto, é curioso obser- ciamento de programas de cunho
var como as críticas ao extrativismo, assistencialista (GUDYNAS, 2015, p.
já proferidas pela teoria da depen- 312); ou seja, os governos progressis-
dência na década de 1960, foram tas passaram a fazer muito mais uso
abandonadas cinquenta anos depois político do extrativismo do que os
pelos governos de esquerda latino- governos conservadores. Às críticas,
-americanos. Até então, as esquerdas os governos populares responderam
criticavam um modelo econômico com a justificativa sobre a necessida-
baseado na produção e nas expor- de imperiosa dos recursos do extra-
tações de produtos primários, que tivismo para fins de incrementar os
nunca levaria os países da América programas sociais. Precisaram cada
do Sul ao desenvolvimento. A ad- vez mais dos recursos da extração
vertência era de que o extrativismo dos minérios e outras commodities a
gerava enclaves econômicos nega- fim de financiar os programas “pro-
tivos, pobreza, miséria, ignorância gressistas”. Como explica Gudynas,
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os governos neoextrativistas de es- lações de seus preços. Tendo optado


querda tornaram-se mais eficientes pela estratégia extrativista, definem
na captura desses recursos do que os pela postergação das estratégias de
precedentes, e utilizando parte dos desenvolvimento sustentável e de
recursos para financiar os programas longo prazo, quando é também in-
sociais que os sustentaram no poder. certo que o valor dessas commodi-
Assim, os governos “progressis- ties permita prospectar os mesmos
tas” pacificam os protestos sociais. ganhos. Além disso, os governos
Os debates políticos da esquerda di- “progressistas” se habituaram a atri-
recionam o foco exclusivamente ao buir a si a exclusividade moral de
problema da distribuição dos recur- conduzirem a exploração dos recur-
sos produzidos pelo extrativismo. sos naturais e seus direcionamentos
Desse modo, ignoram a questão de distributivos mais “justos”. É o tipo
fundo, qual seja, a do próprio modo de mensagem, subliminar ou ex-
de produção extrativista, fundamen- plícita que se viu, por exemplo, em
talmente conflitivo e contraditório, uma das mais disputadas eleições
além de suas consequências conde- presidenciais brasileiras, em 2014;
náveis. O protesto social diminui na mas, efetivamente, também nas ex-
proporção inversa do aumento dos periências governamentais recentes,
programas sociais que advêm do as “velhas promessas” de progresso
extrativismo e de suas perdas e da- e bem-estar foram feitas e, diga-se,
nos de longo prazo. Tais programas realizadas sobre a plataforma do ex-
geram legitimidade social aos gover- trativismo e do boom das commodities.
nos progressistas e quem os critica O Brasil da primeira década
estaria contra o progresso e contra os do século XXI viveu notavelmente
programas sociais também. A econo- essa atmosfera. Com o crescimen-
mia de enclave, historicamente um to da economia chinesa, o Brasil foi
obstáculo ao desenvolvimento, ago- um grande fornecedor de commodi-
ra passava a representar um bônus. ties minerais e agrícolas. O País saiu
Antes, gerava pobreza e dependên- de sua frágil condição na balança
cia. Agora, passava a representar a comercial para país superavitário.
melhor fonte de recursos a combater Nesse sentido, a exportação de mi-
a desigualdade (GUDYNAS, 2015, nerais e, sobretudo, o bem-sucedido
p. 313). Nessa perspectiva, os recur- agronegócio nacional foram os fato-
sos naturais passaram a significar a res responsáveis. De um lado, os di-
riqueza que não poderia ser desper- videndos apropriados pelo governo
diçada, mal necessário sobre o qual foram utilizados para o incentivo a
“não podemos ficar sentados como setores econômicos considerados
mendigos em cima de um saco de estratégicos ao desenvolvimento.
ouro” (GUDYNAS, 2015, p. 314). De outro lado, subsidiaram as po-
Por outro lado, a dependência líticas inclusivas. O bem-sucedido
expressiva das commodities faz com Programa Bolsa Família passou a ser
que governos passem a contar com incrementado com os recursos do
a sorte e se tornem reféns das osci- extrativismo, assim como a notável
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expansão do crédito para ampliar a cas e políticas e seus surtos de cres-


capacidade de consumo dos brasi- cimento econômico não promovem
leiros. A expansão do consumo de o desenvolvimento sustentado. No
bens duráveis, principalmente de caso brasileiro e latino-americano,
eletrodomésticos e automóveis, foi assim como no continente africano,
financiada pelos recursos do extra- a institucionalização social e política
tivismo, além do avanço notável do do extrativismo parece ser a própria
crédito habitacional. herança do processo colonizador.
Nessa perspectiva, o extrativis- Nesse sentido, seria possível con-
mo voltou com maior ênfase e nova cordar com a interpretação de Ace-
roupagem, por meio da maior pre- moglu e Robinson (2012) em Por que
sença do Estado, beneficiando polí- as nações fracassam. Ali, os autores
ticos que se disseram os autores da demonstram como os colonizado-
vinda de empresas extrativistas que res extrativistas criaram instituições
“trazem emprego e progresso” às correspondentes às suas necessida-
comunidades (GUDYNAS, 2015, p. des. Contudo, as elites endógenas
315). Os governos progressistas não que promoveram a independência e
mais fizeram do que confundir cres- assumiram o poder não destruíram,
cimento com desenvolvimento, con- ao contrário, preservaram as institui-
fusão que a própria esquerda sempre ções dos colonizadores. Nesse senti-
usou para criticar os defensores do do, essas regras e esses valores foram
desenvolvimento acrítico; e na pers- uma herança não desprezada pelas
pectiva do velho “mito do progres- posteriores elites nacionais, que os
so”, o neoextrativismo dos governos utilizaram para se manter no poder
“progressistas” da esquerda deixou e dele usufruir. Assim, compreenda-
de ser um tradicional motivo de crí- -se que governos que usufruem o
ticas. Aos governos de esquerda da extrativismo são, por hábito de ori-
América Latina, não importava mais gem, também governos extrativistas.
se o modo de produção extrativista Como não bastasse, é necessário ob-
fosse nacional ou estrangeiro, públi- servar, o produto político e cultural
co ou privado. Tais governos acaba- do extrativismo é uma mentalidade
ram assumindo a mesma forma de extrativista que afeta as perspectivas
exploração, de impactos sociais, e de desenvolvimento sustentável de
reproduziram os mesmos processos uma região ou país.
produtivos e as mesmas relações de
poder que os governos antecessores. 4 Instituições extrativistas
Qual a interpretação sociológica
mais importante disso? É que, com Nessa perspectiva, a maldição
regularidade notável, o extrativismo dos recursos naturais manifesta-se
suscita instituições econômicas e po- no fato de que habitua agentes eco-
líticas igualmente extrativistas. Sua nômicos e políticos ao modo de pro-
definição literal remete à ideia de dução primário, sem agregação de
que essas instituições asseguram ga- valor, com cadeia de produção curta,
nhos concêntricos às elites econômi- baixa intensidade tecnológica e pou-
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ca qualificação da mão de obra. Do recursos naturais disponíveis para


ponto de vista governamental, tende benefício de seus ocupantes. É a for-
a gerar governos menos criativos e ma patrimonialista pura dos coloni-
mais patrimonialistas. Do ponto de zadores do passado, que se estende e
vista socioeconômico, gera pouca continua, como lembram Acemoglu e
ou nenhuma mobilidade social. Do Robinson, como forma de organização
ponto de vista cultural, cria e retro- do poder, mesmo depois da indepen-
alimenta hábitos de resistência ao dência das ex-colônias, seja na África,
novo e dependência aos governos. na Ásia, seja na América Latina.
Gera hábitos peculiares, define re- Nessa direção, a história dos
lações sociais, determina a postura países latino-americanos está mar-
das elites, dos escalões inferiores e cada por uma associação de efeitos
de boa parte da sociedade, repro- comportamentais oriundos das ins-
duzindo relações clientelistas. Do tituições extrativistas. De partida,
ponto de vista institucional, reflete considere-se que o extrativismo está
na conformação de leis e regras que na origem da imprudência e da falta
economistas e cientistas políticos de planejamento de governos que se
convencionaram assim denominar acostumam com a fartura e o boom
de instituições extrativistas. Sendo das commodities. Esses governos ten-
assim, tornam-se uma importante dem a relaxar na cobrança de impos-
variável explicativa do desenvol- tos e exagerar em benefícios, incen-
vimento, de suas possibilidades e tivos e isenções a certos segmentos.
constrangimentos. No seu longo estudo sobre a produ-
Utilizando-nos da aborda- ção do “ouro negro”, Michael Ross
gem institucionalista, consideremos (2015) demonstra que quanto mais
o importante pressuposto de Mon- petróleo mais dependentes são os
tesquieu, segundo o qual, boas leis governos de receitas não tributáveis.
produzem bons homens e desenvol- Por extensão disso, abrem mão das
vem uma nação. Nessa perspectiva, receitas de impostos, o que os torna
a análise das leis e regras facilita a desproporcionalmente dependen-
compreensão dos comportamentos, tes do extrativismo. Na média das
escolhas, modo, condições e expec- economias dos 30 maiores exporta-
tativas de vida de indivíduos e na- dores mundiais de hidrocarboneto,
ções. Portanto, se vale a máxima de o petróleo e o gás natural represen-
Montesquieu para as instituições tam 19% do PIB, enquanto o finan-
boas, o contrário também é verda- ciamento desses governos depende
deiro, isto é, instituições extrativistas 54% dessa fonte econômica.
produzem exclusão e atraso. Sua ori- Quando os preços caem e a arre-
gem está naturalmente relacionada cadação torna-se insuficiente, esses
com o extrativismo econômico, que governos passam naturais dificul-
é quando o Estado, originalmente dades. Se a dependência em rela-
constituído por elites patrimonia- ção aos recursos naturais for muito
listas, utiliza-se predominante ou expressiva, como no caso da Vene-
exclusivamente do extrativismo dos zuela, a crise é certa e sem saída. Se
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a economia for mais diversificada, Nas democracias, é certo, o centra-


como é o caso do Brasil, o proble- lismo político e administrativo ad-
ma não deveria ser tão dramático.6 quire conotações tênues, legitimadas
Ocorre que o Estado brasileiro se pelo voto e por argumentos jurídicos
encaixa no conceito de neoextrativis- sofisticados. A partir da atual Cons-
mo, já que seus sucessivos governos tituição “cidadã” promulgada em
democráticos utilizaram os recursos 1988, a malha operacional do Estado
do extrativismo para financiar o as- tornou-se muito mais complexa. O
sistencialismo; e quando quedam os trânsito do poder no interior ou no
preços das commodities, grande parte entorno do Estado aumentou sig-
da sociedade mais produtiva, que se nificativamente, assim como seus
encontra na classe média, passa a ser custos. A ampliação da relação do
o alvo mais viável para esse financia- Estado com a estrutura social reivin-
mento. Torna-se a fonte sobretaxada dicou significativo aumento dos ser-
de extração dos recursos a financiar viços, correspondente divisão social
os governos cujas estruturas e res- do trabalho e emergência de novas
pectivos gastos não cessam de cres- e poderosas funções operacionais
cer, sob a justificativa de atender às (ALMEIDA, 2014).7
demandas imprescindíveis da socie- No frágil equilíbrio dos pode-
dade. Todavia, por meio de um com- res, o presidencialismo tende a cer-
plexo sistema burocrático de servi- tas sobreposições e grandes planos
ços ineficientes do ponto de vista do nacionais. O arranjo institucional
interesse público, os operadores dos reserva aos governantes um notável
três poderes têm um propósito fun- poder concêntrico, que leva muito
damental: a manutenção da estrutu- mais à barganha que ao diálogo. A
ra fisiológica do poder. fim de obter os apoios necessários,
Por extensão, a roupagem do coopta-se. Com os recursos disponí-
autoritarismo e do centralismo no veis para a permuta, o poder concên-
controle dos recursos daí decorren- trico oferece os cargos de nomeação
tes se reproduz e se acomoda no à disposição do Executivo. Não ape-
desenvolvimento da democracia. nas no Executivo, mas também nos
Instituições extrativistas são edifi- outros poderes, a centralização dos re-
cadas ou preservadas para garantir cursos na União torna mais importante
benefícios exclusivos de elites, res- o controle dos cargos federais (GAR-
tringindo a participação do contro- CÍA LÓPEZ; PRAÇA, 2015, p. 108).
le político e concentrando o poder Nessa perspectiva, por exemplo,
político-burocrático e orçamentário. a administração federal brasileira

6
O auge da participação da produção de petróleo e gás no PIB brasileiro foi em 2013, quando
alcançou 13% do PIB (PARTICIPAÇÃO..., 2013).
7
O artigo de Almeida (2014) analisa o crescimento das funções e do poder corporativo do Ju-
diciário depois da Constituição de 1988, sendo um útil exemplo a respeito de como a estrutura
estatal compreensivelmente se expande no Estado social e permite a concomitante expansão
da elite burocrática.
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nomeia aproximadamente 24 mil res. Os EUA, afirmam Acemoglu e


cargos de confiança nas fundações Robinson, são mais ricos porque suas
e autarquias, além de 8.500 cargos instituições políticas e econômicas
nas agências reguladoras. Assim, geram mais incentivos a empresas e
as condições que o Executivo tem à indivíduos. Sua função geral é des-
sua disposição facilitam a barganha concentrar o poder, gerar as oportu-
e dispensam o diálogo. As principais nidades e atribuir responsabilidades
características desse arranjo institu- aos indivíduos, desencarregando o
cional são o protagonismo estatal, o Estado de maior protagonismo.
consequente centralismo e uma es- Originalmente, no amplo pro-
trutura empregatícia corresponden- cesso colonizador da América Lati-
te, cuja necessidade de financiamen- na, o modo extrativista caracteriza-se
to só o torna mais dependente das pela extração dos recursos naturais,
estratégias extrativistas. apropriado pelos impérios coloni-
Vale destacar o aspecto do cen- zadores e pelos proprietários das
tralismo como uma das veias expli- terras, outorgadas pelos governos
cativas para a produção e reprodu- imperiais colonizadores. As insti-
ção das instituições extrativistas. tuições extrativistas dali originárias
Nesse sentido, mais uma vez Ace- são elaboradas de modo a garantir
moglu e Robinson ajudam a com- a maior extração possível de recur-
preender as origens desse arranjo sos de todos para o benefício das
institucional. Na comparação entre elites extrativistas. Mesmo quando
México e EUA, observam que a “ins- as elites emergentes dessas colônias
titucionalização de regras de par- promoveram os movimentos de in-
ticipação descentralizada permitiu dependência e foram, afinal, bem-
o desenvolvimento democrático e -sucedidas, elas mantiveram intactas
republicano das primeiras colônias tais instituições. Em outros termos,
estadunidenses” (BIRKNER; TREN- as novas elites reproduzem o modus
TINI, 2016, p. 123). Nesse caso: operandi dos antigos usurpadores e
expropriadores. As leis e as regras
[...] as elites já governavam contro- em geral não são modificadas com o
ladas por leis, enquanto as elites sentido republicano da expansão po-
mexicanas exerciam o seu poder lítica e econômica, isto é, da descon-
patrimonialista pelo centralismo e centração e geração de oportunida-
pela violência. Enquanto os EUA des. Ao contrário, são mantidas na
cresciam com a Revolução Indus- sua essência extrativista, permitindo
trial, o México empobrecia pelo a reprodução do poder despótico
extrativismo e pela ausência de es- das elites nacionais.
tímulos institucionais. (BIRKNER; A independência brasileira em
TRENTINI, 2016, p. 124). 1822, por exemplo, também não alte-
ra a configuração colonial e extrati-
Por terem desenvolvido suas vista da relação do Brasil com Portu-
instituições democráticas de baixo gal. A sociedade continua patriarcal,
para cima, os EUA tornaram-se líde- a economia mantém-se mercantil e
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a estrutura institucional brasileira “consciência nacional”. Essas elites


permanece monárquica, escravagis- continuaram “representando seus
ta e extrativista. Em rigor, não hou- patronos”, nunca o seu país, como já
ve mais que a troca de ocupantes, e acontecia na Corte do Regente Feijó
a ideia de um projeto nacional não (VIANNA, 1987, p. 294).
refletiu as aspirações de quem as- Oliveira Vianna, como sabemos,
cendeu ao poder, como já sugeria tinha um projeto nacional em men-
Oliveira Vianna (1987, p. 284) em te. Pensador político brasileiro das
Instituições políticas brasileiras. Ao primeiras décadas do século XX,
largo disso, é preciso lembrar, a ca- procurou explicar as dificuldades e
racterística socioeconômica e políti- os constrangimentos dessa grande
ca do País continuava marcada pelo realização nacional mediante uma
extrativismo patrimonialista puro. sociologia historiográfica do Brasil.
Nesse sentido, a base econômica é Apesar da crítica ao continuísmo
extrativista tanto quanto o compor- na passagem para a independência,
tamento dos operadores do Estado, foi um defensor do centralismo de
uma vez que a riqueza é extraída ex- D. Pedro II. Incomodava-o a força
clusivamente em benefício dos ocu- centrífuga das oligarquias rurais,
pantes do poder. É possível dizê-lo patrimonialistas e, por essa nature-
ao modo marxista: a estrutura go- za, impedidoras da modernização
vernamental serve exclusivamente a brasileira. Ao bom modo positivista,
esse propósito. o autor vislumbra um projeto nacio-
O Brasil independente, obser- nal na assunção de uma elite emer-
vara Oliveira Vianna, simplesmen- gente e esclarecida, prescrevendo o
te “continuou a tradição do Brasil- papel que uma burocracia moderna
-colônia [...], com a educação política teria de assumir e desempenhar nes-
que este período lhe dera” (VIAN- se projeto modernizante. Essa ideia
NA, 1987, p. 293). Em Instituições de uma elite burocrática emergente
políticas brasileiras, o autor descreve influenciaria autores diferentes entre
os inúmeros vícios de origem que si como Golbery do Couto e Silva e
impediam, na Colônia como no Im- Bresser Pereira, ambos defensores
pério, a formação de um espírito do papel histórico das elites buro-
público na administração das coisas cráticas. Segundo Oliveira Vianna, a
públicas. Vianna explica a impossi- classe burocrática moderna e repu-
bilidade da formação de um quadro blicana viria, como veio, em substi-
público, mesmo depois da indepen- tuição ao estamento burocrático que
dência, em função das instituições vingou durante todo o período de
sociais e políticas herdadas. Afirma “desagregação nacional” que, para
que os homens públicos, como a po- ele, viria a representar a Primeira
lítica em geral, herdaram “uma men- República, de 1889 até 1930.
talidade localista” e, acrescente-se, Nessa perspectiva, o advento da
oligárquica, que impedia a forma- República, em 1889, embora com o
ção de um etos nacional na política, fim da escravidão e a introdução do
ou, na preferência do autor, de uma trabalho assalariado, não altera a po-
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sição das oligarquias rurais, ao con- rupturas. Em seu clássico Os donos do


trário, as reforça no poder. A base poder”, ele ressalta a prevalência do
econômica permanece inalterada e Estado e dos organizadores do siste-
os reflexos do extrativismo se man- ma patrimonialista e extrativista que
tem nas instituições políticas e na or- atravessa as etapas históricas e so-
ganização do poder até 1930. Assim, brevive aos tempos republicanos em
o conserto político-administrativo favor das oligarquias e do estamento
modernizante que Oliveira Vianna burocrático. Refere-se aos “quadros
reconhecia no esforço de D. Pedro II administrativos do patrimonialismo
desfaz-se com o advento da Repúbli- estatal” para demonstrar como, ao
ca. Em Instituições políticas brasileiras, longo da História do Brasil, forma-
o autor enalteceu os esforços da eli- -se uma permanente classe burocrá-
te no Segundo Reinado, o que levou tica que progressivamente exercerá
muitos críticos a apresentar Oliveira controle sobre os destinos do País.
Vianna como um pensador reacioná- Porém, não se trata exclusivamente
rio. Ele se referia à sapiência e ao pa- de uma burocracia do Estado que or-
triotismo dos que o imperador havia ganizará a consecução dos interesses
conseguido reunir em torno dele e da públicos. Embora administre os in-
tarefa de modernização do Império. teresses da aristocracia agrária, tam-
Com o fim do reinado do dés- bém não servirá exclusivamente a tais
pota esclarecido, o poder descentra- classes dirigentes. Faoro apresenta a
liza-se, não no sentido republicano, burocracia estamental como a própria
mas ao gosto das oligarquias patri- classe dirigente no longo tempo.
monialistas e extrativistas. Ora, nes- Na perspectiva de Faoro, autores
se sentido, o caráter extrativista das como “Gilberto Freyre (1933, 1951),
instituições políticas brasileiras con- Nestor Duarte (1939), Caio Prado Jr.
tinuava ali, como uma pedra no ca- (1945) e Ignácio Rangel (1953),” lem-
minho republicano nacional. Segun- brados por Bresser-Pereira (2008,
do o jurista Raymundo Faoro (2001), p. 34), mas também Sérgio Buar-
os interesses dos latifundiários con- que de Holanda, fazem referência a
tinuariam preservados, mesmo após essa “classe”. Seus integrantes são
a independência, por um modelo de os organizadores dos interesses da
Estado constituído desde o período Coroa Portuguesa, como das oli-
colonial para esse fim; e a base admi- garquias agrárias que constituem a
nistrativa a garantir a ordem política elite hegemônica brasileira nos seus
e econômica patrimonialista e extra- primeiros quatrocentos anos de co-
tivista é o que o autor denominou de lonização. Contudo, o poder e a ri-
estamento burocrático ou “capitalis- queza desse estamento burocrático,
mo politicamente organizado” (FA- composto por juristas, letrados, ba-
ORO, 2001, p. 837). charéis e militares, são oriundos do
Diferentemente de Oliveira próprio Estado, daí seu caráter mais
Vianna, Faoro não se prende a ressal- patrimonialista. Sua origem social é
vas e reforça o entendimento acerca predominante, embora não exclusi-
da sobreposição da continuidade às vamente oligárquica, e a própria de-
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cadência econômica das famílias ru- tes até 1930, não é uma sociedade
rais leva-os ao Estado, porto seguro predominantemente moderna, por-
e extensão do patrimônio. Ali, esses tanto, nem capitalista na mesma me-
guardiões republicanos se tornariam, dida. Está baseada no latifúndio au-
progressivamente, “esta minoria tossuficiente até fins do século XIX,
[que] comanda, disciplina e controla voltada à extração e exportação dos
a economia e os núcleos humanos” produtos do extrativismo e à impor-
do País (FAORO, 2001, p. 242). tação de produtos acabados, consu-
Assim, o estamento burocrático midos apenas por essa aristocracia
tem a exclusividade da função de or- rural e pela incipiente classe média
ganizar a economia nacional, o que da qual a burocracia estatal faz par-
faz de forma centralizada. É carac- te. Naquele momento histórico, a
terística de todo esse período oligár- função primordial dessa burocracia
quico patrimonialista a confluência patrimonial é garantir a institucio-
entre o público e o privado na admi- nalidade desse modelo, por meio
nistração do Estado. Este é, afinal de da organização da captação e distri-
contas, o elemento definidor do pa- buição dos recursos provenientes do
trimonialismo, cujo significado está extrativismo puro. Portanto, quem
justamente na aproximação entre o coordena a economia e define seus
que pertence ao patrimônio público rumos é a burocracia patrimonial.
e os interesses privados de quem o Por consequência, determina as pos-
administra. Isso permite imaginar sibilidades e os limites do desenvol-
que os interesses não apenas da aris- vimento nacional, sempre em pre-
tocracia rural estavam assegurados, servação da economia do latifúndio.
mas os interesses corporativos (fi- Nessa direção, vale lembrar que
siológicos e de poder) do estamento qualquer país só se desenvolve eco-
burocrático também o estivessem. nomicamente quando, orientado
Enquanto o estamento burocrático por interesses de ordem burguesa, o
controla a organização econômica, mercado passa a coordenar a econo-
convenientemente os interesses da mia. Por extensão, o lucro da ativi-
sociedade patriarcal e mercantil pre- dade econômica serve, majoritaria-
dominam. Esse é o sentido do que mente, ao reinvestimento produtivo
Faoro (2001, p. 837) chamou de “ca- na direção do progresso técnico e da
pitalismo politicamente orientado”, competitividade (BRESSER-PEREI-
isto é, quando a administração do RA, 2008, p. 30). É justamente nessa
Estado é quem controla a economia, perspectiva que Faoro (2001, p. 837)
segundo princípios e objetivos que insistia, através de seu conceito de
não estão necessariamente voltados “capitalismo politicamente orienta-
ao desenvolvimento sustentado, e do”, que a independência de uma
sim à preservação dos interesses nação só seria possível se o estamen-
mencionados. to burocrático não se transformasse
Essa sociedade oligárquica, pa- em classe. Se consumado esse inde-
triarcal e mercantil, cujas caracterís- sejado fato, o controle econômico es-
ticas são significativamente influen- taria sempre em mãos dessa classe.
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Enquanto foi politicamente possível, Não obstante, trata-se da cons-


o papel do estamento burocrático tituição de uma classe social emer-
foi, por efeito, justamente o de im- gente, encarregada de uma tarefa
pedir essa evolução para uma eco- amplificada social e territorialmen-
nomia moderna. Esta é a realidade te. É uma tarefa nacional, tomada a
que atravessa todo o Brasil Colônia, si por um corpo burocrático estatal
passa o período imperial e sobrevive que se forma, que criará e ampliará
incólume até 1930. A partir daí, mui- progressivamente suas funções e ra-
tos autores reconhecem a mudança mificações. Apesar da superação do
do corpo. Faoro não. modo patrimonialista e da assunção
de uma administração pública cons-
5 1930: o início da era Vargas tituída de autoridade racional-legal,
é preciso reconhecer: concomitan-
Dali em diante, uma nova clas- temente, o Estado brasileiro passou
se burocrática estatal toma forma, a amplificar suas funções sociais e
com a tarefa da racionalização bu- econômicas, o que inclui a criação de
rocrática da ordem pública voltada órgãos estatais. No período dos doze
para um projeto nacional moderni- primeiros anos do governo de Getú-
zante. É o produto de um Estado lio Vargas, entre institutos e conse-
pretensamente republicano, isto é, lhos federais, dezoito órgãos gover-
do rompimento da ordem política namentais federais foram criados.
patrimonialista, de uma economia Até fins do século XIX, durante a
mercantil e de uma administração vigência do modelo restrito do Esta-
estamental. Historicamente, é o do liberal no Ocidente, o formalismo
fim da hegemonia das oligarquias procedimental e hierárquico fun-
rurais e, em tese, o começo de um cionou a contento. Nesse contexto,
modelo burocrático baseado na a ordem política estava estruturada
racionalidade formal e impessoal. para atender basicamente os direitos
Não se trata mais de uma simples civis e a segurança nacional, em que
burocracia estamental, cuja finali- o percentual do PIB nos orçamentos
dade explícita é preservar os inte- não ultrapassava os 10%. É o que po-
resses restritos à aristocracia rural, demos deduzir do Estado brasileiro
como fora até então. Naquele mo- até fins da Primeira República, mas
delo patrimonialista, o nepotismo no papel de Estado provedor que
e outras formas de favorecimento começa a tomar corpo com Vargas,
dos ocupantes do poder são a re- o crescimento do aparato estatal que
gra, e o compromisso com os inte- esse Estado passa a representar é
resses nacionais fica no plano se- notável (BRESSER-PEREIRA, L. C.;
cundário. Agora, em substituição SPINK, 1998). A administração das
ao estamento burocrático – leia-se coisas do Estado passa a se basear
a administração patrimonial –, o na burocracia weberiana que, em-
Estado brasileiro será progressiva- bora necessária, não seria suficiente,
mente constituído de uma burocra- tampouco eficiente como se poderia
cia pública de tipo weberiana. supor. Não se põe em dúvida que
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a configuração do Estado brasileiro Os referidos autores conseguem


muda e torna-se notavelmente mais demonstrar que as práticas patrimo-
republicana. É óbvia, igualmente, a nialistas e nepotistas perpassam as
necessidade de uma estrutura go- fases (três) da administração públi-
vernamental muito mais complexa ca brasileira, mantendo-se em vigor
para um Estado que, agora, preten- até os dias de hoje. Nessa direção,
de apresentar-se como provedor e os autores apelam para as profunde-
desenvolvimentista. zas da cultura oligárquica brasileira,
Não obstante, com a ampliação concordando com vários autores no
do escopo dos interesses nacionais, sentido de reconhecer que no Brasil
amplia-se a coalizão de forças, e o não houve solução de continuidade
aumento do governo caminha para- no processo de modernização, que
lelamente ao necessário crescimen- convive com aspectos arcaicos da
to da burocracia pública. Contudo, sua cultura. A persistência é sim-
a profissionalização e racionaliza- plesmente entendida como traço de
ção dessa administração pública, resistência de instituições informais
por meio da expansão inédita do de longo tempo no linguajar socio-
Estado a partir da década de 1930, lógico. Com todo o aparato legal,
não faz desaparecer a cultura patri- insistem os autores, esses elementos
monialista. Com todas as suas ca- persistem e “devido à tradição patri-
racterísticas, desde o fisiologismo, o monialista, os empregos e benefícios
favorecimento e o nepotismo, o pa- que se auferem do Estado costumam
trimonialismo não desaparece. Ao estar ligados aos interesses pessoais
invés disso, molda-se, conforma-se e não aos interesses públicos” (PAU-
e faz parte da nova configuração, LA, 2005, p. 106).
sendo presumível que o aumen- A leitura que os autores fazem
to da estrutura é acompanhado da da fisiologia do poder no Brasil é te-
persistência dos vícios de outrora. oricamente conduzida pela perspec-
Aqui, é a tese da continuidade es- tiva de Sérgio Buarque de Holanda
sencial que vinga, não mais pelo es- (1936/1956). O sociólogo de Raízes
tamento, mas pelo corporativismo do Brasil enfatizava que a conforma-
estatal da nova etapa histórica da ção estatal brasileira estava marcada
burocracia. Haverá profissionaliza- pela sobreposição dos interesses fa-
ção sim, mas não perderá, a classe miliares na ordem política. Essa con-
burocrática, seu caráter de corpo. fusão entre o público e o privado do
Preserva-se o estamento com sua “Brasil neoportuguês” nos impediria
capacidade de controle e hegemo- de instaurar o Estado moderno. Ho-
nia, seu caráter essencialmente ex- landa descreve a conformação patri-
trativista e o autointeresse por meio monialista do Estado brasileiro na
dos velhos vícios. Nesse sentido de década de 1930, mas não faz menção
classe, não há ruptura, ao contrário, a uma nítida solução de continuida-
continuidade, como bem sugere o de entre o passado oligárquico e o
oportuno trabalho de Lescura, Frei- seu tempo. Há esperança em relação
tas Jr. e Pereira (2010). ao futuro e há percepção de mudan-
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ças, mas não há demonstrações de na nossa sociedade [...] que cristali-


entusiasmo com a conformação de zam interesses concretos (como o)
uma nova burocracia pública. Se- corporativismo sindical, resquícios
gundo ele, a tradição patrimonialista do patrimonialismo, troca de favores,
continua presente. O recrutamento vantagens corporativas, servilismo
do funcionalismo público brasileiro clientelista ao poder público” (CAR-
continua ignorando os critérios mo- DOSO apud BRESSER-PEREIRA;
dernos da competência e da eficiên- SPINK, 1998, p. 15-16, 18).
cia e a vida pública “dominada por Nessa direção, os operadores do
questões privadas, afetivas e pesso- Estado brasileiro criam e ampliam
ais” (REIS, 2007, p. 133). Acreditava progressivamente suas ramificações
mais na modernização forjada pela e permanecem, até hoje, direta ou
urbanização inevitável do que pela indiretamente empenhados na ma-
reforma burocrática. nutenção e no crescimento de uma
A urbanização consolidou-se, estrutura estatal que, progressiva-
assim como reformas burocráticas mente, passa a explicitar como fina-
foram instituídas e, no entanto, o ex- lidade a própria existência. Tal qual
trativismo estatal permaneceu tanto a lei férrea das oligarquias partidá-
quanto outras características essen- rias, podemos falar de uma lei férrea
ciais do estamento burocrático com- da classe burocrática estatal. Ela se
posto pelos “donos do poder”. Ape- constitui como um corpo designado
sar de concurso público e plano de a cuidar de interesses que a princí-
carreira para as funções mais eleva- pio não são os seus, sejam esses das
das do serviço público, nos escalões classes dominantes, sejam públicos.
médios e inferiores, continuavam Todavia, a indispensável serventia
predominando os favorecimentos dos operadores da burocracia estatal
clientelistas e as promoções basea- lhes confere poder. Enquanto isso,
das e critérios questionáveis, até hoje seus conhecimentos técnicos e jurídi-
existentes, como o tempo de serviço. cos permitem compatibilizar, ao lon-
Essas observações também aparecem go do tempo, o interesse alheio ao
nas análises de Bresser-Pereira (2008) interesse próprio. Não obstante, tal
e são referendadas por Vasconcelos conhecimento orienta toda a justifi-
(2002), que chama a atenção ao exces- cativa ao aparato burocrático de leis,
so de autoritarismo, privilégios e ine- mas sobretudo de taxas e impostos
ficiências daí decorrentes e comuns que engrenam a armação do extrati-
mesmo depois da reforma. O ex-pre- vismo estatal.
sidente Fernando Henrique Cardoso Pode-se indagar se essa não se-
também se manifestou, por vezes, ria uma tendência universal ou, ain-
sobre os problemas do corporativis- da, se a burocracia pública brasileira
mo da burocracia pública. Sugeria, é mais poderosa, patrimonialista e
na década de 1990, que era tempo de fisiológica do que a de outras demo-
“abandonar o assistencialismo e o pa- cracias. Nesse sentido, a interpreta-
ternalismo, além do corporativismo”. ção exige a devida consideração às
Afirmava serem “práticas enraizadas particularidades da conformação
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histórica de cada Estado-Nação. À re- tar a dívida pública. Com volumosos


velia das discordâncias, é necessário déficits anuais, a forma de cobri-los
reconhecer que nas trajetórias históri- ocorre por meio da captação de recur-
cas há mais continuidades do que rup- sos no mercado financeiro a juros al-
turas. Conquanto mudanças ocorram, tos. Se for possível compreender que
elas são lentas e não estão imunes a re- isso afeta a capacidade de crescimento
sistências, permanências, confluências econômico, então é necessário lembrar
e até movimentos retrógrados. Nesse que o extrativismo estatal também é
sentido, o Estado brasileiro moderni- responsável por comprometer as ge-
za-se, mas também conserva. Torna-se rações futuras, que terão de arcar com
moderno, embora não abandone o ex- esse endividamento. Portanto, isso
trativismo que outrora penetrou nas torna inevitável a pergunta sobre o ta-
instituições e nelas permanece, sofre manho do Estado e suas funções pri-
mutações, mas não desaparece; e do mordiais. Faz indagar sobre quais os
extrativismo puro, estende-se para um propósitos subterrâneos das institui-
habitus extrativista que, paralelamente ções e de toda a estrutura operacional
ao uso dos recursos naturais, passa a que justifica a existência de autarquias
usufruir cada vez mais a produção da e cargos governamentais.
sociedade para a sua sobrevivência e Nessa direção, interesses de po-
manutenção. É o que denominamos líticos, empresários e funcionários
de extrativismo estatal, que significa públicos, incluindo juízes, promo-
o ato do Estado em remover os re- tores e cartorários, além de centrais
cursos da sociedade produtiva para o sindicais, corporações profissionais,
autofinanciamento. Foi assim durante prestadores de serviços públicos e
os períodos colonial e imperial (1500- financiadores de eleições compro-
1889), e não desaparece com o fim da metem o propósito republicano.
“república dos coronéis” (1889-1930); Naturalmente, esses interesses não
ao contrário, evolutivamente, adapta- constituem novidade. O que os torna
-se, cresce e se aperfeiçoa. comprometedores é a dimensão que
adquirem justamente na conforma-
6 Gasto público e esgotamento do ção do Estado social. Pulsaram com
Estado de bem-estar vigor inédito durante a Constituinte
de 1988, mas foram ocultados pela
Essa perspectiva do extrativis- robustez das demandas democrá-
mo estatal nos permite compreender ticas. Respaldados pelos preceitos
melhor o problema do gasto público constitucionais, transformaram-se,
do Estado brasileiro. A progressiva progressivamente, em leis e regras
insuficiência orçamentária em rela- que demandaram novas funções
ção aos gastos crescentes do Estado para a materialização da vontade ge-
brasileiro é o principal obstáculo in- ral interpretada por seus formulado-
terno ao desenvolvimento do País. res. Por sua vez, tais intérpretes da
Uma vez esgotada a capacidade de vontade da maioria estavam cientes
aumento da carga tributária, os su- do fisiologismo que a materialização
cessivos governos só fazem aumen- das demandas viria a representar. A
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realização da vontade geral expres- ca. Afetam, igualmente, o ambiente


sou-se na inclusão consumista e as- de negócios, o desempenho das em-
sistencialista em detrimento da parti- presas, como também extrai recursos
cipação política, demandando ampla da sociedade por meio dos impostos
estrutura assistencial, do importan- que financiam essas atividades esta-
te “Bolsa Família”, ao questionável tais. Do ponto de vista do desenvol-
“bolsa-empresário”.8 O resultado foi vimento, é igualmente distorcivo,
um crescimento desproporcional do sendo necessário pensar nas oportu-
Estado e, naturalmente, a expansão nidades perdidas ao longo da histó-
do extrativismo estatal. ria, e das consequências desse am-
Para ter uma ideia da expansão biente institucional na produtividade
de empregos no serviço público, é e na competitividade nacionais. 10
preciso, por exemplo, levar em conta Subsequentemente a cada nova
o fato de que em um período como de regra criada para o cidadão cum-
2004 a 2013, o percentual de servido- prir, encontram-se justificativas de
res municipais no Brasil cresceu 53%, ordem técnica, altruísta e civiliza-
enquanto a população aumentou 12% tória, de difícil contestação. O que
no mesmo período.9 Outra fonte de- não está claro é que o conjunto de
monstra que, entre 2001 e 2014, o au- definições normativas contém uma
mento desses servidores foi de 66,7%, rede de interesses corporativos. Há
enquanto a população cresceu 17,5% uma economia por trás da burocra-
(N.º DE SERVIDORES..., 2015). Em cia dos procedimentos, das obriga-
período semelhante, de 2002 a 2014, ções, emissões documentais e taxas
um levantamento da Escola Nacio- a pagar. Tudo ocorre em nome do
nal de Administração Pública (Enap) aperfeiçoamento das regras ao bem
mostra uma evolução de 35% no ser- comum, alimentando uma econo-
viço público federal (ENAP, 2015). mia avessa ao interesse geral. Com
Isso gera distorções burocráticas que a justificativa de melhorar o bem-
desestimulam o empreendedorismo, -estar geral, aumenta-se o custo dos
afetam a capacidade de investimento serviços que o cidadão deve pagar
em infraestrutura e, paradoxalmente, para obter as licenças de que preci-
pioram a qualidade da gestão públi- sa.11 Há um exército de funcionários

8
Baseados em dados do Ministério da Fazenda, reportagens de diversos jornais como Folha de S.
Paulo, de 6 de agosto de 2017 (CARNEIRO; WIZIACK, 2017) e Gazeta do Povo (18 de julho de 2018)
demonstram que benefícios concedidos a empresários, no período de 2013-2016, superam os valores
concedidos aos programas sociais. Seriam R$ 420 bilhões contra R$ 372 bilhões (PIERRY, 2018).
9
Os dados estão no Ranking de Eficiência Municipal (REM), criado pelo Jornal Folha de S. Paulo.
10
Em 2018, o ranking de competitividade global do International Institute for Management Develop-
ment (IMD), da Suíça, classifica o Brasil em 60.º lugar entre os 63 países que aparecem na relação. Os
quatro fatores de mensuração são eficiência governamental, infraestrutura, desempenho econômico
e eficiência das empresas. (CALEIRO, 2018).
11
São exemplos disso a renovação da Carteira Nacional de Habilitação, a pontuação de multas na
carteira, que suspende a licença e obriga ao curso de reciclagem; também é exemplo a lei do farol
aceso, que gerou multas, posteriormente suspensas pelo Judiciário, em nome da Constituição, pro-
porcionando a falsa sensação de justiça, que encobre o desperdício.
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públicos e prestadores terceirizados, – PMDB, PT e PSDB. O corpo fun-


de repartições governamentais a car- cional do Executivo e do Judiciário,
tórios e despachantes, cuja sobrevi- como também do Legislativo, preci-
vência depende desse emaranhado sou aumentar consideravelmente as
burocrático. A finalidade geral é respectivas estruturas a fim de dar
corporativa e fisiológica e, do ponto execução, fiscalização e intermediar
de vista republicano, autofágica. Ao as relações ampliadas entre Estado
expandir o lastro patrimonialista por e Sociedade. Naquele momento, a
meio dessa economia extrativista, Constituição Federal daria o respal-
inibe a produtividade, única fonte do moral e legal para justificar o in-
sustentável do Estado social. cremento da estrutura assistencial.
Essa notável expansão dos servi- Mais atribuições e cargos seriam
ços do Estado social aprofunda-se a necessários, assim como os recursos
partir da atual Constituição brasilei- orçamentários à construção de uma
ra, por sua característica redentora, grandiosa estrutura de atendimento
inaugurando a etapa da democra- público; e seria preciso extrair tais
cia e da justiça social. Agora, pelos recursos de algum lugar. Natural-
avanços democráticos com os quais mente, será da parte produtiva da
a Carta Magna se comprometera, era sociedade que se exigirá o sacrifício
necessário criar uma superestrutura de sustentar o aumento da estrutura
estatal para cumpri-la e materializar estatal. Em nome do Estado de di-
as aspirações e premissas do Estado reitos, amplia-se a estrutura de ser-
de direito. Na transição para a de- viços, com correspondentes cargos e
mocracia, o instável governo de José salários.
Sarney (1985-1989) aumentou o gas-
to público, financiado pela inflação 7 Cumprindo a Constituição “cidadã”
crescente, em nome do lema “tudo
pelo social”. Houve um breve retar- A partir do governo de Fernan-
do dessa empreitada assistencialista do Henrique Cardoso (1995-2002),
com o governo de Fernando Collor intensificaram-se os gastos públicos
(1990-1991), eleito em nome justa- federais. Aumenta-se carga tributá-
mente do combate à inflação, o que ria a fim de cobrir a lacuna causada
o levou a promover cortes governa- pelo fim da inflação, de onde o Es-
mentais. Não obstante, as circuns- tado brasileiro tirava grande par-
tâncias da abreviação de seu gover- te do seu financiamento até então.
no continham o descontentamento O aumento dos gastos é notável a
com esses cortes, afetando interesses partir de 1993, quando Cardoso as-
relacionados com a ocupação fisioló- sume o Ministério da Fazenda do
gica de cargos. governo de Itamar Franco, até ser
O pacto pela justiça social reas- eleito presidente dois anos depois.
cende depois do governo Collor. O Pouca margem de aumento restou
ponto de partida foi um consenso aos governos seguintes, do Partido
razoável entre os três principais par- dos Trabalhadores, de Lula e Dilma
tidos que levantaram essa bandeira Rousseff. É irônico, pois o ex-presi-
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dente Cardoso foi frequentemente nem acompanhado do necessário e


acusado de “neoliberal”, sinônimo correspondente crescimento econô-
de diminuição do Estado assistente. mico. Sem o respectivo aumento da
Ao contrário, foi responsável pelo capacidade produtiva, a maneira de
crescimento da arrecadação, e não viabilizar os gastos sociais ocorreu
é necessário lembrar que o aumen- mediante o aumento da dívida pú-
to dos gastos não veio precedido blica e também da carga tributária.
Figura – FHC
Figura(PSDB) subiu
– FHC (PSDB) a carga
subiu a cargatributária mais
tributária mais queeLula
que Lula Dilmae Dilma

Fonte: Lima e Máximo (2014).


Fonte: Lima e Máximo (2014).

Depois da queda do governo as contemplou. De fato, pela pressão


Collor (1990-1992) e da ascensão de social, o aumento do gasto público
Itamar Franco à Presidência (1992- foi justificado e acompanhado, sem
1994), vingou a percepção de que ur- culpa, pelo crescimento das estrutu-
gia materializar as demandas sociais ras governamentais. Por sua vez, a
respaldadas pela Constituição. Tal fonte desses recursos teria de vir da
diagnóstico refletia o ponto de vis- capacidade produtiva da sociedade,
ta do sociólogo e ministro Cardoso, seja do seu capital físico, humano,
atento às demandas da democracia institucional, seja dos recursos na-
de massas. Represadas durante as turais. Entretanto, se o gasto público
décadas de regime autoritário, tais reclama uma correspondente capa-
demandas se manifestaram na ela- cidade produtiva, a produtividade
boração da Constituição de 1988, que também requer condições corres-
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pondentes; e quando a infraestru- entre dívida pública e capacidade


tura e a mão de obra apresentam produtiva conduziu o País à estagna-
limites, quando as leis nem sempre ção, e a possibilidade de diminuir a
favorecem, ou quando baixam os desigualdade e potenciar o Welfare
preços das commodities dos recursos State brasileiro está comprometida.12
naturais, esses limites se impõem e Na experiência dos governos do
ficam expostos. Partido dos Trabalhadores (2003-
Passada a linha tênue que divide 2015), a estrutura extrativista do
a saúde econômica de seu estado pa- Estado brasileiro manteve-se, mas
tológico, a economia perde o vigor. É não se trata de uma distinta opção
quando o sempre ameaçado ambiente de poder, e sim de uma tradição pa-
dos estímulos à produtividade e à com- trimonialista e extrativista da qual
petitividade passa a ser dominado pelos nem conservadores nem progressis-
parasitas do extrativismo, por meio de tas abrem mão. Ainda que o aumen-
uma estrutura fisiológica essencialmen- to do gasto público nesses governos
te patrimonialista e extratora da energia fosse apenas um impulso de repul-
social. Nessa direção, a observação do são ao “Estado minimalista”, trata-
economista Bresser-Pereira aparece de -se de uma condição facultada pela
modo útil e atual, ao afirmar: Constituição de 1988. De todo modo,
essa condição foi temporariamente
[...] ou a sociedade brasileira re- possível, além de promover bons
pensa a sua história [...] e se dá resultados econômicos.13 No entan-
conta de que seus objetivos não to, a situação inverteu-se quando
podem ser apenas a democracia os preços das commodities naturais
e a diminuição da desigualdade, perderam o valor que chegaram a
mas deve ser também a do de- alcançar nos anos do governo Lula.
senvolvimento econômico, [...] ou A “política econômica heterodoxa”
então não superará a quase-estag- do governo subsequente de Dilma
nação em que se encontra. (BRES- Roussef aumentou o problema. É do
SER-PEREIRA, 2008, p. 10-11). economista inglês Lionel Robbins a
tese de que a economia é uma ciên-
Portanto, continuar aumentando cia, e quando suas leis básicas são
os gastos públicos, extraindo esses re- ignoradas, provoca todo o tipo de
cursos da sociedade produtiva é ma- instabilidade e impede o desenvolvi-
tar “a galinha dos ovos de ouro” do mento. Sua inobservância explicaria
Estado Social. Assim, o desequilíbrio os maus governos em geral.

12
No relatório 2016-2017 do Fórum Econômico Mundial, a posição do Brasil no ranking da com-
petitividade global cai de 44.º em 2012-2013 para 81.º em uma lista de atualmente 138 nações.
Entre os critérios que mensuram o ranking, estão os impostos, sua regulação para o ambiente de
negócios, a corrupção e a qualidade da administração no serviço público (ROSSI, 2016).
13
Entre 2003 e 2008, a média de crescimento anual foi de 4,2%. Em 2009, por efeito da crise eco-
nômica global, houve uma retração de 06%, seguida de um crescimento de 7% em 2010, último
ano do governo Lula (CURADO, 2011).

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A despeito da validade desse ar- das, formal e informalmente, quanto


gumento, não se deve subestimar a o modus operandi que as mantém. Por
inteligência e os interesses fisiológi- meio de nossas leis e costumes, atra-
cos no interior dos governos. Segun- vessamos os séculos tecendo uma
do Acemoglu e Robinson (2012), os extensa e intrincada teia de expro-
equívocos das políticas econômicas priação estatal sobre a sociedade. Na
não têm origem na ignorância dos concomitância entre a extração dos
governos, mas são produzidos por recursos naturais e a expropriação
interesses políticos coerentemente do Estado sobre a sociedade pro-
elaborados e cujos objetivos consti- dutiva, institucionalizamos o extra-
tuem a fisiologia do poder. Seguin- tivismo estatal. O resultado é que,
do a orientação metodológica da por meio da centralização de poder
teoria da escolha racional, é preciso político e fiscal, pobres e ricos de-
supor que o objetivo primordial de pendem de suas benesses e essa re-
qualquer governo seja a sua preser- lação de dependência, sendo essen-
vação no poder. Nesse sentido, todo cialmente útil que a desigualdade
o arranjo de governança e governa- se mantenha.
bilidade pressupõe primeiramente a Em situações de desigualdade,
preservação do princípio fisiológico portanto, as instituições são fracas
da preservação dos interesses dos ou malfeitas. Mencionando Ace-
indivíduos e seus grupos no poder. moglu e Robinson (2012), Mendes
Atendidos estes, procura-se compa- (2014) refere-se às instituições eco-
tibilizá-los com o interesse público. nômicas extrativistas que travam o
Portanto, observam os autores de crescimento. Por exemplo, quando
Por que as nações fracassam, que “os há concentração de poder e inves-
países são pobres porque seus líde- timentos sob controle de pessoas
res escolhem políticas que geram que não são as mais eficazes e aptas,
pobreza. Erram não por ignorância, beneficiadas por suas relações com
mas de propósito” (ACEMOGLU; o poder, e não pela competência e
ROBINSON, 2012, p. 54). mérito, isso resulta em baixa produ-
Contudo, não se trata de reduzir tividade. Na desigualdade, a dispu-
nossa análise à observação aos go- ta dos rent seekings por riquezas já
vernantes de plantão. O que está em existentes impede ambientes propí-
jogo é o reconhecimento de que, ten- cios à produção de novas riquezas.
do atravessado regimes e governos, Nesse cenário adverso, os ambientes
a estrutura patrimonialista e extrati- são protecionistas e de baixa concor-
vista manteve-se intacta; e conquan- rência, sem estímulos à busca por
to o Brasil se tenha tornado uma das produtividade. Ali, governos são
maiores economias mundiais ao lon- controlados por patrimonialistas e
go do século XX, não perdeu algu- neopatrimonialistas que extraem
mas de suas características mais an- recursos da sociedade e transferem
tigas. Nessa perspectiva, as formas renda a grupos privilegiados, o que
de apropriação do patrimônio pú- leva a burocracia a servir não ao in-
blico continuam tão institucionaliza- teresse público, e sim em favor dos
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privilegiados, por meio de regras resses da Coroa. Ela é constituída


de benefícios, excluindo empresas e de cortesãos e burocratas indicados
aniquilando oportunidades. pelo monarca, vivendo às custas da
Portanto, quando regras per- sociedade por meio do controle de
mitem o abuso fiscal de governos, todo esse emaranhado extrativista
provocam distorções, constrangem de constrangimentos legais e buro-
o desenvolvimento e adiam o com- cráticos. Era, digamos, normal em se
bate sustentável da desigualdade. tratando de sistemas monárquicos,
No caso brasileiro, o Estado assume, mas anacrônico, para dizer o menos,
paradoxalmente, o duplo protago- em contextos republicanos. Para se
nismo na condição de benfeitor e ter uma ideia, trata-se do tipo de
rent seeking; e a gênese dessa condi- poder e de privilégios reais que, por
ção do Estado brasileiro, que deno- exemplo, os senhores feudais da In-
minamos de Estado patrimonialista glaterra do século XIII começaram a
e extrativista, indica nossa “matriar- eliminar a partir da Carta Magna de
ca”: a Coroa Portuguesa e suas ins- 1215, limitando o poder do rei, co-
tituições exemplares, como a proibi- nhecido, por isso mesmo, como João
ção aos brasileiros de comercializar “sem terras”. Essencialmente, con-
com outros países, as restrições ao cordam inúmeros autores, entre eles
livre cultivo e às autorizações e al- Mendes, é por essas alterações ins-
varás à abertura de negócios, além titucionais que podemos compreen-
de tributação excessiva, de empresas der o destino virtuoso da Inglaterra
e pessoas ligadas aos governantes, e de outros países que se desenvol-
que estiveram entre os primeiros veram e se tornaram potências.
movimentos dessa herança patri- Assustadoramente, o Brasil que
monialista. Com a vinda da Coroa, reconhecemos hoje é essencialmente
a centralização amplifica-se e a nas- o mesmo de Dom João VI. Dois sé-
cente burguesia comercial brasileira culos e sete cartas magnas depois, o
sente como nunca a insaciável ne- eterno “país do futuro” mantém a
cessidade da monarquia em extrair essência patrimonialista, extrativista
recursos para a manutenção de sua e clientelista de suas origens e repro-
condição inútil e improdutiva.14 O duz o modelo segundo a perspectiva
resultado é um vergonhoso sistema de que é a sociedade dos indivídu-
de regulação e privilégio, exposto na os que serve ao poder central. Com
narrativa jurídico-antropológica de toda a institucionalização e as lutas
Raymundo Faoro. políticas até a Constituição “cidadã”
A consequência sociopolítico- de 1988, é constrangedor admitir
-econômica desse “modelo colonial que o Brasil mantenha as institui-
extrativista” é a constituição de uma ções extrativistas. Todas as gerações
classe poderosa ao redor dos inte- de elites emergentes, em nome dos

Um dos primeiros e mais conhecidos decretos do governo de D. João VI foi desalojar a bur-
14

guesia brasileira de sua casa a fim de cedê-la à nobreza improdutiva de Portugal.


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interesses republicanos, não foram nômica”. Foram anos de incentivo


capazes de desarmar esse sistema ao consumo, de subsídios a grandes
centralizador que reproduz o ve- empresas, de expansão do crédito,
lho “mercado de influência política de gasto público excessivo, endivi-
e troca de favores”, ao qual todos damento, juros altos, e, por fim, in-
se veem obrigados a recorrer. Du- flação e recessão. Mais um voo alça-
zentos anos depois, a promiscuida- do pelo protagonismo estatal, mais
de da busca de favores e a proteção um voo de galinha.
faz acotovelarem-se entidades como
“FIESP, ANFAVEA, FEBRABAN, 8 Conclusão
entre outras”, financiando campa-
nhas com o mesmo intuito que co- A preservação do extrativismo
merciantes do passado compravam estatal retirou a capacidade endóge-
seus títulos da nobreza (MENDES, na do desenvolvimento brasileiro.
2014, p. 123). O Brasil desperta sofregamente da
Até hoje, como no passado im- ilusão do protagonismo estatal, e de-
perial, boa parte de nossas institui- pender do Estado patrimonialista é,
ções tem o mesmo sentido de manter cada vez mais, a condição antitética
fortes atilhos entre governo e agentes do desenvolvimento. Almejando o
econômicos, fazendo com que o fun- desenvolvimento sustentável, toda
cionamento da economia dependa nação precisa de um Estado bem or-
do poder político, à revelia das leis ganizado, capaz de atender satisfa-
do mercado. Idêntica é a observação toriamente às principais demandas
de Raymundo Faoro sobre a submis- da sociedade pelo bem-estar e cresci-
são e dependência do empresariado mento econômico. A história brasilei-
industrial brasileiro que, na década ra revela, a duras penas, que vivemos
de 1920 e “cinquenta anos depois”, vários ciclos de crescimento, que sem-
nada mais representava na política pre se esgotaram pela mesma razão:
nacional do que “um prolongamen- o controle do Estado por elites extra-
to do oficialismo, pregando a inicia- tivistas, sustentadas por instituições
tiva privada protegida, modalidade extrativistas. Nessa perspectiva, por
brasileira de liberalismo econômico” paradoxal que pareça, a Constituição
(FAORO, 2001, p. 757). Nessa dire- Cidadã é a maior instituição desse gê-
ção, nossos ciclos de crescimento são nero. Do ponto de vista ideal, deveria
continuamente sucedidos por crises garantir um Estado forte e eficiente,
decorrentes da proteção, do subsídio não obstante limitado e controlado
e de endividamento futuro. Nossos socialmente, e capaz de desarmar as
voos são alçados com a outorga esta- estruturas extrativistas que barram
tal, gerando anos de crescimento, se- o desenvolvimento sustentável. Do
guidos de endividamento e baixo ou ponto de vista real, ela legitimou a ex-
nulo crescimento. É precisamente o pansão dos direitos das elites extrati-
que constatamos na crise econômica vistas, autorizando-as à expansão do
brasileira deflagrada em 2015, pro- extrativismo estatal, com a justificati-
duto da chamada “nova matriz eco- va de promover a inclusão social.
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Amparado na sociologia histó- Por essa razão, sugerimos redirecio-


rica brasileira, é possível mostrar nar a perspectiva sociológica, isto é,
logica e empiricamente que o esta- deslocá-la do pressuposto do con-
mento burocrático, formado ainda flito entre capital e trabalho para o
no Império, atravessou séculos e se conflito entre o Estado e a Sociedade.
constituiu em um fim em si próprio. Assim, estamos propondo um desa-
Reconheça-se que essa travessia foi fio e uma provocação à hegemonia
marcada por importantes mudanças, do pensamento sociológico brasilei-
ora avanços, ora retrocessos, mas, ao ro. Sugerimos que a expropriação da
final, expandiram as três esferas dos mais valia que o Estado promove so-
direitos, os civis, os políticos e os so- bre a sociedade seja o mote interpre-
ciais. Nem é preciso concordar com a tativo. Nesse sentido, trabalhadores,
perspectiva sociológica do “progres- empreendedores e consumidores
so”, mas reconhecer que esse movi- são expropriados pelos patrimonia-
mento histórico exigiu a expansão listas que, por inúmeros benefícios
do Estado de direito. Ao largo dessa legais, extraem a riqueza e energia
expansão, muitos agentes oscilaram sociais a fim do seu sustento.
entre perdas e ganhos, mas, no fim, O Estado brasileiro é centraliza-
o extrativismo estatal manteve-se. dor, concentrando decisões e recur-
O Brasil continua preso a esse mo- sos na União, retendo a maior fatia
dus operandi e ao patrimonialismo, da riqueza, o poder de barganha, os
na devastadora confluência entre o melhores salários, aposentadorias,
público e o privado, que endivida a pensões e outros privilégios que
sociedade e compromete as gerações acentuam as desigualdades. A socie-
futuras. Por essa razão, as ciências dade produz, transfere renda para a
sociais brasileiras deveriam levar a manutenção das estruturas gover-
sério a maior crítica do liberalismo namentais e tem retorno precário na
econômico, qual seja, a de que o de- forma de serviços públicos e inves-
senvolvimento nacional não depen- timentos. Ao centralizar, o Estado
de de mais, e sim de menos Estado. distancia-se da vigilância social e
Nessa perspectiva, nossa pro- cresce desmesuradamente. Torna-se
vocação está em redirecionar a pers- excessivamente burocrático e para-
pectiva sociológica que fundamenta doxalmente antirrepublicano, sen-
a sociologia hegemônica no Brasil. do a autopreservação sua principal
Segundo esse, nosso problema fun- finalidade. Nessa direção, é caracte-
dante seria o de qualquer outra na- risticamente extrativista. Toma a so-
ção capitalista, qual seja, o conflito ciedade como fonte aparentemente
entre o capital e o trabalho. Natu- inesgotável da extração de recursos
ralmente, tal conflito é inerente às à sua manutenção. Em tempos de
nossas relações sociais, mas não bonança, usa os recursos do extra-
constitui o problema estrutural. O tivismo das commodities para criar
principal problema nos parece estar cargos e promover ações que ren-
justamente na feição patrimonialista dem votos. Quando a bonança aca-
e extrativista do Estado brasileiro. ba, lança mão do extrativismo fiscal,
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estrangulando o desenvolvimento, sileiro. Essa condição tem impedido


empobrecendo cidadãos e compro- a realização de nossas expectativas
metendo gerações futuras. de desenvolvimento bem- sucedido.
É sugestível partir da premissa Ao longo dos séculos, o Brasil não se
da autopreservação, a fim de com- livrou de alguns de seus problemas
preender o Estado como fonte inter- fundantes, tais quais o centralismo, o
pretativa e real dos problemas na- patrimonialismo e seus mecanismos
cionais. Nessa perspectiva, o desafio extrativistas, que constituem suas
interpretativo e político é decodificar características mais arcaicas. Nessa
a malha burocrática que retroalimen- direção, o patrimonialismo é a feição
ta as estruturas do Estado patrimo- permanente das elites nacionais, e o
nialista, centralizador e extrativis- extrativismo é a forma pela qual as
ta. Por extensão, cabe identificar os elites patrimonialistas se sustentam
agentes constituintes do estamento no poder. Conquanto o patrimonia-
burocrático, além das condições ra- lismo extrativista seja uma prática
cionais-legais, dos fundamentos ju- arcaica, sucessivas gerações de elites
rídicos e até mesmo as justificativas extrativistas conformaram arranjos
filosóficas que determinam suas ga- legais para a sua legitimidade; e toda
rantias, vantagens pecuniárias e seu a trajetória de modernização da or-
poder decisório. Na mesma direção, dem política brasileira não extinguiu
parece crucial que estejamos dispos- essa característica, ao contrário, so-
tos a reconhecer que, para além dos fisticou-a e ameaça a sustentação do
conflitos de classe, as sociedades são inacabado Estado social brasileiro.
antes constituídas – igualmente seus
indivíduos impulsionados – por dis-
putas de poder. Nesse sentido, a eco- REFERÊNCIAS
nomia é o principal meio ambiente
dessas disputas, podendo-se ainda
admitir que seja pecuniária a prin- ACEMOGLU, D.; ROBINSON, J. Por
cipal finalidade dos agentes em dis- que as nações fracassam: as origens
puta; mas não é a economia a fonte da riqueza, da prosperidade e da po-
genuína dessas disputas. A disputa breza. Tradução de Cristiana Serra.
é pelo poder e o poder um motivo Rio de Janeiro: Elsevier, 2012.
político, cujo lócus é o Estado.
Cremos ser necessário é reco- ALMEIDA, F. As elites da justiça:
nhecer a economia como a fonte ge- instituições, profissões e poder na
nuína da sustentação do Estado, seja política da justiça brasileira. Revis-
das estruturas corporativistas que ta de Sociologia Política da UFPR,
constituem o patrimonialismo, seja Curitiba, v. 22, n. 52, out./dec. 2014.
do justificável Estado de bem-estar.
Não obstante, a extração dos recur- BIRKNEN, W. M. K.; TRENTINI, A.
sos da sociedade produtiva para a V. Por que as nações fracassam: uma
sustentação do patrimonialismo é a boa pergunta para uma excelente
feição mais acabada do Estado bra- proposta. Revista Húmus, Universi-
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Artigo recebido em setembro/2018.


Versão aprovada para publicação em
outubro/2018.

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