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Livre Docente. Professor de Bioética da FOUSP. Membro do Centro de Bioética da
Amazônia – CBAm. Membro do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP. Membro
Correspondente da Pontifícia Academia Para a Vida – Vaticano. Coordenador Adjunto
da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa – CONEP/MS.
Bioética Personalista – Dr. Dalton Ramos – III Encontro de Bioética de Belém – Ago/2008
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Bioética Personalista – Dr. Dalton Ramos – III Encontro de Bioética de Belém – Ago/2008
uma parte do que é verdadeiro, algo de atrativo que se constitui num componente da
verdade. Só que este aspecto da verdade é absolutizado; uma “parte” da verdade
assume a conotação de “toda” a verdade. É por existir nesta ou naquela ideologia este
componente de verdade que muitos, estando desatentos, se convencem da sua
adequação.
O individualismo, típico do que se denomina “ética liberal”, resume tudo na
reivindicação da liberdade. Qualquer discurso contrário à defesa irrestrita da liberdade
passa a ser “politicamente incorreto”. Ora, sabemos que a liberdade implica em
responsabilidades. Nenhum ato humano (decorrente do uso da liberdade) deixa de
ter, em maior ou menos grau, algum tipo de implicação para quem o pratica e para
outros. Liberdade e responsabilidade são duas palavras que não se separam.
A expressão que será empregada com maior destaque nesta lógica da ética
liberal é, então, a “autonomia” como a grande bandeira a ser defendida a todo custo.
Autonomia, nesta ótica, passa a ser entendida como a livre escolha do sujeito que não
aceita nem obrigações nem limites à própria liberdade a não ser o respeito, difícil e
utópico, da liberdade alheia. E aqui, mais uma vez, nos deparamos com uma distorção
da realidade. É verdade que a defesa da liberdade é algo pelo qual devemos lutar. Mas
o individualismo, que aparentemente isto pretende, na verdade favorece o contexto
contrário, onde cada um fica escravo dos poderosos, pois se o limite da minha
liberdade fica condicionado pela liberdade do outro tudo dependerá, então, do meu
poder em conquistar o espaço no confronto, no “cabo-de-guerra”, com os interesses
do outro. E vencerá quem tiver mais força. Assim, em vez de propiciarmos a defesa
das liberdades individuais estamos favorecendo que o mais forte se imponha, em
detrimento do mais fraco.
Já no hedonismo, a busca da supressão da dor e a extensão do prazer, se
constituiriam no sentido do agir moral. Aqui se confunde prazer físico, representado
pela ausência de fenômenos dolorosos, com felicidade. Obviamente não se pretende
fazer apologia do sofrimento ou, ainda, se defender uma postura masoquista, mas
sabemos que, para alcançarmos a felicidade, não basta o prazer físico; a natureza
humana deseja muito mais do que isto. Assim, esta apologia do prazer físico coloca-
nos numa perspectiva terrena e utópica ao mesmo tempo. Terrena porque materialista
e imediatista; utópica porque sabemos, a partir das nossas próprias experiências, que
a simples sucessão da dor e a extensão do prazer físico não são suficientes para nos
garantir a felicidade.
A postura hedonista vai implicar, na reflexão ética, na redução do sentido da
vida, pois esta passa a ser, unicamente, a capacidade de provar dor ou prazer. Assim,
não seria uma vida digna de ser levada em consideração aquela que ainda não é
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inflamada; nestes momentos sentimos como foi reduzida a minha pessoa a um dos
seus componentes (estômago, garganta etc), o que não me satisfaz plenamente pois,
de alguma forma, não corresponde a minha dignidade e ao meu valor.
O reconhecimento do valor, da dignidade de pessoa humana não é uma opção. É
algo implícito na nossa própria experiência.
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A Doença e a Dor.
Se saúde é a unidade harmônica e recíproca de todas as dimensões da pessoa a
doença vem a ser a falta desta harmonia. Uma das implicações práticas desta situação
é que a pessoa, doente, declara “sentir uma dor”.
Uma das situações mais paradigmáticas em que a dor é um elemento presente e
que implica em grandes dilemas éticos é o do paciente terminal, portadores de
doenças incuráveis e moribundos cuja experiência de dor pode ser tão grande que
muitos pedem até para morrer, pedindo a eutanásia, um dos grandes temas da
Bioética. Por eutanásia direta, entendemos a ação ou omissão que, em si ou na
intenção, gera a morte a fim de suprimir a dor. A dor é colocada, então, como a
explicação dada para o pedido de eutanásia.
Na verdade o pedido da eutanásia pode ser entendido como um pedido de
socorro. Aquele que sofre está muitas vezes dominado pela dor (a dor física, a do o
abandono)e pode não conseguir ver muito além; desesperado pede a morte. Mas se
pudermos lhe oferecer algo mais positivo (como uma opção de vida com dignidade) é
a isto que vai aderir.
No caso do doente terminal que pede para morrer, de que forma esta dor pode
se apresentar? Podemos, sinteticamente classificá-las em três categorias, classificação
esta proposta no sentido de facilitar nossa reflexão sobre a sua origem, o seu impacto
sobre a pessoa e de como lidar com ela.
Uma primeira modalidade de dor é aquela de natureza física, de origem
neurológica. A Medicina moderna oferece múltiplos recursos para aliviar ou sanar a
dor física, constituindo-se em um campo de atuação bastante profícuo.
Uma segunda modalidade de dor é causada pelo sofrimento que impede que o
paciente consiga enxergar algo de positivo ao seu redor. Nestes casos a solução inclui
aproximar-se da intimidade do enfermo, conhecer sua história de vida para entender a
razão da angústia do paciente. É preciso criar empatia com quem sofre, relacionar-se
com sua dor, criar laços de confiança e carinho. Este é um caminho que pode ser
trabalhoso, mas não é impossível.
Uma terceira modalidade de dor ocorre quando se esgotamento do projeto de
vida onde e necessário resgatar a auto-estima do doente, fazendo-o compreender que
a vida não depende somente do funcionamento perfeito dos órgãos do corpo. É
possível ajudá-lo a resgatar o sentido da vida.
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Referências Bibliograficas:
Sgreccia, E. Manuale di Bioética: Fondamenti ed ética biomedica. 3ª. Ed. Milano: Vita
e Pensiero; 2003. 817p.