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ISSN: 1809-2950

FISIOTERAPIA e
PESQUISA
REVISTA DE FISIOTERAPIA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ÓRGÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL

Volume 15 – número 3 Julho – Setembro 2008


Fisioterapia e Pesquisa Fisioterapia e Pesquisa
em continuação a Revista de Fisioterapia da Universidade de São Paulo. Revista do Curso de Fisioterapia do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e
Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo -
Fofito/FMUSP
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
Reitora SECRETARIA
Profa. Dra. Suely Vilela Sampaio Patrícia Pereira Alfredo
Vice-Reitor
INDEXAÇÃO E NORMALIZAÇÃO BIBLIOGÁFICA
Prof. Dr. Franco Maria Lajolo
Serviço de Biblioteca e Documentação da FMUSP
Faculdade de Medicina e-mail: sbd@biblioteca.fm.usp.br

Diretor EDIÇÃO DE TEXTO, PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO


Prof. Dr. Marcos Boulos Tina Amado, Alba A. G. Cerdeira Rodrigues e Daniel Carvalho
Pixeletra ME
Depto. Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional IMPRESSÃO
Chefe Gráfica UNINOVE
Profa. Dra. Claudia Regina Furquim de Andrade
Tiragem: 800 exemplares
Curso de Fisioterapia
Coordenadora
Profa. Dra. Silvia Maria Amado João

FISIOTERAPIA E PESQUISA
Curso de Fisioterapia
Fofito/FM/USP
R. Cipotânea 51 Cidade Universitária
05360-160 São Paulo SP
e-mail: revfisio@edu.usp.br
Fisioterapia e Pesquisa v.15, n.3, jul./set. 2008 http://medicina.fm.usp.br/fofito/fisio/revista.php
Telefone: 55 xx 11 3091 8416
Fisioterapia e Pesquisa / (publicação do Curso de Fisioterapia
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) INSTITUIÇÕES COLABORADORAS
INSTITUIÇÕES PARCEIRAS
v.1, n.1 (1994). – São Paulo, 2005.
v. : il.
Continuação a partir de v.12, n.1, 2005 de Revista de
Fisioterapia da Universidade de São Paulo.
Semestral: 1994-2004
Quadrimestral: a partir do v.12, n.1, 2005
Trimestral: a partir do v.15, n.1, 2008 ASSOCIAÇÃO DE FACULDADE DE MEDICINA
FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL DE RIBEIRÃO PRETO / USP
Sumários em português e inglês
ISSN 1809-2950 APOIO

1. FISIOTERAPIA/periódicos I. Curso de Fisioterapia da Faculdade


de Medicina da Universidade de São Paulo

Filiada à

FACULDADE DE MEDICINA
DA UNIVERSIDADE
DE SÃO PAULO
ISSN: 1809-2950

FISIOTERAPIA e
PESQUISA
REVISTA DO CURSO DE FISIOTERAPIA DA FACULDADE
DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ÓRGÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL

Volume 15 – número 3 Julho – Setembro 2008


Fisioter Pesq. 2008;15(3) 217
Fisioterapia e Pesquisa
Publicação trimestral do Curso de Fisioterapia da Faculdade de Medicina da USP
Fisioterapia e Pesquisa visa disseminar conhecimento científico rigoroso de modo a subsidiar
tanto a docência e pesquisa na área quanto a fisioterapia clínica. Publica, além de artigos de
pesquisa originais, revisões de literatura, relatos de caso/s, bem como cartas ao Editor.
indexada em: LILACS – Latin American and Caribbean Health Sciences; LATINDEX –
Sistema Regional de Información en Línea para Revistas Cientifícas de Américas;
CINAHL – Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature; e SportDiscus.
EDITORAS-CHEFES EDITORES ESPECIALISTAS
Amélia Pasqual Marques Celso R. Fernandes de Carvalho – Fofito / FMUSP
Fofito / FMUSP – Depto. Fisioterapia,
Isabel de Camargo Neves Sacco – Fofito / FMUSP
Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional,
Faculdade de Medicina / USP Jefferson Rosa Cardoso – Depto. Fisioterapia / Univ. Estadual de Londrina
Débora Bevilaqua Grossi Raquel Simoni Pires – Laboratório de Neurociências / Univ. Cidade de São
Paulo
RAL/ FMRP/USP Depto. Biomecânica,
Medicina e Reabilitação do Aparelho Rosângela Corrêa Dias – EEFFTO – Escola Educ. Física, Fisioterapia e Terapia
Locomotor, Faculdade de Medicina de Ocupacional / Univ. Federal de Minas Gerais
Ribeirão Preto / USP Silvia Maria Amado João – Fofito / FMUSP
CORPO EDITORIAL
Anamaria Siriani de Oliveira RAL, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto / USP Ribeirão Preto SP Brasil
Depto. Engenharia Telecomunicações e Controle Escola
Andre Fabio Kohn São Paulo SP Brasil
Politécnica / USP
Anke Bergmann Curso de Fisioterapia / Centro Univ. Augusto Motta Rio de Janeiro RJ Brasil
Antonio Fernando Brunetto Depto. Fisioterapia / Univ. Estadual de Londrina Londrina PR Brasil
Armèle Dornelas de Andrade Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de Pernambuco Recife PE Brasil
Barbara M. Quaney Medical Center / University of Kansas Kansas City KA EUA
Clarice Tanaka Fofito / Faculdade de Medicina / USP São Paulo SP Brasil
Cláudia R. Furquim de Andrade Fofito / Faculdade de Medicina / USP São Paulo SP Brasil
School of Allied Health and Life Sciences / New York
Chukuka S. Enwemeka Nova Iorque NY EUA
Institute of Technology
École de Réadaptation et GRIS, Faculté de Médecine / Univ.
Debbie Feldman Montréal QC Canadá
de Montréal
Dirceu Costa Faculdade Ciências da Saúde/ Univ. Metodista de Piracicaba Piracicaba SP Brasil
Fátima A. Caromano Fofito / Faculdade de Medicina / USP São Paulo SP Brasil
Fay B. Horak Neurological Science Institute/ Oregon Health & Science Univ. Portland OR EUA
Laboratoire d’Automatique, de Méchanique et d’Informatique,
Franck Barbier Industrielles et Humaines / Univ. de Valenciennes Le Mont Houy França
Gil Lúcio Almeida Depto. Fisioterapia / Univ. de Ribeirão Preto Ribeirão Preto SP Brasil
Helenice Jane C. Gil Coury Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de São Carlos São Carlos SP Brasil
Jan Magnus Bjordal Dept. Public Health and Primary Health Care / Univ. of Bergen Bergen HD Noruega
João Carlos Ferrari Corrêa Depto. Ciências da Saúde / Univ. Nove de Julho São Paulo SP Brasil
Luci Fuscaldi Teixeira-Salmela EEFFTO / Univ. Federal de Minas Gerais Belo Horizonte MG Brasil
Marcelo Bigal Dept. of Neurology, Albert Einstein College of Medicine Bronx NY EUA
Marco Aurélio Vaz Escola de Educação Física / Univ. Federal do Rio Grande do Sul Porto Alegre RS Brasil
Marcos Duarte Escola de Educação Fisica e Esportes / USP São Paulo SP Brasil
Maria Ignêz Zanetti Feltrim Instituto do Coração, Faculdade de Medicina/ USP São Paulo SP Brasil
Mariano Rocabado Facultad de Odontología / Univ. Andres Bello Santiago RMS Chile
Raquel A. Casarotto Fofito / Faculdade de Medicina / USP São Paulo SP Brasil
Ricardo Oliveira Guerra Depto. Fisioterapia / Univ. Federal Rio Grande do Norte Natal RN Brasil
Rinaldo R. J. Guirro RAL / Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto / USP Ribeirão Preto SP Brasil
Sérgio Teixeira da Fonseca EEFFTO / Univ. Federal de Minas Gerais Belo Horizonte MG Brasil
Simone Dal Corso Depto. Ciências da Saúde / Univ. Nove de Julho São Paulo SP Brasil
Tânia de Fátima Salvini Depto. Fisioterapia / Univ. Federal de São Carlos São Carlos SP Brasil
Vera Lúcia Israel Curso Fisioterapia / Univ. Federal do Paraná – Litoral Matinhos PR Brasil

218 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


S UMÁRIO
C ONTENTS

Editorial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 221
Editorial
PESQUISA ORIGINAL
ORIGINAL RESEARCH
Influência da posição do braço na relação EMG-força em músculos do braço . . . . . . . . . . . . . 222
Influence of arm position on the EMG-force relationship in arm muscles
Anamaria Siriani de Oliveira, Helga Tatiana Tucci, Edson Donizetti Verri,
Mathias Vitti, Simone C. Hallak Regalo
Avaliação da reprodutibilidade de testes funcionais na doença arterial periférica . . . . . . . . . . . . 228
Reproducibility of functional tests in peripheral arterial disease
Danielle A. Gomes Pereira, Karen Lamana de Oliveira, Jerusa Oliveira Cruz,
Cristiane Gonçalves de Souza, Inácio T. Cunha Filho
Efeitos da fisioterapia respiratória sobre a pressão arterial em recém-nascidos
pré-termo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 235
Effects of chest physiotherapy on blood pressure in preterm newborns
Carla Marques Nicolau, Mário Cícero Falcão
Há correlação entre o nível de atividade auto-referido e desempenho
físico observado em mulheres idosas? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 240
Is there a correlation between self-reported level of activity and observed physical performance
in elderly women?
Renata Marinho Pereira, Silvio Lopes Alabarse, Renata Cereda Cordeiro
Versão brasileira da Escala de Comprometimento do Tronco: um estudo
de validade em sujeitos pós-acidente vascular encefálico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 248
Brazilian version of the Trunk Impairment Scale: a reliability study in post-stroke subjects
Núbia M. F. Vieira Lima, Silvia Yukie Rodrigues, Thais Martins Fillipo,
Roberta de Oliveira, Telma Dagmar Oberg, Enio Walker A. Cacho
Redução da dor em mulheres com osteoporose submetidas a um programa de atividade física . . . . . . 254
Pain relief in women with osteoporosis after a physical activity program
Patricia Driusso, Valéria F. Camargo Neves, Renata Neves Granito,
Ana Claudia M. Rennó, Jorge Oishi
Avaliação da função do ombro em técnicos de trânsito pelo protocolo de Constant-Murley . . . . . 259
Assessment of shoulder function in traffic technicians by the Constant-Murley protocol
Maria C. Santos, Selma Lancman
Equiscala: versão brasileira e estudo de confiabilidade e validade da Equiscale . . . . . . . . . . . . 266
Brazilian version, reliability and validity study of the Equiscale
Sara Regina M. Almeida, Anderson Barbosa Loureiro, Tiaki Maki

Fisioter Pesq. 2008;15(3) 219


Análise qualitativa dos efeitos da sonoforese com Arnica montana sobre o processo
inflamatório agudo do músculo esquelético de ratos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 273
Qualitative analysis of effects of phonophoresis with Arnica montana onto acute inflammatory
process in rat skeletal muscles
Patrícia Pereira Alfredo, Carlos Alberto Anaruma, Antônio Carlos S. Pião,
Sílvia M. Amado João, Raquel Aparecida Casarotto
Efeito da acupuntura na melhora da dor, sono e qualidade de vida em pacientes
fibromiálgicos: estudo preliminar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 280
Effect of acupuncture on pain, sleep and quality of life improvement in fibromyalgia patients: a preliminary study
Raymond S. Takiguchi, Vanessa Satie Fukuhara, Juliana Ferreira Sauer, Ana Assumpção,
Amélia Pasqual Marques
Efeitos de exercícios aquáticos sobre a aptidão cardiorrespiratória e a pressão arterial em hipertensas . . . . . . 285
Effects of aquatic exercise on cardiorespiratory fitness and blood pressure in hypertensive women
Lisiane Piazza, Marice Regina Menta, Cristiano Castoldi, José Basileu C. Reolão,
Rodrigo Schmidt, Leonardo Calegari
Relação entre desempenho funcional de crianças com paralisia cerebral e qualidade
de vida relacionada à saúde de seus cuidadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 292
Relationship between functional performance of children with cerebral palsy and health-related quality
of life of their caregivers
Ana Paula Rocha, Daniella Romany V. Afonso, Rosane L. de Souza Morais
RELATO DE CASOS
CASE REPORT
Terapia de movimento induzido pela restrição na hemiplegia: um estudo de caso único . . . . . . . . . 298
Constraint-induced movement therapy in hemiplegia: a single-subject study
Daniela Virgínia Vaz, Rafaela Fernandes Alvarenga, Marisa Cotta Mancini, Tatiana P. da Silva Pinto,
Sheyla Rossana C. Furtado, Marcella G. Assis Tirado
REVISÃO
REVIEW
Controle postural em indivíduos portadores da síndrome de Down: revisão de literatura. . . . . . . . 304
Postural control in individuals with Down syndrome: a review
Regiane Luz Carvalho, Gil Lúcio Almeida
Características psicométricas dos instrumentos que avaliam a qualidade de vida
na esclerose múltipla: uma revisão bibliográfica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 309
Psychometric characteristics of instruments that assess quality of life in multiple sclerosis: a literature review
Luísa M. Reis Pedro, José Luís Pais-Ribeiro
Instruções para os autores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 315
Ficha de assinatura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 319

ERRATA: Fisioter Pesq 2008;2:160


No número anterior de Fisioterapia e Pesquisa, no artigo “Atividade eletromiográfica do vasto medial oblíquo em
portadoras da síndrome da dor patelofemoral”, de Sâmia Bessa et al., os títulos dos Gráficos 1 e 2 estão invertidos: o
Gráfico 1 refere-se ao grupo com SDPF e o Gráfico 2, ao controle.

220 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


E DITORIAL
E DITORIAL
Na classificação da Capes – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior, do Ministério da Educação –, os programas de pós-graduação em Fisioterapia
e/ou Ciências da Reabilitação fazem parte da grande área da Saúde, que engloba
Medicina I, II e III, Odontologia, Farmácia, Enfermagem, Saúde Coletiva e Educação
Física. A Fisioterapia, junto com a Fonoaudiologia, a Terapia Ocupacional e a Educação
Física, estão inseridas na Área 21. A Capes avalia permanentemente os programas e
mantém a classificação Qualis dos periódicos ou anais por eles publicados. Considera
periódico científico o veículo que divulga resultados de pesquisas, tem ISSN e fonte
bibliográfica de referência (listas ou bases de indexação); além da relevância social e
acadêmica, o periódico deve apresentar originalidade e qualidade dos artigos
publicados, seleção de artigos por reconhecido corpo editorial na comunidade
acadêmica da área e avaliação dos artigos por pares.
Recentemente, após estudo específico, foram aprovados novos critérios de classificação
dos periódicos nacionais da Área 21 para o triênio 2007-2009, contemplando sete
estratos (“j” é o índice de impacto da base do Journal of Citation Reports e “h” é o
índice calculado pela base Scopus):
A1 periódicos com índice j ≥ 1,85 ou índice h ≥ 23;
A2 periódicos com índice j ≥ 0,6 e ≤ 1,84 ou índice h ≥ 5 e ≤ 22;
B1 periódicos com índice j < 0,6 ou índice h <5; ou periódicos indexados nas bases
Medline ou SciELO;
B2 periódicos indexados numa das bases Lilacs, Cinahl, Embase, Eric, com pontuação
igual ou superior a 85% dos critérios SciELO, usados na avaliação do padrão
internacional;
B3 periódicos indexados numa das bases Lilacs, Cinahl, Embase, Eric e pontuação
entre 65% e 84% segundo os critérios SciELO, usados na avaliação do padrão
internacional; ou indexados nas bases SportDiscus ou Latindex, com pontuação
igual ou superior a 85% dos critérios SciELO;
B4 periódicos indexados numa das bases Lilacs, Cinahl, Embase, Eric; ou indexados
nas bases SportDiscus ou Latindex, com pontuação entre 65 e 84% dos critérios
SciELO;
B5 periódicos indexados numa das bases Physical Education Index, Cab Abstracts,
Periódica, Open Journal Systems, Scientific Cambridge Abstracts, ou pertencentes
a associações científicas reconhecidas pela comunidade acadêmica da área;
C periódicos com ISSN mas sem fonte bibliográfica de referência.
Embora Fisioterapia e Pesquisa tenha sido classificada no estrato B2 – revelando
portanto a seriedade com que vem se destacando entre as revistas nacionais –, nosso
objetivo é alcançar estratos mais altos. Para isso, esperamos continuar contando com
a inestimável colaboração da comunidade, mais uma vez convidando todos a
submeterem seus artigos.

Amélia Pasqual Marques


Editora-chefe
Eliane Schochat
Vice-coordenadora do Programa de Pós-Graduação
em Ciências da Reabilitação da FMUSP

Fisioter Pesq.
Fisioter
2008;15(3)
Pesq. 2008;15(2) 221
Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.222-7, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Influência da posição do braço na relação EMG-força em músculos do braço


Influence of arm position on the EMG-force relationship in arm muscles
Anamaria Siriani de Oliveira1, Helga Tatiana Tucci2, Edson Donizetti Verri3,
Mathias Vitti4, Simone Cecílio Hallak Regalo5

Estudo desenvolvido no RESUMO: A relação entre a amplitude do sinal eletromiográfico e a força muscular
Laboratório de Eletromiografia (EMG-força) tem sido tomada como medida indireta da força muscular. Este
da FOP/Unicamp – Faculdade estudo, em 18 voluntárias saudáveis e destras, visou avaliar a influência da
de Odontologia de Piracicaba posição do braço na relação EMG-força em músculos do braço em três tarefas
da Universidade Estadual de – flexão do braço (FB), abdução do braço (AB) e neutra do braço (NB) – enquanto
Campinas, Campinas, SP, Brasil se tomavam ambas as medidas: uma célula de carga foi acoplada ao conversor
1 do eletromiógrafo para registrar simultaneamente força e sinal eletromiográfico.
Profa. Dra do RAL da FMRP/ Foram analisados os sinais dos músculos bíceps braquial, braquiorradial e tríceps
USP – Depto. de Biomecânica,
Medicina e Reabilitação do braquial, e estimada a força de flexão e de extensão do braço nas diferentes
Aparelho Locomotor da tarefas. A relação entre esses conjuntos de valores foi analisada estatisticamente,
Faculdade de Medicina de verificando se havia correlação entre força e sinal eletromiográfico. Os resultados
Ribeirão Preto da Universidade mostraram não haver tal correlação nas tarefas avaliadas. A posição do braço não
de São Paulo, Ribeirão Preto, influenciou a relação EMG-força dos músculos avaliados, com exceção do tríceps
SP, Brasil braquial, cuja atividade eletromiográfica foi maior durante a tarefa NB. Conclui-
se que, em isometria, as tarefas podem ser empregadas para ativar o bíceps braquial
2
Fisioterapeuta; doutoranda no e o braquiorradial; a tarefa NB é a mais indicada para ativar o tríceps braquial.
RAL da FMRP/USP DESCRITORES: Braço; Eletromiografia; Força muscular
3
Prof. Ms. do Depto. de
Morfologia da Faculdade de ABSTRACT: The relationship between myoelectric signal amplitude and muscle
Fisioterapia da Universidade de strength (EMG-force) has been used as an indirect measure of muscle strength.
Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, SP The aim of this study, in 18 healthy, female, right-handed volunteers, was to
assess the influence of arm position on the relationship EMG-force of arm
4
Prof. Dr. do Depto. de muscles in three different tasks: arm flexion, arm abduction, and neutral arm
Morfologia, Estomatologia e position. Both myoelectric signals and strength measures were acquired
Fisiologia da Forp/USP – simultaneously, by coupling a load-cell to the electromyograph transducer.
Faculdade de Odontologia de Signals from the biceps brachii, braquioradialis, and triceps brachii muscles
Ribeirão Preto da Universidade were analysed, and arm extension and flexion force was estimated. Relationships
de São Paulo, Ribeirão Preto, SP between these values were statistically analysed, searching for a correlation
5 between myoelectric signal amplitude and muscle strength. Results showed
Profa. Dra. do Depto. de
Morfologia, Estomatologia e no such correlation could be found during any of the tasks. Arm position did
Fisiologia da Forp/USP not influence EMG-force of the assessed muscles, to the exception of the triceps
brachii muscle, which showed greater activity in the neutral arm task as
ENDEREÇO PARA compared to the other tasks. In isometric contractions, the tasks may be used
CORRESPONDÊNCIA to activate biceps brachii and braquioradialis; neutral arm position is indicated
to activate the triceps brachii muscle.
Profa. Dra. Anamaria Siriani KEY WORDS: Arm; Electromyography, Muscle strength
de Oliveira
Depto. RAL, Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto
Av. Bandeirantes 3900 Monte
Alegre
14040-904 Ribeirão Preto SP
e-mail: siriani@fmrp.usp.br

APRESENTAÇÃO
out. 2006
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO
ago. 2008

222 Fisioter Pesq. 2008;15(3):222-7


2008;15(3)
Oliveira et al. Relação EMG-força em músculos do braço

INTRODUÇÃO agonista do movimento 12. Dessa for-


ma, a co-contração muscular também
METODOLOGIA
A relação entre a amplitude do deve ser considerada quando se estu- Este estudo foi desenvolvido no
sinal eletromiográfico e a força mus- da a relação EMG-força, por ser um Laboratório de Eletromiografia da
cular (relação EMG-força) tem sido fator que pode alterar o sinal ele- Faculdade de Odontologia de Piracica-
objetivo de pesquisas que empregam tromiográfico em decorrência da dis- ba e foi aprovado pelo Comitê de
essa ferramenta como medida indireta tribuição de força muscular13. Ética da instituição. Participaram 18
de força muscular1,2. Enquanto alguns voluntárias sedentárias, com média de
Além disso, pesquisas demonstram
estudos demonstram uma linearidade idade entre 20 e 30 anos (23,0±2).
que existe variação na produção de
nessa relação em músculos pequenos, Todas foram submetidas a uma avaliação
força entre músculos mono e biarti- física prévia, que constou de anamnese
outros, que avaliaram músculos maio- culares, possivelmente causadas pela
res, demonstram uma relação EMG- e de testes ortopédicos específicos para
diferença na ativação de unidades assegurar os critérios de inclusão:
força não linear3-6. A diferença entre motoras12. Em diferentes ângulos ar-
os resultados pode estar relacionada ausência de restrições na amplitude
ticulares, os músculos sinergistas e de movimento das articulações do
com a variação no recrutamento de antagonistas variam sua relação com-
unidades motoras durante diferentes membro superior, ausência de dis-
primento-tensão in vivo, causando di- túrbios osteomioarticulares ou história
níveis de força. Músculos pequenos, ferenças na ativação de unidades mo-
quando comparados a músculos maio- de trauma na região do ombro. As
toras e resultando em alterações no voluntárias que apresentaram restrição
res, têm menor variação no recruta- sinal eletromiográfico14. Por exemplo, de movimento na articulação do om-
mento de unidades motoras em dife- como o tríceps braquial também é um bro e/ou presença de arco doloroso
rentes valores de força, o que pode estabilizador articular e a cabeça lon- durante os movimentos de elevação
causar maior linearidade entre o ga desse músculo é biarticular, sua do braço foram excluídas da pesquisa
aumento da amplitude média do sinal ativação durante esforços máximos de pelo fato de esses fatores provocarem
eletromiográfico e o aumento da flexão do antebraço pode alterar a ati- variações nos padrões eletromiográ-
força2. vidade eletromiográfica dos músculos ficos nos diferentes músculos da
Além do recrutamento de unidades agonistas desse movimento, durante a cintura escapular e braço 15 . Todas
motoras, a força que um músculo é realização de uma determinada tarefa. assinaram um termo de consentimento
capaz de produzir pode ser influenciada esclarecido, de acordo com os requi-
Assim, o nível de torque produzido
pelo tipo de contração, pela veloci- sitos legais.
durante um movimento ou tarefa pode
dade de contração e pelo comprimen- estar relacionado, entre outros fatores,
to muscular7-9; e, também, depende da ao nível de ativação de unidades mo- Procedimentos e instrumentos
máxima ativação muscular voluntária, toras, considerado diferente em músculos
ou seja, do maior recrutamento de Para avaliar as eventuais alterações
mono e biarticulares, e a variações no que o posicionamento do braço teria
unidades motoras em uma freqüência
comprimento muscular, ou seja, na re- sobre a atividade eletromiográfica dos
de disparo considerada ideal10. Esses
lação comprimento-tensão. Nesse músculos bíceps braquial, tríceps
fatores podem ser influenciados pelo
sentido, focalizando músculos dos braquial e braquiorradial – e, conse-
comprimento muscular pois, depen-
membros superiores, a hipótese deste qüentemente, sobre a relação EMG-
dendo do movimento ou da tarefa reali-
trabalho é que haverá uma linearidade força durante o torque isométrico de
zada, a relação entre comprimento e
pra o músculo braquiorradial e uma flexão do cotovelo –, foram propostas
tensão pode ser menor do que a con-
não-linearidade para os músculos três tarefas:
siderada ideal para gerar força 7,9,10 .
bíceps braquial e tríceps braquial na
Dessa forma, músculos biarticulares
relação EMG-força em diferentes • tarefa FB (flexão do braço) – 90°
podem ser mais susceptíveis a varia- de flexão do braço, antebraço
tarefas. O objetivo deste estudo foi
ções no sinal eletromiográfico em re- semi-pronado e fletido em 90°;
pois avaliar a relação EMG-força de
lação aos monoarticulares.
dois músculos flexores do antebraço • tarefa AB (abdução do braço) –
No desempenho de uma tarefa, um – a cabeça longa dos músculos bíceps 90° de abdução do braço, ante-
músculo não atua sozinho. De acordo braquial, biarticular, e o braquior- braço semi-pronado e fletido em
com a idéia de tarefa de trabalho11, o radial, monoarticular – durante o 90°;
torque produzido durante uma ativi- torque isométrico máximo de flexão
dade é decorrente de uma ação mus- do antebraço em três diferentes tare- • tarefa NB (neutra do braço) –
cular conjunta, responsável tanto pelo fas. Além disso, com o intuito de posição neutra do braço, ao lado
desempenho adequado da tarefa quan- avaliar a influência da atividade anta- do tronco, com antebraço semi-
to pela distribuição da carga entre a gonista na relação EMG-força nos pronado e fletido em 90°.
musculatura, ou seja, está baseado na flexores do antebraço, a atividade da Foi utilizado um eletromiógrafo
ativação de unidades motoras de di- cabeça longa do músculo tríceps Lynx (Lynx Tecnologia Eletrônica
versos músculos e não apenas do braquial também foi avaliada. Ltda). Os sinais mioelétricos foram

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :222-7 223


captados por eletrodos de superfície braquiorradial foi registrada durante o as seguintes equações: força estimada
ativos simples diferenciais (Lynx), torque isométrico máximo de flexão flexores X 100/ força total em cada
ganho de 20 vezes, compostos por duas do cotovelo nas três tarefas. Cada tarefa; força estimada extensores X
barras de prata pura (10x10x2 mm), voluntária realizou, em cada tarefa, 100/ força estimada em cada tarefa.
impedância de 10 GO e CMRR de três contrações isométricas máximas Esses cálculos foram estabelecidos
130 dB. Um eletrodo de referência mantidas por 4 segundos a intervalos com base em estudo sobre músculos
retangular (33x31 mm), posicionado de 2 minutos. A ordem de execução da extremidade inferior 13, segundo o
na região do punho, foi utilizado para das tarefas foi aleatória, por sorteio qual há uma relação linear, ou quase
diminuir o efeito de interferências e prévio. linear, entre a atividade eletromiográ-
ruídos de aquisição do sinal eletromio- fica dos músculos antagonistas e a
força realizada pela musculatura
gráfico. Para o registro eletromiográ-
fico foram utilizados três canais de um
Análise dos dados agonista.
sistema de aquisição de sinais (módulo Os valores da amplitude do sinal Na análise estatística, a correlação
condicionador de sinais modelo CAD eletromiográfico são representados em entre o valor médio de força de flexão
12/32, Lynx) com aterramento e aqui- raiz quadrada da média (root mean do antebraço e o valor médio de RMS
sição simultânea, placa conversora square, RMS), sugerido entre as pos- normalizado para cada músculo
analógico-digital (A/D), 12 bites de re- síveis formas de apresentação de tal avaliado e para os flexores do cotovelo
solução dinâmica, freqüência de amos- variável pelas normas de padronização (somatória da atividade dos músculos
tragem de 1 KHz e filtro Buttherworth para estudos de EMG de superfície16. bíceps braquial e braquiorradial) foi
com passa-faixa de 10 Hz a 509 Hz. Os valores eletromiográficos referen- calculada para cada tarefa pelo coe-
Para monitorar a força produzida pelo tes às tarefas NB, FB e AB, usados para ficiente de correlação de Pearson
torque isométrico de flexão do cotove- calcular a relação EMG-força, foram (CCP), com nível de significância de
lo, uma célula de carga modelo MM normalizados pela razão entre o valor 5%. O CCP foi considerado aceitável
(Kratos Dinamômetros Ltda.), com médio de RMS obtido nas três con- se o valor fosse igual ou maior a 0,8018.
capacidade nominal de 100 kgf, foi trações de cada músculo em cada Para o cálculo do CCP foram usados
acoplada ao conversor analógico- tarefa e o valor máximo de RMS obtido os valores de RMS normalizados e o
digital. Os sinais eletromiográficos e nos três registros da CIVM. valor de força obtido através da média
de força foram adquiridos simultanea- Para o cálculo da força, foi consi- de três torques isométricos máximos
mente e com a mesma freqüência de derada atividade eletromiográfica dos de cada tarefa. A comparação entre
amostragem (1000 Hz). O programa flexores do antebraço (EMG flexores) os valores de RMS normalizados para
Aqdados versão 4.18 (Lynx) foi empre- a soma da atividade eletromiográfica cada músculo avaliado, para a soma
gado para o tratamento dos sinais do bíceps braquial e do braquiorradial; dos flexores do cotovelo, para a força
eletromiográficos e de força. Para a e considerada a atividade eletromio- estimada de flexão e de extensão do
realização das tarefas foi utilizado um gráfica total (EMG total) a soma dos antebraço nas diferentes tarefas foi
suporte de madeira e couro, com ajus- valores obtidos para os três músculos. feita pela análise de variância
O cálculo da força estimada de exten- (Anova), com nível de significância
te de altura para que as voluntárias
são e de flexão do braço foi feito, res- de 5%. A partir da força de flexão do
permanecessem sentadas e mantives-
pectivamente, pelas seguintes equações: cotovelo e da somatória da atividade
sem o posicionamento do braço de
EMG flexores X total de força em cada eletromiográfica de todos os músculos
acordo com a tarefa testada.
tarefa/EMG total; EMG tríceps X total em cada tarefa, foi possível estabe-
A colocação dos eletrodos para o de força em cada tarefa/EMG total. lecer tanto a porcentagem quanto a
registro do sinal eletromiográfico Assim, foi possível estimar a força força estimada de extensão e de flexão
seguiu as recomendações européias do exercida pelos músculos bíceps braqui- do cotovelo em cada tarefa avaliada.
projeto Seniam *16. Para normalizar o al e braquiorradial (agonistas) e pelo
sinal, este foi coletado durante três
contrações isométricas voluntárias
tríceps braquial (antagonista) durante
a força máxima obtida em cada tare-
RESULTADOS
máximas (CIVM) em posição de prova fa. Para calcular a porcentagem de O coeficiente de correlação de
de função muscular 17 ; cada CIVM força de flexão e de extensão em cada Pearson, utilizado para analisar a re-
durou 4 segundos de duração e foi tarefa utilizaram-se, respectivamente, lação EMG-força, não mostrou corre-
mantido um intervalo de 2 minutos
entre elas para evitar possível fadiga Tabela 1 Correlação EMG/força (valores do coeficiente de correlação de
muscular. A atividade elétrica do Pearson) para os músculos bíceps braquial (BB), braquiorradial (BR) e
bíceps braquial, tríceps braquial e tríceps braquial (TB), segundo a tarefa (n=18)
Músculo
*
Seniam, ou Surface electromyography for Tarefa
BB BR TB BB+BR
the non-invasive assessment of muscles
(Eletromiografia de superfície para avaliação Posição neutra de braço 0,27 0,15 0,04 0,24
não-invasiva de músculos), é um projeto da Flexão de braço 0,09 0,18 0,50 0,17
União Européia para padronização da
metodologia de uso de eletromiografia. Abdução de braço -0,11 -0,07 0,34 -0,1

224 Fisioter Pesq. 2008;15(3) :222-7


Oliveira et al. Relação EMG-força em músculos do braço

Tabela 2 Médias e desvios-padrão dos valores de RMS normalizados (UA) e brutos (µV) em cada músculo, obtidos nas
tarefas posição neutra de braço (NB), flexão de braço (FB) e abdução de braço (AB); n=18
Bíceps braquial Braquiorradial Tríceps braquial Flexores (BB+BR)
Tarefa
UA µV UA µV UA µV UA µV
NB 1,55±1,2 290,20±158,03 1,20±0,79 173,16 ±152,16 1,31±0,59* 98,98 110,08 2,75±1,95 463,36±225,07
FB 1,45±062 278,63±218,81 1,22±0,76 175,89 ±142,71 0,73±0,77 86,22 107,41 2,6±1,16 454,52±239,39
AB 1,43±0,59 284,42±204,74 1,05±0,59 147,99 ±128,85 0,73±0,87 98,96 113,27 2,48±1,02 426,62±201,38
UA: unidade arbitrária; BB = bíceps braquial; BR = braquiorradial; * p<0,05
Os valores de CCP foram inferiores
Tabela 3 Médias e desvios-padrão dos valores da força (em kgf) estimada de a 0,60, indicando a não-correlação
flexão e de extensão do antebraço e dos percentuais (%) dessas entre os dados eletromiográficos e a
forças nas tarefas posição neutra de braço (NB), flexão de braço (FB) produção de força. Esses resultados
e abdução de braço (AB); n=18 concordam com estudos anteriores que
Força estimada Força estimada % Força não encontraram linearidade EMG-
Tarefa Força total flexão extensão
% Força flexão
extensão força em músculos de tamanho maior,
como o bíceps braquial e o tríceps
NB 10,73±4,33 7,01±3,34 3,72±2,12 64,86±14,76 35,14±14,76
braquial, quando comparados a mús-
FB 8,21±2,67 6,29±2,31 1,93±1,93 78,93±18,60 21,07±18,0 culos menores, como os interósseos
AB 8,56±3,26 6,57±2,85 6,57±2,85 78,92±18,44 21,08±18,44 dorsais e o abdutor do polegar4-6.
kgf: kilograma-força; *p< 0,05 Estudos feitos em músculos predo-
minantemente constituídos por fibras
lação entre a amplitude eletromiográ- para os músculos bíceps braquial e do tipo I sugerem uma relação linear
fica e os valores de força em qualquer tríceps braquial confirmando a hipótese ou quase linear entre EMG e força19.
das tarefas avaliadas. O menor valor inicial deste trabalho. Entretanto, o Músculos com constituição mais ho-
de correlação foi o do músculo bíceps músculo braquiorradial não demonstrou mogênea têm maior uniformidade no
braquial na posição de abdução do uma linearidade nessa relação, como tamanho das unidades motoras em
braço e o maior valor foi o do músculo esperado nesta pesquisa, possivelmente relação àqueles com constituição
tríceps braquial na flexão do braço por ser monoarticular e não ter seu mais heterogênea, gerando diferentes
(Tabela 1). comprimento alterado durante as tarefas. recrutamentos musculares e, conse-
A análise de variância mostrou não Também foi verificado que a posição do qüentemente, diferenças na amplitude
haver diferença estatisticamente signi- braço durante as tarefas avaliadas não eletromiográfica20. Os músculos anali-
ficativa entre os valores de RMS nor- influenciou a resposta eletromiográfi- sados nesta pesquisa são de constitui-
malizados dos músculos bíceps braquial, ca dos músculos estudados. Quanto ção mista, possível justificativa para
braquiorradial e dos flexores do braço aos valores de força analisados, ape- a não-linearidade na relação EMG-
entre as tarefas. Porém, mostrou dife- nas a força estimada de extensão no força, pois geram diferentes recruta-
rença estatisticamente significativa movimento de flexão do antebraço mentos de unidades motoras e, conse-
para o músculo tríceps braquial na apresentou diferença significativa qüentemente, diferenças na produção
tarefa NB em relação às tarefas FB e entre as tarefas. de força19.
AB (Tabela 2). Diferenças no recrutamento de
Em relação aos valores de força
Não houve diferença estatistica- unidades motoras também pode ser
total, força estimada e porcentagem
mente significativa para os valores de uma justificativa para os distintos
de força estimada, não houve diferen-
força total, força estimada de flexão, valores de atividade eletromiográfica
ça para os músculos agonistas, o que
força estimada de extensão e porcen- encontrados entre músculos mono e
pode ser decorrente da pouca variação
tagem de força flexora entre as tarefas. biarticulares na mesma tarefa e/ou
no comprimento muscular e no braço exercício estudado9,10,12. Porém, os re-
Houve, porém, diferença na força de alavanca do bíceps braquial e do
estimada de extensão entre as três sultados desta pesquisa demonstram
braquiorradial entre as tarefas. Entre- que a comparação dos valores médios
tarefas (Tabela 3). tanto, houve diferença estatisticamen- de RMS entre os músculos bíceps
te significativa nos valores de força braquial e braquiorradial não demonstrou
DISCUSSÃO estimada de extensão, que pode ser
justificado por variações no posiciona-
diferença estatisticamente significati-
va, independente do posicionamento
Os resultados deste estudo demons- mento do braço em relação à força do braço. Essa ausência de diferença
tram que durante as tarefas avaliadas não de gravidade, que exigiram diferentes pode ser justificada pelo fato de o
houve linearidade entre os valores da níveis de força do músculo tríceps braquiorradial ser monoarticular e, as-
atividade eletromiográfica e os valores braquial para estabilizar a articulação sim, as diferentes posições de teste
de força, ou seja, na relação EMG-força, do cotovelo em cada tarefa. não alteraram sua atividade eletromio-

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :222-7 225


gráfica, por não ter alterado seu com- eletromiográfica de músculos motores fluenciar a relação EMG-força. Entre-
primento muscular. Apesar de ter havi- primários, dentre os quais a semelhan- tanto, esta pesquisa não avaliou
do variações no comprimento do mús- ça no posicionamento do voluntário diferentes níveis de torque isométrico
culo bíceps braquial, essa variação durante as tarefas e/ou exercícios reali- e possíveis alterações na relação
pode não ter sido suficiente para zados e o valor de carga utilizado21,22. EMG-força em tarefas feitas com car-
causar alterações no sinal eletromio- Entretanto, Lephart e Henry23 sugerem ga rotacional em comparação a
gráfico, pois mesmo estando alongado que a direção da carga, se axial ou tarefas com carga axial. A análise de
em relação a sua inserção na escápula rotacional, seria outro fator a ser consi- outros músculos sinergistas também
e com maior registro de força encon- derado. possibilitaria melhor compreensão da
trado com o braço em posição neutra, influência desses músculos durante as
A semelhança encontrada na
nenhuma diferença foi observada nos atividade eletromiográfica nesta pes- tarefas avaliadas. Dessa forma, pes-
registros eletromiográficos. Outra quisa concorda com Dillman et al.21 e quisas futuras que abordem esses pro-
justificativa para a similaridade entre Blackard et al. 22 , mas discorda dos cedimentos experimentais poderão
esses valores seria a análise de apenas achados de Oliveira et al.24 e auxiliar na melhor compreensão de
um valor de torque isométrico máximo. Oliveira et al.25. Uma consideração a fatores que interferem na relação
Talvez, em contrações submáximas, ser feita é que os exercícios realizados EMG-força.
alterações pudessem ser observadas. por Dillman et al.21 e Blackard et al.22
Como a atividade de músculos
são isotônicos, variável que pode ter
influenciado a diferença entre os resul- CONCLUSÃO
sinergistas e antagonistas podem
tados. Ainda, as tarefas realizadas neta As tarefas avaliadas não permitiram
influenciar a atividade eletromiográ-
pesquisa foram feitas com carga ro- estabelecer uma linearidade na rela-
fica e a relação EMG/força, foi anali-
tacional, o que pode ter causado as ção EMG-força. Não foi encontrada di-
sada a atividade eletromiográfica do
divergências com os resultados obtidos ferença estatisticamente significativa
músculo tríceps braquial na força de
por Oliveira et al.24 e Oliveira et al.25, entre a atividade eletromiográfica e
flexão do antebraço. Os resultados que utilizaram carga axial. Esses acha-
mostram que a atividade eletromio- a porcentagem de força exercida pela
dos sugerem que, em contrações iso- musculatura agonista e antagonista
gráfica desse músculo na tarefa NB métricas, a direção da carga, se axial
foi maior em relação às demais. Ape- nas tarefas propostas, sugerindo que a
ou rotacional, pode influenciar a ati- alteração de posicionamento do braço
sar de não-significativa, o torque iso- vidade eletromiográfica e alterar a
métrico realizado na tarefa NB foi não influenciou a porcentagem de for-
relação EMG-força. ça exercida nem a atividade eletromio-
maior e isso pode ter ocasionado
maior recrutamento do tríceps braquial Dessa forma, a associação entre gráfica dos músculos avaliados, com
para manter a estabilidade articular, diferentes comprimentos musculares e exceção do tríceps braquial durante a
justificando sua maior atividade nessa nível de esforço empregado para reali- tarefa em posição neutra de braço
zar uma tarefa ou um movimento26, a (NB). Dessa forma, em isometria, as
tarefa.
direção da carga, se axial ou rotacio- tarefas avaliadas podem ser emprega-
Ainda em relação à atividade mus- nal23, e a ativação da musculatura si- das para ativar os músculos bíceps
cular, encontramos na literatura pes- nergista9 podem causar alterações no braquial e braquiorradial, sendo a
quisas que sugerem outros fatores que recrutamento e nas taxas de disparo tarefa NB a mais indicada para ativar
poderiam influenciar a atividade de unidades motoras e, portanto, in- o músculo tríceps braquial.

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Fisioter Pesq. 2008;15(3):222-7 227


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.228-34, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Avaliação da reprodutibilidade de testes funcionais na doença arterial periférica


Reproducibility of functional tests in peripheral arterial disease
Danielle Aparecida Gomes Pereira1, Karen Lamana de Oliveira2,
Jerusa Oliveira Cruz2, Cristiane Gonçalves de Souza2, Inácio Teixeira Cunha Filho3

Estudo desenvolvido no Curso RESUMO: Este estudo visou avaliar a reprodutibilidade de dois testes funcionais
de Fisioterapia do Depto. de de membros inferiores em pacientes com doença arterial periférica. Os testes
Ciências Biológicas, senta-levanta da cadeira (TSL) e da ponta do pé (TPP) foram aplicados duas
Ambientais e da Saúde do Uni- vezes em 14 voluntários com doença arterial periférica por três examinadores,
BH– Centro Universitário de com intervalo de 1 minuto entre os testes e de 15 minutos entre teste e reteste.
Belo Horizonte, Belo A maioria dos participantes apresentou dificuldades no TPP, sendo realizadas
Horizonte, MG, Brasil adaptações. Os dados foram analisados estatisticamente; o grau de
1 concordância entre examinadores foi estimado pelo coeficiente de correlação
Fisioterapeuta especialista
Profa. do Curso de Fisioterapia intraclasse (CCI), sendo α≤5% considerado significativo. Todas as correlações
do Uni-BH foram estatisticamente significativas. O TSL apresentou alta reprodutibilidade
tanto inter-examinador (CCI=0,904 no teste e 0,857 no reteste) quanto intra-
2
Fisioterapeutas examinador. O mesmo ocorreu com o TPP (CCI=0,824 no teste e 0,941 no
reteste, na avaliação inter-examinador). A correlação de Pearson entre as médias
3
Prof. Dr. do Curso de dos três examinadores no TSL e no TPP foi 0,651 no teste e 0,609 no reteste.
Fisioterapia do Uni-BH Ambos os testes são pois reprodutíveis e viáveis na prática clínica, mas é
necessário avaliar se são sensíveis a alterações que ocorram durante o processo
ENDEREÇO PARA natural da doença ou se podem ser instrumentos viáveis para acompanhamento
CORRESPONDÊNCIA desses pacientes.
Danielle A. Gomes Pereira DESCRITORES: Claudicação intermitente; Doenças vasculares periféricas; Força
R. João Gualberto Filho 1260 muscular Reprodutibilidade dos testes
apto. 604 Sagrada Família
31035570 Belo Horizonte MG ABSTRACT: This study aimed at evaluating the reproducibility of two lower-limb
e-mail: d.fisio@ig.com.br; functional tests in patients with peripheral arterial disease. The chair-stand
karenlamana@hotmail.com (CST) and tip-toe (TTT) tests were applied twice to 14 volunteers with peripheral
arterial disease by three examiners with a one-minute interval between them
and 15 minutes between test and retest. Most participants presented difficulties
in TTT, which has then been slightly adjusted. Data were statistically analysed;
inter-examiner degree of agreement was assessed by means of the intraclass
correlation coefficient (ICC), with significance level set at α≤5%. All correlations
were found to be statistically significant. CST showed high both inter-examiner
reproducibility (test ICC=0.904, retest ICC=0.857) and intra-examiner. The
same applies to TTT (inter examiner test ICC=0.824, retest ICC=0.941). The
Pearson correlation between the mean of the three examiners in CST and the
mean in TTT was 0.651 at test and 0.609 at retest. Both tests are thus reliable
and viable for clinical practice. However, it is still to be assessed whether
APRESENTAÇÃO these tests are sensitive to changes that might arouse from the disease, hence
out. 2007 being useful for patient follow-up.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Intermittent claudication; Muscle strength; Peripheral vascular diseases;
ago. 2008 Reproducibility of results

228 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


2008;15( 3):228-34
Pereira et al. Avaliação de testes na doença arterial

INTRODUÇÃO fibras tipo I e II e da área do músculo


gastrocnêmio desses pacientes 5,15 .
cido, concordando em participar após
serem informados acerca dos objetivos
A doença arterial periférica (DAP) Além das alterações anatômicas, ocor- e testes. Este trabalho foi aprovado pe-
é caracterizada pela redução do fluxo re denervação musculoesquelética lo Comitê de Ética em Pesquisa da
sangüíneo devido a uma obstrução provavelmente devido à isquemia dos instituição.
arterial, sendo em 90% dos casos de nervos motores distais, contribuindo
Previamente à coleta de dados, foi
origem aterosclerótica1,2,3. Ocorre em para a disfunção muscular nos pacien-
realizado um estudo piloto com teste
ambos os membros, é mais freqüente tes com claudicação2,12.
e reteste (48 horas após o teste), para
nos membros inferiores (MMII) e afeta A perda de força muscular nos in- efeito de treinamento dos examinado-
mais de 20% da população idosa3,4,5. divíduos com DAP poderá ser conse- res e para detectar possíveis problemas
Quando sintomática, a claudicação qüência tanto do descondicionamento associados aos testes propostos, de
intermitente (CI) é a manifestação clí- pelo desuso quanto da denervação e senta-levanta da cadeira e de ponta
nica mais comum da DAP 1,3,4. A CI redução da área das fibras tipo II do pé, descritos a seguir. Antes e após
caracteriza-se por dor, cãibra, sensa- secundárias à isquemia 5,12. Essa re- a realização de cada teste, a pressão
ção de formigamento ou queimação dução na força contribui para o prejuí- arterial e freqüência cardíaca eram
na região da musculatura isquêmica, zo funcional durante a deambula- mensuradas para acompanhamento de
principalmente durante a caminhada, ção2,5-8,10,11,12,16. dados hemodinâmicos dos voluntários.
cessando com o repouso1,4. Com a evo-
lução da obstrução, pode ocorrer dor Como há redução de força muscular Teste senta-levanta da cadeira:
em repouso, ulceração isquêmica, nos portadores de DAP, sua mensura- avalia força dos MMII e equilíbrio do
gangrena ou mesmo amputação3,4. ção é importante para o acompanha- indivíduo. Foi realizado em cadeira
mento de alterações que possam sem braço, com assento de altura apro-
A CI pode resultar em limitação influenciar a capacidade funcional ximada de 43 cm 18. O participante
significante na capacidade física dos desses pacientes. Além disso, o treina- sentou no centro da cadeira, com a
pacientes1. Os portadores de DAP sin- mento de força pode ser uma opção coluna ereta, pés separados numa
tomáticos possuem passo encurtado, terapêutica viável para aumento das distância equivalente à largura do
cadência lenta e deficit no equilíbrio, distâncias caminhadas 7-10,12,16 . Para ombro, pé não dominante à frente do
motivando a redução do desempenho, comparar tal mensuração, porém, é outro e os braços cruzados sobre o
da velocidade de caminhar e da capaci- importante haver testes confiáveis, de tórax, sendo solicitado a levantar-se e
dade de percorrer longas distâncias2,5-12. modo a garantir que diferenças encon- sentar-se cinco vezes consecutivas o
Pacientes com DAP grave caminham tradas nos resultados sejam devidas a mais rápido possível, após demonstra-
com velocidades reduzidas para con- intervenções realizadas ou à evolução ção pelo examinador, e após a reali-
seguir percorrer maiores distâncias13. do quadro funcional, e não resultantes zação de uma repetição para certifi-
Vários autores demonstraram que os de oscilações devidas à variabilidade car a forma correta16,19. O examinador
portadores de DAP têm pico de con- de testes não-reprodutíveis. A avalia- registrou o tempo em segundos gasto
sumo de oxigênio 50% menor do que ção da força muscular por meio do para levantar e sentar as cinco vezes.
indivíduos normais, contribuindo para dinamômetro isocinético, que avalia Foi dado comando verbal para início
a redução do desempenho durante o a força máxima de um determinado e final do teste e, durante a realiza-
exercício e a restrição na capacidade grupo muscular, é uma medida válida ção, não foi dada qualquer forma de
de realizar atividades domiciliares2,8,12,14. e confiável, mas inviável na prática incentivo.
Os pacientes que apresentam CI têm clínica, uma vez que esse método é
Teste de ponta do pé: avalia força
suas atividades de vida diária redu- de alto custo, requer grande espaço,
dos MMII e equilíbrio do indivíduo.
zidas e baixa qualidade de vida1,2,6,10. treinamento técnico especializado,
Foi realizado no estudo piloto com o
além de limitar o número de grupos
A DAP também está relacionada a paciente de pé em apoio unipodálico
musculares que podem realmente ser
mudanças crônicas na função e morfo- e descalço. O dedo indicador da mão
testados2,6-8,12,13,17. O objetivo deste estu-
logia da musculatura afetada5,7,12,15,20. dominante permaneceu apoiado à
do é pois avaliar a reprodutibilidade de
Estudos sobre as alterações crônicas frente na parede com extensão da
dois testes funcionais de MMII em
na histologia e função muscular em interfalangeana distal e semiflexão de
pacientes com DAP: o teste senta-levanta
pacientes com DAP demonstraram cotovelo. O membro inferior de apoio
da cadeira e o teste de ponta do pé.
que, apesar de o diâmetro das fibras ficou em extensão de joelho e o
tipo I e tipo II nos MMII desses pacien- membro contralateral a 45º em flexão
tes ser similar ao de indivíduos sem a
doença, ocorre uma diminuição da
METODOLOGIA de joelho. O membro superior não-
dominante estava ao lado do corpo.
área de fibras tipo II do membro O estudo, do tipo transversal, foi O participante realizou cinco flexões
inferior acometido, sugerindo que realizado no Curso de Fisioterapia do plantares consecutivas o mais rápido
fibras tipo II são as mais afetadas pela Centro Universitário de Belo Horizon- possível até chegar ao ponto de apoio
isquemia do as do tipo I 7,12. Outros te. Todos os participantes assinaram nas articulações metatarso-falangea-
autores relatam que há redução das um termo de consentimento esclare- nas. Durante todo o teste os membros

Fisioter Pesq. 2008;15(3) : 228- 34 229


inferiores não podiam tocar um no nadores não apresentou medidas idade, sexo, etnia e estilo de vida, que
outro. Depois de ter feito o teste com estáveis (0,56, 0,55 e 0,91 para os não apresentassem dor isquêmica em
um membro, o participante repousava examinadores 1, 2 e 3 respectivamen- repouso, gangrena, úlceras, amputações,
por 1 minuto e retornava ao teste com te, apenas o 3 tendo apresentado patologias ortopédicas ou neurológi-
o membro não testado. O examinador p<0,05). cas, nem processos inflamatórios agu-
demonstrava o teste e cronometrava dos que impedissem a realização dos
Durante a realização do teste pilo-
o tempo gasto em segundos para a testes. Os 14 indivíduos foram rando-
to, foi pois observado que a maior
realização das cinco flexões plantares. mizados: metade realizou primeiro o
parte dos participantes apresentou
Foi dado comando verbal somente para teste senta-levanta e depois o teste de
dificuldades no teste de ponta do pé,
determinar o início e o final do teste. ponta do pé e a outra metade realizou
tais como perda de equilíbrio, manu-
os testes na ordem inversa.
tenção do mesmo ângulo entre o solo
Estudo piloto e o ponto de apoio das articulações Os voluntários submeteram-se aos
metatarso-falangeanas durante as cin- dois testes de força muscular nos
Participaram do estudo piloto 12
co flexões plantares. Considerando MMII, por três examinadores, com
indivíduos com DAP bilateral. Destes,
esses problemas, foram realizadas intervalo de no mínimo 1 minuto entre
um voluntário não completou o reteste
adaptações no teste ponta do pé, que eles em ambos os testes, e de no míni-
senta-levanta por apresentar perda
urinária devido a incontinência uri- não alteraram o objetivo principal do mo 15 minutos entre as medidas teste-
nária de esforço. A reprodutibilidade estudo: reteste. Nenhum dos voluntários teve
acesso ao tempo de cronometragem
inter-examinador foi verificada • devido à dificuldade de manu-
avaliando-se três examinadores por dos testes. O teste de sentar e levantar
tenção de equilíbrio em apoio
meio do coeficiente de correlação da cadeira foi realizado da mesma
unipodálico, este passou a ser
intraclasse (CCI) e foi considerada alta maneira como no estudo piloto, já
realizado em apoio bipodálico;
(CCI=0,80 no teste, com p<0,05, e descrito.
0,79 no reteste, com p<0,05). O • o apoio do membro superior, que
O teste de ponta do pé foi realizado
coeficiente de correlação de Pearson era realizado com o dedo indi-
com o paciente de pé e descalço. A
foi utilizado para avaliar a reproduti- cador da mão dominante, passou
mão direita permaneceu apoiada na
bilidade intra-examinador, demons- a ser com a região palmar do
parede à frente, com semiflexão de
trando alto grau de estabilidade das membro superior direito;
cotovelo, para auxílio na manutenção
medidas de cada examinador (0,73, • foi criado um instrumento (des- do equilíbrio. O participante realizou
0,96 e 0,80 para os examinadores 1, 2 crito abaixo) para que o indivíduo uma primeira flexão plantar até o
e 3 respectivamente, todos com alcançasse a mesma altura du- ponto de apoio das articulações
p<0,05). rante as cinco flexões plantares metatarso-falangeanas e a altura que
No teste de ponta do pé com o completas; sua cabeça alcançou foi marcada pelo
membro inferior direito (MID), dois examinador em uma haste de equi-
• o período entre teste e reteste,
indivíduos não conseguiram realizar pamento fixado na parede. Em segui-
que era 48 horas, passou a ser 15
teste-reteste devido à dificuldade de da, o participante realizou cinco
minutos, pois esse período foi
manutenção do equilíbrio. A reprodu- flexões plantares completas e conse-
analisado como suficiente para
tibilidade inter-examinador foi mode- cutivas o mais rápido possível, deven-
o repouso muscular do partici-
rada (CCI=0,57 no teste, com p<0,05, do sempre encostar a cabeça na haste
pante;
e 0,60, no reteste, com p<0,05). A do equipamento. O examinador regis-
correlação de Pearson teste-reteste dos • no estudo piloto, todos os parti- trou o tempo em segundos gasto para
examinadores não apresentou medi- cipantes realizaram primeiro o a realização das cinco flexões plan-
das estáveis entre eles (0,76, 0,70 os teste senta-levanta da cadeira e tares após a demonstração do mesmo
examinadores 1 e 2, com p<0,05, e posteriormente o teste de ponta e realização da primeira vez pelo par-
0,55 para o examinador 3). Com o do pé. Para minimizar os pos- ticipante. Foi dado comando verbal
membro inferior esquerdo (MIE) apoia- síveis erros metodológicos, os para início e final do teste e durante a
do, três indivíduos não completaram indivíduos foram randomizados. realização não foi dada qualquer
o teste e dois o reteste, devido nova- forma de incentivo.
mente à dificuldade de manutenção Coleta de dados
do equilíbrio para realização do movi-
mento de flexão plantar. A repro-
Análise estatística
Após o estudo piloto, para a
dutibilidade inter-examinador no teste avaliação da reprodutibilidade dos A estatística descritiva foi utilizada
foi moderada, enquanto no reteste foi testes, foram incluídos 14 indivíduos para caracterizar a população estuda-
baixa (CCI=0,73 no teste com p<0,05 diferentes do piloto, com DAP con- da. Os dados de tempo em segundos
e 0,42 no reteste com p<0,05). A firmada pelo índice tornozelo-braço para realização dos testes são apre-
correlação teste-reteste dos exami- <0,9 no repouso, independente de sentados como média±desvio padrão.

230 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


2008;15( 3):228-34
Pereira et al. Avaliação de testes na doença arterial

A reprodutibilidade teste-reteste (intra-


18
TSL – Examinador 1 examinador) foi avaliada pela correlação
r = 0,916 de Pearson; e o grau de concordância
16
entre examinadores (inter-examinador)
foi avaliado pelo coeficiente de corre-
Tempo em segundos no reteste

14
lação intraclasse CCI(2,1). Para classificar
12
os resultados como estatisticamente
10 significativos foi estabelecido α≤5%. Foi
8
utilizado o pacote estatístico SPSS
versão 13.0 para análise dos dados.
6

2
RESULTADOS
Participaram do estudo 14 indi-
0
víduos, sendo 5 do sexo feminino e 9
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20
do sexo masculino. A média de idade
Tempo em segundos no teste
dos participantes foi de 60,86±14,47
anos. Entre os 14 participantes, 7 apre-
sentavam acometimento bilateral, 4
TSL – Examinador 2
18 do MIE e 3 do MID.
r = 0,921
16 O teste senta-levanta alcançou alta
Tempo em segundos no reteste

reprodutibilidade inter-examinador,
14
com CCI de 0,904 (p=0,005) no teste
12 e 0,857 no reteste (p=0,005). No teste
10 e no reteste, o tempo mensurado pelo
examinador 1 foi 13,28±2,58 e
8
11,65±2,29 segundos, respectivamen-
6 te; os tempos correspondentes do
4 examinador 2 foram 13,31±2,29 e
11,59±2,10; e, pelo examinador 3, foi
2 de 12,62±2,12 e 11,71±2,14. A repro-
0 dutibilidade teste-reteste apresentou
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 correlações de Pearson superiores a 0,8
Tempo em segundos no teste para os três examinadores (Figura 1).
O teste de ponta do pé também
apresentou reprodutibilidade inter-
TSL – Examinador 3 examinador alta, sendo o CCI 0,824
18
r = 0,844 (p=0,005) no teste e 0,941 (p=0,005)
16 no reteste. O tempo médio em
Tempo em segundos no reteste

14 segundos medido pelo examinador 1


no teste e no reteste foi, respectiva-
12 mente, 5,48±1,55 e 4,85±1,58; pelo
10 examinador 2, 5,51±1,33 e 4,92±1,65;
8
e, pelo terceiro examinador, 5,51±1,64
e 5,13±1,69. A reprodutibilidade do
6 teste de ponta do pé para os três
4 examinadores é ilustrada na Figura 2.
2 A correlação de Pearson entre a
0
média dos três examinadores no teste
senta-levanta da cadeira e a média
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20
Tempo em segundos no teste dos três examinadores no teste ponta
do pé foi 0,651 (p=0,012) no teste e
0,609 (p=0,021) no reteste. A variância
Figura 1 Comparação das mensurações dos três examinadores entre o teste e o compartilhada (r²) foi 0,42 no teste e
reteste do TSL – teste senta-levanta 0,37 no reteste.

Fisioter Pesq. 2008;15(3) : 228- 34 231


10
TPP – Examinador 1
DISCUSSÃO
r = 0,782
9 Os resultados mostraram que o teste
Tempo em segundos no reteste

8 senta-levanta da cadeira e o teste


ponta do pé têm alta reprodutibilidade,
7
tanto intra quanto inter-examinador.
6 Quando comparados esses resultados
5 com os do estudo piloto, pode-se obser-
4 var que a reprodutibilidade do estudo
3 piloto foi menor. Essa diferença pode
estar relacionada ao fato de que os
2
examinadores poderiam ainda não
1 estar devidamente treinados para cro-
0 nometrar o tempo gasto pelo indivíduo
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 na realização de cada teste. Além
Tempo em segundos no teste disso, no teste-reteste de ponta do pé
unipodálico realizado no piloto, com
o MID apoiado no solo, dois indivíduos
não completaram as cinco flexões
TPP – Examinador 2
10 plantares; e, com o MIE apoiado no
r = 0,765
9
solo, três indivíduos não completaram
o teste e dois o reteste. Com esses re-
Tempo em segundos no reteste

8 sultados do piloto, supôs-se que os


7 indivíduos que não conseguiram
6 realizar o teste ponta do pé unipo-
dálico podem ter apresentado deficit
5
de equilíbrio, daí as alterações intro-
4 duzidas no estudo oficial, passando o
3 teste ponta do pé para bipodálico.
Como o objetivo principal do teste não
2
era comparar desempenho dos dois
1 membros inferiores, essa mudança não
0 deveria interferir nos resultados1,3,4,5,12.
0 1 2 3 4 5 6 7 8 Na coleta de dados oficial, dos 14
Tempo em segundos no teste indivíduos com DAP que participaram
do teste-reteste de sentar-e-levantar da
cadeira, apenas um indivíduo relatou
dor, de intensidade leve, no lado es-
TPP – Examinador 3 r = 0,841
10
querdo do tórax; ele permaneceu sen-
tado até o alívio do sintoma relatado,
9
por aproximadamente 3 minutos, não
Tempo em segundos no reteste

8 havendo qualquer intercorrência.


7
O teste ponta do pé pode ter apli-
6 cação clínica direta na área da
5 angiologia, já que avalia a principal
4 musculatura acometida na DAP1,3,4,5,12.
3
Assim, verificar a confiabilidade desse
teste é uma das premissas que devem
2
ser analisadas antes de iniciar a aplicação
1 em uma população. Comparando os
0 dados de reprodutibilidade teste-reteste
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 do teste ponta do pé deste estudo com
Tempo em segundos no teste os da literatura, foram encontrados
resultados semelhantes. Haber et al.22
encontraram alta reprodutibilidade
Figura 2 Comparação das mensurações dos três examinadores entre o teste e o (CCI=0,88) em indivíduos saudáveis.
reteste do TPP – teste de ponta do pé Neste estudo, as correlações variaram

232 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


2008;15( 3):228-34
Pereira et al. Avaliação de testes na doença arterial

de 0,765 a 0,841, dependendo do exa- lidade do teste senta-levanta com da- vado no teste ponta do pé e vice-
minador; porém, em todos a reproduti- dos da literatura, também se encontram versa. Esses resultados justificam a
bilidade se manteve acima de 0,76, resultados semelhantes, com achados avaliação específica da força mus-
mesmo tendo os voluntários alteração de alta reprodutibilidade (correlações cular em portadores de DAP quando
de circulação periférica para a mus- teste-reteste e inter-examinador acima membros inferiores são considerados,
culatura do tríceps sural. de 0,8) em várias populações 23-25 . uma vez que o desempenho desses
Pode-se afirmar que o teste senta- membros pode estar comprometido de
Ainda quanto ao teste de ponta do levanta demonstrou-se confiável forma distinta.
pé, a reprodutibilidade inter-examinador também na avaliação de indivíduos
do reteste (CCI=0,94) em relação ao com DAP.
teste (CCI=0,82) apresentou maior
valor. Isso pode ser explicado pelo fato Foi calculada a correlação entre o
CONCLUSÃO
de, no momento do teste, o indivíduo teste senta-levanta da cadeira e o tes- Após a aplicação dos testes senta-
ter apresentado insegurança ou incô- te ponta do pé, pelas médias dos levanta da cadeira e de ponta do pé,
modo com a presença da haste sobre examinadores em ambos os testes, pode-se concluir que ambos são repro-
a cabeça, levando maior tempo para com o objetivo de contrastar o grau dutíveis e viáveis na prática clínica
realizar as cinco flexões plantares de associação entre os dois testes. na avaliação da força muscular dos
completas; e, no momento do reteste, Com o resultado, foi possível observar MMII em portadores de DAP, uma vez
o indivíduo já estaria familiarizado que há associação significante e mo- que os testes avaliam musculaturas dis-
com a atividade a ser realizada. Pode- derada (r>0,6, p<0,05) entre essas tintas. Embora tais testes tenham de-
se excluir a hipótese de que no reteste medidas e que elas medem aspectos monstrado ser confiáveis, ainda é
os examinadores estariam mais treina- semelhantes do desempenho relativo necessário avaliar se são sensíveis a
dos com a cronometragem do tempo à força muscular dos membros inferio- alterações que porventura venham a
gasto em relação ao teste, pois, se isso res nessa população. Entretanto, ao se ocorrer durante o processo natural de
observar a variância compartilhada evolução da patologia, ou se podem
fosse verdadeiro, algo semelhante teria
entre essas duas medidas (r²=0,42 no ser instrumentos viáveis para avalia-
ocorrido com o teste senta-levanta
teste, r²=0,37 no reteste), pode-se ção e acompanhamento do tratamento
(CCI=0,857), o que não ocorreu.
dizer que cerca de 60% do desempe- oferecido a esses pacientes. Portanto,
Quando se comparam os resultados nho no teste senta-levanta não pode futuros estudos são necessários para
obtidos neste estudo da reprodutibi- ser explicado pelo desempenho obser- responder tais questões.

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234 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.235-9, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Efeitos da fisioterapia respiratória sobre a pressão arterial em


recém-nascidos pré-termo
Effects of chest physiotherapy on blood pressure in preterm newborns
Carla Marques Nicolau1, Mário Cícero Falcão2

Estudo desenvolvido no Depto. R ESUMO : Oscilações na pressão arterial (PA) sistêmica são diretamente
de Pediatria da FMUSP – proporcionais às oscilações do fluxo sangüíneo cerebral nos prematuros, mas
Faculdade de Medicina da são escassos os estudos acerca do efeito dos procedimentos fisioterapêuticos
Universidade de São Paulo, São sobre a PA. Este estudo investigou a repercussão desses procedimentos e da
Paulo, SP, Brasil aspiração endotraqueal na pressão arterial em recém-nascidos pré-termo (RNPT)
1 na primeira semana de vida. Foram estudados 42 RNPT com peso de nascimento
Fisioterapeuta Ms. do Instituto menor que 1.500 gramas em ventilação mecânica. A PA foi mensurada em
da Criança do Hospital das três momentos: antes da fisioterapia (A), imediatamente após os procedimentos
Clínicas da FMUSP
fisioterapêuticos (B) e imediatamente após a aspiração endotraqueal (C). Os
2
Prof. Dr. Colaborador de dados coletados foram analisados estatisticamente, com nível de signficância
Neonatologia no Depto. de fixado em p<0,05. Os 42 RNPT tinham idade gestacional média de 29,58±2,16
Pediatria da FMUSP semanas e peso médio ao nascer 1012,68±274,16 g, com predominância do
sexo feminino (57,1%) e da doença das membranas hialinas (90,4%). As médias
ENDEREÇO PARA das variáveis estudadas, respectivamente pressão arterial sistólica, diastólica
CORRESPONDÊNCIA e (média), em mmHg, foram: momento A, 71,32 x 40,56 (53,04); momento B,
69,93 x 39,41 (51,98); e momento C, 74,29 x 43,75 (54,82). A PA dos recém-
Carla M. Nicolau nascidos permaneceu dentro dos valores fisiológicos após os procedimentos
R. Fidalga 764 Vila Madalena fisioterapêuticos e de aspiração, portanto as intervenções fisioterapêuticas
05432-000 São Paulo SP realizadas não podem ser consideradas prejudiciais para os RNPT; a aspiração
e-mail: endotraqueal teve maior influência nas oscilações da PA.
carla.nicolau@icr.usp.br
DESCRITORES: Modalidades de fisioterapia; Monitoramento; Prematuro; Pressão
arterial; Terapia intensiva neonatal

ABSTRACT: Blood pressure (BP) oscillations in premature newborns are directly


related to cerebral blood flow, but few studies assess the effects of standard
physical therapy procedures on their BP. The aim of this study was to analyse
the effects of respiratory physiotherapy and endotracheal suctioning on
premature newborn BP during the first week of life. Forty-two preterm newborns
with mean birth weight of 101.68±274.16 g, mean gestational age 29.58±2.16
weeks, and receiving mechanical ventilation were studied; they were mostly
female (57.1%) and presented hyaline membrane disease (90.4%). BP
measurements were carried out at three moments: before (A) and after
physiotherapy (B), and after endotracheal suctioning (C). Data were statistically
analysed and significance level set at p<0.05. Mean values found for systolic,
diastolic, and (average) BP in mmHg were: moment A, 71.32 x 40.56 (53.04);
moment B, 69.93 x 39.41 (51.98); and moment C, 74.29 x 43.75 (54.82).
Newborn BP thus remained within physiological values both after physiotherapy
procedures and suctioning, hence these may be said to be harmless;
APRESENTAÇÃO endotracheal suctioning had a higher influence on premature newborn BP
nov. 2007 oscillations.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Blood pressure; Infant, premature; Intensive care, neonatal;
ago. 2008 Monitoring; Physical therapy modalities

Fisioter Pesq. 2008;15(3):235-9 235


INTRODUÇÃO postos às variações da pressão arterial
sistêmica, o que aumenta as chances
submetidos à ventilação mecânica na
primeira semana de vida.
A melhoria da assistência pré-natal, de sangramento na tênue rede capilar
métodos mais eficazes de monitorar da matriz germinativa5,6.
as condições fetais, além dos avanços
As oscilações na pressão sangüínea
METODOLOGIA
da nutrição, da ventilação mecânica
arterial são muito freqüentes e estão O estudo do tipo transversal foi
e da terapêutica com o surfactante
relacionadas à manipulação excessi- conduzido de forma prospectiva, no
exógeno vêm contribuindo para o
va do RN, cuidados básicos concomi- Berçário Anexo à Maternidade do
aumento das taxas de sobrevida entre
tantes com inadvertidos estímulos Hospital das Clínicas da FMUSP. Os
os recém-nascidos com peso de nasci-
nocivos, aspiração de secreções e ou- recém-nascidos pré-termo (idade
mento e idades gestacionais cada vez
tros procedimentos médicos, de enfer- gestacional inferior a 37 semanas)
menores1. Como conseqüência, conco-
magem e de fisioterapia. foram incluídos após o consentimento
mitantemente, houve um crescimento
da ocorrência de seqüelas e disfunções As manobras específicas de fisiote- dos pais. Este estudo foi aprovado pela
na evolução desses recém-nascidos rapia respiratória e a aspiração endo- Comissão de Ética para Análise de
(RN), gerando preocupações com a traqueal são procedimentos realizados Projetos de Pesquisa da instituição.
qualidade de vida e o desenvolvimento rotineiramente nas unidades neonatais Foram incluídos 42 RNPT de ambos
dos recém-nascidos pré-termo (RNPT). em recém-nascidos submetidos à ven- os sexos com peso de nascimento me-
tilação mecânica com o objetivo de nor que 1.500 gramas que estavam em
Uma das principais características
prevenir e/ou tratar complicações pul- ventilação mecânica durante a primeira
do RNPT é a instabilidade dos sistemas
monares; entretanto, são escassos os semana de vida. Foram excluídos os
de controle hormonal e neurogênico.
Dependendo de sua idade gestacional, estudos que comparam os efeitos recém-nascidos portadores de malfor-
peso de nascimento e dos fatores que fisiológicos dos procedimentos fisiote- mações congênitas graves, com sín-
atuaram durante sua vida intra-uterina, rapêuticos e de aspiração endo- dromes genéticas, além das situações
esses RN podem apresentar maior risco traqueal nessa população específica7,8. clínicas em que a fisioterapia respi-
de distúrbios durante o período neona- A determinação da pressão arterial ratória era contra-indicada (pneumotó-
tal e seqüelas que poderão comprome- é indispensável e deve ser realizada rax não drenado, hipertensão pulmo-
ter seu desenvolvimento2,3. Dentre as freqüentemente nos RNPT sob cuida- nar, persistência de canal arterial e
complicações neonatais apontadas dos intensivos, já que as oscilações coagulopatias).
como possíveis fatores de risco, citam- na pressão arterial sistêmica são O estudo foi desenvolvido no
se a asfixia perinatal, as infecções, o diretamente proporcionais às oscila- período de fevereiro de 2003 a setem-
uso de ventilação mecânica e a hemor- ções do fluxo sangüíneo cerebral nos bro de 2004, preenchendo-se um for-
ragia peri-intraventricular. prematuros, pela falha do mecanismo mulário para cada recém-nascido
As lesões cerebrais no RNPT são de auto-regulação, e estão significa- incluído, por meio da consulta de seus
múltiplas, e a hemorragia peri- tivamente associadas ao desenvolvi- prontuários, sendo coletadas as seguin-
intraventricular (HPIV) permanece mento da HPIV9. tes informações: data de nascimento,
como a lesão mais descrita e conhe- Um programa de tratamento fisiote- tipo de parto, sexo, idade gestacional
cida, principalmente a da matriz ger- rapêutico bem elaborado, respeitando (em semanas), peso de nascimento (em
minativa, podendo evoluir, nos casos a fisiologia e fisiopatologias do RNPT gramas), Boletim de Apgar de 1o , 5o o
mais graves, para sangramento para de alto risco, pode prevenir alguns dos e 10o o minutos de vida, escore Crib
dentro do sistema ventricular adjacen- fatores que contribuem para o sangra- (Clinical Risk Index for Babies) e os
te ou para a substância branca peri- mento, uma vez que reduz os epi- diagnósticos clínicos, com ênfase nas
ventricular. O risco de ocorrência sódios de hipoxemia causadas pelo afecções respiratórias.
dessas morbidades é inversamente acúmulo de secreção e suas complica-
relacionado com o peso de nasci- Os valores da pressão arterial
ções, bem como reduz o tempo de sistêmica foram determinados pela
mento e a idade gestacional4. ventilação mecânica. medida de pressão arterial não-
É bem conhecido o fato de que a Por outro lado, a utilização de invasiva – método oscilométrico com
HPIV ocorre com maior freqüência nas manguito próprio – pelo sistema de
técnicas fisioterapêuticas inadequadas
primeiras 72 horas de vida nos RNPT monitorização de sinais vitais DX
e sua conseqüente influência na esta-
com peso de nascimento inferior a 2010–LCD (Dixtal Biomédica).
bilidade clínica geral e nas flutuações
1.500 gramas. Várias alterações na
do fluxo sangüíneo cerebral podem Os procedimentos utilizados com-
matriz germinativa podem determinar
aumentar a vulnerabilidade do RNPT preenderam a associação entre os pro-
a origem dos processos hemorrágicos.
à HIPV. cedimentos fisioterapêuticos específicos
Uma das alterações mais estudadas são
as do fluxo sangüíneo cerebral – flutua- O objetivo deste estudo foi avaliar – como o posicionamento em decúbitos
ção, aumento e diminuição –, uma vez a influência da fisioterapia respiratória lateral direito e esquerdo, a vibração
que os RNPT apresentam falha na auto- e da aspiração endotraqueal sobre a manual, os exercícios de mecânica
regulação, ficando passivamente ex- pressão arterial sistêmica em RNPT respiratória de apoio diafragmático –

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Nicolau & Falcão Fisioterapia em recém-nascidos pré-termo

e o procedimento de aspiração endo- Tabela 1 Características da população estudada (n=42)


traqueal. Segundo a normatização da
instituição, precedeu ao procedimento Idade gestacional (semanas) 29,58±2,16
de aspiração o aumento da fração Peso de nascimento (gramas) 1012,68±274,16
inspirada de oxigênio em 10%. Sexo n(%)
Os valores da pressão arterial foram Feminino 24 (57,1%)
registrados antes do início de cada Masculino 18 (42,9%)
sessão de fisioterapia (momento A). Os Adequação nutricional n(%)
RNPT receberam os procedimentos Adequado para a idade gestacional 33 (78,5%)
fisioterapêuticos por um período máxi- Pequeno para a idade gestacional 9 (21,5%)
mo de 10 minutos. As mesmas variáveis
Apgar 5º minuto <5 n(%) 3 (7,1%)
foram novamente mensuradas imedia-
tamente após os procedimentos fisio- Afecção respiratória n(%)
terapêuticos (momento B) e após o Doença das membranas hialinas 38 (90,4%)
procedimento de aspiração endo- Síndrome do pulmão úmido 4 (9,6%)
traqueal (momento C). Em cada Uso de surfactante exógeno n(%) 37 (88%)
recém-nascido estudado foram efetua- Modo ventilatório n(%)
das seis sessões de fisioterapia, duas Ventilação mandatória intermitente 42 (100%)
vezes ao dia. As variáveis estudadas
foram controladas nas seis sessões de
fisioterapia. A coleta de dados foi Tabela 2 Médias ± desvio padrão da pressão arterial sistêmica da população
realizada entre o 3o e o 7o dia de vida, estudada, segundo o momento avaliado
que compreende o período mais crítico Momento
da evolução dos RNPT, justificando a Pressão (mmHg)
Antes (A) Pós-fisioterapia (B) Pós-aspiração (C)
escolha da primeira semana de vida
PAS 71,32r12,07 69,93r10,51 74,29r12,85
como critério de inclusão.
PAD 40,56r12,54 39,41r10,37 43,75r11,18
O tamanho da amostra foi calcula-
PAM 53,04r11,73 51,98r9,58 54,82r11,32
do considerando-se detectar uma
diferença de aproximadamente 10% PAS = pressão arterial sistólica; PAD = pressão arterial diastólica; PAM = pressão arterial média
nas médias da pressão arterial sistê-
mica (sistólica, diastólica e média). A variação das médias dos parâme- feminino e masculino; também não
Para um alfa de 5% e um poder de tros estudados (pressão arterial sistó- foram observadas diferenças estatistica-
teste de 80%, o n calculado foi de 40 lica, diastólica e média) de acordo mente significantes conforme a idade
recém-nascidos. com o momento analisado são apre- gestacional nem o peso de nascimento.
sentadas na Tabela 2. A variação das médias das pressões
Inicialmente, os dados foram subme-
tidos à análise descritiva, avaliando- As análises da pressão arterial sistê- sistólica, diastólica e média, segundo a
se a distribuição de cada variável mica não mostraram variação signifi- idade gestacional e o momento estuda-
estudada. Os dados nominais foram cante na comparação entre os sexos do, é apresentada nos Gráficos 1 a 3.
descritos em termos de porcentagens
e proporções. A comparação de cada 100
Fig 1: Médias da pressão arterial sistólica, de acordo com a idade gestacional.
variável estudada de acordo com o 90
86,83
momento avaliado e a evolução entre 80 77,57
75,22 75,33
as sessões foi feita pelo teste de medi- 70 71,47
68,73
72,13
68,63
das repetidas Anova one-way para a
PAS (mmHg)

60
análise de variância. Os resultados 50
foram considerados estatisticamente 40
significantes quando os valores de p 30
eram <0,05. Os dados foram processa-
20
dos no programa Sigma Stat10.
10
0

RESULTADOS 25 27 28 29 30
Idade gestacional (semanas)
31 32 33

Em cada recém-nascido foram avalia-


A B C
das seis sessões de fisioterapia, totali-
zando 252 sessões. As características
da população estudada estão ilustra- Gráfico 1 Médias da pressão arterial sistólica nos três momentos avaliados,
das na Tabela 1. segundo a idade gestacional

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :235-9 237


60 Os valores normais da pressão
arterial sistêmica se modificam con-
50 Fig 2: Médias da pressão arterial diastólica de acordo com a idade gestacional.
47,27 47,61 46,58 forme a faixa etária; no caso dos
42,76 41,43 42,9 42,54
40 41,33 recém-nascidos, considera-se a faixa
PAD (mmHg)

de normalidade da pressão arterial sis-


30
tólica os valores entre 50 e 80 mmHg,
20 da pressão arterial diastólica entre 30
e 45 mmHg e, da pressão arterial
10
média, entre 50 e 65 mmHg13,14,15.
0
Os resultados mostram que os va-
25 27 28 29 30 31 32 33
lores pressóricos médios permanece-
Idade gestacional (semanas)
ram dentro dos intervalos dos valores
A B C considerados fisiológicos, não alcan-
çando significância estatística na com-
Gráfico 2 Médias da pressão arterial diastólica nos três momentos avaliados, paração entre os momentos antes (A)
segundo a idade gestacional e imediatamente após a fisioterapia
(B). Esses resultados mostram que as
70
intervenções fisioterapêuticas realiza-
64,5
60 Fig 3: Médias da pressão arterial média de acordo com a idade gestacional.
57,73
das não podem ser consideradas preju-
56,72 57
53,14 51,5 53,07 52,8 diciais para os RNPT, podendo-se
50
deduzir que os procedimentos fisiote-
PAM (mmHg)

40 rapêuticos estudados não exerceram


30 influência sobre a hemodinâmica
cerebral e, portanto, não contribuíram
20
para a ocorrência de eventos hemor-
10 rágicos.
0 Também não foram observadas
25 27 28 29 30 31 32 33 diferenças estatisticamente significan-
Idade gestacional (semanas) tes na comparação entre os momentos
A B C
antes (A) e imediatamente após a
aspiração endotraqueal (C); apesar
Gráfico 3 Médias da pressão arterial média nos três momentos avaliados, disso, verificou-se oscilação maior dos
segundo a idade gestacional valores pressóricos com a aspiração
endotraqueal, com aumentos médios
de mais de 2 mmHg nas pressões
DISCUSSÃO E Inúmeros fatores intra- e extravas-
culares podem concorrer para o sangra-
sistólica e média e aumento de mais
3 mmHg na pressão arterial diastólica.
CONCLUSÃO mento ou o aumento deste, dentre os
Gronlund et al. 16 sugerem que
quais, as convulsões, os episódios de
O contínuo desenvolvimento da apnéia e hipoxemia, a persistência do aumentos nas pressões sistólica, dias-
fisioterapia neonatal no Brasil, como canal arterial, a ventilação mecânica tólica e média estão significativamente
vem ocorrendo em centros mais desen- e, possivelmente, certos procedimen- associados ao desenvolvimento da
volvidos, tem otimizado a utilização tos, como a aspiração traqueal e a HPIV em recém-nascidos pré-termo.
fisioterapia respiratória5,11. Tsuji et al.17 mostraram como o aumen-
de recursos terapêuticos e de padrões
to da pressão arterial média estava
de eficiência no tratamento intensivo, Foram selecionados como parâme- associado às variações da oxigenação
colaborando para a redução do tempo tros estudados os valores da pressão intravascular cerebral em prematuros
de hospitalização, dos custos e da arterial sistólica, diastólica e média criticamente doentes.
morbidade dos recém-nascidos em por serem representativos das oscilações
terapia intensiva. do fluxo sangüíneo cerebral nos pre- Estes resultados permitem dizer que
maturos, pela deficiência do mecanis- o procedimento de aspiração endo-
A assistência fisioterapêutica ao mo de auto-regulação, significativa- traqueal e/ou de vias aéreas superiores
recém-nascido apresenta característi- mente associadas ao desenvolvimento da provoca oscilações significantes em
cas próprias referentes ao peso, à ima- HPIV. Nesse sentido, a mensuração da todas as variáveis da pressão arterial,
turidade e às doenças prevalentes pressão sangüínea faz-se imprescindível, ratificando que esse procedimento
nessa população. Essas particularida- para verificar a influência dos procedi- deve ser empregado somente quando
des envolvem dificuldades que exi- mentos fisioterapêuticos aqui utilizados estritamente necessário e não deve
gem cuidados especiais no que diz e do procedimento de aspiração, sobre fazer parte rotineira do atendimento
respeito aos recursos fisioterapêuticos. o fluxo sangüíneo cerebral9,12. fisioterapêutico.

238 Fisioter Pesq. 2008;15(


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Nicolau & Falcão Fisioterapia em recém-nascidos pré-termo

Resultados semelhantes são relata- aéreas proximais pelo catéter de aspi- auto-regulação do fluxo sangüíneo.
dos por Perlman e Volpe18, Shah et al.19 ração. A ativação dos primeiros resul-
Concluindo-se, na população estu-
e Segar et al.20, admitindo que os efei- taria em vasoconstrição periférica e dada, a pressão arterial sistêmica (sis-
tos cardiovasculares da aspiração en- aumento da pressão arterial, enquanto tólica, diastólica e média) perma-
dotraqueal não sejam somente uma as bradiarritmias seriam decorrentes neceu dentro de valores fisiológicos
resposta fisiológica à hipoxemia. As da estimulação do sistema parassim- após os procedimentos fisioterapêu-
alterações da pressão arterial e do pático. Essas respostas são críticas no ticos e de aspiração endotraqueal. O
ritmo cardíaco parecem ser medidas período neonatal, em particular nos procedimento de aspiração teve maior
pelo sistema nervoso autônomo pela RNPT, já que nesses pacientes a irri- influência nas oscilações da pressão
estimulação dos receptores simpáticos gação do cérebro torna-se “pressão arterial sistêmica do que os procedi-
e parassimpáticos localizados nas vias passiva” em conseqüência da falta de mentos fisioterapêuticos.

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Fisioter Pesq. 2008;15(3) :235-9 239


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.240-7, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Há correlação entre o nível de atividade auto-referido e desempenho físico


observado em mulheres idosas?
Is there a correlation between self-reported level of activity and observed physical
performance in elderly women?
Renata Marinho Pereira1, Silvio Lopes Alabarse2, Renata Cereda Cordeiro3

Estudo desenvolvido no Depto. RESUMO: Este estudo visou verificar se havia associação entre o nível de atividade
de Medicina Preventiva da físico-funcional auto-referido e o desempenho físico de idosas em centro de
EPM/Unifesp – Escola Paulista reabilitação. Foram selecionadas 37 mulheres idosas (com em média 72,7±5,9
de Medicina da Universidade anos) pelas fichas de admissão em serviço de atividade física de um centro de
Federal de São Paulo, São referência em reabilitação. Para a avaliação do nível de atividade física auto-
Paulo, SP, Brasil referido empregou-se o Perfil de Atividade Humana (PAH); na observação direta
1 de desempenho físico aplicaram-se os testes de caminhada em 6 minutos (TC6’)
Fisioterapeuta especializada e levantar da cadeira em 30 segundos (TSL30”). Foi encontrada correlação
em Reabilitação Gerontológica
positiva fraca (r=0,41) e estatisticamente significante (p=0,01) entre os valores
2
Educador físico Ms. do PAH e o TC6’; e uma tendência de associação entre a classificação do
nível de atividade e a variável categórica TC6’ (p=0,08). Também foi encontrada
3
Fisioterapeuta Ms. correlação positiva fraca (r=0,36) e estatisticamente significante (p=0,02) entre
Coordenadora do Setor de o PAH e o TSL30”. Pode-se afirmar que o auto-relato de nível de atividade
Reabilitação Gerontológica do física das idosas estudadas correlaciona-se, porém fracamente, ao desempenho
Lar Escola São Francisco, físico observado. Sugerem-se novas pesquisas com amostras representativas
vinculado à EPM/Unifesp da população idosa em uma comunidade, não apenas de pacientes de centro
de reabilitação, para averiguar possíveis tendências à subestimação ou
ENDEREÇO PARA superestimação do nível de atividade física em avaliações auto-referidas.
CORRESPONDÊNCIA
DESCRITORES: Análise e desempenho de tarefas; Atividades cotidianas; Idoso;
Renata M. Pereira Mulheres
R. Paula Ney 705 ap.1001
Aldeota ABSTRACT: The aim of the study was to verify the degree of association between
60140-200 Fortaleza CE self-reported level of physical activity and observed physical performance of
e-mail: aged women. Thirty-seven women (mean aged 72.7±5.99 years old) were
renatafisio2005@yahoo.com.br selected by looking up admission records in a reference centre for physical
rehabilitation. The Human Activity Profile (HAP) was used to measure activity
APRESENTAÇÃO level; and, for direct observation of physical performance, the six-minute walk
nov. 2007 test (6MWT) and the 30-second chair-stand test were applied. A statistically
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO significant (p=0.01), weak positive correlation (r=0.41) was found between
ago. 2008 HAP scores and 6MWT values; and an association trend was noticed between
the classification of activity level and the 6MWT variable (p=0.08). Also, a
significant (p=0.02), weak positive correlation (r=0.36) was found between
HAP scores and results of the 30-second chair stand test. It may be said there
is a correlation, though weak, between self-reported and observed levels of
physical performance among the elderly here studied. Further research should
address aged community dwellers – not only rehabilitation patients – in order
to assess a possible under or overestimation of the physical activity level in
self-reported evaluations.
KEY WORDS: Activities of daily living; Aged; Task performance and analysis;
Women

240 Fisioter Pesq. 2008;15(3):240-7


2008;15(3)
Pereira et al. Atividade e desempenho físico de idosas

INTRODUÇÃO dade de trabalho e de engajamento


em uma diversidade de tarefas mo-
METODOLOGIA
O crescimento da população de toras. Muitos indivíduos sedentários Este é um estudo do tipo descritivo,
idosos é um fenômeno mundial e está entre 65 e 85 anos, período em que exploratório, de corte transversal. Para
ocorrendo a um nível sem preceden- ocorrem perdas mais severas, podem localização das participantes, foram
tes. Considerando a continuidade das atingir níveis críticos de consumo má- levantadas as fichas de avaliação de
tendências das taxas de fecundidade ximo de oxigênio, inviabilizando a pacientes encaminhados para o Setor
e longevidade da população brasileira, autonomia motora. Em síntese, a de Atividade Física Adaptada do Cen-
as estimativas para os próximos 20 diminuição do VO2máx no decorrer do tro de Reabilitação Lar Escola São
anos indicam que a população idosa envelhecimento advém da diminuição Francisco, vinculado à Unifesp.
poderá exceder 30 milhões de pessoas, da freqüência cardíaca máxima, da Foram incluídas no estudo mulheres
chegando a representar quase 13% da massa muscular, da capacidade de com idade igual ou maior de 60 anos,
população1. redirecionamento do fluxo sangüíneo admitidas no serviço no período de
e da capacidade dos músculos de maio de 2006 a janeiro de 2007, so-
O envelhecimento é conceituado
utilizar o oxigênio8. O consumo de oxi- mando um total de 37 idosas. A
como um processo dinâmico e pro-
gênio reflete-se na habilidade de idosos amostra foi pois não-probabilística,
gressivo, em que ocorrem alterações
saudáveis em realizar atividades da vi- consecutiva, respeitando-se a ordem
morfológicas e bioquímicas no orga-
da diária, como transferências da cama de chegada ao serviço. Os indivíduos
nismo, tornando-o mais suscetível às
para a cadeira, ir ao banheiro, vestir- do sexo masculino foram excluídos
agressões intrínsecas e extrínsecas que
se, tomar banho, preparar refeições e por sua ínfima ocorrência na amostra
culminam na morte2. As alterações es-
caminhar 9. Assim, a manutenção da (três). Essa decisão tem por funda-
truturais e funcionais, embora variem
capacidade aeróbica é o maior con- mento os achados de Bennell et al.15,
individualmente, são encontradas em
tribuinte para a manutenção da inde- de que mulheres com osteoartrite
todos os idosos e próprias do processo de
pendência funcional em idosos10. (OA) de joelhos tenderam a menores
envelhecimento normal3. O envelheci-
mento biológico resulta em inevitável escores no Perfil de Atividade Huma-
Define-se capacidade funcional
na (PAH) que os homens (cujos escores
diminuição da capacidade fisiológica. (CF) como “o grau de preservação da
entre aqueles com e sem a doença não
O declínio dos principais sistemas do habilidade em executar, de forma
diferiram significantemente, ao con-
organismo (cardiovascular, metabólico, autônoma e independente, as ativida-
trário das mulheres). Sabendo-se ser o
respiratório e neuromuscular) contribui des básicas de vida diária (de auto-
PAH menos sensível em homens do que
para fraqueza, fadiga e movimentos mais cuidado) e instrumentais de vida diária em mulheres e discriminativo em
lentos, tidos como os principais marca- (mais complexas, auxiliares), depen- relação ao sexo16, isso implicaria con-
dores do envelhecimento4. A proporção dentes de habilidades físicas e trole dessa variável e o número exíguo
de massa muscular no adulto jovem, mentais”11. CF surge então como um de homens não permitiria conduzir
que chega a 19%, cai para 12% no novo conceito ou paradigma de saúde, análise estatística.
idoso. A sarcopenia (perda de massa marcado pelo fato de o declínio
muscular ligada ao envelhecimento) funcional constituir forte preditor de Todos os dados utilizados neste
é associada a níveis restritos de ati- mortalidade entre idosos12,13. Conside- estudo foram extraídos da avaliação
vidade, redução do metabolismo basal rando-se a relevância da avaliação da de triagem que separaria os partici-
e da força muscular5. Esta atinge mais CF, fundamentada nos conceitos de pantes para ingresso nos seus respecti-
precocemente seu auge nas mulheres, funcionalidade e saúde introduzidos vos grupos de atendimento (iniciante,
em quem a perda de força também se pela Organização Mundial de Saúde, intermediário e avançado), planejados
inicia antes da dos homens. Apesar têm sido criados instrumentos padroni- de acordo com as habilidades físicas
dessas diferenças, o decréscimo da for- de cada grupo. Todas as pacientes
zados e psicometricamente rigorosos
ça muscular, ao longo do envelheci- encontravam-se pois em fase de
para descrever adequadamente a ca-
mento, parece ser equivalente para “reabilitação preventiva”. Foram
pacidade funcional de populações
ambos os sexos6. utilizadas apenas informações coleta-
específicas de idosos (em hospitais,
das em prontuários, todas obtidas
A capacidade de pessoas idosas de instituições de longa permanência,
previamente por avaliadores fisiote-
realizar atividades aeróbicas, como comunidade, ambulatórios) 14 . Um
rapeutas treinados para a aplicação dos
andar e correr, é adversamente afeta- desses instrumentos é o Perfil de Ativi- testes de desempenho e dos questio-
da pelo declínio do consumo máximo dade Humana (PAH)14, de auto-relato nários. Além dos dados destes últimos,
de oxigênio (VO2máx.), de cerca de 0,5 das atividades físicas. O objetivo deste foram coletados dados de identifica-
a 1,0% ao ano. Em indivíduos sau- trabalho foi verificar em que medida ção e clínicos de doenças auto-
dáveis e sedentários, o VO2máx diminui o nível de atividade físico-funcional referidas: dor no peito, dor no corpo
1,3 l/min nas mulheres e 2,0 l/min em auto-referido no PAH se relaciona com inteiro, dor na coluna, reumatismos,
homens dos 25 aos 85 anos7. A regres- o desempenho físico de idosas nos diabetes, hipertensão, dislipidemia,
são do VO2máx ao longo da vida corres- testes de caminhada de 6 minutos e de obesidade, quedas, fraqueza, proble-
ponde à perda progressiva da capaci- levantar da cadeira em 30 segundos. mas de visão e de audição.

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :240-7 241


Perfil de Atividade Humana (PAH) prognóstico de morbidade e mortali-
dade19. Esse protocolo analisa a via de
ração quase imediata de energia.
Assim, esse teste de campo prático é
O PAH é um questionário utilizado transferência de energia predominan- destinado a avaliar a capacidade de
na avaliação do nível funcional e de temente aeróbica, pois considera-se o transferência dessa energia imediata24.
atividade física, tanto para indivíduos sistema aeróbico como de longo prazo
A paciente avaliada sentava-se
saudáveis, em qualquer faixa etária, e baixa intensidade, em que o consu-
com a coluna reta, os pés apoiados
quanto para aqueles com algum grau mo de oxigênio aumenta exponencial-
no chão e os braços cruzados contra o
de disfunção14. É composto de 94 itens, mente durante os primeiros minutos do
tórax em uma cadeira sem braços, que
de atividades rotineiras de variados exercício para atingir um platô entre
devia estar encostada em uma parede.
níveis funcionais, ordenados de acordo o terceiro e o quarto minutos em ativi-
Após o sinal do avaliador, a paciente
com o custo energético: os de menor dade física estável20.
devia levantar-se, ficando totalmente
numeração demandam menor gasto Este teste foi aplicado em um cor- de pé, retornando em seguida à posi-
energético, os de numeração mais redor onde eram marcados 15 metros ção sentada e repetindo o movimento.
alta, maior gasto energético. Para de comprimento, delimitados por dois Todas eram encorajadas a levantar-se
cada item, há três respostas possíveis: cones, com placas fixas na parede a completamente o maior número pos-
“ainda faço”, “parei de fazer”, ou cada metro. Explicava-se às pacientes sível de vezes durante 30 segundos23.
“nunca fiz”, sendo que esta última não que o objetivo do teste era verificar o
é computada em qualquer escore ou máximo que elas poderiam andar Jones et al. 23 calcularam a média
classificação. A ampla variação dos es- durante 6 minutos. Elas então eram de repetições de acordo com a faixa
cores, contemplando atividades das instruídas a caminhar na área demar- etária e com o nível de atividade física
mais básicas às mais avançadas em ter- cada, no próprio passo, tentando andar dos pacientes. Estratificaram sua amos-
mos de aptidão física, é uma caracte- o máximo possível19. A cada minuto o tra da seguinte forma: de 60 a 69 anos,
rística que evita efeitos chão-e-teto17. avaliador encorajava as participantes a média foi de 14±2,4 repetições; de
Para pontuação, é obtido o escore má- com frases como: “você está indo 70 a 79 anos foi de 12,9±3,0; e de 80
ximo de atividade (EMA), represen- bem” ou “continue assim, bom traba- a 89 anos, de 11,9±3,6. Os pacientes
tado pela atividade de maior consumo lho”21, somente observando-as, sem mais ativos apresentaram média de
de oxigênio que o indivíduo ainda caminhar ao lado das avaliadas para 13,3 ± 2,8 e os menos ativos média
realiza 18. Em seguida, calcula-se o não haver influência na realização do de 10,8±3,6 repetições.
escore ajustado de atividade (EAA), teste. O tempo era marcado com um
subtraindo-se do último item cuja
resposta é “ainda faço” o número de
cronômetro pelo avaliador que anota- Análise estatística
va o número de voltas e ao final
atividades que ele parou de fazer, calculava a distância caminhada. As variáveis categóricas foram des-
anteriores ao item que o indivíduo ain- critas em freqüências absolutas e rela-
da faz14 (assim, o escore máximo seria Para encontrar o valor predito para tivas; as quantitativas de distribuição
94, ou seja, atividade física máxima, cada paciente, foi utilizada a equação normal foram descritas por média e
e o mínimo, zero). O EMA é conside- de referência para o TC6’ para desvio padrão, enquanto as de dis-
rado uma medida do nível de ativida- mulheres22: distância predita = (2,11 x tribuição assimétrica, como mediana
de física, enquanto EAA, uma medida alturacm) – (2,29 x pesokg) – (5,78 x e intervalo interquartil. O teste de
de funcionalidade física18. O EAA for- idade) + 667m. De acordo com Enright Kolmogorov-Smirnov foi utilizado
nece uma estimativa mais precisa das et al.21, foi considerada nota de corte para verificar a de normalidade de
atividades diárias, pois representa o o limite mais baixo de normalidade, variáveis quantitativas25. A análise de
nível médio de equivalente metabóli- que é de aproximadamente 75% do correlação linear (com IC=95%) foi
co gasto em um dia típico. A classifi- valor predito. efetuada utilizando-se o coeficiente de
cação é obtida pelo número do EAA, correlação de Pearson26. Correlações
sendo o sujeito considerado ativo Teste de levantar abaixo de 0,3 foram consideradas
(EAA>74), moderadamente ativo inexistentes; entre 0,3 e 0,5, fracas;
(53≤EAA≤74) ou prejudicado (EAA<53)14. da cadeira em 30 segundos entre 0,5 e 0,7, moderadas; e, acima
de 0,7, correlações fortes. Intervalos de
Esse teste é uma alternativa prática
Teste da caminhada para medir indiretamente a força dos confiança de 95% foram calculados
para o coeficiente de correlação de
em 6 minutos membros inferiores devido à correla-
ção moderadamente alta com o teste Pearson segundo a transformação Z de
de uma repetição máxima no leg press Fisher27.
A principal indicação do teste da
caminhada em 6 minutos (TC6’) é me- em homens (0,78) e mulheres (0,71)23. Para testar associação entre duas
dir a resposta à intervenção medica- Avalia a potência e capacidade anae- variáveis categóricas em tabelas de
mentosa em pacientes com doença róbica alática, que representa ativida- contingência maiores que 2x2, uti-
cardíaca ou pulmonar moderada a de de alta intensidade e curta duração lizou-se o teste exato de Fisher-
severa, mas também tem sido utiliza- (até 30 segundos), mas que exige es- Freeman-Halton, uma generalização
do como medida da CF, bem como forço máximo e necessita de uma libe- do teste exato de Fisher28.

242 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


2008;15(3):240-7
Pereira et al. Atividade e desempenho físico de idosas

Todas as probabilidades de signifi- média


média mediana
mediana
10
10
cância (valores de p) foram do tipo
bilateral, considerando-se significan-
tes p<0,05; valores de p entre 0,05 e
0,10 foram interpretados como margi- 8
8
nalmente significantes.

sujeitos
desujeitos
A análise estatística foi efetuada uti-
lizando-se SAS versão 9.1.3 (Statistical 6
6
Analysis System, Cary, NC, USA) e

Númerode
Minitab versão 15.1 (Minitab Inc, State

Número
College, PA, USA).
44

RESULTADOS
A amostra foi composta por 37 mu- 2
2
lheres com idade média de 72,7±6,0
anos, ocorrendo a maior concentração
de idade na faixa de 70 a 79 (46%), %
0
0
sendo a idade mínima de 62 e a má- 00 25
25 50
50 75
75 100
100 125
125
xima de 85 anos. A estatura média foi Percentual
Percentual percorrido
percorrido da distância
da distância preditapredita
no TC6'no TC6’
151±6,1cm e massa média, 65±11,6 kg.
A aferição da pressão arterial realizada Gráfico 1 Distância percorrida pelas idosas (% em relação à prevista) no teste
em repouso apresentou valores médios da caminhada de 6 minutos (TC6’) n=35
de pressão arterial sistólica de 130±13,6
massa corpórea (IMC) de 28±4,7 kg/m2, No TC6’, considera-se que sujeitos
mmHg e diastólica de 79±10,3 mmHg,
indicando 61,1% de idosas obesas percorrendo menos de 75% da dis-
ou seja, 89,2% das mulheres eram
(IMC>27 kg/m 2). tância prevista teriam pior condição
normotensas durante a verificação. No
entanto, segundo o relato das pato- De acordo com o PAH, 70,2% das física aeróbica. Neste estudo a media-
logias auto-referidas (Tabela 1), 29 pacientes foram classificadas como na foi de 84±26,8% da distância
pacientes (78,3%) eram hipertensas. moderadamente ativas, 21,7% como percorrida em relação à prevista, com
O mesmo ocorreu para o relato de prejudicadas e apenas 8,1% como valor mínimo de 1,4 e máximo de
obesidade pois, no auto-relato, 70,3% ativas, sendo a média±desvio padrão 120,3%. Dentre as participantes, 23
da amostra não se considerou obesa encontrada de 60±13,1 pontos. O (65,7%) e 12 (34,3%) percorreram
ou com dificuldade em diminuir o menor escore atingido foi 23 e o respectivamente distâncias acima e
peso corporal (Tabela 1) mas, na máximo foi 88. abaixo de 75% da distância prevista
avaliação realizada pelos examinado-
res, encontrou-se o índice médio de 12
12 média (9,1±3,7
média (9,1±3,7 repetições
repetições)

Tabela 1 Distribuição das doenças 10


10
auto-referidas na amostra
Número de sujeitos

Doenças auto-referidas n %* 88
Número de sujeitos

Dor no peito 12 32,4


Dor no corpo inteiro 15 40,6 66
Dor na coluna 29 78,4
Reumatismos 21* 58,3
Diabetes 6* 16,7 44
Hipertensão 29 78,4
Dislipidemia 17* 47,2 22
Obesidade 11 29,7
Quedas 14* 38,9
0
Fraqueza 11 29,7 00
00 55 10
10 15
15 20
20

Problemas de visão 22 59,5 Número de repetições de levantar e sentar em 30”


Número de repetições de levantar e sentar em 30”
Problemas de audição 16 43,2
Gráfico 2 Número de repetições no teste de levantar da cadeira em 30
* n=36; percentual válido segundos (TSL30”) n=37

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :240-7 243


para cada uma (Gráfico 1). Duas Ao verificar a relação entre os resul- Na análise da correlação entre o
pacientes não conseguiram finalizar tados do PAH e do TC6’, encontrou-se PAH e o teste de levantar da cadeira,
o teste, com queixas de dispnéia e dor uma correlação positiva fraca (r=0,41) também foi encontrada correlação
nos membros inferiores, reduzindo e estatisticamente significativa (p=0,01)
(Gráfico 3). Quanto ao desempenho positiva fraca (r=0,36) e estatistica-
portanto a amostra para 35 sujeitos. no TC6’ em relação à classificação mente significante (p=0,02) na amos-
No teste de levantar da cadeira em funcional do PAH, 67% do grupo ati- tra estudada (Gráfico 4).
30 segundos (TSL30”), a amostra deste vo, 76% do grupo moderadamente
ativo e 28,5% do grupo prejudicado Não houve correlação significante
estudo apresentou média de 9±3,7 (p=0,35) entre a classificação funcio-
conseguiram caminhar 75% ou mais
repetições, com mínimo de uma e má- da distância prevista durante o teste. nal obtida pelo PAH e o TSL30”. As
ximo de 18 repetições; 18 idosas Observou-se também uma tendência médias de repetições do teste de le-
(48,6%) fizeram mais de 9 repetições de associação entre essa classificação vantar da cadeira nos grupos modera-
e 19 (51,4%) fizeram menos do que a e a variável TC6’ (nota de corte em damente ativo e prejudicado foram 9,7
média (Gráfico 2). 75%, p=0,08). e 7,6 repetições, respectivamente. As
três mulheres do grupo ativo foram
90 excluídas desta análise em vista do
número insuficiente para comparação.
80

70 DISCUSSÃO
No presente estudo encontrou-se
60 maior concentração de idade na faixa
EAA

de 70 a 79 anos (46%) e idade média


50 de 72,7±5,99 anos, apresentando, por-
tanto, diferenças em relação aos ido-
40 sos da comunidade de um estudo mul-
ticêntrico realizado em área metropoli-
30 tana na região Sudeste do Brasil, cuja
população analisada era relativamente
0 20 40 60 80 100 120 mais jovem, com idade média de 69
% de distância percorrida (em relação à prevista) no TC6’ anos e 58% abaixo de 70 anos29.
Gráfico 3 Correlação entre os escores ajustados de atividade (EAA) obtidos no Segundo o auto-relato das pacien-
PAH e as porcentagens da distância prevista percorrida no teste da tes, 78,3% eram hipertensas, mas estu-
caminhada de 6 minutos (TC6’) dos epidemiológicos de vários países
mostram prevalências de hipertensão
arterial sistêmica (HAS) variando de
90
1% em regiões rurais de alguns países
africanos até aproximadamente 30%,
80 entre operários urbanos da cidade de
São Paulo30. Nossos achados indicam
70 índices maiores, por se tratar de indi-
víduos idosos, pois a HAS tem na ida-
60 de um forte fator de risco.
EAA

Apesar de 70,3% da amostra não


50 ter se considerado obesa ou com difi-
culdade em diminuir o peso corporal,
40 foi encontrado IMC médio de 28±4,7
kg/m2. De acordo com uma classifi-
30 cação do estado nutricional e do IMC
adotado para o idoso, índices maiores
20 de 27 indicam obesidade31, pois du-
0 5 10 15 20 rante o processo de envelhecimento
Número de repetições no TSL30” ocorre uma sensível perda de massa
muscular e o correspondente ganho
Gráfico 4 Correlação entre os escores ajustados de atividade (EAA) obtidos no em massa de gordura, que aumenta
PAH e o número de repetições no teste de levantar da cadeira em 30 em torno de 1,7% em mulheres por
segundos (TSL30”) década de vida, dos 15 aos 98 anos

244 Fisioter Pesq. 2008;15(3):240-7


2008;15(3)
Pereira et al. Atividade e desempenho físico de idosas

de idade 32 . Bennell et al. 15 também explicada por uma combinação de Neste estudo, os valores de classifi-
encontraram valores semelhantes de testes de desempenho na análise de cação de atividade não se corre-
IMC em pessoas com OA de joelhos regressão múltipla, sugerindo que o lacionaram com os índices alcançados
(29,3±4,2Kg/m2) e controles (27,5±5Kg/ PAH avalia uma dimensão diferente no TC6’, em parte, pelo pequeno
m 2), ambos grupos constituídos por das outras medidas (de fato, níveis de número da amostra e por particularida-
idosos. atividade e dispêndio de energia), não des da amostra, selecionada a partir
fornecendo informação redundante de sua inserção em serviço ambula-
A média dos escores ajustados de
quando em conjunto com outros ins- torial especializado. Outro aspecto
atividade do PAH obtidas neste estudo
trumentos de avaliação em uma ba- relevante é que 6,5% dos itens do PAH
foram inferiores às dos pacientes com
teria de testes clínicos para reabili- em sua aplicação com idosos são
artrite reumatóide e OA de Bilek et
tação, sendo, portanto, complementar. erráticos: não se encaixando no con-
al.33 e às dos controles saudáveis de
outros estudos 15,17,18, tendo sido su- O TC6’ não avalia diretamente o tínuo de habilidade, prejudicam a men-
periores às médias de pacientes em pico de consumo de oxigênio, embora suração da CF como um construto
diálise18, acidente vascular encefálico17 essas medidas possam apresentar forte unidimensional14. É necessária cautela
e mulheres com OA de joelhos15. correlação 19 . Aplicado de modo a na aplicação desse instrumento, prin-
permitir que o sujeito empregue seu cipalmente quando se tratar de popu-
O questionário PAH classificou a lação desfavorecida econômica e cul-
próprio passo durante o teste, a simi-
maior parte das idosas (70,2%) como turalmente, dada a variabilidade das
laridade com as atividades de vida
moderadamente ativa. Tal resultado respostas por dificuldade de com-
diária é supostamente maior, visto que
seria esperado, já que geralmente exis- preensão ou por não desenvolvimento
essas atividades exigem níveis submá-
te um pequeno número de pessoas mui- de uma determinada atividade física
to hábeis e outra pequena quantidade ximos de esforço19. No presente estudo,
as correlações entre as medidas no ao longo da vida por razões meramen-
de pessoas muito debilitadas14. A pró- te contextuais.
pria amostra favorece esse resultado, TC6’, no TSL30” e o EAA do PAH esti-
por ter sido selecionada em ambula- veram presentes, porém, fracas. Sendo Quando se compara a média das
tório de atendimento de manutenção o EAA uma medida mais próxima das repetições do teste de levantar da
funcional para pacientes já reabilita- atividades cotidianas dos sujeitos, cadeira em 30” entre os dois grupos
dos, integral ou parcialmente; os acha- seriam esperadas correlações mais de classificação funcional (moderada-
dos indicam justamente o público-alvo fortes entre as duas medidas. mente ativo e prejudicado), não são
preferencial para tais ações em saúde. O baixo grau de correlação encon- observadas diferenças estatisticamen-
Supõe-se que idosos muito ativos ten- trado indica uma distância entre o te significantes (p=0,35). Em estudo
dem a procurar outras modalidades de desempenho físico-funcional observa- realizado por Jones et al.23 com idosos
assistência (centros de convivência, do e a percepção que as pessoas têm da comunidade, foram encontradas
universidades abertas à terceira idade, de seu próprio nível de atividade. médias de repetições para o TSL30”
academias) ou mesmo já incorporaram Assim como em qualquer questionário, de 13,3 para o grupo mais ativo e 10,8
um estilo de vida ativo, mantendo-o é inerente ao PAH a influência da para o grupo menos ativo. Os presentes
por seus próprios meios, pela preser- subjetividade nos resultados, podendo resultados mostram menores médias
vação de atividades domésticas, de refletir-se em superestimação ou para os grupos moderadamente ativo
trabalho e lazer. subestimação da capacidade real do e prejudicado (9,7 e 7,6 respectivamen-
sujeito 19,33. Outra limitação do PAH te), não sendo possível compará-las
Diversos estudos procuraram corre- com a pesquisa dos autores supra-
lacionar o PAH a medidas de avalia- refere-se ao fato de que o sujeito é
questionado sobre o que realmente já citados, pois naquele estudo não há
ção física como uma das formas de descrição do critério de classificação
testar sua validade em populações fez e parou de fazer, ou o que ainda
faz, não contemplando o fazer com de atividade adotado. Quanto à média
distintas 15-18,33,34 . Com exceção de
dificuldade, limitação ou dor – uma geral de repetições (9), foi mais baixa
Bennell et al.15, que obtiveram corre-
realidade presente no paciente em fase que a encontrada por Jones et al.23,
lações fracas a moderadas do PAH
de reabilitação 33. Pode-se ponderar que foi de 12,7 repetições em 42 mu-
com medidas físicas (Timed up-and-
que o nível de atividade física relatado lheres idosas.
go, step test e velocidade de marcha)
e dor em pessoas com OA de joelhos, é influenciado, portanto, por outras A maioria dos sujeitos do presente
correlações fortes foram alcançadas variáveis que não apenas o desempe- estudo (65,7%) percorreu acima de
com teste de consumo de oxigênio em nho físico, tais como senso de contro- 75% da distância prevista no TC6’
esteira 33, tempo para levantar cinco le, auto-eficácia, motivação, e dimen- segundo a equação de referência,
ou dez vezes da cadeira18,33, caminhar sões contextuais como oportunidade, sendo a mediana da amostra de 84%.
10 ou 15 metros17,18,33, acelerômetro18 escolaridade, acesso a ambientes Mesmo em se tratando de amostra am-
e tempo para subir escadas 18 . No físicos atrativos, nível socioeconômi- bulatorial, é oportuno enfatizar termos
estudo de Bennell et al.15, menos da co, além do sexo e hábitos como o encontrado resultados dentro da nor-
metade da variância no PAH pôde ser tabagismo 35. malidade, em concordância com

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :240-7 245


dados de pesquisas prévias: Enright et tras maiores, representativas da mar que os níveis de classificação
al.21 observaram que o 5o percentil da população residente na comunidade, funcional e de atividade física, obtidos
distância do TC6’ percorrida por parti- para que se possa inferir se a medida pelo Perfil de Atividade Humana, cor-
cipantes saudáveis – o qual pode ser auto-referida está mais fortemente relacionaram-se fracamente (nos casos
considerado o limite mais baixo da associada à medida observada ou se em que as variáveis foram tomadas
faixa de normalidade – foi de 75% do ocorre subestimação ou superestima- quantitativamente) ou apenas tenderam
valor predito. ção de desempenho quando a idosa é à correlação (nos casos de variáveis
questionada sobre seu nível de ativi- categóricas) com o desempenho físico
Devido às limitações metodológi- dade física.
cas do estudo, tais como tamanho re- avaliado por meio dos testes de cami-
duzido da amostra e o fato de ter sido
selecionada em um serviço de reabi-
CONCLUSÃO nhada de 6 minutos e de levantar da
cadeira em 30 segundos, das idosas
litação física de um centro público, Trata-se de um estudo de caráter pre- ambulatoriais que iniciariam um pro-
sugerem-se novas pesquisas com amos- liminar cujos resultados permitem afir- grama de reabilitação preventiva.

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Fisioter Pesq. 2008;15(3) :240-7 247


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.248-53, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Versão brasileira da Escala de Comprometimento do Tronco: um estudo de


validade em sujeitos pós-acidente vascular encefálico
Brazilian version of the Trunk Impairment Scale: a reliability
study in post-stroke subjects
Núbia Maria Freire Vieira Lima1, Silvia Yukie Rodrigues2, Thais Martins Fillipo2,
Roberta de Oliveira3, Telma Dagmar Oberg4, Enio Walker Azevedo Cacho5

Estudo desenvolvido no RESUMO: O controle de tronco – uma habilidade motora básica indispensável à
Hospital de Clínicas (HC) da execução de muitas tarefas funcionais – encontra-se deficitário em pacientes
FCM/ Unicamp – Faculdade de que sofreram acidente vascular encefálico (AVE). Há poucas referências
Ciências Médicas da estrangeiras, e nenhuma em português, que focalizem a avaliação de tronco
Universidade Estadual de de forma quantitativa. Este estudo teve como objetivo traduzir e verificar a
Campinas, Campinas, SP, Brasil confiabilidade inter e intra-examinador, validade construtiva e consistência
1 interna da versão brasileira da ECT – Escala de Comprometimento do Tronco
Fisioterapeuta do Ambulatório
de Fisioterapia e Terapia (Trunk Impairment Scale). Em 18 voluntários com hemiparesia secundária à
Ocupacional do HC/FCM/ AVE foram aplicados os seguintes instrumentos: ECT, Protocolo de Desempenho
Unicamp; mestranda em Físico de Fugl-Meyer, Medida de Independência Funcional, EEB – Escala de
Ciências Médicas na FCM/ Equilíbrio de Berg e Classificação de Deambulação Funcional. As avaliações
Unicamp foram realizadas por três fisioterapeutas experientes e o reteste da ECT foi
realizado após 48 horas. Foram encontradas moderada confiabilidade intra-
2
Fisioterapeutas Especialistas examinador e excelente confiabilidade inter-examinador (p<0,05), porém baixa
em Fisioterapia Aplicada à consistência interna (0,45). A EEB foi a única a apresentar correlação com a
Neurologia Adulto ECT (r=0,491, p=0,038); a comparação com as demais escalas não revelou
3
significância estatística. A ECT mostrou-se válida e eficaz para quantificar o
Fisioterapeuta Dra. comprometimento do tronco, com fácil aplicabilidade, e cumpriu os critérios
4 de confiabilidade, assegurando sua replicabilidade por profissionais atuantes
Dra. Coordenadora da
na reabilitação neurológica.
Especialização em Fisioterapia
Aplicada à Neurologia Adulto DESCRITORES: Acidente cerebral vascular/reabilitação; Estudos de validação;
da FCM/Unicamp Postura; Reprodutibilidade dos testes
5
Fisioterapeuta Ms. ABSTRACT: Trunk control – which is a basic motor ability to perform many functional
tasks –is disrupted in most patients who have suffered a stroke. There are few
ENDEREÇO PARA foreign references and none in Portuguese dealing with the quantitative
CORRESPONDÊNCIA assessment of trunk control. The aim of this study was to translate, verify intra-
Núbia M. F. V. Lima and inter-examiner reliability, validity and internal consistency of the Brazilian
R. Domingos Bonato 30 version of the Trunk Impairment Scale (TIS). Eighteen hemiparetic, post-stroke
Jardim Santa Genebra II volunteers were evaluated by means of the Fugl-Meyer Assessment Scale,
13084-785 Campinas SP Functional Independence Measure, Berg Balance Scale (BBS), and Functional
e-mail: nubia@fcm.unicamp.br Ambulation Classification; TIS was apllied by three experienced physical
therapists; retest was carried out 48 hours later. Data analysis showed moderate
intra-rater and an excellent inter-rater reliability (p<0.05), though low internal
consistency (0.45). The only scale found to correlate with TIS was BBS (r=0.491,
p=0.038), comparison to the others having shown no statistical significance.
The TIS Brazilian version thus proved a valid and effective measure of trunk
APRESENTAÇÃO deficits, having fulfilled reliability criteria; it is easy to apply, and may be
abr. 2008 said to be reproducible by neurology physical therapists.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Posture; Reproducibility of results; Stroke/rehabilitation; Validation
ago. 2008 studies

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2008;15(3)
Lima et al. Versão da Escala de Comprometimento do Tronco

INTRODUÇÃO A realização de uma avaliação efi-


caz é fundamental para estabelecer
verificar sua confiabilidade intra e
inter-observador, consistência interna
Muitos estudos na área de reabi- um adequado protocolo de tratamen- e validade construtiva.
litação abordam assuntos referentes a to. A escassez de informações na lite-
tratamentos e avaliações de membros ratura nacional e internacional e,
superiores e inferiores, sendo dada principalmente, de escalas que avaliem METODOLOGIA
pouca atenção ao comprometimento quantitativamente o comprometimen-
to do tronco não condiz com sua im- Foi realizada a tradução da ECT de
do tronco, causado pela hemiparesia.
portância funcional. A avaliação pre- sua versão original em inglês Trunk
Pode-se dizer que esta é uma área Impairment Scale por um tradutor bi-
negligenciada pelos estudos cien- coce do tronco tem sido considerada
como um importante preditor da re- língüe e profissional da área de saúde,
tíficos 1. familiarizado com a natureza do estu-
cuperação motora e funcional após o
Sabe-se que a hemiparesia secun- do. Em seguida, a versão do instrumen-
AVE 7-9. Na literatura, geralmente as
dária ao acidente vascular encefálico to em português foi vertida para o
avaliações são voltadas para o desem-
(AVE) provoca maiores danos na mus- inglês por outro profissional, não sendo
penho dos membros e de sua recupe-
culatura distal do que na proximal. encontrados conflitos de interpretação.
ração pós-AVE; poucos estudos con-
Esse gradiente de comprometimento O formato final da escala foi mantido.
centram-se no comprometimento da
pode ser explicado pelo fato de a mus- função do tronco10. O tronco vem sen- A ECT é composta por sete itens
culatura axial e proximal dos membros do avaliado por meio de vários instru- (Quadro 1), que avaliam mudanças
receberem inervação descendente mentos, de forma qualitativa11-13 ou, em quanto a: 1 percepção da verticalida-
bilateral, enquanto os músculos distais menor extensão, quantitativamente7,10. de do tronco; 2 e 3, força muscular de
são supridos por inervação principal- A avaliação é essencial para a prática rotação de tronco no lado afetado e
mente contralateral2. Contudo, após a clínica e científica, mas os instrumen- no lado não-afetado (passagem de
instalação da hemiplegia ou paresia, tos para tanto devem apresentar ade- decúbito dorsal para decúbito lateral);
o paciente apresenta dificuldade de quadas propriedades psicométricas 4 e 5, reflexo de endireitamento do
mover seu tronco em relação à gravi- que os tornem reprodutíveis. lado afetado e do lado não-afetado; 6
dade, independente da atividade mus- comprometimento da verticalidade na
cular requerida3. Freqüentemente, esses Uma Escala de Comprometimento posição sentada; 7 comprometimento
pacientes apresentam precário contro- do Tronco (ECT – Trunk Impairment da força muscular abdominal sentada.
le de tronco e várias alterações pos- Scale, TIS, no original) foi desenvol- O escore para cada item varia de 0 a
turais decorrentes dos défices nos vida por Fujiwara e colaboradores 10 3 e o melhor resultado corresponde à
diversos sistemas (sensorial, motor e para mensurar os aspectos quantitati- pontuação total de 2110.
perceptual). vos do comprometimento do tronco do
paciente hemiplégico ou hemiparético Para sua aplicação, foram recruta-
Davies4 assinalou a perda do con- pós-AVE. Em 2004, os autores verifi- dos consecutivamente 18 pacientes
trole seletivo do tronco como o princi- caram sua confiabilidade, validade e acometidos por AVE provenientes do
pal deficit funcional dos pacientes sensibilidade na avaliação da função Ambulatório de Fisioterapia e Terapia
hemiparéticos, pois todas as atividades do tronco desses pacientes. Ocupacional do Hospital de Clínicas
funcionais normais dependem do con- da Unicamp – Universidade Estadual
trole de tronco como base para o movi- Mediante a ECT é possível quanti- de Campinas. Foram incluídos pacien-
mento3. Segundo Wade5, o controle de ficar o comprometimento do tronco em tes com história de único e unilateral
tronco é uma habilidade motora básica sete itens. Dois itens (força muscular AVE, na faixa de 20 a 70 anos, de
e um componente crucial para exe- abdominal e verticalidade) foram ambos os sexos, em qualquer fase de
cução de muitas atividades; por essa originalmente baseados na SIAS recuperação pós-AVE, em reabilitação
razão, grande parte dos pacientes que (Stroke Impairment Assesment Set) ambulatorial (técnicas neuroevoluti-
sofrem AVE apresentam limitações desenvolvida por Chino et al. 15 em vas) desde o primeiro mês após o AVE.
que dificultam a reaquisição da mar- 1995 e validada em 2002 por Liu 16. Os pacientes realizavam reabilitação
cha e a obtenção de independência Os outros cinco itens foram desenvol- há mais de seis meses. Foram excluí-
nas diversas atividades da vida diária. vidos para a ECT, consistindo na per- dos indivíduos com doenças neurológi-
cepção de verticalidade do tronco, cas prévias ao AVE, acidente vascular
Sabe-se que os músculos do tronco
força de rotação dos músculos do cerebelar, doenças ortopédicas, ampu-
participam em atividades que envol-
tronco para os lados afetado e não- tações e os portadores de deficit cogni-
vem os membros, podendo atuar como:
afetado, além das reações de endireita- tivo severo, que causasse a incompre-
(1) motores primários ou sinergistas em
mento de ambos os lados. ensão das atividades requisitadas.
movimentos voluntários do tronco2; (2)
respondem automaticamente às pertur- Diante do exposto, este estudo teve O projeto de estudo foi aprovado pelo
bações inesperadas do corpo e/ou do como objetivo traduzir e adaptar para Comitê de Ética em Pesquisa da Facul-
membro4; (3) participam do ajuste pos- a língua portuguesa a Escala de Com- dade de Ciências Médicas da Unicamp.
tural antecipatório durante atividades prometimento do Tronco e, mediante Todos os indivíduos assinaram o termo
voluntárias 6. sua aplicação em pacientes pós-AVE, de consentimento livre e esclarecido.

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :248-53 249


Quadro 1 Escala de comprometimento de tronco – ECT

1 Percepção de verticalidade do tronco. O 4 Reflexo de endireitamento do lado afetado. O


paciente senta-se em uma cama ou cadeira sem paciente está sentado na borda de uma cama ou em
encosto, com os pés no solo. O examinador produz uma cadeira sem encosto. O examinador empurra
desvios do tronco para a direita e esquerda e lateralmente o ombro do paciente (# 30º) para o lado
solicita ao paciente que indique quando sente que não-afetado e pontua de acordo com o grau de reflexo
disparado no lado afetado do tronco do paciente.
seu tronco está em posição vertical. O examinador
Pontuação
registra o grau de desvio angular do tronco em
0 = nenhum reflexo é disparado;
relação a uma linha vertical imaginária
1 = o reflexo é pobremente disparado e o paciente
proveniente do ponto médio da linha de Jacoby não pode retornar seu tronco para a posição
(que liga as espinhas ilíacas póstero-superiores). próxima da original;
Pontuação 2 = o reflexo não é forte, mas o paciente pode
0 = o ângulo é • 30° trazer seu tronco para a posição próxima da
anterior;
1 = o ângulo é < 30° e • 20°
3 = o reflexo é forte o suficiente, e o paciente pode
2 = o ângulo é < 20° e • 10° imediatamente retornar à posição de tronco ereta
3 = o ângulo é < 10° anterior.
2 Força muscular de rotação do lado afetado do 5 Reflexo de endireitamento do lado não-afetado. O
tronco. Deitado, o paciente é solicitado a rolar o examinador empurra lateralmente o ombro do paciente (#
corpo da posição supina para o lado não-afetado. 30º) para o lado afetado. A pontuação é a mesma do item 4.
Os braços devem estar cruzados sobre o tórax e as 6 Comprometimento da verticalidade na posição
pernas estendidas. O paciente é solicitado a rolar sentada. O examinador apenas observa o paciente.
seu corpo sem empurrar com os membros nem Pontuação
puxar os lençóis da cama. Durante o rolamento 0 = o paciente não pode se manter sentado na
são permitidas a contração isométrica para posição vertical;
1 = a posição sentada somente pode ser mantida
estabilização e a contração ativa de outros
enquanto inclinado para um lado, e o paciente é
músculos além do oblíquo externo (p. ex. o incapaz de corrigir a postura para a posição ereta;
peitoral maior). 2 = o paciente pode sentar-se verticalmente quando
Pontuação se faz lembrar;
0 = nenhuma contração é notada no músculo 3 = o paciente pode sentar-se verticalmente de
oblíquo externo no lado afetado; maneira normal.
1 = a contração do músculo oblíquo externo é 7 Comprometimento da força muscular abdominal. O
visível no lado afetado, mas o paciente não paciente, em posição semi-reclinada (encosto a 45º), é
consegue rolar seu corpo; solicitado a retirar os ombros do encosto e assumir a
posição sentada. O examinador impõe pressão sobre
2 = o paciente consegue elevar a escápula do
o esterno do paciente.
lado afetado, mas não rola completamente o
corpo; Pontuação
0 = o paciente é incapaz de sentar-se;
3 = o paciente pode rolar completamente o
1 = o paciente só se senta na ausência de
corpo. resistência;
3 Força muscular de rotação do lado não-afetado 2 = o paciente consegue assumir a posição após a
pressão exercida pelo examinador;
do tronco. O paciente é solicitado a rolar o
3 = o paciente tem boa força nos músculos
corpo da posição supina para o lado afetado. A abdominais e é capaz de sentar-se contra uma
pontuação é a mesma do item 2. considerável resistência.

Com o intuito de caracterizar a utilizada a Classificação de Deambu- A seleção dos pacientes incluiu uma
amostra, os sujeitos foram avaliados lação Funcional (Functional Ambulation entrevista; aqueles que se enquadra-
pelo Protocolo de Desempenho Físico Classification – FAC)19. vam nos critérios de inclusão foram
de Fugl-Meyer (F-M)17, a fim de men- avaliados pelos instrumentos F-M, MIF,
surar seu comprometimento sensório- Três fisioterapeutas experientes na EEB e FAC. Em seguida, os pacientes
motor; pela Medida de Independência área e pós-graduandos participaram de foram encaminhados a outra sala,
Funcional (MIF)18, que avalia o grau um treinamento teórico-prático em onde os três examinadores aplicaram
de independência funcional; pela que lhes foram apresentados a ECT e a ECT, sendo que um conduziu os tes-
Escala de Equilíbrio de Berg (EEB) 11, os critérios a serem utilizados para a tes e todos pontuaram a escala, con-
que mensura o equilíbrio dinâmico e pontuação dos itens, bem como forne- forme o desempenho nas tarefas solici-
estático; e, com o intuito de avaliar o cidos esclarecimentos da avaliação para tadas. O material utilizado foi um
suporte necessário para caminhar, foi padronização do uso do instrumento. goniômetro, para aferição da inclina-

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Lima et al. Versão da Escala de Comprometimento do Tronco

ção lateral do tronco20. A pontuação Tabela 1 Características da amostra (n=18)


foi dada conforme a qualidade do mo-
Característica Média±dp
vimento, de acordo com a escala de
zero (0) a três (3). A avaliação da ECT Idade (anos) 44,6±11,8
foi repetida em 48 horas (reteste), Sexo (feminino – masculino) 6 – 12
seguindo os mesmos padrões de avalia- Hemisfério lesionado (direito – esquerdo) 11 – 7
ção. O intervalo sugerido entre um
Tempo de AVE (meses) 24,9±20,1
teste e reteste é de 1 a 3 dias para as
medidas físicas que não envolvam Escore no teste Fugl-Meyer – seção motora 52,27±19,76
máximo esforço e fadiga muscular21. Escore no teste Fugl-Meyer – seção MS 29,7±17,92
Para a análise dos dados, foi utiliza- Escore no teste Fugl-Meyer – seção MI 22,55±4,69
do o programa estatístico SPSS 15.0. Escore no teste Fugl-Meyer – seção equilíbrio 9,38±2,54
A confiabilidade da ECT foi testada de Medida de independência funcional 114,05±6,75
três modos: mensuração da confiabi- Pontuação na Escala de Equilíbrio de Berg 41,33±11,78
lidade inter e intra-observador, consis-
Classificação de deambulação funcional 4,05±0,63
tência interna da ECT e pela correla-
ção entre as escalas (validade cons- ECT Total 18,88±1,96
trutiva). A confiabilidade intra e inter- MS: Membro Superior; MI: Membro Inferior; ECT: Escala de Comprometimento do Tronco
observador foi verificada nos itens da
ECT e na pontuação total pelo coe- Tabela 2 Confiabilidade intra-examinador da ECT pelo coeficiente de
ficiente de correlação intraclasse (CCI) correlação intraclasse (n=18)
para mensuração da replicabilidade Item CCI IC de 95% p
dos escores, sendo adotada a seguinte
1 Percepção de verticalidade do tronco * * *
classificação: CCI<0,40, concordância
fraca; CCI<0,75, concordância modera- 2 Força muscular de rotação do lado afetado do tronco 0,517 0,147; 0,816 0,006
da; e CCI>0,75, alta concordância22. 3 Força muscular de rotação do lado não-afetado do tronco 0,702 0,373; 0,876 <0,001
A consistência interna, propriedade 4 Reflexo de endireitamento do lado afetado 0,585 0,195; 0,819 <0,001
que revela o grau de correlação entre 5 Reflexo de endireitamento do lado não-afetado 0,056 -0,421; 0,502 <0,001
os itens do instrumento, foi avaliada 6 Comprometimento da verticalidade na posição sentada 0,00 -0,393; 0,43 <0,001
pelo alfa de Cronbach23. Foi calculada 7 Comprometimento da força muscular abdominal sentada 0,798 0,533; 0,919 <0,001
a correlação item-total da ECT, sendo
ECT Total Examinador 1 0,505 0,092; 0,777 0,01
o escore superior a 0,4 considerado
satisfatório 24 . A correlação entre os ECT Total Examinador 2 0,647 0,263; 0,853 0,002
instrumentos de medida foi verificada ECT Total Examinador 3 0,681 0,319; 0,868 0,001
pelo coeficiente de correlação de * Não houve variação dos escores; ECT: Escala de comprometimento do tronco; CCI:
Spearman (r). O nível de significância Coeficiente de correlação intraclasse; IC = Intervalo de confiança
adotado para as análises foi de 5%. Tabela 3 Confiabilidade da ECT inter-examinador (pelo coeficiente de
correlação intraclasse; n=18)
RESULTADOS Item CCI IC de 95% p
Correlação
item-total
A Tabela 1 expõe as características 1 Percepção de verticalidade do tronco * * * 0
da amostra. De acordo com o instru- 2 Força muscular de rotação do lado afetado do tronco 0,786 0,602; 0,905 <0,001 0,14
mento F-M, os sujeitos eram modera- 3 Força muscular de rotação do lado não-afetado do tronco 0,888; 0,978 <0,001 0,31
damente comprometidos. Cinco 4 Reflexo de endireitamento do lado afetado 0,532 0,257; 0,767 <0,001 0,08
pacientes (27,7%) atingiram pontua- 5 Reflexo de endireitamento do lado não-afetado 0,710 0,488; 0,867 <0,001 0,43
ção total na ECT. 6 Comprometimento da verticalidade na posição sentada 0,414 0,115; 0,694 <0,001 0,41
7 Comprometimento da força muscular abdominal sentada 0,897 0,792; 0,956 <0,001 0,12
A confiabilidade intra-examinador
ECT Total 0,848 0,704; 0,935 <0,001 ---
foi excelente para o item 7; moderada
para os itens 2, 3, 4 e fraca para os * Não houve variação dos escores; ECT = Escala de Comprometimento de Tronco; CCI =
itens 5 e 6. Ao considerar a pontuação Coeficiente de correlação intraclasse; IC = Intervalo de confiança
total, os três examinadores apresenta- 4, 5 e 6. A replicabilidade da pontua- baixo de consistência interna. A cor-
ram moderada estabilidade do escore, ção total da ECT mostrou-se excelente relação item-total da ECT encontra-
como se vê na Tabela 2. (Tabela 3). se na Tabela 3: os itens com valores
mais satisfatórios foram os itens 5 e 6.
Considerando a primeira e segunda Quanto à consistência interna da
aplicações da ECT, a confiabilidade ECT, foi obtido o valor de alfa de Para avaliar a validade construtiva,
inter-examinador foi excelente para os Cronbach de 0,45, com base na sua os resultados obtidos com a ECT foram
itens 2, 3 e 7 e moderada para os itens pontuação total, considerado um valor comparados aos de outros instrumen-

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tos. A EEB mostrou correlação signifi- mais sensível de avaliação do reflexo ções que dificultam a reaquisição da
cativa com a ECT (r=0,491; p=0,038). postural é a aplicação de uma pertur- marcha. Por essa razão, utilizamos a
As seções motora e equilíbrio do bação externa. No protocolo de F-M, FAC para caracterizar a marcha desses
protocolo de Fugl-Meyer (F-M) não o reflexo postural é explorado pela indivíduos. Entretanto, não se observou
revelaram significância estatística em subescala de equilíbrio, mas só a correlação significativa dessa escala
relação à ECT (r=0,166 e p=0,51, reação de pára-quedas dos membros com a ECT, indicando que, apesar da
r=0,195 e p=0,439, respectivamente). superiores, não havendo enfoque no importância do tronco na realização
A MIF apresentou correlação sem endireitamento de tronco, como na da marcha, a ECT avalia dinamica-
significância estatística com a ECT ECT. O F-M avalia principalmente o mente a musculatura de tronco somen-
(r=0,232 e p=0,355), bem como a FAC equilíbrio estático sentado e em bipe- te nas atividades como rolar, alinha-
(r=0,224 e p=0,372). destação; a ECT difere por observar mento vertical e ajustes posturais
ações musculares do tronco mais sele- sentado. Esse achado pode ser devido
tivas. à amostra ser composta de pacientes
DISCUSSÃO A correlação encontrada entre a
crônicos, que desenvolveram estra-
tégias compensatórias para manuten-
A versão brasileira da Trunk Impairment ECT e a Escala de Equilíbrio de Berg ção da marcha.
Scale apresentou excelente confiabilidade pode ser devida à presença de tarefas
inter-examinador e moderada confiabili- na postura sentada (permanecer sen- Entre as vantagens da ECT encontra-
dade intra-examinador, revelando-se um tado sem apoio, transferência da pos- se o tempo curto de aplicação (10 mi-
instrumento válido e eficaz na avalia- tura sentada para em pé) que deman- nutos), conferindo à escala fácil apli-
ção da função de tronco. Fujiwara et dam seletividade muscular do tronco cabilidade, o que a torna um instrumento
al.10 avaliaram a confiabilidade inter- na EEB, em especial da musculatura importante para a prática clínica ambu-
examinador e a validade da ECT e abdominal, requerida também nas latorial do fisioterapeuta, auxiliando o
encontraram excelente concordância tarefas de rolar e sentar da ECT. A planejamento do programa de reabili-
entre os examinadores, exceto para o atividade seletiva do tronco avaliada tação do paciente após AVE. Além dis-
item 3 (força muscular de rotação do pela ECT mostra uma relação muito so, a ECT não requer uso de equipa-
tronco para o lado não-afetado). To- estreita com mobilidade e equilíbrio mentos especiais ou de alto custo. A
davia, no presente estudo, essa tarefa sentado e em pé, mensurado qualitati- desvantagem da ECT foi sua baixa
apresentou o melhor coeficiente de vamente pela EEB na hemiparesia, consistência interna. Recomenda-se
confiabilidade entre os itens da ECT. pois essas habilidades dependem do pois o uso da ECT associado à aplica-
Não há estudos prévios de avaliação nível de comprometimento do tronco10. ção da EEB, visando a avaliação quan-
da confiabilidade intra-examinador da titativa e qualitativa do tronco, respec-
Dada a ausência de correlação
ECT. tivamente. Duas limitações deste
entre a MIF e a ECT, pode-se inferir
estudo, a serem superadas em outros,
Mediante análise dos itens da ECT que a ECT parece não demonstrar
foram a pequena amostra de hemipa-
nota-se que o tronco exerce papel fun- capacidade de avaliar a indepen-
réticos e a prevalência de pacientes
damental nas atividades funcionais, dência funcional, considerando o ca-
com deficit crônico.
proporcionando ao mesmo tempo esta- ráter subjetivo da MIF, que é realizada
bilidade e mobilidade, permitindo ao em forma de perguntas ao próprio
indivíduo realizar atividades manuais
e deambular, corroborando o estudo
paciente ou cuidador. Alguns itens são
relacionados à função, como o rolar –
CONCLUSÃO
de Mohr3. É inegável que os hemipa- que porém não é avaliado pela MIF. A ECT mostrou-se válida e eficaz
réticos apresentam uma perda extre- Dessa forma, a MIF não mensura grau para quantificar o comprometimento
mamente importante na atividade se- de seletividade muscular, o que é do tronco com fácil aplicabilidade e
letiva dos músculos que controlam o muito bem explorado pela ECT. cumpriu os critérios de confiabilidade
tronco, particularmente nos músculos Todavia, foi demonstrada relação intra e inter-examinador, assegurando
responsáveis pela flexão, rotação e entre a força muscular do tronco e a sua replicabilidade por outros pro-
flexão lateral. deficiência de equilíbrio25; e Karatas fissionais atuantes na reabilitação neu-
et al. 26 observaram que a fraqueza rológica.
Não foi encontrada correlação entre
muscular em flexão e extensão do tron-
a ECT e a seção motora do protocolo O baixo grau de concordância entre
co apresenta correlação com a pontua-
de Fugl-Meyer, possivelmente por este as escalas sugere a necessidade de
ção dos itens de locomoção e transfe-
não avaliar a seletividade da muscula- elaboração de protocolos de avaliação
rência da MIF, e não com a pontuação
tura do tronco, tendo seu enfoque fisioterapêutica mais objetivos, a fim
total do instrumento.
apenas na sinergia dos membros. Carr de aumentar progressivamente a repro-
et al. 2 encontraram um baixo coe- Segundo Wade 5 , o controle do dutibilidade das medidas clínicas
ficiente de correlação (r=0,28) entre tronco é uma habilidade motora básica entre os fisioterapeutas. Sugerem-se a
o item de equilíbrio sentado de outro e um componente crucial para exe- realização de novas pesquisas com
instrumento, a Motor Assessment cução de muitas atividades e, por esse amostras maiores e, de preferência,
Scale, e a pontuação motora total do motivo, grande parte dos pacientes agrupando os resultados obtidos por
protocolo de F-M. Sabe-se que a forma que sofreram AVE apresentam limita- severidade de hemiparesia.

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Fisioter Pesq. 2008;15(3) :248-53 253


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.254-8, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Redução da dor em mulheres com osteoporose submetidas


a um programa de atividade física
Pain relief in women with osteoporosis after a physical activity program
Patricia Driusso1, Valéria Ferreira Camargo Neves2, Renata Neves Granito3,
Ana Claudia Muniz Rennó4, Jorge Oishi5

Estudo desenvolvido no PPG-FT RESUMO: Este estudo teve por objetivo avaliar a dor e o consumo de analgésicos
da UFSCar – Programa de Pós- em mulheres com osteoporose, após a realização de um programa de atividade
Graduação em Fisioterapia da física. Participaram do estudo 15 mulheres com média de idade 59±7,6 anos,
Universidade Federal de São com diagnóstico densitométrico em L2-L4 de osteoporose e que haviam feito
Carlos, São Carlos, SP, Brasil uso de analgésicos para dorsalgia pelo menos três vezes por semana no mês
1 precedente à avaliação inicial. A dor foi avaliada por questões extraídas do
Profa. Dra. do Curso de
Osteoporosis Assessment Questionnaire, aplicadas antes e após um programa
Fisioterapia e do PPG-FT da de atividade física; o escore variou de 0 (melhor, sem dor) a 10 (pior, dor
UFSCar
diária). O programa, que consistiu em caminhadas, exercícios livres de
2
Fisioterapeuta Dra. membros superiores e inferiores e relaxamento, foi realizado duas vezes por
semana durante 28 semanas consecutivas. Os dados foram tratados
3
Doutoranda em Fisioterapia no estatisticamente. Comparando-se as pontuações obtidas, a dor apresentou uma
PPG-FT da UFSCar diminuição significativa entre a avaliação inicial (7,33±3,05) e final (4,17±2,61,
4
p=0,0007). Observou-se também uma redução no consumo de analgésicos.
Profa. Dra. do Curso de Esses resultados sugerem que o programa de atividade física foi efetivo para a
Fisioterapia da Universidade diminuição da dor, contribuindo para a melhora da qualidade de vida das
Federal de São Paulo, São mulheres com osteoporose.
Paulo, SP
DESCRITORES: Dor; Osteoporose; Terapia por exercício
5
Prof. Dr. do Curso de Estatística
e do PPG-FT da UFSCar ABSTRACT: This paper aimed at evaluating the effect of a physical activity program
onto the level of pain as perceived by women with osteoporosis. Fifteen women
ENDEREÇO PARA (mean age 59±7.6 years old) with bone-densitometry diagnosis of lumbar
CORRESPONDÊNCIA osteoporosis took part in the study; they all took analgesics at least thrice a
week in the month prior to the study. Pain was assessed by questions extracted
Patricia Driusso from the Osteoporosis Assessment Questionnaire both before and after the
R. Profa. Nicoleta Stella program; scores ranged from 0 (no pain) to 10 (pain everyday). The program
Germano 60 apto. 63
consisted of walking, lower and upper limb free exercises, massage, and
13561-090 São Carlos SP
e-mail: pdriusso@ufscar.br relaxation, twice a week, during 28 weeks. Data were statistically analysed.
A significant decrease in pain was found after the program (from 7.33±3.05 to
APRESENTAÇÃO 4.17±2.61, p=0,0007), and a lesser use of analgesics was reported. These results
out. 2007 suggest that the program of physical activity brought pain relief, thus
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO contributing to improve quality of life of women with osteoporosis.
set. 2008 KEY WORDS: Exercise therapy; Osteoporosis; Pain

254 Fisioter Pesq. 2008;15(3):254-8


2008;15(3)
Driusso et al. Percepção de dor em mulheres com osteoporose

INTRODUÇÃO em redução na altura da região an-


terior dos corpos vertebrais, levando
pelo sofrimento observado nesses
pacientes, comprometendo sobre-
A osteoporose é considerada um à deformidade vertebral com conse- maneira sua qualidade de vida8-11.
importante problema de saúde pública qüente cifose dorsal, redução da esta-
Muitos trabalhos demonstraram que
da atualidade. Nos Estados Unidos ela tura, sobrecarga de músculos, tendões
a prática de atividade física induz a
afeta aproximadamente 24 milhões de e ligamentos adjacentes, o que acar-
analgesia, sugerindo que sua inclusão
americanos, dos quais 80% são mu- reta limitações aos movimentos da
pode ser extremamente útil nas inter-
lheres; é responsável por mais de 1,5 coluna, espasmo na musculatura para-
venções terapêuticas11-16. Sabe-se que
milhão de fraturas anualmente. Naque- vertebral e dor crônica secundária à
diversos neuromoduladores, entre eles
le país estima-se que os custos com deformidade mecânica 7.
as endorfinas, podem mediar a anal-
fraturas de quadril cheguem a 62 Uma vez instalada a osteoporose, gesia. Diversos estudos verificaram
bilhões de dólares em 2020, custos os tratamentos resultam geralmente na aumento na concentração plasmática
esses que irão aumentar, com o enve- redução da perda de massa óssea dessa substância decorrente do exer-
lhecimento populacional 1,2. devido aos efeitos favoráveis da as- cício físico16-19.
A osteoporose é caracterizada por sociação com outras terapias, tais como
O objetivo deste estudo foi verificar
tecido ósseo de baixa densidade com estrogênio, calcitonina e fluoretos. A
o efeito de um programa de atividade
deterioração de sua microarquitetura, atividade física tem sido sugerida
física sobre a percepção da dor e o
o que o torna mais frágil e susceptível como um suplemento para a preven-
consumo de analgésicos em mulheres
a fraturas3. Esse desarranjo da microar- ção e tratamento da osteoporose3.
com diagnóstico densitométrico de
quitetura óssea leva a micro e macro- Os mecanismos pelos quais o es- osteoporose na coluna lombar.
fraturas, a princípio, em pontos em queleto responde à atividade física
que o osso trabecular é dominante; e, ainda não estão totalmente elucida-
a partir dessas lesões, desencadeia-se dos. Há no entanto evidências de METODOLOGIA
o restante do quadro clínico, que inclui aumento da resistência óssea em res-
fraturas, dor e modificações posturais3,4. Esta é uma pesquisa do tipo experi-
posta à aplicação de cargas mecâ-
mental, com amostragem intencional,
A dor não é originada pela osteopo- nicas e, por outro lado, de diminuição
desenvolvida na Universidade Federal
rose; manifesta-se por lombalgia, da densidade mineral óssea, quando
de São Carlos. Participaram deste
da ausência de atividade física8-10.
relacionada às microfraturas vertebrais estudo 15 mulheres com idade entre
por compressão ou pelo colapso ou Um programa de atividade física 50 e 70 (59±7,6) anos com diagnóstico
encunhamento do corpo vertebral, al- para indivíduos com osteoporose não densitométrico de osteoporose na
gumas vezes com raquialgia impor- deve visar somente a aquisição de coluna lombar (L2-L4). Todas as vo-
tante5; e por fraturas vertebrais parciais massa óssea, mas promover melhora luntárias realizaram o exame de
ou completas, que levam à deteriora- da flexibilidade, força muscular, coor- densitometria óssea, feito no Instituto
ção da qualidade de vida do paciente5,6. denação, equilíbrio e alívio da dor, visto Romeu Santini, na cidade de São
Esses colapsos vertebrais irão resultar que são estas as variáveis responsáveis Carlos. Este estudo foi aprovado pela

Quadro 1 Questões relacionadas à dor, extraídas do OPAQ

Durante o último mês… Todo dia Maior parte


dos dias
Alguns
dias
Poucos
dias
Nenhum
dia
Pontuação 0 2,5 5 7,5 10
Você consegue ficar em pé por um longo tempo?
Você consegue ficar em pé confortavelmente?
Você consegue ficar sentada por muito tempo?
Você se sente confortável ao ficar sentada?
Suas costas se cansam facilmente? Pontuação 10 7,5 5 2,5 0
Questões sobre a dor relacionada à osteoporose

Durante o último mês… Todo dia Maior parte


dos dias
Alguns
dias
Poucos
dias
Nenhum
dia
Pontuação 10 7,5 5 2,5 0
Você tem alguma dor nas costas devido à osteoporose?
Você tem dor forte devido à osteoporose?
Você sente suas costas rígidas por mais de uma hora
depois que acordou?
Sua dor nas costas impede você de fazer as coisas que
queria?

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :254-8 255


Comissão de Ética em Pesquisa da extraídas do OPAQ, apresentadas no da musculatura do tronco; 30 minutos
Universidade Federal de São Carlos. Quadro 1. de caminhada associada a exercícios
Todas as participantes foram informa- ativos livres dos membros superiores
Para as cinco possíveis respostas a
das das características do estudo e e inferiores; 10 minutos de atividades
cada pergunta foram atribuídas notas
aceitaram participar, tendo assinado lúdicas, geralmente com bolas; e 5
variando de 0 a 10 (Quadro 1) e, tal
termo de consentimento livre e minutos de relaxamento. Durante es-
como no OPAQ, 0 era a melhor e 10 a
esclarecido. sas sessões as participantes também
pior. O escore foi obtido somando-se recebiam orientações posturais e de
Os critérios estabelecidos pela Or- as notas das nove perguntas e divi- exercícios para realizarem em seus
ganização Mundial da Saúde foram dindo por nove, para obter a nota final domicílios, bem como orientações
utilizados para o diagnóstico da osteo- de cada voluntária. Com base na deter- visando a prevenção de quedas.
porose. Assim, foram consideradas minação do escore de cada volun-
para este estudo as voluntárias cuja tária, estabeleceu-se a média e o
densidade mineral óssea em L2-L4 era desvio padrão da pontuação de dor. Análise dos dados
superior a 2,5 desvios-padrão abaixo
Os dados foram tabulados no pro-
da média para adultos jovens. Os cri-
térios para a inclusão na pesquisa
Programa de atividade física grama Excel e a análise estatística foi
realizada no programa Statistica, por
foram: osteoporose em L2-L4, confir- Após a avaliação inicial, as parti- meio da técnica não-paramétrica de
mada pelo exame de densitometria cipantes foram submetidas a um Wilcoxon. Para as conclusões das
óssea; ausência de doenças cardiovas- programa de atividade física, realiza- análises estatísticas foi utilizado o
culares, neurológicas, ortopédicas ou do na Universidade Federal de São nível de significância de 5% (p≤0,05).
défices cognitivos que as tornassem Carlos; com freqüência de duas vezes Os dados qualitativos são apresentados
incapazes de realizar o programa de por semana, em sessões de 1 hora de em porcentagem.
atividade física; índice de massa cor- duração, foi desenvolvido durante 28
poral normal, ou seja, entre 20 e 25 semanas consecutivas. A freqüência
kg/m2; declaração espontânea de uso cardíaca (FC) foi aferida antes de iniciar RESULTADOS
de analgésico por no mínimo três os exercícios e a cada 20 minutos de
vezes por semana, para alívio da atividade; desse modo foi controlada Todas as voluntárias participaram de
dorsalgia no mês anterior à avaliação a intensidade dos exercícios a que as pelo menos 80% do programa de ati-
inicial deste estudo. E outro critério mulheres estavam sendo submetidas: vidade física proposto, não havendo
de exclusão foi a não-participação em sempre que a FC ultrapassava 65 a pois exclusões.
pelo menos 80% do programa de 75% da freqüência cardíaca máxima, A comparação dos escores médios
atividade física proposto. de acordo com a idade, a paciente di- obtidos no questionário antes
minuía a intensidade da atividade (7,33±3,05) e depois do programa
Todas as participantes foram subme-
tidas a uma anamnese para excluir física até sua estabilização. (4,17±2,61, p=0,0007) mostra uma sig-
outras doenças associadas, confirmar nificativa redução no relato de dor,
O programa de atividade física foi
a ocorrência de dorsalgia, verificar o após os quase quatro meses do pro-
constituído por sessões de uma hora:
uso de analgésicos e responderam ao grama de atividades físicas.
10 minutos de exercícios de alonga-
Questionário de avaliação de osteo- mento de membros superiores e in- O Gráfico 1 refere-se à percepção
porose 11 (Osteoporosis assessment feriores, enfatizando-se o alongamento da ocorrência de dor após o programa,
questionnaire, OPAQ), antes e após o
programa de atividade física. Após o 90
programa, foram ainda novamente in- 80
quiridas sobre o uso de analgésicos. 70
O OPAQ é um instrumento especí- 60
fico para avaliação da qualidade de
50
vida de pacientes com osteoporose. É
um questionário constituído de 18 40
domínios, com questões relacionadas 30
à função física, estado psicológico,
sintomas e interação social; a pontua- 20
ção varia de 0 a 10, sendo 10 a pior 10
nota e 0 a melhor; foi desenvolvido 0
por Silverman et al. em 199319 e vali-
Diminuiu Manteve-se Aumentou
dado para o português por Cantarelli
em 1997 11 . Para este estudo foram Gráfico 1 Diferença percebida pelas participantes (%) na ocorrência de dor
selecionadas as questões relacionadas após o programa de atividade física, em relação à situação inicial
à intensidade e freqüência da dor, (n=15)

256 Fisioter Pesq. 2008;15(3):254-8


2008;15(3)
Driusso et al. Percepção de dor em mulheres com osteoporose

em relação à condição no início do os achados de diversos estudos10,13,16,17,20-23. de uma postura mais correta, o que
estudo, tal como aferida pelas ques- Bravo et al.21 analisaram o impacto de contribuiria para um alívio das
tões do OPAQ. um programa de exercícios feitos por sobrecargas impostas nas estruturas
um período de 12 meses sobre a saúde ligamentares e musculares, principal-
Quanto ao consumo de analgésicos
física e psicológica de mulheres osteo- mente da coluna vertebral, levando
para alívio da dor lombar, foi critério
pênicas e concluiu que, dentre as ao maior relaxamento e menor tensão
de inclusão o consumo pelo menos
variáveis observadas, a intensidade da nessas estruturas e, conseqüentemen-
três vezes por semana. Inquiridas após
dor na coluna foi o parâmetro que apre- te, diminuição da dor 6,7,10,12,13,15 ; os
o programa, apenas uma, dentre as 15
sentou o resultado mais positivo. exercícios também promovem altera-
participantes, referiu manter o uso
constante de analgésico. Também foi possível verificar que ções fisiológicas no organismo, dentre
o número de mulheres que consumiam as quais a liberação de endorfinas, ca-
analgésicos em uma freqüência de no tecolaminas e serotoninas, entre ou-
DISCUSSÃO E mínimo 3 vezes por semana diminui tras, substâncias estas responsáveis
tanto pela diminuição da percepção
CONCLUSÃO significativamente com o programa de
atividade física. Este é um importante da dor, como também da depressão e
achado desta pesquisa, visto que o ansiedade, que comumente acompa-
Em indivíduos com osteoporose, a nham esse tipo de paciente12,18.
dor advém das conseqüências da rare- consumo de analgésicos gera custos
fação óssea e não da doença em si, e grande parte da população brasileira A dor é essencialmente, uma mani-
uma vez que esta rarefação leva à tem limitadas condições econômicas. festação subjetiva, variando sua aprecia-
perda do trabeculado ósseo, resultando Assim, o hábito de fazer uma cami- ção de indivíduo para indivíduo15, sendo
em fraturas. Estas sim produzem dor, nhada pode propiciar, além do alívio esta a principal limitação do estudo.
não só a dor aguda, que surge logo da dor, como foi o caso nesta pesquisa, Essa limitação poderia ser amenizada
após a ocorrência da fratura, mas tam- também economia. se houvesse a inclusão de um grupo
bém a dor postural crônica, resultante Resultado similar foi encontrado controle de mulheres e/ou uma avalia-
principalmente das microfraturas por Malmros et al.22, segundo os quais ção mais precisa da dor, como por
vertebrais, levando às deformidades o nível da dor e o uso de analgésico exemplo, pelo uso de dolorímetro. No
posturais, com conseqüente cifose diminuíram significativamente em entanto, diante dos resultados apresen-
dorsal e redução da estatura5,6,13-15. Essa pacientes com dor crônica na coluna tados, deve-se ressaltar a importância
dor postural crônica provavelmente lombar, após um programa de ativi- de novos estudos com diferentes proto-
está relacionada à sobrecarga ou dis- dade física realizado em ambulatório colos de atividade física, a fim de se
tensão que sofrem os ligamentos, dis- e supervisionado por fisioterapeutas. obterem resultados mais precisos em
cos ou articulações interapofisárias, relação aos benefícios da atividade
secundárias à alteração estática e Essa redução da dor acompanhada
para pacientes com osteoporose.
pela prática regular de exercícios,
funcional que sofre uma coluna em que
observada no presente trabalho, pode Pode-se concluir que a prática de
ocorreram uma ou várias fraturas ver-
estar relacionada a várias hipóteses, atividade física supervisionada, es-
tebrais, como também ao espasmo da
ou à interação destas: a prática de pecialmente a caminhada, além de
musculatura paravertebral6,14.
exercícios envolve maior consciência proporcionar bem-estar aos indivíduos,
Como indicam os resultados, houve corporal, está relacionada com ganho pode ser utilizada como importante
diminuição da ocorrência de dor per- de força muscular, flexibilidade, me- recurso terapêutico no tratamento de
cebida após as 28 semanas de ativi- lhora da coordenação e equilíbrio, fa- pacientes acometidas/os pela osteo-
dade física. Esse resultado corrobora tores que contribuem para a adoção porose.

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :254-8 257


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Avaliação da função do ombro em técnicos de trânsito


pelo protocolo de Constant-Murley
Assessment of shoulder function in traffic technicians
by the Constant-Murley protocol
Maria C. Santos1, Selma Lancman2

Estudo desenvolvido no Fofito/ RESUMO: O estudo visou verificar a associação entre capacidade funcional e
atividade ocupacional em trabalhadores técnicos de trânsito expostos a
FMUSP – Depto. de
Fisioterapia, Fonoaudiologia e movimentos repetitivos, associados ou não a esforço físico; e verificar a presença
Terapia Ocupacional da de queixas e sintomas de traumas cumulativos na região do ombro.
Faculdade de Medicina da Participaram do estudo 102 técnicos de trânsito, divididos em dois grupos: G1
Universidade de São Paulo, São expostos a movimentos repetitivos e esforço físico; G2 expostos só a movimentos
Paulo, SP, Brasil repetitivos. Todos foram avaliados pelo método de Constant-Murley, que avalia
intensidade de dor nas atividades de vida diária, mobilidade e força muscular
1
Terapeuta ocupacional Ms. do dos ombros. Os dados foram tratados estatisticamente e o nível de signficância
Fofito/FMUSP fixado em p≤0,05. Queixas de dor nos ombros foram referidas por 66% dos
2
trabalhadores no G1 e 28,8% no G2; com relação à intensidade da dor, o G1
Profa. Livre-docente Assoc. do referiu dor mais intensa no ombro direito (11,80±4,60) que o G2 (13,56±3,33;
Fofito/FMUSP p=0,030). Foi encontrada uma tendência para o ombro esquerdo no G1 de dor
ENDEREÇO PARA mais intensa do que no G2 (p=0,054). Trabalhadores de ambos os grupos não
apresentaram prejuízo da função em relação ao parâmetro normal. Não se
CORRESPONDÊNCIA
verificou pois associação entre a capacidade funcional dos ombros e a atividade
Maria C. Santos ocupacional em qualquer dos grupos, o que pode ser devido ao viés conhecido
Fofito/ FMUSP como efeito do trabalhador sadio. A queixa de dor no ombro do G1 foi associada
R. Cipotânea 51 Cidade ao movimento repetitivo e ao esforço físico presentes nas tarefas de trabalho
Universitária desse grupo.
05360-160 São Paulo SP DESCRITORES: Dor; Efeito do trabalhador sadio; Ombro; Saúde do trabalhador;
e-mail: mariato@usp.br Transtornos traumáticos cumulativos

ABSTRACT: The purpose of the study was to assess whether there is a relation
between shoulder functional capacity and occupational activity among traffic
workers exposed to repetitive movements and/or to overexertion; and to inquire
on shoulder complaints and symptoms of cumulative trauma disorders. A
hundred and two traffic workers were divided into two groups – G1 exposed to
overuse and overexertion, G2 exposed only to overuse – and submitted to the
Constant-Murley functional shoulder protocol, which assesses four items: pain,
pain in activities of daily living, range of motion, and muscle strength. Data
were statistically analysed and significance level set at p≤0.05. Shoulder pain
was reported by 66% of G1 subjects and by 28.8% of G2’s; G1 presented
higher pain intensity complaints on the right shoulder (11.80±4.60) than G2
(13.56±3.33; p=0.030); and a trend was found to more intense pain on the left
shoulder in G1 than in G2 (p=0.054). Workers of both groups did not present
functional decrease as compared to normality parameters. There was hence no
association between functional shoulder capacity and occupational activity
in neither group, which may be due to the bias known as healthy worker
APRESENTAÇÃO effect. G1 shoulder pain complaints were linked to repetitive movements
nov. 2007 associated to physical effort inherent to G1 worker tasks.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Cumulative trauma disorders; Healthy worker effect; Occupational
set. 2008 health; Pain; Shoulder

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INTRODUÇÃO trânsito nas grandes vias. Essa ativi-
dade é feita pela colocação manual
não ao esforço físico, bem como veri-
ficar a presença de queixas e sintomas
As doenças ocupacionais e aciden- de cones de sinalização e exige dos de traumas cumulativos na região do
tes de trabalho que envolvem os braços trabalhadores o uso dos membros su- ombro, utilizando-se o protocolo de
e os ombros ultrapassam 40% do total periores com movimentos repetitivos avaliação clínica funcional de Constant-
de casos registrados1 gerando um total em amplitudes de movimento extre- Murley10.
de gastos elevado para o tratamento mas associada ao esforço físico para
dessas patologias, sobrecarregando o o levantamento e deslocamento dos
sistema de saúde e previdenciário no cones de sinalização (3 kg em média). METODOLOGIA
Brasil e comprometendo a saúde do
Trabalhos com essas características Este é um estudo observacional
trabalhador. Segundo dados do anuário
são potencialmente geradores de so- transversal. A população estudada foi
estatístico de 2005, do Ministério da
brecarga na articulação do ombro, composta de 102 trabalhadores técni-
Previdência Social1, as partes do corpo
podendo levar ao aparecimento de cos de trânsito da cidade de São Paulo
em que houve maior incidência de
distúrbios osteomusculares relaciona- (204 ombros), ativos na função. Os
doenças do trabalho foram o ombro e
dos ao trabalho5-9, gerando graus de in- sujeitos foram alocados em dois gru-
o dorso; o número de acidentes de tra-
capacidade funcional que comprome- pos: G1 (n=50) composto por trabalha-
balho liquidados atingiu 528 mil traba-
tem a saúde e capacidade laboral des- dores que desenvolviam atividades
lhadores, o que corresponde a um
ses trabalhadores. ocupacionais com esforço repetitivo
aumento de 4,8% em relação ao ano
associado ao esforço físico, devido à
anterior; a incapacidade temporária Os instrumentos utilizados para
tarefa de canalização da via; e G2
para o trabalho aumentou 2,8% e a avaliar a função do ombro são aplica-
(n=52), de trabalhadores que realiza-
incapacidade permanente subiu 5,4%. dos geralmente na situação clínica10-12,
Esses dados justificam esforços para vam apenas movimentos repetitivos.
depois que os trabalhadores já desen-
identificar os fatores que colaboram A seleção da amostra foi feita após a
volveram algum tipo de disfunção.
com o aparecimento dessas doenças. observação do trabalho. Os critérios
Embora tenham um valor preditivo
de exclusão foram: estar afastado do
Os transtornos traumáticos cumula- alto para detectar essas alterações,
trabalho ou ter história de trauma re-
tivos cursam com dor, inflamação e dis- raramente são utilizados nas situações
cente (15 dias ou menos) ou com
função e, devido a sua alta incidência, ocupacionais para detecção precoce
algum tipo de imobilização em mem-
podem gerar aumento da incapacidade de agravos e implementação de práti-
bro superior. Todos os trabalhadores as-
laboral. A lesão tendinosa do manguito cas preventivas, colaborando para
sinaram o Termo de Consentimento
rotador do ombro está entre as afecções avaliar a sobrecarga biomecânica
Pós-Informação; o estudo foi aprovado
musculoesqueléticas de partes moles antes do adoecimento13-15.
pela Comissão de Ética do Hospital
mais comuns, contribuindo para que No atual sistema previdenciário bra- das Clínicas da Faculdade de Medici-
a dor no ombro apareça em segundo sileiro, o parecer dos peritos acerca na da Universidade de São Paulo.
lugar de freqüência clínica de queixa da capacidade funcional para afasta-
de dor, depois da coluna lombar1-4; es- No estudo foram utilizados o proto-
mento ou retorno ao trabalho é pautado
tudos enfatizam a relação dessa queixa colo de avaliação10, dinamômetro de
em achados clínicos como presença,
com absenteísmo nas indústrias4. mola portátil, com graduação em dupla
mobilidade e força muscular, auto-
escala em quilos e libras (marca Crown
Outros estudos na literatura6-9 apon- nomia nas atividades de vida diária.
AT-30, Técnica Industrial Oswaldo
tam como fatores potenciais de risco A avaliação clínica funcional de
Filizola Ltda.), e goniômetro universal.
aqueles ligados à carga física nos tra- Constant e Murley10 foi desenvolvida
balhos braçais, a ângulos e esforços especificamente para a região dos om-
físicos em posturas inadequadas, a bros, numa escala de itens objetivos Procedimentos
movimentos repetitivos, à vibração e (mobilidade e força) e subjetivos (pre-
sença de dor e desconforto referidos Todos os trabalhadores foram avalia-
ao tempo de trabalho na função.
no desempenho das atividades de vida dos uma única vez ao final de seu res-
O trabalho dos técnicos de trânsito, diária). Pode ser utilizada independen- pectivo turno de trabalho. A avaliação
tal como são denominados pela em- constou de duas partes: a) entrevista
te do diagnóstico de forma simples e
presa, consiste principalmente em con- para caracterização sociodemográfica
rápida, não contém termos que sejam
trolar fluxo de tráfego nas vias, fisca- e física (idade, sexo, peso e altura,
influenciados pelo contexto sociocul-
lização semafórica e estacionamento IMC, tabagismo, escolaridade etc.), so-
tural e é largamente utilizada na lite-
rotativo, fazendo movimentos repeti- bre exposição a fatores de risco ocupacio-
ratura10-12,16,17.
tivos com os membros superiores. Em nal e não-ocupacional (tempo na fun-
São Paulo, alguns fazem ainda a mon- Este estudo teve como objetivo ção atual, ocupações anteriores, outras
tagem e desmontagem da canaliza- verificar se há associação entre capaci- atividades remuneradas, comorbida-
ção da faixa de rolamento (faixa rever- dade funcional e atividade ocupacional des, história de acometimentos em
sível) para mudar a mão de direção em técnicos de trânsito que realizam membros superiores, dor musculoes-
dos veículos nos horários de pico de movimentos repetitivos, associados ou quelética, prática de esportes etc.) e

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Santos & Lancman Função do ombro em guardas de trânsito

quanto a queixas de dor. A segunda a associação entre os trabalhadores do variáveis sociodemográficas e de vida
parte avalia a capacidade funcional G1 e as variáveis categorizadas foram fora do trabalho (p>0,05), com porcen-
dos ombros direito (OD e esquerdo utilizados testes qui-quadrado ou teste tagem maior de doença sistêmica
(OE) com base no protocolo clínico exato de Fisher. Para analisar as me- diagnosticada no G2.
de Constant-Murley10, que pontua qua- didas que se associaram ou não com
Foi feita análise de regressão logís-
tro parâmetros: dor referida, desempe- o esforço físico dos sujeitos do G1 foi
tica das variáveis idade, tempo na
nho referido nas atividades de vida utilizada análise de regressão logísti- função, afastamentos do trabalho, his-
diária, mobilidade articular (alcance da ca; para verificar a existência de cor- tória de trauma em membro superior.
mão e goniometria) e força muscular relação entre a idade e o índice de Dentre elas, somente a história de
isométrica (aferida por dinamometria). força muscular de cada ombro foi utili- trauma em membro superior – fator
O escore máximo é 100 pontos; quanto zado o teste de correlação de Pearson adicional para o risco de adoecimento
maior a pontuação em cada parâme- e efetuadas as análises de regressão musculoesquelético – se mostrou mais
tro, melhor é a capacidade funcional. linear correspondentes. Foi admitido significativa (p=0,019) para caracte-
nível de significância estatística rizar o trabalhador do G1 em compa-
Para a medida de força10,11,16-20 adotou-
p≤0,05. ração com o do G2 (Tabela 1).
se a posição ortostática e estabiliza-
ção do tronco, posicionando o ombro Os grupos se queixaram igualmente
anteriormente ao plano da escápula20,
utilizando-se um dinamômetro de
RESULTADOS de presença de dores pelo corpo (78%
no G1, 78,8% no G2). No entanto, as
mola e fixando-se o ponto distal17-19 por A maioria da população é do sexo porcentagens de queixas na região dos
uma correia segura ao pé do exami- masculino: 96% no G1 e 92,3% no OD e OE foram 66% no G1 e 28,8%
nado (Figura 1). A força foi exercida G2. A média de idade foi de 36,4±6,99 no G2. A queixa de dor osteomuscular
gradualmente até o máximo possível, anos no G1 e de 25,59±2,96 no G2, em mais de uma região foi freqüente-
mantida por 5 segundos; o procedimen- sem diferenças significantes. Os gru- mente citada e a região lombar foi a
to foi repetido três vezes e considerada pos foram semelhantes quanto às terceira mais referida (Tabela 2).
a medida mais alta. O dinamômetro
foi calibrado previamente à realização Tabela 1 Características da amostra: regressão logística da associação das
do estudo e era zerado a cada medida. variáveis para exposição ao adoecimento musculoesquelético
Característica Coeficiente ep p
Idade 0,07 0,037 0,048
Tempo na função -0,09 0,064 0,177
Afastamento (acidente de trabalho) 0,13 0,545 0,817
Afastamento (doença ocupacional) -2,14 1,139 0,060
Afastamento (outras causas) -0,08 0,657 0,909
Acometimento MMSS -0,90 0,488 0,065
Constante -1,72 1,261 0,173
ep = erro padrão; MMSS = membros superiores
Tabela 2 Distribuição das queixas de dor referida (%) segundo a região corporal
e lateralidade, por grupos (G1, n=50; G2, n=52)
Região corporal G1 (78%) G2 (78,8%) Total (78,4%)
Ombro direito 34,0 17,3 25,5
Ombro esquerdo 32,0 11,5 21,6
Cotovelo direito 4,0 9,6 6,9
Cotovelo esquerdo 2,0 3,8 2,9
Punho direito 4,0 3,8 3,9
Figura 1 Posicionamento da Punho esquerdo 2,0 - 1,0
dinamometria: (A) local da Mão direita 12,0 3,8 7,8
aplicação da força; (B) ponto
Mão esquerda 2,0 1,9 2,0
fixo da resistência
Membro inferior direito 4,0 11,5 7,8
A análise estatística foi feita com Membro inferior esquerdo 4,0 7,7 5,9
o programa SPSS versão 10.0. Foi Coluna cervical 8,0 13,5 10,8
usado o teste t de Student não-pareado
Coluna torácica 6,0 1,9 3,9
para comparar as variáveis sociodemo-
gráficas e de esforço físico. Para verificar Coluna lombar 32,0 42,3 37,3

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Avaliação clínica à intensidade da dor, o G1 apresentou
dor mais intensa no OD (11,80±4,60)
pos não mostraram prejuízo da função
em qualquer dos ombros e os dois gru-
funcional do ombro que o G2 (13,56±3,33), com diferença pos obtiveram escore total da função
significante (p=0,030). Ainda quanto dos ombros (Tabela 3) classificada
Os resultados dos escores obtidos à intensidade de dor no OE, houve uma como boa (pontuação total maior que
para a função dos ombros foram anali- tendência do G1 a apresentar dor 85 pontos).
sados em separado para os lados D e (12,50±3,94) mais intensa do que o G2
E, considerados os escores totais em Analisando a relação entre as quei-
(13,85±2,91, p=0,054).
cada parâmetro: intensidade de dor, xas de dor e as medidas de força
desempenho nas atividades de vida Na soma dos quatro parâmetros muscular (em kgf) dos trabalhadores
diária, mobilidade total e força mus- totalizando o escore funcional do om- (Tabela 4), no G1, os que se queixam
cular isométrica dos OD e OE. Quanto bro, os trabalhadores de ambos os gru- de dor no OD têm menos força quando
comparados (p=0,021) aos que não se
Tabela 3 Escores (média e desvio padrão) na avaliação funcional do ombro de queixam de dor nesse ombro.
Constant-Murley dos dois grupos (G1, n=50, G2, n=52) e valores de p
da comparação entre os grupos A força muscular dos OD e OE foi
comparada entre os grupos e com a
Parâmetros Grupo Média dp p idade. Os dados mostram que a idade
G1 11,80 4,60 não influenciou a força muscular do
Dor no ombro direito 0,030* trabalhador nos OD (p=0,127) nem OE
G2 13,56 3,33
(p=0,126); foi encontrada fraca corre-
G1 12,50 3,94
Dor no ombro esquerdo 0,054 lação negativa entre a idade e força
G2 13,85 2,91 muscular do OD (r=–0,153) e do OE
G1 18,76 2,33 (r=–0,154).
AVD total OD 0,701
G2 18,94 2,44
G1 18,94 2,21
AVD total OE
G2 19,31 2,04
0,385 DISCUSSÃO
G1 39,28 2,45 Este estudo avaliou e comparou a
Mobilidade total OD 0,766
G2 39,42 2,39 capacidade clínica funcional dos om-
G1 39,60 1,76 bros em trabalhadores expostos a
Mobilidade total OE 0,803 movimentos repetitivos, associados ou
G2 39,50 2,24
não ao esforço físico, verificando a
G1 18,28 5,37 presença de queixas e sintomas de
Força muscular OD 0,387
G2 19,15 4,64 traumas cumulativos na região do om-
G1 18,35 5,00 bro. Os dados mostram que não houve
Força muscular OE 0,263
G2 19,43 4,67 diferença entre os grupos quanto ao
G1 88,12 12,06 total de queixas de dor no corpo
Escore total OD 0,175 (78,0% no G1, 78,8% no G2). No en-
G2 91,07 9,65
tanto, dor na região dos ombros foi
G1 89,39 9,40 mais citada pelo G1 e foi encontrada
Escore total OE 0,142
G2 92,09 8,94 correlação entre intensidade da dor,
OD= ombro direito; OE = ombro esquerdo; AVD = desempenho nas atividades da vida movimento repetitivo e esforço físico
diária;* diferença estatisticamente significante no G1. Apesar disso, o escore para a
função total em ambos os ombros e
Tabela 4 Relação entre queixa de dor e a medida de força muscular (kg, média
em ambos os grupos foi elevado: os
e desvio padrão) e nos ombros nos dois grupos (G1, n=50, G2, n=52)
dois grupos apresentaram função total
Força muscular nos dois ombros classificada como boa.
Ombro
Dor no ombro Média (kg) dp N p
Nos estudos sobre os fatores de riscos
Não 24,64 3,95 33 de adoecimento musculoesquelético
Ombro direito G1 0,021*
Sim 18,85 9,02 17 em trabalhadores, o primeiro problema
Não 23,46 5,35 34 que se apresenta é a caracterização da
Ombro esquerdo G1 0,319 população, uma vez que esse tipo de
Sim 21,28 7,69 16
adoecimento relacionado ao trabalho
Não 23,90 5,38 43
Ombro direito G2 0,676 tem causas multifatoriais14-15, tanto in-
Sim 23,00 7,65 9 trínsecas – ligadas às características
Não 24,50 5,30 46 individuais dos trabalhadores – quanto
Ombro esquerdo G2 0,166
Sim 21,00 8,76 6 extrínsecas, geradas pelas muitas face-
* Diferença estatisticamente significante tas do trabalho. Ao estudar a exposição

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Santos & Lancman Função do ombro em guardas de trânsito

ao risco físico, é importante que as Embora este estudo não possa levar mo um viés, próprio em estudos com
populações estudadas sejam homo- a conclusões sobre diagnósticos ou trabalhadores ativos, conhecido como
gêneas, uma vez que as variáveis in- patologias que poderiam estar se efeito do trabalhador sadio26,27. Esse
dividuais (principalmente idade, sexo, instalando, a presença de dor referida viés ocorre devido ao fato de serem
dados antropométricos etc.), a organi- pode ser um sinal prodrômico impor- estudados trabalhadores que estão
zação do trabalho, o tempo na função tante, indicativo de alguma patologia ativos, que são os mais hígidos e, ain-
atual, ocupações anteriores e ativida- mais severa23. Considerando-se a etio- da, de não serem comparados aos
des de lazer e esporte têm um papel logia e a fisiopatologia dos mecanismos trabalhadores de mesma função que
determinante na resposta do indivíduo de lesão do complexo do ombro3,4,22, já deixaram a força de trabalho. Outro
à exposição ao risco8,9,20,21. Neste estu- acredita-se que a queixa de dor nos aspecto que pode ter sido influenciado
do, os resultados indicam que os tra- ombros apresentada pelos trabalhado- pelo efeito do trabalhador sadio é a
balhadores do G1 e do G2 compõem res do G1 deva ser interpretada como força muscular aferida nos sujeitos de
uma amostra homogênea, não apre- um sinal de alerta quanto ao início de ambos os grupos: os resultados não
sentando diferenças significativas nas distúrbios osteomusculares nessa arti- apontam decréscimo da força quando
características sociodemográficas culação, cuja progressão deve ser mo- se relaciona esse aspecto com a idade
(p>0,05). nitorada. dos trabalhadores avaliados, em ne-
Esses acometimentos, se diagnostica- nhum dos grupos. Esses dados concor-
A porcentagem total dos sujeitos dos dam com os de Bäckman et al.27, que
dois grupos com queixa de dor nos dos em estágios avançados ou crônicos,
têm pior prognóstico, o que acarretaria indicam os trabalhadores mais sadios
ombros foi de 47,1% (n=80/102), por- como aqueles que se mantêm em
centagem maior do que a encontrada prejuízo no desempenho ocupacional,
podendo gerar afastamento prolongado atividade na profissão. A manutenção
por Fredrikson et al.6 (43%) e por Van da força muscular, apesar do avanço
do trabalho, restrições laborais perma-
der Windt et al.8 (6% a 11%). Consi- da idade nos indivíduos, está ligada à
nentes e ônus para a saúde do sujeito
derando-se a mesma faixa etária, o execução de tarefas que demandam
e para a Previdência Social.
presente resultado é ainda superior em esforço físico, seja no trabalho, seja
termos de prevalência de dor no om- Outro argumento para reforçar a em atividades não-ocupacionais que
bro, na população em geral (12%)9,20. idéia de que a dor referida pode ser combatam o sedentarismo pelo efeito
indicativo de afecção musculoesque- de treinamento da musculatura28 – e,
Os resultados indicam que G1 está
lética do ombro é o fato de que os no caso, o trabalho dos técnicos de
mais exposto ao risco de adoecimento
trabalhadores do G1 apresentaram trânsito estimula esse condicionamen-
por traumas de repetição na região dos
queixa de maior intensidade de dor to físico.
ombros. A presença de dor no ombro nos ombros (Tabela 2) e, também, me-
nesse grupo apresenta associação nor força muscular nesse ombro, quan- O instrumento de avaliação funcio-
significativa com a repetitividade e o do comparados aos trabalhadores sem nal do ombro mostrou-se de fácil apli-
esforço físico de levantamento de queixa de dor (Tabela 4). cação, rápido e preciso, podendo ser
pesos realizado no trabalho. Como em utilizado em situações de investi-
outros estudos8,20, a dor no ombro está Embora a freqüência de queixa de gação ocupacional que envolvam
mais associada à carga física acima dor na região lombar neste estudo não grande número de pessoas. Como ins-
do nível do ombro, com tarefas de le- tenha tido associação entre os grupos, trumento dirigido a uma região especí-
vantamento e carregamento de pesos, esta aparece nos resultados como a fica, foi adequado para medir o desgas-
tarefa de trabalho não exigida no G2, segunda região de dor mais citada, em te da articulação do ombro na situação
que executava apenas movimentos ambos os grupos, corroborando acha- avaliada. Porém, esse instrumento de-
repetitivos. dos de Avanzi et al.2, Soslowsky et al.3 manda um técnico para sua aplicação,
e Rocha e Ferreira24, que referem ser a ao contrário de outros instrumentos uti-
Muitos distúrbios musculoesquelé- coluna lombar a região de acometi- lizados em investigação de saúde
ticos na região do ombro estão relacio- mento mais freqüente depois dos ocupacional, que permitem a auto-
nados à amplitude de movimentação ombros. avaliação pelos próprios trabalhadores.
e à repetitividade de movimentos,
acarretando sobrecarga nessa articula- A alta prevalência de dores na colu- O uso de um instrumento da clínica
ção devido ao atrito do tendão, bem na pode ser explicada pelo fato de que para uma região específica do apare-
como à provável isquemia do mesmo3,22. o trabalho exige desses trabalhadores lho locomotor, em um contexto de
Os tecidos moles (músculos, tendões movimentos de torção de tronco associa-
saúde ocupacional, deve ser acompa-
e nervos) respondem ao estresse me- dos ao levantamento de peso (no G1) e
nhado de outros meios que possibilitem
à permanência por período prolongado
cânico gerado pela repetitividade e rastrear os riscos, considerando-se o
de tempo na posição ortostática25.
sobrecarga física com sinais inflama- caráter multifatorial 13-15 do apareci-
tórios que, na clínica, aparecem como Constatou-se que a capacidade mento de doenças osteomusculares
queixas de dor e possível limitação funcional dos ombros dos trabalhadores relacionadas ao trabalho. Esse caráter
da mobilidade e força, comprometen- de ambos os grupos está preservada. multifatorial é reforçado no atual e
do a função. Deve-se considerar esse resultado co- abrangente conceito de funcionalidade,

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :259-65 263


incapacidade e saúde da Organização tos em posturas inadequadas, devam ao esforço físico presentes na tarefa
Mundial da Saúde e seus determinan- ser especialmente analisados, para de trabalho do G1. E, embora não se
tes biopsicossociais, imprescindíveis que se possa intervir com ações que tenha verificado prejuízo da capaci-
para descrever a saúde e os estados minimizem o impacto da atividade na dade funcional dos ombros em qual-
relacionados à saúde29. saúde dos trabalhadores.
quer dos grupos, esse achado deve ser
Do ponto de vista da saúde ocupacio-
nal, este estudo evidencia que trabalhos
que apresentam associação de fatores
CONCLUSÃO visto com cautela devido ao viés do
efeito do trabalhador sadio, ou seja,
biomecânicos, como a repetitividade A queixa de dor nos ombros está re- do que permanece ativo na força de
somada a esforço físico e a movimen- lacionada ao movimento repetitivo e trabalho.

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Fisioter Pesq. 2008;15(3) :259-65 265


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.266-72, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Equiscala: versão brasileira e estudo de confiabilidade e validade da Equiscale


Brazilian version, reliability and validity study of the Equiscale
Sara Regina Meira Almeida1, Anderson Barbosa Loureiro2, Tiaki Maki2

Estudo desenvolvido no Serviço RESUMO: Este estudo consistiu na tradução para o português e na verificação da
de Fisioterapia e Terapia confiabilidade e validade do teste original de equilíbrio Equiscale. A versão
Ocupacional do Hospital de brasileira foi testada em 11 indivíduos com esclerose múltipla selecionados
Clinicas da Unicamp – aleatoriamente, que foram inicialmente avaliados pela Escala de Equilíbrio
Universidade Estadual de de Berg (EEB), Medida de Independência Funcional e pela Escala do Estado
Campinas, Campinas, SP, Brasil de Deficiência Expandida (EDSS). Foram feitas duas avaliações usando a
1 Equiscala (teste-reteste) por três fisioterapeutas, para verificar a confiabilidade
Fisioterapeuta, mestranda em interexaminador. A confiabilidade teste-reteste e interexaminador foi verificada
Ciências Médicas na pelo coeficiente de correlação intra-classe (CCI); e a relação entre a Equiscala
Faculdade de Ciências
e as demais escalas, pelo coeficiente de correlação de Spearman. Foi
Médicas da Unicamp
demonstrada adequada confiabilidade teste-reteste (CCI=0,882; 0,906) e
2
Fisioterapeutas Ms. interexaminador(CCI=0,947; 0,933; 0,962). Também foi encontrada boa
correlação da Equiscala com a Escala de Equilíbrio de Berg (rs=0,8940;
ENDEREÇO PARA p=0,0002) e a EDSS (rs=–0,7139; p=0,0136). Os resultados indicam que a
CORRESPONDÊNCIA Equiscala apresenta adequada confiabilidade e validade, podendo ser aplicada
na avaliação do equilíbrio em pacientes com esclerose múltipla.
Sara Regina M. Almeida DESCRITORES: Avaliação; Equilíbrio musculoesquelético; Esclerose múltipla;
Av. Papa Pio XII 163 ap.12 Estudos de validação
Jardim Chapadão
13070-091 Campinas SP
e-mail: ABSTRACT: This articles presents the Brazilian-Portuguese version of the Equiscale,
sararm@fcm.unicamp.br and assesses its reliability and validity. The translation was tested on 11
randomly-selected patients with multiple sclerosis, who were also assessed by
the Berg Balance Scale (BBS), Functional Independence Measure (FIM), and
Expanded Disability Status Scale (EDSS). The Equiscale was applied twice
(test-retest) by three physical therapists. Test-retest reliability was verified by
the intra-class correlation coefficient (ICC), and comparison between Equiscale
and the other scales was made using Spearman correlation coefficient. Test-
retest reliability was shown to be adequate (ICC=0.882; 0.906), as well as
inter-examiner’s (ICC=0.947; 0.933; 0.962). Good correlations were also found
between Equiscale and BBS (rs=0.8940; p=0.0002), and EDSS (rs=–0.7139;
p=0.0136). Results thus show that the Equiscale Brazilian version presents
APRESENTAÇÃO adequate reliability and validity, proving a useful instrument to assess balance
dez. 2007 in multiple sclerosis patients.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Evaluation; Multiple sclerosis; Musculoskeletal equilibrium;
set. 2008 Validation studies

266 Fisioter Pesq. 2008;15(3):266-72


2008;15(3)
Almeida et al. Equiscala: versão brasileira e validação

INTRODUÇÃO diferentes condições de apoio, bem


como permanecer estável durante e
METODOLOGIA
A esclerose múltipla (EM) é uma após perturbações internas e externas24. A pesquisa foi um estudo prospec-
doença crônica, debilitante causada De todos esses instrumentos, a tivo, em corte longitudinal, para verifi-
pela desmielinização do sistema Equiscale é o único elaborado es- car a confiabilidade e validade da
nervoso central (SNC) e deterioração pecialmente para indivíduos com EM, escala Equiscale. A amostra foi compos-
axonal1,2. Devido à presença da mie- com base em outras duas escalas ta por pacientes portadores de EM
lina em todo o SNC, os indivíduos (Tinetti Gait e EEB). Além de avaliar atendidos no Ambulatório de Fisiote-
com EM podem apresentar fraqueza o equilíbrio estático e antecipatório rapia e Terapia Ocupacional do Hospi-
muscular2,3, espasticidade4,5, desordens dos indivíduos durante a realização de tal de Clínicas da Universidade Estadual
da marcha e do equilíbrio, défices tarefas preestabelecidas, mensura o de Campinas. De 11 pacientes selecio-
sensitivos e de coordenação6, fadiga7 equilíbrio reativo frente a uma pertur- nados, 7 eram do sexo feminino e 4
e piora da qualidade de vida8. A difi- bação externa 23. do masculino. A média de idade foi
culdade na manutenção do equilíbrio
Tesio e colaboradores criaram em de 38 anos. Na avaliação inicial,
está geralmente associada com a per-
1997 a Equiscale alegando que os foram aplicados os instrumentos EEB,
da de mobilidade, sustentação da pos-
testes posturais e de posturografia MIF – Medida de Independência
tura bípede e realização de atividade
dinâmica não exploravam o equilíbrio Funcional e EDSS. Os pacientes apre-
funcionais, além de predispor a quedas9-11.
durante os movimentos usuais em sentaram uma média de 38,5 na EEB,
Na década passada, a atenção era situações do dia-a-dia, quando é muito 121 na MIF e 3,9 na EDSS (Tabela 1).
direcionada à reabilitação do equilíbrio comum a ocorrência de quedas 23. O Foram incluídos pacientes portadores
em pessoas jovens. Recentemente, a teste vem sendo utilizado para avaliar de EM na fase surto-remissiva, faixa
avaliação e o tratamento do equilíbrio resultados terapêuticos nos indivíduos etária de 20 a 60 anos, em ortostase,
e da marcha nos indivíduos com EM com EM15. que não apresentassem outras pato-
tem atraído grande interesse da co- A exigência de abordagens terapêu- logias associadas, obtendo pela escala
munidade científica2,12-14. Embora sejam ticas baseadas em evidências 25 faz de EDSS19 pontuação até 6,5.
consideráveis as pesquisas clínicas crescer o interesse em avaliações ob-
dedicadas à restituição e manutenção jetivas e específicas que reflitam a Todos os sujeitos incluídos no estudo
do equilíbrio e prevenção de quedas15-17 efetividade das técnicas terapêuticas foram informados quanto aos proce-
em indivíduos com EM, poucos são os empregadas nos pacientes com lesões dimentos e assinaram o termo de con-
instrumentos clínicos para avaliar o do SNC18. Dessa forma, este estudo tem sentimento de forma livre e esclarecida;
equilíbrio. A escolha dos instrumentos o objetivo de traduzir e verificar a o estudo foi previamente aprovado
de avaliação deve ser adequada, por validade e a confiabilidade da versão pelo Comitê de Ética e Pesquisa da
parte dos profissionais que lidam com brasileira do teste original Equiscala. instituição.
esses pacientes, buscando medidas
confiáveis, válidas, sensíveis e de fá- Tabela 1 Caracterização da amostra (n=11)
cil aplicabilidade18. Além disso, a uti-
lização de testes clínicos confiáveis Pacientes Sexo Idade (anos) Escore na EEB Escore na MIF Escore na EDSS
contribui para a documentação obje- 1 M 38 43 126 4,5
tiva do progresso de um paciente,
antes e após uma intervenção, bem 2 F 28 54 126 3
como para a troca de informações en- 3 F 40 53 126 3
tre profissionais. 4 F 32 12 105 6
Nos últimos 40 anos, vários instru- 5 M 41 50 126 3,5
mentos de medida vêem sendo criados
e utilizados na esclerose múltipla. A
6 M 31 17 113 6,5
Escala do Estado de Deficiência Ex- 7 F 31 43 126 3
pandida (EDSS) é a mais conhecida e 8 M 53 25 110 4
largamente utilizada para avaliar o
comprometimento e a incapacidade
9 F 42 28 124 3
funcional19, porém não avalia a reação 10 F 37 54 124 3,5
postural. Os instrumentos clínicos uti- 11 F 45 45 125 3
lizados na avaliação do equilíbrio em
indivíduos com EM são: Escala de
Média (dp) 38 (7,33) 38,5 (15,37) 121 (7,75) 3,9 (1,26)
Equilíbrio de Berg (EEB)20, teste clinico M = Masculino;
de equilíbrio em pé21, Dynamic Gait F = Feminino;
Index22 e a Equiscale23. A avaliação do EEB = Escala de Equilíbrio de Berg (escore máximo=56);
equilíbrio deve averiguar a habilidade MIF = Medida de Independência Funcional (escore máximo=126) ;
dos indivíduos de manter-se em pé em EDSS = Escala do Estado de Deficiência Expandida (escore máximo=0)

Fisioter Pesq. 2008;15(3):266-72 267


Quadro 1 Equiscala – Escala de equilíbrio para pacientes com esclerose múltipla (tradução da
Equiscale, elaborada por Tesio et al.23)
Itens Procedimentos Pontuação
0 = necessita de ajuda ou é incapaz de levantar-se
1 Levantar-se Utilizar uma cadeira convencional 1 = utiliza os braços para impulsionar o corpo
2 = levanta-se sem o auxílio dos braços
2 Ficar em pé Levantar-se com os olhos fechados, pés juntos 0 = fica em pé por menos de 5 segundos
com os olhos e braços dobrados à frente do tórax, 1 = fica em pé de 5 a 19 segundos
fechados permanecendo pelo menos 5 segundos em pé 2 = fica em pé por 20 ou mais segundos
3 Ficar em pé
com olhos O mesmo do item anterior, adicionando 0 = fica em pé por menos de 10 segundos
fechados e máxima extensão da cabeça, permanecendo 1 = fica em pé de 10 a 29 segundos
extensão da assim por pelo menos 10 segundos 2 = fica em pé 30 ou mais segundos
cabeça
De pé, com pés juntos e olhos abertos, elevar
os braços à frente na altura dos ombros e 0 = inclina-se menos que 10 cm
4 Inclinar-se inclinar-se à frente; as mãos devem manter-se 1 = inclina-se de 10 a 24 cm
para frente paralelas a uma tira de papel (ou régua) 2 = inclina-se 25 cm ou mais
segurada pelo examinador. Medir o
deslocamento horizontal das mãos
0 = é incapaz de realizar a tarefa
Em pé, com os pés juntos, pegar uma caneta 1 = realiza parcialmente numa primeira
5 Abaixar e tentativa, mas consegue realizar plenamente
posicionada no chão, cerca de 20 cm à frente
pegar em tentativa subseqüente
dos dedos do pé, e voltar à posição em pé.
2 = realiza plenamente a tarefa na primeira
tentativa
Em pé, com os pés juntos e olhos abertos, re- 0 = cai ou dá passos nos três empurrões
6 Resistir a sistir a empurrão sobre o esterno, dado pelo 1 = cai ou dá passos em um ou dois dos três
empurrão examinador. Três vezes em cerca de 15 empurrões
segundos, aguardando alguns segundos entre 2 = fica estável nos três empurrões
um empurrão e outro
0 = é completamente incapaz de realizar a tarefa
Em pé, com olhos abertos e distância livre 1 = é capaz de girar em uma direção em 4
entre os pés, girar o corpo “rapidamente”, no segundos ou mais; não em menos de 4
7 Girar
mesmo lugar. Após cerca de 5 segundos, segundos em cada direção
repetir na direção oposta 2 = é capaz de girar em menos de 4 segundos
em cada direção
Com ambos os pés orientados no sentido
sagital, posicionar o esquerdo, ligeiramente 0 = cai ou tira o pé da posição em menos de 5
deslocado para a esquerda, à frente do direito, segundos, em ambas as posições;
8 Ficar em pé, mantendo a posição. O calcanhar do pé
1 = mantém a posição por no mínimo 5
com um pé esquerdo deve quase tocar os dedos do pé segundos em pelo menos uma das posições;
atrás do outro direito. Pode-se oferecer apoio por alguns
2 = fica em pé no mínimo 15 segundos em
segundos até o paciente equilibrar-se, antes de ambas as posições
iniciar a contagem do tempo. Repetir com o
pé direito à frente.
Pontuação total

268 Fisioter Pesq. 2008;15(3):266-72


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Almeida et al. Equiscala: versão brasileira e validação

Instrumentos Tabela 2 Correlação entre as medições feitas pelos examinadores no teste e


reteste
A Equiscale23 avalia o equilíbrio em Correlação intra-examinador
oito itens, sendo os itens 2, 3 e 8 refe- CCI Limite inferior Limite superior
rentes à posição estática, o item 6
Teste 0,882 0,720 0,963
referente à resistência a perturbações
externas e os itens 1, 4, 5 e 7, à resis- Reteste 0,906 0,770 0,971
tência à própria perturbação, com es- CCI = Coeficiente de correlação intraclasse
cores variando entre zero (não realiza Tabela 3 Correlação entre os valores obtidos pelos três examinadores
a atividade), um (realiza parcialmente)
e dois (realiza normalmente). A pontua- Correlação interexaminador
ção máxima, de 16 pontos, indica um CCI Limite inferior Limite superior
excelente equilíbrio (Quadro 1). Examinador 1 0,947 0,798 0,986
A Escala de Equilíbrio de Berg (EEB) Examinador 2 0,933 0,701 0,983
avalia o desempenho do equilíbrio Examinador 3 0,962 0,870 0,989
funcional em 14 itens comuns à vida CCI = Coeficiente de correlação intraclasse
diária com valor máximo de 56 pontos,
tendo cada item cinco alternativas,
que variam de zero a quatro pontos20.
Procedimentos Análise estatística
Quanto maior a pontuação, melhor o Primeiramente foi realizada a tra- A confiabilidade da Equiscala foi
resultado obtido. dução para o português da Equiscale, testada de duas maneiras: pela corre-
A Medida de Independência Funcio- com base em sua versão original de lação com as demais escalas; e pela
nal (MIF) verifica o desempenho do 199723. A tradução foi feita por dois avaliação da confiabilidade teste-
indivíduo para a realização de um profissionais qualificados e experien- reteste e interexaminador, para men-
conjunto de 18 tarefas, referentes às tes, tendo um deles o inglês como surar a replicabilidade dos escores. A
subescalas de autocuidado, controle língua materna. Posteriormente, foi ver- correlação entre os instrumentos de
esfincteriano, transferências, locomo- tida para o inglês por um terceiro tra- medida foi calculada pelo coeficiente
ção, comunicação e cognitivo-social. dutor, chegando-se a um texto final de de correlação de Spearman (r) para
Cada item pode ser classificado em consenso, que foi mantido (Quadro 1). testar a validade concorrente. A confia-
uma escala de graus de independência
Participaram do treinamento de bilidade teste-reteste e interexaminador
de sete níveis, sendo o zero correspon-
dente à dependência total e o sete cor- avaliação três fisioterapeutas experien- foi verificada em sua pontuação total
respondente à realização de tarefas de tes, treinados por um examinador familia- pelo coeficiente de correlação intra-
forma independente. Sua pontuação rizado com a escala. O treinamento classe (CCI). Foi adotada a seguinte
varia de 18 (totalmente dependente) a consistiu na exposição teórica e práti- classificação do CCI: CCI<0,40 – con-
126 (totalmente independente) pontos ca da Equiscala. No treinamento práti- cordância fraca; CCI<0,75 – concor-
– quanto maior a pontuação, melhor co, os fisioterapeutas assistiram a um dância moderada; e CCI>0,75 con-
o resultado26. videoteipe do examinador experiente cordância adequada 28. O nível de
A Escala do Estado de Deficiência realizando os testes, pontuando e mos- significância adotado para as análises
Expandida (Expanded Disability Status trando os resultados. Em seguida, assis- foi de 5% (p<0,05).
Scale – EDSS), de 10 pontos, visa medir tiram o videoteipe de outros pacientes
a função máxima e as limitações e atribuíram eles próprios as pontua-
resultantes dos défices neurológicos ções, comparando-as às do examinador RESULTADOS
juntamente com a de oito sistemas do videoteipe.
funcionais (piramidal, cerebelar, de O CCI demonstrou uma adequada
A Equiscala foi aplicada de forma concordância intra-examinadores na
tronco cerebral, sensorial, bexiga e
seqüencial pelos três fisioterapeutas: primeira (0,882) e na segunda avalia-
intestino, visual, cerebral e funções
um conduziu e pontuou as avaliações, ção (0,906) (Tabela 2), assim como
variadas), que constituem as altera-
ções neurológicas que podem ser enquanto os outros dois observavam e uma adequada concordância interexa-
atribuídas às lesões19. A pontuação vai pontuavam ao mesmo tempo, porém minadores (variando de 0,933 a 0,962,
de zero (exame neurológico normal) sem comunicação entre si. Os mesmos
Tabela 3).
a 10 (morte devido a esclerose múl- fisioterapeutas avaliaram os pacientes
tipla). Quanto maior a pontuação, pior na primeira e segunda visita, após um Na correlação entre as demais
o prognóstico. O escore menor que 4 tempo médio de 48 horas, para permitir escalas, foi encontrada uma signifi-
indica pouca incapacidade e de 4 a verificar a confiabilidade teste-reteste. cante correlação positiva da Equiscala
10 é fortemente dependente nas inca- Na primeira avaliação, concomitan- com a EEB (rs=0,894, p=0,0002). Isto
pacidades e, principalmente, na temente a essa escala, foram aplica- é, na correlação positiva, o aumento
locomoção 27. das a MIF, a EEB e a EDSS ou diminuição na pontuação de um

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :266-72 269


dos instrumentos é acompanhado pelo se à frente para pegar um objeto e girar instrumento capaz de mensurar a efi-
outro. Já na correlação significante em torno do próprio eixo. Mas também cácia de estratégias terapêuticas apli-
negativa, observada entre a Equiscala demonstra a capacidade da Equiscala cadas e testadas nos pacientes com
e a EDSS (rs=–0,713; p=0,0136), o de avaliar o equilíbrio nesse grupo de EM.
aumento na pontuação em um dos ins- indivíduos. Além disso, soma-se a pre-
A confiabilidade teste-reteste e in-
trumentos é acompanhado pela di- sença do item 6 (resistir a empurrões
terexaminador mostrou-se adequada
minuição no outro, ou vice-versa. Na dado pelo terapeuta) da Equiscala, que
no presente estudo; a Equiscala apre-
correlação entre a Equiscala e a MIF avalia o controle postural reativo, para
sentou-se como uma escala de fácil
não foi observada significância a melhor descrição do equilíbrio desses
aplicabilidade, podendo ser utilizada
(rs=0,501; p=0,1158). pacientes.
na prática clínica dos pacientes com
A Equiscala também demonstrou EM.
DISCUSSÃO boa correlação com a EDSS, que é a
escala mais utilizada para medir o im-
Um outro ponto levantado foi o
tempo gasto com a aplicação da
O comprometimento do funciona- pacto da EM no indivíduo, apesar de
Equiscala, que não foi superior a 10
mento neural na EM conduz à disfun- alguns autores relatarem que a EDSS
minutos. Tesio et al. 23, ao criarem a
ção sensorial e motora, contribuindo não analisa todo o comprometimento
Equiscala, alegaram a necessidade de
assim para os problemas de equilíbrio, da mobilidade32. A coerência entre as
um instrumento de curta aplicação,
coordenação, controle postural e dos duas escalas mostra a efetividade de
para evitar fadiga dos pacientes. Se-
mecanismos da marcha 21 . Por esses utilizar a Equiscala nas avaliações
gundo esses autores, os indivíduos com
comprometimentos e pela perda de práticas, já que a EDSS auxilia na ca-
EM são propensos a mudanças em seus
força muscular nos membros inferiores, racterização da disfunção neurológica
desempenhos em testes muito longos
a prevalência de quedas é elevada11,29. e na correlação com outros parâme-
e demorados – embora, três anos mais
tros, como disfunção psicológica, du-
Como o desequilíbrio é um dos tarde, Frzovic et al.21 tenham relatado
ração e forma clínica da doença33.
sintomas mais comuns e de maior que a fadiga parece não comprometer
incapacidade nos pacientes com EM11, Entre a Equiscala e a MIF não foi o desempenho de pacientes com EM
torna-se necessário avaliar o equilíbrio e encontrada relação significante, con- em testes de equilíbrio.
analisar o impacto que esse sintoma tem tradizendo estudos anteriores, que
Justamente, uma das vantagens da
nas atividades de vida diária, além de apontam a MIF como o melhor instru-
Equiscala é sua estrutura, que verifica
ajudar na elaboração de um tratamento mento para predizer as necessidades
aspectos importantes em poucos itens.
fisioterapêutico adequado. de assistência física ao paciente com
Mensura o controle postural estático,
EM 34. Na avaliação de alguns itens
Um dos objetivos do estudo foi tra- avaliado pela manutenção da postura
motores (mobilidade – transferência e
duzir a Equiscala, respeitando aspec- no apoio uni ou bipodal contra a ação
locomoção) da MIF, é observado um
tos da equivalência experimental ou da gravidade; e avalia a manutenção
conjunto de ações motoras que deman-
cultural vivida pela população à qual do equilíbrio frente a perturbações
dam a integridade de todos os sistemas
se destina. Para sua reprodução na geradas interna e externamente. As
envolvidos com o controle postural –
língua portuguesa foram preservadas perturbações geradas internamente
mas não se observam algumas estra-
todas as tarefas propostas na versão são avaliadas em tarefas que solicitam
tégias motoras compensatórias, que
original em inglês, sem necessidade o planejamento antecipatório, como
podem ser utilizadas no ajustamento
de alteração de qualquer natureza. o teste de alcance funcional. Este teste
postural desses pacientes. Aliado a
Após a tradução da Equiscala, foi pos- sozinho é capaz de discriminar os
isso, muitos dos itens motores e cogni-
sível perceber sua adequação quanto défices de equilíbrio entre indivíduos
tivos da MIF podem ser realizados na
à reprodução e quanto à aplicação nos normais daqueles com desordens do
ausência de controle postural apurado,
pacientes avaliados. movimento, além de refletir a habili-
sugerindo a necessidade de instru-
dade em realizar tarefas que incorpo-
Quando se observa a relação da mentos específicos para o equilíbrio
ram o alcance e preensão de objetos
Equiscala com as demais medidas que nos pacientes com EM.
posicionados a uma distância maior
avaliam a EM, encontramos uma boa
Dificilmente, um único teste clínico que o comprimento do braço 21 . O
correlação com a EEB. Isso é impor-
é capaz avaliar todos os sistemas en- equilíbrio reativo é avaliado na
tante, pois a EEB é um instrumento
volvidos no complexo mecanismo de Equiscala pelos “empurrões” produzi-
amplamente utilizado na avaliação de
controle do equilíbrio35. Além disso, a dos pelo examinador. As três principais
equilíbrio, com confiabilidade e vali-
avaliação do equilíbrio deve incorpo- estratégias de movimento (tornozelo,
dade estabelecidas para a EM30, 31.
rar protocolos que testam a habilidade quadril e passo) que podem ser utili-
A boa validade concorrente da de uma pessoa manter o equilíbrio na zadas para retornar ao equilíbrio na
Equiscala e EEB pode ser decorrente postura sentada e bípede sobre diferen- posição em pé só são realizadas ade-
da presença de itens que se repetem tes condições, permanecendo estável quadamente se todos os componentes
nos dois instrumentos, como mover-se durante e após perturbações internas e do controle postural estiverem íntegros,
da posição sentada para de pé, inclinar- externas24. Para esse fim, buscamos um incluindo as regiões corticais respon-

270 Fisioter Pesq. 2008;15(3):266-72


2008;15(3)
Almeida et al. Equiscala: versão brasileira e validação

sáveis pelo processamento e integração sentava quedas daquele que não apre- e validade concorrente com a EDSS e
sensório-motora – as quais freqüente- sentava. EEB, não apresentando boa correlação
mente apresentam, em pacientes com com a MIF. Este estudo permitiu veri-
EM, placas escleróticas que podem ficar que a Equiscala, versão brasileira
levar a falhas na seleção e modulação CONCLUSÃO do Equiscale, tendo preenchido os cri-
das respostas35. Além disso, Cattaneo térios de reprodutibilidade, é fidedigna
et al.11 demonstraram que a Equiscala Os resultados indicam que a Equis- e apta a ser utilizada nas avaliações
permitiu distinguir de forma significa- cala apresenta adequada confiabili- de deficit de equilíbrio em indivíduos
tiva o grupo de indivíduos que apre- dade teste-reteste e interexaminador, com esclerose múltipla.

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Análise qualitativa dos efeitos da sonoforese com Arnica montana


sobre o processo inflamatório agudo do músculo esquelético de ratos
Qualitative analysis of effects of phonophoresis with Arnica montana
onto acute inflammatory process in rat skeletal muscles
Patrícia Pereira Alfredo1, Carlos Alberto Anaruma2, Antônio Carlos Simões Pião3,
Sílvia Maria Amado João4, Raquel Aparecida Casarotto4

Estudo desenvolvido no RESUMO: Este estudo visou verificar o efeito da sonoforese com Arnica montana
Programa de Pós-Graduação em sobre a fase inflamatória aguda de uma lesão muscular. Para isso, 40 ratos
Ciências da Reabilitação do Wistar machos, lesados cirurgicamente, foram divididos em 4 grupos: controle
Fofito/ FMUSP – Depto. de (C), 10 ratos lesados e não tratados; grupo ultra-som (US), 10 lesados, tratados
Fisioterapia, Fonoaudiologia e com US; grupo ultra-som com arnica (US+A), 10 ratos lesados, tratados com
Terapia Ocupacional da sonoforese de gel de arnica; grupo arnica (A), 10 ratos lesados, tratados com
Faculdade de Medicina da massagem de gel de arnica. O tratamento dos três grupos foi iniciado 24h
Universidade de São Paulo, São após a lesão, sendo aplicado uma vez ao dia durante 3 minutos, por três dias.
Paulo SP, Brasil Quatro dias após a lesão, os animais foram sacrificados e o terço médio do
1 músculo tibial anterior lesado foi removido e tratado histologicamente. Os
Fisioterapeuta Ms.; doutoranda
no Programa de Pós-Graduação resultados da análise qualitativa mostram que, no grupo C, formou-se um intenso
em FisioPatologia Experimental infiltrado de células inflamatórias no espaço intersticial e um processo de
do Fofito/FMUSP regeneração apenas iniciado. Nos grupos US e US+A foi detectado um avançado
processo inflamatório, com tecido conjuntivo mais organizado e consistente.
2
Prof. Dr. do Depto. de No grupo A foi detectada diminuição no número de células inflamatórias e
Educação Física, Instituto de uma desorganização em sua disposição, o que poderia levar a um atraso no
Biociências, Unesp – processo de regeneração. Conclui-se que os grupos que receberam a aplicação
Universidade Estadual Paulista, do ultra-som e ultra-som com arnica apresentaram semelhante aceleração do
Rio Claro, SP, Brasil processo inflamatório agudo, sugerindo ineficácia da sonoforese quando
3
comparada à aplicação de apenas ultra-som.
Prof. Dr. do Depto. de
Estatística, Matemática DESCRITORES: Arnica; Fonoforese; Músculo esquelético/anatomia & histologia;
Aplicada e Computacional da Terapia por ultra-som
Unesp - Rio Claro
ABSTRACT: This study aimed at verifying the effects of phonophoresis associated
4
Profas. Dras. do Curso de to Arnica montana on the acute phase of an inflammatory muscle injury. Forty
Fisioterapia do Fofito/FMUSP Wistar male rats of which the Tibialis Anterior muscle was surgically lesioned,
were divided into 4 groups (n=10 each): control group received no treatment;
ENDEREÇO PARA the ultrasound group (US), treated with US; the US+A group was treated with
CORRESPONDÊNCIA arnica phonophoresis; and the arnica group (A) received massage with arnica
gel. Treatment for the three groups started 24 h after surgical injury and lasted
Patrícia Pereira Alfredo
3 days, being applied during 3 minutes once a day. On the 4th day after lesion
R. Profa. Gioconda Mussolini 23
Edifício Felipe apto. 11 Jardim animals were sacrificed and sections of the injured, inflamed muscle were
Risso removed for histological analysis. Results showed, in C group, an intense
05587-120 São Paulo SP infiltrate of inflammatory cells and an only incipient regeneration process; in
e-mail: patriciaalfredo@usp.br both US and US+A groups an advanced inflammatory process was noticed,
with organized and thick conjunctive tissue. In A group a reduced number of
ill-arranged inflammatory cells was detected, which might lead to delays in
the regeneration process. Since both US and US+A groups showed similar
acceleration of the acute inflammatory process, it may be inferred that arnica
APRESENTAÇÃO phonophoresis did not have extra healing effect, hence is inneffective when
fev. 2008 compared to ultrasound alone.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Arnica; Muscle, skeletal/anatomy & histology; Phonophoresis;
set. 2008 Ultrasonic therapy

Fisioter Pesq. 2008;15(3) : 273- 9 273


INTRODUÇÃO pele13, aplicando o US com freqüências
terapêuticas (1 a 3 MHz). Porém, o
METODOLOGIA
O músculo esquelético é um tecido aumento dos níveis do transporte de Foram utilizados 40 ratos da linha-
sujeito a lesões em função das solici- drogas através da pele foi observado gem Wistar, machos, sedentários,
tações exigidas pelas atividades da somente com drogas específicas 14 . pesando em média 300±50 g, com 90
vida diária e esportiva. A inflamação Devido à grande variação entre as dias de vida. Esses animais foram
é um processo importante para a re- drogas, ainda existem controvérsias obtidos no Biotério Central da UNESP-
generação do tecido lesado, mas sua sobre a eficácia da sonoforese em Botucatu e mantidos no Biotério do
continuidade é sempre considerada aumentar a penetração de drogas atra- Laboratório de Biodinâmica do Depar-
indesejável 1 . A morbidade estrutural vés da pele. Uma explicação para essa tamento de Educação Física do Insti-
e funcional ocorre na forma de atrofia, variação foi apresentada recentemen- tuto de Biociências da Unesp - Rio
contraturas, dor e aumento da proba- te baseada nas diferenças das proprie- Claro, em gaiolas coletivas com no
bilidade de se ter uma recidiva2. dades físico-químicas das drogas, por máximo cinco ratos, que foram ali-
exemplo, lipofilicidade e peso mole- mentados com ração balanceada para
A efetividade dos cuidados clínicos roedores (Labina), com 23% de proteí-
com tecidos estressados ou traumati- cular14.
na e água ad libitum, em condições
zados depende de um bom entendi- A Arnica montana é uma planta da ambientais controladas (12 horas de
mento dos eventos celulares e mole- família Asteraceae utilizada como ciclo claro/escuro; ambiente higieni-
culares que levam a uma resposta medicamento homeopático. É usada zado; temperatura a 25°C e ventilação
fisiológica como a inflamação. A inter- topicamente para o tratamento de controlada).
venção precoce pode oferecer estra- contusões, distensões musculares,
tégias benéficas para minimizar as al- Os ratos foram divididos aleatoria-
alívio da dor e edema, cicatrizações,
terações morfofuncionais após a lesão mente em quatro grupos (n=10 em
afecções bucais, entre outras15. Seus
tecidual, facilitar o reparo e a recu- cada): grupo controle (C) – sofreram
princípios ativos são lactonas sesquiter- lesão muscular, mas não foram subme-
peração da função. pênicas (arnicolide, helenalina e dihidro- tidos a qualquer tratamento; grupo
O ultra-som terapêutico (US) é um helenalina), flavonóides (incluindo quer- ultra-som (US) – sofreram lesão mus-
recurso usado no tratamento de uma citina e seus derivados como quercitina- cular e foram tratados com ultra-som;
variedade de situações, incluindo aí 3-mono-glucosídeo e quercitina-3- grupo sonoforese de arnica (US+A) –
a bioestimulação do reparo tecidual3-6, glicogalacturônico), álcoois (arnidiol, sofreram lesão muscular e foram
tendo um efeito de promover a cascata arnilenediol, isoarnilenediol), caro- tratados com ultra-som e gel de arnica;
de cicatrização. De acordo com al- tenóides, óleo essencial, ácido fenil- e grupo arnica (A) – sofreram lesão
guns autores7-9, o US pode facilitar a carboxilico, entre outros16. As lactonas muscular e foram tratados com mas-
penetração de agentes antiinflama- sesquiterpênicas, especialmente os sagem de gel de arnica.
tórios aplicados topicamente sobre a ésteres helenalina e dihidro-helenalina,
pele – em uma técnica chamada de são os principais princípios ativos da O experimento foi aprovado pela
fonoforese ou sonoforese. A rota trans- Comissão de Ética do Hospital das
Arnica montana, sendo responsáveis
dérmica de aplicação de agentes Clínicas da Faculdade de Medicina da
por sua atividade antiinflamatória, o
antiinflamatórios apresenta vantagens Universidade de São Paulo.
que foi comprovado por vários estudos
em relação à administração oral, pois, in vitro e in vivo15,17,18. Wagner et al.19
na aplicação tópica, a droga age dire- concluíram que uma quantidade su- Procedimentos
tamente sobre a área inflamada, evi- ficiente de lactonas sesquiterpênicas
tando os riscos dos efeitos colaterais Os animais foram anestesiados com
penetra a barreira da pele, gerando
causados pelo metabolismo hepático pentobarbital sódico a 2%, pesados e
efeitos antiinflamatórios. tricotomizados na pata posterior
e/ou sistêmico10.
O conhecimento da eficácia da direita. A pele foi seccionada, o mús-
No entanto, o transporte transdér- aplicação via subcutânea de drogas culo tibial anterior (TA) e sua fáscia
mico de moléculas é limitado devido antiinflamatórias, utilizando-se os foram expostos. Nestes foi feito um
à baixa permeabilidade do extrato efeitos da sonoforese, pode trazer corte de 3 mm de largura por 3 mm
córneo da pele11. Embora o US o faci- de profundidade com auxílio de uma
informações importantes que au-
lite, vários estudos têm mostrado que lâmina de bisturi, de maneira a seccio-
xiliariam na escolha da técnica na
o aumento da permeabilidade do nar as fibras transversalmente no terço
prática clínica. Como a arnica vem
extrato córneo causado pelo US é médio do músculo. Nessas condições,
sendo utilizada topicamente de forma o diâmetro da área lesada foi consi-
mediado pela cavitação acústica. A significativa em afecções do sistema
cavitação instável seria responsável derado como de 0,5 cm². Feita a lesão,
musculoesquelético e nenhum estudo a pele foi suturada e no local foi feita
pelo aumento da permeabilidade da verificou seus efeitos com a sonoforese assepsia com álcool 70%. Durante os
pele 12. em lesões musculares, o objetivo deste dois primeiros dias, foram oferecidas
Alguns estudos constataram o efeito trabalho foi avaliar a eficácia da sono- 20 gotas de dipirona sódica diluída em
da sonoforese aumentando a penetra- forese com Arnica montana na fase meio litro de água para todos os
ção de pequenas moléculas através da aguda da lesão muscular. animais.

274 Fisioter Pesq. 2008;15(3):273-9


2008;15(3)
Alfredo et al. Sonoforese com arnica em lesão muscular

Neste experimento foi usado um em nitrogênio líquido, onde foi man- ram sua regeneração e entre fragmen-
aparelho gerador de ondas ultra-sônicas tido e conservado. Os músculos foram tos necróticos das fibras em estado de
modelo Sonacel (da Bioset Indústria congelados em uma posição onde os degeneração (Figura 3US). Próximo à
de Tecnologia Eletrônica Ltda.), tendo cortes puderam oferecer imagens trans- borda da lesão havia células fusiformes
o cabeçote área de radiação efetiva versais e longitudinais das fibras em proliferação, sugerindo o início da
de 0,5 cm2. Antes de ser utilizado, o musculares e da fenda incisional. formação e diferenciação das células
aparelho foi calibrado em uma ba- satélites em mioblastos (Figura 4US).
Para análise morfológica das fibras Nesse grupo pôde ser notada maior
lança radiométrica Ultrasound Power
musculares e do tecido conjuntivo espessura da rede de fibrina (Figura
Meter com precisão de ±20 mW. A
adjacente, foram realizados cortes 2US), quando comparada à do grupo
área do transdutor foi de 1 cm² e o
seriados com a espessura de 10 µm, controle, e a presença de células gi-
tipo de cristal gerador de ultra-som foi
a cerâmica PZT. A fim de excluir o ar obtidos em um criótomo (Criostato) a gantes multinucleadas (Figura 1US),
entre as interfaces, evitando assim a – 25º C. Colheram-se uma série de que sugere a ocorrência intensa de fa-
reflexão da onda ultra-sônica21, foram amostras da região superficial da lesão gocitose, acelerando o processo infla-
utilizados como agentes acopladores e, a partir daí, mais duas séries loca- matório.
500 mg de gel hidrossolúvel comercial lizadas a 200 µm de profundidade da
outra. Cada série de corte forneceu No músculo dos animais do grupo
ou gel de arnica, dependendo do grupo. sonoforese de arnica (ultra-som com
três lâminas, que foram coradas com H/
O gel de arnica utilizado é co- E (hematoxilina-eosina). Foi feita a arnica, US+A), o tecido conjuntivo
mercializado pelo Herbarium Labora- documentação fotográfica das lâminas recém-formado na fenda incisional
tório Botânico Ltda., preparado com em fotomicroscópio Zeiss, para registrar apresentou-se preenchido por infiltrado
tintura de Arnica montana. A dosagem as alterações morfofuncionais da lesão. inflamatório (Figura 1US+A). Os
utilizada foi a recomendada pela leucócitos aderidos à espessa rede de
Anvisa – Agência Nacional de Vigi- Foi feita análise qualitativa de 10 fibrina já estavam picnóticos, com sua
lância Sanitária 20, que preconiza a campos por amostra, totalizando 100 atividade fagocítica esgotada, mos-
aplicação tópica de uma dose diária campos por grupo experimental. trando estado relativamente avançado
de 1 mg/ml de lactonas sesquiterpêni- de degeneração (Figura 2US+A). Na
região próxima à fenda incisional
cas. Cada grama do gel de arnica con-
tém 200 mg de tintura. Considerando RESULTADOS nota-se a presença de infiltrado infla-
a composição do gel, foram aplicados matório composto predominantemen-
A análise histológica das lâminas
em cada sessão 500 mg do gel. te por células polimorfonucleares do
mostrou que o interior da fenda in-
tipo neutrófilo (Figura 3US+A) e, na
Os animais dos grupos submetidos cisional produzida pela lesão cirúrgica
matriz do tecido conjuntivo, por célu-
ao US foram tratados 24 horas após a e o tecido intersticial ou conectivo,
las mononucleadas como macrófagos,
cirurgia, com os seguintes parâmetros: próximo dos segmentos seccionados,
plasmócitos, mastócitos e fibroblastos
freqüência de 1 MHz, intensidade de estavam preenchidos por uma deli-
cada rede de fibrina e por um rico (Figura 4US+A).
0,5 w/cm2 (média temporal e espacial),
modo pulsado 1:2 (2 ms on e 4 ms off, infiltrado de células inflamatórias. No grupo Arnica, além de algumas
50%), com cada sessão de aplicação No grupo controle, as extremidades células polimorfonucleares e mono-
tendo 3 minutos. No grupo arnica, das fibras musculares seccionadas e nucleares (Figuras 1A e 3A), surgiram
foram aplicados 500 mg de gel de com morfologia comprometida apre- fibroblastos aderidos à rede de fibrina
arnica em massagem sobre a área sentaram núcleo centralizado e gru- (Figuras 1A e 2A) bem como leitos
lesada durante 3 minutos. Para a pamentos de células fagocíticas em vasculares, o que não se repetiu nos
aplicação do US e da arnica, todos os atividade (Figura 1C). Na borda da outros grupos. Esses são espaços sem
animais foram anestesiados com lesão, um infiltrado de células infla- formação de células endoteliais, por
pentobarbital sódico a 2%. A aplica- matórias apresentou-se intenso, che- onde passa o sangue durante a fase
ção foi feita uma vez ao dia, durante gando a atingir todo o espaço intersticial de reparo. Na região onde as fibras
três dias. Os animais foram sacrifica- dessas fibras musculares (Figura 3C); musculares foram seccionadas, os
dos 24 horas após a última aplicação. no interior, surgiu uma fina rede de fragmentos necróticos foram tomados
fibrina (Figura 2C). Pôde-se observar por numerosos leucócitos, como neu-
Os animais foram submetidos à
também inúmeras células fusiformes trófilos e macrófagos em atividade
eutanásia no 4o dia após a lesão com
indiferenciadas, sugestivas de serem fagocitária. No delicado tecido con-
dose letal de 20mg/100g de pentobar-
células satélites e fibroblastos em juntivo que começou a se formar nota-
bital sódico. O músculo TA dos dife-
proliferação (Figura 4C). se que células inflamatórias, fibroblas-
rentes grupos experimentais foi remo-
vido e seu terço médio, local da lesão, Nas lâminas do grupo ultra-som, o tos e células satélites estavam distribuí-
colhido e colocado em um suporte de tecido conjuntivo mostrou-se mais das de maneira desordenada (Figura
cortiça com a ajuda de um meio de organizado e consistente, sendo que 4A), o que poderia dificultar a organi-
inclusão para congelamento (Tissue a fenda da lesão, diferente do grupo zação dos mioblastos no sentido longi-
Tec). Após esta etapa, foi envolvido controle, apresentava pequenos vasos tudinal do eixo das fibras, atrasando ou
em talco mineral para ser criofixado sangüíneos entre as fibras que inicia- prejudicando a formação de miotubos.

Fisioter Pesq. 2008;15(3) : 273- 9 275


Figura 1 Fotomicrografia de músculo tibial anterior de rato dos grupos controle (C), ultra-som (US), sonoforese de arnica
(US+A) e arnica (A): aspectos gerais
C: fibra muscular lesada com núcleos centralizados; US: células gigantes multinucleadas; US+A: infiltrado
inflamatório em meio ao tecido necrótico; A: fibroblastos (seta grossa) entre células polimorfonucleares (seta
curta) e mononucleares (seta fina)

Figura 2 Fotomicrografia de músculo tibial anterior de rato dos grupos controle (C), ultra-som (US), sonoforese de arnica
(US+A) e arnica (A): rede de fibrina
US+A: rede de fibrina com leucócitos picnóticos

Figura 3 Fotomicrografia de músculo tibial anterior de rato dos grupos controle (C), ultra-som (US), sonoforese de arnica
(US+A) e arnica (A): infiltrado inflamatório C: intenso; US: fibras em necrose com presença de vaso muscular

276 Fisioter Pesq. 2008;15(3):273-9


2008;15(3)
Alfredo et al. Sonoforese com arnica em lesão muscular

Figura 4 Fotomicrografia de músculo tibial anterior de rato dos grupos controle (C), ultra-som (US), sonoforese de arnica
(US+A) e arnica (A): processo de regeneração
C: células fusiformes indiferenciadas; US: células fusiformes em proliferação; US+A: fibroblastos; A:
fibroblastos (seta fina) e células satélites (seta curta) distribuídas desordenadamente

DISCUSSÃO E cular, apresentou um infiltrado inflama-


tório intenso entre as fibras musculares
foram observados no grupo controle.

CONCLUSÃO seccionadas (Figura 3C), sendo tam-


No grupo arnica, verificou-se um
menor número de neutrófilos no sítio
bém observada a presença de células da lesão, quando comparado ao grupo
Como os neutrófilos e macrófagos fusiformes sugestivas de serem células
são as principais células de um pro- controle. Isso pode ser justificado pela
satélites e fibroblastos em proliferação ação antiinflamatória dos princípios
cesso inflamatório agudo22-25, decidiu-
(Figura 4C). Esse achado é semelhan- ativos da arnica, a helenalina e dihidro-
se verificar neste estudo sua presença
te ao de Hawake e Garry24, segundo helenanina. Estas inibem o fator de
após os tratamentos recebidos.
os quais as células satélites começam transcrição NF-kB que regula a trans-
Devido ao fato de o aumento da per- a se diferenciar em mioblastos e mio- crição de várias citocinas inflamatórias,
meabilidade do extrato córneo da epi- túbulos 96 h após uma lesão. inibindo assim a migração e quimio-
derme ser causado pelo efeito não-térmico taxia de neutrófilos e, em grande dose,
de cavitação do US, foi escolhida a O grupo ultra-som apresentou uma
a síntese de prostaglandinas32,33. Sabe-
modalidade de aplicação pulsada. quantidade maior de células inflama-
se que a atuação de um antiinflama-
Love e Kremkau 26 mostraram que o tórias no sítio da lesão quando com-
tório por um período prolongado de
tratamento com US pulsado poderia parado ao grupo controle. Esses dados
tempo pode levar a um atraso na re-
causar um aumento menor do que corroboram os de Speed30, Kitchen e
cuperação e perda funcional em
0,5°C com 10 minutos de exposição. Partridge31, mostrando a capacidade de
animais lesados 34 . O grupo arnica
o US acelerar as fases da inflamação, apresentou características histológicas
Foi escolhida a freqüência terapêu- fazendo com que a fase de reparo seja
tica do transdutor de 1 MHz, para que que sugerem a possibilidade de haver
adiantada em relação ao controle. A um atraso no reparo tecidual, tais
pudesse alcançar o tecido muscular.
análise do padrão histológico revela como a distribuição desordenada de
A intensidade aplicada foi de 0,5 w/cm2,
que o tecido conjuntivo começou a células inflamatórias, fibroblastos e
baseada nos resultados obtidos e
se organizar com mais consistência e células satélites, que podem dificultar
analisados por Enwemeka et al. 27
a rede de fibrina apresentou-se mais a organização dos mioblastos no
(1990), Gan et al.28 e Cunha et al. 5,
espessa, porém em menor extensão sentido longitudinal das fibras e atrasar
que apóiam o uso de intensidades de
0,5 w/cm2 ou menores para obter taxas (Figura 2US). A presença de células a formação dos miotubos, que rara-
máximas de regeneração em tecidos. gigantes multinucleadas, que nada mente foram encontrados nesse grupo
mais são do que macrófagos fundidos (Figura 4A).
O tratamento foi iniciado 24h após (Figura 1US), demonstra a intensa O grupo ultra-som+arnica não apre-
a lesão para maximizar o efeito de atividade fagocítica na região. Nessa sentou diferenças morfológicas quan-
regeneração do tratamento com o US etapa, iniciou a regeneração das fibras do comparado ao grupo ultra-som: em
pois, segundo Markert et al.29, o início lesadas (Figura 3US) com o conse- ambos apresentou-se o mesmo efeito
do tratamento antes das primeiras 24h qüente aumento da presença de célu- pró-inflamatório, acelerando a chega-
poderia levar ao aumento da ação las satélites. Esse fato pode ser um da das células inflamatórias ao local
degenerativa dos neutrófilos.
indicativo de aumento na velocidade da lesão; em ambos, a rede de fibrina
Observou-se neste estudo que o de formação e diferenciação dos apresentou-se mais espessa; os leucó-
grupo controle, 96 h após a lesão mus- mioblastos (Figura 4US). Esses dados não citos encontravam-se em avançado

Fisioter Pesq. 2008;15(3) : 273- 9 277


estado de degeneração ou picnóticos, Por outro lado, o grupo que recebeu Com base nesses achados, pode-se
o que aponta para uma eventual ace- a aplicação tópica de arnica apre- concluir que os grupos que receberam
leração do processo de regeneração. sentou uma diminuição na chegada de aplicação do ultra-som e de ultra-som
Esses achados apontam para a inefi- com arnica apresentaram um similar
neutrófilos, que são células importan-
cácia da sonoforese com arnica, na estado avançado de regeneração do
medida em que a similaridade dos tes no processo inflamatório, além de
tecido lesado, com aceleração do
resultados entre sonoforese e apenas uma desorganizada distribuição das processo inflamatório agudo, sugerindo
ultra-som mostra que o gel de arnica células envolvidas nesse processo, o ineficácia da sonoforese quando
aplicado com ultra-som não produziu que poderia causar um atraso na comparada à aplicação de apenas
nenhum efeito antiinflamatório a mais. regeneração tecidual. ultra-som.

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Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.280-4, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Efeito da acupuntura na melhora da dor, sono e qualidade de vida


em pacientes fibromiálgicos: estudo preliminar
Effect of acupuncture on pain, sleep and quality of life improvement
in fibromyalgia patients: preliminary study
Raymond S. Takiguchi1, Vanessa Satie Fukuhara2,
Juliana Ferreira Sauer3, Ana Assumpção4, Amélia Pasqual Marques5

Estudo desenvolvido no Curso RESUMO: A fibromialgia é uma síndrome definida por dor crônica generalizada e
de Fisioterapia do Fofito/ em pelo menos 11 dos 18 tender points, pontos dolorosos específicos. Este
FMUSP – Depto. de ensaio clínico randômico visou verificar a eficácia da acupuntura na melhora
Fisioterapia, Fonoaudiologia e da dor, sono e qualidade de vida de pacientes fibromiálgicas. Dentre 20
Terapia Ocupacional da mulheres com média de idade 44 anos, com diagnóstico de fibromialgia
Faculdade de Medicina da segundo critérios do Colégio Americano de Reumatologia, finalizaram o estudo
Universidade de São Paulo, São 12, distribuídas aleatoriamente em dois grupos: A (GA, n=5), que recebeu
Paulo SP, Brasil acupuntura segundo a medicina tradicional chinesa; e B (GB, n=7), que teve
1
Fisioterapeuta acupunturista a inserção de agulhas nos tender points base do occipital, trapézio,
supraespinhoso e epicôndilo lateral. A dor foi avaliada por escala visual
2
Fisioterapeuta analógica e dolorimetria; o sono, pelo Inventário do Sono; e a qualidade de
vida, pelo Questionário de Impacto da Fibromialgia (QIF). Os grupos receberam
3
Fisioterapeuta; mestranda em acupuntura uma vez por semana, durante oito semanas, com inserção de oito
Ciências da Reabilitação no agulhas por 25 minutos. Os dados foram tratados estatisticamente, adotando-
Fofito/FMUSP se o nível de significância α=0,05. No GA, houve melhora estatisticamente
4
significante do sono; e no GB, na dor, limiar de dor nos tender points, no sono
Fisioterapeuta; doutoranda em e nos itens do QIF dor, cansaço matinal, ansiedade e depressão (p<0,05). Os
Fisiopatologia Experimental na resultados sugerem que a acupuntura, especialmente com inserção de agulhas
FMUSP
nos tender points, promove a diminuição da dor e melhora da qualidade de
5
Profa. Dra. Assoc. do Fofito/ vida e do sono em indivíduos com fibromialgia.
FMUSP DESCRITORES: Dor; Fibromialgia/reabilitação; Qualidade de vida; Terapia por
acupuntura
ENDEREÇO PARA
CORRESPONDÊNCIA ABSTRACT: Fibromyalgia is a syndrome defined by chronic widespread pain and
sensitivity to pressure at at least 11 of 18 tender points. The aim of this random
Raymond S.Takiguchi – Fofito/ blind clinical trial was to assess the effectiveness of acupuncture on pain
FMUSP relief, on quality of sleep and life in fibromyalgia patients. From 20 female
R. Cipotânea 51 Cidade fibromyalgic patients (diagnosed according to the American College of
Universitária
05360-160 São Paulo SP Rheumatology), mean aged 44 years, 12 completed the study, randomly
e-mail: raym.st@gmail.com assigned into two groups: group A (GA, n=5) received acupuncture according
to the traditional Chinese medicine; and group B (GB, n=7) received acupuncture
Este estudo contou com bolsa at eight tender points: at the occiput, trapezius muscle, supraspinatus muscle,
de iniciação científica do and lateral epicondyle. Pain was assessed by a visual analogue scale and by
CNPq dolorimetry; quality of life, by the Fibromyalgia Impact Questionnaire (FIQ);
and sleep, by the Post Sleep Inventory. Both groups received acupuncture once
a week for eight weeks, with insertion of eight needles for 25 minutes. Data
were statistically analysed and significance level set at α=0.05. Results show
significant sleep improvement in GA; and, in GB, lesser pain as detected by
VAS, higher pain threshold on tender points, better sleep and improvement in
APRESENTAÇÃO FIQ items pain, morning tiredness, anxiety, and depression (p<0.05). These
fev. 2008 data suggest that acupuncture, especially that with tender point needle insertion,
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO provides pain relief, better quality of life and of sleep in fibromyalgic patients.
set. 2008 KEY WORDS: Acupunture therapy; Fibromyalgia/rehabilitation; Pain; Quality of life

280 Fisioter Pesq. 2008;15( 3):280-4


2008;15(3)
Takiguchi et al. Acupuntura na fibromialgia

INTRODUÇÃO METODOLOGIA A dor foi avaliada por uma escala


analógica visual da dor (EVA)9 – uma
Fibromialgia (FM) é definida como O estudo foi idealizado como um reta de 10 centímetros de comprimen-
dor musculoesquelética generalizada ensaio clínico randomizado, realizado to desprovida de números com as
e crônica com sensibilidade dolorosa no Ambulatório de Fisioterapia em Fi- indicações “ausência de dor” e “dor
em pelo menos 11 dos 18 tender points. bromialgia do Hospital das Clínicas insuportável” nos extremos; e pela do-
(HC) da Faculdade de Medicina da lorimetria, que avalia o limiar de dor
Sintomas associados freqüentes são
Universidade de São Paulo. O projeto dos 18 tender points, utilizando-se o
depressão, ansiedade, distúrbios do
foi aprovado pela Comissão de Ética dolorímetro de Fischer (algômetro de
sono, entre outros, gerando um grande pressão)10.
do Hospital das Clínicas e todos os
impacto na qualidade de vida1,2. Afeta
participantes assinaram o termo de A qualidade de vida foi avaliada
principalmente mulheres1. Apesar de consentimento livre e esclarecido.
inúmeras pesquisas sobre sua relação pelo Questionário de Impacto da
com distúrbios neurológicos e/ou quí- Foram selecionadas 20 pacientes do Fibromialgia (QIF) validado para a
micos, a fibromialgia ainda é consi- Ambulatório de Reumatologia do HC população brasileira11, no qual o maior
com diagnóstico de fibromialgia se- escore corresponde ao maior impacto
derada de etiologia desconhecida,
gundo critérios do Colégio Americano da fibromialgia na qualidade de vida
com diagnóstico essencialmente clí-
de Reumatologia1, sendo randomiza- relacionada à saúde.
nico, sendo o tratamento voltado ao das em dois grupos: o grupo A recebeu
controle dos sintomas3,4. O sono foi avaliado pelo Inventário
acupuntura segundo a medicina tra-
do Sono (IS, em versão traduzida e
A fisioterapia tem sido utilizada dicional chinesa, com a escolha dos
adaptada para o português do original
como forma de controle da dor e dos pontos seguindo o diagnóstico próprio
de Bonnet e Webb 12); solicita-se ao
sintomas, com impacto positivo nas ati- da técnica, baseada nas Síndromes dos
paciente graduar cada item em uma
Zang Fu8; o grupo B recebeu a inserção
vidades diárias. Os exercícios físicos, escala analógica visual, somando-se
de agulhas nos seguintes tender points:
principalmente aeróbicos de baixa os pontos para o escore final – que,
base do occipital, trapézio, supraespi-
intensidade, auxiliam o relaxamento quanto mais elevado, indica melhor
nhoso e epicôndilo lateral, visando a
e fortalecimento muscular, reduzindo supressão da dor. Foram critérios de qualidade do sono.
a dor e melhorando a qualidade do inclusão: ter idade entre 35 e 60 anos Pacientes do grupo A também foram
sono5. Entre os tratamentos disponíveis, e ser do sexo feminino; os critérios de submetidas ao diagnóstico pulsológico
as terapias alternativas e complemen- exclusão foram: presença de outras tradicional da medicina tradicional
tares são muito utilizadas, com a pro- doenças reumatológicas, mulheres chinesa8, que se caracteriza pela veri-
cura chegando a 98% dos portadores durante período gestacional, falta a ficação do pulso radial, posicionando
em países desenvolvidos, como nos três sessões de terapia consecutivas inicialmente o terceiro dedo na artéria
Estados Unidos da América6. (caracterizada como “abandono”), fobia radial na altura do processo estilóide
às agulhas, coagulopatias e presença de do rádio e, a seguir, o segundo e o
Dentre essas terapias encontra-se a infecções próximas ao local de quarto dedos ao lado do terceiro. Ao
acupuntura, que visa o equilíbrio do aplicação das agulhas de acupuntura. aplicar diferentes pressões sobre a
corpo por meio do estímulo em pontos artéria, é possível sentir o fluxo san-
Houve perda amostral. Oito pacien-
de acúmulo de energia ao longo de güíneo e, a partir dele, inferir o fluxo
tes não completaram o estudo: quatro
linhas corporais conhecidas como me- energético dos diferentes órgãos do
faltaram a três sessões consecutivas,
ridianos de acupuntura, na visão clás- duas interromperam o tratamento por corpo.
sica. Alguns de seus mecanismos de incompatibilidade de horários, uma
ação, como a analgesia, são compro-
vados pela medicina ocidental7.
por constatar que estava em período Intervenção
gestacional, e uma por apresentar
extremo medo de agulhas. Algumas Foram utilizadas agulhas de acupun-
A hipótese deste estudo é que a
pacientes desejaram prosseguir com tura (0,30 x 50 mm) descartáveis e
acupuntura nos tender points pode me-
atendimento da fisioterapia e foram estéreis (Dongbang Acupuncture Inc.).
lhorar a dor no local e, conseqüente-
encaminhadas para o grupo de alon- No grupo A foi realizado o diagnóstico
mente, a qualidade de vida; a acupun- gamento do mesmo ambulatório. pulsológico para identificar os órgãos
tura realizada seguindo os princípios acometidos e determinar os pontos dos
da medicina tradicional chinesa pode
melhorar a dor e os demais sintomas, Avaliação meridianos para a inserção de agulhas;
cada paciente recebeu tratamento per-
já a aplicação respeita a localização A avaliação foi realizada antes e sonalizado, em pontos definidos no
de pontos e meridianos. Este estudo ao final do tratamento por uma fisiote- diagnóstico realizado. No grupo B
teve pois como objetivo verificar a efi- rapeuta, treinada na aplicação dos foram inseridas agulhas nos seguintes
cácia da acupuntura na melhora da questionários e na dolorimetria, que tender points bilateralmente: base
dor, sono e qualidade de vida de desconhecia a distribuição das pacien- occipital, trapézio, supraespinhoso e
pacientes fibromiálgicos. tes nos grupos. epicôndilo lateral. Para padronização

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :280-4 281


da pesquisa, em ambos os grupos fo- e desvio padrão). As variáveis relativas sempre que necessário suas dúvidas
ram inseridas exatamente oito agulhas aos sintomas foram comparadas pré e sobre os questionários eram pronta-
com uma profundidade de aproxima- pós-tratamento pelo teste t de Student mente esclarecidas.
damente meia polegada em cada pareado. Toda a análise estatística foi
A Tabela 2 apresenta as pontuações
ponto, exceto onde a descrição de sua realizada com 5% de significância.
médias obtidas pela EVA, QIF e Inven-
utilização diga o contrário13.
tário do Sono, antes e após a interven-
Todas as pacientes permaneceram
em decúbito dorsal e foram orientadas
RESULTADOS ção. Houve melhora da dor nos dois
grupos, porém com diferença estatis-
a evitar movimentação corporal duran- A amostra foi composta por 12 ticamente significante apenas no
te os 25 minutos de permanência com mulheres, divididas em dois grupos: grupo B (p=0,012). Em relação ao QIF
as agulhas. Foram realizadas oito grupo A (n=5) com idade 45,6±7,06 somente o grupo B apresentou diferen-
sessões de acupuntura com freqüência anos; e grupo B (n=7), idade 44,28±7,22 ça estatisticamente significante nos
de uma vez por semana. anos, sem diferença entre os grupos itens dor (p=0,025), cansaço (p=0,004),
(p=0,98). Apesar de não estatistica- ansiedade (p=0,018) e depressão
Análise estatística mente significante, é possível perce- (p=0,021). Quanto ao sono, no grupo
A houve diferença estatisticamente
ber heterogeneidade no grau de esco-
Os dados demográficos são apre- laridade das participantes (Tabela 1) significante nos quesitos durante a
sentados de forma descritiva (média – o que não é relevante no caso, pois noite, ao levantar e total (p<0,05). No
grupo B, houve melhora em todos os
itens (p<0,05) – lembrando que no IS,
Tabela 1 Características da amostra quanto maior o valor, melhor a quali-
dade do sono.
Grupo A (n=5) Grupo B (n=7) p
A Tabela 3 mostra valores de limiar
Idade [anos – média (dp)] 45,6 (7,06) 44,28(7,22) 0,98
da dor em cada tender point antes e
Escolaridade 0,25 após o tratamento. No grupo A, apenas
1º Grau incompleto 2 (40%) 5 (71,43%) o ponto do trapézio apresentou dife-
1º Grau completo 0 0 rença estatisticamente significante
2º Grau incompleto 0 1 (14,29%) (p=0,007); no grupo B, os tender points
cervical baixa, trapézio, segunda arti-
2º Grau completo 3 (60%) 1 (14,29%)

Tabela 2 Escores obtidos da intensidade dos sintomas (média e desvio-padrão) nos três instrumentos, antes e após o
tratamento dos dois grupos

Grupo A (n=5) Grupo B (n=7)


Sintomas Antes Após p Antes Após p
média(dp) média(dp) média(dp) média(dp)
Dor (cm) † 5,88(1,25) 3,3(3,14) 0,08 7,56(2,46) 3,91(2,92) <0,05*
Sono ‡ Total 102,92 (26,8) 174,94 (43,89) <0,05* 91,59 (25,43) 151,36 (57,05) <0,05*
Antes de dormir 25,6 (10,2) 41,12 (14,52) 0,15 21,57 (8,4) 36,04 (16,47) <0,05*
Durante a noite 44,3 (10,32) 81 (27,8) <0,05* 43,77 (7,58) 70,57 (27,22) <0,05*
Ao acordar 33,02 (9,93) 52,82 (9,17) <0,05* 26,24 (13,21) 44,74 (15,71) <0,05*
QIF §
Cap. funcional 16,2 (3,96) 11 (6,78) 0,25 12,43 (7,3) 9,57 (7,61) 0,27
Dor 7,84 (1,61) 4,04 (3,85) 0,19 8,84 (1,82) 6,24 (3,07) <0,05*
Cansaço 8,8 (1,24) 6,08 (3,73) 0,22 9,21 (1,10) 6,04 (1,96) <0,05*
Sono 6,46 (2,58) 5,74 (3,53) 0,77 7,97 (3,20) 6,27 (3,87) 0,08
Rigidez 6,68 (1,59) 4,4 (4,00) 0,38 8,59 (1,55) 6,18 (3,7) 0,08
Ansiedade 5,08 (2,84) 4,54 (3,53) 0,51 8,54 (1,44) 4,91 (3,23) <0,05*
Depressão 5,2 (2,56) 5,62 (4,09) 0,85 7,61 (3,01) 5,39 (3,46) <0,05*
* Valores da comparação antes-depois estatisticamente significantes; † Intensidade da dor avaliada pela escala analógica visual (0-10 cm); ‡
Escores total e por subescalas obtidos no Inventário do Sono; § Escores nos itens do Questionário do Impacto da Fibromialgia: item Capacidade
funcional, pontuação varia de 0 a 30 (valores menores indicam melhor capacidade funcional); os demais itens são aferidos por escala
analógica visual (0-10 cm)

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2008;15(3)
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Takiguchi et al. Acupuntura na fibromialgia

Tabela 3 Limiar de dor nos tender points (em kgf – média, desvio padrão e valor de p) dos dois grupos, antes e após o
tratamento
Grupo A (n=5) Grupo B (n=7)
Tender point Antes Após Antes Após
média(dp) média(dp) p média(dp) média(dp) p
Base do occipital † 1,02 (0,64) 1,21 (0,69) 0,315 1,19 (0,5) 1,23 (0,58) 0,851
Cervical baixa 0,91 (0,56) 1,16 (0,42) 0,201 0,66 (0,78) 1,24 (0,54) <0,05*
Trapézio † 1,09 (0,44) 1,95 (0,49) <0,05* 1,21 (0,68) 1,86 (0,57) <0,05*
Supraespinhoso † 1,20 (0,36) 2,22 (1,07) 0,065 1,27 (0,93) 1,75 (0,57) 0,196
Segunda costocondral 0,93 (0,34) 1,27 (0,95) 0,508 0,71 (0,59) 1,39 (0,87) <0,05*
Epicôndilo lateral † 0,78 (0,49) 1,43 (0,63) <0,05* 1,13 (0,90) 1,61 (0,89) 0,146
Glúteos 1,68 (0,55) 2,32 (0,98) 0,287 1,63 (0,66) 1,93 (0,54) 0,078
Trocânter maior 1,51 (0,62) 2,14 (0,76) 0,259 1,97 (0,65) 2,13 (0,48) 0,562
Borda medial do joelho 1,17 (0,32) 1,47 (0,75) 0,490 1,19 (0,42) 1,68 (0,53) 0,063
Média dos tender points 1,14 (0,34) 1,67(0,66) 0,130 1,22 (0,56) 1,65 (0,42) <0,05*
* Valores da comparação antes-depois estatisticamente significantes; † Tender points onde foi aplicada a acupuntura

culação costocondral e a média dos hipótese inicial, em que era esperada A qualidade do sono parece estar
tender points apresentaram diferença melhora nos dois grupos, porém com intimamente ligada a sintomas como
estatisticamente significante (p<0,05). expectativa de melhora acentuada no a dor crônica, sendo difícil determinar
grupo A, devido à não-dissociação qual desses dois sintomas seria a causa
entre mente e corpo, segundo os e qual a conseqüência19,20. Como no
DISCUSSÃO princípios da energia qi17, conceito que grupo B não foram puncionados pontos
permeia toda a base da medicina específicos envolvidos com o sono,
O objetivo deste estudo foi verificar infere-se que o efeito analgésico
a eficácia da acupuntura na melhora tradicional chinesa. No grupo B, era
esperada melhora da dor nos tender obtido, aliado à liberação de subs-
da dor, sono e qualidade de vida de tâncias “semelhantes ao ópio“ no
pacientes fibromiálgicas. Os resultados points onde foi realizada acupuntura,
fluido cérebro-espinhal, conforme visto
apontam para melhora nas variáveis sem efeitos em outros sintomas. Os
por Ho et al.21, foram os mediadores
nos dois grupos, porém com melhora resultados, porém, apontam resultados
responsáveis pelo efeito sistêmico das
acentuada no grupo B, submetido à contrários, ou seja, a melhora foi mais
inserções pontuais em locais de dor,
acupuntura nos tender points. Apesar acentuada no grupo B, inclusive com como a melhora de todos os quesitos
de o grupo A também apresentar me- diminuição da dor em pontos distantes do questionário do sono.
lhora, não foram encontradas diferen- dos puncionados, menor impacto da
ças significativas na maioria dos esco- fibromialgia no dia-a-dia, melhora da Ainda no tocante à localização dos
res, após o tratamento. dor e da qualidade do sono. pontos, como sugerem Harris et al.22,
o local da punção da agulha parece
Estudos com acupuntura e fi- A diminuição do limiar de dor no não ser significante, sendo encontrada
bromialgia indicam não haver con- grupo B, mesmo em pontos onde não melhora dos sintomas mesmo com a
senso a respeito do uso e efeito dessa foi feita a acupuntura, demonstra o punção em locais que não são doloro-
terapia. Segundo Deluze et al.14, o tra- efeito sistêmico da inserção de agu- sos nem pertencentes a um meridiano
tamento com a eletro-acupuntura lhas, causando alívio da dor mesmo de acupuntura. O mesmo não foi
obteve melhora significativa em sete em locais distantes. Cho et al.18 anali- observado no presente estudo, uma vez
dos oito parâmetros avaliados. Mas saram diversas teorias que utilizaram que o grupo B, que recebeu acupun-
Assefi et al.15 não obtiveram diferença tomografia com emissão de pósitrons tura nos tender points, teve melhora
significativa entre o grupo submetido e propõem um modelo de integração mais significativa, enquanto o grupo A
a acupuntura e o grupo controle. no eixo hipotálamo-pituitário-adrenal apresentou melhora apenas no sono.
Uma revisão sistemática realizada que, através de transmissores neurais Como a dor e os distúrbios do sono
por Mathew et al.16 encontrou apenas e humorais, promovem ativação de interferem diretamente na qualidade
cinco artigos, sendo relatados efeitos centros corticais, bem como liberação de vida23, a melhora desses dois aspec-
positivos da acupuntura em três estu- de substâncias antiinflamatórias e tos gerou conseqüente melhora nos
dos e indiferentes em dois. No presente analgésicas, promovendo os efeitos valores observados no QIF, com a di-
estudo, também foram encontrados encontrados pela estimulação da minuição do impacto da fibromialgia
resultados contraditórios, diferentes da acupuntura para aliviar a dor. na vida desses pacientes.

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :280-4 283


Na medicina tradicional chinesa, com o quadro apresentado na avalia- número maior de indivíduos para obter
cada indivíduo deve ser considerado ção inicial. resultados mais conclusivos.
como único, com suas especificidades
e peculiaridades, o que interfere na
O número de sujeitos de ambos os
grupos foi abaixo do esperado inicial-
CONCLUSÃO
escolha final dos acupontos. Com base mente, em decorrência do número ele- A acupuntura mostrou-se eficaz na
nesse princípio, a não-padronização vado de pacientes que não continuaram melhora da dor, sono e qualidade de
dos pontos no grupo A foi intencional, o tratamento. Como não foi efetuado vida nos dois grupos, porém com
a fim de promover o melhor atendi- cálculo do tamanho amostral, não se melhora acentuada no grupo que re-
mento a cada paciente, de acordo pode afirmar se seria necessário um cebeu acupuntura nos tender points.

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2008;15(3)
3):280-4
Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.285-91, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Efeitos de exercícios aquáticos sobre a aptidão cardiorrespiratória


e a pressão arterial em hipertensas
Effects of aquatic exercise on cardiorespiratory fitness
and blood pressure in hypertensive women
Lisiane Piazza1, Marice Regina Menta1, Cristiano Castoldi2,
José Basileu Caon Reolão3, Rodrigo Schmidt4, Leonardo Calegari4

Estudo desenvolvido no Curso RESUMO: O estudo visou avaliar a influência de um programa de exercícios
de Fisioterapia da UPF – aquáticos sobre a aptidão cardiorrespiratória e a pressão arterial em mulheres
Universidade de Passo Fundo, hipertensas. Dez hipertensas participaram do programa de exercícios aquáticos
Passo Fundo, RS, Brasil – aeróbicos, de fortalecimento, alongamento e relaxamento – duas vezes por
1
semana durante 7 semanas, totalizando 14 sessões. Foram avaliadas pelo teste
Graduandas em Fisioterapia na de esforço cardiorrespiratório antes e após o desenvolvimento do programa. A
UPF pressão arterial foi mensurada ao repouso e aos 10, 20 e 30 minutos após o
2
Fisioterapeuta exercício em cada sessão. As variáveis cardiorrespiratórias não apresentaram
alterações significativas após o programa, tanto dos valores de limiar de
3
Cardiologista; Prof. Ms. do anaerobiose quanto os do pico de esforço. As pressões arteriais sistólica,
Curso de Fisioterapia da UPF diastólica e média de repouso permaneceram estáveis no decorrer do programa.
Entretanto, no período pós-exercício, os níveis da pressão arterial sistólica
4
Fisioterapeutas; Profs. Ms. do (PAS) e média (PAM) foram significativamente menores, quando comparados
Curso de Fisioterapia da UPF aos valores pré-exercício: houve redução média de 6,43 mmHg da PAS e 3,08
mmHg da PAM aos 30 minutos pós-exercício. Assim, o programa de exercícios
ENDEREÇO PARA aquáticos proposto não promove ganho aeróbico efetivo, mas os resultados
CORRESPONDÊNCIA sugerem que exercícios aquáticos como os propostos, em intensidade próxima
ao limiar de anaerobiose, desencadeiam redução dos níveis de pressão arterial
Lisiane Piazza
R. Rio Branco 1541 Cruzeiro no período pós-exercício, em mulheres hipertensas.
99070-080 Passo Fundo RS DESCRITORES: Hidroterapia; Hipertensão/Terapia por exercício
e-mail:
lisiane_piazza@yahoo.com.br ABSTRACT: The aim of this study was to assess the influence of an aquatic exercise
program on cardiorespiratory fitness and blood pressure in hypertensive women.
A autora 1 participa do Ten hypertensive women took part in the study. The program consisted of aquatic
Programa de Iniciação aerobic, strengthening, and stretching exercises in intensity near the anaerobic
Científica Voluntário da threshold, besides relaxation, twice a week during 7 weeks, totalling 14 sessions.
Universidade de Passo Fundo, They were assessed by cardiorespiratory exercise testing before and after program
sob orientação do Prof. development. Blood pressure was measured at rest before and at 10, 20, and
Leonardo Calegari 30 minutes after exercise, at the end of each session. After the hydrotherapy
program, cardiorespiratory ranges did not show significant changes, neither at
the anaerobic threshold nor at the effort peak. Systolic (SBP), diastolic (DBP),
and mean (MBP) blood pressure at rest remained stable all through the program.
However, SBP and MBP levels at 30-minute rest after exercises, at the end of
the program, were significantly lower when compared to pre-exercise ones:
there was a mean 6,43 mmHg SBP decrease and a 3,08 mmHg MBP decrease.
The hydrotherapy program thus did not promote effective aerobic increase, but
APRESENTAÇÃO results suggest that the proposed exercises, performed at near-anaerobic
abr. 2008 threshold, may reduce post-exercise SBP and MBP levels in hypertensive
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO women.
set. 2008 KEY WORDS: Exercise therapy; Hydrotherapy; Hypertension

Fisioter Pesq. 2008;15(3):285-91 285


INTRODUÇÃO respostas fisiológicas à imersão confi-
guram uma situação homeostática dis-
ção de esforço de Borg15 foram regis-
tradas em intervalos de três minutos.
Diversos estudos têm mostrado rela- tinta se compararmos com exercícios A pontuação na escala de percepção
ção inversa entre condição física, grau realizados em solo. de esforço de Borg varia de 6 a 20
de atividade física e o desenvolvimen- pontos e é obtida mediante pergunta
Nesse sentido, os objetivos do estu-
to de doenças cardiovasculares1,2,3. A verbal à participante.
do foram avaliar o efeito de um progra-
correlação entre níveis pressóricos e ma de exercícios hidrocinesioterapêu- O limiar de anaerobiose foi deter-
incidência de patologias de alta mor- ticos sobre a capacidade funcional minado pela técnica ventilatória 16
bidade e mortalidade indica a necessi- aeróbia e a pressão arterial (PA) em identificando os pontos mais baixos do
dade de controle rigoroso dos níveis mulheres hipertensas. equivalente ventilatório de oxigênio
pressóricos arteriais. No Brasil, a hiper- (VE/VO2) e da fração expirada de O2
tensão arterial é um problema de antes de esses valores recomeçarem a
saúde pública4, e a otimização dos re- METODOLOGIA subir. Foi calculada a média dos valores
cursos terapêuticos, farmacológicos ou obtidos no limiar de anaerobiose e no
não, devem ser encorajados. Este estudo foi aprovado pelo Co- pico do esforço a cada 40 segundos.
mitê de Ética em Pesquisa em Seres
O exercício físico regular vem sen- Humanos da Universidade de Passo A PA foi mensurada após 5 minutos
do considerado um importante coadju- Fundo. As participantes voluntárias de repouso, na posição sentada, no
vante na prevenção e no tratamento assinaram um termo de consentimento membro superior direito, com aparelho
da hipertensão arterial, contribuindo livre e esclarecido. aneróide (BD), definindo-se as fases I
para melhoria de outros fatores de risco e IV de Korotkoff para identificação
cardiovascular 5. Programas de con- O projeto foi divulgado entre as par- das pressões arteriais sistólica (PAS) e
dicionamento físico têm sido freqüente- ticipantes do grupo de terceira idade diastólica (PAD), respectivamente. A
mente recomendados como conduta im- da Secretaria Municipal da Saúde de mensuração da PA seguiu a metodo-
portante no tratamento não-farmacológico Passo Fundo; as voluntárias interes- logia proposta pela IV Diretriz Bra-
da hipertensão arterial 4. Estudos têm sadas em participar do presente estudo sileira de Hipertensão Arterial4. Todas
mostrado que a realização de uma úni- foram encaminhadas para uma avalia- as participantes incluídas no estudo
ca sessão de exercício físico reduz a ção cardiológica visando sua liberação relataram estar na pós-menopausa, ou
pressão arterial no período pós-exercício6 ou não para a prática de exercícios seja, período superior a 12 meses da
e que sua duração influencia a respos- físicos na água. Após essa triagem, as amenorréia 17.
ta hipotensora 7 . Entretanto, raros 17 inicialmente selecionadas foram
estudos têm investigado os efeitos de submetidas à avaliação fisioterápica
exercícios realizados em ambiente e ao teste de esforço cardiorrespiratório Programa de exercícios
aquático sobre a pressão arterial pós- (TECR).
O período de intervenção foi de
exercício. Em mulheres pós-menopau- sete semanas, ocorrendo duas sessões
O TECR foi realizado de acordo com
sa, a prática de exercício físico regular de exercícios por semana nas terças e
os pré-requisitos estabelecidos pela
tem papel primordial para a saúde sextas-feiras à tarde, totalizando 14
Sociedade Brasileira de Cardiologia,
cardiovascular, pois nessa faixa etária sessões, com duração de 60 minutos
incluindo a presença de um médico
ocorre maior incidência de disfunção cada. Nas primeiras sessões foram
cardiologista e os equipamentos neces-
endotelial8 e hipertensão9. realizadas adaptações ao meio aquático,
sários para casos de emergência clí-
A hidroterapia em água aquecida é nica13. O teste visa avaliar a tolerância controle respiratório, familiarização com
um método alternativo no desenvolvi- ao esforço, bem como diagnosticar os exercícios e com a seqüência de
mento de exercícios devido às proprie- possíveis alterações como isquemia do atividades propostas em cada sessão.
dades físicas da água e às respostas miocárdio e/ou patologias cardiovascula- Os exercícios foram realizados em
fisiológicas desencadeadas pela imer- res associadas, que contra-indicassem a piscina aquecida (31°C a 33°C) e
são10. Enquanto a flutuabilidade produz prática de exercícios físicos. As partici- cada sessão foi dividida em quatro
redução de impactos sobre as articula- pantes foram desafiadas a caminhar etapas, como proposto por Arca et
ções, a viscosidade oferece resistência em esteira rolante, monitoradas con- al.18:
aos movimentos. Nesse contexto, a tinuamente nas derivações eletro-
1a Aquecimento e alongamento:
hidroterapia pode ser considerada cardiográficas, utilizando o protocolo
caminhadas para frente e para
favorável à prática de exercícios físi- de Bruce modificado14 com análise dos
trás, realizando turbulência para
cos sem sobrecarga articular11. A imer- gases expirados (O2 e CO2) em circuito
aumentar a resistência ao deslo-
são corporal no nível do manúbrio em aberto (mediante o programa Ergo PC
camento (duração de 5 minutos)
piscina térmica (34 ºC) desencadeia Elite VO 2000). Foi utilizado pneumo-
e alongamento dos principais
várias respostas fisiológicas nos siste- tacógrafo de fluxo médio (10 a 120
grupos musculares (10 minutos).
mas cardiovascular e renal, tais como litros/min) e as medidas foram coleta-
o aumento do volume sangüíneo torá- das em tempo fixo a cada 20 segun- 2a Exercícios aeróbicos: movimen-
cico, da pressão venosa central, do dos. A verificação da pressão arterial tos isotônicos dinâmicos com os
débito cardíaco e da diurese12. Essas e a quantificação subjetiva da percep- membros superiores e inferiores

286 Fisioter Pesq. 2008;15(


2008;15(3)
3):285-91
Piazza et al. Hidroterapia em mulheres hipertensas

(saltitando no mesmo lugar com post-hoc de Tukey. Valores de p<0,05 pouso foi em média 65,1±6,2 bpm e
o joelho em direção contralateral foram considerados significantes. PAS e PAD foram em média 135,3±16,2
ao cotovelo, “esqui cross-country”, mmHg e 77,4±3,4 mmHg, respectiva-
movimentos como “andar de bi- mente. Quanto ao tratamento farma-
cicleta” apoiando-se nas barras), RESULTADOS cológico, cinco mulheres utilizavam
totalizando 20 minutos, com in- diuréticos associados a beta-bloquea-
tervalo de um minuto entre um Foram excluídas das análises cinco dores; três, diuréticos associados a
exercício e outro. Para controlar participantes que apresentaram as- inibidores da enzima conversora de
a intensidade dos exercícios aeró- siduidade inferior a 80% das sessões angiotensina II (ECA); uma usava
bicos foi mantido monitoramento e duas por não comparecerem para as beta-bloqueador; e uma, inibidor da
da freqüência cardíaca por meio avaliações finais. A amostra final foi ECA. Quando questionadas sobre a
de palpação da artéria radial e constituída por dez mulheres com ida- presença de antecedentes familiares,
pela escala de percepção do es- de média de 64,6±5,9 anos, em trata- todas as participantes relataram ter
forço de Borg: as participantes mento farmacológico em média há pais ou irmãos hipertensos.
foram orientadas a manter a 13,3±8,6 anos, índice médio de massa
corpórea 28,58±4,47 kg/m2 e circunfe- Na Tabela 1, pode-se observar os
freqüência cardíaca no valor es-
rência abdominal média de 98,9±10,4 valores medidos no limiar de anaero-
tabelecido para o limiar de anae-
cm. A freqüência cardíaca (FC) em re- biose e, na Tabela 2, os mensurados
robiose e abaixo da percepção
de cansaço (número 13 da escala
de Borg). Tabela 1 Valores (média±desvio padrão) obtidos no TECR na intensidade
correspondente ao limiar de anaerobiose, pré e pós-intervenção
3a Fortalecimento: movimentos em
diagonal com a utilização de Variáveis Pré-Intervenção Pós-Intervenção p
flutuadores nos membros superiores Potência (W) 110,9±24,4 119,3±38,9 0,50
e inferiores. Foram realizadas 2 a
3 séries de 10 repetições com Tempo (seg) 589,2±61,7 603,3±100,1 0,53
duração aproximada de 10 minutos. FC (bpm) 105,6±13,9 109,1±12,4 0,15
4a Alongamento e relaxamento: RC (bpm) 35,1±12 36,3±14 0,73
alongamento de grandes grupos Escala de Borg 9,1±2,1 10,1±2,4 0,39
musculares mantidos por 30 VE (l.min-1) 23,6±4,5 25,1±3,9 0,25
segundos. Relaxamento utilizan-
VO2 (l.min-1) 1,10±0,28 1,07±0,18 0,74
do flutuadores cervicais e nos
membros inferiores em posição VO2Pico (ml.min-1.kg-1) 15,8±3,3 16,6±2,3 0,87
de supino durante 10 minutos. VCO2 (l.min-1) 0,93±0,22 0,92±0,18 0,73
TECR = Teste de esforço cardiorrespiratório; FC = freqüência cardíaca; RC = reserva
Previamente às sessões, o grupo se
cronotrópica; VE = volume minuto expirado; VO2 = captação pulmonar de oxigênio; VCO2 =
reunia em uma sala de aula ao lado liberação pulmonar de dióxido de carbono
da piscina para mensurar a PA ao
repouso. Após as sessões, o grupo retor- Tabela 2 Valores (média±desvio padrão) obtidos no TECR no pico do esforço,
nava à sala para mensurar a PA aos pré e pós-intervenção
10, 20 e 30 minutos pós-exercícios
aquáticos. A pressão arterial média Variáveis Pré-Intervenção Pós-Intervenção p
(PAM) foi calculada segundo Leite 14 Potência (W) 225,4±39,9 235,9±61,6 0,53
pela fórmula PAM=[(2PAD)+ PAS]/3. Tempo (seg) 804,6±83 825,8±94,9 0,30
Após as sete semanas de interven- PAS (mmHg) 157,7±15 155,5±16 0,71
ção, as voluntárias foram novamente PAD (mmHg) 88,5±9,7 86±11,5 0,65
submetidas à avaliação pelo TERC.
FC (bpm) 130±19,7 133,8±18,2 0,44
RC (bpm) 59,5±18,3 61,03±18,8 0,67
Análise estatística
Escala de Borg 11,46±2,2 11,58±2,72 0,90
Os dados foram tabulados utilizando- VE (l.min-1) 34,02±7,2 37,15±4,6 0,07
se o programa Excel e analisados pelo
programa Statistica versão 6.0. Os
VO2 (l.min-1) 1,45±0,33 1,42±0,22 0,62
dados referentes ao TECR foram ana- VO2Pico (ml.min-1.kg-1) 21,02±3,8 20,86±3,4 0,85
-1
lisados pelo teste t de Student para VCO2 (l.min ) 1,31±0,31 1,36±0,22 0,43
amostras dependentes. Análise de TECR = Teste de esforço cardiorrespiratório; PAS = pressão arterial sistólica; PAD = pressão
variância (Anova) para medidas repe- arterial diastólica; FC = freqüência cardíaca; RC = reserva cronotrópica; VE = volume minuto
tidas foi usada para comparar os efeitos expirado; VO2 = captação pulmonar de oxigênio; VCO2 = liberação pulmonar de dióxido de
do exercício sobre a PA com o teste carbono

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :285-91 287


160 de exercícios em piscina aquecida
pode trazer algumas vantagens devido
140 aos efeitos das propriedades físicas da
água, de reduzir o impacto articular
120 PAS durante atividades aeróbias.
PAD
mmHg

PAM Estudos indicam que o aumento da


100 PAD é linearmente proporcional à
circunferência abdominal 21. Neste
80 estudo, foi observada elevada circun-
ferência abdominal (média de 98 cm),
60 sendo que os valores de normalidade1
são ≤80 cm2, sugerindo obesidade. A
40 hipertensão e a obesidade abdominal
1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª fazem parte de uma constelação de
Semanas fatores de risco cardiovasculares e
Gráfico 1 Evolução da média da pressão arterial de repouso antes dos poderiam ser evitadas pela promoção
exercícios durante as sete semanas de intervenção de hábitos saudáveis22. Em relação ao
tratamento farmacológico, as prin-
cipais classes de drogas utilizadas pe-
no pico do esforço máximo, pré e pós- ticos. A Tabela 3 traz as médias obti- las participantes eram diuréticos, beta-
intervenção. Em ambas as situações das de todas as sessões nos quatro bloqueadores e inibidores da ECA,
(limiar de anaerobiose e pico do momentos. A Anova para medidas sendo que a associação entre diurético
esforço), o teste t de Student não in- repetidas revelou que os níveis de PAS e beta-bloqueador foi encontrada em
dicou diferenças estatisticamente e PAM aos 20 e 30 minutos no período metade das prescrições. Dessa forma,
significativas entre as médias pré e pós-exercício foram significativamen- a conduta clínica está de acordo com
pós-intervenção. te menores quando comparados aos as IV Diretrizes Brasileiras de Hiper-
A pressão arterial em repouso antes valores basais. Observou-se redução tensão Arterial (2004)4.
dos exercícios foi medida em todas média da PAS de 6,12 mmHg (p<0,001)
As variáveis cardiorrespiratórias
as sessões durante as sete semanas de aos 20 minutos e de 6,43 mmHg
mensuradas no TECR não apresentaram
intervenção. Foi calculada a média se- (p<0,001) aos 30 minutos pós-exercício;
alterações estatisticamente significan-
manal, ou seja, dos valores obtidos nas e redução média da PAM de 3,05
tes após o desenvolvimento do progra-
duas sessões semanais. Os valores mmHg (p=0,007) aos 20 minutos e de
ma de exercícios aquáticos, tanto dos
médios da PAS, PAD e PAM das sete 3,08 mmHg (p=0,006) aos 30 minutos
valores no limiar de anaerobiose
semanas são apresentados no Gráfico após os exercícios. As análises da PAD
(Tabela 1) quanto nos do pico do es-
1. A Anova para medidas repetidas não não revelaram resultados estatistica-
forço (Tabela 2). Embora esses resul-
indicou diferenças significativas para mente significantes.
tados não indiquem ganho aeróbico
PAS (p=0,31) nem PAM (p=0,10) ao efetivo, o volume semanal de ativi-
longo do programa, enquanto para a
PAD indicou tendência à relevância DISCUSSÃO dades físicas realizadas manteve a
aptidão cardiorrespiratória em nível
estatística (p=0,053). Entretanto, o A prática regular de exercícios fí- regular, segundo a American Heart
teste de Tukey não revelou diferenças sico em mulheres pós-menopausa tem Association23. Entretanto, se compara-
entre as médias. se mostrado uma intervenção com po- dos os valores de VO2Pico previstos com
Além da PA em repouso antes dos tencial preventivo, reduzindo o risco os obtidos após a intervenção, observa-
exercícios, também foram tiradas me- de desenvolver resistência à insulina19 se um deficit aeróbico funcional
didas em três momentos (aos 10, 20 e e de doenças cardiovasculares20. Em médio de 22,4%. Corroborando esses
30 minutos) após os exercícios aquá- situações de sobrepeso, a utilização achados, Mercuro et al. 24 relataram
que mulheres na pós-menopausa apre-
sentam redução da aptidão cardior-
Tabela 3 Valores (em mmHg, média±desvio padrão) da pressão arterial em respiratória.
repouso sistólica (PAS), diastólica (PAD) e média (PAM) antes, e 10, Laterza et al. 25 relataram que o
20 e 30 minutos após os exercícios aquáticos treinamento em cicloergômetro na
Pressão arterial intensidade relativa ao limiar de anae-
(mmHg) Pré-exercício 10 min após 20 min após 30 min após robiose, três vezes por semana durante
PAS 131,85±17,08 130,38±15,33 125,73±14,61* 125,41±14,37* quatro meses, produziu aumento no
consumo de oxigênio em hipertensos.
PAD 75,16±5,6 75,76±5,3 73,64±5,89 73,76±5,95
Esses resultados não concordam com
PAM 94,06±8,88 93,97±7,81 91,01±8,13* 90,98±8,1* os observados no presente estudo. É

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Piazza et al. Hidroterapia em mulheres hipertensas

possível que o volume de exercícios rada produziram reduções importantes na pelo óxido nítrico. Esses mecanismos
(em duas sessões por semana durante PA de repouso em mulheres pós- fisiológicos envolvidos no efeito HPE,
sete semanas) tenha sido insuficiente menopausa com níveis de PA iniciais desencadeados pela imersão em
para produzir alterações metabólicas, elevados. Esses estudos, com períodos pacientes hipertensos, merecem
e não a intensidade do treinamento. de intervenção iguais ou superiores a maiores investigações.
dez semanas em meio aquático18 e
O aumento progressivo da FC du- Alguns fatores podem estar envolvi-
no solo28, mostraram reduções na PA
rante o TECR alcançou em média dos na ocorrência, na magnitude e na
de repouso, em contraste com o pre-
133,8 bpm no pico do esforço, com duração da hipotensão pós-exercício.
sente estudo, em que sete semanas de
reserva cronotrópica (RC) de 61 bpm, Por exemplo, os níveis iniciais de PA
intervenção não foram suficientes para
quando analisados os valores pós- observados no presente estudo apre-
produzir reduções significativas na PA
intervenção. Alguns fatores podem sentam valores moderados (em média
de repouso.
atenuar o aumento da FC durante o <140/90 mmHg), sugerindo que em
exercício físico, como a utilização de Embora o programa de exercício portadores de hipertensão descontro-
fármacos que têm ação cronotrópica proposto não tenha produzido ganho lada esse fenômeno pode ser melhor
negativa. Neste estudo, 60% da aeróbico efetivo nem influências sobre visualizado. Esses resultados apóiam
amostra utilizavam beta-bloqueadores, a PA de repouso, foram encontrados evidências de que intensidades mode-
o que pode ter influenciado essa resultados significativos sobre a PAS radas potencializam os benefícios e
resposta. Silva et al. 26 relataram e a PAM no período pós-exercício. O minimizam os riscos inerentes ao exer-
maiores RC e FCMáx em mulheres efeito hipotensor pós-exercício (HPE) cício, mesmo na ausência de ganho
idosas submetidas ao protocolo de vem sendo freqüentemente investi- aeróbico efetivo28.
Bruce modificado, que não utilizavam gado nos exercícios realizados em
solo6,29,30. Em elegante estudo, Rondon No entanto, este estudo não teve
essa classe de medicamento.
et al.30 relataram que uma única sessão grupo controle. O modelo ideal de
Para avaliação da reserva funcional de exercícios com baixa intensidade pesquisa deveria incluir dois grupos,
do organismo ao exercício físico, ha- (50% VO2pico) em bicicleta ergométri- intervenção e controle, alocados por
bitualmente são utilizados valores ca durante 45 minutos promoveram meio de randomização, visando con-
obtidos no esforço máximo. Entretanto, efeito HPE em idosos, e os níveis de trolar o fator de interesse32. Embora o
poucos pacientes conseguem atingir pressão arterial permaneceram reduzi- delineamento experimental não seja
tal intensidade; dessa forma, os valo- dos 22 horas após o exercício. o mais adequado, a amostra de 10
res obtidos em níveis submáximos, participantes mostrou perfil homo-
como o limiar de anaerobiose, são A literatura científica mostra que a gêneo e os resultados apresentam um
úteis na mensuração do estresse imersão produz respostas fisiológicas padrão semelhante no grupo. Em
metabólico e cardiovascular imposto favoráveis aos portadores de hiperten- estudos futuros, deverão ser alteradas
pelo exercício16. Nesse sentido, obser- são, como por exemplo o aumento da a duração e/ou freqüência e tipo de
vamos que o consumo de oxigênio eliminação de sódio12 e a inibição do sis- exercícios aquáticos, a fim de inves-
nessa intensidade ocorreu em média tema renina-angiotensina-aldosterona31. tigar eventuais alterações na PA de
a 75% do VO 2Pico e a freqüência Nesse contexto, a hidroterapia apre- repouso nessa população.
cardíaca, a 81% da FCMáx. Porcentagens senta evidências para sua utilização
semelhantes foram encontradas por em pacientes portadores de hiperten-
Modesti et al.27, ao utilizarem o pro- são. Sabe-se que a imersão altera o
gradiente hidrostático promovendo
CONCLUSÃO
tocolo de Bruce modificado em
hipervolemia torácica 12 , fato que O meio aquático parece ser uma
homens hipertensos.
promove aumento nas concentrações alternativa segura e atraente para a
Após sete semanas de exercícios plasmáticas do peptídeo natriurético prática de exercícios em pacientes
aquáticos com duas sessões semanais, atrial31, conseqüentemente natriurese portadores de hipertensão arterial. Os
foi encontrado que a PAS, PAD e PAM e diurese. Larochelle et al. 31 investi- presentes resultados mostram que o
de repouso permaneceram estáveis garam os efeitos da imersão sobre a programa de hidroterapia proposto não
(Gráfico 1). No entanto, Arca et al.18 função renal de pacientes hipertensos, melhorou a aptidão cardiorrespiratória
relataram reduções na PAS e PAD após relatando inibição dos fatores que de mulheres hipertensas. Os exer-
um programa de 10 semanas de exercícios retêm sódio (aldosterona e renina plas- cícios aquáticos aeróbicos, de fortale-
aquáticos em mulheres hipertensas, mática), enquanto aumentam os fato- cimento, alongamento e relaxamento
sugerindo a indicação de hidroterapia res que eliminam sódio (peptídeo como os aqui propostos, feitos em
como recurso fisioterápico para esse natriurético atrial). Além disso, esse intensidade próxima ao limiar de
grupo de pacientes. Seals et al. 28 estudo31 mostrou aumento nas concen- anaerobiose, promoveram redução dos
mostraram que um programa de 12 trações plasmáticas de monofostato níveis da pressão arterial sistólica e
semanas de caminhadas em solo com 3 cíclico de guanosina induzido pela média aos 30 minutos pós-exercício
sessões semanais de intensidade mode- imersão, possivelmente estimulado em mulheres hipertensas.

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :285-91 289


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Fisioter Pesq. 2008;15(3) :285-91 291


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.292-7, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Relação entre desempenho funcional de crianças com paralisia cerebral e qualidade


de vida relacionada à saúde de seus cuidadores
Relationship between functional performance of children with cerebral palsy and
health-related quality of life of their caregivers
Ana Paula Rocha1, Daniella Romany Viana Afonso1, Rosane Luzia de Souza Morais2

Estudo desenvolvido no Depto. RESUMO: Cuidadores de crianças com paralisia cerebral (PC), ao lidar com as
de Fisioterapia da Faculdade de incapacidades da criança, são suscetíveis a detrimento de sua saúde física e
Ciências Biológicas e da Saúde bem-estar psicológico, o que pode ter impacto em sua qualidade de vida
da UFVJM – Universidade relacionada à saúde (QV). O objetivo deste estudo foi verificar se há correlação
Federal dos Vales do entre o desempenho funcional de crianças com PC e a QV de seus cuidadores,
Jequitinhonha e Mucuri, verificando também eventual correlação entre o nível de função motora e o
campus II, Diamantina, MG, desempenho funcional em crianças com PC. A QV de 17 cuidadores de crianças
Brasil com PC foi avaliada pelo questionário Short-Form Health Survey (SF-36); a
1
Graduandas em Fisioterapia na função motora e o desempenho funcional das respectivas crianças foram
UFVJM avaliados pelo Gross Motor Function Classification System (GMFCS) e pelo
Inventário de Avaliação Pediátrica de Disfunção (PEDI). Os dados foram tratados
2
Profas. Ms. Assistentes do estatisticamente. Nenhuma correlação significativa foi encontrada entre a
Depto. de Fisioterapia da classificação no GMFCS ou o escore no PEDI e os escores dos cuidadores no
UFVJM SF-36. Foi encontrada forte correlação negativa entre os escores das crianças
no PEDI e os níveis do GMFCS. A qualidade de vida de cuidadores de crianças
ENDEREÇO PARA com PC não foi pois influenciada pelo grau de limitação funcional de suas
CORRESPONDÊNCIA crianças. No entanto, o GMFCS mostrou-se um bom preditor de funcionalidade
em crianças com paralisia cerebral.
Rosane L.S. Morais
R.Grupiara 147A bairro DESCRITORES: Criança; Cuidadores; Paralisia cerebral; Qualidade de vida
Purquéria
39100-000 Diamantina MG ABSTRACT: When dealing with the child’s disabilities, caregivers of children with
e-mail: cerebral palsy (CP) are likely to experience physical or psychological suffering,
rosanemorais@gmail.com which may impact their health-related quality of life (QoL). This study searched
for a correlation between CP children’s functional performance and their
caregivers‘ QoL, also looking for a correlation between gross motor functional
level and functional performance in children with CP. The QoL of 17 caregivers
of children with CP was assessed by the Short-Form Health Survey (SF-36);
children’s functional performance was evaluated by means of the Gross Motor
Function Classification System (GMFCS) and the Pediatric Evaluation of
Disability Inventory (PEDI). Data were statistically analysed. No significant
correlation was found between children’s GMFCS classification or PEDI scores
and their caregivers scores in SF-36. A negative, strong correlation was found
between scores at PEDI and GMFCS. The quality of life of caregivers of children
APRESENTAÇÃO with CP was hence not influenced by the children’s level of functional
jul. 2008 limitation. GMFCS has shown to be a good predictor of functional performance
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO in children with cerebral palsy.
set. 2008 KEY WORDS: Caregivers; Cerebral palsy; Child; Quality of life

292 Fisioter
Fisioter Pesq.
Pesq. 2008;15( 3): 292-7
2008;15(3)
Rocha et al. Qualidade de vida de cuidadores de crianças com PC

INTRODUÇÃO turais nos quais vive, e a relação com


suas metas, objetivos e expectativas.
e outras informações como parentesco
com a criança, grau de escolaridade
A paralisia cerebral (PC) é uma das É um amplo conceito que incorpora a e ocupação. As características socioe-
mais comuns desordens infantis, com saúde física da pessoa, status psicoló- conômicas dos cuidadores foram defi-
uma incidência de 2 a 2,5:1000 gico, nível de independência, relacio- nidas conforme critério proposto pela
nascidos vivos nos países desenvol- namento, inserção social e sua relação Associação Brasileira de Institutos de
vidos1. No Brasil não existe pesquisa com as características do ambiente7. Pesquisa de Mercado, utilizando cate-
específica a respeito da incidência de Qualidade de vida relacionada à gorias que variam de A, indicando
portadores de deficiência física, sen- saúde (QVRS) refere-se à saúde e ao nível socioeconômico elevado, a E,
sorial ou mental2. Porém, Piovesana et bem-estar do indivíduo nos domínios indicando nível socioeconômico mui-
al.3 relatam que, em países subdesen- físico, psicológico, social e espiritual8. to baixo, sendo as intermediárias – B,
volvidos, em cada 1.000 crianças, 7 Estudos têm focalizado a relação C e D – indicativas de níveis médio-
são portadoras de PC. da qualidade de vida de pais e cuida- alto, médio e médio-baixo11.
Essa doença consiste em uma desor- dores com as deficiências e a função
dem do movimento, tônus e postura. motora grossa de suas respectivas Instrumentos
Não é de caráter progressivo, mas alte- crianças 4,6,9,10. Utilizam o Sistema de
rações físicas e psicológicas podem Classificação Funcional de Função Os instrumentos usados na pesquisa
ser observadas durante todo o seu cur- Motora Ampla (Gross Motor Function foram o Inventário de Avaliação Pediá-
so. Prejuízos sensoriais, cognitivos e Classification System, GMFCS) para trica de Disfunção (PEDI – Pediatric
de linguagem aparecem em adição a verificação da função motora grossa, Evaluation of Disability Inventory) 12,
dificuldades do aprendizado e proble- mas poucos estudos, de fato, verificam para avaliar desempenho funcional; o
mas de comportamento4. Comprome- a relação entre QVRS de cuidadores questionário conhecido como SF-36,
timentos como espasticidade, fraqueza e desempenho funcional em crianças Medical Outcomes Study 36-item
muscular e instabilidade postural resul- com PC por meio de instrumentos Short-Form Health Survey 13 , para
tam em dificuldades na marcha em padronizados. Além disso, na literatura avaliação da QVRS; e o GMFCS14, para
90% das crianças com PC. Além dos pesquisada não existem estudos com avaliação da função motora grossa.
comprometimentos supracitados, população brasileira estabelecendo O PEDI é uma escala pediátrica
algumas crianças também podem ter relação entre a qualidade de vida de norte-americana traduzida para o por-
complexas limitações de mobilidade cuidadores de PC com a limitação tuguês e adaptada para contemplar as
e autocuidado, tais como as relativas funcional de suas crianças. especificidades socioculturais do
a alimentação, vestuário e higiene1,5. Brasil12. Trata-se de um teste padroni-
O objetivo do estudo foi pois verifi-
Segundo Raina et al.1, os cuidado- car se há relação entre desempenho zado baseado em julgamento, realiza-
res de crianças com PC geralmente funcional de crianças com PC e QVRS do por meio de entrevista estruturada
têm múltiplas responsabilidades na de seus cuidadores, residentes em uma com os pais ou responsáveis que pos-
abordagem das incapacidades da cidade no interior do Brasil (Diaman- sam informar sobre o desempenho
criança. Um dos principais desafios tina, MG). funcional em atividades da rotina
para os pais é abordar efetivamente diária da criança, e visa caracterizar
seus problemas crônicos de saúde, en- aspectos funcionais na faixa entre seis
quanto mantêm as exigências da vida METODOLOGIA meses e sete anos e meio de idade12.
diária. Em alguns casos, esses cuida- Estudos confirmam que o PEDI é uma
dos podem trazer detrimento à saúde Este é um estudo de tipo transversal. avaliação válida e confiável das ati-
física e bem-estar psicológico dos pais, Participaram do estudo todas as crian- vidades diárias de crianças com inca-
com impacto nos rendimentos e nas ças com PC cadastradas nos sete pacidade 15. Esse teste é dividido em
funções da família. Em alguns casos, núcleos do PSF – Programa Saúde da três partes, que informam sobre três
o principal cuidador da criança com Família e no Núcleo de Reabilitação áreas de desempenho funcional. A
PC não é nenhum dos pais mas pessoas Nossa Senhora da Saúde de Diaman- primeira parte documenta as habilida-
próximas, como por exemplo avó ou tina, MG, bem como seus respectivos des funcionais da criança nas escalas
babá. Dessa forma, Tuna et al.6 defi- cuidadores. O critério de inclusão do de autocuidado, mobilidade e função
nem cuidador principal como aquela participante adulto foi ser cuidador
social; a somatória dos escores obtidos
pessoa responsável pelo cuidado direto principal de uma criança de 6 meses
em cada escala resulta em um escore
e diário da criança, podendo ser a a 12 anos de idade com diagnóstico
total bruto para cada uma das três
mãe, pai, avó, ou qualquer outra médico de PC estabelecido e regis-
áreas de habilidades funcionais. No
pessoa que exerça esse papel. trado em prontuário, residente na sede
entanto, para os objetivos do estudo,
do município de Diamantina.
Qualidade de vida é definida pela conforme instruções do manual, o es-
Organização Mundial de Saúde como Para caracterização da amostra, os core bruto foi convertido em escore
a percepção do indivíduo de sua posi- cuidadores forneceram dados de iden- contínuo. Para este estudo foi utilizada
ção na vida, contexto e valores cul- tificação: nome, endereço, idade, sexo apenas a primeira parte.

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :292-7 293


O SF-36 é um questionário genérico suporte; no nível IV, a criança utiliza fícios e riscos. Todos os responsáveis
de avaliação da qualidade de vida tra- tecnologia assistiva para mover-se; e, pelas crianças autorizaram a participa-
duzido e adaptado para a população no nível V, é gravemente limitada na ção e assinaram o Termo de Consenti-
brasileira 13. Nesse questionário, que mobilidade, mesmo com o uso de mento Livre e Esclarecido (TCLE).
pode ser respondido por pessoas a partir tecnologia assistiva18. Devido ao fato Cada cuidador também autorizou sua
de 12 anos de idade, são mensurados de as funções motoras em crianças própria participação assinando o TCLE
oito domínios: função física, função dependerem da idade, essas foram e preenchendo a ficha dos dados de
social, limitações em papéis sociais definidas de acordo com quatro dife- identificação. Posteriormente, em uma
devido a problemas físicos e a proble- rentes grupos: menor que 2 anos, entre nova visita, foram aplicados os instru-
mas emocionais, saúde mental, energia/ 2 e 4 anos, 4 a 6 anos e 6 a 12 anos4. mentos GMFCS, PEDI e o questionário
vitalidade, dor e percepção de saúde SF-36. Os instrumentos foram aplica-
mental16. Apresenta um escore final de
0 a 100, no qual zero corresponde ao
Procedimentos dos por pesquisadoras devidamente
treinadas, sendo que uma aplicava o
pior estado geral e 100 à percepção Os participantes foram recrutados PEDI e a outra, o SF-36 e o GMFCS.
de melhor qualidade de vida relacio- por meio da consulta às fichas ca- Os dois primeiros foram aplicados por
nada à saúde16,17. dastrais em todos os núcleos do PSF e entrevista com o cuidador principal;
Também foi utilizado o GMFCS, no Núcleo de Reabilitação Nossa a classificação do GMFCS foi obtida
que é um sistema de classificação da Senhora da Saúde. Os dados de todos pela observação do comportamento
função motora ampla proposto por os pacientes com necessidades es- motor da criança. Este estudo foi apro-
Palisano et al. 14 e é especificamente peciais foram coletados e, dentre estes, vado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
foram selecionadas todas as famílias da Universidade Federal dos Vales do
usado para crianças com PC até 12
anos4. A gravidade do comprometimen- que possuíam crianças entre 6 meses Jequitinhonha e Mucuri.
to neuromotor é descrita, principalmen- e 12 anos com diagnóstico de PC
estabelecido.
te, na forma da locomoção utilizada Análise de dados
pela criança com PC. As crianças são As famílias selecionadas (do PSF e
classificadas em cinco níveis: os níveis do Núcleo de Reabilitação) foram vi- Para a análise dos dados foi utilizado
I e II são atribuídos a crianças que sitadas em suas respectivas residências o pacote estatístico SPSS (versão 15.0).
andam sem restrições; o nível III, para esclarecimento quanto ao objeti- Foi feita análise descritiva para carac-
àquelas que andam com auxílio ou vo da pesquisa, procedimentos, bene- terização da amostra. Inicialmente, as

Tabela 1 Características das crianças (n=17) Tabela 2 Características das/os cuidadoras/es (n=17)

Criança Sexo Idade GMFCS Co-morbidades Cuidador Sexo Idade Parentesco Escolaridade Ocupação Nível S-E
1 M 11 I 1 F 51 Avó PI Diarista D
2 F 06 I RM/Outros 2 F 39 Mãe PC Cozinheira D
3 M 11 IV RM 3 F 54 Mãe PI Do lar E
4 F 02 V RM 4 F 28 Mãe EMI Do lar C
5 F 10 V 5 F 14 Babá GC Estudante/Babá C
6 M 08 V RM /Outros 6 F 31 Mãe GI Do lar E
7 M 08 II Epilepsia/ RM 7 F 25 Mãe GI Do lar E
8 M 09 V 8 F 15 Irmã EMI Estudante D
9 F 08 V RM /Outros 9 F 29 Mãe GI Do lar D
10 F 11 V RM /Outros 10 F 45 Mãe GI Diarista C
11 F 26 Mãe A Do lar E
11 M 06 II
12 F 20 Babá EMI Estudante/Babá D
12 F 04 V RM /Outros
13 M 81 Pai PC Aposentado D
13 F 04 IV RM /Outros
Mãe
14 M 12 IV RM 14 F 39 adotiva GI Do lar E
15 M 11 V Epilepsia/ RM 15 F 29 Mãe EMC Doméstica D
16 F 11 IV RM 16 F 45 Mãe GI Do lar C
17 M 04 V 17 F 29 Mãe GC Do lar C
F = Feminino; M = Masculino; GMFCS = Nível no Gross F = Feminino; M = Masculino; A = Analfabeto; PI = Primário incompleto; PC =
Motor Function Classification System; RM = Retardo Primário completo; GI = Ginasial incompleto; GC = Ginasial completo; EMI =
mental; Outros = Deficit visual e/ou auditivo Ensino médio incompleto; EMC= Ensino médio completo; Nível S-E = Nível
socioeconômico: C = médio; D = médio-baixo; E = pobre

294 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


2008;15( 3):292-7
Rocha et al. Qualidade de vida de cuidadores de crianças com PC

variáveis foram analisadas quanto à 4). Não foi encontrada correlação Tabela 4 Correlação entre os escores
normalidade (pelo teste Shapiro-Wilk) significativa. dos cuidadores nos domínios
e à homogeneidade de variância do SF-36 e a classificação
(Levine). Apenas três das onze variáveis Finalmente, quanto à correlação das crianças segundo o
analisadas apresentavam distribuição entre função motora ampla (avaliada GMFCS
normal. Portanto, deu-se seguimento pelo GMFCS) e desempenho funcional
da criança (nas escalas do PEDI), foi GMFCS
à análise inferencial com a correlação Domínio do SF-36 r p
não-paramétrica de Spearman. O nível encontrada uma forte correlação
negativa: com a escala de autocuidado, Capacidade funcional 0,269 0,297
de significância adotado foi de α=0,05.
r=–0,874 (p=0,000); com a escala de Aspecto físico 0,474 0,054
mobilidade, r=–0,911 (p=0,000); e, com Dor 0,369 0,145
RESULTADOS a de função social, r=–0,797 (p=0,000). Estado geral de saúde - 0,147 0,574
Participaram do estudo 17 crianças Vitalidade - 0,199 0,443
e seus principais cuidadores. Nove DISCUSSÃO Aspectos sociais 0,244 0,345
Aspectos emocionais 0,378 0,134
crianças (53%) eram do sexo mascu-
lino e oito (47%) do sexo feminino, A QVRS tem sido cada vez mais Saúde mental 0,179 0,492
com idades variando de 2 a 12 utilizada para avaliação da eficácia
(8±3,14) anos. Quanto à classificação de intervenção. Isso reflete a crescente cuidadores de crianças com desenvol-
no GMFCS, duas crianças se encon- valorização da importância de conhe- vimento típico.
travam no nível I e duas no nível II; cer como os pacientes se sentem e o
quatro crianças foram classificadas no quão satisfeitos estão com o tratamen- Segundo Brehaut et al.20, mães de
nível IV e nove no nível V. Essas infor- to19. No caso da pediatria, é importante crianças com incapacidades físicas e
mações, mais a indicação da presen- avaliar a QVRS dos pais ou cuidadores psicológicas relatam mais queixa na
considerando o papel que exercem na saúde física quando comparadas às
ça de comorbidades associadas, po-
mães de crianças sem incapacidades.
dem ser visualizadas na Tabela 1. vida das crianças. Segundo Ones et
Além disso, os autores salientam que
al.4, a participação e a atuação direta
A maioria das cuidadoras (64,7%) as mães dessas crianças estão expostas
da família são vitais para resultados
eram mães biológicas e apenas uma aos mesmos acontecimentos de vida
satisfatórios na reabilitação da criança
adotiva. A Tabela 2 mostra a idade, sexo e às eventuais pequenas perturbações
com PC. No entanto, o cuidador prin-
e nível socioeconômico das cuidadoras. do dia-a-dia que as outras famílias21.
cipal, geralmente a mãe, pode sofrer
Por essas razões, as mães das crianças
A Tabela 3 apresenta os resultados estresse emocional e social. com PC poderão, comparativamente
da análise de correlação entre a QVRS às mães de crianças sem deficiência,
Tuna et al. 6 realizaram um estudo
dos cuidadores (domínios do SF-36) e apresentar risco mais elevado de apre-
para investigar a QVRS de 40 cuida-
o desempenho funcional das crianças sentar variações no nível da saúde
dores de crianças com PC em compa-
(escores nas escalas do PEDI). Não mental e do bem-estar psicológico21.
ração com cuidadores de crianças
houve correlação significativa.
com desenvolvimento típico, usando No entanto, no presente estudo não
Também foi verificado se havia cor- o SF-36. Os resultados demonstraram foi encontrada correlação significativa
relação entre a classificação funcio- que os cuidadores de crianças com PC entre o nível de funcionalidade de
nal das crianças (no GMFCS) e os es- apresentaram escores do SF-36 signifi- crianças com PC, avaliado pelo PEDI
cores dos cuidadores no SF-36 (Tabela cativamente mais baixos do que os e pelo GMFCS, e a QVRS de seus cui-
dadores, a partir do SF-36. No estudo
Tabela 3 Correlação entre os escores dos cuidadores nos domínios do SF-36 e de Tuna et al.6, o nível de função mo-
os escores das crianças nas escalas do PEDI tora foi investigado como um possível
fator negativo de impacto na QVRS
Escores dos Escores das crianças nas escalas do PEDI em 40 cuidadores de crianças com PC.
cuidadores nos Autocuidado Mobilidade Função social No entanto, os autores também não
domínios do SF-36 r p r p r p encontraram correlação significativa
Capacidade funcional 0,057 0,829 -0,226 0,384 -0,166 0,523 entre desempenho motor (GMFCS) e
QVRS (SF-36) dos cuidadores de crian-
Aspecto físico -0,288 0,262 -0,323 0,207 -0,446 0,072
ças com PC. Ones et al.4 também não
Dor -0,116 0,659 -0,324 0,205 -0,273 0,289 encontraram correlação entre a qua-
Estado geral de saúde 0,172 0,510 0,341 0,180 0,273 0,289 lidade de vida de 46 mães de crian-
Vitalidade 0,346 0,174 0,212 0,415 0,124 0,636 ças com PC e os escores do GMFCS.
Aspectos sociais -0,174 0,504 -0,155 0,552 -0,196 0,451 Essa falta de correlação significante
sugere que um desempenho funcional
Aspectos emocionais -0,237 0,361 -0,269 0,297 -0,347 0,173
inferior não piora a qualidade de vida
Saúde mental 0,002 0,993 -0,231 0,372 -0,165 0,528 das mães de crianças com PC. Segundo

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os autores, é possível que a correlação pais de crianças com alterações neuro- das crianças (medida pelo PEDI). Os
tenha sido comprometida por uma lógicas diversas, inclusive PC, e en- autores concluíram que o GMFCS é
distribuição heterogênea das crianças contraram que o nível de escolaridade um ótimo preditor de funcionalidade
nos níveis do GMFCS, pois a maioria dos pais, a incapacidade e problemas em crianças com PC. O GMFCS e o
foi classificada nos níveis III e IV. Essa de comportamento da criança, a fun- PEDI representam aspectos diferentes,
explicação poderia ser aplicada ao ção familiar, a satisfação com o apoio porém diretamente relacionados, da
presente estudo, em que mais de 75% social e as estratégias de enfrentamen- funcionalidade diária da criança com
das crianças foram classificadas nos to de problemas estão relacionados PC.
níveis IV e V. com a percepção de bem-estar dos
Uma das limitações deste estudo é
Schneider et al.10 também investi- pais.
ter sido realizado com uma apenas 17
garam a correlação entre QVRS de 30 Assim, é compreensível a falta de crianças, apesar de este representar o
cuidadores de crianças com PC e o relação entre QVRS de cuidadores e número total de crianças com PC, de
desempenho funcional destas; no desempenho funcional de suas crian- 2 a 12 anos, registradas nas instituições
entanto, usaram o instrumento funcio- ças, encontrada no presente e em pesquisadas do município de Diaman-
nal WeeFIM, que mensura restrições outros estudos, devido ao caráter tina. A literatura sugere a necessidade
ou incapacidades para realização de multifatorial da qualidade de vida de de se estudarem amostras populacionais
tarefas funcionais. Os autores encon- um indivíduo. Além disso, Tuna et al.6 em vez de centros específicos tais
traram uma fraca correlação positiva sugerem que, em vista do caráter ca- como clínicas e hospitais4,8,20.
entre os construtos analisados (r=0,460). tastrófico do nascimento de uma crian-
ça com PC, o grau de severidade da
Qualidade de vida é um conceito
multidimensional que pode ser defi- paralisia parece adquirir menor impor- CONCLUSÃO
nido como a percepção do indivíduo tância aos olhos de seus cuidadores.
Apesar de as crianças com paralisia
de sua posição na vida, no contexto Um outro achado do presente estu- cerebral demandarem mais recursos de
da cultura e dos sistemas de valores do foi a forte correlação positiva en- seus cuidadores, não foi encontrada
nos quais vive e na relação com seus contrada entre os escores do PEDI e correlação entre a qualidade de vida
objetivos, expectativas, padrões e os níveis do GMFCS, mostrando que destes e o grau de desempenho funcio-
interesses19. Segundo Mugno et al.7, o a função motora grossa está relacio- nal das crianças, sugerindo que a qua-
nível de prejuízo na qualidade de vida nada com as atividades funcionais lidade de vida relacionada à saúde
das famílias de crianças com condições dessas crianças. Ostensjo et al.22 pro- pode ser influenciada por diversos
crônicas severas pode ser influenciado curaram verificar a correlação entre fatores. A forte correlação negativa
por vários fatores, tais como status os níveis do GMFCS e as três escalas entre o GMFCS e o PEDI confirma e
socioeconômico, suporte social, carac- do PEDI em uma amostra de 95 crian- respalda a utilização do GMFCS para
terísticas dos pais e das crianças e ças com PC. Tal como no presente avaliar funcionalidade de crianças
capacidade de enfrentamento de estudo, encontraram correlação positiva com PC e mostra como a função mo-
problemas. entre a gravidade da incapacidade tora grossa está intimamente relacio-
King et al.9 avaliaram diversos fato- motora grossa (medida pelo GMFCS) e nada às atividades funcionais dessas
res relacionados ao bem-estar de 166 funcionalidade nas atividades diárias crianças.

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Fisioter Pesq. 2008;15(3) :292-7 297


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.298-303, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Terapia de movimento induzido pela restrição


na hemiplegia: um estudo de caso único
Constraint-induced movement therapy in hemiplegia: a single-subject study
Daniela Virgínia Vaz1, Rafaela Fernandes Alvarenga2, Marisa Cotta Mancini3,
Tatiana Pessoa da Silva Pinto4, Sheyla Rossana Cavalcanti Furtado1, Marcella Guimarães Assis Tirado3

Estudo desenvolvido no Depto. RESUMO: A terapia de movimento induzido por restrição (TMIR) tem mostrado
de Fisioterapia da EEFFTO/ resultados positivos em indivíduos hemiparéticos após acidente vascular
UFMG – Escola de Educação cerebral; consiste na contenção do membro superior não-afetado e treinamento
Física, Fisioterapia e Terapia intensivo do membro afetado. Este estudo visou documentar longitudinalmente
Ocupacional da Universidade os efeitos da TMIR na funcionalidade do membro superior de um indivíduo
Federal de Minas Gerais, Belo com hemiparesia esquerda crônica. Neste estudo de caso único tipo ABA, as
Horizonte, MG, Brasil fases linha de base (A) duraram duas semanas e a intervenção (B) compreendeu
1
Profas. Ms. Assistentes do a contenção do membro sadio com um splint e cinco sessões semanais de 3
Depto. de Fisioterapia da horas de treino do membro superior afetado, durante duas semanas. As medidas
EEFFTO/UFMG de funcionalidade Action Research Arm (ARA) e de qualidade de movimento
e destreza Wolf Motor Function Test (WMFT) foram coletadas cinco vezes por
2
Terapeuta ocupacional semana, e a medida de qualidade e freqüência de uso do membro superior,
Motor Activity Log (MAL), uma vez por semana por seis semanas. Os dados
3
Profas. Dras. Adjuntas do coletados foram tratados estatisticamente. Os resultados mostram ganhos
Depto. de Terapia Ocupacional significativos na qualidade de movimento (WMFT) durante a intervenção
da EEFFTO/UFMG (p<0,05), mantidos no follow-up (p>0,05). Quanto à destreza (WMFT) e
4 funcionalidade (ARA), foram detectadas tendências significativas de ganho
Profa. Assistente do Depto. de durante as quatro primeiras semanas; após a intervenção, houve estabilização
Fisioterapia da Universidade
Fumec, Belo Horizonte, MG do desempenho (p<0,05). A análise do MAL acusou efeitos sem relevância
clínica. Os resultados mostram que a TMIR propiciou ganhos de desempenho
ENDEREÇO PARA motor do paciente com hemiparesia crônica.
CORRESPONDÊNCIA DESCRITORES: Acidente cerebral vascular; Extremidade superior; Hemiplegia/
reabilitação; Terapia por exercício
Daniela Virgínia Vaz
Depto. de Fisioterapia, ABSTRACT: Constraint-induced movement therapy (CIMT) consists of restraining
EEFFTO/ UFMG movement of the non-affected arm while providing intensive training of the
Av. Antônio Carlos 6627 affected upper extremity. Positive results have been reported after CIMT in
Pampulha individuals with hemiparesis due to stroke. This study is a longitudinal, ABA-
31270-901 Belo Horizonte design documentation of the effects of CIMT on upper extremity function of an
MG individual with chronic left hemiparesis. Baseline phases (A) lasted two weeks
e-mail: danielavvaz@gmail.com
and intervention (B) involved restrain of the non-affected arm with a splint and
five three-hour weekly sessions of training of the affected arm, for two weeks.
During the six study weeks upper extremity function was assessed by means of
the Action Research Arm (ARA) and movement quality and dexterity were
assessed with the Wolf Motor Function Test (WMFT), five times a week. Quality
and frequency of use of the upper extremity were assessed by the Motor Activity
Log (MAL) once a week. Collected data were statistically analysed. Results
showed significant gains in quality of movement (WMFT) during intervention
(p<0.05), which were maintained during follow-up (p>0.05). As to dexterity
(WMFT) and functioning (ARA), significant gain trends were detected during
the first four weeks, performance having stabilised thereafter (p>0.05). MAL
analysis did not detect any clinically relevant change. This study thus
APRESENTAÇÃO documented motor performance gains after CIMT in a patient with chronic
jan. 2008 hemiparesis.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Exercise therapy; Hemiplegia/rehabilitation; Stroke; Upper
ago. 2008 extremity

298 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


2008;15(3): 298-303
Vaz et al. Terapia de restrição na hemiplegia

INTRODUÇÃO reorganização uso-dependente, tem


sido evidenciado por estudos recentes,
de 10º de dedos a partir da posição de
repouso na mão afetada; capacidade
O acidente vascular cerebral (AVC) que descrevem aumentos significati- cognitiva para compreensão de ordens
é uma condição clínica caracterizada vos das áreas de representação cortical simples e execução de atividades
por um deficit neurológico decorrente de segmentos corporais submetidos a realizadas na intervenção6. O paciente
de um distúrbio na circulação cere- treinamento intensivo. A hipótese de não apresentava deficit de equilíbrio
bral, podendo resultar em incapacida- que a TMIR produziria uma ampla reor- que pudessem ser agravados pela imo-
de e morte1. As manifestações clínicas ganização uso-dependente em pacien- bilização do membro superior não-
secundárias ao AVC envolvem altera- tes com hemiparesia crônica secundária afetado, e não havia sido submetido
ções motoras, sensitivas, cognitivas e ao AVC foi empiricamente testada e a cirurgias no membro superior ou
emocionais2. A hemiparesia é o deficit confirmada por diversos estudos13-18. estava fazendo uso de medicações
mais comum, afetando mais de 80% Apesar de vários estudos demonstra- que influenciassem a função motora.
dos pacientes na fase aguda e mais rem efeitos positivos da TMIR na fun- Anteriormente ao período do estudo,
de 40% deles cronicamente3. ção do membro superior de pacientes o paciente foi submetido a interven-
hemiparéticos, uma documentação ções de fisioterapia e terapia ocupacio-
Dentre as técnicas preconizadas nal durante os seis primeiros meses
para reabilitação do membro parético longitudinal sistemática dos efeitos
dessa terapia ainda não foi realizada. após o AVC, enquanto esteve inter-
encontram-se o biofeedback, o trata- nado em um hospital de reabilitação.
mento neuroevolutivo, o treinamento Enquanto desenhos experimentais tra-
dicionais informam sobre a presença Durante o estudo, o participante não
bimanual e, mais recentemente, a te- foi submetido a quaisquer outras te-
rapia de movimento induzido por de efeitos conseqüentes de uma inter-
venção, o desenho experimental de rapias voltadas para a função do
restrição (TMIR)4. membro superior.
caso único19 oferece informações sobre
A terapia de movimento induzido por o padrão de mudanças longitudinais O desenho experimental de caso
restrição (constraint-induced movement no desempenho do paciente subme- único tem dois elementos fundamentais:
therapy) é caracterizada pela restrição tido a essa terapia. Tal informação é avaliações repetidas e o desenho de
do membro superior não-afetado, as- de grande relevância para a prática fases. O desenho ABA consiste de três
sociada a um programa intensivo de clínica, uma vez que detalha o pro- fases: linha de base anterior ao
treinamento do membro afetado e à gresso individual durante o tratamen- tratamento (A); intervenção (B); e a
utilização do shaping 5, uma técnica to, revelando a temporalidade do perfil segunda linha de base (A), após a fase
comportamental. A técnica envolve a de mudanças e a manutenção ou não de tratamento. Nas três fases são feitas
seleção de atividades específicas para dos efeitos após a suspensão da terapia.
mensurações sistemáticas a intervalos
as dificuldades individuais do pacien- Nesse sentido, o objetivo deste estudo
regulares. O estudo durou seis sema-
te, auxílio do terapeuta nas tarefas que foi documentar longitudinalmente os
nas, tendo cada fase duração de duas
o indivíduo é incapaz de realizar inde- efeitos da TMIR na funcionalidade do
semanas. O número total de mensu-
pendentemente e recompensas verbais membro superior afetado de um indi-
rações realizadas neste estudo foi de
para quaisquer ganhos que ocorrerem6. víduo com hemiparesia, pela metodo-
30, sendo 10 na linha de base inicial,
logia experimental de caso único.
A TMIR baseia-se em dois mecanis- 10 na fase de intervenção, e 10 na
mos: o fenômeno de desuso aprendido segunda linha de base.
e a reorganização uso-dependente7. O METODOLOGIA
“desuso aprendido” é definido como Avaliações
o uso diminuído da extremidade afeta- O presente estudo foi aprovado pelo
da em relação ao potencial motor que Comitê de Ética em Pesquisa da O paciente foi avaliado pelos testes
o indivíduo possui8. Após uma lesão Universidade Federal de Minas Gerais. Action Research Arm Test (ARA) e Wolf
cerebral, o indivíduo que apresenta di- Um indivíduo destro, do sexo mas- Motor Function Test (WMFT) cinco
ficuldade no uso do membro afetado culino, com 47 anos e com hemipa- vezes por semana. O ARA, utilizado
aprenderá rapidamente a utilizar estra- resia esquerda em conseqüência de para avaliar função motora do mem-
tégias compensatórias, fazendo uso um AVC sofrido 23 meses antes do bro superior, é composto por 19 itens
apenas da extremidade não-afetada9-11. início do estudo, concordou em ser com o foco na preensão de objetos de
Assim, a falta de uso espontâneo do submetido aos procedimentos da pes- diferentes formas e tamanhos e em
membro afetado pode não decorrer es- quisa e assinou o termo de consenti- movimentos amplos realizados nos
sencialmente de danos estruturais ou mento livre e esclarecido. O paciente planos horizontal e vertical. O desem-
impossibilidade de realização de mo- preenchia os critérios de inclusão co- penho em cada tarefa motora é pontua-
vimentos funcionais, mas de mecanis- mumente estabelecidos na literatura do em uma escala de quatro pontos,
mos comportamentais originados de sobre a TMIR: idade superior a 18 anos, variando de zero (nenhum movimento
tentativas fracassadas de uso da extre- diagnóstico de hemiparesia crônica possível) a três (movimento desempe-
midade afetada e conseqüente frus- devida a AVC (acidente há mais de nhado normalmente)20. A pontuação
tração12. O segundo mecanismo que um ano); capacidade de extensão total é dada pela soma dos pontos em
fundamenta a TMIR, o fenômeno de ativa de punho de 20º e extensão ativa cada item. O WMFT consiste em 17

Fisioter Pesq. 2008;15(3) : 298- 303 299


tarefas seqüenciadas de acordo com simples para as mais complexas, e em dados 19 , indicando a direção da
as articulações envolvidas (do ombro alguns momentos o paciente era mudança (estacionária, aceleração ou
até interfalangeanas) e nível de difi- auxiliado pela terapeuta a realizar desaceleração) dos dados de uma fase
culdade (de habilidades motoras etapas da atividade que não conseguia em relação à fase subseqüente, por
amplas para finas). Para a avaliação completar sozinho, sendo fornecido meio de uma linha de tendência. Dife-
de destreza, em cada tarefa a velo- feedback verbal a cada melhora no renças entre uma fase e a subseqüente
cidade de desempenho é cronome- desempenho da tarefa. Foram realiza- na proporção de pontos abaixo e aci-
trada, sendo 120 segundos o tempo das atividades de destreza manual ma da linha de tendência são testadas
máximo permitido para o desempenho (como jogos de encaixe, massa de com o teste binomial, com nível de
de cada tarefa. A pontuação total da modelar, quebra cabeça e desenho significância estabelecido em 0,05.
avaliação de destreza é dada pelo com blocos), jogos de tabuleiro e de Diferenças significativas indicam
tempo total em minutos gasto para cartas, atividades motoras globais e alteração na tendência de mudança do
completar todas as tarefas. A quali- atividades funcionais de alimentação. desempenho. Pelo método banda de
dade do movimento desempenhado Durante todo o período de intervenção, dois desvios padrão (BDDP) determina-
também é documentada em cada houve restrição da extremidade não- se a variabilidade dos dados da fase
tarefa por uma escala que varia de afetada por um splint de posiciona- de linha de base e compara-se com a
zero a cinco pontos 21. A pontuação mento ventral e tipóia para imobili- distribuição dos dados da fase seguin-
total para a qualidade de movimento zação do ombro e cotovelo (Figura 1). te. Mudanças são consideradas estatis-
é dada pela média das pontuações de ticamente significativas se pelo me-
cada tarefa. Ambos os testes foram
filmados e os escores atribuídos por
Análise dos dados nos dois pontos consecutivos da fase
subseqüente se apresentarem acima
duas fisioterapeutas cegas em relação Foram usados os métodos estatísti- ou abaixo da faixa de dois desvios
à condição da avaliação. cos celeration line (CL) e banda de dois padrão da fase anterior, uma vez que
O paciente foi ainda avaliado pelo desvios padrão. A CL é utilizada para a probabilidade de tal evento ocorrer
estimar tendência em uma série de é menor do que 5%19.
Motor Activity Log (MAL) uma vez por
semana, durante as seis semanas de
duração do estudo. O MAL consiste
em uma entrevista semi-estruturada
com o participante acerca de 26 ati-
vidades funcionais do membro su-
perior. Durante a aplicação do teste
são obtidas informações sobre a
qualidade e quantidade do uso do
membro afetado nas atividades da
vida diária, avaliadas em uma escala
de zero a cinco pontos22. A pontua-
ção total é dada pela soma das
pontuações de cada item.

Intervenção
Na terceira e quarta semanas ocor-
reu a intervenção, que consistiu em
treinamento da extremidade afetada
por meio de atividades funcionais,
utilizando o método shaping, durante
três horas diárias, cinco vezes por se-
mana. O shaping consiste na gradua-
ção progressiva da complexidade da
movimentação do membro superior
afetado 6 . Os princípios do shaping
foram definidos e implementados em
tarefas funcionais considerando os mo-
vimentos articulares que apresentavam
défices mais pronunciados e maior
potencial de ganhos. As demandas de
movimentação exigidas nas tarefas
Figura 1 Ilustração da imobilização utilizada durante a intervenção
funcionais foram graduadas das etapas

300 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


2008;15(3): 298-303
Vaz et al. Terapia de restrição na hemiplegia

Para a análise de cada variável, a Função motora


escolha entre os dois métodos (CL e 40
BDDP) foi feita segundo uma explo- 35
ração preliminar dos dados, para de-
30
tectar a presença de tendências no
perfil longitudinal dos dados, por meio 25

Escores
da Estatística C. Uma vez que a CL. 20
ao contrário da BDDP, é o método 15
apropriado para a análise de dados não-
10
estáveis, todas as variáveis em que a
Estatística C detectou tendências foram 5
analisadas com a CL; as demais variáveis 0
foram analisadas com a BDDP23. 0 5 10 15 20 25 30
Medições nas três fases
RESULTADOS Figura 4 Escores no ARA (função motora) nas três fases (linha de base,
intervenção e pós-intervenção). Linha sólida: celeration line, linha de
De acordo com a análise por BDDP, tendência; linha pontilhada: prolongamento da linha de tendência da
foram encontrados ganhos significati- fase anterior
vos na qualidade de movimento (me- dida pelo WMFT) quando a interven-
ção foi comparada à linha de base
Qualidade de movimento
4 inicial (p<0,05). Os ganhos foram
mantidos nas duas semanas após a
3,5
intervenção, uma vez que não houve
3 diferenças entre a intervenção e a
2,5 segunda linha de base (p>0,05), como
Escores

mostra a Figura 2.
2

1,5 Em relação à destreza (aferida pelo


WMFT) e funcionalidade (pelo ARA),
1
foram detectadas tendências de ganho
0,5 durante a linha de base e a interven-
0 ção, de acordo com a Estatística C. A
0 5 10 15 20 25 30 linha de tendência não detectou dife-
Medições nas três fases renças significativas entre as duas
Figura 2 Escores no WMFT (qualidade de movimento) nas três fases (linha de fases. Após a intervenção, houve esta-
base, intervenção e pós-intervenção); linha sólida: média da fase; bilização do desempenho, acusada
linha pontilhada: banda de dois desvios padrão por diferenças significativas (p<0,05)
na CL, indicando desaceleração dos
Destreza ganhos no pós-intervenção em compa-
10 ração com a tendência de ganhos da
intervenção. A evolução de desempe-
9
nho nessas variáveis pode ser observa-
8 da nas Figuras 3 e 4.
7
A análise qualitativa do MAL acusou
6 mudanças sem relevância clínica
Escores

5 durante a intervenção (variação de 0,4


4 pontos na qualidade e 0,64 pontos na
freqüência). A análise estatística não
3
detectou mudanças significativas.
2
1
0 DISCUSSÃO
0 5 10 15 20 25 30 O presente estudo teve como obje-
Medições nas três fases tivo documentar longitudinalmente os
Figura 3 Tempo (em minutos) de realização das tarefas no WMFT (destreza) efeitos da TMIR na funcionalidade do
nas três fases (linha de base, intervenção e pós-intervenção). Linha membro superior afetado de um indi-
sólida: celeration line, linha de tendência; linha pontilhada: víduo com hemiparesia. A diferença
prolongamento da linha de tendência da fase anterior significativa entre a primeira linha de

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base e a intervenção demonstrou que qualidade de uso do membro afetado limitações motoras e à necessidade de
a TMIR foi capaz de promover ganhos na rotina diária de pacientes subme- auxílio para realizar algumas tarefas.
significativos na qualidade de movi- tidos à TMIR5,9,24-26. Tal fato pode ser A decisão de utilizar a contenção
mento do membro superior afetado e, associado ao menor tempo de conten- apenas durante o treinamento foi to-
ainda, que esses ganhos foram manti- ção e treinamento. Neste estudo, foi mada para evitar aumento desse
dos por duas semanas após a suspensão utilizado um protocolo de três horas sentimento de frustração, uma vez que
da intervenção. Em relação à destreza de treino funcional com uso da con- no ambiente domiciliar o paciente
e funcionalidade, foram detectadas tenção somente durante o treinamen- não podia contar com cuidador para
tendências de melhora de desempenho to, em contraste com estudos que oferecer auxílio nos momentos de
já na linha de base, antes do início da analisaram o protocolo tradicional de dificuldade. No entanto, durante a
intervenção. Esses resultados indicam seis horas diárias de treino associado intervenção o paciente assistiu aos
que o desempenho nos testes de des- à contenção por 90% do tempo que o vídeos dos testes e pôde verificar seus
treza e funcionalidade pode melhorar paciente passava acordado. Sterr e ganhos de desempenho em compara-
em decorrência do aprendizado pela colaboradores5 compararam os efeitos ção com as primeiras avaliações. Essa
repetição dos testes (dez avaliações do tempo das sessões de treinamento estratégia foi útil para aumentar a mo-
na linha de base inicial). Quando o funcional na TMIR, realizando sessões tivação do paciente e controlar seu
protocolo da TMIR foi iniciado, o de três e seis horas de treinamento nível de frustração.
paciente continuou apresentando ga- diário, com contenção em 90% do
nhos de destreza e funcionalidade, período de vigília. Os resultados Na literatura internacional, os pro-
mantendo a mesma tendência que já demonstraram ganhos funcionais no tocolos tradicionais da TMIR têm apre-
vinha sendo observada na fase anterior. MAL e no WMFT, mas os efeitos foram sentado resultados significativos em
Houve, no entanto, uma desaceleração mais expressivos no grupo que subme- termos de ganhos na funcionalidade
dos ganhos após a suspensão da tido a 6 h de treinamento5. Os resulta- do membro superior parético em
intervenção, indicando que possivel- dos referentes ao MAL no presente pacientes crônicos 5,7,9,24-26, porém há
mente a intervenção tinha papel estudo sugerem que o tempo de treino grandes diferenças na estrutura dos sis-
importante para manter a tendência e de uso da contenção podem interferir temas de reabilitação entre países
de ganhos de desempenho. Caso o pro- na generalização dos ganhos obtidos desenvolvidos e países em desenvolvi-
tocolo de TMIR tivesse sido estendido, na terapia para as tarefas da rotina mento, como é o caso do Brasil. Assim,
o paciente poderia ter continuado a diária. Além disso, o participante des- estudos que analisem a aplicabilidade
demonstrar melhoras de destreza e te estudo apresentava grande limita- da técnica na população brasileira são
funcionalidade. Os resultados positivos ção na amplitude de movimento ativo fundamentais para a avaliação da
em relação ao desempenho mensura- do ombro, o que possivelmente inter- exeqüibilidade dessa técnica em nossa
do pelos testes WMFT e ARA foram feriu tanto no treinamento quanto na realidade sociocultural.
semelhantes aos encontrados por transferência dos ganhos obtidos para
outros estudos5,9,10,24-26. as atividades diárias. As limitações na
Apesar dos ganhos observados em
generalização dos ganhos evidenciam CONCLUSÃO
a necessidade de documentação espe-
testes realizados em ambiente clínico, O presente estudo exemplifica a
cífica tanto de aspectos de capacida-
não foi observada mudança relevante aplicação clínica de um protocolo de
de funcional, em testes aplicados no
quanto à freqüência de uso e à quali- intervenção modificado e sugere que
ambiente clínico, quanto do desem-
dade de movimento do membro paré- a terapia de movimento induzido pela
penho em tarefas diárias do contexto
tico em atividades funcionais da rotina restrição pode ser utilizada para pro-
real do paciente.
diária do paciente, avaliadas pelo mover ganhos no desempenho motor
MAL. Esse resultado é conflitante com Durante as sessões de treinamento de pacientes com hemiparesia crônica
achados da literatura, que evidenciam observaram-se momentos de grande secundária a um acidente vascular
ganhos significativos na quantidade e frustração do paciente frente a suas cerebral.

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2008;15(3): 298-303
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Fisioter Pesq. 2008;15(3) : 298- 303 303


Fisioterapia e Pesquisa, São Paulo, v.15, n.3, p.304-8, jul./set. 2008 ISSN 1809-2950

Controle postural em indivíduos portadores da síndrome


de Down: revisão de literatura
Postural control in individuals with Down syndrome: a review
Regiane Luz Carvalho1, Gil Lúcio Almeida2

Estudo desenvolvido no Curso RESUMO: Este trabalho consistiu numa revisão da literatura sobre controle postural
de Fisioterapia da PUC-Minas – em indivíduos portadores da síndrome de Down, por meio de consulta às bases
Pontifícia Universidade de dados Medline, Lilacs e Web of Science. Dentre os artigos publicados nos
Católica de Minas Gerais, últimos 16 anos, selecionaram-se 30, dos quais 7 focalizam a natureza dos
campus de Poços de Caldas, défices no sistema de controle postural, como alterações neurobiológicas e
MG, Brasil biomecânicas, e 23 enfocam o controle postural no período de desenvolvimento
(11 artigos) e em adolescentes e adultos (12 artigos) portadores da síndrome.
1 Profa. Dra. do Curso de Discutem-se os marcos teóricos que conformam a compreensão do
Fisioterapia da PUC-Minas –
campus de Poços de Caldas desenvolvimento postural e seus défices, bem como as implicações dessa
compreensão para a prática da fisioterapia.
2 Prof. Dr. diretor dos programas DESCRITORES: Atividade motora; Deficiências do desenvolvimento; Síndrome de
do New York Institute of Down/reabilitação; Postura
Technology no Brasil, São
Paulo, SP ABSTRACT: This is a review of literature on postural control in individuals with the
Down syndrome, by searching in Medline, Lilacs and Web of Science data
ENDEREÇO PARA bases. Among articles published in the last 16 years, 30 were selected, of
CORRESPONDÊNCIA
which 7 focus on postural control system deficits, such as neurobiological and
Regiane L. Carvalho biomechanical alterations, and 23 focus postural control development (11
Curso de Fisioterapia/PUC- articles) and in adolescents and adults (12 articles) with the Down syndrome.
Minas The theoretic bases for understanding posture control development and deficits
Av. Padre Francis Cletus Cox are discussed, in view of their implications for physical therapy practice.
1661 Jd Country Club KEY WORDS: Developmental disabilities; Down syndrome/rehabilitation; Motor
37701-355 Poços de Caldas activity; Posture
MG
e-mail: regiluz@pucpcaldas.br/

APRESENTAÇÃO
abr. 2007
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO
abr. 2008

304 Fisioter Pesq. 2008;15(


2008;15(3)
3): 304-8
Carvalho & Almeida Controle postural na síndrome de Down

INTRODUÇÃO RESULTADOS Os achados de Polastri e Barela 10


favorecem a idéia de atraso no desen-
A síndrome de Down (SD) é a mais O desenvolvimento do controle volvimento do processo de organiza-
freqüente anormalidade cromossômi- postural de crianças portadoras de SD ção sensorial e sua relação com a ação
ca associada ao retardo mental, com parece progredir de maneira seme- motora. Verificaram a importância da
incidência aproximada de 1 em cada lhante ao de crianças neurologica- experiência na relação percepção-
700 nascidos vivos. A desordem gené- mente normais. No entanto, há uma ação ao avaliar a oscilação corporal
tica é atribuída a trissomia (92 a 95% defasagem cronológica na aquisição na posição sentada em uma sala
dos casos), mosaico (2 a 4%) e trans- dos principais marcos motores. Palisano móvel, tendo observado resposta se-
locação (3 a 4%) do cromossomo 21. melhante entre bebês portadores de SD
et al. 7 descreveram um atraso de 6
Os fatores mais aceitos como predis- e NN, com experiência no sentar inde-
meses na aquisição do sentar indepen-
ponentes são exposição a radiações, pendente de respectivamente 7,2 e 1,5
dente e 9 meses no engatinhar. Ulrich
infecções e idade materna1. meses. Por outro lado, bebês com SD
et al.8 observaram atraso no aprendizado
novatos no sentar (1,6 meses) apre-
O fenótipo é variável, afetando dife- da marcha.
sentaram comportamento diferente
rentes sistemas e tecidos. Dentre as alte- Shumway-Cook e Woollacott5 ana- dos NN, indicando a necessidade de
rações musculoesqueléticas destacam-se lisaram as respostas posturais automá- um tempo maior de experiência por
a irregularidade da densidade óssea, ticas em crianças portadoras de SD de parte dos portadores de SD para
hipoplasia da cartilagem, baixa estatura 4 a 6 anos durante perturbações ajustarem a relação percepção-ação.
e frouxidão ligamentar2. Em relação ao externas geradas por plataforma móvel Defendendo a mesma idéia, Ulrich
sistema nervoso central, observam-se (translação). Padrões normais de res- et al. 11 explicam o atraso do desen-
menor volume total do cerebelo, alte-
postas posturais foram observados, mas volvimento postural pela dificuldade
rações celulares na região do hipo-
a latência para o início da resposta de percepção das respostas posturais,
campo e redução das sinapses no
foi muito grande, resultando em o que prejudica a sensação do movi-
córtex temporal3. Alterações motoras
aumento da oscilação corporal e, mento e de suas conseqüências.
e perceptivas que afetam o controle
algumas vezes, em perda do equi- Uyanik et al. 12 sugerem a disfunção
postural são freqüentes4.
líbrio. Outras características descritas de integração sensorial como resultado
Este artigo efetua uma revisão da foram défices na adaptação às mu- da limitada experiência sensorial.
literatura disponível sobre o controle danças do ambiente e dificuldade de
postural de indivíduos portadores de utilização das reações antecipatórias. Controle postural em
SD, buscando implicações para a
prática da fisioterapia. Algumas dificuldades no relaciona- adolescentes e adultos
mento percepção-ação também têm
sido apontadas devido à grande difi- As dificuldades motoras e os défices
METODOLOGIA culdade de manutenção do equilíbrio posturais parecem persistir ao longo
da vida dos portadores de SD. Aruin e
na presença de informações sensoriais
O presente estudo foi realizado com incongruentes6. Por exemplo, Wade et Almeida 13 analisaram as respostas
base em levantamento bibliográfico de al.9 verificaram que crianças portado- posturais geradas por movimentos
trabalhos publicados nos últimos 16 ras de SD foram mais influenciadas rápidos de flexão e extensão bilateral
anos (1993-2008), com exceção de pelos movimentos de uma sala móvel dos ombros. Modelos diferentes de
dois estudos clássicos da década de respostas posturais antecipatórias
do que crianças neurologicamente
19805,6. Foram consultadas as bases de precedendo movimentos voluntários
normais (NN). Os achados desses
dados Medline, Lilacs e Web of Science foram observados. Os adultos porta-
autores foram similares aos descritos
com as seguintes expressões (no idio- dores de SD apresentaram grande
por Polastri e Barela10 para bebês e por
ma inglês): Down syndrome em deslocamento do centro de pressão,
Shumway-Cook e Woollacott 6 para
associação com postural control, motor padrão eletromiográfico de contração
crianças de 10 anos. Este último estudo simultânea entre os pares de músculos
strategy, development e sensorial mostrou que, mesmo aos 10 anos de
system. Além disso, as listas de refe- agonista e antagonista envolvidos no
idade, os portadores de SD dependem controle postural (co-ativação) e mo-
rências bibliográficas dos artigos muito da visão, ao passo que crianças
selecionados foram examinadas para vimentos de flexão do quadril e
NN já apresentam controle multimo- extensão do joelho. Já o grupo NN
obtenção de trabalhos adicionais.
dal. Apesar da ausência do controle apresentou padrão alternado de
Dentre os 30 estudos localizados e multimodal, esses autores não pude- ativação muscular com movimentos
considerados relevantes, 7 focalizam ram determinar se o desenvolvimento de extensão do quadril e flexão do
alterações morfológicas e 23 o desen- do processo de organização de con- joelho. A estratégia utilizada pelos
volvimento do controle postural, dis- flito sensorial está ausente ou simples- portadores de SD foi menos universal
tribuídos quase igualmente entre os mente atrasado nessas crianças, já que e de menor eficiência em relação ao
que enfocam crianças (11) e adoles- esse processo se desenvolve normal- gasto energético, entretanto foi su-
centes e adultos (12 artigos). mente dos 7 aos 10 anos. ficiente para assegurar o equilíbrio.

Fisioter Pesq. 2008;15(3) : 304- 8 305


Estudos sobre a manutenção da Algumas teorias tentam explicar bilidade de realizar tarefas diárias,
postura em superfícies estáveis têm certas alterações, como por exemplo como a manutenção do equilíbrio e a
mostrado uma maior velocidade de o padrão de co-contração. Virji-Babul marcha.
oscilação postural medida pelo des- e Brown19 sugerem que a co-contração
As alterações neurobiológicas tam-
locamento do centro de pressão tanto é decorrente da dificuldade de gerar
bém devem ser consideradas. No nível
em adultos (2,00±0,5 cm/s)14 quanto forças adequadas. Ulrich et al.17 pro-
central, o cerebelo seria um bom can-
em adolescentes 15 portadores de SD põem uma compensação para a frou- didato a causador, devido a seu papel
(2,4±1 cm/s) em relação a adultos (1,42±0,1 xidão ligamentar. Latash e Anson 20 na coordenação muscular 24 e seu
cm/s) e adolescentes NN (1,5±0,7 cm/s). alegam que a co-contração é uma baixo peso em indivíduos portadores
O aumento da oscilação parece ser característica geral do movimento, de SD25. Sabe-se que défices cerebe-
uma característica geral da postura utilizada em situações inesperadas lares prejudicam a ativação sinérgica
desses indivíduos, da infância à vida para aperfeiçoar a segurança e a esta- dos músculos, contribuindo para a len-
adulta16. Com o aumento da oscilação, bilidade. Para esses autores, uma res- tidão dos movimentos. Outro fato inte-
os movimentos realizados sobre uma posta pré-programada de padrão ressante é a semelhança no padrão de
base de suporte instável tornam-se recíproco, ativada de forma errônea,
mais difíceis de ser controlados15. marcha adotado por indivíduos porta-
acentuaria o distúrbio. Por outro lado, dores de disfunção cerebelar e de SD
Outra característica marcante do a co-contração atenuaria os efeitos da em esteira26.
comportamento motor é o padrão de perturbação, independentemente da
direção do distúrbio. Um achado No nível periférico, as alterações
co-contração muscular que foi descrito
interessante é o de que, com a prática podem estar ligadas ao sistema soma-
durante caminhada de baixa e alta
extensiva, esses indivíduos são capa- tossensorial. Brandt e Rosen27 mostra-
velocidade em esteira 17 , em anteci-
pação a perturbações geradas por zes de adotar um padrão trifásico de ram baixa amplitude do potencial de
movimentos rápidos de extensão e ativação21, favorecendo a idéia de que ação devido à estimulação do polegar,
flexão dos ombros 13, com ativação a co-contração é uma escolha feita sugerindo função somatossensorial
simultânea entre os músculos: sóleo e pelo sistema nervoso tendo em vista deficitária. Por outro lado, Shumway-
tibial anterior; bíceps e reto femoral; sua flexibilidade e adaptabilidade. Cook e Woollacott5 mostraram latências
reto abdominal e eretor espinhal; e, Embora seja uma escolha mecanica- normais dos reflexos de estiramento
também, em reações pré-programadas mente sub-ótima, a co-contração monossinápticos durante perturbações
durante perturbações na articulação do oferece mais segurança e reflete a in- geradas por plataforma de força. Além
cotovelo 18. segurança do sistema em gerar rea- de reflexos normais, o padrão adotado
ções posturais universais. Por outro durante movimentos planares do braço
lado, os altos níveis de co-contração em portadores de SD diferiu do
DISCUSSÃO descritos acima 13,17,18 não condizem observado em indivíduos com neuro-
com a caracterização de baixo tônus patia periférica28.
A literatura consultada descreve as e baixa capacidade de gerar força, em Com base nos achados de Sainburg28
principais características do controle adolescentes portadores de SD. Existe e de Shumway-Cook e Woollacott 5 ,
postural em indivíduos portadores da portanto uma inconsistência entre a acreditamos que os défices observados
síndrome de Down desde seu desen- avaliação clínica do tônus nessa popu- nos portadores de SD estejam mais
volvimento (atraso na aquisição de lação e os achados acima citados, per- relacionados a comprometimentos em
marcos motores, lentidão na elabora- manecendo a relação entre hipotonia níveis centrais do que periféricos, cor-
ção de respostas posturais, grande e co-contração pouco compreendida. roborando a idéia de disfunção de
oscilação postural5,7,10) até a vida adul-
Para Webber et al. 14 e Vuillerme et integração sensorial, com conseqüen-
ta (adoção de estratégia motora menos
al.15, a avaliação do tônus sobre con- te deficit de percepção das respostas
universal, instabilidade, dificuldade
dições passivas pode fornecer infor- posturais, do movimento e de suas
de adaptação às alterações ambientais
mações limitadas sobre as estratégias conseqüências11.
e co-contração) 14,15,17,18 . Os artigos
utilizadas pelo sistema nervoso
selecionados avaliam o controle Apesar da importância do conheci-
central.
postural em plataformas fixas e mento das alterações biomecânicas e
móveis, assim como durante distúrbios Outros aspectos dos défices de neurobiológicas para a compreensão
gerados por movimentos corporais controle postural podem ser explicados dos déficits posturais, características
com e sem manipulação das informa- por alterações biomecânicas, como como contexto ambiental, experiência
ções sensoriais (salas móveis, restrição diferença na densidade óssea, hipo- e prática têm grande influência sobre
da visão). A maioria dos trabalhos plasia da cartilagem, alterações nas esses défices. Os efeitos positivos da
consultados focaliza a descrição das propriedades dos ligamentos2. Essas prática têm sido demonstrados. A
alterações posturais em várias situa- alterações podem influenciar a capa- exposição repetida de bebês à sala
ções e fases da vida, sendo que as cidade de gerar torque articular e móvel (situação ilusória) levou a um
razões específicas dessas alterações força em contrações isocinéticas 22 . acoplamento mais coerente e estável
são pouco exploradas e não são total- Para Shields e Dodd23, a fraqueza mus- entre a informação visual e a oscila-
mente identificadas. cular também pode influenciar a ha- ção corporal10. A redução da rigidez

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Carvalho & Almeida Controle postural na síndrome de Down

muscular ao longo das tentativas du- tema motor. Assumindo a estratégia uti- concordamos com Polastri e Barela10, que
rante a manutenção de postura estáti- lizada pelos portadores de SD como sugerem o início precoce da interven-
ca sinalizou a capacidade de adultos uma resposta adaptativa (seja a défices ção devido a seu impacto na aquisição
modularem sua rigidez muscular com biomecânicos, no sistema nervoso cen- e refinamento das habilidades moto-
a prática 14 . Similarmente, Smith et tral, ou mesmo à limitada experiência ras. Entretanto, embasados nos estudos
al.29 verificaram a redução dos valores sensorial), deveria o fisioterapeuta ten- disponíveis na literatura, defendemos
de rigidez muscular em pré-adoles- tar incorporar a estratégia utilizada que essa prática seja voltada para a
centes com SD após o treino de cami- pelos indivíduos NN na realidade dos função e não para a correção de ajus-
nhada em esteira, embora os padrões SD? Muitas vezes, os terapeutas optam tes compensatórios, já que o sistema
cinemáticos adotados antes e após o por treinar seus pacientes a adotar um nervoso central pode adotar inúmeros
treino tenham diferido dos padrões modelo mais próximo possível do padrões motores capazes de acompa-
observados em indivíduos NN. observado na população em geral. Por nhar com sucesso as tarefas motoras
exemplo, pode-se treinar a marcha de (variabilidade normal).
portadores de SD com marcadores no
Implicações para a reabilitação chão, para que aumentem o comprimen-
O melhor conhecimento sobre os
to do passo e se aproximem do padrão
normal, ou simplesmente estimulá-los
CONCLUSÕES
aspectos biomecânicos, neurológicos
a andar e a descobrir suas próprias estra- De uma forma geral, os estudos de
e ambientais envolvidos no controle
tégias em várias superfícies, com e controle motor em portadores de SD
postural, assim como as adaptações
sem estímulos sensoriais – o que nos indicam défices nos mecanismos en-
observadas em várias situações faci- parece mais eficiente. Tentativas de volvidos no controle postural. A aqui-
litam a compreensão dos défices de corrigir ajustes compensatórios sem sição desse controle é atrasada e os
equilíbrio, norteando a reabilitação. entender as causas primárias desses mecanismos posturais parecem estar
Tem sido debatido na literatura se ajustes podem prejudicar os movimen- organizados de forma a maximizar a
a reabilitação deve enfatizar a alte- tos. Winter et al.30 apresentaram uma estabilidade, adaptando-se pela lenti-
ração do padrão motor (co-contração, análise biomecânica da marcha e dão e pobreza das respostas às altera-
lentidão etc.) caracterizado como sub- concluíram que muitas características ções imprevisíveis do ambiente. A
ótimo. Segundo Latash e Anson20, esse atípicas eram resultantes de adapta- conseqüência funcional desse prin-
padrão aparentemente anormal deve ções e não poderiam ser consideradas cípio é a redução da velocidade e da
ser visto como um sinal de que o sis- patológicas. coordenação dos movimentos, que se
tema nervoso central está reorgani- Não questionamos aqui o efeito tornam desajeitados. Embora restrita
zando suas prioridades para alcançar benéfico da prática que tem sido obser- em condições laboratoriais, a prática
uma solução motora, dentre as várias vada em bebês10, pré-adolescentes29 e tem influenciado de forma positiva o
permitidas pela redundância do sis- adultos14 portadores de SD. Pelo contrário, controle postural.

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Características psicométricas dos instrumentos usados para avaliar


a qualidade de vida na esclerose múltipla: uma revisão bibliográfica
Psychometric characteristics of the instruments used
to assess quality of life in multiple sclerosis: a literature review
Luísa Maria Reis Pedro1, José Luís Pais-Ribeiro2

RESUMO: A esclerose múltipla (EM) é a doença crônica neurológica que mais


Estudo desenvolvido na ESTESL afeta adultos jovens; em 80% dos casos, a doença progride para situações de
– Escola Superior de Tecnologia
da Saúde de Lisboa, Lisboa, níveis variados de incapacidade, o que torna necessário avaliar a qualidade
Portugal de vida (QV) desses indivíduos. O objetivo desta revisão foi localizar estudos
que avaliam a QV em indivíduos com EM, identificando os instrumentos
1
Profa. Dra. Adjunta da ESTESL utilizados e suas características psicométricas. Foram consultadas as bases
Psycinfo, Psycarticles, Psycbooks, Psychology & Behavioral Science Collection,
2
Prof. Dr. Associado da EJS E-Journal, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database
Faculdade de Psicologia e of Systematic Reviews, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Medline,
Ciências da Educação, e Academic Search Complete, utilizando os descritores multiple sclerosis e
Universidade do Porto, Porto, quality of life, para localizar artigos publicados no período 1997-2007. Foram
Portugal selecionados 1.376 artigos e, após a leitura dos resumos, excluídos os referentes
a instrumentos que não tinham boas características psicométricas e/ou eram
ENDEREÇO PARA pouco referenciados. Foram encontrados 461 artigos, dos quais 267 usaram
CORRESPONDÊNCIA
instrumentos genéricos e 194, específicos para a EM. Dos 7 instrumentos (2
Luísa M. R. Pedro genéricos, 5 específicos) com boas características psicométricas utilizados
Politécnico de Lisboa (ESTESL) pelos estudos consultados, o mais usado é o SF-36 (em 237 estudos). Todos os
Av. D. João II, Lote 4.69.01 - instrumentos têm validade verificada e apresentam grau elevado de
1990 – confiabilidade, podendo ser utilizados para avaliação da qualidade de vida
096 Lisboa Portugal de pacientes com EM tanto em pesquisa quanto na clínica.
e-mail: DESCRITORES: Esclerose múltipla; Estudos de validação como assunto;
luisa.pedro@estesl.ipl.pt; Qualidade de vida
jlpr@fpce.up.pt
ABSTRACT: Multiple sclerosis (MS) is the chronic neurological disease that most
affects young adults; 80% of patients experience a transition towards persistent
disability, hence the need to assess their quality of life (QoL). The aim of the
study was to review studies that assess QoL in patients with multiple sclerosis,
inquiring on the instruments used and their psychometric features. Articles
published from 1997 through 2007 were searched for by means of key words
“multiple sclerosis” and “quality of life” in databases Psycinfo, Psycarticles,
Psycbooks, Psychology & Behavioral Science Collection, EJS E-Journal,
Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic
Reviews, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Medline, and Academic
Search Complete. From the 1,376 studies found, after abstract reading those
that reported on instruments with poor psychometric properties and/or were
little referred were excluded. A total of 461 articles were selected, of which
267 reported using generic instruments and 194, MS-specific ones. Among the
7 instruments reported by the studies as having good psychometric
characteristics (2 generic, five MS-specific), the most used is the SF-36 (by
APRESENTAÇÃO 237 studies). All instruments have shown adequate psychometric properties
abr. 2008 and a high degree of reliability, hence may be used to assess QoL in subjects
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO with multiple sclerosis both in clinic and research.
set. 2008 KEY WORDS: Multiple sclerosis; Quality of life; Validity studies as topic

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :309-14 309


INTRODUÇÃO em que vive, em relação a seus objeti-
vos, expectativas, normas e preocupa-
var um processo inflamatório na
substância branca do sistema nervoso
O conceito de qualidade de vida ções. Resumindo, essas definições central (reação auto-imune), iniciando
remonta aos anos 1960, mais especi- incluem conceitos como bem-estar, desse modo o processo da esclerose
ficamente a um relatório do governo satisfação, felicidade, expectativas ou múltipla 8.
dos EUA que continha um conjunto de funcionalidade5-7.
A esclerose múltipla apresenta gran-
indicadores sociais e ambientais de A esclerose múltipla é uma doença des variações de sinais e sintomas, con-
qualidade de vida, estabelecidos crônica do foro neurológico que incide forme a zona cerebral mais afetada
como objetivos concretos para o povo principalmente em indivíduos entre os pela desmielinização; os encontrados
americano. Tal conceito tem sido alvo 15 e 40 anos e do sexo feminino8; tem com mais freqüência são: astenia,
de muitos estudos, alguns dos quais sido, nas últimas décadas, uma doen- fadiga, inflamação do nervo óptico e
bastante controversos. É baseado em ça com diagnóstico cada vez mais perda de força muscular, que pode
inúmeros indicadores relacionados ao precoce e objeto de intervenção dos ocorrer não só em surtos temporários,
indivíduo. No campo da saúde esse fisioterapeutas. Por esse motivo, é im- mas também em surtos recorrentes, ou
conceito é recente e ainda está em portante compreender os mecanismos num processo gradual e progressivo11.
fase de clarificação, aceitação e inte- inerentes à doença e os meios de A progressão da esclerose múltipla
gração; por isso, é freqüente encontrar avaliação da qualidade de vida de depende da gravidade da inflamação
diversas conceitualizações conforme seus portadores. e do ritmo da desmielinização. A mul-
a interpretação que cada investigador
dá ao conceito. É também freqüente Segundo a Sociedade Norte-Americana tiplicidade de sintomas que podem
encontrar alusões à qualidade de vida de Esclerose Múltipla (National Multiple emergir significa que as conseqüências
relacionada à saúde, sem referência Sclerosis Society)9, com base nos dados físicas, cognitivas e psicossociais
a seu significado1. Apesar de ser um disponíveis sobre o número de casos dessa doença são freqüentemente
termo muito utilizado, poucos traba- registrados nos serviços de saúde de muito abrangentes, variáveis e com-
lhos definem claramente seu signifi- vários países, a doença afeta cerca de plexas. A doença evolui de forma pro-
cado2,3. uma pessoa em mil, havendo em torno gressiva, prolongada e irreversível12.
de 2,5 milhões de indivíduos com Nos doentes com esclerose múlti-
De modo sistemático, os conceitos esclerose múltipla em todo o mundo.
de qualidade de vida podem ser clas- pla, o bem-estar não pode ser avaliado
No Reino Unido são 85 mil, na Europa somente segundo critérios de incapa-
sificados em definições globais, defi- continental, 350 mil, no Canadá, 50
nições por componentes, definições cidade e/ou deficiência. Há uma forte
mil e, nos Estados Unidos, 350 mil
focalizadas, combinação de defini- correlação entre saúde e qualidade de
pessoas com EM. Estima-se que
ções ou, ainda, definições estrutura- vida, relacionando-se a saúde com o
África, América do Sul e Ásia sejam
das. Essa classificação é importante impacto da doença na saúde física,
as regiões com mais baixa freqüência
não só para fundamentar o conceito mas também nos aspectos emocionais,
(5 em cada 100.000 pessoas) de casos
do ponto de vista estrutural, mas tam- sociais e ocupacionais do indivíduo,
de EM.
bém para auxiliar o entendimento dos bem como na capacidade de este
vários estudos sobre qualidade de vida Pode ser considerada como a doen- adaptar-se à doença13. Para sua avalia-
quanto a sua base conceitual4. ça crônica neurológica que mais afeta ção utilizam-se instrumentos genéricos
os adultos jovens. Em 80% dos casos, – que avaliam a qualidade de vida
Quando a qualidade de vida é a doença progride para situações de relacionada à saúde em geral – e espe-
definida a partir dos aspectos relacio-
níveis variados de incapacidade, le- cíficos, para avaliá-la em indivíduos
nados à saúde, os mais referidos são:
vando esses indivíduos a recorrer com com EM. Em estudo de Pais-Ribeiro5 é
a) qualidade de vida como completo
muita freqüência a programas de feita referência à diferença na utili-
bem-estar físico, mental e social e não
reabilitação física e funcional, bem zação de instrumentos específicos ou
meramente ausência de doença; b)
como a necessitar de apoio de equipes genéricos de avaliação da qualidade
qualidade de vida como percepção
multidisciplinares de reinserção social10. de vida em indivíduos com doença
subjetiva de satisfação e felicidade
crônica, bem como os benefícios e
com a vida, em domínios importantes Apesar da falta de evidência cien-
limitações inerentes à sua aplicação.
para o indivíduo; c) qualidade de vida tífica de um fator responsável pela
como sensação pessoal de bem-estar, doença, crê-se cada vez mais que a Considerando que os aspectos físicos,
potenciada pela satisfação ou insatis- esclerose múltipla seja causada por cognitivos e psicossociais presentes na
fação, em áreas da vida que são impor- uma combinação de vários fatores. EM acarretam um grande comprome-
tantes para o indivíduo; d) qualidade Supõe-se que fatores hereditários, na timento na qualidade de vida, este
de vida como diferença entre as ex- presença de fatores ambientais desco- estudo teve como objetivo identificar
pectativas pessoais e experiência nhecidos mas facilitadores da doença, os instrumentos genéricos e específi-
atual; e) qualidade de vida como e em situações emocionais adversas, cos – com suas características psico-
percepção individual da pessoa relati- favoreçam a ativação do sistema métricas – que avaliam a qualidade
vamente à sua posição na vida, no imunológico no sentido de este não de vida de indivíduos com esclerose
contexto cultural e sistema de valores reconhecer seus próprios tecidos e ati- múltipla.

310 2008;15(3)
Fisioter Pesq. 2008;15( 3):309-14
Pedro & Ribeiro Qualidade de vida na esclerose múltipla

METODOLOGIA Quadro 1 Instrumentos utilizados para avaliar a qualidade de vida na esclerose


múltipla e o número de artigos em que se relata sua utilização
Foi feita consulta às bases de dados
Nome Tipo Nº artigos
Psycinfo, Psycarticles, Psycbooks,
Psychology & Behavioral Sciences Short-Form-36 (SF-36) Genérico 237
Collection, EJS E-Journal, Cochrane Functional Assessment Multiple Sclerosis (FAMS) Especifíco 96
Central Register of Controlled Trials, Multiple Sclerosis Quality of Life-54 (MSQOL-54) Especifíco 41
Cochrane Database of Systematic
Sickness Impact Profile (SIP) Genérico 30
Reviews, Database of Abstracts of
Reviews of Effects, Medline e Academic Disability & Impact Profile (DIP) Especifíco 26
Search Complete, mediante as palavras- Multiple Sclerosis Impact Scale – 29 (MSIS-29) Especifíco 17
chave multiple sclerosis e quality of life, Multiple Sclerosis Quality of Life Inventory (MSQLI) Especifíco 14
para localizar estudos publicados no
período compreendido entre 1997 e
citado em 237 artigos (mais de 50% foram definidas 12 dimensões para
2007.
dos selecionados), o que lhe confere avaliá-la (saúde, casamento, vida fa-
Na primeira busca foram encon- um elevado grau de confiança em miliar, governo, amizades, habitação,
trados 1.376 artigos e utilizados os estudos sobre qualidade de vida. Esse emprego, comunidade, fé religiosa,
seguintes critérios de exclusão: a) instrumento contém 36 itens dis- lazer, situação financeira e organiza-
artigos que não tinham utilizado tribuídos em oito domínios (funciona- ções). Mais recentemente, a Organi-
instrumentos de avaliação da quali- lidade física, desempenho físico, dor zação Mundial de Saúde definiu a
dade de vida; b) instrumento que foi corporal, saúde em geral, vitalidade, qualidade de vida contendo seis do-
utilizado em menos de 10 artigos; c) funcionalidade social, desempenho mínios, cada um com várias facetas
instrumentos que não apresentavam emocional e saúde mental). É aplicado (saúde física, saúde psicológica, nível
boas características psicométricas. Foi em estudos de qualidade de vida em de independência, relações sociais,
definido como boa característica população saudável comparativamen- ambiente e espiritualidade/religião/
psicométrica: apresentação de cri- te a populações com esclerose múlti- crenças pessoais)6.
térios de validação (de conteúdo, cons- pla, bem como em estudos compara-
truto e critério) e confiabilidade (alfa Desse modo, houve a necessidade
tivos (da qualidade de vida) entre
de Cronbach e teste-reteste). desenvolver instrumentos que pudes-
populações com doenças crônicas
sem avaliar a qualidade de vida dos
variadas.
indivíduos em situação de doença,
RESULTADOS E O Functional Assessment of mais nomeadamente no caso de doen-
ça crônica. Assim, os instrumentos que
Multiple Sclerosis (FAMS) aparece
DISCUSSÃO como o instrumento específico mais avaliam a qualidade de vida relacio-
utilizado para a valiar a qualidade de nada à saúde ganharam importância
Após a leitura dos resumos foram nas últimas décadas, porque permitem
vida em indivíduos com esclerose
selecionados 461 artigos, dos quais avaliar não só os resultados da inter-
237 utilizaram instrumentos genéricos múltipla, seguido do Multiple Sclerosis
Quality of Life-54 (MSQOL-54). Esses venção do sistema de saúde – como
e 194, específicos para a EM. Sete ins- monitorar a evolução da doença e a
trumentos com boas características instrumentos têm muitas semelhanças,
contendo itens gerais de qualidade de eficácia dos tratamentos – mas, tam-
psicométricas foram usados na avalia- bém, atender à crescente necessidade
ção da qualidade de vida de indi- vida e itens específicos relativos à
sintomatologia da esclerose múltipla. de monitorar aspectos relacionados às
víduos com esclerose múltipla. Por dimensões de funcionalidade física,
último, foi feita análise dos domínios e O MSQOL-54 é constituído pelos 36
itens do SF-36, mais 18 itens específi- psicológica, social e de bem-estar
um estudo das características psico- geral dos pacientes7.
métricas de cada um desses instru- cos para a esclerose múltipla.
mentos, utilizando os critérios: domínios Os demais questionários foram Após a etapa de identificação dos
abrangentes, número de itens, valida- citados em apenas 87 artigos, o que questionários, foi feita análise dos
ção, confiabilidade e tempo de aplica- corresponde a aproximadamente 18% artigos de validação de cada um des-
ção do instrumento. do total de artigos encontrados. ses instrumentos. Procedeu-se à verifi-
cação das propriedades psicométricas
Os instrumentos mais utilizados
As dimensões da qualidade de vida dos instrumentos, utilizando critérios
pelos investigadores, relativamente à
variam segundo a conceitualização e de avaliação relativos à abrangência dos
qualidade de vida dos indivíduos com
o âmbito a que são referidos, de modo domínios, número de itens, critérios de
esclerose múltipla, bem como a fre-
mais genérico ou mais específico, da validação (conteúdo, construto e critério),
qüência com que são utilizados, são
saúde e da doença. Na primeira con- confiabilidade (alfas de Cronbach e teste-
apresentados no Quadro 1.
cepção de qualidade de vida, desen- reteste) e tempo de aplicação do
O SF-36 foi o instrumento genérico volvida pela Commission on National instrumento. O Quadro 2 sintetiza
mais utilizado na investigação, sendo Goals dos Estados Unidos em 1963, essas propriedades dos instrumentos.

Fisioter Pesq. 2008;15(3) :309-14 311


Quadro 2 Propriedades psicométricas dos instrumentos referidos pelos estudos consultados que avaliam a qualidade de
vida na esclerose múltipla
N de Tempo de
Nome Domínios itens Validação Confiabilidade aplicação
Alfas entre 0,69 e 0,96 exceto
SF-36 na função física (0,58)
Físico, emocional, social, dor, Verificada a
Short-Form-36 36 Teste-reteste r<0,60 física, 9 min
15 vitalidade, saúde em geral validade de c-c-c social e emocional, r<0,70
vitalidade e saúde em geral
FAMS Verificada a
Functional Físico, emocional, social, Alfas entre 0,82 e 0,96 exceto
validade de c-c-c. na mobilidade (0,78 e 0,39)
assessment of comunicação, bem-estar e 59 20 min
multiple Correlação com o
fadiga MSIS-29 e o SF-36 Teste-reteste entre 0,85 e 0,91
sclerosis16
Físico, emocional, social, dor,
MSQOL-54 É constituído pelo Alfas entre 0,75 e 0,96 exceto
vitalidade, saúde em geral, na função social (0,68)
Multiple SF-36 mais 18
cognitivo, sexual, nível de 54 Teste-reteste acima de 0,70, 15 min
sclerosis quality itens específicos
estresse, controle de exceto na percepção de saúde
of life 17 esfíncteres e percepção de QV
para EM em geral, que é de 0,69
SIP Trabalho, dormir, gestão dia- Verificada a
a-dia, mobilidade física e validade de c-c-c. Alfas entre 0,70 e 0,85
Sickness impact 136 30 min
cuidados com corpo, social, Correlação com o exceto para emocional e
profile 18 emocional e comunicação MSQLI e o SF-36 sono, com r<0,70
DIP Físico, emocional, social,
comunicação, sexual, Verificada a Alfas entre 0,61 e 0,92
Disability & 78 25 min
controle dos esfíncteres e validade de c-c-c Teste-reteste entre 0,61 e 0,87
impact profile19 sensorial

MSIS-29 Físico, emocional, social, Verificada a


validade de c-c-c. Alfas entre 0,89 e 0,91
Multiple sclerosis cognitivo, fadiga, controle 29 15 min
Correlação com o Teste-retest entre 0,65 e 0,90
impact scale 20 dos esfíncteres SF-36 e o FAMS
MSQLI Físico, emocional, social, dor,
Multiple sclerosis vitalidade, saúde em geral, Verificada a Alfas entre 0,67 e 0,97
81 30 m
quality of life fadiga, sexual, esfíncteres e validade de c-c-c Teste-reteste entre 0,75 e 0,94
inventory 21 percepção de deficiência

A análise dos resultados permite tado de doença, inerente aos sintomas concordando com Pais-Ribeiro6. Além
considerar que os artigos que utilizam particulares e aos tratamentos es- disso, a esclerose múltipla tem sinto-
instrumentos genéricos têm como pecíficos7. Os instrumentos que avaliam matologia específica associada a seu
objetivo fazer comparações entre a qualidade de vida indicam o impac- caráter progressivo10,12,13.
indivíduos com esclerose múltipla e to da doença e inquirem sobre as áreas
populações com outras patologias; em que mais incide a doenca, nomea- Relativamente aos domínios, todos
aqueles que usam instrumentos espe- damente incapacidade física, fadiga, esses instrumentos têm domínios físi-
cíficos avaliam somente indivíduos alterações no controle dos esfíncteres, cos, emocionais e sociais que deter-
com esclerose múltipla, dando alterações cognitivas e problemas de minam a qualidade de vida na escle-
informações mais detalhadas sobre as integração social. É pois importante rose múltipla, diferenciando-se somen-
condições desses doentes. conhecer os instrumentos tanto genéri- te em alguns aspectos mais específi-
cos quanto específicos que avaliam a cos, como por exemplo controle dos
A diferença fundamental entre esfíncteres, fadiga, disfunções sexuais
qualidade de vida de indivíduos com
avaliação da qualidade de vida gené- (Quadro 2).
esclerose múltipla, para melhor
rica e qualidade de vida relacionada
avaliar o impacto da doença na vida
à saúde (específica para uma doença) Na análise dos domínios verifica-se
desses pacientes14.
é que, enquanto na primeira o concei- que os componentes físicos, emocionais
to é abrangente ao indivíduo saudável Desse modo, parece mais apropria- e sociais estão presentes em todos os
e não-saudável, na segunda refere-se do, em estudos da qualidade de vida instrumentos, com critérios de confia-
aos indivíduos com uma doença espe- só de doentes com esclerose múltipla, bilidade e validação aceitáveis, pre-
cífica, e os componentes para avaliar utilizar instrumentos específicos e, em dizendo que a associação desses três
a qualidade de vida são específicos estudos que englobam várias pato- aspectos são determinantes para
para aquela condição particular de es- logias, os instrumentos genéricos, avaliar a qualidade de vida dos indi-

312 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


2008;15(3):309-14
Pedro & Ribeiro Qualidade de vida na esclerose múltipla

víduos. Resultados semelhantes foram o caso do MSIS-29, que tem uma cor- utilizados em estudos científicos. Ape-
descritos por Mitchell10 e Nortvedt et al.14. relação elevada com o SF-36 e o FAMS sar de esses instrumentos serem utili-
(Quadro 2). Quanto à confiabilidade zados por todos os profissionais da
Quanto ao número de itens, são
dos instrumentos, todos têm valores de saúde, salienta-se sua grande rele-
muito variados, havendo instrumentos
Cronbach entre 0,60 e 0,90, revelando vância para a fisioterapia, tanto para
com um número reduzido (MSIS-29,
boas características psicométricas; quanto a realização de pesquisas como na
29 itens) e outros com número muito
ao teste-reteste, também foram prática clínica, para avaliar o progres-
elevado (SIP, com 136 itens). Pelos
encontrados valores aceitáveis, entre 0,69 so de pacientes após uma intervenção.
dados obtidos, pode-se inferir que os
e 0,94, demonstrando boa
instrumentos que têm menor número
de itens são preferencialmente mais confiabilidade dos instrumentos
(Quadro 2). Todos os instrumentos
CONCLUSÕES
utilizados que os instrumentos com
apresentam bons critérios de validade Os resultados mostram que, dos sete
maior número de itens. Porém, ao
e confiabilidade, ou seja, boas carac- instrumentos utilizados mais freqüente-
observar o tempo médio de aplicação,
terísticas psicométricas, o que sem mente pelos pesquisadores para
vê-se que alguns instrumentos com
dúvida explica sua vasta utilização avaliação da qualidade de vida na
menor número de itens (MSQLI, com
nas pesquisas, como constatado por esclerose múltipla, dois são genéricos
81), têm tempo médio semelhante ao
esta revisão, podendo-se assim aplicá- e os demais, específicos. O mais utili-
SIP, que tem 136 itens. Talvez isso
los com confiança na avaliação da zado é o SF-36, genérico, especial-
possa ser explicado por que neste
qualidade de vida na esclerose múl- mente em estudos que comparam a
último as questões se referem mais a
tipla. qualidade de vida entre indivíduos
elementos do cotidiano como traba-
com esclerose múltipla e indivíduos
lho, sono, cuidados com o corpo etc.
Pelo número de artigos localizados portadores de uma outra doença crô-
Em relação à validação, todos os pelo presente estudo, pode-se inferir nica e/ou população saudável. Quanto
instrumentos têm validação de que a qualidade de vida na esclerose às propriedades psicométricas, todos
conteúdo, de construto e de critério. múltipla tem sido objeto de preocupa- os instrumentos apresentam grau
Além disso, alguns dos instrumentos ção da comunidade científica – o que elevado de confiabilidade para serem
analisados apresentam um elevado reforça a justificativa deste estudo, utilizados tanto em pesquisa quanto
índice de correlação entre si, como é que identificou os instrumentos mais na clínica.

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314 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


2008;15(3):309-14
INSTRUÇÕES PARA AUTORES
A revista FISIOTERAPIA E PESQUISA, editada pelo elementos de autoria de terceiros, que já tiverem sido
Curso de Fisioterapia do Departamento de Fisioterapia, publicados, deve vir acompanhada da autorização de re-
Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de produção pelos detentores dos direitos autorais; se não
Medicina da Universidade de São Paulo, prioriza a publi- acompanhados dessa indicação, tais elementos serão con-
cação de pesquisas originais, cujos resultados possam ser siderados originais do/s autor/es do manuscrito.
replicados, publicando também ensaios de revisão siste-
Autoria
mática ou crítica de literatura, relatos de casos e cartas
ao editor. Deve ser feita explícita distinção entre autor/es e cola-
borador/es. O crédito de autoria deve ser atribuído a quem
Os manuscritos apresentados à Revista devem ser origi-
preencher os três requisitos: (1) deu contribuição substan-
nais, redigidos em português. Caso uma versão semelhan-
tiva à concepção, desenho ou coleta de dados da pesqui-
te, em qualquer língua, já tiver sido publicada ou enviada
sa, ou à análise e interpretação dos dados; (2) redigiu ou
a outro veículo, essa informação deve constar da folha de
procedeu à revisão crítica do conteúdo intelectual; e (3)
rosto, para que o Conselho Editorial possa ponderar sobre
deu sua aprovação final à versão a ser publicada.
a pertinência de sua publicação.
No caso de trabalho realizado por um grupo ou em vá-
Processo de julgamento rios centros, devem ser identificados os indivíduos que
Todo manuscrito enviado para FISIOTERAPIA E PESQUI- assumem inteira responsabilidade pelo manuscrito (que
SA é examinado pelo Conselho Editorial, para considera- devem preencher os três critérios acima e serão conside-
ção de sua adequação às normas e à política editorial da rados autores). Os nomes dos demais integrantes do grupo
Revista. Os manuscritos que não estiverem de acordo com serão listados como colaboradores. A ordem de indicação
estas normas serão devolvidos aos autores para adequa- de autoria é decisão conjunta dos co-autores. Em qual-
ção antes de serem submetidos à apreciação dos pares. quer caso, deve ser indicado o endereço para correspon-
Em seguida, o manuscrito é apreciado por dois pareceristas dência do autor principal. A carta que acompanha o en-
de reconhecida competência na temática abordada, ga- vio dos manuscritos deve ser assinada por todos os auto-
rantindo-se o anonimato de autores e pareceristas. Depen- res, tal como acima definidos.
dendo dos pareceres recebidos, os autores podem ser soli- Envio dos manuscritos
citados a fazer ajustes (no prazo de um mês), que serão
examinados para aceitação. Uma vez aceito, o manuscri- Os manuscritos devem ser submetidos por via eletrôni-
to é submetido à edição de texto, podendo ocorrer nova ca pelo site www.mdpesquisa.com.br/FP. Ao submeter um
solicitação de ajustes formais – nesse caso, os autores têm manuscrito para publicação os autores devem enviar:
o prazo máximo de duas semanas para efetuá-los. O não- ƒ Declaração de responsabilidade, de conflitos de in-
cumprimento dos prazos de ajuste será considerado desis- teresse e de autoria do conteúdo do artigo. Os auto-
tência, sendo o artigo retirado da pauta da Revista. Os res devem declarar a existência ou não de eventuais
manuscritos aprovados são publicados de acordo com a conflitos de interesse (profissionais, financeiros e
ordem cronológica do aceite na secretaria da Revista. benefícios diretos e indiretos) que possam influenci-
Responsabilidade e ética ar os resultados da pesquisa e a responsabilidade do(s)
autor(es) pelo conteúdo do manuscrito. Ver modelo
O conteúdo e as opiniões expressas são de inteira res- no site www.mdpesquisa.com.br/FP.
ponsabilidade de seus autores. Artigos de pesquisa envol- ƒ Declaração de transferência de direitos autorais
vendo sujeitos humanos devem indicar, na seção Meto- (copyright) para Fisioterapia e Pesquisa, assinada por
dologia, sua expressa concordância com os padrões éticos todos os autores, com os respectivos números de CPF,
e com o devido consentimento livre e esclarecido dos caso o artigo venha a ser aceito para publicação
participantes (de acordo com a Resolução 196/96 do Con- (modelo também no site acima).
selho Nacional de Saúde, que trata do Código de Ética
ƒ No caso de ensaio clínico, informar o número de re-
para Pesquisa em Seres Humanos). As pesquisas com hu-
gistro validado pela Organização Mundial da Saúde
manos devem trazer na folha de rosto o número do pare-
(OMS) e International Committee of Medical Journal
cer de aprovação pela respectiva Comissão de Ética em
Editors (ICMJE), cujos endereços estão disponíveis no
Pesquisa, que deve estar registrada no Conselho Nacional
site do ICMJE: www.icmje.org/faq.pdf.
de Saúde. Estudos envolvendo animais devem explicitar
o acordo com os princípios éticos internacionais e instru- Preparação dos manuscritos
ções nacionais (Leis 6638/79, 9605/98, Decreto 24665/
1 Apresentação – O texto deve ser digitado em
34) que regulamentam pesquisas com animais.
processador de texto Word ou compatível, em tamanho
A menção a instrumentos, materiais ou substâncias de A4, com espaçamento de linhas e tamanho de letra que
propriedade privada deve ser acompanhada da indicação permitam plena legibilidade. O texto completo, incluin-
de seus fabricantes. A reprodução de imagens ou outros do páginas de rosto e de referências, tabelas e legendas

Fisioter Pesq. 2008;15(3) 315


de figuras, deve conter no máximo 25 mil caracteres com –cuidando tanto para não remeter o leitor unicamente a
espaços. estes quanto para não repetir no texto todos os dados dos
elementos gráficos; d) na Discussão, comentar os achados
2 A página de rosto deve conter: mais importantes, discutindo os resultados alcançados
a) título do trabalho (preciso e conciso) e sua versão comparando-os com os de estudos anteriores; e) a Conclu-
para o inglês; são sumariza as deduções lógicas e fundamentadas dos
b) título condensado (máximo de 50 caracteres) Resultados e Discussão.
c) nome completo dos autores, com números sobrescri- 5 Tabelas, gráficos, quadros, figuras, diagramas – são
tos remetendo à afiliação institucional e vínculo; considerados elementos gráficos. Só serão apreciados ma-
d) instituição que sediou, ou em que foi desenvolvido o nuscritos contendo no máximo cinco desses elementos.
estudo (curso, laboratório, departamento, hospital, clí- Recomenda-se especial cuidado em sua seleção e
nica etc.), faculdade, universidade, cidade, estado e pertinência, bem como rigor e precisão nos títulos. Note
país; que os gráficos só se justificam para permitir rápida apre-
e) afiliação institucional dos autores (com respectivos ensão do comportamento de variáveis complexas, e não
números sobrescritos); no caso de docência, informar para ilustrar, por exemplo, diferença entre duas variáveis.
título; se em instituição diferente da que sediou o Todos devem ser fornecidos no final do texto, mantendo-
estudo, fornecer informação completa, como em se neste marcas indicando os pontos de sua inserção ideal.
“d)”; no caso de não-inserção institucional atual, in- As tabelas (títulos na parte superior) devem ser montadas
dicar área de formação e eventual título (a Revista no próprio processador de texto e numeradas (em arábi-
cos) na ordem de menção no texto; decimais são separa-
não indica em quê nem em qual instituição o título
dos por vírgula; eventuais abreviações devem ser
foi obtido);
explicitadas por extenso, em legenda.
d) endereços postal e eletrônico do autor principal;
e) indicação de órgão financiador de parte ou todo o Figuras, gráficos, fotografias e diagramas trazem os tí-
estudo, se for o caso; tulos na parte inferior, devendo ser igualmente numerados
f) indicação de eventual apresentação em evento cien- (em arábicos) na ordem de inserção. Abreviações e outras
tífico; informações vêm em legenda, a seguir ao título.
g) no caso de estudos com seres humanos, indicação 6 Remissões e referências bibliográficas – Para as re-
do parecer de aprovação pelo comitê de ética; no missões no texto a obras de outros autores adota-se o siste-
caso de ensaio clínico, o número de registro interna- ma de numeração seqüencial, por ordem de menção no
cional. texto. Assim, a lista de referências ao final não vem em
ordem alfabética. Visando adequar-se a padrões internacio-
3 Resumo, abstract, descritores e key words – A se- nais de indexação, para apresentação das referências a
gunda página deve conter os resumos do conteúdo em Revista adota a norma conhecida como de Vancouver, ela-
português e inglês. O resumo em português deve ocupar o borada pelo Comitê Internacional de Editores de Revistas
máximo de 1.500 caracteres com espaços (cerca de 220 a Médicas (www.icmje.org), também disponível em http://
230 palavras). Resumo e abstract devem ser redigidos em www.icmje.org/index.html#references. Alguns exemplos:
um único parágrafo, buscando-se o máximo de precisão e
concisão; seu conteúdo deve seguir a estrutura formal do Forattini OP. Ecologia, epidemiologia e sociedade.
texto, ou seja, indicar objetivo, procedimentos básicos, São Paulo: Edusp; 1992.
resultados mais importantes e principais conclusões. São Laurenti R. A medida das doenças. In: Forattini OP,
seguidos, respectivamente, da lista de até cinco descritores editor. Epidemiologia geral. São Paulo: Artes
e key words (sugere-se a consulta aos DeCS – Descritores Médicas; 1996. p.64-85.
em Ciências da Saúde da Biblioteca Virtual em Saúde do Simões MJS, Farache Filho A. Consumo de
Lilacs (http://decs.bvs.br) e ao MeSH – Medical Subject medicamentos em região do Estado de São Paulo
Headings do Medline (www.nlm.nih.gov/mesh/ (Brasil), 1988. Rev Saude Publica. 1988;32:71-8.
MBrowser.html).
Riera HS, Rubio TM, Ruiz FO, Ramos PC, Castillo
4 Estrutura do texto – Sugere-se que os trabalhos se- DD, Hernandez TE, et al. Inspiratory muscle training
jam organizados mediante a seguinte estrutura formal: a) in patients with COPD: effect on dyspnea and
Introdução, estabelecendo o objetivo do artigo, justifican- exercise performance. Chest. 2001;120:748–56.
do sua relevância frente ao estado atual em que se encon- [nomear até seis autores antes de “et al”]
tra o objeto investigado; b) em Metodologia, descrever Rocha JSY, Simões BJG, Guedes GLM. Assistência
em detalhe a seleção da amostra, os procedimentos e ma- hospitalar como indicador da desigualdade social. Rev
teriais utilizados, de modo a permitir a reprodução dos Saude Publica [periódico on-line] 1997 [citado 23 mar
resultados, além dos métodos usados na análise estatísti- 1998];31(5). Disponível em: http://www.fsp.usp.br/ ~rsp.
ca – lembrando que apoiar-se unicamente nos testes esta- Correia FAS. Prevalência da sintomatologia nas
tísticos (como no valor de p) pode levar a negligenciar disfunções da articulação temporomandibular e suas
importantes informações quantitativas; c) os Resultados relações com idade, sexo e perdas dentais
são a sucinta exposição factual da observação, em se- [dissertação]. São Paulo: Faculdade de Odontologia,
qüência lógica, em geral com apoio em tabelas e gráficos Universidade de São Paulo; 1991.

316 Fisioter Pesq. 2008;15(3)


Sacco ICN, Costa PHL, Denadai RC, Amadio AC. • no caso de gráficos ou diagramas elaborados por
Avaliação biomecânica de parâmetros softwares específicos, devem ser convertidos (expor-
antropométricos e dinâmicos durante a marcha em tados) em formatos que possam ser abertos por progra-
crianças obesas. In: VII Congresso Brasileiro de mas de uso comum (verifique os tipos de arquivos que
Biomecânica, Campinas, 28-30 maio 1997. Anais. podem ser abertos no Adobe Photoshop®, para figuras
Campinas: Ed. Unicamp; 1997. p.447-52. em escala de cinza, no CorelDraw®, para desenhos,
7 Agradecimentos – Quando pertinentes, dirigidos a ou no Excel® ou Origin®, para gráficos), para permitir
pessoas ou instituições que contribuíram para a elaboração eventuais ajustes, adequação de fonte etc.;
do trabalho, são apresentados ao final das referências. • forneça fotografias ou outras ilustrações com resolu-
ção mínima de 300 dpi, e em tamanho compatível;
Apresentação eletrônica da versão final
• em qualquer caso, forneça simultaneamente um ar-
Após a comunicação do aceite do artigo, o autor deve- quivo em TIFF do elemento gráfico, para permitir
rá proceder aos eventuais ajustes sugeridos pelos pare- visualização e conferência.
ceristas, para o quê terá o prazo de quatro semanas (findo
esse prazo, se a versão final não tiver sido enviada à Re- Envio dos arquivos
vista, será considerada desistência). A versão final será Os dados de texto (em Word ou compatível) e de ilus-
ainda editada, ocasião em que o editor poderá solicitar trações devem ser enviados em arquivos separados. Os
novos ajustes e esclarecimentos – e, nesse caso, o prazo dados devem ser acompanhados da informação precisa
para os ajustes será de apenas duas semanas. de todos os programas utilizados, inclusive de compres-
Solicita-se que, na preparação da versão final, o autor: são, se for o caso; sugere-se que os nomes dos arquivos
sejam curtos e permitam rápida identificação (por exem-
• use fonte comum, simples; use itálico apenas para plo, “sobrenome do autor fig1....”).
títulos de obras e palavras em língua estrangeira; o
negrito é reservado a títulos e intertítulos, claramen- Exemplares dos autores
te diferenciados; Serão enviados ao autor principal dois exemplares do
• não use a barra de espaço para recuos nem a tecla número da Revista em que seu artigo for publicado, mais
“tab”, apenas recursos de formatação do processador um exemplar para cada co-autor.
de texto;
• não separe parágrafos com sinal de parágrafo adicional; ***
• use o próprio processador de texto (e não planilhas)
No bojo do processo de aprimoramento de FISIOTERAPIA
para elaborar tabelas;
E PESQUISA, estas normas estão em construção, podendo so-
• use o próprio processador de texto (recurso “Desenho”)
frer alterações. Para informação atualizada, sugere-se a con-
para elaborar diagramas simples, organogramas etc.
sulta ao site da Revista (http://medicina.fm.usp.br/fofito/fisio/
(não insira figuras ou organogramas do Microsoft
revista.php) ou às instruções do último número publicado. Para
PowerPoint®);
contato com a secretaria da Revista, use revfisio@usp.br.
• inversamente, use programa apropriado (como
Microsoft® Excel) para elaborar gráficos, e não o re- O endereço completo da Revista encontra-se na terceira
curso “Gráficos” do processador de texto; capa, a seguir.

Fisioter Pesq. 2008;15(3) 317


318 Fisioter Pesq. 2008;15(3)
Assinatura
Para assinar Fisioterapia e Pesquisa, preencha o cupom abaixo e envie-o à revista (ver endereço página 2), junto com um
cheque nominal à Fundação Faculdade de Medicina (ver endereço ao lado, na 3a capa) no valor de R$ 64,00 ou recibo de
depósito no Banespa (banco 033), agência 0201, cc 13004086-7. A ficha de assinatura está disponível no site da revista:
<http://medicina.fm.usp.br/fofito/fisio/revista.php>. Números anteriores solicitar à revista. Valor unitário: R$ 16,00.

FICHA DE ASSINATURA

Assinatura anual (quatro números) de Fisioterapia e Pesquisa a contar de (data) _____________________

Nome: _______________________________________________________________________________________

Endereço: ____________________________________________________________________________________

CEP: _____________ Cidade: ___________________________________________________ Estado: _______

e-mail: _______________________________________________________________________________________

Instituição (opcional): _________________________________________________________________________

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320 Fisioter Pesq. 2008;15(3)
Fisioterapia e Pesquisa Fisioterapia e Pesquisa
em continuação a Revista de Fisioterapia da Universidade de São Paulo. Revista do Curso de Fisioterapia do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e
Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo -
Fofito/FMUSP
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
Reitora SECRETARIA
Profa. Dra. Suely Vilela Sampaio Patrícia Pereira Alfredo
Vice-Reitor
INDEXAÇÃO E NORMALIZAÇÃO BIBLIOGÁFICA
Prof. Dr. Franco Maria Lajolo
Serviço de Biblioteca e Documentação da FMUSP
Faculdade de Medicina e-mail: sbd@biblioteca.fm.usp.br

Diretor EDIÇÃO DE TEXTO, PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO


Prof. Dr. Marcos Boulos Tina Amado, Alba A. G. Cerdeira Rodrigues e Daniel Carvalho
Pixeletra ME
Depto. Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional IMPRESSÃO
Chefe Gráfica UNINOVE
Profa. Dra. Claudia Regina Furquim de Andrade
Tiragem: 800 exemplares
Curso de Fisioterapia
Coordenadora
Profa. Dra. Silvia Maria Amado João

FISIOTERAPIA E PESQUISA
Curso de Fisioterapia
Fofito/FM/USP
R. Cipotânea 51 Cidade Universitária
05360-160 São Paulo SP
e-mail: revfisio@edu.usp.br
Fisioterapia e Pesquisa v.15, n.3, jul./set. 2008 http://medicina.fm.usp.br/fofito/fisio/revista.php
Telefone: 55 xx 11 3091 8416
Fisioterapia e Pesquisa / (publicação do Curso de Fisioterapia
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) INSTITUIÇÕES COLABORADORAS
INSTITUIÇÕES PARCEIRAS
v.1, n.1 (1994). – São Paulo, 2005.
v. : il.
Continuação a partir de v.12, n.1, 2005 de Revista de
Fisioterapia da Universidade de São Paulo.
Semestral: 1994-2004
Quadrimestral: a partir do v.12, n.1, 2005
Trimestral: a partir do v.15, n.1, 2008 ASSOCIAÇÃO DE FACULDADE DE MEDICINA
FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL DE RIBEIRÃO PRETO / USP
Sumários em português e inglês
ISSN 1809-2950 APOIO

1. FISIOTERAPIA/periódicos I. Curso de Fisioterapia da Faculdade


de Medicina da Universidade de São Paulo

Filiada à

FACULDADE DE MEDICINA
DA UNIVERSIDADE
DE SÃO PAULO
ISSN: 1809-2950

FISIOTERAPIA e
PESQUISA
REVISTA DE FISIOTERAPIA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ÓRGÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO DE FISIOTERAPEUTAS DO BRASIL

Volume 15 – número 3 Julho – Setembro 2008

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