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“TERRITÓRIOS DA SUSTENTABILIDADE”: MOSAICOS DE ÁREAS PROTEGIDAS COMO

FERRAMENTA DE GESTÃO E DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL NA AMAZÔNIA BRASILEIRA

Thiago Mota Cardoso - IPÊ-Instituto de Pesquisas Ecológicas


<thiago@ipe.org.br>

Oscar Sarcinelli - IPÊ-Instituto de Pesquisas Ecológicas


<oscar@ipe.org.br>

Rafael Illenseer - IPÊ-Instituto de Pesquisas Ecológicas


<biorafito@yahoo.com.br>

Leonardo Pereira Kurihara - IPÊ-Instituto de Pesquisas Ecológicas


<leonardo@ipe.org.br>

Sarita de Moura - IPÊ-Instituto de Pesquisas Ecológicas


<saritademoura@hotmail.com>

RESUMO

O projeto “Mosaico de unidades de conservação do baixo Rio Negro”, foi submetido pelo IPÊ –
Instituto de Pesquisas Ecológicas e parceiros locais ao Fundo Nacional do Meio Ambiente – FNMA, por
meio do Edital 01/2005. O projeto objetiva formar o Mosaico de Áreas Protegidas do Baixo Rio Negro,
envolvendo os atores sociais na sua gestão e elaborar e implementar o plano de Desenvolvimento Territorial
com Bases Conservacionistas do mosaico, fortalecendo o poder local. Para atingir tais objetivos acoes de
mobilização vem conformando espaços participativos trans-escalares, envolvendo a sociedade civil,
comunidades tradicionais, Estado, municípios e empresas a nível local e instituições a nível regional e
nacional. Em termos de Gestão, trabalha-se para formar o conselho do mosaico, bem como comitês e
grupos de trabalhos. Ao mesmo tempo busca-se articular este espaço com outros instrumentos de Gestão
territorial como Corredores Ecológicos, Reserva da Biosfera e Território da Cidadania. O mosaico
se apresenta como um espaço de zoneamento ecológico do território, tendo em vista as possibilidades de
desenvolvimento territorial fundado no conceito de terroir, com a valorização dos conhecimentos tradicionais
e da biodiversidade, o que chamamos de produtos e serviços da sociobiodiversidade.

1.Introdução

As criação e implantação de áreas protegidas seguem sendo um importante meio de


combater a degradação das florestas amazônicas e de promoção do desenvolvimento regional
com sustentabilidade (Pasquis, 2009). Diversas estratégias estão sendo propostas a fim de ampliar
e fortalecer as áreas protegidas no Brasil, com destaque as linhas guias do Plano Nacional de
Áreas Protegidas, que visa promover a conservação e uso sustentável da biodiversidade,
valorizando a cultura dos povos tradicionais. Estas estratégias se deparam com o fato de que as
áreas protegidas na Amazônia atualmente se encontram conectadas estruturalmente e
funcionalmente, formando “blocos” com identidades territoriais e socioambientais específicos.
Diante do dever de melhorar a eficiência e representatividade das áreas protegidas no
que concerne a debilidade de recursos humanos e financeiros disponíveis, ao isolamento das áreas
protegidas em termos de gestão e proteção e na repartição justa dos benefícios da criação destas
áreas com os povos tradicionais que vivem em seu interior ou entorno, está sendo proposta a
criação e implementação de mosaicos nos biomas brasileiros (MMA, 2007). A gestão articulada
de um variado conjunto complexo de áreas protegidas, espalhadas por extensas regiões é,
particularmente, um dos desafios institucionais para a Amazônia (Borges et al. 2007; Drummond
et al. 2006).
A proposta de criação de um mosaico de áreas protegidas no baixo Rio Negro (BRN) se
constitui como uma forma de atuar nas questões supracitadas, solucionando assim a situação de
isolamento e dificuldade de gestão de cada áreas protegidas. A preterida integração em mosaico
realiza-se nos aspectos da gestão participativa, formando um corpo único de um grupo diverso de
atores sociais, facilitando os processos de comunicação, interação e gestão de projetos de
desenvolvimento territorial e conservação ambiental. O mosaico pode possibilitar a criação de
espaços de gestão compartilhada e resolução de conflitos ao mesmo tempo em que delimita um
contorno territorial com lugares e referências de sociobiodiversidadei local que geram potenciais
de desenvolvimento com enfoque nas identidades territoriais, com valorização dos patrimônios
naturais e culturais (materiais e imateriais).
A criação das áreas protegidas no BRN foi essencial para a proteção e conservação dos
ecossistemas, de inúmeras espécies ameaçadas de extinção e da biodiversidade em seu conjunto.
Este mosaico de áreas protegidas também se apresenta como um espaço qualificado pelo capital
social e cultural das comunidades tradicionais que habitam a região. A criação do mosaico pode
também contribuir para por em evidência territorialidades dos povos tradicionais que habitam a
região. Estas populações foram excluídas dos processos de criação e gestão das áreas protegidas,
seus territórios foram desconsiderados, gerando uma consequente reação negativa e mobilizações
politicas e étnicas (Barreto-Filho, 1999; Cardoso et al. 2008). O mosaico no baixo rio Negro, por
propor a conservação e a valorização cultural estará contribuindo diretamente para manter os
serviços ambientais fundamentais para a sociedade local, regional, nacional e global, sendo um
instrumento no combate as mudanças climáticas.
Este trabalho objetiva apresentar as estratégias e procedimento metodológicos que estão
sendo utilizados para a criação e implementação do mosaico de áreas protegidas do BRN, na
Amazônia Central, um projeto em andamento. Dando enfoque às metas de criação do conselho
consultivo integrado a proposta de desenvolvimento territorial.
A experiencia apresentada ao longo deste artigo constitui-se como uma construção trans-
escalar entre a sociedade civil organizada, movimentos sociais, profissionais e órgãos ambientais
de governo (federal, estadual e municipal), fomentada ao longo do projeto Corredores Ecológicos
com continuidade através do edital 01/2005 do Fundo Nacional do Meio Ambiente, apoiando a
criação de Mosaicos de Áreas Protegidas e o Desenvolvimento Territorial com Bases
Conservacionistas nos Biomas brasileiro.

2.Áreas Protegidas na Amazônia

As áreas protegidas são porcões do território com regime de proteção especial


determinado ou reconhecido pelo Estado. O estabelecimento de áreas protegidas pressupõe
objetivos de conservação ambiental, desenvolvimento para sustentabilidade (no caso de unidades
de conservação-UCii) e, em alguns casos, garantir direitos territoriais de grupos étnicos
diferenciados (terras indígenasiii e quilombosiv).
A criação destas áreas foi um fenômeno tipico do período republicano, principalmente
no seculo XX (Medeiros et al. 2006). A década de 30 representa um marco neste processo devido
a criação de um conjunto de instrumentos legais e de estrutura administrativa do Estado tendo em
vista proteger as paisagem naturais e monumentos de valor histórico e artístico, inclusive período
onde foi criado o primeiro parque nacional, o de Itatiaia, bem como florestas nacionais e o
Código Florestal. Nos anos 70, em plena ditadura militar, se iniciou uma reflexão sobre a
necessidade de se conceber um sistema integrado e mais amplo para criação e gestão das áreas
protegidas, neste mesmo período houve um aumento considerável do numero de unidades de
conservação criadas, principalmente unidades de proteção integral e florestas nacionais, com
finalidade geopolítica, que no caso da amazônia, respondia a contrapartida de processos
contraditórios de desenvolvimento e avanço da fronteira econômica (Barreto-Filho, 1999). Este
sistema foi efetivado em 2000 com a aprovação do SNUC e em 1988, com a Constituição se
consolida as áreas protegidas no Brasil. Este período e marcado pelo aumento vigoroso, e não
suficiente, da criação das áreas protegidas e pela participação de grupos ambientalistas, dos
direitos humanos e indigenistas nos processos. O SNUC foi o marco inicial para o planejamento
consistente da conservação, sob uma abordagem ecossistêmica, consolidando uma série de
mecanismos que asseguram maior participação pública no processo de criação e gestão das áreas
protegidas.
O governo federal aprovou em 2006 o Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas-
PNAP, reforçando os objetivos e propondo acoes para fortalecer estes instrumentos. O PNAP
define princípios, diretrizes, objetivos e estratégias para o Brasil estabelecer um sistema
abrangente de áreas protegidas, ecologicamente representativo e efetivamente manejado,
integrando paisagens terrestres e marinhas mais amplas até 2015. O PNAP busca fortalecer
“gestão integrada de áreas protegidas visando promover a conectividade entre ecossistemas -
incluindo paisagens terrestres e marinhas, de modo a manter a sua estrutura e função ecológicas e
socioculturais” (MMA, 2007).
Na Amazônia 23,5% da Amazônia brasileira encontram-se sob alguma forma de
unidades de conservação seja de proteção integral (8,7%) como parques, reservas biológicas e
estacoes ecológicas, seja na forma de unidades de uso sustentável (13%), na forma de reservas
extrativistas, reservas de desenvolvimento sustentável e florestas nacionais, entre outras
categorias. As UC's amazônicas apresentam deficiências em termos de implementação e
manutenção, comprometendo de forma grave a integridade física e biológica que se almeja
conservar. As 406 terras indígenas cobrem 21,6% da superfície da Amazônia (RAISG, 2009),
enquanto que existem cerca de 360 quilombo reconhecidos nesta região.
O processo de criação de áreas protegidas na Amazônia foi conflituoso (Barreto-Filho,
1999). Estes conflitos decorreram e decorrem de fatos como: processos de consulta popular
inexistentes ou conduzidos de forma parcial; inadequação das categorias de áreas protegidas em
relação a realidade regional; sobreposições de UC's com territórios tradicionalmente ocupados.
De fato, no Brasil de forma geral e na Amazônia em particular, as políticas de preservação que
subtraem espaços físicos do contato com a sociedade provocam reações locais de oposição,
contrárias à sua intenção original de promover a ecologia (Lima, 2002). Assim ocorreu na criação
das UC's do Mosaico do BRN com os severos conflitos gerados e que perduram ate os dias atuais
quando na criação das unidades de conservação de proteção integral na região.
Na Amazônia as áreas protegidas envolvem em seu interior e entorno os povos
tradicionais (ribeirinhos, indígenas, quilombolas, etc), que historicamente foram excluídos dos
processos de ordenamento territorial publico e subordinados a uma logica de desenvolvimento
excludente e insustentável do ponto de vista social, politico, ecológico e econômico (Porto-
Gonçalves, 2001). Tais contradições do processo de desenvolvimento econômico e de criação das
áreas protegidas gerou movimentos sociais de resistência e de proposição de novos caminhos de
inclusão social e de melhora da qualidade de vida destes povos com participação local. Portanto,
a proposta de se considerar as áreas protegidas como instrumento qualificador do território e
potencializador do desenvolvimento territorial, como proposto por Pasquis (2009) advém dos
conhecimentos gerados nestes movimentos, criando espaços de dialogo para o enfrentamento dos
problemas locais, reconhecendo os conflitos e as contradições do território, bem como os
desafios gerados na construção da identidade territorial.
A importância das áreas protegidas e reivindicação de inclusão social no processo de
criação e gestão da mesma esta na “Declaracão da sociedade civil sobre Áreas protegidas”
durante a Conferencias das Partes (COP9), realizada em 2008, que versa,
"Las áreas protegidas y el manejo de los pueblos indígenas y las
comunidades locales que viven en dichas áreas, o dependen de ellas,
continúan estando amenazados por los proyectos de infraestructura a
gran escala y la industria extractiva. Las Partes no han tomado ni mucho
menos las medidas adecuadas para tratar estas amenazas... Las áreas
protegidas tampoco podrán sobrevivir como islas dentro de un paisaje
degradado; necesitan vincularse positivamente a las políticas de manejo
y uso de los recursos terrestres, de humedales y marinos, y a las
estructuras de gobernabilidad a nivel de paisaje terrestre y marino."
É neste contexto socioambiental que surge a proposta do Ministério do Meio Ambiente,
através do Decreto nº 4.340/2002, de se constituírem os Mosaicos de Áreas Protegidas. Os
Mosaicos surgem com a finalidade de buscar soluções para o desafio de conciliar os interesses da
conservação ambiental com os direitos das populações pré-estabelecidas nas áreas onde as
Unidades de Conservação são estabelecidas através da gestão integrada e participativa das
diferentes Áreas Protegidas que os compõem, “..... de forma a compatibilizar a presença da
biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto
regional....”.

3.Mosaico: espaço de gestão e desenvolvimento territorial, qual o potencial?

Segundo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, em seu artigo 26, quando


existir um conjunto de áreas protegidas de categorias diferentes ou não, em proximidade,
justapostas ou sobrepostas, seria interessante a constituição de um Mosaicov, com gestão
integrada e participativa, de forma a considerar a conservação da biodiversidade, a valorização da
diversidade sociocultural e o desenvolvimento sustentável.
Em anos recentes, a constituição de mosaicos integrando unidades de conservação de
diferentes categorias de manejo e outras áreas protegidas ganhou maior relevância na política de
conservação brasileira (MMA, 2007). Esta proposta ganhou força após a ampliação do número e
áreas protegidas no Brasil gerando sobreposições e conectividades e a possibilidade do trabalho
articulado, envolvendo múltiplos atores.
Os primeiros mosaicos foram criados no Brasil, entre 2005 e 2006, sendo o Mosaico dos
Parques Nacionais Serra da Capivara e Serra das Confusões, no bioma Caatinga, o Mosaico
Paraná-São Paulo, Mosaico Mantiqueira, Mosaico Bocaína e Mosaico Mata Atlântica Central
Fluminense, no bioma Mata Atlântica os percussores destes instrumento. Mais recentemente, em
fevereiro de 2008, foi criado o Mosaico do Jacupiranga e em 2009 o Mosaico do Grande Sertão
Veredas-Peruacu. No final de 2006 foi criado, de forma conflituosa, o Mosaico Juréia-Itatins que
objetivou, dentre outros motivos, contemplar os direitos das mais de 300 famílias caiçaras.
Uma iniciativa importante no que diz respeito à implantação de mosaicos ocorreu com o
lançamento, em 2005, do Edital nº. 01/2005 do Fundo Nacional do Meio Ambiente – “Mosaicos:
uma estratégia de Desenvolvimento Territorial com Base Conservacionista (DTBC)”. Este edital,
objetivou selecionar projetos orientados (1) à formação de mosaicos de UC’s s e outras áreas
legalmente protegidas e (2) à elaboração e implementação de Planos de Desenvolvimento
Territorial que contribuam para a implementação e consolidação do SNUC. Foram selecionados 8
projetos para criação e implementação de mosaicos nos biomas Amazônia, Mata Atlântica,
Caatinga, Cerrado e Zona Costeira. Ver lista de projetos apoiados em Drummond et al. (2006).
Debates realizados durante a I Oficina de Gestão do Mosaico do BRN e no II Seminário
sobre Mosaicos no Amazonas, realizado respectivamente em agosto e em novembro de 2008,
ressaltaram os seguintes pontos, dentre outros, a ser levado em conta na implementação dos
mosaicos: a) a atenção que a sociedade deve ter quanto aos usos da ferramenta de Mosaicos, pelo
fato de poder ser usada pelos governos estaduais e federal como forma de diminuir ou congelar os
gastos públicos com o tema socioambiental; b) a importância da participação social e da
valorização sociocultural; c) esforço de envolver terras indígenas e quilombos; d) compreender o
papel dos projetos de reforma agrária nos mosaicos; e) esforços de integrar níveis de governo,
programas e ministérios; f) construção de mecanismos de financiamento dos mosaicos; g) criar
mecanismos de resolução de conflitos entre os atores e de mobilização local.
Na região do baixo rio Negro, o IPÊ, com apoio do Fundo Nacional do Meio Ambiente
e de parceiros, vem fomentando o planejamento, a articulação interinstitucional e a mobilização
da sociedade civil com o propósito de constituir participativamente o Mosaico de Áreas
Protegidas do BRN. A proposta é que este mosaico seja constituído por 11 Unidades de
Conservação de diferentes categorias, com uma área total pouco maior que 9 milhões de hectares
(IPE, 2008) (figura 1 e tabela 1). O objetivo principal da constituição deste Mosaico é articular os
gestores e a sociedade civil diretamente envolvida em torno das atividades e planos de proteção
do território, da conservação da biodiversidade in situ, da valorização da diversidade
sociocultural e o desenvolvimento territorial.
A preterida conexão, formando o mosaico, realiza-se nos aspectos da gestão
compartilhada, formando um corpo único e diverso de atores sociais, facilitando os processos de
comunicação, interação, elaboração e gestão de projetos e proteção ambiental. Em termos
ecológicos, a área se encontra conectada de foram estrutural e parcialmente conectada em termos
funcionais. O referido mosaico localiza-se na Amazônia Central, numa região reconhecida como
de importância prioritária para a conservação da biodiversidade. Insere-se dentro da área de
abrangência da Reserva da Biosfera da Amazônia Central e no Corredor Ecológico Central da
Amazônia, maior área de proteção ambiental contínua do mundo, sendo área piloto do Projeto
Corredores Ecológicos. Além disto, o Parque Nacional de Anavilhanas e o Parque Nacional do
Jaú foram declarados como Sítio do Patrimônio Natural da Humanidade pela UNESCO.
A área de abrangência do Mosaico do BRN incluí os municípios de Manaus, Novo
Airão, Iranduba, Barcelos e Manacapuru, que totalizam 1,8 milhões de pessoas e outras 80
comunidades, formadas por ribeirinhos, quilombolas, indígenas e agricultores familiares que
sobrevivem do uso múltiplo da floresta. Dentre esses usos podemos citar a agricultura, o
extrativismo florestal madeireiro e não-madeireiro, e atividades ligadas ao turismo e à venda de
artesanato, com forte inserção do componente “tradição cultural”. A criação de algumas UC’s do
Mosaico gerou severos conflitos sociais com as comunidades tradicionais e com os poderes
públicos locais (Cardoso et.al. 2008; Barreto-Filho, 1999; Creado, 2007).

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Figura 1 – Localização do Mosaico de Áreas Protegidas do Baixo Rio Negro

A proposta de criação do Mosaico de Áreas Protegidas do BRN surge das relações


interinstitucionais estabelecidas no âmbito do projeto Corredores Ecológicos da Amazônia
Central, a partir de 2003 nas Unidades de Conservação estabelecidas na parte mais baixa da
região. O projeto “Mosaico de Áreas Protegidas do baixo rio Negro” foi elaborado e submetido
pelo IPÊ e aprovado no edital 01/2005 do Fundo Nacional do Meio Ambiente - FNMA e teve
inicio no final de 2006. Seus objetivos são: (i) Constituir o Mosaico de Áreas Protegidas do baixo
rio Negro, envolvendo os atores sociais na sua gestão, (ii) Elaborar e implementar o plano de
Desenvolvimento Territorial do Mosaico, com enfoque na identidade sócio-territorial,
contribuindo para a implementação e consolidação do SNUC e (iii) Criar o banco de dados.

4.Estrategias e Metodologias do Projeto Mosaico

4.1.Caminhos para a gestão

O principal espaço de gestão de um mosaico é o seu conselho consultivo. Segundo o


artigo 9, do Decreto 4.340/2002, o mosaico deverá dispor de um conselho com a função de atuar
como instância de gestão integrada das UC's e outras áreas protegidas que o compõem.

Desta forma, torna-se relevante envolver a diversidade de atores sociais com interesses no
Mosaico, tendo em vista a formação do conselho e a construção dos “caminhos” para a gestão
participativa. O conselho de mosaico pode atuar na implementação da gestão integrada das áreas
protegidas que o compõem e propor diretrizes e ações para compatibilizar, integrar e otimizar as
atividades desenvolvidas em cada unidade de conservação e nas outras áreas. Proporciona
também a relação propositiva com as comunidades residentes na área do mosaico, além da
promoção do desenvolvimento territorial. Cabe ainda ao conselho manifestar-se sobre propostas
que visem solucionar eventuais sobreposições entre áreas protegidas.
Neste ponto torna-se importante encorajar o empoderamento da população local, ou seja,
com o estabelecimento dos mosaicos, os atores sociais destas regiões podem participar
ativamente do planejamento regional e tornam-se parceiros efetivos nas atividades de
conservação in situ da biodiversidade, este direito deve ser garantido. É importante capacitar os
conselheiros em conceitos e práticas específicas sobre gestão de áreas protegidas e que haja o
respeito e a plena possibilidade de participação e expressão por parte das comunidades , dotadas
de culturas diferenciadas. Salienta-se os limites de um instrumento como o conselho consultivo
que decerta forma não permite tomada de decisões relevantes e o mesmo e muitas vezes e
disputado por setores com graus hierarquicamente distintos de poder e conhecimento. De certo,
apesar dos limites legais, o conselho do mosaico terá que deliberar em casos que envolvam temas
regionais e temas que envolva acoes integradas, o que poderá ser um avanço.
A execução desta meta esta sendo feita em etapas, tendo como orientação geral e
metodológica os exemplos e caminhos debatidos na Oficina de Gestão Participativa do SNUC
(MMA, 2004), que versam sobre a formação dos conselhos gestores e a consolidação dos
mosaicos de forma integrada. Nestes casos, o processo deve ser desenvolvido através de etapas
sucessivas de sensibilização-mobilização, articulação institucional, reuniões preparatórias,
escolha e capacitação dos gestores. Tendo como produtos o conselho e o mosaico formalizados,
com seu respectivo regimento aprovado, e os membros capacitados (figura 2).

Figura 2 – Etapas da constituição do conselho gestor


Está em andamento uma série de ações, no âmbito do projeto Mosaico, com o propósito de
formação do mosaico do BRN. Atividades realizadas:

Mobilização social e institucional – a identificação e mobilização de atores sociais envolvidos


com as áreas protegidas são consideradas atividades estratégicas para potencializar o processo
dialógico na construção coletiva e na elaboração do planejamento do próprio mosaico, motivo
pelo qual foram realizadas com cautela. Buscou-se iniciar o processo de informação e formação
do conselho. Estes processos intentam incentivar e apoiar a participação de representantes dos
segmentos envolvidos com as áreas protegidas do mosaico. Foram realizados os seguintes
procedimentos metodológicos: a) Mapeamento político-institucional, visando identificar os atores
sociais locais e regionais, os conflitos latentes ou deflagrados, os processos já iniciados na
região, os recursos e possibilidades institucionais, e a relação de força e poder entre os atores
sociais; b) Visitas, apresentações e reuniões com instituições, entidades sociais e comunidades
que tenham interface com o mosaico, nos municípios de Manaus e Novo Airão, bem como
nos conselhos já criados das unidades de conservação, onde foi apresentada a proposta para a
criação do mosaico e feita a sensibilização para a participação em eventos futuros. Essa fase
serve, também, para que alguns passos propostos no projeto original sejam replanejados.
I Oficina de Gestão do Mosaico - O objetivo geral da Oficina, realizada em agosto
de 2008, foi à integração dos gestores, instituições públicas, instituições não governamentais e
representantes das comunidades envolvidas na região do BRN visando: a) Discutir conceitos
como: Mosaico, Corredores Ecológicos e Reservas da Biosfera; b) Conhecer duas experiências de
formação de Mosaicos e desenvolvimento territorial; c) Apresentar o status da gestão das UC’s e
algumas experiências de territórios dos povos tradicionais; d) Conhecer propostas de políticas
públicas para o Mosaico; e) Indicar as instituições envolvidas na região do Mosaico para
subsidiar a formação do Conselho; f) Elaborar um plano de ação com base em temas comuns das
áreas protegidas. O oficina foi organizada pensando em duas grandes temáticas que permearam
as palestras e grupos de trabalho: 1) a gestão participativa e; 2) o desenvolvimento territorial. A
temática gestão participativa envolveu, num primeiro momento, uma discussão conceitual sobre
mosaicos e a gestão das UC’s e numa segunda etapa, através de grupos de trabalho, caminhou em
direção a estruturação do conselho e na elaboração de um documento de ação conjunta entre
gestores e sociedade civil. A temática do desenvolvimento territorial foi trabalhada no nível das
palestras e debates com a apresentação de experiências que visam qualificar na prática a noção de
mosaico, incorporando elementos socioeconômicos e de desenvolvimento local como por
exemplo, planos de desenvolvimento, certificações, marcas, valorização de produtos e serviços da
sociobiodiversidade, etc. Uma outra temática, que permaneceu como pano de fundo, foi a das
distintas territorialidades. A oficina trouxe a debate as propostas das comunidades locais bem
como o status de gestão das unidades de conservação, a fim de compreendermos a complexidade
do mosaico nos níveis fundiários, ambientais e culturais.
Para consolidar o processo deverão ser trabalhados a obtenção dos termos de adesão das
AP, organização dos documentos e envio ao Ministério do Meio Ambiente para reconhecimento
do mosaico (através de portaria), a criação e escolha do conselho consultivo com posterior
elaboração do regimento interno e a capacitação do conselho em gestão e desenvolvimento
territorial em AP. Ações que serão realizadas durante 2009/2010.

4.2.Identidade e Desenvolvimento Territorial do Mosaico

Segundo Albagli (2004) o território e o espaço apropriado por um ou mais atores


sociais, sendo definido e delimitado por e a partir das relações de poder. Este não se reduz a sua
dimensão material, constituindo-se como uma rede de relações sociais. O território também
assumiria significados distintos por cada formação sociocultural, sendo apropriado de forma
distinta entre, por exemplo, o Estado, as comunidades indígenas, por pesquisadores e grupos
ambientalistas, o que gera uma serie de conflitos, sobre-posições e alianças. Segundo a autora a
gênese, a dinâmica e a diferenciação dos territórios vinculam-se aos aspectos físicos,
econômicos, simbólicos e sociopolíticos.
O mosaico seria um recorte geográfico (região) com certas características comuns
(unidade na diversidade) que distinguem de áreas adjacentes ou de outras regiões. Portanto segue
sendo uma unidade politica, histórico-cultural, econômica e ecológica. Esta unidade comum
conforma a identidade territorial da região. É necessário que se incorpore os aspectos de
identidade e percepção das pessoas que moram em áreas protegidas. Estes aspectos garantiriam o
saber ambiental, e contribuiriam para entendimento mais complexo dos modelos de planejamento
e gestão das UC’s. É essa identidade territorial que pretende ser o ponto de apoio para construção
da proposta de desenvolvimento do mosaico. Para Haesbaert (1999), toda identidade territorial é
uma identidade social definida fundamentalmente através do território, constituindo assim parte
fundamental dos processos de identificação social. A identidade territorial seria uma espécie de
apropriação simbólica do espaço pelos que nele (dele) vivem. Dá uma idéia de pertencimento a
determinado lugar.
Segundo Albagli (2004), é possível se estabelecer formas de fortalecer as
territorialidades, “estimulando laços de identidade e cooperação baseados no interesse comum de
proteger, valorizar e capitalizar aquilo que um dado território tem de seu – suas especificidades
culturais, tipicidades, natureza enquanto recurso e enquanto patrimônio ambiental, práticas
produtivas e potencialidades econômicas”.
No entanto, a autora alerta para a impossibilidade de se construir essas territorialidades a
partir do externo, sem estar baseada no capital sociocultural do território. Nesse sentido, a
valorização baseada em interesses externos, de caráter instrumental, visa atrair investimentos e,
nesses casos, a “territorialidade é valorizada como mero objeto de interesse mercantil e
especulativo”. Dessa forma, a exploração da territorialidade ocorre de forma predatória e
insustentável no longo prazo, tendendo a destruir o capital social local e o meio ambiente. Por
outro lado, afirma que a valorização dos produtos com base na força do capital social permite o
surgimento de solidariedade, parceria e cooperação, formando redes sociais com bases na
territorialidade e “criando uma dinâmica virtuosa entre o moderno e o tradicional”. Segundo
Brandão (2003), o desenvolvimento territorial deve tornar-se uma criação dos próprios agentes
locais. Em comum, todos concordam que os projetos que tenham como finalidade principal a
promoção do desenvolvimento de um território devem abranger suas diferentes dimensões, que
são: a dimensão econômica, ambiental e social.
Esta proposta de desenvolvimento do território depende da construção e multiplicação
de redes de atores e instituições locais, de cidadãos, de movimentos sociais, tendo em vista o
planejamento e a gestão do desenvolvimento territorial (Flores, 2004). Promover o

9
desenvolvimento “alternativo” na região do Mosaico significa mais que potencializar as
iniciativas econômicas desta região. O que se pretende é assegurar o bem estar aos beneficiários
deste processo através de uma economia a escala humana (Neff, 1994), baseado na participação
efetiva, na sustentabilidade e numa critica profunda ao crescimento econômico (Sachs, 2000) e
que possua múltiplos indicadores que busquem a “felicidade” das pessoas e não apenas números
(Viveret, 2006). Como apresenta Sen (2000), “...uma perspectiva alternativa vê o
desenvolvimento essencialmente como um processo “amigável” de trocas mutuamente benéficas,
de liberdades políticas, de desenvolvimento social e de segurança protetora”.
A conservação da biodiversidade passa por uma nova visão de desenvolvimento
territorial sustentável e as áreas protegidas devem formar parte de uma estratégia regional de
desenvolvimento e ocupação dos espaços. Tal enfoque é fundamental para que as comunidades
locais se apropriem da gestão do desenvolvimento e das áreas protegidas. Estas últimas poderão
contribuir para a economia através da valorização e utilização sustentável da biodiversidade, dos
serviços ambientais, da proteção aos patrimônios culturais, do incentivo ao manejo dos recursos,
da agroecologia, ao ecoturismo e a negócios sustentáveis baseados na economia solidária.
A estratégia principal do projeto é a incorporação do elemento “Desenvolvimento
Territorial com Bases em Cadeias Produtivas da Sociobiodiversidade” nos espaços de gestão
participativa do Mosaico de Áreas Protegidas do Baixo Rio Negro e, a partir desta estratégia,
gerar ferramentas para implementar o Plano de Desenvolvimento Territorial (DT) que está em
elaboração pelo IPÊ e parceiros. A proposta e fundamentada no conceito de terroir, que são
produtos agrícolas, alimentares, florestais e artesanais da terra provenientes de sistemas
ecológicos diferenciados, produzidos de forma familiar ou micro-industrial com forte componente
de tipicidade e de um saber-fazer próprio e diferenciado (Berard e Marchenay, 1995).
Metodologicamente as acoes do projeto ocorrem de acordo com a proposta de Albagli
(2004), onde no processo de fortalecimento e capitalização do território em favor do
desenvolvimento territorial sustentável, visualiza-se como passos fundamentais a (1)
identificação das unidades territoriais pertinentes (no caso aqui as áreas protegidas formadoras do
mosaico), (2) geração de conhecimento sobre o território (diagnósticos, planos), (3) promoção da
sociabilidade (mobilização, oficinas, identificação de iniciativas) e o (4) reconhecimento e a
valorização da territorialidade (figura 4).
A identificação das unidades territoriais pertinentes se realizou através de diversas
metodologias. A área de abrangência do mosaico foi discutida publicamente em reunião de Novo
Airão em abril de 2007, onde através de um exercício buscou se construir propostas do mosaico a
partir da inclusão das áreas protegidas e de critérios de identidade territorial. Houve quatro
propostas de mosaico distintas, baseados na proximidade das UC’s e no grau de identidade de
gestão (desafios e potencialidades). Neste evento, foram criados dois grupos de trabalho, um de
gestores e outro da organização da oficina. O grupo de gestores junto, com o IPÊ, realizou duas
reuniões que culminou na elaboração de uma “matriz de proximidade” que visou comparar
aspectos comuns entre as áreas protegidas. Esta matriz permitiu visualizar a identidade de gestão
do território a partir de uma análise que englobou os seguintes aspectos: 1) ações já realizadas
conjunto pelos órgãos gestores; 2) questões relacionadas ao uso de recursos pelas comunidades;
3) potencialidades econômicas; 3) ameaças; 4) abrangência dos conselhos; 5) situação fundiária;
6) História, cultura e socioeconomia; 7) Características físicas e ecológicas, entre outras. Coube
também ao GT organizar a documentação necessária para formalizar o mosaico e animar o
processo. Num segundo momento foi solicitado posicionamento dos órgãos gestores em
comporem o mosaico e houve consulta aos conselhos das UC’s, ficando definida, a priori, a
formação do mosaico. Estão sendo realizadas consultas junto aos Waimiri-Atroari, tendo em vista
a incorporação da Terra Indígena no processo.

Figura 4 – Etapas da Estrategia de Desenvolvimento Territorial

A geração de conhecimento sobre a região se realiza através de estudo/diagnostico


que subsidiara a construção do Plano de Desenvolvimento Territorial com Bases
Conservacionistas. Os temas estudados no plano são: historia da região, cultura, socioeconomia,
áreas protegidas, instituições e planos de politicas publicas, bem como as seguintes cadeias
produtivas: (i) Agrícola ou Agroflorestal, (ii) Turismo e Artesanato, (iii) Manejo Florestal, (iv)
Manejo de fauna silvestre, (v) Serviços ambientais. O enfoque está sendo dados aos aspectos
econômicos, ecológicos e culturais das cadeias produtivas. Após elaboração do diagnostico será
iniciado um grupo de trabalho (GT) formado pelos gestores das UC’s e pelos membros das
comunidades, com posterior mobilização para elaboração das estrategias e caminhos de
implementação do plano para avaliação das iniciativas econômicas atualmente desenvolvidas e
suas potencialidades. Após esta etapa o plano será encaminhado ao conselho do mosaico para
aprovação final.
A implementação do plano se desenrolara de acordo com as estrategias a serem
definidas de valorização da territorialidade com busca de incentivos à produção em bases
sustentáveis, a capacitação dos produtores em técnicas que agregam valor aos produtos, a
comercialização de forma mais justa e equitativa da produção, assim como o fortalecimento da
“marca/origem” dos produtos tradicionais apresentam grande potencial de geração de riqueza,
com conseqüente melhoria na qualidade de vida da população e conservação in situ da
biodiversidade local. E importante visualizar estrategias de comunicação do território, bem como
formas de se inserir nos processos de pagamento por serviços ambientais. Cada ação deste deve
ser guiada por indicadores socioambientais bem delineados de acordo com a realidade regional e
seguindo, como proposição, a idéia de Novos Indicadores de Riqueza (Gadrey e Catrice, 2006)

4.2.1.Produtos e Serviços da Sociobiodiversidade

Na região do BRN as cadeias de produtos e serviços da sociobiodiversidade


caracterizam-se por serem curtas e, ao mesmo tempo, formadas por redes socioculturais muito
complexas. O encurtamento das cadeias pode ser explicado pela baixa especialização dos agentes
produtivos e pelo baixo nível de processamento de seus produtos. Nesta região, a maioria dos
produtos comunitários é comercializada in natura passando apenas por processos simples de
coleta, seleção, limpeza e beneficiamento básico, como é caso da retirada de óleos, fibras, cipós e
coleta de frutas das plantas e árvores da região (ver tabela 1).
O segmento produtivo local é composto por agentes pluriativos que se dedicam a um
grande número de atividades e à produção de uma significativa diversidade de recursos da
biodiversidade, acessando diversos espaços ao longo do tempo. Nestas condições são os próprios
comunitários os responsáveis pela coleta, pesca, caça e/ou cultivo de plantas e erva medicinais,
seu beneficiamento, processamento, comercialização e, em alguns casos, até mesmo pela
distribuição aos mercados consumidores. Esta característica, de pluriatividade, representa uma
estratégia de sobrevivência das famílias nos diferentes ciclos sazonais de produção que
acompanham a cheia e a seca, amplia assim a diversidade de produtos da sociobiodiversidade e
torna as relações sociais de produção mais complexas. Muitos destes sistemas produtivos são
também vistos como patrimônio da cultura local, como os da agricultura, que esta sendo
pleiteados como patrimônio imaterial no IPHAN (Emperaire et al. 2008)
A pluriatividade dos agentes econômicos se inter-relaciona a uma complexa rede de
relações socioculturais de trocas de saberes, de saber-fazer, de trabalhos coletivos comunitários e
de trocas de produtos, informações e conhecimentos. Os resultados da inter-relação social entre as
formas de produção e a cultura tradicional moldam redes sociais de produção pouco segmentadas,
relativamente curtas e com um alto nível de interdependência entre si através das trocas e
comercialização intra-comunidades e das comunidades com os intermediários (denominados na
região como “aviadores” ou “regatões”). As relações de troca entre comunitários, comunidades e
comerciantes se dão quase que totalmente sem a mediação da moeda, num sistema de dádivas. As
trocas e doações geralmente são entre gêneros alimentícios (produtos agrícolas e do extrativismo
florestal) por bens alimentícios processados em outras comunidades, por bens básicos
provenientes das cidades (bens/produtos de necessidade básica) e, por equipamentos destinados a
facilitar o trabalho dos comunitários no interior.
Esta economia beneficia-se ainda pela relativa proximidade da cidade de Manaus,
principal centro consumidor da região, e pela existência de outras cidades menores como o
município de Barcelos (localizada ao norte da região), de Novo Airão (ao centro) e de Iranduba e
Manacapuru (ao sul). A proximidade dos centros consumidores exerce grande pressão sobre as
atividades produtivas, a final são quase dois milhões de consumidores. De forma geral, esta
proximidade dos mercados consumidores apresenta vantagens e desvantagens para o
desenvolvimento da região. As vantagens relacionam-se principalmente com a certeza de acesso a
mercados para os produtos do baixo rio Negro, mas, por outro lado, também estimula a produção/
extração de produtos ilegais, como é o caso do extrativismo madeiro, da caça e da mineração.

Tabela 1: Alguns produtos e serviços da sociobiodiversidade mapeados na região do baixo rio Negro.

Manejo e criação Turismo


Agricultura tradicional Extrativismo não-madeireiro
de animais

Artesanato em
fibras e sementes,
cerâmica, comidas
frutas regionais, frutos de pesca subsistência
regionais,
palmeiras, sub-produtos da Fibras, cipós, resinas, e comercial, peixe
ecoturismo, turismo
mandioca, sementes, medicinais, óleos, sementes, ornamental, caca,
de aventura,
medicinais, ornamentais, doces castanhas piscicultura,
turismo com bases
e quitutes, culinária meliponicultura
comunitárias, pesca
esportiva, visitação
educacional
Fonte: Dados coletados junto aos representantes comunitários, Sindicatos, Organizações e Associações sociais de
classe no município de Novo Airão e Barcelos, Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Amazonas,
Instituto Chico Mendes de Proteção da Biodiversidade, Fundação Vitória Amazônica (FVA) e IPE – Instituto de
Pesquisas Ecológicas.

De forma geral, a economia dos povos tradicionais da região do baixo rio Negro se apóia
na produção/extração de uma ampla variedade de recursos naturais locais cultivados ou
apropriados pelos comunitários em seu dia-a-dia com a finalidade do autoconsumo familiar e
subsistência, garantindo a própria sobrevivência das famílias. Neste sistema econômico a
produção de excedentes para comercialização é pequena (baixa escala produtiva) e destina-se
principalmente para a troca e obtenção de outros gêneros essenciais à sobrevivência das famílias.
O saber-fazer e as formas de acesso, manejo e exploração dos recursos naturais locais obedecem a
saberes e técnicas de produção tradicionais idealizadas com baixo investimento de capital, baixa
produtividade e pequena escala produtiva, mas respeitando os ciclos ecológicos e a sazonalidade
da produção.

Considerações finais

A implementação dos Mosaicos de Áreas Protegidas se despontam como uma


alternativa viável de empoderamento dos povos estabelecidos nestas regiões, tanto no que se
refere aos direitos de manutenção de seu modo de vida tradicional, como também na
possibilidade do planejamento participativo no modelo de desenvolvimento regional. Os
Mosaicos atuam ainda na tentativa de se solucionar uma série de conflitos sociambientais até
então sem solução.
O Mosaico de Áreas Protegidas do baixo rio Negro está se constituindo em um destes
exemplos. O projeto conta com a parceria e envolvimento de uma série de instituições públicas
federais, estaduais e municipais, organizações da sociedade civil, ONG’s e representantes
comunitários, todos membros ativos do conselho consultivo e participantes no planejamento do
modelo de desenvolvimento que se pretende para este território.
E importante frisar que esta proposta e condicionada por politicas publicas nas áreas de
educação, saúde, transporte e comunicação para a região. De forma a atender os objetivos de um
processo de desenvolvimento coletivo de baixo para cima, voltado para a qualidade de vida
humana e não-humana e ancorada no principio da autonomia e liberdade. E fundamental a
articulação com outros projetos de Gestão territorial realizado pleo Ministério do
Desenvolvimento Agrário, do Turismo, do Planejamento e do Meio Ambiente. Como também se
deve reconhecer e demarcar os territórios tradicionais valorizando outras cosmovisões .
Por fim, a especificidade dos processos produtivos e, por conseqüência, dos
bens/serviços da sociobiodiversidade na região do baixo rio Negro pode ser utilizada como seu
principal diferencial de mercado. A criação de selos ou marcas (“Marca Mosaico”, “Selo Áreas
Protegidas”, “Selo Territórios da Sustentabilidade”) de valorização dos produtos e serviços
através de processos coletivos de certificação é capaz de agregar valor aos produtos de base
comunitária local e ampliar o acesso destes produtos.

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15
i O termo sociobiodiversidade tem sido usado pelas entidades que compõem o Fórum Brasileiro de Organizações Não
governamentais e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e Desenvolvimento. Significa que nos ecossistemas tropicais
persiste tanto a diversidade biológica quanto a cultural e que estas estão intimamente ligadas. A biodiversidade produz
diversidade cultural e vice-versa, gerando um sistema simbiótico complexo. O Ministério do Desenvolvimento Agrário
(2008) apresenta a seguinte definição para produtos da sociobiodiversidade: “são bens e serviços gerados a partir de recursos
da biodiversidade local, voltados à formação de cadeias produtivas de interesse dos Povos e Comunidades Tradicionais e de
Agricultores Familiares, numa relação harmônica entre si, com sustentabilidade, justiça social e respeito às especificidades
culturais e territoriais, que assegurem a manutenção e a valorização de seus laços sociais, suas práticas e saberes, dos
direitos decorrentes, da melhoria do ambiente em que vivem e da sua qualidade de vida”.
iiUnidades de Conservação (UCs) são espaços territoriais com seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais,
com características naturais relevantes, legalmente instituídos pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites
definidos, sob regime especial de administração. A Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000 regulamenta o art. 225, § 1o,
incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, e institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
(SNUC). O SNUC divide as Unidades de Conservação em dois grupos: as de Proteção Integral (cujo objetivo é o de
preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais com exclusão de populações
humanas) e as de Uso Sustentável (que visam compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parte dos
seus recursos naturais).
iii Segundo Drummond et al.(2006)A inclusão das Terras Indígenas no conceito ampliado de áreas protegidas se deve
primeiramente a Constituição de 1988 que consagrou o princípio de que os povos indígenas são os primeiros e naturais
senhores das terras brasileiras. Esta é a fonte primária de seu direito. Em segundo lugar, o reconhecimento constitucional
dessa identidade diferenciada dos povos indígenas se liga à questão territorial, em virtude do papel central da terra e dos
recursos naturais na reprodução econômica, física e cultural desses povos. As terras indígenas têm forte apoio legal e
institucional e estão marcadas pela intenção de perpetuidade. Assim, essas terras têm um caráter de permanência que faz
com que as UCs sejam aparentadas a elas. Em terceiro lugar, na medida em que mantenham os traços fundamentais de suas
práticas produtivas tradicionais, os povos indígenas geralmente não causam modificações radicais nos processos
ecológicos, nos ecossistemas, nas paisagens nativas e nos componentes bióticos e abióticos das terras que usam.
iv O processo de reconhecimento de Territórios de Quilombos no Brasil teve início em momento relativamente recente.
Consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos os grupos étnico-raciais com trajetória histórica própria,
dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à
escravidão. Isso implica em direitos reconhecidos pela Constituição de 1988. Foi a partir do texto constitucional em vigor
que o conceito de quilombo adquiriu uma significação atualizada, ao ser inscrito no artigo 68 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias (ADCT).
v De acordo com o Decreto nº 4.340/2002 (regulamentação do SNUC), os mosaicos devem ser formalmente reconhecidos
por ato do Ministério do Meio Ambiente e devem ser geridos por um Conselho, de caráter consultivo e presidido pelo chefe
de uma das unidades de conservação.

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