Coletânea de artigos
publicados na revista “Diretrizes”
Caratinga – MG
2008
2
GAMITO, José Aristides da Silva. Política, Ética e Religião. Coletânea de Artigos publicados
na revista “Diretrizes”. Caratinga, 2008.
3
países, é sustentada por 2,8 milhões de membros particulares. Seu campo de ação é o
ambiente, em questões dealterações climáticas, preservação
dos oceanos e florestas, paz edesarmamento, engenharia genética, desenvolvimento
nuclear,comércio justo ou sustentável.
Os debates e as ações são velhos. Mas, somente a pressão do aquecimento global fez o
assunto se tornar novo e presente na boca de todo mundo. Para reverter a progressiva
destruição do planeta, não bastam só teorias. Há que se desenvolver uma educação ecológica
que saia dos livros e se torne prática cotidiana. São atitudes de ética ecológica como se
recolhe o lixo, cuida da água, estrutura o quintal de casa. As instituições podem promover
essas ações. Porém, por trás delas, deve estar uma mentalidade nova. A base da conversão é
ecológica é aceitar a condição natural do homem. Ele é um membro frágil e dependente do
ecossistema. Não está autorizado a sobrepor as outras criaturas. Não é dono, é hóspede
convidado a cuidar. É precedido, gerado, circundado e sustentado pela natureza. Enfim, é um
convite ao retorno ao homem natural.
templo. O ensino de Jesus tem dois públicos como alvos: uma geração misteriosa e a geração
presente. A doutrina de Jesus tem característica gnóstica, ela extrapola a racionalidade do
texto. O mestre ensina cosmologia, revelando a origem dos primeiros pais, dos anjos, da
humanidade. Descreve a hierarquia dos eões. Cristo é posto como o grande Seth, o
primogênito dentre todas as criaturas. Esta concepção aproxima-se de Paulo, quando este
coloca Cristo como o primaz das criaturas. A chave de leitura da compreensão da figura de
Jesus decorre da sua íntima relação com Judas. A partir desses colóquios Cristo vai se
revelando como mestre, filho de Deus, o primeiro dentre as criaturas. A sua morte fica
subentendida no final, aos descrever a cena da traição. A identidade do confidente de Jesus é
evidente no texto. Judas é o principal interlocutor do Mestre. Possui uma espécie de primado
no meio dos discípulos, encarna em si a figura de Pedro e do discípulo amado dos canônicos.
Judas possui uma fortaleza espiritual ímpar no meio do discipulado. O texto diz: “Tu
ultrapassarás todos eles.” Ele não é visto como o filho da perdição (Jo 17, 12), mas ao
contrário, o discípulo principal. O texto o transforma no filho da bênção. Isto é devido à sua
missão diante de Jesus: “Tu me libertarás do homem que me reveste”. A mais importante e
conclusiva. O texto se situa no século segundo II, foi escrito pela seita dos cainitas. Tratarei
esse autor ou autores de comunidade. Esta provavelmente admirava Judas e fizeram uma
releitura da sua traição. A doutrina do desprezo do corpo presente nesses grupos muito
contribuiu para a reinterpretação. A comunidade patrocina um resgate da figura de Judas, ação
dele é este justificada e o discípulo a passar do primado espiritual. A comunidade relê a
trajetória de Judas, coloca a sua rejeição pelos cristãos como o cumprimento de uma profecia.
E depois de um tempo de rejeição, ele seria relembrado. O evangelho é esta fonte importante.
Ele revela ensinamentos que só Judas teve acesso. A atribuição da autoria a Judas se insere
em casos comuns dos evangelhos. O documento nos ajuda a compreende o cristianismo
primitivo. Questões como a diversidade de idéias, o primado entre os apóstolo, a
supervalorização da figura de Jesus e a fusão entre cristianismo e helenismo. As lacunas do
manuscrito deixam muitas passagens obscuras. A visão integral do texto fica comprometida.
É um texto pequeno. Mas, de difícil leitura.
referendo. A fé tem se tornado uma instância muito procurada, mas que só age na dimensão
psicológico-existencial, não chega a atingir o agir ético que se faz necessário no concreto das
relações. A ocasião é propícia para a Igreja conhecer melhor seus fiéis e seu modo de lhes
falar. A propósito de uma avaliação geral, o fato aqui discutido não deve invalidar nossos
esforços em favor da cultura da paz. A esperança ainda continua. O referendo representou um
grande passo para a história da nação brasileira. Mesmo que o motivo seja a dor, a
humanidade começa a construir timidamente a civilização do amor tão sonhada. A maioria
disse “não” à vida, mas ela continua se afirmando incansavelmente e não há de ser ignorada
sempre.
é perda do sentido da vida. Dentre tantas propostas de existência autêntica existe a religião.
Que orienta, significa, mas a auto-escolha a precede. No nosso caso de cristão, o Evangelho é
uma proposta-experiência que redimensiona a vida. O no ser é assumido como filho de Deus e
o nosso fazer na construção do Reino. O lugar do jovem ainda anda muito indefinido na
Igreja, é necessário ocupar esse espaço. Cristo nos convida a uma escolha fundamental, a
escolha dele, implica a escolha de nós mesmos. Fazendo o nosso batismo e a nossa marca de
cristão. Quanto ao fazer somos intimados a construir uma civilização do amor, superando a
falsa fraternidade desenvolvida entre nós. A nossa tarefa é usar o vigor juvenil que temos para
superarmos o comodismo diante da atual e circundante situação do mundo contemporâneo.
Fazer como Cristo fez com a sua situação histórica.
Há muita carência de educação no mundo. E uma delas que tem feito falta
entre nós, é a educação para o cuidado. O cuidado tem uma tarefa dupla: cuidar dos outros e
cuidar do mundo. O nosso descuido com a natureza tem provocado agressões catastróficas.
Atualmente, devido ao efeito estufa o nível de acidez nos oceanos aumentou, juntamente com
o aquecimento destes, a vida oceânica está ameaçada. Os elevados níveis de ozônio na
atmosfera têm causado alterações nas plantas e animais. Os invernos rigorosos da Europa
tendem a acabar e as geleiras, a derreter. Esses são exemplos de algumas mudanças naturais
resultantes da nossa deseducação para o cuidado.O nosso descuido com os outros engloba
tanto essas agressões à natureza quanto o desrespeito direto ao outro. Exemplo claro disso,
são as guerras que presenciamos diariamente. Mais do que nunca, precisamos a aprender a
cuidar. Esta é uma arte difícil, exige dedicação, discernimento e previsão. Significa assumir a
presença dos outros no mundo e assumir o próprio mundo como sustentáculo para os nossos
projetos. A lição de Gn, 1, 28 de “crescer”, “multiplicar”, “encher” e “dominar a terra” ecoa
aqui. Esses imperativos devem ser entendidos como a prova da grande responsabilidade
humana de cuidar da natureza, cuidar como um pastor dedicado.A faculdade de cuidar é
própria do homem. Cuidar vem de cogitare “pensar”. Os animais, de certa forma, cuidam dos
seus. Porém, só o gênero humano devido à sua racionalidade foi constituído, pela natureza,
pastor da criação. Esta opção se torna fundamental, porque agredir a natureza para ele, é
agredir a si mesmo. Há uma relação filial incorruptível entre os dois. Pena que temos nos
esquecido disso. E vivemos imprudentemente agredindo uns aos outros e a nós mesmos,
através da natureza. No dia 4 de outubro comemoramos o Dia da Natureza, dia de São
10
todos os nossos esforços para uma nova ordem. A conscientização para essa necessidade,
direito e poder, é dada pela educação. Esta seria de responsabilidade de todos os segmentos
educativos da sociedade, especialmente a escola, na qual a Educação Política se converteria
numa disciplina prioritária. E não com a ocupação periférica que tem atualmente na Escola.
No fundo é voltar todas as nossas atenções com seriedade e urgência para as Políticas
Públicas, dando ao país uma cultura de Educação Política, libertando-nos dos rotineiros vícios
de cidadania. Precisamos de uma mentalidade aberta à mudança. O momento oportuno é
agora. Que tal começarmos com um voto bem consciente nas eleições deste ano?
especial: a gratidão. Sabemos que todo dia é dia das mães, mas precisávamos convencionar
um dia para exprimirmos a nossa gratidão. Assim nasceu o dia das mães, uma data magnífica.
Historicamente há uma superação a ser feita. Essa data não é dia de consumo, nem de poesia
barata e muito menos dia de lazer. É, acima de tudo, livre de qualquer amarra capitalista, o
Dia da Celebração da gratidão e do amor mais sublime que há entre nós. Nisto todos povos
são concordes !!! Eis a surpresa que nos fez Deus na evolução da existência. Que presentão!
Felicidades a todas a nossas mães .
dignidade humana para defendermos o divino. Somos religiosos para termos tempo para
sermos humanos. Uma guerra religiosa é soco mais dolorido que podemos dar no coração de
Deus, Numa religião que perde a razão de vista, a verdade e a contradição se confundem.
Quando percebemos ele já estava no nosso meio. Quem podia imaginar que
aquela criança de Belém era ele?! Seu primeiro choro infantil foi lição de amor tão singular. A
humanização de Deus foi surpreendente, gratuita e não exigiu respostas. Belém não é um
lugar necessário. O coração do homem é um presépio gratuito do divino. Mas, ele quis armar
a sua tenda entre nós. Tornou-se um profeta não para nos ensinar um código de moral, mas
para nos convidar a uma experiência acessível a todos: o amor. Porém, tenho de discorrer
sobre a natureza desse amor. Ele não é um amor exigente e nem é recíproco. Ele é pura
iniciativa, nítido desdobramento em favor do outro. Ele não diz faça o bem para ser salvo.
Mas, nele já está implícita a salvação: o bem faz sentido porque vivemos uma relação de
pessoas salvas. A História da Salvação plenificada na epifania do Senhor nos mostra uma
relação de graça. Entre o homem e Deus há uma caso de aspiração e sedução infindável. O
Natal nos faz repensar a nossa relação com Deus. Ele não tinha nenhuma dívida conosco, não
havia um contrato exigindo a sua manifestação para que crêssemos. Nem impôs a fé como
condição. No entanto, ele veio. Ele que nos criou livremente. Só poderá receber uma resposta
gratuita. Ao longo da história nosso zelo excessivo foi instituindo obrigações para o amor. E
passamos a dizer que devemos o amor uns aos outros. Isso não cabe na natureza intrínseca do
mesmo.Como podemos sentir a relação de graça e de liberdade com o nosso Deus? A fé cristã
não parte da adesão a um conjunto de verdades. Começa com um encontro pessoal com Jesus.
Ás vezes, mediado pela comunidade ou não. A estrutura central desse ato de fé que nasce
dessa apresentação interpessoal é o amor. Não é uma experiência moral em primeira instância.
É uma relação estética pautada por um amor espontâneo. A conversão de muitos santos se
deram da maneira mais impensável. É um enamoramento sem formas prévias, sem exigências
de reciprocidade. Compreende-se a medida do amor é com o próprio amar.O Evangelho
provoca uma virada de expectativa diante da lei. Enquanto, se espera do devoto um
cumprimento perfeito dos mandamentos. A gratuidade evangélica vai além, justamente
naquilo que não se exige. Não precisamos mostrar nossas ações para atrair recompensas, o
intuito do bem não é receber outro em troca. Essa pespectiva contradiz os ditos “amor com
amor se paga”, “o bem se paga com bem”. A essência evangélica nos convida a dar mais um
16
passo, convida-nos a uma virada de expectativa. O amor não nos faz devedores. Se
concordamos com atitude farisaica (da recompensa), no lugar em que não se fizer mais o bem,
não teremos motivação para realizá-lo. O efeito da graça na vida humana só pode ser uma
postura de gratuidade. Caso contrário estaremos numa relação ambígua. A encarnação só
pode ser entendida num contexto de graça e a relação com ela fará sentido se for por nada. E
as nossas relações interpessoais? Qual será o parâmetro? O limite é o amor. Ele é desmedido.
“Ama e faze o que quiseres”, dizia Agostinho. Não tenhamos medo o amor dá o contorno
próprio ás coisas autenticamente humanas. Se não há uma relação de necessidade e de
obediência. Então, tudo é permitido, dirão alguns. Quando desviamos e projetamos a razão do
amor na premiação que Deus nos conferirá, desfiguramos o amor divino. Se tiramos a
premissa esquecemos que somos seres amorosos. A graça age a na comunhão entre o homem
e Deus. A salvação é a maneira objetiva como a graça nos toca – não depende de nosso
mérito. Agora a santidade é a relação subjetiva que se estabelece com a graça. É acolhida livre
e pessoal da salvação – é uma construção pessoal. Essas relações quando são confundidas,
não conseguimos compreender a visita gratuita que nosso Deus nos faz a cada Natal. Amar é
próprio de quem cultiva a hospitalidade. Fica o convite para acolhermos o nosso visitante
neste Natal, em outras palavras: sejamos gratuitos – amemos as pessoas pelo que elas são e
não pelo que elas podem nos dar. Assim como o nosso Deus fez conosco na Encarnação.
“... homem...Ele nos parece o animal mais forte porque é o mais astuto: um dos
corolários disso é a sua intelectualidade” (Nietzsche). O ser humano está condenado a
conviver com sua ambivalência: a capacidade de amar e de gerir guerras. De onde virá o
equilíbrio de forças, senão de sua decisão de amar? Porém, o amor precisa de um ambiente
favorável para se desenvolver e gerar relações fraternas. É preciso lançar um olhar mais
profundo sobre as raízes da paz. Num mundo cansado de guerras e de múltiplas formas de
violência, parece que a compreensão de paz reduziu a mera ausência de guerra. Há que se
recuperar o sentido do Shalôm (paz) bíblico. A construção da paz do mundo é uma tarefa
árdua e lenta. Apesar de todo o progresso tecnológico, o homem continua eticamente
atrasado. Há uma disparidade entre essas duas dimensões. Seus instintos de predador ainda
continuam s mesmos. Se não se desenvolvem meios de humanização, ele continua entre o
irracional e o pensante. A violência está travestida de diversas formas culturais, desde
símbolos, passando por instituições até os atos propriamente ditos. Como poderíamos avançar
na direção de uma cultura de paz?Não se pode isolar o problema da conjuntura social, política
17
e econômica. E nem podemos nos esquecer que ser pacífico é uma decisão individual, parte
de uma metanóia (conversão) a para a paz. Quanto mais se enrijecer as convicções individuais
e étnicas, tornando-as absolutas e hegemônicas, mais formas de violências serão geradas. O
terrorismo, os fundamentalismos islâmico e cristão e o crime organizado são protestos
desesperados que tem salvaguardar uma concepção de homem. No fundo quem não pertence a
esse qualificativo deve morrer. O humano é relativizado em nome de certas “verdades”.
Mesmo nas sociedades democráticas ainda não há autêntica convivência entre a s diferenças.
A tolerância é muito confundida com conformismo, a decisão de começar a paz é sempre
adiada. Não há política e nem educação favoráveis para a superação da violência. Alguns
optam por uma pacificação como o império americano. Faz-se guerra para garantir a paz,
como os romanos diziam Se vis pacem, para bellum (se queres a paz, prepara a guerra). Será
que estamos dispostos a investir no caminho encontrado por Gandhi? O da não violência?No
sentido bíblico a paz é fruto da justiça. A opção por ela requer uma sociedade onde reina a
justiça. Sem elas inter-relações a questão se torna uma utopia estéril. Há um discurso por aí de
livretos de auto-ajuda que poetizam uma paz ingênua, não feita para o mundo dos homens.
Tenhamos cuidado para que nossas reflexões cristãs não tomem a mesma direção!Francisco
de Assis, Gandhi nos lembram decisões imperturbáveis pela paz. Decidir-se por ela é doloroso
e um risco a princípio. Significa uma saída corajosa de todo individualismo, de convicções
fechadas, mesmo sagradas, que não se dispõem a dialogar com outras verdades. O homem da
paz é um homem radical, não se contenta em ser superficialmente humano. Na sua decisão
corre o risco de ficar sozinho. Jesus é o protótipo! Espero que cristão não tenham sido
entorpecidos pela desesperança na paz.
Durante os primeiros séculos da Igreja um dos grandes desafios encontrados foi o surgimento
das heresias. Os pais da Igreja se esforçaram tremendamente para que a fé fosse transmitida
com fidelidade. Porém, o cristianismo primitivo foi se construindo a partir do contato do
Evangelho com as diversas culturas do mundo antigo. Os cristãos provenientes do meio
filosófico e de religiões mistéricas tendiam a interpretar os princípios da fé a partir de sua
visão de mundo.
A dificuldade doutrinal foi explicitar coerentemente a identidade de Jesus. Houve muitas
propostas e discussões. Surgindo, assim, os desvios de doutrina chamados de heresias
18
cristológicas. Essas questões foram resolvidas em concílios. Hoje essas heresias persistem de
outras formas. E quando se pergunta sobre a identidade de Jesus o problema reaparece.
O que se observa nas igrejas e movimentos pentecostais é uma despersonalização de Cristo.
Flagrantes de pregações e de programas de TV nos sugerem que Jesus é definido segundo
critérios de âmbito psicológico, financeiro e clínico. As visões cristológicas contemporâneas
se afastam consideravelmente da tradição bíblica e são afirmações impactantes como “Jesus é
a solução”. O padre e o pastor apresentam Jesus a partir da carência do fiel. Para se converter
é necessário ter problemas financeiros, de saúde ou passionais. A função de Jesus é responder
e solucionar os males daquele que crê. A sua personalidade é colorida segundo a praticidade,
seu aspecto ontológico se perde. Jesus não é mais assumido como o Filho de Deus, está mais
para super-homem. O slogan do cristão que defende essas heresias é “Jesus tem poder”.
Essas constatações nos impulsionam a uma revisão de método de evangelização. As
influências do mercado nos fazem sacrificar a identidade do Filho de Deus. Ele é apresentado
segundo princípios do marketing como um produto de excelente qualidade. E que soluciona
todos os problemas do ser humano. Uma visão utilitarista de Deus e pessimista de homem.
Deus existe para servir o homem na superação de suas limitações e o homem precisa estar
decadente e ameaçado para buscar a divindade. A personalidade de Jesus se encontra
fragmentada e presa a interesses de ordem prática. Quando se diz que “Jesus é tudo”, corre-se
o risco de reduzi-lo a nada.
As pregações e a catequese não podem desgrudar o olho da Bíblia e da Tradição. A tarefa
religiosa de nosso tempo é indubitavelmente redescobrir Jesus. A síntese da fé cristã
formulada no Credo professa: “Creio em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor “ e seus
desdobramentos.
Jesus Cristo possui todas as dimensões da pessoa humana, mas é único e não pode ser
confundido com uma expressão vaga sem compromisso histórico. Não tem como pregar um
Cristo versátil, multicolor e com personalidade cambiante sem desviar da fé ortodoxa. A fé
tem uma fórmula própria, transmitida, que reflete um mistério ímpar. Portanto, é preciso
redescobrir Jesus com os pés na história para que não se caia em heresias hodiernas tais como
as do Jesus terapeuta, financista e clínico.
Nos últimos anos, a sociedade brasileira entrou no grupo das sociedades mais violentas do
19
mundo. São altos os índices de violência urbana, doméstica e familiar. O país tem índices de
violência superiores às áreas de conflitos como Colômbia e a Palestina. O episódio do
espancamento da empregada doméstica Sirlei Dias Carvalho Pinto, 32 anos, por cinco jovens
da classe média provocou a indignação da sociedade. O crime ocorreu dia 24, na Barra da
Tijuca, bairro nobre do Rio Os agressores eram ricos, universitários e no grupo havia até
estudante de Direito. Esse é um dos exemplos mais recentes da violência entre jovens da
classe média. Em 1997, jovens ricos de Brasília mataram queimado, enquanto dormia, o índio
Pataxó Galdino Jesus dos Santos. Nos dois casos, os rapazes alegaram equívocos. Os do Rio
pensaram que a agredida era prostituta. Os de Brasília acharam que o assassinado era
mendigo.
Antes se ligava a questão da violência às condições sociais e econômicas dos indivíduos. Hoje
o problema se generalizou e jovens ricos e pobres estão constantemente envolvidos com a
violência. Todos os meios se tornaram espaços de prática de violência. Que vai desde uma
agressão verbal entre familiares até uma segregação predatória e generalizada nas grandes
cidades. A cidade se transformou em tribos que se estranham.
O cidadão está envolto de particularidades e critérios pessoais que definem o direito de viver.
E não consegue mais reconhecer a sua semelhança com o próximo. Uma mesma espécie se
estranha. A violência surge no interior humano, mas se propaga em cadeia. Há pressões
sociais, econômicas e políticas sobre o jovem brasileiro. Há competitividade, pobreza,
corrupção, estresse e redução do sentido da vida. Essas causas já são conhecidas como
geradoras de violência. São apenas reações. E quantos aos jovens de classe média que tem
uma economia estável? Onde estariam as causas da violência?
A idéia de homo hóminis lupus, o homem é o lobo do homem (Plauto 254-184), está fazendo
sentido. O indivíduo fechado em seu egoísmo pode definir para si um conceito de homem e
descartar os outros dessa classificação. Se a sociedade não regulamenta leis, não detém os
males dessa guerra. Porém, a questão é mais profunda. Faz-se necessário refazer conceitos
sobre a vida e uma cosmovisão completa. Somente a abertura ao outro totalmente outro, e não
extensão do nosso egoísmo poderá salvar o homem de ser lobo de si. A ausência de sabedoria
e arranjo da vida para nos remeter ao estado de “guerra de todos contra todos”.
O egocentrismo predatório nos ronda a todo tempo. Estamos pensando em fatos, mas se
analisarmos toda estrutura de nossa sociedade, percebemos uma coletividade só em função da
sobrevivência. Se os mais fortes não dependessem dos obséquios dos menores, não os
tolerariam. Há entre nós uma justiça fictícia. Cristãos, juristas, humanistas se rendem à
sedução do mal. E o mal é justamente a estranheza. O homem que estranha o outro e não
20
A diversidade de igrejas e movimentos cristãos nasce de uma mesma fonte. Seu ponto de
unidade é a Bíblia. Uma única palavra vista por tantos olhares diferentes. Mas estas são
contradições e mazelas do cristianismo. O zelo pela conservação fiel da mensagem evangélica
se transforma em vício. Guerras e massacres já aconteceram porque a religião se tornou cega
diante do dinheiro e do poder.
As dificuldades em torno de um consenso da interpretação bíblica começaram bem cedo.
Quando olhamos para o cristianismo primitivo o imaginamos como um movimento
homogêneo. Basta um pouco de atenção que veremos as razões dos concílios, dos combates
aos hereges. Mais tarde acontece o grande cisma. Católicos orientais e ocidentais se dividem.
Na época da Reforma, antigas controvérsias são retomadas.
Os teólogos, ao longo do tempo, foram usando instrumentos de interpretação. A primeira
parceira histórica foi a retórica grega. As categorias platônicas deram corpo de expressão para
a Bíblia. Houve maior resistência em aceitar o pensamento aristotélico. A crítica bíblica só
ganhou mesmo cientificidade nos séculos 18 e 19. Os intelectuais protestantes alemães
tiveram grande contribuição.
Mesmo com a aquisição de modernos instrumentos de interpretação, o aperfeiçoamento da
crítica bíblica não pôde impedir a continuidade, e até mesmo, o aumento de leituras
21
fundamentalistas por parte de grupos pentecostais. Na década de 90, por exemplo, cresceu nos
Estados Unidos uma pressão para a adoção do criacionismo nas escolas. O fato fez aumentar
as divergências entre fé e ciência.
Atualmente duas posições diante da Bíblia são bastante claras. Há uma interpretação
racionalista empregada em ambientes acadêmicos pelos biblistas. Essas conclusões chegam às
classes populares. A segunda é a interpretação estética, seu poder é os sentidos. A fonte é a
pregação de pastores e padres. São repassadas em meios de comunicação.
Será que sabemos o que a Bíblia quer dizer? As divergências de compreensão se tornam
diferenças instituições e por fim conflitos pessoais. “Para que todos sejam um”, o desejo de
Cristo fica em segundo plano. Os cristãos deveriam pôr em primeiro lugar seus pontos de
unidade: a fé em Cristo. As divergências dogmáticas não deveriam ser impedimento para o
progresso do Evangelho. Muitas esses pontos de divisão ganham espaço maior do que os
benefícios que a fé pode trazer. É preciso ter coragem de sacrificar detalhes para salvar o
essencial!
Jornal “O Carmelo”, outubro de 2007, 48ª edição.
A sociedade ocidental conserva algumas tradições que merecem uma crítica impiedosa. A
cada fim de ano vemos uma corrida louca em torno do Natal e do ano novo. Antigas festas
pagãs cristianizadas foram agora “capitalizadas”. Apesar de uma boa parte da sociedade não
ter nenhuma prática cristã, essas pessoas insistem em adotar discursos e símbolos cristãos
nessa ocasião. Vivemos uma crise de convicção. A nossa sociedade precisa festa e feriados,
mas não precisa de sustentar hipocritamente antigas tradições. Natal é para os cristãos. O Ano
Novo é celebrado com muita superstição para atrair “sorte”, doutores altamente diplomados
ainda têm práticas míticas. Essas se perdem na estética e na fantasias e não se convertam às
grandes causas da humanidade.
22
IDENTIFICAÇÃO DO AUTOR
CONTATO