Belo Horizonte
2008
1
Monografia apresentada à banca examinadora constituída pelas professoras
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Orientadora
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2
dedico este trabalho à Paulinha, minha
estrutura óssea;
ao Affonso, meu
avô e sábio verdadeiro;
3
AGRADECIMENTOS
À minha orientadora Profª Drª Eliana Regina de Freitas Dutra – grande professora e
pesquisadora com a qual aprendi muito e que sempre acreditou nesta pesquisa – e, por
meio desta, ao Projeto Brasiliana, um dos ambientes mais estimulantes imagináveis para
um aprendiz de historiador como eu.
À senhora Eunice Vivacqua (in memoriam) e à Profª Constância Lima Duarte, ligada
ao Acervo de Escritores Mineiros (AEM) da UFMG, que me franquearam, em
diferentes momentos, o acesso ao arquivo pessoal de Achilles Vivacqua, assim como à
colega bolsista de iniciação científica Juliana Cristina de Carvalho, que me ajudou na
consulta propriamente dita.
Ao Prof. Dr. Eduardo Jardim de Moraes que não apenas teve a gentileza de me enviar
uma cópia de seu fundamental livro – infelizmente esgotado – sobre a brasilidade
modernista, como também me proporcionou a honra de uma troca de idéias sobre os
assuntos aqui tratados.
Aos colegas e amigos que tiveram a paciência de discutir comigo o presente trabalho
nas suas diversas fases, em especial Igor Daniel Borges e Valdeci Cunha.
4
Resumo
Esta monografia tem por objetivo analisar a inserção da publicação modernista leite
criôlo e do grupo de escritores responsável por ela no que denominamos de rede
modernista nacional. Nela focamos as conexões do núcleo responsável pela publicação
com outros núcleos modernistas espalhados pelo país; as tomadas de posição que se
expressam no âmbito dos gêneros textuais e dos temas presentes nas suas página; e a
posição de leite criôlo na construção da memória da geração modernista.
5
Conteúdo
6
1. Se perdendo neste mundo que é o Brasil: leite criôlo e a
rede modernista nacional.
7
O presente trabalho tem por foco a inserção de uma publicação modernista
relativamente esquecida1 de Belo Horizonte – leite criôlo de 1929 – naquilo que pode
ser definido como a rede modernista brasileira2. Investigação restrita e específica que,
como uma alternância de fases, movimentos e/ou estilos. Existem, de fato, várias
para Nelson Werneck Sodré as datas chave seriam 1922-1930; para José Guilherme
Merquior de 1922 a meados dos anos 19503. Francisco Iglesias já havia atentado para a
dando-lhe mais extensão, pode-se falar de 22 a 45; com mais amplitude ainda, de 22 a
cultura verdadeiramente nacional” – tendem a expandir o período até 1945. Por fim, o
1
O que significa, também, relativamente rememorada e comemorada. Sobre este ponto nos
concentraremos posteriormente.
2
A definição do que compreendemos como “rede modernista nacional” virá logo adiante.
3
Apud. SANT’ANNA, 2005. P. 16.
4
IGLÉSIAS, 1972. P. 13
8
e dos brasileiros que continua a ser evocado de diversas maneiras pela quase totalidade
dos intelectuais brasileiros e, talvez, difundido para outras camadas sociais através da
indústria cultural e das instituições de ensino – estende a duração até os nossos dias5.
datação, tem de invariável é o peso das análises internas, ou seja, das obras e das idéias
entendido como um pano de fundo político, econômico e social das obras e das idéias,
não resolve a questão: pensados em termos de analogias com seu “contexto” definido
o “indivíduo” à “sociedade”. Tal dualismo acaba por destruir o caráter social do objeto
“criadores incriados” de si mesmos e das suas próprias obras, a lógica específica das
literária dos que se opuseram a eles, assim como aquela imediatamente anterior ao
movimento, acaba por ser reduplicada por análises que tomam por objeto o modernismo
5
É sintomático que a produção cultural erudita brasileira hoje seja concebida, em parte, como pós-
moderna, mas dificilmente se distancie da herança do Modernismo.
6
Cf. ELIAS, 1994
9
ter em mente que nunca houve um “movimento passadista” e que, sem compreender a
Mônica Pimenta Velloso7. Se, como essa autora e também Flora Sussekind
maneira não ajuda na compreensão das relações daqueles que nos anos 1920 assim se
intelectuais destes erigiram para tal movimento. A porta de entrada para esse estudo é,
no mais das vezes, o cânone artístico e literário, os grandes nomes que surgiram com o
“pesquisa de origem”, o que segundo ele constituiria mesmo uma das atribuições mais
fundação. Pode-se dizer que tal exaltação do início como momento forte da história –
afirmada com todas as letras na tradição ocidental durante os muitos séculos nos quais o
7
VELLOSO, 2003. P. 353-360.
8
SUSSEKIND, 1987.
10
caráter monumental da história foi considerado auto-evidente e positivo – permanece
Assim podemos tomar a terceira das datações do modernismo de que fala Iglesias,
de 1922 aos nossos dias, como ponto de partida para uma outra perspectiva de
exemplo, como marcos da sua história pessoal e da história brasileira eventos hoje
notórios, como a Semana de Arte Moderna de 1922 e a visita dos modernistas de São
constantes. Estas, por sua vez, não podem ser ignoradas nas tentativas de compreender
11
intelectual, “geração” que se produz como geração através da construção de uma
que reconstruir tal objeto implica em uma vigilância redobrada em relação aos perigos
anos 1920 como uma configuração social, em relação à qual se realiza a produção
programa explícito. Pelo contrário, durante todo o período a rede modernista esteve
9
A publicação modernista paulista Revista de Antropofagia denominou suas fases de dentições, em
alusão à metáfora do canibalismo presente desde o seu título.
12
vaga o bastante para abrigar as diversas tendências. Na verdade, o que caracteriza a rede
é que todas as publicações, todas as obras, tinham como interlocutor implícito a própria
autor” do que era visto pelos leitores em geral como absurdo, ultrajante e
negativamente, por exemplo, através das polêmicas que permitiam aos modernistas
demarcar suas posições dentro do movimento. A noção de rede nos parece interessante
campo literário – tal como definido por Pierre Bourdieu10, ou seja, conjunto de todos os
produtores de literatura que compõem a “República das Letras”, lugar das disputas
na virada da década se passam apenas alguns poucos anos. Depois deste período, cujo
marco final coincide com a Revolução de 1930, muitas das características da difusão
original do movimento se alteram, um exemplo entre muitos seria que o gênero literário
10
BOURDIEU, 2005. P. 243-311
13
de preferência do modernismo dos anos 1920, a poesia, perde espaço para os “ensaios
o romance de “caráter social”. Outro exemplo seria que neste momento parte
ou então em ativa militância dentro de partidos políticos, o que acaba por eliminar o
anterior.
ausência de uma referência melhor para seu início, poderia ser datada do encontro do
adoção por parte do modernismo de um ideário nacionalista. Como mostram este autor
referência obrigatória para tal questão aos olhos das gerações intelectuais posteriores.
Temos por hipótese que o nacionalismo literário, que se tornou então um dos
era um dos principais atrativos de toda uma nova geração de conversos ao modernismo,
cuja emergência na rede modernista nacional se dará em torno dos anos de 1925-1928.
Ao cabo deste processo, em 1929, a rede modernista abarcava núcleos em quase todos
elite – muitos do quais trocavam naquele momento suas bases nas cidades do interior
11
MORAES, 1978.
12
GOMES, 1999.
14
por uma temporada de estudos secundários e superiores nas capitais de seus respectivos
estados.
pela publicação em 1929 de leite criôlo, constitui um destes núcleos de novos adeptos.
Dirigido por João Dornas Filho, Guilhermino César e Achilles Vivacqua, leite criôlo só
pode ser descrito como uma “revista” na mesma medida em que a segunda “dentição”
São Paulo no caso da publicação paulista. Apesar de, por um lado, leite criôlo ter tido a
muito diferente nas suas características editoriais de outras revistas modernistas – como
marcada pelo desejo, ainda que contraditório, de se comunicar com um público mais
amplo que o da rede modernista, de ir além da literatura estrito senso em nome dos
ideais nacionalistas, impulso expresso não apenas pela sua presença em um jornal de
grande circulação, mas também pela distribuição gratuita da única edição avulsa em
praça pública.
Tal interesse por uma aproximação do universo público, que antecipa a postura de
muitos membros da geração modernista a partir dos anos 1930, não deixa de ser, como
rede modernista nacional e, em especial, pelas várias revistas modernistas, que eram a
15
principal forma de manifestação do movimento, dado que muito pouco daquela
contexto, porém, da aparição das revistas literárias modernistas nos anos 1920, a
deste tipo de publicação é a longeva revista carioca Fon-fon, fundada em 1907 e ainda
Brasil como Careta, Don Quixote, Paratodos e várias outras14. Também em outros
locais foram publicadas revistas nos mesmos moldes e no próximo capítulo trataremos
de duas delas, publicadas em Belo Horizonte nos anos 1920 e em estreita conexão com
um público mais amplo, não satisfaziam o desejo dos escritores de produzir “literatura
pura” nos padrões vigentes então no campo literário francês, referência hegemônica em
termos de produção cultural naquele momento. Desta forma, no mesmo período foram
das quais se destaca o ciclo das revistas simbolistas na década de 190015. O problema
básico do ponto de vista editorial destas revistas – e a principal razão pela qual
então da forma que as revistas de variedades, o que significava, além de vendas baixas,
13
Cf. DOYLE, 1976.
14
Cf. VELLOSO, 2003. P. 360.
15
Cf. DE LUCA, 1999. P. 58.
16
pouco interesse dos anunciantes. Segundo Tania de Luca, a primeira revista
contexto foi a Revista do Brasil, publicada em São Paulo a partir de 1916, que poderia
ser definida como uma revista de cultura, e na qual a literatura estrito senso ocupava
na qual o “futurismo” era, para o público leitor mais amplo, sinônimo de absurdo e
ultraje. Assim, tais revistas, feitas muito mais de crença na literatura do que de tino
Antropofagia), o que implicava no beneplácito das pessoas responsáveis por tal órgão
de imprensa.
disponível é expressa na idéia corrente no período de que não existe público para a
veiculada pelos modernistas. Se o público tal como ele se apresenta deseja o formato
poesia parnasiana, ele deve ser ignorado até que se forme um novo público “à altura” da
16
Idem. P. 56-59
17
GOMES, 1999.
18
Em leite criôlo foi publicado um texto ridicularizando este escritor português, autor de títulos como “O
Eterno Feminino”, “O que morreu de amor” e “O primeiro beijo”, que é descrito no texto como um
produtor de literatura “açucarada” para o público feminino. (“ Julio Dantas, o Brumel” de Oswaldo Abrita
em LEITE CRIÔLO Nº VIII, 21 de julho de 1929)
17
produção modernista. É neste sentido que a rede nacional modernista é a referência de
modernistas. As próprias publicações encenam a rede, seus fios, seus nós: quem publica
o que onde, o que diz a resenha de fulano da obra de sicrano na revista X etc. Revistas
deles20 são colecionados por membros dos múltiplos núcleos modernistas espalhados
pelo país.
A expansão máxima da rede modernista se dá até 1929 e tem por símbolo maior a
início de 1929. As desavenças que puseram fim à primeira fase da revista paulista e
19
Como comprovação podemos citar trechos da carta de Antônio de Alcântara Machado a Tristão de
Athayde, na qual ele diz que a função de Raul Bopp como secretário da primeira “dentição” da Revista de
Antropofagia “se limitava a enviar pelo correio 70% da tiragem” (Apud SANTIAGO, 2003. P. 107); da
carta de Carlos Drummond de Andrade a Oswald de Andrade de maio de 1929 a respeito da segunda
“dentição” da Revista de Antropofagia – “estou ciente da revista, que leio sempre no ‘Diário de São
Paulo’ (a propósito: obrigado pela remessa do jornal, que só posso atribuir a V.)” (Apud DORNAS
FILHO, 1959. P. 88.); e da carta de Ascenso Ferreira a Achilles Vivacqua, datada de 5 de dezembro de
1929, na qual aquele reclama com este que não tem recebido “o Estado de Minas, nem Leite Crioulo, nem
Montanha [revista modernista de Ubá], nem nada” e atribui tal fato à desorganização dos Correios – na
verdade, leite criôlo havia publicado sua última edição em 29 de setembro daquele ano (Carta de Ascenso
Ferreira a Achilles Vivacqua (5/12/1929). Série correspondência. Caixa 1 [Classificação provisória].
Fundo Achilles Vivacqua. Acervo de Escritores Mineiros, UFMG). A remessa de publicações como a
segunda “dentição” da Revista de Antropofagia e leite criôlo, publicados em jornais comerciais de
circulação local, para integrantes da rede modernista nacional de outros estados demonstra a relativa
continuidade das formas de circulação em relação às revistas modernistas avulsas, nestes casos somada à
circulação normal daqueles diários.
20
Os arquivos pessoais de escritores modernistas, como aquele de Achilles Vivacqua depositado
atualmente no Acervo de Escritores Mineiros da UFMG, muitas vezes incluem este tipo de material nos
seus acervos.
18
Paradoxalmente, é neste momento que as articulações da rede quase chegam a ser
nomeadas enquanto tal por seus próprios integrantes: na segunda “dentição” da Revista
Grande até o Pará”22. Nestes textos não se trata da geografia da rede modernista, mas da
geografia de uma facção desta, dado o conflito que a segunda encarnação da publicação
modernismo de então. Mas, como veremos em maior minúcia no próximo capítulo, tal
facção não possui a solidez de que se arroga: o grupo de leite criôlo, descrito na
publicação paulista como “clube de antropofagia de Minas Gerais”, não pode ser
diversos suas experiências décadas depois dos eventos. É o caso das notas
republicado na Revista da Academia Mineira de Letras, Vol. XXI, de 1959 como parte
das suas Notas para a história da literatura mineira, o texto originalmente intitulado
21
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Segunda Dentição Nº 10, 12 de junho de 1929.
22
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Segunda Dentição Nº 13, 4 de julho de 1929.
19
antropofagia e seu diretor. No final da carta Drummond afirma que João Dornas Filho
citado na íntegra:
devorar também seus próprios pagés, com o agravante deles nunca terem se disposto a
talvez tenha levado a uma relativa retirada dos seus diretores do campo literário
nome desconhecido, apesar do zelo para com a sua memória por parte de sua irmã
Eunice.
sentido, a memória coletiva produzida pela própria geração modernista: uma das razões
de autores importantes e suas respectivas obras, sendo de certa forma uma história de
heróis. Tendo sido o suplemento uma espécie de flerte com a literatura para a maior
parte de seus colaboradores, a escassez de sua fortuna crítica é, dentro desse quadro,
23
DORNAS FILHO, 1959. P. 89
20
previsível. Tal perspectiva, natural na avaliação das realizações estéticas do movimento
modernista, aparece como uma espécie de sombra mesmo nos trabalhos que pretendem
e/ou sociais. Assim, o conjunto da produção sobre leite criôlo e o grupo responsável
pela sua publicação é bastante escasso, se comparado ao número de trabalhos que tem
por foco principal o periódico A Revista e seu grupo, que incluía aquele é hoje
Drummond de Andrade.
Um primeiro trabalho de cunho acadêmico que tem em leite criôlo um dos seus
mesma geração que vão à capital para estudar, trabalhando como jornalistas e
grupo mais antigo de modernistas mineiros que publicava A Revista (Drummond, João
Alphonsus, Abgar Renault e outros), mas cita também o grupo de leite criôlo. Apesar de
todo seu interesse, a análise peca por sua benevolência anacrônica para com os autores
analisados, atribuindo um caráter progressista (no sentido dos anos 60, a tese data de
1968) aos protagonistas que não resiste a um confronto com as fontes. Ser moderno na
1960.
Na década de 1980 foram publicados dois livros nos quais leite criôlo constitui um
21
Sérgio Bueno e Poesia negra no modernismo brasileiro de Benedita Gouveia
como o estudo mais aprofundado de leite criôlo que se encontra em forma de livro, o de
O livro de Antônio Sergio Bueno constitui até hoje o único estudo que tentou
discurso a respeito da “salvação” do negro, que havia passado em branco para Dias
foi relegado leite criôlo e reconhecer sua importância24, Bueno se deixa levar por certas
características pitorescas da publicação e acaba por exagerar nas tintas com as quais
certa forma o distingue, mas é preciso lembrar que leite criôlo foi, em muitos sentidos,
um periódico modernista normal. Não é possível estabelecer uma oposição entre ele e o
resto do modernismo mineiro. Pode-se pensar mesmo que o que para nós hoje é
escrachado. Não há por que pensar que quando A Revista fala, de acordo com o bom
24
“Surpreende-nos o esquecimento a que foi relegado o Leite Criôlo, porque creditamos a esses textos
uma importância singular para o Modernismo de Minas Gerais. Propomo-nos a iniciar a tarefa imediata
de reler e difundir esse material”. BUENO, 1982. Pg. 101
22
tom que prevalece nela, em “humanizar o Brasil” não possa estar dizendo o mesmo que
Um dos estudos mais recentes a ter em leite criôlo um foco de análise é o livro
Bueno, Helena coloca como pólos opostos leite criôlo e A Revista, vinculando o
rede modernista nacional, não conseguimos entrever o caráter paroquial que, para
Revista, percebido como cosmopolitismo pela autora, talvez caracterize mais certamente
25
DAMASCENO,1988, P. 57-58. Discutimos e rejeitamos tal hipótese na comunicação “Entre Sujeito e
Objeto: Representações do negro no suplemento modernista leite criôlo”, apresentada na SEVFALE 2006
, a partir de uma comparação entre leite criôlo e as publicações da imprensa negra paulista.
26
BOMENY , 1994.
23
uma concessão ao passadismo provinciano do momento do que uma visão modernista
mais ambiciosa, já que parte importante dos colaboradores locais são “passadistas”
convictos, o que se pode afirmar não apenas pela leitura dos textos, como pelo
testemunho de Pedro Nava27 e pela recomendação dada por Mário de Andrade em carta
a Carlos Drummond: “Façam uma revista como A Revista, botem o modernismo bonito
inimigo preferencial eleito pelo modernismo brasileiro, sempre defendeu a Beleza como
um ideal transcendente e universal. Por outro lado, a temática local e regional, que
caracteriza muitos textos de leite criôlo, não nos parece um indício de um “isolamento
modernista, tendência que, aliás, se torna dominante na década seguinte com o romance
social nordestino. Assim, vincular a publicação de João Dornas Filho ao lado rural e
predominantes nas duas publicações e a sua origem social, expressa nos termos
ambas as revistas tinham sua origem nas famílias importantes das pequenas cidades
mineiras – por exemplo, Dornas vinha de Itaúna e Drummond, como se sabe, de Itabira
O presente trabalho tem por objeto não o que distingue leite criôlo – em que
27
“A Revista... fez questão de abrir suas colunas à colaboração conservadora de Magalhães Drummond,
Alberto Deodato, Iago Pimentel, Godofredo Rangel, Pereira da Silva, Wellington Brandão, Orozimbo
Nonato, Carlos Góis e Juscelino Barbosa” (Apud. BUENO, 1982. Pg. 36).
28
Apud BUENO, 1982. Pg. 35. Carlos Drummond de Andrade também comenta, em texto de 1952, que
“A conselho de Mário de Andrade, também porque impossível fazer de outro modo, insinuávamos nela
[em A Revista] a pimenta modernista no chôcho trivial da literatura acadêmica da época” (Apud. DIAS,
1968. P. 20).
24
forma como a publicação e o grupo responsável por ela se inserem na rede modernista
nacional. Tal opção se dá na medida em que sem a análise da interação entre o “órgão
em leite criôlo, por exemplo – uma das características mais peculiares e interessantes do
isso, no presente mapeamento várias das questões que leite criôlo suscita não serão
compreensão tanto das suas peculiaridades quanto das características que dividem com
como fontes primárias as principais publicações com as quais o grupo se vincula, além
(número XVI, 18o suplemento), com exceção do referente a 23/6/1929 (número IV) que
29
Como a coleção da Hemeroteca Estadual Assis Chateaubriand do jornal Estado de Minas se inicia em
1930, não foi possível localizar aquela edição.
25
de crítica literária do modernista João Alphonsus, que divergia da orientação de leite
criôlo.
Ilustrada (14 edições No. 17, 20, 66, 82-87, 89-91 do período 1927 a 1929) e Cidade
Vergel (2 edições: maio e junho de 1927). A Revista foi analisada por ser a principal
publicação modernista de Belo Horizonte, antes de leite criôlo, realizada por um grupo
contribuições dos editores de leite criôlo e referências ao seu grupo. Semana Ilustrada e
profissional nos cargos de redação exercidos por Achilles Vivacqua, João Dornas Filho
e Diterot Coelho Neto em revistas ilustradas mundanas, que os colocava quase sempre
26
A utilização das correspondências como fonte apresentou certas dificuldades, já
que não foi possível o acesso aos arquivos pessoais de um dos diretores de leite criôlo,
consulta ao fundo João Dornas Filho do Arquivo Público Mineiro foi decepcionante,
pois ali não se encontra nenhuma correspondência relacionada com os temas aqui
de fora de Belo Horizonte, em um arco que vai de Curitiba até Belém, o que implicaria
27
na medida em que materializam tomadas de posição temáticas e formais em relação à
28
2. Cavando um lugar de modernista: a trajetória do grupo de
leite criôlo e de sua publicação no âmbito da rede modernista
nacional.
Aderir:
erro perigoso
Eu nunca aderi:
sempre fui.
(...)
29
Neste capítulo serão mapeadas as interações entre o grupo de escritores
responsável por leite criôlo e o que definimos como a rede modernista brasileira. A
dimensão das tomadas de posição literárias explícitas – aquilo que poderia ser
denominado como “política literária” ou, para usar a expressão de Fernando Correa
Dias, trajetória exterior30 – será aqui o foco principal: as tomadas de posição que se
mais adiante – servem de pontos de referência para as múltiplas tomadas de posição que
expressão “aderir”, que no poema citado se refere à dignidade e à abertura que implica
do inimigo de serem nada mais que formas de mascarar seus interesses é uma das mais
30
DIAS, 1968. P. 93
30
Quanto à forma, nossa análise se estruturará em termos de narrativa, assinalando
documentação cede por vezes lugar à ordem lógica da argumentação. Tal opção pela
incompreensíveis. Acreditamos ser este o caso da análise de Antônio Sérgio Bueno das
relações entre leite criôlo e a Revista de Antropofagia – posto que este autor, ao tentar
alternadamente como vinculadas ou como opostas, acaba por não encontrar uma solução
uma resposta à mesma indagação básica a partir da análise da trajetória das adesões e
modernista nacional.
do movimento modernista nos anos 1920 precisa partir da tomada de posição que
31
Cf. BUENO, 1982. P. 167-177
31
dos escritores modernistas mais estabelecidos, cimentando a mútua vinculação literária,
escritor. Outro ponto a ser considerado é que muitos dos que aderiam ao modernismo já
construir uma nova persona literária por oposição à anterior: foi o caso de Jorge de
Lima, que havia sido coroado “príncipe dos poetas” de Alagoas graças à fama de seu
soneto “Acendedor de lampiões” 32, e também de dois dos diretores de leite criôlo, cuja
utilizadas pelos novatos que se lançavam como escritores no âmbito do modernismo dos
anos 1920 é uma reconstrução a posteriori. O que a análise revela na dimensão objetiva
maioria das vezes desconhecidas: como saber, por exemplo, a qual das “figuras centrais
Aranha pudesse parecer mais central e promissor do que o grupo paulista que seria
veremos adiante, leite criôlo se defrontou em 1929 com a necessidade de optar entre as
32
Como lembravam sempre os críticos “passadistas” ao rejeitar sua conversão ao modernismo Cf.
SANT´ANA, 1978. P. 32 e 53
32
Assim, cabe à descrição detalhada do caso em questão restituir a textura complexa do
Andrade, João Alphonsus, Emílio Moura, Martins de Almeida, Pedro Nava, Abgard
Renaut e outros – havia sido responsável pela publicação das três edições de A revista
destes a Minas Gerais em 1924. Como mostra Maria Zilda Cury, alguns deles já se
interessavam por literatura moderna antes desta data33. O grupo de leite criôlo, por sua
vez, demoraria um pouco mais a aderir ao modernismo: tanto Vivacqua quanto João
da sua “conversão” definitiva. Para eles – assim como para o terceiro diretor de leite
criôlo, Guilhermino César, que era seis anos mais novo que Dornas e cuja estréia
literária já se deu no âmbito do modernismo34 – o ano chave para suas atuações como
redator das revistas de variedades Cidade Vergel em 1927 e Semana Ilustrada de 1927 a
33
Cf. CURY, 1998. P. 74-84
34
Dornas nasceu em 1902 na cidade de Itaúna, tinha, portanto, a mesma idade que Drummond, já
Guilhermino havia nascido em Cataguases no ano de 1908. Cf. DIAS, 1968. P. 12
35
WERNECK, 1992. P. 13-30
33
1929. Dornas também colaborou com a segunda publicação, tornando-se um dos
estudantes universitários – naqueles tempos vindo estritamente das camadas mais altas
da sociedade. Uma das seções de Semana Ilustrada, por exemplo, encenava o famoso
Semana”.
“boa sociedade” belorizontina de então. Mais certo é que a presença da literatura nessas
João Alphonsus. Semana Ilustrada parece ter sido um empreendimento mais viável
comercialmente38 e a linha literária dos textos ali publicados era, com raras exceções,
36
Cf. Idem P. 44 e VIVACQUA, 1997. P. 38
37
LINHARES, 1995. P. 203
38
Os exemplares de Semana Ilustrada são salpicados de anúncios, além disto, na página de expediente
estão relacionados os preços dos variados formatos de propaganda disponíveis aos anunciantes da revista.
Tais fatos talvez corroborem a hipótese de que a publicação possuía um grau de organização do ponto de
vista comercial incomum em face do amadorismo da imprensa belorizontina de então.
34
mais estritamente “passadista”. Surgida em 1927, alcançou em maio de 1929 sua edição
de número 91. Sua periodicidade semanal foi observada com uma regularidade que o
em 1927, João Dornas Filho publica um soneto, intitulado “A creação”, nas páginas da
aparece um poema moderno de Dornas, sem rimas e de métrica livre, chamado “O moço
que andava nos cavalinhos de pau”. Logo apareceria também nas páginas da edição de
moderno seu. Intitulado “Meus oito annos”, o poema em verso livre justapunha a
então. Temáticas e procedimentos que também farão sua aparição em leite criôlo, como
Durante os anos de 1928 e 1929, João Dornas Filho continua a publicar textos
entanto, de contos sem maiores ousadias formais, cuja temática às vezes pode ser
prosa não havia neste momento uma contraposição tão rigorosa entre “passadismo” e
39
Idem. P. 248.
40
Recorte da Semana Ilustrada datado a caneta “Ano 1 Nº 32 Janeiro de 1928”. Série fortuna crítica.
Caixa2 (Classificação provisória). Fundo Achilles Vivacqua. Acervo de Escritores Mineiros, UFMG
35
modernismo quanto na poesia. Mas, se em Semana Ilustrada nada se publicou da
versos “Do Flirt, do Footing, da Semana” de 2 de março de 1929 tinha por um dos
Dornas é a seguinte:
(...)
E o João Dornas, rapaz intelligente
Abraçar essa asneira [o modernismo] de repente...
Um jornal do Governo-futurista!
De fato não ha mesmo quem resista
como diriam, com o “futurismo” – em Belo Horizonte ser o jornal do PRM, eterno
41
A revista Semana Ilustrada chegou a publicar alguns poemas modernos. Na edição de Nº 34 de 21 de
janeiro de 1928, por exemplo, apareceram sob a rubrica “Modernistas” os poemas “Os meus versos
impressionistas...” de Odilon Negrão e “O bailado da lua” de Evagrio Rodrigues. Mas ambos poderiam
ser definidos como “modernistas” apenas na medida em que não apresentam métrica fixa e rimas, aliás,
parcialmente presentes no segundo. Aspectos estilísticos do modernismo de então como, por exemplo, a
coloquialidade, a ortografia fonética, a justaposição de imagens e a temática nacional não aparecem
nestes poemas e talvez tal fato seja um indício de que a produção poética mais ostensivamente modernista
não encontraria lugar na revista.
42
SEMANA ILUSTRADA, Nº 81. 2/3/1929
36
no estado e a adesão de Dornas é considerada uma conversão repentina. A partir de tais
elementos é que a crônica argumenta, a título de piada, que a adesão de Dornas é um ato
tempos de eleição, a ser jocosamente imitado pelo eu-lírico da sátira: uma brincadeira
na qual sobressai uma ponta de ressentimento da parte dos escritores “passadistas” que
na Semana Ilustrada em 1927 até a menção de seu nome como líder da “parte boa” do
dos anos 1920 – em 1929 se passaram aproximadamente dois anos. Tal fato não
publicação dirigida por Dornas, Aquiles Vivacqua e Guilhermino César. Uma crítica
Itaúna como “o João Dornas Filho, dos contos passadistas, longos como os versos
kilometricos de Murilo Araújo”, estranhando que ele e os outros dois diretores estivem
carnaval” 44.
43
A postura política oportunista ou “adesista” será também alvo de sátiras publicadas em leite criôlo,
como veremos no próximo capítulo.
44
FOLHA DA NOITE, 11/5/1929
37
de Alcântara, Laranja da China], não gostou por que era “o livro de um
principiante”.
Serenidade era o nome da plaqueta com seis poemas que Aquiles publicou,
do livro pela rede modernista nacional e por outros setores da crítica. As vinte e quatro
cartas agradecendo e/ou comentando o envio deste livro, encontradas no arquivo pessoal
(Plínio Motta, da Academia Mineira de Letras; Renato Travassos e Carlos Lomba que
se declaram avessos ao modernismo nas suas cartas). É interessante notar que, antes da
quais nos temos referido e também em outros veículos, vários contos e crônicas
passadistas dos quais são exemplos a prosa simbolista de “O Lindo Poema” 45 e o conto
“Dôr”, este último assinado com o pseudônimo Roberto Theodoro46. Com o mesmo
nestes textos de crítica literária não transparecem maiores sinais de adesão modernista.
45
CIDADE VERGEL, Nº 2. Junho 1927
46
SEMANA ILUSTRADA, Nº 29. 17/12/1927
38
corrente moderna que tanta preocupa a nova geração” – em uma resenha elogiosa de um
Neste contexto não é de se estranhar que Cyro dos Anjos, cuja adesão ao
modernismo também foi relativamente tardia48, tenha escrito em uma resenha do livro
publicada em Semana Ilustrada que “o autor de Serenidade devia (...) ser advertido que
seu espirito não se molda, muito bem, á nova escola [literária] em o que está, aliás, de
Talvez esta última citação faça referência à convivência de Aquiles Vivacqua com
outros estudantes universitários na Belo Horizonte de então, Vivacqua morava com seus
para a recente capital mineira esperando que os “afamados ares” desta cidade
47
CIDADE VERGEL, Nº 2. Junho 1927. O livro
48
Cf. WERNECK, 1992. P. 79-80 Cyro dos Anjos publicaria depois textos modernistas em leite criôlo.
49
SEMANA ILUSTRADA, Nº 37. 11/2/1928
50
Pelo que podemos levantar não se tratava propriamente de um salão literário, como o que era mantido
por Olívia Penteado no mesmo período em São Paulo, mas um espaço no qual era realizados saraus e
“assustados” (festas dançantes mais ou menos improvisadas) que foi apelidado de salão por seus
freqüentadores. Pode-se talvez arriscar que o salão artístico propriamente dito (organizado pela dona da
casa e tendo por convidados artistas de certo renome) está para tais saraus literários (organizado e
freqüentado por amigos do filho da casa) da mesma forma que a família Penteado (alta burguesia cafeeira
paulistana) está para a família Vivacqua (proprietários de armazém de secos e molhados de classe média
alta de origem capixaba residindo em BH). Cf. VIVACQUA, 1997. P. 42-43.
39
“assustados” nos quais se faziam presentes também as mais velhas dentre as irmãs do
Drummond de Andrade, Abgar Renault, Pedro Nava, Milton Campos) quanto pelo
círculo “passadista” ligado a Semana Ilustrada (além dos irmãos responsáveis pela
dos outros futuros co-diretores de leite criôlo, João Dornas e Guilhermino César52. A se
literária ao movimento53.
literários – as reações por parte da crítica ao seu livro variaram consideravelmente entre
texto de Cyro dos Anjos ao qual já nos referimos54. Mas, como já prevenia uma resenha
consorcio del viejo lirismo con la poesia moderna, que tal vez no agrade a los
51
Cf, por exemplo, DIAS, 1968. P. 67-71 e WERNECK, 1992. P. 35-38
52
VIVACQUA, 1997. P. 30-42
53
Idem. P. 36. O principal problema desta datação – proposta não pela autora, mas pela filha de Baptista
Santiago em carta citada no livro – é remontar os encontros a um período anterior ao estabelecimento da
primeira leva de modernistas de Belo Horizonte, que data de não muito antes de 1924. Para nós, uma
datação mais verossímil seria algo como 1925-1927, o que, no entanto, não invalida nosso argumento
apresentado no corpo do texto.
54
Carta de Renato Travassos a Achilles Vivacqua (2/4/1928), Carta de Carlos Lomba a Achilles
Vivacqua (26/5/1928), Cartão de Plínio Motta a Achilles Vivacqua (sem data). Série correspondência.
Caixa 1 (Classificação provisória). Fundo Achilles Vivacqua. Acervo de Escritores Mineiros, UFMG
40
modernistas denámicos, auto-parlante aeroplánicos”55 . E, de fato, figuras mais centrais
com o livro de Vivacqua. Blaise Cendras, Paulo Prado e Manuel Bandeira enviaram
para Vivacqua notas lacônicas agradecendo o envio do livro, no caso dos dois últimos
aparecida no jornal Folha da Noite, já citada anteriormente, mas, em carta para Achilles
Você tossiu Serenidade. Ficou assim liberto de algumas tantas antigualhas que
lhe enfeiavam [sic] a poesia. Estou certo disso. E estou porque conheço o seu
excelente [poema] Samba. Para você cantar Samba foi preciso primeiro pôr fora
Serenidade. (...) Tenho fé no poeta do [sic] Samba.”58
A recepção não muito favorável do livro nos meios mais estritamente modernistas
publicada na revista Verde de Cataguases pelo escritor Rosário Fusco. Vale a pena
transcrever na integra:
Os versos são do principio da vida literária do poeta e quasi que a gente já conhecia
todos.
Um punhado de críticos (?) [sic] escreveram sobre uma tal [sic] de influências
flagrantes de que se resente encharcado (dizem êles) o livrinho Serenidade. Graças a
Deus não entendo de crítica, nem críticos – e não dou valor nenhum mesmo pra
alguns deles. Porisso [sic] é quêu [sic] acho que falar em influencias é bobagem.
Esplicar [sic] porquê seria cansar.
Achilles Vivacqua (Roberto Theodoro) é o mesmíssimo que escreveu aqueles
bonitissimos versos de Samba que esta revistinha de vocês publicou no seu numero
55
Recorte do jornal El Heraldo de Goes, “Montevideo, Abril 27 de 1929”, colado no Álbum de Achilles
Vivacqua, P. 62. Série Álbum de Achilles Vivacqua. Caixa 1 (Classificação provisória). Fundo Achilles
Vivacqua. Acervo de Escritores Mineiros, UFMG.
56
Cf. MORAES, 1978. P. 49-105
57
Carta de Blaise Cendras a Achilles Vivacqua (25/2/1928), Cartão de Manuel Bandeira a Achilles
Vivacqua (1928), Cartão de Paulo Prado a Achilles Vivacqua (sem data). Série correspondência. Caixa 1
(Classificação provisória). Fundo Achilles Vivacqua. Acervo de Escritores Mineiros, UFMG.
58
Carta de Antônio Alcântara Machado a Achilles Vivacqua (8/2/1928). Série correspondência. Caixa 1
(Classificação provisória). Fundo Achilles Vivacqua. Acervo de Escritores Mineiros, UFMG.
41
de estréa. Pra mim este poeminho só marcou bem Achilles Vivacqua enchendo a
gente de confiança bastante pras suas coisas futuras.
Por emquanto já se pode falar que Serenidade é um livro de POETA. Mais, [sic]
59
acho que o Achilles não deseja não .
vida literária”, implicando certo descrédito pela produção anterior de Vivacqua. Segue
porém, que o mesmo seja efetivamente original. O próximo parágrafo elogia um poema
POETA” constitui um clichê dos elogios da crítica “passadista”, Fusco poderia estar
sugerindo que, para o próprio Vivacqua, mais valeria uma resenha esquiva e ambígua
É preciso lembrar que a resenha de Rosário Fusco deve ser considerada simpática
escrever, por vezes, críticas extremamente cáusticas sobre figuras bastante centrais da
amizade de Vivaqua com o terceiro dos diretores de leite criôlo, Guilhermino César.
havia se mudado, em 1926, para Belo Horizonte com o fim de ingressar na Faculdade
59
VERDE Nº 5 Abril de 1928. P.9
60
Cf., por exemplo, os reparos enfáticos que Fusco, então um estudante de 17 anos de idade, põe nas suas
resenhas de modernistas importantes daquele momento como Sérgio Milliet (VERDE Nº 2 Outubro de
1927 P. 26) e Cassiano Ricardo (VERDE Nº 5 Abril de 1928. P.9).
42
de Direito61. É provável que naquele momento ele e Ascânio Lopes, que residia na
modernistas belorizontinos, tanto aqueles que haviam sido responsáveis pela publicação
nossa análise, Aquiles Vivacqua e João Dornas Filho. O fato é que o primeiro poema de
por introduzir os estreantes de Verde, assim como os futuros diretores de leite criôlo,
revista pôde contar com a colaboração de alguns dos principais nomes do movimento,
àquela altura, sediados no Rio de Janeiro e em São Paulo. E “Samba”, publicado sob o
pseudônimo Roberto Theodoro que Aquiles também usava para a sua produção
passadista, era um poema que não ficava a dever nada em termos de “modernidade” à
da página e tinham por temática o tipo de cultura original e “primitiva”, no caso a dança
61
CESAR, 1978. P. s/n
62
Idem
63
O poema foi publicado novamente nas páginas de leite criôlo e será retomado nas análises do próximo
capítulo. Cf. VERDE Nº 1 Setembro de 1927. P. 26
64
VERDE Nº 2 Outobro de 1927. P.14
43
Dos futuros diretores de leite criôlo, Guilhermino César foi o que mais publicou
nas seis edições da publicação de Cataguases. Foram ao todo quatro poemas, duas
revista: mesmo morando em Belo Horizonte ele fazia parte do grupo modernista de
Cataguases. Ao que tudo indica sua estréia literária já se fez em águas modernistas e –
Francisco Inácio Peixoto, no ano de 1928 – Guilhermino tinha apenas 20 anos de idade.
Em suma, aplicar-se-ia também a ele a desarticulada frase telegráfica com que se auto-
qualificou seu parceiro de livro, “nacido [sic] e criado dentro modernismo” 66.
de leite criôlo Wellington Brandão. Não sendo um dos diretores, Brandão era, no
entanto, uma das suas vozes mais distintivas da publicação e só ficava a dever a eles no
Florêncio. Nascido em 1894, era 12 anos mais velho que Guilhermino e é descrito na
enquête literária realizada pelo Diario de Minas nos primeiros meses de 1929 – enquête
que será mais à frente analisada com maior detalhamento – como um advogado e
industrial que residindo na cidade de Passos, “fez mais pelo modernismo do que muitos
vanguardistas das capitaes”67. Em 1927, ela já havia publicado quatro livros, sendo dois
contos68. Este último, datado de 1926, chegou a ser resenhado em Verde por Ascânio
Lopes e, descontado o estilo mais sóbrio de Ascânio, o julgamento emitido era bastante
65
Poemas: “Noturno” (VERDE Nº1, 9/1927), “Crônica Quase Policial da Barroca” (VERDE
Nº4,12/1927), “Balada do Arco-Íris da Gente”, “Tio Santana”, (VERDE Nº5, 1/1928-4/1928). Resenhas:
“Baianinha e Outras Mulheres”, “Arraiada Mineira” (Nº 5, 1-4/1928). Conto: “Santinha da Encarnação”
(VERDE Nº1, 9/1927)
66
VERDE Nº 4 Dezembro de 1927. P. 13
67
DIARIO DE MINAS, 14 de fevereiro de 1929.
68
Cf. http://pt.wikipedia.org/wiki/Usu%C3%A1rio:Lucasbrandaoarouca. Acesso 2 de abril de 2008.
44
Wellington Brandão não era um livro inteiramente desprovido de qualidades, no
entanto, as qualidades de seu autor deveriam ser avaliadas, assim como as de Vivacqua
na resenha de Fusco, por sua produção mais recente, em especial pelo “ingenuo
Alceu Amoroso Lima), a facção paulista do modernismo liderada por Mário de Andrade
revista Festa, que cultivava um nacionalismo distinto daquele do grupo paulista, era
renovação católica liderado por Jackson de Figueiredo.70 Wellington Brandão, que antes
estava publicando àquela altura na revista carioca, pela qual os “verdes” não possuíam
influência oswaldiana que continuaria a ser publicada em leite criôlo74 – Ascânio opta
por elogiar apenas a faceta do escritor mais próxima da orientação do grupo de Verde,
69
VERDE Nº 3 Novembro de 1927. P. 25
70
Cf, GOMES, 1999. P. 69-70.
71
“O Poema Maior” em A REVISTA Nº 2 Agosto de 1925. P. 34-35. Como já se mencionou, A Revista é
uma publicação na qual eram publicados também textos de escritores “passadistas”. Quando
mencionamos aqui o grupo desta revista nos referimos aos modernistas já citados responsáveis pela sua
publicação. Sobre “passadismo” e modernismo em A Revista cf. DIAS, 1968. P. 18-20 e BUENO, 1982.
P. 35-73.
72
Cf. a resenha do lançamento do terceiro número de Festa em VERDE Nº 4 Dezembro de 1927. P. 13
73
Apud DOYLE, 1977. P. 103-109.
74
Na mesma edição em que aparece a resenha de Ascânio, foram publicados cinco poemas dos “Cantos
Municipais”. Cf. VERDE Nº 3 Novembro de 1927. P. 13
45
faceta que se tornaria uma verdadeira persona literária ao se vincular, nas publicações
Temos por estabelecido, então, que as figuras chaves de leite criôlo haviam todos
diretores de leite criôlo e da própria publicação na rede modernista nacional passa pela
da qual foram publicadas dez edições entre maio de 1928 e fevereiro de 1929. Foi esta a
terceira revista literária do modernismo sediada em São Paulo: fora antecedida por
Klaxon (nove números entre maio de 1922 e janeiro de 1923) e Terra Rocha e outras
“antropofagia” não era a ainda o ideário radical e razoavelmente bem definido que
75
Para as polêmicas envolvendo o primeiro manifesto de Oswald ver MORAES, 1978. P. 83-103
76
Informações extraídas de uma carta de Antônio de Alcântara Machado a Alceu Amoroso Lima (Tristão
de Athayde), apud SANTIAGO, 2003 P. 105-109. Segundo a carta, Oswald viajou para a Europa logo
que após o aparecimento da primeira edição da Revista de Antropofagia. Esta seria, segundo Alcântara,
“intelectualmente (...) o produto do meu esforço e só do meu esforço”. E completava: “A função do Bopp
se limitava a enviar pelo correio 70% da tiragem”. Idem, P. 107
46
“segunda dentição”, a cargo do próprio Oswald e de seus colaboradores mais próximos,
principalmente uma metáfora recorrente à disposição das mais variadas intenções dos
manifesto da publicação:
colaboradores dos mais variados. Tirando o diretor e o gerente, não se pode falar
Nesta publicação, que pode ser descrita como o auge da rede nacional modernista,
77
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 1, Maio de 1928. P. 8
78
O “verde-amarelismo” era uma das correntes modernistas do momento. Pregava um nacionalismo um
pouco distinto da proposto por Oswald de Andrade e Mário de Andrade. Cf. MORAES, 1978 P. 113-135.
47
Vivacqua saíram os poemas “Indifferença”, dedicado a Oswald de Andrade e
e também uma resenha sobre seu livro conjunto com Francisco Inácio Peixoto, Meia-
que como já vimos, parece ter sido bastante impiedoso com o livro de estréia de
somente umas poucas e brandas ressalvas82. João Dornas Filho, por sua vez, se fez
antecipa alguns dos principais temas e referências que se farão presentes em leite
criôlo83.
Grande parte dos futuros colaboradores de leite criôlo de fora de Belo Horizonte
79
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 3, Julho de 1928. P. 2
80
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 10, Fevereiro de 1928. P. 5
81
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 5, Setembro de 1928. P. 2
82
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 10, Fevereiro de 1928. P. 4
83
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 10, Fevereiro de 1929. P. 2
48
Fortaleza, Ceará; além de vários integrantes do grupo dos Verdes de Cataguases84. O
depois em leite criôlo com poemas da série “Ai, seu Mé”, iniciada na Revista de
Antropofagia, a seção “Brasiliana” era constituída por trechos citados, em geral a partir
procedimento já utilizado por Oswald de Andrade em seu livro Pau Brasil em relação a
origem das citações fosse um pouco diferente daquele da publicação paulista, como
passaria em branco para o futuro grupo de leite criôlo seria a resenha de Antonio de
Alcântara Machado do livro Poemas e Essa negra Fulô do poeta alagoano Jorge de
Lima. Nela o poema “Essa negra fulô”, de grande repercussão nos meios modernistas
84
Alguns dos nomes citados já estavam em contanto epistolar com Achilles Vivacqua antes do
aparecimento de leite criôlo, como Marques Rebello e Franklin Nascimento, que haviam ambos recebido
cópias de “Serenidade”.
49
das resenhas de Alcântara Machado, em especial em se tratando de autor recém estreado
através do açoite – tenha inspirado o grupo mineiro a conceber a temática “negra” como
Aquiles Vivacqua já havia trabalhado com uma temática deste tipo em “Samba”.
Também Guilhermino César produzia poemas nessa linha, do que são exemplos os
resposta à já mencionada enquête literária realizada pelo Diario de Minas em 1929, João
Dornas Filho sintetiza o pano de fundo sobre o qual se dará opção pela temática “negra”
No mesmo texto ao enumerar as figuras que, na sua opinião, mais haviam feito no
Ascenso Ferreira que, como Jorge de Lima, era um poeta nordestino, no caso
pernambucano, que em 1928 havia publicado um poema e uma carta aberta na Revista
85
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 1, Maio de 1928. P. 4
86
VERDE Nº5, 1/1928-4/1928
87
DIARIO DE MINAS, 3 de fevereiro de 1929
50
de Antropofagia88. Dornas deixa claro, porém, que os escritores citados “fizeram muito
Evento controverso e obscuro para o qual podem ter concorrido divergências tanto
maneira de conceber a nacionalidade que haviam levado Mário a rejeitar ainda em 1924
na primeira página da edição de número sete foi publicado em letras garrafais o seguinte
88
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 4, Agosto de 1928, P. 1 (“A sucessão de São Pedro”) e Nº 6,
Outubro de 1928, P. 5 (“Carta a Órris Barbosa”).
89
MORAES, 1978. P. 91-92.
90
MICELI, 2001. P. 254.
91
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 7, Novembro de 1928, P. 1
51
Mensagem cifrada que fora do seu contexto original parecer evocar desde uma
tentativa de retratação até uma intenção provocadora. Mas certamente indica algum
abalo na relação entre os dois “Andrades” do modernismo. Mário, por sua vez,
canibalismo mágico-ritual92. Talvez o texto possa ser compreendido como uma resposta
O fato é que, depois daquela última edição da primeira fase datada de fevereiro de
1929, ressurgiria nas páginas do Diário de São Paulo, em 17 de março do mesmo ano,
uma Revista de Antropofagia muito diferente da que fora publicada até então. Em carta
Tristão de Athayde –, Antônio de Alcântara Machado, depois de dizer que antes dos
92
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 10, Fevereiro de 1929, P. 5
93
MORAES, 1978. P. 91-94
52
o Antropófago. Na Agência Brasileira, na presença do Sérgio [Buarque
de Holanda] e do [Américo] Facó, eu concordei. No dia seguinte o Bopp
comunica ao Rubens que eu me desinteressava da revista mas que ele,
Oswald de Andrade e Osvaldo Costa se incumbiriam de sua publicação
no jornal.
Quando aí no Rio tive conhecimento da nova fase da [sic] Antropófago
fiquei surpreso mas pouco me incomodei. Percebi logo que era uma
safadeza e calei-me. O Rubens me conta a história que o Mário [de
Andrade], o Couto de Barros e o Paulo Prado confirmaram. Aos três
últimos o Oswald havia declarado que eu autorizei a publicação da
revista no Diário e concordara com a minha saída e a indicação de um
novo diretor, o irresponsável mulato Geraldo Ferraz. 94
através de uma carta deste enviada a Carlos Drummond de Andrade, datada, segundo
primeira dentição, para o segundo plano. Dela constaria uma seção intitulada
não afinadas com o ideal antropofágico. Função também cumprida por inúmeras notas
94
Apud SANTIAGO, 2003. P. 107. No livro citado, a carta vem datada de 15 de maio de 1930, o que
parece erro, posto que no texto a referências de acontecimentos de 1929, como sendo “deste ano” (“Em
fevereiro deste ano segui para aí deixando dois números prontos sendo que um deles já na tipografia: o
número de fevereiro que saiu”). Em todo caso, a data publicada não invalida nossa linha de
argumentação.
95
Apud DOYLE, 1976. P. 140.
53
menores, nas quais o incomparável talento de Oswald para o trocadilho era utilizado
– levou, nas palavras de Aracy Amaral, a uma “torrente de rompimentos”: alguns dos
amigos e colaboradores mais próximos de Oswald romperam relações com ele. Além
dos já citados Mário de Andrade e Antônio de Alcântara Machado, foi o caso de Yan de
qual Alcântara Machado propõe adicionar uma “conjuração do silêncio”, implica que na
está descartada e a dos modernistas menos ilustres é muito bem vinda. Além das
modernistas nordestinos que são, com poucas exceções (como Jorge de Lima), nomes
do grupo antropófago para conseguir a adesão daqueles que eram então considerados
96
Cf. AMARAL, 1975. P. 264-268.
97
Apud SANTIAGO, 2003. P. 108
54
líderes do movimento moderno em Belo Horizonte, Carlos Drummond de Andrade e
João Alphonsus. A carta já citada de Oswald a Drummond pede a este que “mande
coisas” para a Revista de Antropofagia e também que “diga aos [escritores do grupo da
98
revista Verde de] Cataguases que com eles contamos” . Em decorrência da negativa
deste, outro “antropófago”, o escritor Clóvis Gusmão sediado no Rio de Janeiro, escreve
considerava um amigo pessoal – define de uma vez por todas sua rejeição à
para tanto.
98
Apud DOYLE, 1976. P. 140.
99
Apud DOYLE, 1976. P. 142.
100
Apud DORNAS FILHO, 1959. P. 88.
55
segunda dentição da Revista de Antropofagia. Cabe agora analisar como tais tensões se
A existência de leite criôlo enquanto periódico foi relativamente curta, o que não
distingue, aliás, essa publicação da maioria dos periódicos modernistas. Foram ao todo
Revista foram publicadas 3 edições (julho e agosto de 1925; janeiro de 1926) e que da
segunda dentição da Revista de Antropofagia – que tinha em comum com leite criôlo o
1/8/1929.
Quando ao grau da sua inserção na rede modernista nacional cabe mencionar que a
publicação dirigida por Dornas, Vivacqua e Guilhermino César contou ao todo com 53
incluindo um dos editores, Guilhermino César, além de Rosário Fusco, Francisco Inácio
Peixoto, Oswaldo Abrita, Ascânio Lopes (publicações póstumas) e Fonte Bôa. Existe
entre essa revista e o suplemento certa continuidade: textos publicados na Verde são
101
Não conseguimos encontrar nenhuma informação que ajude a compreender porque o jornal Estado de
Minas publicou em suas páginas o suplemento modernista leite criôlo. O jornal havia sido fundado no ano
anterior e seria comprado pelos Diários Associados de Assis Chateaubriand treze dias depois da
publicação da primeira edição do suplemento. A única conjuntura que nos foi possível é que existe uma
grande probabilidade de algum ou talvez todos os diretores de leite criôlo trabalhassem no jornal. Cf.
MENDONÇA, 1987. P. 62-64.
56
republicados em leite criôlo102, séries de poemas que começaram a ser publicadas na
Andrade que contou com contribuições de 27 autores, sendo todos eles mineiros, com
espalhados pelo país que estavam em contato com leite criôlo, em oposição à
publicou apenas sob o pseudônimo Jacob Pim-Pim – e dos mineiros Drummond e João
Alphonsus, cujas relações complexas com o grupo de leite criôlo analisaremos a seguir.
“república das letras”, pode-se observar que leite criôlo tem por interlocutores e pontos
102
O poema “Samba” de Achilles Vivacqua foi publicado sob o pseudônimo Roberto Theodoro em Verde
N˚ 1, de Set/1927, e republicado com o nome do autor em leite criôlo III, de 16/6/1929. O texto de Yan
de Almeida Prado “Arte e Artifício” foi publicado em Verde N˚ 2, de Out/1927, e republicado em leite
criôlo XIII [15˚ suplemento], de 8/9/1929. De Ascânio Lopes foram republicados postumamente dois
artigos: “A hora presente”, Verde N˚ 2 (Out/1927) e leite criôlo X [11˚ supl.] (11/8/1929); e “Paulo
Prado, Paulística e Várias Coisas”, Verde N˚ 4 (Dez/1927) e leite criôlo XIII [14˚ supl.] (1/9/1929).
103
As séries são “Poemas de Belo Horizonte” de Achilles Vivacqua , iniciada sob o pseudônimo Roberto
Theodoro em Verde N˚ 2 (Out/1927) e continuada com o nome do autor em leite criôlo VIII (21/7/1929),
e “Cantos Municipais” de Welligton Brandão, iniciada em Verde N˚ 3 (Nov/1927) e continuada, agora
com o pseudônimo Fidelis Florêncio, em leite criôlo I (2/6/1929), II (9/6/1929), V(30/6/1929) e X
(11/8/1929).
57
de leite criôlo em relação a ambos os outros grupos não se fazem presentes na sua
própria publicação: o palco da interação explícita com o outro grupo mineiro seria a
imprensa belorizontina e, com o grupo paulista, a página que esse publicava no Diário
antropofagia oswaldiana sem romper as relações com outros grupos modernistas. Além
disso, percebemos a intenção de evitar que leite criôlo se torne o que os “antropófagos”
paulistas gostariam que ela fosse, ou seja, uma subsidiária local da Revista de
Antropofagia.
realizada nos primeiros meses de 1929 no jornal Diario de Minas, cujo redator-chefe
As respostas dos escritores que pouco tempo depois lançariam leite criôlo deixam
104
A enquête já foi analisada por Fernando Correia Dias, mas em um sentido diferente do proposto aqui.
Interessava ao sociólogo mineiro a questão da dispersão do grupo modernista de Belo Horizonte que
publicou A Revista, grupo às vezes denominado a partir dos seus pontos de encontro, a Confeitaria Estrela
e a Livraria Alves. Cf. DIAS, 1968. P. 31-37.
105
DIARIO DE MINAS, 3 de fevereiro de 1929.
106
Apud DIAS, 1968. P. 31
58
entre o grupo mais estabelecido de modernistas mineiros, tendo a frente Alphonsus e
respostas de Acchiles Vivacqua e Guilhermino Cesar, são feitas ressalvas à posição dos
dois:
O senhor Achiles é bem moço ainda. Si por um lado, isso lhe permite
affirmar com convicção coisas que mais tarde não lhe pareçam
absolutamente certas, por outro lado lhe confere autoridade o bastante
para dizer outras tantas coisas que só os moços comprehendem e que só
elles sabem e podem dizer107
Guilhermino é, entre os verdes de Cataguases, o de coração mais suave.
(...) Teria Guilhermino Cesar mudado feitio como se muda de alfaiate?
Parece que o poeta esta se buscando, inquieto neste mundo que é o
Brasil. Esta se buscando ou se perdendo.108
grupo que logo publicaria leite criôlo seria um texto de Achilles Vivacqua intitulado “a
publicação paulista, no dia primeiro de maio de 1929, o texto retrabalha alguns temas
que se juntou com duas raças decaídas, os negros e os portugueses, para a problemática
em leite criôlo109.
107
DIARIO DE MINAS, 14 de fevereiro de 1929. Encontramos dois anos distintos como sendo da data
de nascimento de Vivacqua: 1900, presente nas memórias da sua irmã (VIVACQUA, 1997. P. 135), tão
zelosa da sua lembrança, e 1905, citado por Fernando Correa Dias (1968. P. 12), que parece ter se
equivocado. De todo jeito, a invocação no trecho citado da juventude de Vivacqua para desautorizá-lo é
quase tão incisava caso ele seja três anos mais novo que Drummond – ou seja, nascido em 1905 – quanto
se a datação de 1900 estiver correta e ele for dois anos mais velho que o poeta de Itabira.
108
DIARIO DE MINAS, 7 de abril de 1929.
109
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Segunda Dentição Nº 7, 1º de maio de 1929.
59
Dois números antes, aparecia na publicação paulista um texto intitulado “Os tres
Almeida Prado, que havia publicado capítulos de sua obra “Os tres sargentos” na
exigia uma definição por parte dos modernistas mineiros – “(...) os meninos de Minas
Oswald citada acima. A resposta foi a também já citada carta de Drummond na qual já
escravatura, seria publicado leite criôlo, um tablóide de oito páginas a ser distribuído
“numero I” e “ano I”, nada no tablóide indicava que haveria periodicidade definida ou
mesmo seqüência à sua publicação110 e uma matéria publicada pelo Diario de Minas em
irregular (tanto quanto possivel irregularissimo[sic])”111. Outro artigo não deixou passar
em branco certa opção de escrita presente no tablóide, se referindo ao fato de leite criôlo
se apresentar “as primeiras letras l e c minusculos – o que elles [os diretores] acham
110
Nos outros periódicos modernistas consultados é comum a referência ao que seria publicado nos
próximos números e também a oferta de assinaturas, apesar de serem, via de regra, empreendimentos
editoriais amadores, de periodicidade irregular e tendência a gerar prejuízos financeiros.
111
Recorte de jornal, anotado à mão “Diario de Minas, maio 929”. Série Fortuna Crítica. Caixa 1
(Classificação provisória). Fundo Achilles Vivacqua. Acervo de Escritores Mineiros, UFMG.
60
112
uma cousa muito interessante” , solução gráfica inspirada provavelmente na segunda
seguido pelos poemas (sete) e trechos de prosa (três). Nesta primeira aparição de leite
criôlo a proporção de textos que mencionavam questões raciais, ligados assim mais
Vivacqua e João Dornas Filho na Semana Ilustrada escrevem em uma nota sobre leite
criôlo que “os espiritos modernos, não sabemos se pela inquietação ou pela incultura,
têm uma tendencia para o fútil e para a blague”113. Mas pode-se especular que tais
rejeição a leite criôlo, publicado no mesmo jornal que dali a dezoito dias estamparia a
112
Recorte de revista com artigo de Jairo Leão, anotado à mão “Vida Capixaba – Vitória, E. Santo”.
Série Fortuna Crítica. Caixa 1 (Classificação provisória). Fundo Achilles Vivacqua. Acervo de Escritores
Mineiros, UFMG.
113
SEMANA ILUSTRADA, Nº 91. 13/5/1929
114
ESTADO DE MINAS. 12 de maio de 1929. Nota-se que o artigo saiu um dia antes do “grande
atentado às boas letras” efetivamente “inundar as ruas”.
61
Assinada por um certo Juvencio Bôaventura, nome que não encontramos em
nenhum outro ponto da nossa pesquisa, e publicado no Estado de Minas – que, assim,
após invocar uma “cruzada santa”, acaba por publicar leite criôlo – não seria impossível
que o artigo tivesse saído das próprias linhas “criolistas”, como parte do espetáculo de
lançamento do tablóide.
Paulo”115.
Mas, sem dúvida, os ataques mais importantes sofridos pelo grupo de leite criôlo
vinham dos modernistas sediados no Diário de Minas, tão ou mesmo mais versados na
blague vanguardista que seus contrapartes que haviam produzido o tablóide. Um dos
comemorativo de datas nacionais – o artigo propõe sua publicação nos dias “21 de abril,
sendo uma “revolta (...) contra escritores paulistas de mais fama” 116. Em outro artigo, a
crítica a leite criôlo vai além da blague polêmica, atacando os pontos fracos do
programa “criolista”:
115
FOLHA DA NOITE, 11/5/1929
116
DIARIO DE MINAS, 12/5/1929
62
deixar, porque teria de adoptar, como aliás já acontece, outras danças e
outros cantos deploráveis, porque sem sinceridade.
Querem também acabar com as crendices, como si isso fosse herança do
negro captivo deixada no Brasil e o branco europeu, sem “criolismo”,
não tenha as suas supertições117
posição primitivista e nativista – que significava, por exemplo, que muitos poemas
Brasil de Paulo Prado e, até mesmo, das discussões, estudadas por Tania Regina de
Luca, presentes vários anos antes nas páginas da Revista do Brasil118, questão que
Da parte dos escritores citados – que contribuíram com um texto cada no tablóide
de 13 de maio, sendo que Drummond também publicou ali um poema sob pseudônimo e
publicaria um outro sob seu próprio nome na segunda edição de leite criôlo como
do Diário de Minas já citados, de que “os rapazes mineiros apparecem com intenção de
não brigar”120.
117
DIARIO DE MINAS, 14/5/1929
118
Cf. DE LUCA, 1999. P. 131-156
119
Apud. BUENO, 1982. P. 104.
120
DIARIO DE MINAS, 12/5/1929
63
Como já foi dito, dezoito dias depois do lançamento do tablóide, no dia 2 de junho
leite criôlo faria a sua segunda aparição, desta vez como suplemento literário do jornal
normalmente um espaço que variava entre meia página e um quarto de página, nas
modernista em minúsculas foi mantida e expandida para muitos dos títulos dos textos ali
de Mário de Andrade, posição que, como vimos, eles tentavam evitar. No décimo
121
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Segunda Dentição Nº 10, 12 de junho de 1929.
64
Assim, a recusa em bloco do grupo de Verde em aderir à antropofagia era
contraposta à posição de leite criôlo, ignorando que Guilhermino César fazia parte deste
grupo, que contribuía com bastante freqüência na publicação de Belo Horizonte. A nota
ignorava também que sem dúvida Mário de Andrade continuava figura central pelo
menos do cânone pessoal de João Dornas, como demonstra a sua resposta à enquête já
algumas vantagens para o grupo mineiro. Dentro de uma situação na qual a contribuição
uma possibilidade para os três diretores de leite criôlo aumentarem seu peso enquanto
lado a lado, a nota intitulada “Cartas na mesa: os andrades se dividem”, que transcrevia
brasilidade, vae á frente com o tacape e com os dentes, desbravando o caminho perigoso
que tem nos desorientado até aqui”. E continua afirmando a identidade entre os projetos
122
DIARIO DE MINAS, 3 de fevereiro de 1929
65
Concluindo. A finalidade do criolismo é mais ou menos a mesma da
antropofagia. É a mesma de todos os movimentos nacionalizadores.
Talvez o caminho é que tenha umas pequenas variantes, que
absolutamente não nos desviarão do fim desejado, porque estamos
bussolados de muita vontade de acertar123
um panorama nacional dos vários “clubes de antropofagia”, havia sido publicada quase
João Alphonsus começa então a pressionar o grupo “criolista” para que se defina
Estado de Minas ao mesmo tempo em que o suplemento, publicando ali sua “Chronica
de uma seção de resenhas, mas que eram escritas de maneira solta, permitindo ao autor
abordar o assunto que desejasse. No dia 28 de julho, incrustado na sua resenha do livro
Estudos (2ª série) de Tristão de Athayde, aparece um recado para o grupo de leite criôlo
123
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Segunda Dentição Nº 11, 19 de junho de 1929.
124
LEITE CRIÔLO Nº VI, 7 de julho de 1929.
125
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Segunda Dentição Nº13, 4 de julho de 1929.
66
1927. Tão longe. Depois delle aconteceram uma porção de coisas
deploraveis e o homem moderno do Brasil continua procurando.
Procurando o que? Sinto uma certa nausea em falar em coisas
deploraveis, do mesmo passo que sinto necessidade de esclarecer essas
coisas, não para mim, mas para os meus camaradas “leite-criolistas” por
exemplo, rapazes estimaveis mas que andaram mettidos por querer no
meio do “movimento antropophagico”.
(...)
Sob a direcção de Alcantara Machado, fundou-se em S. Paulo a revista
de antropophagia. Havia enthusiasmo, camaradagem. Mas o sujeito
endinheirado [Oswald de Andrade] não podia estar satisfeito com a
rabada (...). Apesar do ilustre presidente Washington Luis achar uma
graça damnada nelle, passear de braço dado com elle. (...) Rodeou-se de
rapazes que [ilegível] carecendo de um [ilegível], ainda que de pau
torto. Um incidente de coisinha de revista serviu para o rompimento.
Hoje os antropophagos atacam rijamente os srs. Alcantara Machado,
Mario de Andrade e Tristão de Athayde, com mesquinharias.
Convencidos de que podem destruir alguma coisa. Nos intervallos
manifestam sua incondicional adhesão á candidatura Julio Prestes.126
Catete para a próxima eleição presidencial, Júlio Prestes – não é de maneira alguma
mostra Cláudia Maria Ribeiro Viscardi, era o mais intenso dos processos sucessórios da
lançar uma chapa oposicionista, o que acabou ocorrendo com o lançamento da Aliança
No aspecto que nos interessa aqui, o importante é que o governo Antônio Carlos,
126
ESTADO DE MINAS, 28 de julho de 1929.
127
Cf. VISCARDI, 2001. P. 330-349.
67
de parte da opinião pública urbana com medidas consideradas modernizadoras como a
instituição no estado do voto secreto. Se, por um lado, os jovem intelectuais que
situacionismo para conseguir seus cargos no serviço público e na imprensa, por outro,
tal fato não determinava a espécie de adesão entusiasmada que podemos observar tanto
lançamento Aliança Liberal – pode ter incitado Dornas a declarar que não se devia
não publica mais artigos sobre o “criolismo” e perde, assim, o pouco de referência à
128
Apud SANTIAGO, 2002. P. 354.
129
LEITE CRIÔLO Nº X (11º), 11 de agosto de 1929. A numeração do suplemento encontra-se, ao final
da publicação de leite criôlo, dois números defasada devido à repetição errônea do cabeçalho nos
exemplares IX (28/7 e 4/8) e XIII (1/9 e 8/9).
68
programática da segunda dentição da Revista de Antropofagia que havia na publicação.
Na, por assim dizer, política interna da “república das letras” os acontecimentos da
várias das figuras com quem Oswald rompera eram ligadas ao Partido Democrático. Era
profissionais liberais, intelectuais etc.131, o que talvez representasse uma vantagem, sob
PRP, ao qual Oswald de Andrade – apesar das suas posições radicais no campo literário
– continuava vinculado.
de sua Revista de Antropofagia nas páginas do Diário de São Paulo, filiado à rede dos
Seja por tais injunções, seja por outras, a Revista de Antropofagia deixa de
número XIV de leite criôlo seria apenas uma pequena coluna com um trecho de prosa e
130
Cf. AMARAL, 1975. P. 265 e MICELI, 2001. P. 254
131
Idem. P. 91-92.
132
Cf. VISCARDI, 2001. P 343.
133
Apud SANTIAGO, 2003. P. 108.
69
dois poemas curtos. Na mesma página aparece a seção “Chronica literaria”, de João
Alphonsus, com um texto intitulado “De Negra Fulô a Freud” no qual o escritor mineiro
se refere mais uma vez à antropofagia, agora como um fato passado, em uma resenha
tentativas literárias do suplemento o poeta e o poema que, como foi visto, era uma
bastante provável inspiração das propostas estéticas do grupo “criolista”. A lição foi
atacado devido “ao seu plano de botar Jesus Christo para fora do territorio brasileiro” e
também aparece, incidentalmente a figura de Jorge de Lima, ao qual se refere ter sido
134
ESTADO DE MINAS, 15 de setembro de 1929.
135
Cf. SANT´ANA, 1978. P. 123.
70
nomeado, apesar das suas “convicções catholicas, agente de antropophagia aqui em
Alagoas”. 136
Amaral, para ficar com a poetisa Pagu, que então tinha apenas 18 anos137 – concluindo
que o “galo” por não possuir culpa não pode se queixar “da faca e da panela” 138.
Após este rompimento com a antropofagia haveria apenas mais um número, aliás,
rede modernista nacional – rede que, aliás, já não era mais a mesma e que funcionaria
de maneira bastante diversa a partir de 1930. Talvez seja válido citar aqui um poema,
chamado “Vai-vem da ladeira sem flores”, de Guilhermino César – único texto assinado
por um dos diretores de leite criôlo a sair no último número do suplemento – para
Caricia da descida.
Os anjos máus que me abraçaram
os anjos máus...
Monotona
Caricia da descida.139
136
LEITE CRIÔLO Nº XV (17a) de 22 de setembro de 1929.
137
Cf. AMARAL, 1975. P. 284-295.
138
LEITE CRIÔLO Nº XV (17a) de 22 de setembro de 1929.
139
LEITE CRIÔLO Nº XVI (18a) de 29 de setembro de 1929.
71
3. Não tão somente pela poesia: gêneros e temas em leite
criôlo.
72
Depois de analisada a trajetória do grupo de leite criôlo e da própria publicação no
recorte dos gêneros literários ali presentes. Tal opção metodológica se dá com o
contribuições ad hoc que compõe o mosaico que é o “órgão oficial do criolismo” como
textos literários. O risco que se pretende evitar é o de conceber leite criôlo como uma
entidade dotada de uma retórica e de uma ideologia unitárias, limitação esta que se fez
como tais concepções se fazem presentes naquele momento. A primeira delas se refere à
limitação básica dos textos que aparecem em publicações como leite criôlo e a Revista
colaboradores para publicações que, ao que parece, não pagavam pelos textos
no âmbito do modernismo de então e expressam também uma reação a este quadro. Mas
73
a citação do futuro diretor de leite criôlo, invocando a hegemonia do gênero poético
literatura estrito senso. Parece assim sugerir o formato da segunda dentição da Revista
hegemônico no corpus publicado de leite criôlo, mesmo que tensionado pela existência
gêneros mais estabelecidos, a análise do corpus pelo recorte dos gêneros será antecedida
por uma breve discussão do referencial temático que leite criôlo propõe desde o seu
transformação pelo qual passa o pensamento racial brasileiro a partir do final dos anos
1910 até a década de 1940, tendo possivelmente como pontos críticos as décadas de
mal compreendido.
pensamento racial, posto que existe uma certa tendência a ignorar a importante
diferenciação entre racismo e racialismo proposta por Tzvetan Todorov em seu texto
74
clássico sobre o assunto . O autor búlgaro distingue o racismo enquanto comportamento,
doutrina referente às supostas “raças” humanas. Segundo ele o “racista comum não é
“piadas de preto” que infelizmente a maior parte dos brasileiros ouviu em um ou outro
momento de sua vida são mais importantes que os textos de Gobineau, por mais que
estes textos tenham tido ampla aceitação nos círculos da elite brasileira da segunda
metade do séc. XIX ao começo do XX. É óbvio que o racialismo pode legitimar e
1933 costuma ser definida como o ponto no qual o pensamento social brasileiro sairia
da análise racial para a análise cultural, não mais se pensaria em termos de raças, mas
em termos de culturas. Mas não existem rupturas absolutas em história. Muitos estudos
atuais vêm nuançando a radicalidade de tal afirmação. Maria Lúcia Garcia Palhares-
apenas Freyre não havia ainda chegado às idéias mais características de Casa Grande &
Senzala até a segunda metade dos anos 1920, como se encontrava fascinado com várias
das teorias eugênicas e racialistas em voga nos Estados Unidos, mesmo depois de
140
TODOROV, 1993. P. 107-112.
141
PALHARES-BURKE, 2005. P. 21-25; 261-327.
75
de Araujo142, no seu clássico livro sobre o pensamento de Freyre, mostra que o autor
trabalha com a idéia de que existiam raças, mas que elas eram mutáveis pelo meio e
presença negra no Brasil muitas vezes de modo biologizante e/ou monolítico. Mais
hierarquia das culturas: Freyre, por exemplo, considera os africanos islamizados mais
espaço social, tais permanências não são nem um pouco surpreendentes, também não
por décadas a imaginação das elites brasileiras, a ponto de inspirar uma política de
Muito menos com um passe de ciência: não é possível concluir que o sucesso
editorial de Casa Grande & Senzala145, que acabou por simbolizar a mudança de
142
ARAÚJO, 1994. P. 31-41.
143
ROMO, 2007.
144
Idem. P. 41-42
145
O livro foi originalmente publicado por uma pequena editora pouco estruturada, a Editora Schmidt, e
teve três edições entre 1933 e 1938.
76
No prefácio à segunda edição (datado de 1934, publicado em 1936), o autor insiste em
“observar que este ensaio pretende ser menos obra convencionalmente literária que
formação social brasileira” 146. Tal afirmação se torna compreensível se lembrarmos que
ensaio político que virá revelar um escriptor dos mais vigorosos”. A ausência de
Direito e Medicina reinavam absolutos, resulta que os praticantes do gênero que hoje é
leitores como literatos e não como cientistas sociais. Na realidade muitos dos ensaístas
dos anos 1930 haviam estreado nos anos 1920 como poetas e/ou críticos literários,
mudando de gênero literário apenas depois que fatores como a vitória da revolução de
1930 impõe a discussão do futuro político e social do Brasil como foco da produção
intelectual.
146
FREYRE, 1958. v.1 P. LXV.
77
Tais constatações nos permitem voltar à questão inicial: a relação entre o
racial”. Nossa hipótese é que a publicação é parte de um grande arco de interesse pela
na formação da nacionalidade.
É nesse sentido que devemos compreender a presença dos principais símbolos que
âmbito da rede modernista nacional, ao que devemos acrescentar que a discussão sobre
o negro e a nacionalidade se dava naquele momento das mais diversas formas e através
dos mais diversos espaços, desde o debate erudito – num arco que vai das discussões
147
Cf. DE LUCA, 1999. P. 131-177
148
Cf. TELLES, 2003. P. 49
149
Cf. ,por exemplo, GOMES, 2001. P. 53-83.
78
encampada, por exemplo, pela Companhia Negra de Revistas e pela imprensa negra
militante de São Paulo, que lança para esta cidade uma campanha semelhante150. A
presença da Mãe Preta no repertório simbólico das entidades negras pode causar
espanto, pois nas palavras de Tiago de Melo Gomes
Hoje em dia, tal símbolo remete diretamente a Gilberto Freyre, portanto
à idéia de uma ideologia branca. Mas, no contexto da década de 1920,
esta figura assume outra conotação: tanto no Rio de Janeiro como em
São Paulo, grupos negros lutavam para conseguir erigir monumentos
em homenagem à Mãe Preta. 151
A campanha pelo monumento à Mãe Preta repercute neste momento até mesmo
Estão tratando de erguer não sei onde (mas sempre aqui no Brasil) um monumento á
mãe preta. Os denodados que para isso trabalham querem confessadamente prestar
homenagem de gratidão ás amas molhadas e sêcas mas sobretudo molhadas da linda côr
do urubu. E atravez delas á raça escrava.
Eu acho isso muito bonito e comovente porêm perigoso. Marmorizada ou bronzeada a
preta, as mulatas e as brancas protestarão na certa. E será preciso erguer outros
monumentos. Um para cada côr. Depois um para cada nacionalidade. A homenagem
provocará uma competição de raças, de origens, até de tipos de leite. Por fim os
150
GOMES, 2001. P. 73.
151
Idem.
152
LEITE & CUTI, 1992. P.
79
fabricantes de leite condensado tambêm reclamarão a sua estátua e com toda a justiça. E
haverá o diabo quando o governo holandês exigir uma para as vacas suas súbditas.
Eu não estou ofendendo. Eu estou prevenindo.153
medida tão inócua e compatível com uma interpretação paternalista da questão racial
como o monumento à Mãe Preta – denúncia de separatismo que parece ser uma
suas mais diversas demandas – o texto de Alcântara Machado demonstra que a figura da
“mãe preta” e as diversas e contraditórias questões que tal símbolo evocava estavam no
a seguir, afirmando que tinha passado “todo o dia de hontem com a figura da Mãe Preta
vigorosamente o poema “Essa negra fulô” de Jorge de Lima, qualificado pelo crítico
155
paulista de “canção e história da escravidão sem querer ser” – serve também de
chamada imprensa negra paulista sua contemporânea ilustra bem a variação dos
153
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 7, Novembro de 1928. P. 1
154
LEITE CRIÔLO Nº X (11º), 11 de agosto de 1929.
155
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Nº 1, Maio de 1928. P. 4
80
significados dos símbolos que focamos aqui. No texto MãePreta do jornal Progresso156
editado pelo poeta e militante paulista Lino Guedes, o tema da Mãe Preta é enfocado em
termos de usurpação e opressão branca: “Mães abandonando seus filhos, pelos dos
Espírito Santo, evoca a memória da Mãe Preta, mais especificamente da sua mãe preta –
“chamava-se ‘Chicó’”, escreve ele –, mas antes fala da fazenda de seu avô. Metade do
aparece a interrogação retórica: “Quem não se lembra da sua Mãe Preta?” (grifo
nosso)157 Por certo não os filhos de mães negras. É interessante notar o uso do pronome
maio, Guilhermino Cesar, um dos três diretores, iniciava com uma afirmativa que serve
de resposta antecipada àquela falsa questão: “Nós todos mamamos naquêles peitos
fartos de vida e estragados de sensibilidade”. E expõe o que na sua opinião deve ser
feito com o leite da Mãe Preta, metáfora para a herança africana na formação nacional.
156
PROGRESSO, 19 de Agosto de 1928. Apud LEITE & CUTI, 1992. P.
157
LEITE CRIÔLO Nº X (11º), 11 de agosto de 1929.
158
LEITE CRIÔLO (Tablóide), 13 de julho de 1929
81
Nesta fala se nota a relação mais do que ambígua de leite criôlo com a dimensão afro-
suposto presente que seria o trabalho do negro introduz uma das facetas de leite criôlo,
uma espécie de sadismo que permeia as referências à escravidão. Muitos dos textos
piedade, mas com certa malícia. No poema “mãe preta” de Fidelis Florêncio,
mimado que ordena que sua “mãe preta” faça isto e aquilo, entre as ordens surgem
(...)
Mãe Preta, caiu um cisco no meu leite,
E porque não há mais tronco,
Si houvesse, Mãe Preta,
era hora de você ver
(...)
Nada de cantigas de congado.
Conte-me a historia daquelle sinhô
que te cortou de rabo de tatu.
- Chega sinhô!
- Não chega não, negra atôa!
e lépo e lépo e lépo!
E tu pelada no tronco
como um morcego de maminha.
Mãe Preta: como se chamava
Esse sinhô tão bravo?
Eta, mãe preta.
Serafina do Congo e Jesuis,
159
Ninguém póde com você!
“bemquerer a todos tem sido a enorme falta nossa”. A publicação modernista mineira A
Revista, dirigida por Carlos Drummond de Andrade e Martins de Almeida – cujo grupo
leite criôlo, mas que possui grandes afinidades com este – afirma no seu primeiro
159
LEITE CRIÔLO Nº VIII, 21 de julho de 1929.
82
editorial que “no Brasil ninguém quer obedecer. Há mil pastores para uma só
tratamento das questões raciais no Brasil constitui exceção em leite criôlo, a regra é um
resposta de João Dornas Filho à enquête do Diario de Minas, já analisada sob outros
preta” é preciso ressaltar que – se, a partir dos anos 1970, a simbologia da luta anti-
dos Palmares) como Dia da Consciência Negra – no período aqui enfocado todas as
data da abolição. Mas a figura emblemática desta comemoração não era a Princesa
Isabel, como observa Andrews, “no final da década de 1920, as comemorações [de 13
Gama” 162. A abolição era, pois, percebida como um processo na qual os negros ou, pelo
menos, alguns “grandes patrícios” – para emular a linguagem daqueles jornais – seriam
160
A REVISTA No. 1, 1925. P. 12-13
161
DIARIO DE MINAS, 3 de fevereiro de 1929.
162
ANDREWS, 1998. P. 332-333
83
Já na abordagem de leite criôlo da abolição da escravatura a população negra não
sua liberdade se torna um dos problemas do Brasil. Não é que faltem as representações
de uma moça branca que brinca com “o pretinho” no colo da “preta gorda” sentada ao
seu lado em banco de praça é associada implicitamente à Princesa Isabel. Mas o texto
referências aos abolicionistas negros não é nada incomum, mas a referência à luta
Reivindicação de direitos ao preto. Não nego que foi justo. Porem fora do tempo.
Faltava-lhe educação. Não conhecia necessidades. Para vida livre. Mas cahio no
mangue assim mesmo. Queria gosar. Fuzarca. E com toda autonomia. Sem policia de
costumes. E poz em nossos dias todas as paixões licenciosas.
conseqüências com uma outra publicada naquele mesmo 13 de maio de 1929, esta agora
reivindicação de direitos aos negros para a qual a abolição foi apenas o começo.
[Os remanescentes dos escravos] Ficaram libertos, porém, sem pão e sem lar,
embrutecidos pelos martírios do maldito regime. Tiveram também de enfrentar as
correntes imigratórias que sempre foram bem remuneradas e amparadas por todas as leis
do nosso país. Do negro ninguém cuidou, ele que fora a verdadeira máquina de trabalho
para a construção dos alicerces do progresso que hoje assistimos (...). 165
NO AMAZONAS DA POESIA
Como já afirmamos, no conjunto do corpus de leite criôlo se mantém a hegemonia
dos versos característica das publicações modernistas dos anos 1920, sendo que o
163
LEITE CRIÔLO Tablóide, 13 de Maio de 1929
164
“Defeza da Alegria” de Achiles Vivacqua em LEITE CRIÔLO (Tablóide), 13 de maio de 1929. P. 7
165
Apud LEITE & CUTI, 1992. P. 226
84
volume das águas do “Amazonas da poesia” – para usarmos a metáfora de Antônio de
portanto, que em apenas uma das edições cotidianas de leite criôlo outro gênero textual
no corpus poético analisado. A modernidade técnica e/ou social enquanto temática, tão
166
LEITE CRIÔLO Nº IX (10º), 4 de agosto de 1929.
85
repetem temas e/ou procedimentos literários de outros poemas publicados no próprio
leite criôlo, gerando séries relativamente coesas dentre o mosaico das contribuições. É
interessante ressaltar que tal redundância – que facilita, aliás, em muito a presente
análise – serviu na época de argumento para críticas, como aquelas de João Alphonsus
poema “Samba” de Achilles Vivacqua, que já havia saído no primeiro número da revista
Verde e no Diario de Minas167, tem por ecos “Poesia criôla” de Fonte Boa, do grupo
todos eles encenam danças dos “corpos pretos” de “criôlas”, “morenas” e “negras”,
herança cultural africana no Brasil (“cabinda”, “iaiá”, “berimbau” etc). Também fazem
sua aparição diversos tipos de trabalho textual de matriz sonora e/ou visual como as
rimas acompanhadas de ortografia fonética (“aruê, aruá/ pra seu dia festejá”) que
Salomé mulambo”. Estes são alguns dos poemas publicados em leite criôlo que mais
chamam a atenção para si no aspecto formal, trazendo como substrato temático o tipo da
mulata sensual, cuja proximidade com o tema da luxúria como perdição está explícita na
167
DIARIO DE MINAS, 1/2/1929.
168
Cf. DOTTIN, 1997. P. 805-811
169
“Samba” de Achilles Vivacqua em LEITE CRIÔLO Nº III, 16 de junho de 1929; “Poesia criôla” de
Fonte Boa em LEITE CRIÔLO Nº V, 30 de junho de 1929; “Dança de Salomé mulambo” de José
Guimarães Alves em LEITE CRIÔLO Nº VII, 4 de agosto de 1929. “Samba” e “Dança de Salomé
86
A temática “negra” também aparece nas páginas da publicação mineira em
pseudônimo do “antropófago” paulista Raul Bopp, que narra o estupro da “escrava mais
nova” pelo feitor, tendo por cenário o “fundo da lavoura grande” de uma fazenda dos
Natal, aparecem ecos da trama do poema “Nega Fulô” de Jorge de Lima, já comentado
no capítulo anterior: o escritor do Rio Grande do Norte descreve em seu poema uma
“negrinha asseiada [sic]” concluindo que a fala dela “até se parece / com a fala da dona /
frutos cheirosos / fazem sentinela” devido à presença das tais “morenas” em uma venda
Além do viés erotizado, comum aos poemas mencionados até aqui, a temática
negra também faz sua aparição sobre outras formas em leite criôlo. Na seção anterior
abolição da escravidão, entendida como dádiva da Princesa Isabel. Sobre outro ponto
mulambo” já foram analisados e parcialmente transcritos por Antônio Sergio Bueno, cf. BUENO, 1982.
P. 144.
170
“milú” de Jacob Pim-Pim em LEITE CRIÔLO Nº VI, 7 de julho de 1929; “bichinha de casa...” em
LEITE CRIÔLO Nº XIII (14°), 1° de setembro de 1929; “cromo” de Achilles Vivacqua em LEITE
CRIÔLO Nº VI, 7 de julho de 1929.
87
Montanha, publicada naquela cidade mineira. Ali o autor funde a imagem de uma
poemas dentro da lógica mais ampla das temáticas do nacionalismo primitivista. O foco
presente, de forma muito mais positiva, intimista e caseira, nos poemas “Mez de Maria”
voz de Ninita” –; “Balada da ternura” de Oswaldo Abrita, ligado à revista Verde – “As
Guilhermino Cesar – “Tristeza moleirona dos sentidos / deixou lugar pra Deus Nosso
Senhor”. Estes poemas, os últimos dois remetendo mesmo à forma da prece religiosa,
Menina” de Fonte Bôa173 versos livres modernos servem de moldura para cantigas
171
LEITE CRIÔLO Nº XI (12°), 18 de agosto de 1929.
172
“Mez de Maria” de Fidelis Florêncio em LEITE CRIÔLO Nº VII, 14 de julho de 1929; “Balada da
ternura” de Oswaldo Abrita em LEITE CRIÔLO Nº XII (13º), 25 de agosto de 1929; “armarinho” de
Guilhermino Cesar em LEITE CRIÔLO Nº V, 30 de junho de 1929.
173
“A canção do meu sapo” de Francisco L. Martins Filho em LEITE CRIÔLO Nº I, 2 de junho de 1929;
“Pedra Menina” de Fonte Bôa em LEITE CRIÔLO Nº III, 16 de junho de 1929.
88
entre outros, por João Dornas Filho em poema seu publicado na revista Verde, como
de Achilles Vivacqua que começou a ser publicada na revista Verde e teve sua
174
“bandeira nacional” de Achilles Vivacqua em LEITE CRIÔLO Nº VII, 14 de julho de 1929;
“bandeira” de Eneida em LEITE CRIÔLO Nº XII (13º), 7 de julho de 1929; “Os ‘Baianos" de Fidelis
Florêncio em LEITE CRIÔLO Nº I, 2 de junho de 1929; “Batalha” de Franklin Nascimento em LEITE
CRIÔLO Nº VII, 7 de julho de 1929.
175
“ca paraó” de Valle Ferreira em LEITE CRIÔLO Nº V, 30 de junho de 1929; “bucolica" de Odorico
Costa, de Uberaba, em LEITE CRIÔLO Nº VIII, 21 de julho de 1929; “Minas” de Rosário Fusco, ligado
à revista Verde, em LEITE CRIÔLO Nº IX, 28 de julho de 1929; “Bois de Carro” e “A Catita” de Fidelis
Florencio em LEITE CRIÔLO Nº X(11º), 11 de agosto de 1929; “Paraná” de Francisco L. Martins Filho
em LEITE CRIÔLO Nº XIII(14°), 1° de setembro de 1929.
89
JUIZ-DE-PAZ / apascenta sete cabras magras...”. A mesma leitura da cidade, à qual
poemas “vistas de Bello Horizonte: Estrada de Ferro” de Valle Ferreira, que se refere à
“Estação sem prática da vida”, e “o sol na prosa” de Fonte Bôa, que tem por temática o
clima da capital176.
internacional e, no fim, exaltada por ser “brasileirinha até debaixo d’água”, no primeiro,
e no segundo porque seus olhos não são “olhos de americana”. No poema de Camara
Cascudo aparece um refrão – a interpelação “Meu bem” – também utilizado nos poemas
uma tuberculosa, e “pra você...” de João Dornas Filho, no qual é ressaltado o “sabor
bem” é tem por equivalente “Mulher” no poema “Desejo Lyrico” de João Alphonsus,
com resultados bastante parecidos. Neste poema o eu-lírico antecipa a resposta da sua
interlocutora nos seguintes termos: “Tu então dirás: tá bão”, em mais um exemplo da
176
“paisagem n. 4” e “paisagem n. 5” de Achilles Vivacqua em LEITE CRIÔLO Nº VIII, 21 de julho de
1929; “vistas de Bello Horizonte: Estrada de Ferro” de Valle Ferreira em LEITE CRIÔLO Nº VIII, 21 de
julho de 1929; “o sol na prosa” de Fonte Bôa em LEITE CRIÔLO Nº VI, 7 de julho de 1929.
177
“Neurastenia Clerical”, “Reclame para o Grande Hotel”, “Versos do Coletor Estadoal de Briquites” de
Fidelis Florêncio em LEITE CRIÔLO Nº II, 9 de junho de 1929; “o papagaio do palácio” de Jacob Pim-
pim em LEITE CRIÔLO Nº IX, 21 de julho de 1929.
90
preocupação de integrar o tema sentimental e amoroso com as formas coloquiais e as
sentimental, das mais tradicionais para a feitura de versos, é tratada de maneira mais
convencional, em alguns deles são inclusive rimados de maneira não muito distante da
mineira – que se dá a colaboração de duas das quatro mulheres cuja produção aparece
em leite criôlo: Carmem Corrêa de Mello e Mieta Santiago. A última delas, que chegou
a publicar dois poemas no suplemento, era também uma conhecida sufragete mineira,
de leite criôlo, cabe lembrar que a articulação da diversidade dos poemas aqui
analisados – a qual se deve somar a diversidade daqueles vários que não integram as
178
“Artistas Bonitas de Cinema” de Carlos Drummond de Andrade em LEITE CRIÔLO Nº II, 9 de junho
de 1929; “lundu de Coolen Moore” de Luis da Camara Cascudo em LEITE CRIÔLO Nº XI (12º), 28 de
julho de 1929; “Offerecimento” de Francisco L. Martins em LEITE CRIÔLO Nº III, 16 de junho de 1929;
“pra você...” de João Dornas Filho em LEITE CRIÔLO Nº IX(10º), 4 de junho de 1929; “Desejo Lyrico”
de João Alphonsus em LEITE CRIÔLO (Tablóide), 13 de julho de 1929.
179
“Canção do Só” de José Guimarães Alves em LEITE CRIÔLO Nº I, 2 de junho de 1929; “Sonata de
noite e de dia” de José Guimarães Alves em LEITE CRIÔLO Nº XIII (15º), 8 de setembro de 1929;
“inquietação” de Rogerio Picanço em LEITE CRIÔLO Nº XIV(16º), 15 de setembro de 1929.
180
“cae a chuva” de Mieta Santiago em LEITE CRIÔLO Nº VI, 7de julho de 1929; “caricia de roce que
és tu...” de Mieta Santiago em LEITE CRIÔLO Nº VII, 14 de julho de 1929; “você já vinha comigo” de
Carmem Corrêa de Mello em LEITE CRIÔLO Nº IX, 28 de julho de 1929. As outras escritoras são
Eneida, autora do já citado poema “bandeira”, e Thereza Marchetti, que publicou no suplemento um
poema de influência simbolista intitulado “Helio” (LEITE CRIÔLO Nº XII (13º), 25 de agosto de 1929).
91
sim das tendências e ressonâncias da rede modernista nacional no âmbito da produção
outros gêneros literários. Nestes o ideário “criolista” se faz presente de maneira mais
opinativo.
A PROSA SALVADORA
Ilhada entre o mosaico dos poemas e o conteúdo programático dos artigos, a
criôlo, tal gênero de escrita dificilmente poderia ser qualificada de salvadora no sentido
está longe de fazer frente ao “Amazonas da poesia” (foram publicados vinte e quatro
trechos de prosa contra um total de sessenta e nove poemas). Mas a prosa de ficção mais
Como traço geral, a prosa de ficção presente em leite criôlo tende a ser mais curta
São deste tipo vários textos publicados em leite criôlo que, através de enredos
181
Poucos são os textos inequivocamente qualificáveis como contos. Nominalmente, “O chapéo” de Ary
Gonçalves, modernista de Ubá, em LEITE CRIÔLO Nº VIII, 21 de julho de 1929; e “Tragedia” de
Marques Rebello, modernista do Rio de Janeiro em LEITE CRIÔLO Nº IX, 28 de julho de 1929.
182
FERREIRA, 1986. P. 118.
92
popular, tratados igualmente nos textos programáticos do suplemento como criolismo e
Dornas Filho conta-se a história de um flautista que fez fama tocando uma flauta de
taquara, decide, porém, trocá-la por uma de prata, acaba por não conseguir tocá-la e se
vê obrigado a se sujeitar a tocar bumbo na banda. Dornas sintetiza ao final do seu texto
a lição: “Conheço um povo que se sujeitasse a tocar flauta de tacoára, podia ao menos
Neste texto um “nêgo” invade um salão passadista provocando escândalo, mas devido a
sua ignorância não pode ser ouvido. O texto finaliza com um arremate paternalista: “o
caso é que alguém já olhava ele com simpatia. Porém talvez ele inda não fale
amanhã.”183
partir de alguns “pensamentos bonitos” que teve e se revolta por não o publicarem em
publicação, “você já viu negro escrever coisa que preste?”. Acontece que o poema
continha erros crassos de português. 184 Este texto encena uma versão ficcional da figura
vagas”, adotado ironicamente pelo grupo de leite criôlo, que publicava seus poemas na
183
“apologó” de João Dornas Filho, LEITE CRIÔLO Nº IX, 28 de julho de 1929, “A propósito de uma
aparição” de Oswaldo Abrita em LEITE CRIÔLO Nº I, 2 de junho de 1929.
184
LEITE CRIÔLO Nº V, 30 de junho de 1929
93
Uma questão interessante é o fato de que o tipo de linguagem marcada por incorreções
primitivista.
implícitas mais significativas de leite criôlo, o livro Retrato do Brasil de Paulo Prado.
“N’uma terra radiosa vive um povo triste” – se encontra reproduzida. Logo abaixo se
Palmares, de uma negra que provocava abortos sucessivos para não dar à luz filhos da
sua cor e que acaba morrendo no parto quando consegue, enfim, engravidar de um
Prado. Incrustada no texto vem a moral da história: “Pobre raça brasileira! Ainda não
foi agora que começou a apparecer o branco nascido debaixo das suas arvores”.185
Por outro lado, na última página do mesmo tablóide aparece um texto de Cyro dos
Anjos, intitulado “Zé Prequeté andando atôa...”, na qual a parteira, por ocasião do
para
Este trecho mostra como também em leite criôlo se dá a tensão entre um discurso
94
higienista, como o que Tania de Luca analisou a partir das páginas da Revista do
Brasil.187
Além da prosa de ficção mais alinhada com as temáticas centrais do “órgão oficial
geral também na linha que definimos como anedota. Alguns deles se comunicam com
urbano189.
Também foi publicada uma série de poemas em prosa de Guilhermino Cesar, de teor
capítulo anterior, que Achilles Vivacqua publicava nas revistas de variedade antes da
concentrada nas penúltimas edições de leite criôlo, quando caí drasticamente o número
qual os “brasileirismos” começavam a ser criticados, por exemplo, por João Alphonsus,
O PROCESSO DE DESNATAR
Se nos gêneros propriamente literários as formulações do que leite criôlo
considera serem os males nacionais e também o que deveria ser feito para saná-los
aparecem como sombras – como moral da história, às vezes assinalada nos próprios
textos como tal – nos artigos programáticos tais questões se colocam de maneira mais
187
Cf.. DE LUCA, 1999. P 136-177.
188
“ jóca estourado” de Diterot Coelho Junior em LEITE CRIÔLO Nº VII, 14 de julho de 1929
189
“História do homem que me queria pra irmão” de Guilhermino Cesar em LEITE CRIÔLO Nº II, 9 de
junho de 1929.
190
“capitulo z”, “capitulo y” e “capitulo x” em LEITE CRIÔLO Nº XII (13°), 25 de agosto de 1929, Nº
XIII (14°), 1° de setembro de 1929, e Nº XIV (16º), 28 de setembro de 1929, respectivamente.
95
direta, ainda que conservando uma margem importante de ambigüidade., deriva
nacional.
Antes de mais nada é necessário contar o que seja “criôlismo”, no nosso ponto de
vista. É o divórcio do homem com a terra. É a preguiça. É o optimismo exagerado e sem
rumo. É o pernosticismo. É a desorganização culminada no bacharel.
(...)
O criôlismo – como a antropofagia – é um movimento literário, filosófico e religioso,
mas sem estrangeirice.
(...)
Nelle combatermos pela lampeana e pelo ridículo, tudo o que representa macaqueação e
burrice, entravando o Brasil a caminhar. Tudo o que representa saudosismo, fanatismo e
preguiça. Tudo o que tem infelicitado o paiz.191
discursivas.
191
REVISTA DE ANTROPOFAGIA Segunda Dentição Nº 11, 19 de junho de 1929.
96
especial no tablóide de 13 de maio, onde foram publicados seis artigos dedicados à
Além do já citado artigo “leite criôlo” de Guilhermino Cesar, que propõe desnatar
que é levado a criar “a filhotada preta” daquela ave como se fosse a sua própria. O
preto sudoso [sic] da pátria”, descrita como “erro de uma aberração”, e ao português,
culpado por tal mácula, se justapõe a uma descrição sintética do processo histórico
brasileiro, bastante parecida com as que Oswald de Andrade incluía às vezes em seus
Ecos deste texto estão presentes em outros textos publicados no tablóide: “Banzo”
de Diderô Coelho Junior, que também encena uma síntese histórica da formação da
nacionalidade, e em “Negro vamos dar um jeito nisso!” de Newton Braga, que também
o já citado “Defeza da alegria”, que menciona Galton e as idéia eugênicas e propõe uma
192
“leite criôlo” de Guilhermino Cesar, “Fóra o malandro” de João Dornas Filho e “Convite” de Achilles
Vivacqua em LEITE CRIÔLO (Tablóide), 13 de maio de 1929. P.1
193
“Banzo” de Diderô Coelho Junior e “Negro vamos dar um jeito nisso!” de Newton Braga em LEITE
CRIÔLO (Tablóide), 13 de maio de 1929. P. 2 e 4, respectivamente.
97
eugenia meio concreta meio metafórica do povo brasileiro, enraizada na crença do
branqueamento:
Eugenia para a alma brasileira. Eugenizar. Não o negro. Este, por si mesmo, se anula
pela mestiçagem. Todo o Brasil, sim. Fazel-o feliz. Obter, selectivamente, typos que
melhore [sic] a nossa raça.194
programa explícito e claramente definido para leite criôlo, afirmando que isto implicaria
densa rede de metáforas que caracteriza o tablóide vai sendo aos poucos abandonada, o
de gente” que vive ali, tem “bichinhos na barriga” e “sangue ruim” proveniente de uma
“mistura de portuguez, negro e indio que não tem dado nada que preste”. Ao “garoto”
194
“Defeza da Alegria” de Achiles Vivacqua em LEITE CRIÔLO (Tablóide), 13 de maio de 1929. P. 7
195
“Cromo” de Achilles Vivacqua e “mexerica se conhece pelo cheiro” de Guilhermino Cesar em LEITE
CRIÔLO Nº I, 2 de junho de 1929.
98
deve se ensinar, por fim, que sem seu trabalho e empenho a nação acabaria “obrigada a
entregar isto [seu território, sua soberania] para os outros que estão trabalhando e tem
reaparece de forma mais concreta no artigo “Livros Didacticos” de João Dornas Filho,
premiando novos livros didáticos, mas reprova a obrigatoriedade de que os livros sejam
sejam estudados nas escolas primárias biografias dos “grandes homens do passado”
O apreço de Dornas pela biografia parece ter permanecido com ele depois do fim de
leite criôlo, posto que na década de trinta escreveu uma obra deste gênero sobre Silva
Nacional.
voltam contra a imitação dos usos e costumes estrangeiros197; denunciam a cegueira dos
196
“o que nós precisamos” de Carlos da Matta Machado em LEITE CRIÔLO Nº VII, 14 de julho de
1929; “Livros Didacticos” de João Dornas Filho em LEITE CRIÔLO Nº I, 2 de junho de 1929.
197
“façamos nossa a nossa casa” de Americo R. Netto em LEITE CRIÔLO Nº VI, 7 de julho de 1929; “si
isto é leite criôlo, eu sou leite criôlo” de Odorico Costa em LEITE CRIÔLO Nº IX (10º), 4 de agosto de
1929.
198
“o caso do burro e a carapuça” de Fonte Bôa, modernista de Cataguases, em LEITE CRIÔLO Nº VIII,
21 de julho de 1929.
199
“A hora presente” de Ascânio Lopes, modernista de Cataguases falecido no início de 1929, em LEITE
CRIÔLO Nº X (11°), 11 de agosto de 1929.
99
Passando do “criolismo” enquanto ideário para o “criolismo” enquanto
Newton Braga intitulado “devore-se”, citado no capítulo anterior, que desenha um mapa
das publicações modernistas publicados àquela altura em vários pontos do país; o texto
trata com ironia o ingresso dos modernistas paulistas Guilherme de Almeida, Menotti
Academia Paulista de Letras, considerado uma traição aos ideais modernistas200. Este
último texto é também o mais próximo que o suplemento chegou da prática da segunda
nacional se dá sob a forma de resenhas, com destaque para as que tratam de outras
revistas modernistas. Nesta categoria se enquadram artigos sobre as revistas Arco &
últimas consideradas revistas irmãs de leite criôlo em uma das resenhas201. Também são
200
“devore-se” de Newton Braga em LEITE CRIÔLO Nº VI, 7 de julho de 1929; “movimento criôlo” de
Edison Magalhães em LEITE CRIÔLO Nº XI, 28 de julho de 1929; “jornalsinho critico, humoristico e
noticioso” em LEITE CRIÔLO Nº XII(13º), 25 de julhoagosto de 1929.
201
“Paizagem” de Gulhermino (Cesar) em LEITE CRIÔLO (Tablóide), 13 de maio de 1929; “pipia:
Samba” de A. (Achilles Vivaqua) em LEITE CRIÔLO Nº IX, 28 de julho de 1929; “Verde”, não
assinado, em LEITE CRIÔLO Nº III, 16 de junho de 1929; “Montanha” de A. V. (Achilles Vivaqua) em
100
resenhados no suplemento livros de poemas como os de Martins Mendes, do grupo da
revista Verde, e Carvalho Filho, ligado à revista Arco & Flecha202. No geral estas
resenhas se caracterizam pelo tom sóbrio e pela simpatia para com os seus objetos,
núcleos modernistas.
criolismo” utilizam recursos lingüísticos próximos da escrita literária estrito senso, mas
sobre a vida e a história brasileiras, a seção comporta textos que se colocam a meio
caminho entre a nota jornalística e o tipo de poesia praticado naquele momento por
Oswald de Andrade203.
Oswaldo Abrita é o único texto assinado por um colaborador de leite criôlo a aparecer
na seção citada. Trata-se de uma sátira aos concursos de miss, então em evidência em
todos os jornais. Já “Do pequeno escriptor Olavo Augusto Maia ao poeta Alberto
Agostini”, também de Oswaldo Abrita, não foi publicada naquela seção. Falava, no
101
entanto, dos principais autores nela publicados, os pretensos poetas Olavo Augusto
O “CRIOLISMO” EM EXEMPLOS
Como já foi mencionado no capítulo anterior, a seção intitulada “raça”,
constante tanto do tablóide como de nove das dezoito edições do suplemento, era
modernistas) a título de gozação. Como já havia observado Antonio Sérgio Bueno, estas
nomes de todos os envolvidos evidenciam sua origem “turca”, menos o do padre, cujo
nome trai sua origem italiana. A mesma temática anti-imigração aparece em leite criôlo
na figura de Alberto Agostini, sapateiro de Cataguases de origem italiana, que “luta com
204
“Os proveitos de um concurso de beleza...” de Oswaldo Abrita em LEITE CRIÔLO Nº XVI (18º), 29
de setembro de 1929; “Do pequeno escriptor Olavo Augusto Maia ao poeta Alberto Agostini” de
Oswaldo Abrita em LEITE CRIÔLO Nº XII (13º), 11 de agosto de 1929
205
BUENO, 1982. p. 158-163
102
suplemento. No já citado artigo “Do pequeno escriptor Olavo Augusto Maia ao poeta
de Finanças e rouxinol nas horas vagas” Olavo Augusto Maia. Negro, pretenso escritor
leite criôlo. Além deste artigo, são publicados três poemas de Olavo Augusto Maia e a
pequena estória já citada que encena sua condição, “O poeta obscuro ou o poema do
escritor” são a “evidência” que permite ao grupo mineiro formular todo o seu
Talvez a maior crueldade do grupo para com seu “amigo” seja a publicação do texto que
Poema
É a hora chegada
Dum grande universitário
Que gramou a liberdade
Da monarquia chamada.
103
Que nunca mais nos escraviza;
nacionais se faz presente também neste caso. Se aqui os autores se consideram longe do
terceira, quarta e da última estrofes do poema de Olavo Augusto Maia com os seguintes
trechos de cantos de congado, recolhidos por Edimilson Pereira no ritual dos Arturos,
pela pena constrangida e desajeitada do “pequeno escritor”, pôde ser registrada sem o
Tava dormino
Sá Rainha me chamo
— Acorda, nego
O cativeiro acabo
No dia 13 de maio
Fazendero todo chorô
Chorô, chorô
Cativeiro de nego acabo207
Por fim, vimos neste capítulo que todo o corpus de leite criôlo é perpassado por
tensões como as que caracterizam a seção “raça”: tensões entre gêneros textuais; entre
forma literária e conteúdo programático etc. Assim, podemos dizer que – se, como
206
“Poema” de Olavo Augusto Malha [sic] em LEITE CRIÔLO (Tablóide), 13 de maio de 1929. P. 4
207
PEREIRA, 2000. P. 64.
104
modernista brasileiro se encontrava em uma encruzilhada – na própria publicação esta
105
4. Totalizando nossa maneira: conclusão.
106
Na presente monografia tivemos por objetivo analisar a inserção da publicação
entendemos como rede modernista nacional, defendendo a validade desta noção para a
social. Apresentamos nesse primeiro capítulo também as nossas hipóteses gerais sobre a
rede modernista, além de discutir as principais obras que têm em leite criôlo um dos
seus focos de análise e apresentar as fontes a partir das quais o presente trabalho foi
construído.
equilíbrio que o grupo tentou manter durante o período da publicação de leite criôlo
entre suas principais referências: o grupo paulista ligado à antropofagia e o núcleo mais
107
A forma como a rede modernista nacional é encenada no mosaico das
capítulo, que trata dos temas e gêneros textuais. Ali discutimos a tensão entre o
história exemplar da parte desta produção que se vincula com o eixo programático da
publicação; a relação dos artigos com a dupla acepção de “criolismo” e com os nós da
vincula ao ideário “criolista” e como, mesmo no máximo de afirmação dos seus valores,
interpretação do Brasil.
maior “relevância intelectual” nada fazem senão repetir o discurso triunfal da geração
não possibilita a compreensão de um objeto, como leite criôlo, que chega a ser em
alguns aspectos constrangedor para o leitor atual, mas, como esperamos ter
não parecia especialmente ofensivo para seus interlocutores de então: nem mesmo os
108
Partindo do presente mapeamento das relações entre este o grupo e a totalidade da
muitas questões que o presente trabalho deixa em aberto para futuras pesquisas.
109
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