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14 Le Monde Diplomatique Brasil agostO 2009

MODELO DE DESENVOLVIMENTO

A felicidade como uma


questão política
As múltiplas crises geradas pela dinâmica do modelo de desenvolvimento vigente abrem uma nova
discussão: reduzir o crescimento, ou até mesmo diminuir a produção, e conseguir atender a todos. Para os
defensores do decrescimento, o desafio é viver melhor com menos
POR ERIC DUPIN*

E
m 14 de outubro de 2008, o primeiro- a população”. Para ele, “uma crise de gran- blicos uma dezena de seus quadros, por a “revista teórica e política do decrescimen-
ministro François Fillon não conse- des dimensões seria a pior das situações”. meio de uma rede muito descentralizada. to”, vem explorando os inúmeros problemas
guiu disfarçar sua perplexidade: ele Jean-Luc Pasquinet, militante do Movi- Reunindo militantes mais experientes, co- levantados por essa perspectiva teórica.3 Es-
assistiu ao deputado dos Verdes, mento dos Opositores do Crescimento mo Jean-Luc Pasquinet, antigo porta-voz do sa vertente, coordenada por Jean-Claude
Yves Cochet, defender a tese do “de- (MOC), observa que “a crise é uma oportu- PPLD, e Christian Stunt, ex-integrante dos Besson-Girard, cultiva laços mais ou menos
crescimento” em plena Assembleia Nacio- nidade para nos lembrar que o crescimento Amigos da Terra e do Partido Ecologista, o informais com uma série de organizações:
nal da França. não é mais possível”. Mas pondera: “Ao mes- MOC comemora a presença em suas fileiras as redes antinucleares ou anti-OGMs (orga-
Diagnosticando uma “crise civilizacio- mo tempo, em períodos como este, as pes- de “muitas mulheres e muitos jovens”. nismos geneticamente modificados), os mo-
nal”, Cochet afirmou, sob protestos da direi- soas tendem a se voltar para os seus interes- vimentos internacionais “Slow Food”4 e
ta, que “agora a busca pelo crescimento pas- ses particulares”. Paul Ariès também aponta capitalismo verde? “Slow Cities”, e muitas associações antipu-
saria a ser antieconômica, antissocial e a ambivalência da crise: “De um lado, ela Recentemente, MOC e PPLD deram iní- blicitárias. “A vontade de mudar as coisas
antiecológica”. Naquele momento, seu apelo posterga o sentimento de urgência ecológi- cio a um processo de aproximação, criando passa pela apresentação de alternativas”, su-
por uma “sociedade mais sóbria” tinha pou- ca, pois a prioridade do momento seria lutar em parceria a Associação dos Opositores ao blinha Guillaume Gamblin, um dos colabo-
cas chances de obter qualquer respaldo. Mas em defesa do poder aquisitivo e dos empre- Crescimento (Adoc). Sob a etiqueta “Europe radores da revista Silence.
com o agravamento da recessão econômica, gos. De outro, mostra que durante décadas Décroissance” – Europa Decrescimento – As ideias relativas ao decrescimento não
esse assunto parece ter entrado de vez na vivemos em cima de mentiras”2. Assim, na eles fizeram campanha conjunta na última são nenhuma novidade. De fato, elas eram
pauta dos franceses. avaliação daqueles que duvidam que a re- eleição para o Parlamento europeu. Por não muito mais disseminadas durante os anos
Assim, os questionamentos em torno do cessão possa pavimentar o caminho do de- disporem de muitas condições materiais e 1970 do que hoje. Contudo, 30 anos atrás a
modelo de desenvolvimento surgem, sobre- crescimento, a inquietude disputa espaço terem grandes divergências, eles nem se- contestação do produtivismo estava cir-
tudo, como consequência óbvia da crise com a esperança. quer imprimiram cédulas para a votação, cunscrita a um espaço ideológico fechado e
que abala o planeta. De repente, os pensa- pedindo aos seus eleitores que o fizessem não influenciava a esquerda, ainda domina-
dores do decrescimento passaram a ser ou- eles mesmos, acessando o site da associa- da pelo Partido Comunista (PC) e por um
vidos com mais atenção. “Andaram procu-
rando por mim”, comemora Serge Latouche.
A ideia do decrescimento ção. O resultado era previsível: Jean-Luc
Pasquinet, que encabeçava a lista em Île-de-
marxismo ingenuamente “progressista”.
Agora, com a crise ambiental e os questiona-
“Nossos debates estão cada vez mais cheios não é nenhuma novidade France (região parisiense), obteve somente mentos que pesam sobre o trabalho como
de gente”, confirma Paul Ariès, outro inte- e foi muito mais 0,04% dos votos válidos. valor, a união entre anticapitalismo e anti-
lectual que se tornou referência nessa cor- Mas as ideias do decrescimento têm produtivismo está progredindo.
rente de pensamento.
disseminada nos anos uma repercussão que de maneira alguma se “O decrescimento vem reafirmar, por
“Nesta conjuntura, em que muitos dos 1970. Naquela época, compara a esses números. A popularidade meio de um vocabulário novo, antigas ques-
nossos argumentos são comprovados pela porém, não conseguia do jornal mensal La Décroissance, fundado tões às quais o movimento operário tentava
realidade, devemos começar a indagar se ha- em 2004, revela o razoável impacto dessa responder”, garante Paul Ariès, que foi co-
verá uma alternativa entre o decrescimento influenciar a esquerda corrente: a sua tiragem é de 20 mil exempla- munista durante a juventude. “O que me
sofrido, imposto pela recessão atual, e aque- res, dos quais 13 mil são vendidos em ban- atraiu nessa nova vertente foram suas afini-
le conduzido”, afirmava Nicolas Hulot du- cas. A sua linha editorial se caracteriza pelo dades com a crítica da alienação, ‘o direito à
rante a corrida eleitoral para o Parlamento O caráter inovador e o impacto desse te- tom polêmico, cujos alvos prediletos são os preguiça’… Ao contrário do que muitos pen-
europeu.1 Para alguns de seus partidários, o ma contrastam com a influência muito re- expoentes de um “capitalismo verde” e de sam, a esquerda nem sempre optou pelo ca-
colapso atual constitui uma formidável duzida das forças políticas que o incorpora- um “desenvolvimento sustentável”. minho do produtivismo!”
oportunidade para essa causa. “Tomara que ram em suas pautas. O Partido em Prol do Já a revista ecologista Silence (Silêncio), A evolução das posições de Jean-Luc Mé-
a crise piore!”, exclama Latouche, utilizando Decrescimento (PPLD) foi fundado em 2006 cuja tiragem é de 6 mil exemplares, publi- lenchon é um sintoma da influência exercida
uma “pedagogia das catástrofes”. Sem ser por Vincent Cheynet, para quem “a con- cou em 1993, sem sucesso, aquele que foi o pelo decrescimento no âmbito da esquerda.
tão extremista, Yves Cochet avalia, por sua quista do aparelho institucional assumiu primeiríssimo dossiê a respeito do decresci- Oriundo de uma estrita tradição marxista,
vez, que somente esbarrando nos limites da caráter emergencial”. Entretanto, querelas mento, recheado de trechos do livro funda- tendo sido inicialmente militante trotskista
biosfera a humanidade será obrigada a ser internas nunca permitiram que essa orga- dor do conceito criado por Nicholas Geor- lambertista e depois socialista, o fundador
mais ponderada. “Não haverá mais cresci- nização saísse do papel. “Constituir um gescu-Roegen. Na segunda tentativa, em do Partido de Esquerda (PG) elogia hoje “o
mento em decorrência de razões objetivas. partido político é muito difícil em meios 2002, a situação foi bem diferente, demons- poder de interrogação” que emana dos adep-
Por força das circunstâncias o decrescimen- que tendem a ser anarquistas”, lamenta trando o poder de disseminação dessas tos do decrescimento. “É preciso refletir de
to é o nosso destino”, avalia o deputado eco- Cheynet. Recentemente, alguns militantes ideias: um colóquio realizado na sede da maneira diferente a respeito do nosso modo
logista. Só nos restaria torcer, então, para que tentaram relançar o PPLD. Embora a agre- Organização das Nações Unidas para a de vida e nos perguntarmos, por exemplo, se
a crise acelere a conscientização da socieda- miação atraia muitos jovens, o seu porta- Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) devemos avançar sempre com rapidez”, afir-
de em prol do decrescimento, “para fazer voz, Vincent Liégey, reconhece que o pro- pela associação Ligne d’Horizon e do qual ma. Ele também critica “o produtivismo que
com que ele seja democrático e equitativo”. cesso para retomá-la ainda está um pouco participaram 700 pessoas, entre elas José insinuou a ideia segundo a qual tudo o que é
Esse ponto de vista, porém, está longe de “hesitante”. Curiosamente, o PPLD recusa- Bové, Ivan Illitch e Serge Latouche, colocou desejável deve se tornar necessário”.
ser compartilhado por todos. “De maneira se a divulgar seu número de filiados. “Não o termo em evidência. A Silence alcançou O Novo Partido Anticapitalista (NPA) é
alguma essa ‘pedagogia das catástrofes’ queremos nos tornar um partido de mas- grande sucesso e, posteriormente, dedicou outro interessado em se relacionar com os
descreve a realidade que estamos vivendo”, sas, não estamos à procura de novos mem- várias edições à exploração dos mais diver- expoentes do decrescimento. Tanto que, no
rebate Vincent Cheynet. O redator-chefe do bros nem de eleitores”, diz Rémy Cardinal, sos aspectos desse projeto. “O decrescimen- decorrer de algumas negociações, foi elen-
jornal La Décroissance (O Decrescimento) outro porta-voz desse micropartido. to talvez seja o grande tema do século XXI”, cada a possibilidade de convidar um mili-
avalia que “se a crise oferece uma oportuni- Em outra iniciativa, parte dos opositores pondera Michel Bernard, um dos colabora- tante do decrescimento para encabeçar
dade para questionar o mundo à nossa volta do crescimento lançou, em 2007, o MOC. O dores da revista. uma lista apoiada pelo NPA e o PG nas elei-
e a nós mesmos, ela apresenta também o ris- movimento já teria atraído cerca de 200 se- Desde 2008, outra publicação intelectual ções parlamentares europeias. A proposta,
co de engendrar tensões e gerar medo entre guidores e conseguiu eleger para cargos pú- de qualidade, a Entropia, que se define como contudo, acabou fracassando.
agostO 2009 Le Monde Diplomatique Brasil 15

com uma sociedade de pequenas cidades fe-


deradas, ele argumenta em favor da arbitra-
gem política dos conflitos entre os partidá-
rios do decrescimento. Mas há quem evite
questões delicadas, refugiando-se em abor-
dagens individuais que preconizam a “so-
briedade voluntária”. Outros creem nas vir-
tudes exemplares de iniciativas locais, como
a do movimento “Cidades em transição”, que
reúne cerca de 130 comunas – majoritaria-
mente na Grã-Bretanha – comprometidas
com metas de decrescimento energético e de
retorno a uma produção local.8
Contudo, o decrescimento ainda carece
de uma definição política positiva, que te-
nha capacidade de mobilizar da mesma for-
ma que o socialismo o fez nos séculos XIX e
XX. “Nós enfrentamos dificuldade quando
se trata de inventar uma nova narrativa para
o imaginário coletivo”, deplora Yves Cochet.
“Qual seria a utopia impulsionadora para
responder à pergunta: como viver melhor
com menos?”
A fórmula que reza que “quando há me-
nos bens, maiores são os laços” talvez não
seja satisfatória. É preciso “ampliar a gratui-
dade dos bens dos quais se faz bom uso e
proibir aqueles que são assimilados ao mau
uso”, preconiza Ariès, acrescentando que a
definição dessa utilização será produto de
deliberação política. Ele arremata: “O obje-
tivo é reduzir as desigualdades sociais”. De
fato, o decrescimento prejudicaria, em pri-
meiro lugar, os mais ricos.
Em última instância, é mesmo a questão
filosófica da “boa vida” que transparece co-
mo pano de fundo nesses debates. Trata-se
de substituir a concepção de um desenvolvi-
mento econômico ditado pela dinâmica
própria do progresso técnico por uma lógica
de arbitragem democrática.
O filósofo Patrick Viveret, interessado
nos questionamentos que fundamentam o
decrescimento, não aprova, contudo, as so-
luções propostas em seu nome. Ele recusa “a
proibição de considerar a felicidade como
uma questão política” sob o pretexto de que
os totalitarismos se arriscaram a adotar essa
abordagem. “Se nos recusamos a colocar
© Benett

democraticamente a questão do viver me-


lhor, em nome do que, então, iremos funda-
mentar um pensamento crítico do modo de
desenvolvimento atual?”
Liberais ou socialistas, os progressistas
têm em comum a meta de procurar aumen-
tar as riquezas materiais, reduzindo a ques-
tão da felicidade a um assunto de ordem
privada. Se as sociedades humanas, con-
Já os Verdes, paradoxalmente, parecem assumido. “A minha perspectiva é claramen- Poucos são os partidários do decresci- frontadas aos limites físicos da natureza,
não se preocupar muito com os conceitos re- te republicana, democrática e humanista”, mento que arriscam descrever algumas ca- não questionarem esse pressuposto, abre-
lativos ao decrescimento, apesar dos esfor- declara Cheynet, que na juventude chegou a racterísticas da sociedade que eles almejam. se a porta para um vertiginoso espaço de
ços de Yves Cochet. O anseio do partido por ser militante centrista. “O Estado-nação é, ao Em 2002, Cheynet foi um dos raros que acei- indeterminação política.
respeitabilidade e o peso de seus parlamen- mesmo tempo, ultrapassado e não desejá- taram se submeter a esse exercício.6 Numa
tares os afastou de tudo e de todos que possa vel”, rebate Latouche. Já Paul Ariès se posicio- “economia saudável, o transporte aéreo e os *Eric Dupin é jornalista.
atrapalhar sua expansão entre o eleitorado, e na no campo da República, ainda que siga veículos dotados de motor a explosão seriam
isso inclui o questionamento dos padrões colaborando com os católicos de esquerda condenados a desaparecer, e as embarca-
produtivos. Em dezembro de 2008, a moção da revista Golias. Pierre Rabhi, figura desta- ções à vela, a bicicleta, o trem e a tração ani- 1 Nicolas Hulot, “L’enjeu crucial des élections européen-
apresentada pelo partido no final do seu cada do decrescimento que tentou ser candi- mal os substituiriam”. A sociedade também nes”, Le Monde, 15 de maio de 2009.
2 Laure Nouhalat, “Rendre la décroissance désirable”, en-
congresso fez referência, pela primeira vez, dato à eleição presidencial de 2002, represen- evoluiria rumo “ao fim dos grandes centros
trevista com Paul Ariès, Libération, 2 de maio de 2009.
ao “decrescimento”, mas limitou este último ta, por sua vez, uma corrente espiritualista. comerciais, em proveito das lojas de bairro e 3 Para uma crítica radical desta corrente de pensamento,
às questões relativas à “pegada ecológica”.5 As concepções divergentes da democra- das feiras, e em direção à supressão dos ca- ver, entre outros, os Cahiers marxistes, Bruxelas, n° 235,
cia também atiçam as divisões. Há aqueles ros produtos manufaturados, em proveito maio-junho de 2007, ou ainda, “La décroissance, un point
Falta de projeto que querem investir nas instituições e apre- dos objetos produzidos localmente”. En- de vue parfaitement réactionnaire”, Lutte de classe, Paris,
n° 121, julho de 2009.
Paul Ariès se refere ao decrescimento sentar-se nas eleições, como Cheynet. Ou- quanto a reabilitação da produção local é
4 Ler “Militants de la gastronomie”, por Carlo Petrini, Le
como sendo uma “palavra-obus”, uma peça tros privilegiam a democracia direta ou o compartilhada por todas as correntes do de- Monde Diplomatique, agosto de 2006.
de artilharia destinada a abalar o produti- mandato imperativo. “A desconfiança em crescimento, a ideia de instituir moedas re- 5 A pegada ecológica visa traduzir de maneira compreensí-
vismo. Já Vincent Cheynet elogia a capaci- relação à democracia representativa é mui- gionais, defendida por alguns, é vista, em ge- vel o impacto de determinadas atividades humanas sobre
dade que esse vocábulo tem de “questionar e to forte nesses meios”, observa o pesquisa- ral, como uma medida demasiado extrema. os ecossistemas e o planeta. Ela é medida geralmente em
superfície (hectares por indivíduo, ou hectares consumi-
incomodar” a sociedade. Porém, a grande dor Fabrice Flipo. “Nós precisamos de uma É difícil acreditar que um programa des- dos por uma cidade ou um país para satisfazer suas ne-
fraqueza dessa corrente é não projetar um consolidação da democracia direta, mas sa natureza possa seduzir uma maioria de cessidades, por exemplo). É um indicador de sustentabili-
futuro possível para a humanidade. também da representativa”, pondera Paul eleitores. Por isso, Serge Latouche prefere in- dade ambiental.
Suas vertentes estão, acima de tudo, às Ariès. Já Serge Latouche tem uma maneira sistir no método de elaboração de uma “so- 6 Bruno Clémentin e Vincent Cheynet, “La décroissance
soutenable”, Silence, Lyon, fevereiro de 2002.
voltas com profundas divergências filosófi- diferente de expressar essa ambiguidade: ciedade autônoma”, com os seus oito “R”:
7 Serge Latouche, “Pour une société autonome”, Entropia
cas. Cheynet não arreda pé de suas posições “Eu me considero profundamente demo- “Reavaliar, Reconceituar, Reestruturar, Re- n°5, Malaucène, outono de 2008.
republicanas e universalistas, enquanto o crata, mas não sei o que é ao certo a demo- distribuir, Redimensionar (localmente), Re- 8 Ler Agnès Sinai, “Mirages verts et sobriété californienne”,
africanista Latouche é “relativista cultural” cracia”, afirma. duzir, Reutilizar, Reciclar”7. Enquanto sonha Le Monde Diplomatique, julho de 2009.

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