Portal Pró-Menino - O que (desejada por todos), nem a preparação MARCELO IHA representou para o senhor ser eleito o para vida profissional (desejada pelo Da redação do Portal Pró-Menino empreendedor social de 2007? mercado), por exemplo. Alguns anos FOTO: DIVULGAÇÃO atrás, a gente dizia que a escola era o Tião Rocha - Primeiramente, foi uma boa aparelho ideológico do Estado. Hoje, ela Imagem: Divulgação surpresa e uma honra ter esse prêmio. Por é o aparelho ideológico do Mercado, pois outro lado, é também um grande desafio atende aos interesses dele e está à sua ser reconhecido por um trabalho e, ao mercê, preparando gente como mão-de- mesmo tempo, tornar-se uma referência obra para um mundo volátil, excludente, para outras pessoas, educadores, projetos seletivo, individualista, amoral e e ter que me manter sempre atualizado. competitivo. Esta privatização da escola não produz educação, mas escolarização, Pró-Menino - Qual é sua principal e esse é o ponto fundamental. Para que contribuição para a educação haja educação de verdade e integral, brasileira nos dias atuais? temos que pensar além dos muros da escola, além das necessidades do Tião - Fazer a separação entre o que é mercado e além do conteúdo focado pré- “educação” e o que é “escolarização” e formatado. Temos que pensar em outras Tião Rocha ganhou o prêmio propor não só caminhos alternativos, formas de aprendizagem e não apenas Empreendedor Social de 2007. mas também alterativos, opções para de “ensinagem”, por isso a chamada que tenhamos uma escola mais eficiente educação não-formal está fora da fôrma, Ele criou a “pedagogia da roda”, fez e comprometida com a nação e com pois se aprende e se ensina outras “coisas” uma educação verdadeira e integral para relativas ao dia-a-dia, à cidadania, à ética, de um pé de manga uma sala de aula todos os meninos. Acredito que nossa à rua, à casa, à solidariedade, ao trabalho, diferente e inventou jogos educativos grande contribuição é pensar fora da à igreja, ao clube, às relações sociais, à vida para ensinar alunos com dificuldades social ativa. Se pensarmos em educação caixa, do padrão ou do modelo histórico e em determinadas áreas. O educador institucionalizado que está incrustado no integral no sentido pleno, ela vai muito mineiro Tião Rocha, de 59 anos, sistema educacional escolar brasileiro. além da escola, já que esta sozinha não fundou o Centro Popular de Cultura consegue, nem pode e nem deveria querer e Desenvolvimento (CPCD) há 24 anos Pró-Menino - Faz sentido a separação dar conta de tudo, da complexidade que com uma metodologia de educação entre a educação formal, aquela que é a vida de hoje. Precisamos construir que “incomoda aqueles que não se dá dentro do espaço físico, e a mais espaços e tempo de aprendizagem querem sair do lugar”, nas palavras educação informal, que acontece em e de humanidade, portanto, de educação. dele mesmo, e critica a chamada outros espaços de aprendizagem como Precisávamos mesmo separar e clarear o “escolarização”, atualmente praticada projetos sociais, que são cada vez mais trigo do joio nessa história. pela maioria das escolas brasileiras. presentes no Brasil?
Tião - Primeiro precisamos separar “A escola atualmente não
A experiência de Tião foi exportada forma pessoas éticas, justas, o que eu chamo de “educação” e para países como Moçambique, “escolarização”. Educação é um fim. dignas, solidárias, pois está Angola e Guiné-Bissau, na África, Escolarização é um meio. Existe um comprometida com os interesses e sua iniciativa foi reconhecida projeto de escolas que trabalha dentro do mercado, do qual tornou-se recentemente pela Fundação Schwab da fôrma e, na maioria das vezes, dentro aparelho ideológico” e o Jornal Folha de São Paulo, com do formol, ou seja, é uma escola que está o prêmio Empreendedor Social de fechada em si mesmo, tem um conteúdo 2007, que busca identificar líderes já pronto, um currículo fossilizado e Pró-Menino - Algumas experiências de organizações que desenvolvam pré-definido há muitos anos, que não iniciadas em Curvelo (MG) já estão produtos ou serviços voltados à se atualiza. Por isso o formol. Só muda sendo adotadas em outros países como melhoria da qualidade de vida e que a data de ano para ano, mas o conteúdo, Portugal, Angola e Moçambique. Como o programa e as matérias são os mesmos. foi a entrada nesses países e por que são exemplos a serem seguidos. E, na maioria das vezes, até o jeito de eles se interessaram pela sua proposta ensinar é o mesmo. Essa dita educação de educação? Em entrevista concedida ao Portal Pró- produzida nesta escola não educa, mas Menino, o educador conta sobre suas apenas escolariza, se reproduz ano após Tião - Começamos em Curvelo há 24 experiências pessoais e profissionais, ano. Este é o aspecto crucial para mim, anos, a partir de uma pergunta: é possível e como são as concepções inovadoras pois a escola não consegue cumprir fazer educação sem escola, sem prédio, que possui na área da educação. nenhuma função social importante, sem estrutura física, ou é possível a gente Confira abaixo a conversa na íntegra. nem a formação educacional integral fazer uma boa escola e uma boa educação debaixo do pé de manga? Essa experiência gerou isso fosse a solução. Um outro aspecto Neto teve todas as escolas, fez MBA, pós- o projeto “Sementinha”, a escola debaixo da é que, se mostrarmos escolas em prédios graduação, etc, mas esse individuo, com mangueira, que demonstrou na prática e depois com boa estrutura física, levantamos certeza, nunca teve uma aula de ética de muita experiência e muita “desaprendizagem” as seguintes perguntas: esses meninos e não sabe o que é isso, caso contrário, que é possível, sim, fazer educação sem escola. estão aprendendo bem? Eles estão se não faria tanta roubalheira. Para um caso Aprendemos também que só é possível fazer transformando em cidadãos melhores? É desses, que é um desastre, a universidade boa educação com os bons educadores. E isto preciso começar a avaliar isso. Imaginemos onde ele estudou deveria tomar-lhe é vital, porque os educadores ruins fazem os garotos que colocaram fogo no índio o diploma, porque ele rompeu com o educação ruim. Essa experiência expandiu-se em Brasília. Com certeza eles estudaram juramento. Era o mínimo que deveria ser gradativamente pelo interior de Minas, Vale de nas melhores escolas da cidade, nos feito a bem da moralização do ensino São Francisco, depois para a Bahia, Maranhão, melhores prédios e com ótima estrutura superior brasileiro. E a universidade Vitória, no Espírito Santo, Vale do Jequitinhonha. e tiveram o máximo de escolarização. No deveria pedir desculpas à sociedade por Um belo dia, algumas fundações internacionais entanto, provavelmente a educação foi ter formado e diplomado pessoas como que estavam muito preocupadas e atuando zero, porque é impossível que um jovem o Dr. Lalau. Da mesma forma que ela nessa questão da educação e da escolarização seja capaz de fazer tamanha atrocidade. deveria ser cumprimentada pelos bons nos paises do 3o. Mundo nos convidaram a Então essa escola contribuiu ou deixou exemplos de cidadãos formados. Para levar isso para a África, e assim começamos a de contribuir com o quê? Por isso, não é o mim, nossa escola deve nos preparar trabalhar em Moçambique, com educadores que lugar onde estão, mas o que efetivamente para a construção de uma nação, de um trabalhavam com crianças e jovens que viviam aprendem e o que dá sentido à vida das país, e não apenas de mão-de-obra. Se nos campos de refugiados de guerra. Ali, era um pessoas. queremos um país ético, justo, com menos país destruído pela guerra civil e que tentava corrupção, solidário, como podemos ter se reorganizar, realocar a população que vivia uma escola que prepara pessoas só para andando de um lado para o outro, perdida em “É necessário rever os o mercado, em que vale tudo e o mais campos de refugiados. Buscavam fixar essas parâmetros e paradigmas esperto leva todas as glórias? Acredito pessoas e criar um processo de educação. Eles educacionais para construirmos que esse modelo é um grande equívoco e reconheceram que o projeto “Sementinha” era o Brasil que queremos” que estamos em um momento crucial, em uma possibilidade. Fomos para lá e a idéia se que é necessário rever tais parâmetros e expandiu, e depois adotaram nossas pedagogias paradigmas para construirmos o Brasil que também na Angola, Portugal e outros lugares, Pró-Menino - E o que mais te queremos e necessitamos. Se temos uma num processo de apropriação e adequação desagrada na educação formal? escola medíocre, de segunda categoria, o comunitária, segundo as necessidades de cada país também continuará assim, um país país. Tião - A educação formal não cumpre de segunda, então precisamos pensar sua missão, pois a escola não educa, qual escola queremos ter. Eu acho que Pró-Menino - Na questão do espaço físico só escolariza. E outro ponto é que, podemos vir-a-ser os campeões mundiais da escola, ouvimos muito nos noticiários e atualmente, ela não forma pessoas de educação e construir escolas tão boas jornais casos de crianças de diferentes séries éticas, justas, dignas, solidárias, mas e eficientes quanto as nossas seleções e dividindo a mesma sala por falta de espaço, está comprometida como um aparelho equipes esportivas. e que ficam sentadas no chão por falta de ideológico do mercado que, como falei, cadeiras. O senhor defende que o espaço é volátil, e está formando pessoas para Pró-Menino - O Portal Pró-Menino físico é dispensável para a educação? o mercado de trabalho, para serem é um projeto comprometido com a competitivos, eficientes, e ganharem o implementação dos direitos da criança Tião - Recentemente, vi na televisão uma série máximo no mínimo de tempo, não importa e do adolescente. Qual é, na sua de denúncias e situações de escolas em fundos se eticamente ou não. E o pior é que nem visão, a contribuição do Estatuto da de casa, garagens e lugares absolutamente isso a escola brasileira está fazendo bem. Criança e do Adolescente (ECA) para inapropriados. O grande problema na minha Basta vermos os últimos resultados do a educação brasileira? opinião não era o lugar, mas o conteúdo daquela exame do Programa Internacional de escola, pois em uma dessas reportagens, dizia Avaliação de Alunos (Pisa), que mede a Tião - A grande conquista do ECA foi que os meninos estavam ”aprendendo” sobre avaliação de estudantes de 15 anos nos trazer para a pauta da sociedade e das meio ambiente, enquanto estavam lá sentados campos da leitura, escrita, matemática políticas públicas a importância e o num lugar que parecia um lixo! Por isso, o e ciências. Os alunos brasileiros foram valor da criança e do adolescente como problema maior não é o espaço, e sim o conteúdo uma calamidade, e ficaram nos últimos prioridade em todas as ações e políticas. e a forma, porque não depende se o menino está lugares, ou seja, essa escola não consegue Já temos alguns anos de existência dessa sentado em uma cadeira confortavelmente ou nem preparar gente para esse mercado, lei e da dificuldade de implementação, sentado em cima de caixote. Se o aluno aprende muito menos pessoas dignas e decentes. ou seja, sair do desejo e da legitimidade algo que não tem nada a ver com a sua vida e E quando falo escola, não é apenas a para a prática, e fazer com que as sua realidade, isso não afeta sua formação. O escolinha lá do interior, de ensino básico pessoas e instituições assumam o equivoco dessas matérias da imprensa é o foco ou pública, mas também a universidade. ECA como um exercício diário de vida simplesmente na escola como prédio, como se Por exemplo, o ex-juiz Nicolau dos Santos digna e cidadania plena para todos os meninos. Nesse aspecto ainda falta muito, por Pró-Menino - O que o senhor acha uma compensação que foi fundamental exemplo, segundo dados do SIMAVE, de 2003, na mudança do LBD que insere os e me marcou muito, pois meu ambiente dos alunos com oito anos de escola, somente direitos da criança e do adolescente comunitário era muito bom. Isso me 3,3% das crianças do Vale do Jequitinhonha no currículo do Ensino Fundamental? ajudou muito não só a enfrentar, mas alcançaram o índice de suficiência, enquanto também a estabelecer uma formação 96,7% estavam abaixo desse índice em uma Tião - Tenho muito receio dessas medidas melhor. Por isso sou contra tirar os categoria chamada de insuficiência. E mais de que visam “curricularizar” a vida, pois meninos da rua. Não quero tirá-los de lá, 50% deles estavam num estágio chamado de quando se pega qualquer assunto e o mas sim mudar a rua, pois ela é o lugar estado crítico. Essa estatística mostra a falência coloca em uma grade curricular, pode da cidadania, da manifestação cívica, por do sistema de ensino porque se mais de 96% ser uma forma de se ter controle e onde passam as procissões religiosas, desses estudantes não aprenderam, a escola virar apenas uma matéria a mais. O onde se comemoram títulos de futebol, formou uma massa de gente analfabeta e semi- que era para ser bom, vira uma chatice. onde há o ato público, a festa popular, analfabetos. Essas crianças não serão cidadãos Imagina se o tema Solidariedade virar a passeata pela greve ou manifestação por inteiro, mas só meio cidadãos, pois não matéria curricular, nada garante que o pelos direitos da criança, pelos direitos terão acesso e possibilidade de se desenvolver índice de solidariedade entre as pessoas humanos, etc. Quer dizer, a rua é um plenamente, nem no próprio no mercado de vá aumentar. O que precisa é praticar espaço importante de aprendizagem, trabalho. E o que aconteceu? Nada! A culpa do sempre, todo dia, a solidariedade e não então por que temos que tirar os meninos fracasso escolar ficou na conta das próprias ter trabalho e prova sobre o assunto. Na e meninas dali? O lugar deles é na rua, crianças, de vitimas passaram a culpados pelo época dos governos militares, em toda na praça, no coreto, no shopping, nos próprio analfabetismo. O Conselho Tutelar ou o escola tínhamos uma disciplina chamada estádios, nas escolas, em todo lugar. Ou Conselho de Direitos deveriam intervir nessas “Educação Moral e Cívica” no ginásio, ele é cidadão por inteiro ou ele é cidadão escolas e obrigá-las a alfabetizar e bem todas Organização Social e Política Brasileira/ “meia boca”, e me incomoda muito esses as crianças. É um direito inalienável delas. OSPB no 2o. Grau, e Estudo dos Problemas discursos que dizem demagogicamente Todos os meninos que passam oito anos no Brasileiros/EPB nas universidades, que a “lugar de criança é na escola”, pois eu falo ensino fundamental deveriam sair da escola moçada chamava de “estuprobrás”. Todas que é na escola só se for aprendendo. E bem formados, alfabetizados integralmente, e eram obrigatórias, repletas de doutrinas e o que tento fazer atualmente é trabalhar isso é obrigação do Estado e da Sociedade, um ideologismos, quando não de propaganda em comunidades que façam das suas direito previsto pela Lei. Nunca vi ou ouvi falar, estatal. Por isso, tenho receio dessa ruas e bairros, espaços permanentes mas gostaria de ver um Conselho de Direito ou mudança na lei, porque deve haver uma de educação. Eu tive a possibilidade Tutelar pedir ao Ministério Público para fechar prática diária dos direitos das crianças e de viver numa rua muito boa, que me uma escola por incompetência ou a obrigasse dos adolescentes, e não ficar guardando ajudou muito para a não-aceitação do a alfabetizar todos os alunos, sem exceção. isso como aula na grade curricular. Como modelo padrão e autoritário de escola e Metade das escolas desse país teriam que ação viva da educação, acho muito legal e de educação. Tudo isso foi fundamental ser fechadas ou multadas pelo PROCON (por importante, mas o duro é ter uma aulinha para minha vida e para a opção do que enganarem o consumidor) por não entregarem disso por semana no meio de dez aulas faço e acredito hoje. à sociedade os estudantes preparados como de matemática e outras tantas matérias, prometido e previsto pelo ECA. Não adianta e a cidadania tornar-se um adereço ou ficar fazendo programas paralelos, a escola deve alegoria. Aí é bobagem e perda de tempo “Ao contrário de a maioria ter o compromisso e a obrigação de ensinar a para quem ensina e quem aprende. das instituições dizerem que todos sem excluir. Se o menino não aprende, a temos de tirar os meninos da culpa não é dele, mas da escola, pois todos são Pró-Menino - Como suas experiências rua, não quero tirá-los de lá, aptos para aprender tudo, no seu tempo e no escolares influenciaram as opções mas sim mudar a rua” seu ritmo. Deveria ser proibido deixar qualquer profissionais e a prática como criança sair da escola sem aprender o mínimo educador atualmente? necessário para sua vida social, como cidadão brasileiro. No dia em que isso acontecer, o ECA Tião - Minha experiência na escola Pró-Menino - Como a família foi torna-se efetivo. foi ruim, como a maioria das crianças importante na sua formação? no Brasil. Tive uma escola excludente, seletiva, preconceituosa e racista, porque Tião - A família é importante para todo era uma escola branca, européia, cristã mundo, mas quando falamos nela, “Gostaria de ver um Conselho de e capitalista como é, até hoje. Percebi também temos que ter claro do que e de Direito ou Tutelar que pedisse ao que tinha duas alternativas: ou eu me quem estamos falando. Família pode ser Ministério Público para fechar ajustava e aceitava aquilo como valor, o pai, a mãe, os irmãos, os primos e todas uma escola por incompetência ou ou me rebelava. É claro que optei pela as relações de parentescos envolvidas. a obrigasse a alfabetizar todos segunda, e isso tem um preço a se Boa parte das famílias de nosso país só pagar, pois a maioria daqueles que se tem a mãe com uma penca de filhos os alunos, sem exceção”. rebelam, tornam-se os marginais, os porque o pai sumiu. Outras têm só a meninos-problema. Por outro lado, tive avó, e há crianças que saíram de casa para refazer sua família nas ruas, nas gangues, demitir porque nenhum professor de em Moçambique que “para educar uma nas galeras. O Mapa da Exclusão de São Paulo, universidade pública brasileira faz isso criança, é necessário toda uma aldeia”. inclusive, mostrava que 34% dos meninos que e que nunca havia tido um caso assim Então uma cidade deve ser sempre uma viviam na Praça da Sé, saíram de casa para não naquela universidade. Ele não tinha nem cidade educativa, uma grande aldeia. O perder a família, e foram constituir a sua família o formulário, então falei: “Pode deixar importante é trabalhar esse potencial na rua, que era a gangue. Todo mundo precisa que eu crio! Fui!” Ao sair dali, comecei um e disponibilizá-lo como possibilidade ter família porque, para mim, família significa o novo caminho e criei o Centro Popular de concreta para criar uma vida melhor para ninho, o colo que todos nós precisamos. Deve Cultura e Desenvolvimento (CPCD) há 24 todos. ser um lugar que te receba, que te acolha e que anos, para ser uma instituição guarda- te dê a possibilidade das relações de afeto. Nesse chuva que pudesse abrigar as nossas Pró-Menino - Como isso pode ser aspecto, precisamos oferecer o que eu chamo perguntas e fosse um exercício de ser feito? de cafuné pedagógico para todos aqueles que aprendiz permanente. não o tiveram. Só se consegue fazer cafuné nos Tião - Pela nossa experiência, outros quem teve cafuné na vida, pois isso é construímos a “pedagogia da roda” algo eminentemente íntimo e familiar. Eu tive “Professor é aquele que para que todo mundo pudesse se ver, e o privilégio de ter um ninho do ponto de vista ensina, e o educador é percebemos que na roda, com as pessoas das relações de parentesco, mas também fui aquele que aprende” confortavelmente instaladas, não tem acolhido por meus amigos na rua, construimos ninguém que manda. Numa roda as laços de companheirismo e familiares e tudo informações circulam de um lado para isso cria os ninhos, forma a família que todos Pró-Menino - Então como deveria ser o outro e o que comanda é o conteúdo, nós precisamos. a formação de um educador? são os desejos, os conhecimentos e os interesses de todos que estão na roda. Pró-Menino - O que fez o senhor optar pela Tião - Ser educado é um dos fins da nossa Quem está sentado na roda é educador, carreira de educador? vida, já que viemos ao mundo e temos e não importa se é criança ou adulto. pouco tempo aqui (não há segundo Começamos a perguntar o que iríamos Tião - Tenho formação em história e turno na vida, é turno corrido). Nós estudar e aprender juntos, e como antropologia. Fui professor durante muito somos inquilinos (não proprietários do cada um tem um desejo aparecia uma tempo. Dei aula no ginásio, no científico, no mundo) e estamos de passagem e para listagem com 30 ou 40 assuntos. Em um segundo grau e então fui para o terceiro grau, quê? - para ser educados, livres, felizes primeiro momento, começamos a usar a pós-graduação, mestrado, etc. Em determinado e ter saúde, penso eu. Por isso acredito lógica econômica, selecionando o que é momento, por volta de 1982, era professor na que a educação é fim (e não meio) e o mais importante e fazendo uma eleição Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP-MG) educador é aquele que cria as condições do tipo “maioria vence“ e decide estudar. e me dei conta de que eu não queria mais ser para as pessoas aprenderem tudo e Isso é bacana como prática de exercício da professor. “Agora quero ser educador” dizia e todo o tempo. Educador é aquele que democracia. Mas, no aspecto educacional, comecei a falar sobre isso com meus colegas, possibilita às pessoas a aprendizagem é uma lástima porque se um determinado mas eles respondiam que os dois eram a mesma para a realização plena de todo potencial tema proposto por uma criança qualquer coisa, sinônimos, com o mesmo salário e a humano que trazemos e construimos. fosse vetado e ele “perdesse” no primeiro, mesma chatice. Mas eu dizia que não, que eram Então a educação deve preparar para que segundo e terceiro momentos, na quarta coisas diferentes. Eles perguntavam qual era a cada um seja um grande aprendiz com vez que tivesse nova a eleição ele nem diferença e eu falava: “Professor é aquele que os outros, com o todo. Podemos definir entraria, pois já teria se excluído ou ensina e o educador é aquele que aprende.” Eu educação como quisermos, mas ela só pensaria: “Poxa, vou embora porque preciso parar de ensinar e começar a aprender, acontece no plural. Não existe educação nunca ganho. O que me interessa nunca e a universidade deveria deixar de ser uma no singular, pois para que haja educação, interessa ao grupo.” E uma escola que instituição de “ensinagem” e se transformar é necessário no mínimo duas pessoas. E exclui, não educa! em uma instituição de aprendizagem de fato. educação não é aquilo que eu ou o outro Precisamos aprender porque se não a gente sabemos, mas o que nós conseguimos Pró-Menino - E então o que fizeram? fica fechado intra-muros e paredes, cheirando trocar e aprender juntos, é na soma (1 + a mofo e respirando gás carbônico, porque 1 = 3) que se aprende junto com o outro Tião - Com isso, percebemos que aqui não entra oxigênio para arejar. Foi quando e se produz o milagre da educação. Por se continuássemos daquele jeito, percebi que a universidade, ao invés de se abrir isso, penso que a formação do educador perderíamos os meninos e, para não e se arejar, foi fechando as portas e as minhas deveria preparar o indivíduo para ser perder ninguém, mudamos o jeito possibilidades. Então me dei conta de que não um aprendiz permanente, com uma de fazer, e a eleição ficou proibida. A podia ficar naquela instituição, pois ela não capacidade de ouvir e de aprender de eleição, tipo a maioria vence, é boa queria educadores, mas só professores, gente uma forma generosa e intensa. Quando como exercício de vida democrática, que saiba ensinar e repassar a informação. a gente consegue despertar nas pessoas mas não como processo educacional Por isso pedi demissão e, para minha surpresa, que todos nós temos esse potencial de porque exclui pessoas. O que temos que quando fui ao departamento pessoal, o educador, percebemos que é possível aprender é construir consensos. E o que chefe do setor dizia que eu não podia me fazer isso em escala maior. Aprendi lá isso significa? Se temos uma pauta com 40 assuntos, ótimo, vamos organizá-los como teima em ser o aparelho ideológico do em tecnologias de aprendizagem e de prioridades... O que é mais importante para mercado. Atualmente, muitas famílias, convivência (os TACs). É necessário esse se estudar hoje, amanhã e assim por diante, principalmente da classe média, colocam exercício de ritmo, tempo e pulsação no até trabalhar com todos os assuntos. Então o filho em determinada escola infantil processo de aprendizagem. O educador é percebemos que a participação era de muito ou pré-escolar porque pensam que a um construtor de pedagogias próprias. E mais qualidade, todas as opiniões e propostas escola possa preparar a criança para deve ser verdadeiro. Não adianta a gente eram valorizadas porque não queríamos perder o vestibular, desde pequeno. Aliás, querer que ele saiba ou tenha a resposta nada e queríamos estudar tudo. Também existe até “vestibulinho” para maternal para tudo, mas ele precisa ser uma pessoa percebemos que, ao fazer novos consensos, e pré-escola. Ou seja, é uma escola curiosa, instigante, que queira aprender os assuntos adquiriam mais qualidade e o que instrumentaliza e treina o menino, junto, que seja curiosa e pesquise envolvimento era muito maior nas rodas. desde cedo, para passar numa prova, e todo dia. E outro ponto que nossos não importa se ele vai ser feliz, ser boa professores ainda não descobriram, é “Educação só acontece no plural. Não existe gente ou ético. Depois de passar, ele vai que esta é a única categoria profissional no singular, pois para que haja educação, é pegar um diploma para ter um emprego, que tem o privilégio e a honra de estar necessário no mínimo duas pessoas” ganhar dinheiro, ficar rico e poderoso. Se, diante de seu “cliente”, que são seus Pró-Menino - Deu certo? futuramente, ele cair nas operações da alunos, todos os dias. Isso não acontece Polícia Federal por roubalheira, ninguém com o psicólogo, nem com o médico, Tião - Sim. Isso não era problema nem estará preocupado com a sua formação. o engenheiro, o advogado, o padre ou dificuldade. Pelo contrário, era uma solução. Percebam o seguinte: a maioria das o bancário, pois eles encontram seus Não se faz isso na escola porque é mais pessoas acusadas de crimes contra o clientes de vez em quando, ao ir ao banco, cômodo para quem ensina achar que todo patrimônio público, nos últimos anos, à igreja, ao hospital, etc. Já o professor mundo precisa aprender a mesma coisa, do têm um vasto currículo escolar. A maioria está diariamente com o aluno, ou seja, se mesmo jeito e no mesmo tempo, o que é um tem curso superior! Portanto, temos um ele quiser, pode rever e passar o mundo equivoco, de um autoritarismo tremendo. problema, já que essa escola não formou a limpo todos os dias. Isso é fundamental Hoje, as crianças têm muita clareza disso cidadãos. Se a gente começa a trabalhar porque se ele tiver esse jeito de olhar e porque alguém decide o que elas precisam com as crianças lá na base, não é tempo a vontade de fazer, ele pode fazer uma aprender, que existe uma autoridade, mas perdido, mas sim um investimento, e a transformação fantástica. Por outro lado, o que elas precisam aprender efetivamente escola pode fazer isso nos quatro anos se ele acredita que os meninos passam é saber respeitar, socializar, ter tolerância, de ensino básico. Os estudantes precisam quatro anos para aprender sempre a solidariedade e criar relações de justiça. sair de lá aptos para aprender a viver bem mesma coisa, com repetição e perda de Tenho citado um caso que aconteceu comigo e dignamente, dominando os códigos de tempo, aí acaba criando um lugar que fica recentemente, quando uma aluna de nove leitura, de escrita, de comunicação e de chato para ir, ficar e conviver. Por isso anos me disse que nas férias havia esquecido bem-viver. E há assuntos que só serão sempre coloco um grande desafio, sobre o que era “hectômetro” e estava preocupada se vistos lá no segundo ou terceiro grau, ou qual seria a escola ideal: é aquela em que este “assunto” caísse na prova. Disse-lhe que quando ele quiser estudar, pois na vida os alunos, professores e funcionários ela (nem mingúem) precisava saber isso e que é possível se interessar e aprender tudo queiram ter aulas aos sábados, domingos nem cairia na prova. Perguntei se ela sabia o e o tempo todo e de todas as maneiras, e feriados, por exemplo. O outro lado, ao que era centímetro, metro e quilômetro, e ela e não temos só a escola o tempo inteiro contrário, que é só falar de um feriado respondeu que sim. Então eu disse: “Minha para nos ensinar. à vista que todos ficam felizes. Muitos filha, você está pronta para andar pra baixo professores pensam assim e dão graças e pra cima, medir as coisas, vai viver a vida Pró-Menino - Pela sua metodologia, a Deus quando ficam três dias ou uma inteira e ninguém vai te pedir para medir ou te nos exemplos que o senhor citou da semana sem ver aqueles “capetinhas”. E mostrar nada em hectômetro. Isso só interessa pedagogia da roda e da conversa do outro lado, com os meninos, acontece para a pós-graduação, no doutoramento de com a menina sobre o hectômetro, a mesma coisa, pois eles falam: “Oba, matemática, física, sei lá...”. Passado alguns é necessário estar sempre atento vou ficar sem ver aquela jararaca!” Ou dias, ela voltou. A questão caíra na prova e ela às demandas dos alunos. O senhor seja, temos um problema de relação, perdeu nota. Imagine quanto desperdício de acredita que o educador é um pouco enquanto o professor fica copiando tempo e de talento por causa de inutilidade... como um psicólogo? coisas em que não acredita na lousa, As crianças têm que aprender brincando, mas porque alguém mandou fazer, e os aprender a serem justas e solidárias. Esses Tião - Não sei se o educador deve ser alunos obrigados a copiar aquilo que não temas devem ser deixados para a época certa, um pouco psicólogo. Ele precisa ser um faz sentido na vida deles. Então um finge no ritmo, no tempo e no momento necessários aprendiz permanente e bom ouvinte, que ensina, o outro finge que aprende, a para a vida das crianças. Então essa é a grande ele precisa aprender a transformar escola finge que existe e o Estado finge questão: se nós quisermos realmente aprender, os saberes, fazeres e quereres das que paga, criando essa relação de mútuos temos que fazer o exercício de humildade crianças e dos jovens em instrumentos fingimentos. E as pessoas imaginam que e não pensar que nosso conhecimento de de aprendizagem para todos. Então eu está tudo certo, mas depois estouram as adulto, ou professor de escola são os únicos falo que é como usar as tecnologias da estatísticas de violência, criminalidade, e e os únicos verdadeiros. Mas, infelizmente, informação e da comunicação (os TICs) alguém grita que o motivo é a falta de reafirmo que o nó da questão é que a escola para transformá-las em conhecimento, investimento em educação... Pró-Menino - E para os mais “violência zero”, e assim por diante. “ Pa r a e d u c a r u m a c r i a n ç a , “progressistas”? Precisamos zerar esses déficits e, para isso, temos que criar o Setor Zero. Não é é necessária toda uma aldeia”. Tião - Estes vejo que eles assumem muito questão de saber se isso é responsabilidade como uma bandeira e, nesse caso, a de A, B ou C, porque é responsabilidade grande dificuldade é executá-la e colocar de todos nós, por uma questão ética, e a em prática. Vemos pessoas fazendo coisas ética serve para todo mundo. Temos que Pró-Menino - Como o senhor vê o uso da extraordinárias de forma anônima na cuidar do nosso ethos, de nossa morada, tecnologia da internet na educação? escola, na sala de aula ou na comunidade, do sentido da nossa vida, por uma razão mas com muita dificuldade de serem ética e transformar isto numa bandeira, Tião - Qualquer que seja a tecnologia, ela será reconhecidos porque a diretora da escola numa causa nacional, do país todo, e não sempre um instrumento a serviço da nossa não admite ou a superintendência de trata-las como questões setorizadas e educação olha com maus olhos. E a sempre terceirizadas. humanidade e, se for bem usada, pode ser Secretaria da Educação e o MEC nem muito legal. O acesso à informação pela internet sabem ou imaginam que existem e o Pró-Menino - Como a cultura possibilita transformação das tecnologias de popular pode contribuir para o que está acontecendo lá na ponta. Mas informação e de comunicação (os TICs) em existe muita coisa positiva, e vejo que ensino de matérias tradicionais como tecnologias de aprendizagem e convivência (os estamos fazendo basicamente algo que matemática e ciências? TACs). E isso é a própria pessoa que faz, não é vai na contramão da lógica e dos teóricos o computador. É o menino com a capacidade da economia, da política, pois podemos Tião - Aqui no CPCD criamos o MDI de transformar aquilo que leu em valor, e isso fazer política pública não-governamental. (de quantas Maneiras Diferentes e serve para todos e para qualquer mídia, como Quem disse que só o Estado faz política Inovadoras) podemos, por exemplo, a televisão, a internet, outras linguagens, os pública e que nossa sociedade civil ensinar matemática ou ciências para uma livros e todas as pedagogias. Os “tics” devem organizada e desorganizada também criança. Se perguntamos aos educadores estar sempre à disposição dos “tacs”. não faz? Podemos fazer algo de caráter vai aparecer, provavelmente, uma lista coletivo, para o bem-estar de todos, e esse com mais de 80 possibilidades ou MDIs, é o novo paradigma, quando se começa em que provavelmente uma delas será Pró-Menino - Como a sua concepção a romper com determinadas lógicas e por meio da cultura popular. Se funcionar, de ensino e de aprendizagem é vista por ótimo. Se não funcionar, usamos outra quebrando um monte de barreiras. Esta outros profissionais da área de linha mais lógica de dividir os espaços de atuação em maneira, mas o importante não é pegar tradicionalistas? compartimentos estanques, a “educação a cultura popular como solução dos bancária“ que Paulo Freire criticava “problemas da lavoura”. Claro que, tudo Tião - Nunca fiz uma avaliação rigorosa disso, quando dizia da relação do ensino e que for ligado à tradição das crianças, da mas o que observo é que incomoda muitos os aprendizagem, temos o Primeiro Setor sua comunidade, da sua herança cultural, tradicionalistas, pois cutuca e mexe na ferida, que é de responsabilidade do Estado, o aproxima ela do mundo. Mas será muito ele se sentem incomodados e tentam reagir. Segundo Setor que é da área do mercado, chato se usarmos isso somente como Claro que quem é tradicionalista e conservador e o Terceiro Setor que é da sociedade. Mas uma instrumentalização da cultura para não quer sair do lugar, e toda vez que se faz ao olhar o aspecto da eficácia dos três atender a um interesse que não tenha a setores, percebemos que não funciona, ver com ela. Por exemplo, lá em Curvelo uma provocação, ele precisa se sacolejar, porque eles ficam numa briga, em que (MG) havia um garoto de 11 anos que tirar a poeira e o ranço. Também é cômodo um setor acusa o outro e, enquanto estava na primeira série, pois todo ano ficar no mesmo lugar quando ninguém cobra ele era matriculado, repetia, mas era isso, ninguém resolve nada. Por isso, resultados e fica empurrando com a barriga. defendo cada vez com mais veemência resistente e persistente, se matriculava Por isso, incomoda muito mais pessoas como que devemos criar o Setor Zero, que de novo no primeiro ano e não aprendia os gestores de políticas de ensino, secretários não é comandado nem pelo Estado, de jeito nenhum. A escola não conseguia e ministérios. Essa turma toda se sente muito nem pelo mercado, nem pela sociedade, ensinar a ele as quatro operações básicas amarrada a algo que julgam muito maior que mas sim pela ética. Por exemplo, não é da aritmética, mas ele sabia jogar dama eles, que é o dito sistema, que pensam estar ético que, em pleno século 21, tenhamos muito bem e ganhava das pessoas nesse pronto e acabado. Chegam lá só para cumprir crianças analfabetas e isso não é uma jogo. E aquilo nos incomodava muito, pois tabela, aplicar regras e normas caducas e a questão econômica ou social. Temos o menino era bom de espaço e de lógica. maioria não quer nem tentar mudar, preferem que pensar em “analfabetismo zero” e Por que ele não aprendia a matemática? seguir o mesmo raciocínio com pessoas Na realidade, o aprendizado foi nosso, pois fazer pequenas reformas, são reformistas, que passam fome nesse país com tanta eu achava que matemática e aritmética não transformadores. Quando se mexe na riqueza, e pensar em “fome zero”. Não eram coisas iguais, mas são coisas possibilidade de construir o novo, é preciso absolutamente diferentes. Matemática é é ético que haja degradação ambiental, mudar de posição para ter outra perspectiva, desmatamento, queimadas na natureza, a forma de pensar usando o raciocínio pensar e agir de forma sistêmica, sair da caixa então pensamos na “degradação zero”, lógico, já aritmética qualquer maquininha e da fôrma, pois não dá para transformar a e também podemos aceitar a violência faz. Então pegamos o tabuleiro de damas sociedade sem sair do lugar. contra mulheres e crianças, por isso e enchemos com números variados e colocados aleatoriamente. Como ele jogava história, e durante seis meses estudei a Se o sistema estiver funcionando como com tampinhas de garrafa de refrigerante, mitologia greco-romana, mas nunca tive gerador e produtor de cidadania, de colocamos um sinal de “+” ou de “-” em cima, uma aula sequer de mitologia yorubá solidariedade, de um país mais justo, e ele só podia comer uma peça na jogada se ele . Eu nunca pude falar, nem aprender ele também vai mal, porque não tem fizesse uma conta de soma ou subtração. Se ele sobre a minha tia rainha, nem sobre a alcançado estes resultados e, parece, errasse, o outro faria no lugar dele. Em pouco cultura yorubá. Como é que pode um que não tem compromisso com essa tempo e dessa forma esse menino aprendeu país mulato, negro em sua essência questão. Então estamos em uma grande a calcular, somar, subtrair e multiplicar. E e que tem na negritude uma de suas encruzilhada, vivendo uma demanda nós percebemos que tínhamos criado nosso raízes de força, beleza e talento, e não fundamental que a sociedade brasileira primeiro jogo, uma mistura da dama com a ser razão de nosso aprendizado? Temos deseja: uma educação de qualidade para matemática, que chamamos de “damática”. Ele essa cultura fantástica e fundamental seus filhos, netos e tataranetos. Por isso, funciona para resolver dificuldades dos meninos para ser estudada e aprendida. Por isso, temos que pensar e construir um sistema que precisam aprender a somar, subtrair e penso que é um absurdo os alunos terem de ensino mais ligado nos interesses multiplicar, para dividir o jogo não serve, pois que conhecer todos os reis e rainhas da da nação que desejamos (e não a que tem suas limitações. Portanto, a cultura popular França, Inglaterra, todos os Luizes, os temos). Qual é o país e o tipo de cidadão pode virar uma “damática”, mas é um prejuízo e Stuarts, os Bourbons e essa turma toda, e que queremos? Que sejam pessoas mais bobagem pegar qualquer coisa ligada à tradição não existir uma aula sequer sobre os reis éticas, podem ser pobres, mas que sejam popular, como a dança ou a musica, e forçar o e rainhas do congado ou sobre a cultura dignas, sem a defasagem e o abismo da seu uso como simples instrumento. negra da África e também a que está no injustiça social, da má distribuição de Brasil nas nossas veias e dia-a-dia. Essa renda, e um país mais igualitário. Não é uma conquista, uma forma de nos precisa ser o primeiro do mundo em “Devemos criar o Setor Zero, que valorizar, aumentar nossa auto-estima poder econômico, mas que seja o primeiro não é comandado nem pelo Estado, e criar mais um espaço, mas este espaço do mundo em dignidade e em cidadania. nem pelo mercado, nem pela deve ter o mesmo status das outras Esse é o grande desafio. Queremos este sociedade, mas sim pela ética” matérias e conhecimentos, senão pode pais assim ou outro? Torço para que a virar alegoria ou adereço. Precisa ser tão gente seja campeão mundial da ética, da importante como um samba-enredo. solidariedade, da alegria, do bem-estar, Pró-Menino - O que o senhor acha da lei Percebemos que hoje esse é um conteúdo porque a experiência mostra que um país federal que estabelece a inclusão da história tratado com muito carinho, porque está mais endinheirado não é necessariamente da África e da Cultura Afro-brasileira nos ligado à força e à beleza cultural da um país melhor. Os resultados estão nos currículos? nossa negritude. Isso nos diferencia de indicadores de qualidade de vida, mas os outros povos, porque somos misturados nossos dirigentes precisam parar de olhar Tião - É um passo importante, mas tenho o e diversificados e, apesar de todos os o Brasil apenas pela ótica do Índice de mesmo receio, como disse anteriormente em problemas de preconceito que vivemos, Desenvolvimento Humano (IDH), porque relação à questão da inclusão dos direitos da estamos levando estas conquistas com ele só mostra o lado vazio do copo ao criança e do adolescente, pois podemos cair muita garra. Por isso é uma conquista boa medir aspectos de economia, saúde e na mesma vala. Apesar disso, há um avanço que eu louvo e torço para que não fique educação. Precisamos criar um novo jeito significativo, por exemplo, pela minha própria engradada no currículo e tratada como de olhar, pelo IPDH, que são os Indicadores experiência de vida, de uma história que me algo menor e secundário, mas que ela de Potencial de Desenvolvimento marcou profundamente. Sou sobrinho de uma tenha a pujança de transformação, porque Humano, observáveis no lado cheio do rainha, mas nunca pude falar dela na escola traz a geratriz de nossa brasilidade. copo. Para construir essa nova referência, primária, no ginásio, nem na faculdade e em nós temos que começar já, pois se não nenhum lugar, porque ela era Rainha Perpétua Pró-Menino - O que o senhor acha do fizermos, não vai acontecer. E não serão do Congado, da Irmandade da Nossa Senhora sistema de ensino brasileiro? os americanos nem os europeus que vão do Rosário dos Pretos. Quando fui estudar Tião - disse anteriormente, do ponto fazer isso, porque para eles a história já antropologia, meu trabalho de pesquisa foi vista do sistema de ensino, atrelado para está pronta e acabada, e só precisam dar um comparativo entre as mitologias africana atender ao mercado, ele está mal. Basta prosseguimento. Mas nós sim, precisamos e grega, porque tinha necessidade de entender vermos os dados estatísticos do PISA, que e podemos construir um país. isso: o culto de Oxalá segundo a mitologia mostram que nossos meninos de 15 anos Yorubá e o culto de Zeus, segundo a Teogonia não estão preparados para concorrer no *Entrevista concedida em dezembro de de Hesíodo, base da mitologia grega. Também mercado de trabalho, nessa sociedade 2007. passei quase cinco anos em uma faculdade de competitiva, excludente e capitalista.