PerCeBer
Partido Comunista Brasileiro www.pcb.org.br
N° 192– 20.01.2011
.
Lições que o povo ensina
Comunidade organizada
vira o jogo na habitação
e tem vitórias na luta pela
preservação ambiental Foto: Ailton Santos, jornal Hoje
Área ocupada em São João e suas improvisadas casas: uma
lição de resistência popular à ameaça de repressão policial
Contra a vontade do poder, no entanto,
uma mobilização popular da qual o
PCB tem participado intensamente
mostrou que o jogo desfavorável das
tramas palacianas pode ser virado.
Neste momento, as chances de vitória
da mobilização Salve o Rio Cascavel!
Viva o Rio Cascavel! já são amplas,
pois o Ministério Público Federal tirou
a questão da esfera local, onde lixo,
terrenos, natureza, tudo se negocia em
tramas suspeitas. Também na questão
habitacional o movimento dos tem-teto
de São João parecia completamente
derrotado em abril de 2009, quando a
Prefeitura conseguiu a reintegração de
posse da área e ameaçou jogar a
polícia em cima dos moradores se não
desocupassem a área em cinco dias.
Ao mesmo tempo, perseguia os líderes
com um inquérito policial, como se o
anseio da população por moradia, um
direito constitucional, fosse banditismo
ou caso de polícia. Mas luta não
cessou.
Informes da Revolução
Quando a empresa interessada na
construção do mega-shopping usou o
prédio da Prefeitura para anunciar as
obras do Catuaí, sob os aplausos do
poder público e contra toda a lógica de
proteção da microbacia do rio Cascavel,
havia setores inclusive ligados ao meio
ambiente jogando a toalha.
Consideravam impossível ao povo de
Cascavel reagir às manobras que
geraram um controvertido laudo
favorável do Instituto Ambiental do
Paraná e a estranha adesão do prefeito
Bueno ao projeto. A proteção rigorosa
da microbacia do rio-símbolo de
Cascavel, aliás, deveria ser ponto de
honra para o projeto Cidade das Águas,
criado pelo próprio prefeito Bueno em
sua primeira gestão.
No Jardim Gramado ocorreu a maior ocupação de
terrenos especulativos no espaço urbano de Cascavel
A seguir, apresentamos um estudo
preliminar da questão habitacional,
que depois de concluído vai integrar o
Projeto 21 – uma avaliação ampla
sobre as necessidades de Cascavel
tendo em vista a formação de uma
ampla frente de oposição de esquerda,
popular e dos trabalhadores, ao atual
controle empresarial do Município.
Aguardamos correções, observações
críticas e novos aportes, para montar
uma correta radiografia da realidade
cascavelense a partir da interação
participativa dos partidos e
movimentos sociais.
Ousar lutar! Ousar vencer!
Lições que o povo José Richa nas eleições No entanto, depois do
de 1982, à frente de um governo Richa, que foi
ensina: a luta arco de forças que ia uma ampla coalizão, o
pela moradia desde a direita do PMDB começou sua
PMDB até os viragem para a direita e
comunistas, os as demandas populares
movimentos populares passaram a ser
começaram a aflorar. progressivamente
Teriam um impulso ignoradas.
decisivo na atuação do A primeira metade da
advogado Mário Katuo década de 90 é marcada
Kato, um dos fundadores por um avanço das
do PT em Cascavel, e do demandas populares e o
Setor Jovem do PMDB, crescimento do MST
Cascavel já tem vivido onde militavam motivou a organização
inúmeras situações de estudantes e jornalistas do movimento pela
conflito social e jurídico comunistas. habitação que chegou ao
ao redor de projetos de auge com a impactante
habitação popular, que São criados sindicatos ocupação do Residencial
envolveram várias importantes, como o dos das Palmeiras.
regiões da cidade e bancários e dos Vale esclarecer que o
culminaram com o grave comerciários. Surgem grave problema do
problema de São João, em poucos meses cerca Palmeiras foi fruto de
quando se interioriza o de 40 entidades de um projeto habitacional
drama dos cidadãos sem- moradores de bairros. envolvido em uma
teto. Em 1984, oficializa-se combinação perversa de
O início da em Cascavel a criação incompetência, ganância
mobilização organizada do MST, a mais e corrupção, sendo seus
dos excluídos da importante entidade protagonistas a Caixa
habitação coincide com popular do Brasil na Econômica Federal e o
o auge da expulsão dos atualidade. mesmo empresário que
agricultores da terra, O movimento popular pretende construir o
com a mecanização avançava e, com ele, a Shopping Catuaí.
agrícola da década de demanda habitacional.
70. Cascavel, que tinha Ela foi refreada com o Em 10 de setembro de
em 1970 uma população chamado aos 1995, portanto, cerca de
urbana de 34.961 pretendentes para se 500 famílias invadem o
habitantes (e quase o inscrever e aguardar a conjunto Residencial das
dobro no campo) saltou liberação de moradias Palmeiras, no Oeste da
para 123.698 em 1980, o em programas cidade, cujas obras,
triplo da população habitacionais. Essa praticamente completas,
rural. contenção não seria foram bloqueadas pela
suficiente e a pressão foi Justiça abaixo de
Durante a ditadura, no atendida parcialmente diversas denúncias de
entanto, a pela construção dos irregularidades.
desmobilização forçada primeiros conjuntos da O movimento de 1995
dos movimentos Cohapar (o pioneiro foi foi amplamente
populares mantinha as em 1968, no Parque São vitorioso, embora
demandas pró-habitação Paulo, em programa do custasse aos ocupantes
reprimidas. Com a antigo BNH que não vários anos de luta e
consagradora vitória de teve continuidade). espera.
 Silvio Gonçalves, ligado para se tornar uma
ao PT, acreditou na guerra de egos,
propaganda das boas envolvendo também
intenções do prefeito mesquinharias eleitorais
Edgar Bueno, que se burguesas.
apresenta como o Tais atritos apenas
menino pobre que dificultam a
Ocorreram diversas trabalhou e progrediu, possibilidade de um
outras ocupações, na no modelo self-made entendimento, ficando
maioria delas contando man. no jogo rasteiro de
com o concurso do Ele dirige o Município Bueno punindo seus
advogado Yves no período 2001/2004 antigos aliados por uma
Consentino Cordeiro na após trocar o apoio suposta “traição”
defesa dos mutuários. popular recebido nas política. Enquanto isso,
Ele por anos a fio eleições pelos arranjos os punidos de fato são os
defendeu os ocupantes de gabinete. Sua última cidadãos que precisam
do Palmeiras e de outros concessão popular foi o das moradias.
conjuntos: Residencial conjunto residencial mal Na gestão Tomé
Cascavel, Residencial estruturado, no primeiro (2005/2008), tudo o que
Boa Vista, Jardim ano, que levou o nome não foi cumprido na
Equatorial e ocupação de sua mãe, d. Julieta, gestão anterior foi
no Jardim Gramado. em mais um de seus cobrado pelos
Em 13 de fevereiro de impulsos personalistas. movimentos
1999, ainda antes da organizados, com
resolução do caso do Apesar do equívoco de escassos resultados
Residencial das ter acreditado em Bueno favoráveis, mesmo a
Palmeiras, cerca de 300 – para Gonçalves, o gestão inicialmente
famílias ocupam uma prefeito usava “máscara” assumindo uma ilusória
área do Jardim Gramado pró-povo que caiu no feição de “esquerda”,
utilizada para segundo mandato –, o cultivada pelo PPS e
especulação imobiliária. movimento dos cidadãos pelo PCdoB.
Era a maior ocupação de sem teto merece apoio
todos os tempos em por ser consistente e Nas eleições de 2008,
terrenos sem construção. objetivo, enfrentando todos os candidatos à
corajosamente a Prefeitura de Cascavel
Na campanha eleitoral máquina do poder: prometeram soluções
de 2000, o deputado Legislativo leniente, para o problema
Edgar Bueno aliciou Executivo carrasco, habitacional, que
toda a “esquerda” de Justiça morosa e também é grave em
Cascavel, com exceção ameaças de repressão todas as médias e
do PCB, na época policial. grandes cidades do País.
lutando para se refazer Oportunamente, o
do golpe desferido por A ação de Silvio Movimento Nacional de
Roberto Freire ao criar o Gonçalves deve ser Luta pela Moradia
PPS. Além desse mesmo reconhecida como promoveu em junho
PPS e do PSB, Bueno positiva até o limite de desse 2008 o 3º
também foi apoiado pelo seus atritos pessoais com Encontro Municipal do
PT. o prefeito Bueno, Movimento, sob o tema
quando a questão se “Reforma Urbana, na
O líder do movimento desloca do plano Gestão Política e no
dos cidadãos sem-teto, estritamente institucional Controle Social”.
 tergiversou em torno do não negava a intenção de
problema habitacional, honrar os compromissos
em meio a idas e vindas, assumidos pela gestão
até concluir que as anterior, mas novamente
demandas habitacionais não ocorreram
eram justas e havia progressos.
espaço para obras. Esses compromissos
A finalidade do
Tomé, candidato à foram reassumidos por
encontro era encaminhar
reeleição mas já sem Bueno em 2008, mas
a resolução dos
fingir-se de “esquerda”, logo ao se empossar
problemas habitacionais,
sentiu-se mais bondoso revelou uma atitude
mas se limitou a um
que de costume: no oposta, descartando a
comício de Aderbal de
início de junho de 2008, intenção de cumpri-los.
Mello, então candidato à
destinou 55 terrenos de Bueno se opunha a si
Prefeitura pelo PT. Um
uma lista de 198 áreas mesmo, a partir de 2009,
PT isolado, sem arco de
levantadas pela rejeitando os
alianças, mero
Prefeitura que poderiam compromissos
coadjuvante para a
ser vendidas para criar assumidos na primeira
reeleição do deputado
recursos destinados a um gestão, tanto em relação
Bueno e sua pendenga
programa de habitação. ao problema
igualmente personalista
habitacional quanto em
com o ex-prefeito
Ao enviar a lista de relação à necessidade de
Barreiros.
terrenos à Câmara, desapropriar a área
pedindo autorização para adquirida pela
Por sua vez, Bueno
leiloá-los, Tomé construtora do Shopping
prometeu a construção
manifestou a intenção de Catuaí.
de 500 casas populares
obter ao menos R$ 8,2
por ano. Apesar de toda
milhões por eles. Havia Confiando nas
a propaganda e festas em
a estimativa de que a soluções prometidas na
torno do projeto “Minha
metade desse valor campanha de 2008, em 7
Casa, Minha Vida”,
serviria para reduzir de março de 2009 um
desde então a situação
significativamente o grupo de famílias
habitacional piorou. As
déficit habitacional em ocupou em São João do
soluções não apareceram
Cascavel. Oeste uma área que há
e mais conflitos vieram à
Para Silvio Gonçalves, muitos anos estava
tona.
essas 55 áreas, divididas reservada para um
Até onde havia
em 200 m² cada uma, projeto habitacional.
convênio assinado e
poderiam servir para Mal havia iniciado o
entendimento celebrado
assentar 1,3 mil famílias, segundo mandato,
ocorreu descompasso.
com um preço médio Bueno voltava atrás em
Medidas revogadas,
unitário de R$ 3,3 mil. A tudo o que prometeu na
promessas não
oferta de lotes campanha eleitoral.
cumpridas, acordos
urbanizados, aliás, Ignorou até o que havia
desfeitos, intermináveis
consta da Lei Orgânica conveniado em sua
demandas judiciais e
do Município. primeira gestão, quando
incapacidade de
Mas Tomé voltou tinha a
negociação têm sido o
atrás em 19 de junho e companhia/assessoria de
retrato da “política
retirou o pedido Gonçalves. Ou seja,
habitacional” em
encaminhado à Câmara. quando o PT fazia parte
Cascavel.
Contemporizando e se da administração
Durante toda a gestão
contradizendo, Tomé municipal.
Tomé, a Prefeitura
 casas do conjunto construção das moradias
residencial do Sanga do projeto Minha Casa
Funda. Minha Vida, com
Mais uma traição: não inscrições e
havia a infraestrutura contemplação de
combinada com a famílias selecionadas
Em setembro de 2009 Prefeitura, o governo do sob o controle do
todas as promessas já Estado e a Cohapar. prefeito.
estavam enterradas. Se o Além disso, os É contraproducente
prefeito quis se vingar moradores sofreram essa confusão que
do PT pela “traição” de cobranças indevidas, envolve o Movimento, a
abandoná-lo, a vingança contrariando todos os Prefeitura, a Caixa
se abateu sobre os acordos estabelecidos. Econômica e os egos dos
cidadãos sem-teto. Em maio de 2010, a líderes envolvidos, que
O que parecia claro é funcionária pública Katy preferem o confronto à
o prefeito estar se Taborda ingressou com negociação. E quanto
vingando até de sua uma representação mais a confusão
primeira administração, contra o prefeito Bueno, aumenta, mais é
quando encaminhou junto ao Ministério retardada uma
corretamente a Público. Alegava ter negociação definitiva
desapropriação da área sido coagida pelo para a resolução do
hoje objeto do prefeito, que iria retirá-la problema habitacional
lamentável Caso do de uma lista para em Cascavel.
Shopping e quando se conseguir a casa própria. Com o envolvimento
recusou a pagar uma Ela disse que foi do prefeito Bueno na
dívida inexistente, no chamada ao gabinete do campanha da candidata
caso da praça Wilson prefeito e ouviu dele um Gleisy Hoffmann (PT)
Joffre. Bueno fez pedido para fazer ao Senado e a
exatamente o oposto da declarações vinculação do PDT com
primeira gestão, até prejudicando o Lula/Dilma, e sobretudo
sepultando o bom Movimento Nacional de com a posse de Renato
projeto Cidade das Luta pela Moradia, do Silva, um negociador, na
Águas, hoje limitado a qual Katy Taborda fazia companhia habitacional
uma transferência de parte, sob pena de de Cascavel (Cohavel)
capivaras. represálias funcionais. renasceram as
Vingava-se também Em agosto desse esperanças de um acordo
de si mesmo, daquele mesmo 2010, em mais para não prejudicar as
deputado que nas um episódio de batalha famílias ocupantes da
campanhas eleitorais de judicial, o Tribunal de área de São João.
2006 e 2008 prometeu Justiça do Paraná deu Silva levou uma
resolver os problemas da ganho de causa aos proposta de acordo ao
população. integrantes do MNLM prefeito, que ainda se
Nesse ínterim, depois na luta para reaver as recusa aceitar um
de uma “novela” que quatro áreas que haviam entendimento, mas já se
durou muitos anos – o sido repassadas a eles percebe que já existe
caso da ocupação do para a construção de dentro da Prefeitura o
Jardim Gramado –, em casas. reconhecimento de que a
outubro de 2009 as 288 Esses terrenos foram, demanda dos moradores
famílias que aguardavam depois, tomados de volta de São João é justa e
uma perovidência final pela Prefeitura, que precisa ter uma solução.
se mudaram para as destinou as áreas para a

Esta solução parecia
ter sido esmagada em
abril de 2009, quando a
Prefeitura conseguiu a
reintegração de posse e
avisou aos moradores
que eles tinham um
prazo de cinco dias para
desocupar a área. Teriam
que enfrentar a polícia
caso não se retirassem.
Ao mesmo tempo, num
rolo compressor, a das condições de vida na
Prefeitura prosseguia
intimidando os líderes da
ocupação com um
inquérito na Polícia
Civil.
Mas a resistência dos populares são uma luta
moradores ensinou que é só.
possível virar o jogo. Todo sofrimento que
Sabe-se que quanto recai sobre uma parcela
menos democrático o do povo afeta a toda a
Estado, mais difíceis são comunidade, das mais
as lutas. É a vitória do diversas formas. Assim,
povo nessas lutas, a pressão por direitos
porém, que vai sociais deve ser exercida
representar a conquista por todo o movimento
de mais democracia. popular organizado e
não somente pelo
As demandas pela segmento diretamente
moradia, pela terra, pelo prejudicado pelas
transporte coletivo enganosas políticas
acessível, pelo pleno sociais do governo
emprego, pela segurança burguês.
estruturada na melhoria Ousar lutar, ousar
vencer! Esta continua a
periferia e não na palavra de ordem mais
repressão policial, necessária para os
educação melhor e movimentos populares e
estrutura de saúde à para a luta anticapitalista
altura das expectativas em geral.

A contra-revolução Publicamos aqui trechos de uma

importante entrevista do filósofo
em curso exige a ação italiano Domenico Losurdo na qual ele
do Partido Comunista destaca a necessidade do partido
revolucionário para que os
trabalhadores passem à ofensiva na
atual etapa da luta de classes, em que a
direita avança em sua contra-revolução.
Losurdo é professor de História da
Filosofia na Universidade Carlo No e
Domenico presidente da Associação Marx XXI.
Losurdo* Eis uma seleção de suas análises que
transcendem o caso italiano e se
aplicam também ao Brasil:

“Assiste-se a um ataque contra o Estado

A Itália vive uma situação
semelhante à do Brasil: os
capitalistas controlam o poder do
Estado e se beneficiam da divisão
da esquerda para avançar em seu
projeto, que se traduz por uma
ofensiva de classe contra os
trabalhadores.
social e ao seu desmantelamento: todos
percebem isso. Pelo contrário, é menos
evidente um fato para o qual gostaria de
chamar a atenção: o ataque contra o
Estado social não é determinado em
primeira mão pelas compatibilidades
econômicas, pela necessidade de
economia nem porque falta o dinheiro,
entenda-se”

“Um dos patriarcas do neoliberalismo
(que chegou a ser coroado com o
Prêmio Nobel de economia), Friedrich
August Von Hayek, declarava, na altura
dos anos 70 do século passado, que os
direitos socioeconômicos (exatamente
os que são protegidos pelo Estado
social), eram uma invenção que ele
considerava catastrófica: eram resultado
da influência exercida pela revolução
marxista russa. E apelava pois para a
libertação dessa herança maléfica.
“Percebe-se assim que, ao
desaparecimento do desafio que a União
Soviética e um campo socialista forte
representavam, tenha correspondido e
continue a corresponder cada vez mais o
desmantelamento do Estado social”
“Há, por fim, um terceiro aspecto da
contra-revolução que não devemos
perder de vista. É o verdadeiro ataque à
democracia que assume formas
particularmente gritantes na fábrica. Aí
a contra-revolução é evidente ao ponto
de ser praticamente declarada: o poder
patronal deve poder exercer-se sem
demasiados limites, a Constituição não
deve ser causa de embaraço nas relações
de trabalho... Mas há um aspecto que
passa para além da fábrica e que diz
respeito à sociedade no seu conjunto: é
o avanço de um bonapartismo suave
(que defini no meu livro Democracia ou
bonapartismo)”
“Hoje em dia a riqueza exerce um peso
político imediato. Enquanto existiu na
Itália o sistema proporcional, era mais
fácil a formação de partidos políticos de
massas, e era possível conter dentro de
certos limites o peso político da riqueza
que, atualmente e pelo contrário, se
exprime de forma imediata, mesmo
despudorada”
“A partir da concentração dos meios de
informação e utilizando sem
preconceitos a enorme riqueza à sua
disposição, pretende exercer, e exerce
de fato, um poder decisivo sobre as
instituições políticas e revela uma total
capacidade de corrupção e de
manipulação”
“Não podemos esquecer que essa
contra-revolução também se dá ao nível
ideológico-cultural. Estamos em vias de
reescrever de forma totalmente
fantasista e vergonhosa a história não só
do nosso país, como de todo o século
XX. Quais são os elementos
fundamentais dessa história? A partir da
Revolução de Outubro começaram três
gigantescos processos de emancipação”
“O primeiro foi o a independência dos
povos coloniais: nas vésperas da
viragem de 1917, os países
independentes eram apenas em número
bastante restrito, quase todos situados
no ocidente. A Índia era uma colônia, a
China um país semi-colonial; toda a
América do Sul estava submetida ao
controle da Doutrina Monroe e dos
EUA. A África tinha sido repartida
entre as diversas potências colonialistas
europeias. Na Ásia, a Indonésia, a
Malásia etc eram colônias. O gigantesco
processo de descolonização e de
emancipação que pôs fim a essa
situação viu o seu primeiro impulso na
Revolução de Outubro”
“O segundo processo foi o da
emancipação das mulheres: é
importante recordar que o primeiro país
em que as mulheres passaram a usufruir
da totalidade dos direitos políticos e
eleitorais (ativos e passivos) foi a
Rússia revolucionária, entre fevereiro e
outubro de 1917.

Foi apenas num segundo tempo que
chegaram ao mesmo resultado a
Alemanha da República de Weimar,
saída de uma outra revolução, a de
novembro de 1918, depois os Estados
Unidos. Em países como a Itália e a
França, as mulheres só conquistaram a
sua emancipação na onda da Resistência
antifascista”
“Finalmente, o terceiro processo foi a
eliminação da discriminação eleitoral
que, em matéria de direitos políticos,
continuava a discriminar negativamente
as massas populares: na Itália liberal e
dos Sabóias, em vez de ser eleito pelas
bases, o Senado era apanágio da grande
burguesia e da aristocracia. A
discriminação eleitoral também se fazia
sentir em Inglaterra, e não somente pela
presença da Câmara dos lordes; ainda
em 1948, havia 500 mil pessoas que
gozavam de voto plural e portanto da
faculdade de votar várias vezes: eram
consideradas como mais inteligentes
(claro que se tratava de pessoas ricas do
sexo masculino)”
“Para resumir, no decurso do século XX
desenvolveu-se em três frentes um
gigantesco processo de emancipação
que partiu da Revolução de Outubro e
da luta contra a guerra e a carnificina do
primeiro conflito mundial. Tudo isso é
atualmente esquecido e rejeitado. E
assim acabou por se constituir uma
cultura, ou mais exatamente uma
incultura, apropriada para a ordem
existente. Tal como no plano
propriamente político, também no plano
ideológico está em marcha o que defini
(no livro Democracia ou bonapartismo)
o regime de Monopartismo
Competitivo”
“Assistimos ao funcionamento de um
partido único que, segundo modalidades
diversas, remete para a mesma classe
dominante, para a burguesia
monopolista. Evidentemente, existe
sempre o momento da competição
eleitoral, mas trata-se de uma
competição entre camadas políticas em
que cada uma delas tenta realizar
ambições a curto prazo, sem nunca pôr
à discussão o quadro estratégico, a
orientação cultural de fundo e a classe
de referência, ou seja, a burguesia
monopolista”
“É um fato que falta hoje uma força
política organizada e estruturada que se
oponha à manipulação ideológica e
historiográfica e ao Monopartismo
Competitivo que reinam atualmente.
Ficam assim sem contestação o domínio
e a hegemonia da burguesia
monopolista, assim como a contra-
revolução neoliberal e pró-imperialista
de que falei”
“Apresenta-se como uma coisa nova
mas, na realidade, é bastante velho: o
comunismo foi sempre declarado morto,
ao longo de toda a sua história.
Podemos mesmo dizer que o
comunismo foi declarado morto antes
mesmo do seu nascimento. Não se trata
de um paradoxo nem de uma piada.
Vejamos o que se passa em 1917: a
Revolução de Outubro ainda não tinha
estalado, já grassava a carnificina da
primeira guerra mundial. É exatamente
nesse ano que um filósofo italiano de
estatura internacional, Benedetto Croce,
publica um livro intitulado
Materialismo histórico e economia
marxista. O prefácio apressa-se a
declarar imediatamente que o marxismo
e o socialismo estão mortos”.

“O raciocínio é simples: Marx previra e
invocara a luta de classes proletária
contra a burguesia e o capitalismo, mas
onde estava nesse momento a luta de
classes? Os proletários estavam
cortando as cabeças uns dos outros. Em
vez da luta de classes, assistia-se à luta
entre os Estados, entre as nações que se
confrontavam no campo da batalha. E,
portanto, a morte do marxismo e do
socialismo estavam à vista de todo o
mundo. Ou seja, antes mesmo de
aparecer e de se desenvolver o
movimento comunista propriamente
dito, que verá o seu nascimento na
Revolução de Outubro e de seguida com
a fundação da Internacional comunista,
antes mesmo disso tudo, esse
movimento já tinha sido declarado
morto, sob os cuidados de Benedetto
Croce”
“Sabemos hoje, tarde demais, que a
disputa pela hegemonia e a guerra
imperialista, consideradas por Croce
como um fato imutável, constituíram o
ponto de partida da Revolução de
Outubro, que se impôs precisamente na
luta contra a carnificina provocada pelo
sistema capitalista e imperialista. Foi
assim que começou o movimento
comunista. E as declarações de morte
sucederam-se…”
“Quando na Rússia soviética foi
introduzida a NEP [Nova Economia
Política], uma série de jornais europeus
e americanos e intelectuais de primeiro
plano e eminentes homens políticos
opinaram: vejam, acabou a
coletivização total dos meios de
produção, que tinha sido proposta e
solicitada por Karl Marx. Até Lênin foi
obrigado de reconhecer a necessidade
da mudança; portanto o comunismo está
morto”
“Basta ler qualquer livro de história um
pouco mais profundo do que os manuais
consensuais para perceber como é
recorrente esta palavra de ordem que
estamos analisando. Os que continuam a
afirmar que o comunismo está morto,
julgando que anunciam uma novidade,
não se apercebem, por causa da sua
ignorância histórica ou da sua adesão
acrítica ou da sua submissão à ideologia
dominante, que estão apenas repetindo
um slogan recorrente na história da luta
da burguesia e do imperialismo contra o
movimento comunista”
“Atualmente os grandes órgãos de
informação internacionais observam que
existe o perigo concreto de guerra em
grande escala: a que se seguiria à
agressão desencadeada pelos Estados
Unidos e Israel contra o Irã. Não se sabe
qual poderá ser a evolução e as
complicações internacionais. E
sobretudo, não devemos perder de vista
a guerra (por agora fria) que os EUA
começam a travar contra a República
Popular da China: é preciso ser muito
ingênuo para não perceber isso.
Estamos perante uma situação que torna
urgente o dever de lutar contra o
imperialismo e a sua política de
agressão e de guerra, e isso faz-nos
voltar evidentemente à história do
movimento comunista”
“Outro elemento que devemos ter em
conta é a crise econômica. Quem se
esqueceu dos discursos triunfais,
segundo os quais o capitalismo já tinha
ultrapassado as suas crises periódicas,
crises essas de que Marx tinha falado? E
até - garantiam-nos - não só se devia
falar do fim da crise mas pura e
simplesmente do fim da história”

“Atualmente, pelo contrário, a crise do
capitalismo está debaixo dos nossos
olhos e são muitos os que pensam que
ela vai durar. Não é fácil prever a sua
evolução, mas com certeza não se trata
de um fenômeno puramente ocasional.
Portanto, é clara a permanência dos
problemas, das questões centrais que
estão na origem do movimento político
comunista”
“Vejamos agora o segundo aspecto: o
que é que significa falar do fim do
comunismo quando vemos um país
como a China, que representa um quinto
da população mundial, ser dirigido por
um Partido Comunista? Podemos e
devemos discutir as opções políticas dos
grupos dirigentes, mas não podemos
deixar de admirar a ascensão prodigiosa
de um país de dimensão continental que
liberta da fome centenas de milhões de
pessoas e que, ao mesmo tempo, altera
profundamente (num sentido
desfavorável ao imperialismo) a
geografia política do mundo”
“Neste ponto é necessário fazer uma
pergunta: qual foi o conteúdo político
central do século XX? Já falei dos três
movimentos de emancipação que
caracterizam a história do século XX.
Detenhamo-nos sobre quem teve o
desenvolvimento planetário mais amplo:
todo o século XX foi atravessado por
gigantescas lutas de emancipação,
travadas pelos povos coloniais ou
ameaçados de serem submetidos ao
colonialismo: pensemos na China, no
Vietnã, em Cuba, na própria União
Soviética que, na luta contra a tentativa
hitleriana de criar um império colonial
precisamente na Europa oriental, teve
que travar a Grande Guerra Patriótica”
“Esse processo gigantesco desapareceu
no século XXI, no século em que
vivemos? Não, ele continua. Mas há
outros. Para além dos casos trágicos,
como o do povo palestino que é
obrigado a sofrer o colonialismo na sua
forma clássica e mais brutal, nos outros
países a luta anticolonialista passou da
fase propriamente político-militar para a
fase político-econômica”
“Esses países tentam garantir uma
independência que já não é apenas
política mas também econômica. Estão
portanto empenhados em romper com o
monopólio tecnológico que os Estados
Unidos e o imperialismo julgavam ter
conquistado duma vez por todas. Em
outras palavras, estamos perante a
continuação da luta contra o
colonialismo e o imperialismo que
constituiu o conteúdo principal do
século XX. E, tal como no século que já
passou, onde foram partidos comunistas
que estimularam e dirigiram esse
movimento, também agora vemos
países como a China, o Vietnã ou Cuba
guiar no século XXI essa nova fase do
processo de emancipação
anticolonialista. Por certo não é por
acaso que estes três países são dirigidos
por partidos comunistas”
“Os que declaram morto o movimento
comunista, e pensam estar falando de
uma coisa evidente, não percebem que
estão repetindo uma idiotice
macroscópica. O potencial comunista é
real. Os comunistas estão fragmentados
em diversas organizações, por vezes
mesmo em pequenos círculos. É preciso
arregaçar as mangas e pôr-se ao
trabalho pela unidade, apoiando-se antes
de tudo nas forças comunistas que já
estão presentes de modo mais ou menos
organizado em nível nacional”
 clandestinidade em que o partido era
obrigado a funcionar”

“É preciso um partido capaz de

Vladimir
Illitch
Lênin
“O modelo do Partido Comunista
elaborado por Lênin me parece manter-
se válido; evidentemente, é preciso ter
em conta que o seu Que fazer? se
referia à Rússia czarista e também,
portanto, às condições de
construir um saber coletivo alternativo
às manipulações da ideologia
dominante, um partido que deve saber
estar presente nos locais do conflito e
deve saber também, quotidianamente,
construir uma alternativa tanto no plano
ideológico como no da organização
política”
___________
*Declarações concedidas pelo filósofo
Domenico Losurdo à jornalista Sara
Milazzo, da revista comunista italiana
L’Ernesto.

Cidade, emprego, ambiente, juventude:

por um programa revolucionário
Nenhum direito a menos,
só direitos a mais
Ajude um desempregado: reduza a
jornada de trabalho para 40 horas

Lembre-se: em Cascavel,
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 1

Curso Básico de Marxismo

O único objetivo é enriquecer
14
A produção capitalista está subordinada a um só objetivo: o
enriquecimento dos capitalistas. Mas como eles enriquecem? Às custas de
quem?
Antes de vender as mercadorias e obter lucro, é preciso produzi-las. Mas é
o trabalho (e só o trabalho) que pode criar valor.
Como o capitalista vai ter trabalho à disposição se não possui nem
escravos nem servos dos quais possa dispor à sua vontade?
De fato, ele não é dono da força de trabalho, mas tomou conta dos meios
de produção. Enquanto isso, a outra classe existente, a proletária, foi
impedida de ter os meios de produção, mas tem a força de trabalho.
O operário não precisaria trabalhar para o
burguês, mas para sobreviver é obrigado a vender a
única mercadoria que possui (a força de trabalho) ao
capitalista.
Este, ao comprá-la, conquista a única mercadoria
existente capaz de criar valor. É por isso que se diz:
toda riqueza é produzida pelo trabalho.
O fator humano é o mais importante da produção.
Só o trabalho produz valor
Por que o trabalho é o fator mais importante da produção?
O valor da força de trabalho é equivalente ao valor dos meios de vida
necessários para o sustento do operário e da sua família.
O que influi na dimensão do valor da força de trabalho é a luta de classes
do operariado contra a burguesia para melhorar a sua situação. É por meio
dessa luta que nós avançaremos ao Socialismo.
É no processo de produção que se realiza a união da força de trabalho com
os meios de produção. A força de trabalho cria um valor novo, enquanto que
os meios de produção, sozinhos, não podem criar qualquer valor.
Com o trabalho do operário, o valor dos meios de produção se conserva,
transferindo-se para as novas mercadorias produzidas à medida que os meios
de produção são utilizados.
O novo valor criado pelo operário no processo de produção capitalista
ultrapassa, pela sua importância, o valor da força de trabalho.
 2
A diferença para mais é tomada pelo capitalista. Essa diferença é a fonte
de seu enriquecimento às nossas custas. Chama-se mais-valia.
Pouca gente sabe disso! Por esse motivo é tão necessário divulgar ao
máximo os ensinamentos de Marx para, como classe, saber como lutar para
superar a exploração.
Essa exploração consiste, em essência, na
produção de mais-valia e na sua apropriação
pelos capitalistas.
O trabalho assalariado é um sistema de
escravidão assalariada, pois o operário vende a
única fonte que tem para obter os meios de vida
(a força de trabalho), mas a maior parte da sua
produção é tomada, sem indenização, pelo
capitalista.
O capitalista explora o trabalho humano
A produção de mais-valia pela exploração dos assalariados constitui a lei
econômica fundamental do Capitalismo. A ânsia de obter mais-valia é o
principal estímulo da atividade do capitalista.
Em grande parte, não lhe importa o que está produzindo: quer sejam
artigos úteis ao homem, como roupa, calçado, carne, pão, açúcar, quer sejam
armas portadoras de destruição e morte. Produz aquilo que lhe dá lucro!
Mas terá sempre que produzir valores de uso, pois
essa é uma condição imprescindível para obter mais-
valia pela exploração do trabalho.
Os burgueses dizem que o capital surgiu graças à
sua capacidade e coragem: “Aqueles que trabalharam
e souberam economizar se tornaram capitalistas”.
Tentam ocultar a verdade de que exploram o
trabalho humano e querem manter sempre tal situação.
A indústria da morte dá grandes lucros aos capitalistas
No fundo, os ociosos e esbanjadores se dizem melhores trabalhadores do
que aqueles realmente trabalham e aos quais é negada a possibilidade de
“economizar” para ter terras, bancos e fábricas.
Aquele que trabalha para sustentar o luxo do rico, segundo este, precisa
agradecer a sua “caridade”: ele quer sempre parecer o dedicado “empresário
que gera empregos” por generosidade e não por ganância de lucro!
A seguir: Desemprego e crise, marcas registradas do capitalismo.
 Lições de Comunismo
número 71

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