Miguel Moreira
Agosto de 2007
Conteúdo
1 Introdução 2
2 A Equação de Bernoulli 2
7 Conclusões 16
1 3 1 / A g o sto / 2 0 0 7
1 Introdução
A escolha do tema “A Equação de Bernoulli”para objecto desta lição deve-
se, em primeiro lugar, ao facto de ser um tema da mecânica de ‡uidos com
múltiplas, interessantes e importantes aplicações na Engenharia.
Como se sabe, a Equação de Bernoulli é utilizada para, entre outras apli-
cações em hidráulica, quanti…car velocidades de escoamentos estacionários de
descarga de reservatórios, estimar a velocidade de uma escoamento através
duma restrição à sua passagem e medir velocidades de escoamentos e os cor-
respondentes caudais. A aplicação da Equação de Bernoulli está portanto
presente quer nas operações de previsão feitas pelo Engenheiro, quer nas
correspondentes operações de veri…cação e experimentação em geral. As-
pectos estes que constituem as duas faces do mundo em que um Engenheiro
se movimenta.
Por outro lado, a “maquinaria matemática”e física, necessária para justi-
…car o enunciado da Equação de Bernoulli, é adequada ao nível de um aluno
do …m do primeiro ano, princípio do segundo ano de um curso de Engenharia,
possibilitando a ilustração da aplicação de conceitos de cálculo vectorial e de
física de uma forma integrada, obtendo um resultado de utilidade evidente
para aluno. Acresce que ao nível das aplicações a Equação de Bernoulli
oferece-nos facilmente, alguns resultados, já conhecidos do aluno e obtidos
aplicando outras metodologias. Ora, estes factos constituem elementos ex-
tremamente motivadores da aprendizagem.
2 A Equação de Bernoulli
Daniel Bernoulli foi um físico e matemático Suíço do século XVIII. Oriundo
de uma notável família ligada à Ciência — particularmente à matemática1
— nasceu em 1700 e investigou, entre muitos outros assuntos, as forças as-
sociadas a um ‡uido em movimento. Desenvolveu a teoria cinética dos gases
e foi quem pela primeira vez caracterizou a pressão de um gás através dos
choques elásticos, das suas partículas, numa superfície.
Viria a estabelecer, em 1738, uma das equações mais utilizadas na mecânica
de ‡uidos conhecida por Equação de Bernoulli.
A Equação de Bernoulli traduz o princípio de conservação de energia
numa mesma linha de corrente num escoamento suposto estacionário,
com massa volúmica constante, invíscido, sujeito adicionalmente a forças
volúmicas de origem gravítica.
1
tais como, Jacob Bernoulli notabilizado pelos seus estudos sobre sucessões e séries e
Johan Bernoulli que investigou questões ligadas à teoria da integração.
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Lembremos que uma linha de corrente é caracterizada pela tangência do
vector velocidade do escoamento em cada um dos seus pontos. Um escoa-
mento é dito estacionário quando os parâmetros que o caracterizam, tais
como a massa volúmica , a velocidade V, a pressão p e outros, não de-
pendem do tempo. A massa volúmica diz-se constante se não depender
quer do tempo, quer da posição. Um escoamento diz-se invíscido quando a
viscosidade do ‡uido é nula. Nesta última situação o ‡uido diz-se perfeito.
O estabelecimento da Equação de Bernoulli tem por base a Equação de
Euler
DV
= 5p+ g (1)
Dt
a qual representa a Lei Fundamental da Dinâmica, ou Segunda Lei de Newton
X
ma = Fi (2)
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3 Dedução da Equação de Bernoulli
Comecemos por considerar a Figura 1 que representa uma linha de corrente
de um escoamento planar. Nesta …gura podemos observar a representação
Vector normal unitário Vector tangente unitário
V =V T
N T
z
Linha de corrente
k dr
θ dz
dr = Tds
ρg sinθ =
dz
θ ds
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Comecemos por observar que o primeiro membro da Equação de Euler se
reduz a
DV @V @ (V T)
= +V , (8)
Dt @t @s
já que a velocidade V tem uma componente normal nula na linha de corrente.
Notemos que esta última expressão ainda se pode escrever como
DV @V @ (V T)
= +V
Dt @t @s
@V @V @T
= +V T+V 2
@t @s @s
@V @V
= +V T , (9)
@t @s
já que o termo V 2 @T
@s
representa uma aceleração normal à linha de corrente.
Por outro lado, a componente do gradiente de pressão 5p na direccão
tangencial tangencial à linha de corrente reduz-se a
@p
(5p)T = : (10)
@s
Quanto à componente tangencial, à linha de corrente, do peso volúmico g,
considerando a Figura 1, facilmente concluimos que
dz
( g)T = g sin = g : (11)
ds
Tendo em conta as expressões (9), (10) e (11) e supondo adicionalmente
o escoamento estacionário, @V
@t
= 0, a Equação de Euler na direcção da linha
de corrente assume a forma
@V @p dz
V = g ; (12)
@s @s ds
isto é,
@ V2 @p dz
+ + g = 0: (13)
@s 2 @s ds
Naturalmente se a massa volúmica for constante, obtemos
@ V2 @p dz
+ + g = (14)
@s 2 @s ds
@ V2
+ p + gz = 0; (15)
@s 2
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condição esta que só se veri…ca quando
V2
+ p + gz = constante (16)
2
ao longo de uma linha de corrente. Esta última expressão é a Equação de
Bernoulli.
À quantidade
V2
pT = +p
2
é habitual chamar pressão total ou pressão de estagnação, isto é, num
ponto da mesma linha de corrente em que a velocidade se anula.
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Na forma correspondente à expressão (18) a Equação de Bernoulli apre-
senta termos com dimensões de energia por unidade de massa. Finalmente
na forma (19) os seus termos têm dimensões de comprimento:
V2
o termo 2g
designa-se habitualmente por altura cinética;
p
o termo g
por altura estática ou piezométrica;
V2 p
H= + + z:
2g g
2 A2 V2 1 A1 V1 = 0;
A2 V2 = A1 V1 ; (20)
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Almofada gasosa
1 Líquido
h Válvula
Linhas de corrente
V1 A1 = V2 A2 ;
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em que A1 e A2 representam as áreas das correspondentes secções normais
V2
de passagem, V1 V2 pois A1 A2 : Assim, na equação (5), o termo 2g1
V22
pode ser desprezado na presença do termo 2g
. Deduz-se sucessivamente
V22 p1 p2
= + z1 z2 )
2g g
s
2 (p1 p2 )
V2 = + 2g (z1 z2 ):
V1 A1 = V2 A2 :
V22 p2 V2 p1
+ + z2 = 1 + + z1 ;
2g g 2g g
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p2
p1 Linhas de corrente
V1 ≈ 0
A2
A1 >> A2
V12 V22
poderemos desprezar o termo 2g
na presença de 2g
e eliminar z1 z2 , obtendo
s
2 (p1 p2 )
V2 = . (22)
5.3 Jactos
Um clássico exemplo de escoamento invíscido e estacionário é de um escoa-
mento vertical (de água no seio de ar, por exemplo) com uma velocidade de
descarga V1 su…cientemente baixa. Veja-se a Figura 4. Como se sabe, por
efeito da tensão super…cial, a coluna de líquido instabiliza e fragmenta-se em
gotículas após percorrer uma certa distância. No entanto iremos supor neste
exemplo que essa distância não foi ainda percorrida e que o efeito da tensão
super…cial é insigni…cante não afectando a pressão no interior do jacto. Desta
forma podermos considerar a pressão estática, nas secções 1 e 2, no interior
do jacto relacionadas da seguinte forma:
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V1 p1 z1
1
Ar Água
V2 p2 z2
V22 p2 V2 p1
+ + z2 = 1 + + z1 : (24)
2g g 2g g
Resolvendo a expressão (24) em ordem a V2 após substituir a expressão (23)
nesta última, obtemos
2 ar g (z2 z1 )
V22 = V12 + + 2g (z1 z2 )
ar
= V12 + 2 1 g (z1 z2 ) : (25)
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Reforcemos no entanto a ideia de que a simpli…cação 1 1 ar
, efectu-
ada, só é válida quando as massas volúmicas do ‡uido em escoamento e do
‡uido exterior são muito diferentes. Com efeito, se tal não acontecer, tem de
se considerar na expressão (25), o factor 1 ext
; atenuador da aceleração
da gravidade g.
A título de curiosidade registemos que a utilização adicional do princípio
de conservação da massa permite deduzir e quanti…car a variação do diâmetro
do jacto. Assim, considerando a expressão do referido princípio aplicado às
secções 1 e 2 do jacto da Figura 4, suposto, naturalmente constituído pelo
escoamento estacionário de um ‡uído com massa volúmica constante, deduz-
se:
D12 D22
V1 = V2 )
4 4
r
V1
D2 = D1 :
V2
Donde, tendo em conta (26),
r
V1
D2 = D1
V2
s
V1
= D1 p
V12 + 2g (z1 z2 )
1
V12 4
= D1 : (27)
V12 + 2g (z1 z2 )
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Linha de corrente
V1 V2
1 2
h Fluido manométrico
ρM
V1 A1 = V2 A2 : (28)
V22 p2 V2 p1
+ = 1 + :
2g g 2g g
Donde se deduz, recorrendo a alguma álgebra
2 (p1 p2 )
V22 = V12 + )
v
u 2 (p p2 )
u 1
V1 = u :
t V2
2
V1
1
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expressão esta que caracteriza a velocidade do escoamento em termos do
quociente das áreas de passagem nas secções 1 e 2 e da diferença de pressões
estáticas que aí se veri…ca.
Notemos que no dispositivo da Figura (5) o líquido do ‡uido manométrico
deve ter uma massa volúmica maior do que a do ‡uido em escoamento.
Fluido em escoamento
1
ρ
2 V2
V1
Linhas de corrente
p1 p2
parede h
Fluido manométrico
ρM
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A expressão (29) permite, da forma descrita, obter a velocidade V1 do escoa-
mento em termos dos parâmetros h e das diferenças das massas volúmicas
do ‡uido manométrico e de trabalho. Naturalmente supõe-se que a diferença
M é positiva.
1 2
Linhas de corrente
V12 p1 V2 p2
+ + z1 = 2 + + z2 + hf (30)
2g g 2g g
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em que hf representa a referida dissipação de energia.
Em virtude do princípio de conservação da massa aplicado às secções 1 e
2 deduz-se
A1 V1 = A2 V2 )
V1 = V2 .
7 Conclusões
Nesta lição foi deduzida a Equação de Bernoulli
V2
+ p + gz = constante,
2
com base na integração da Equação de Euler numa linha de corrente de uma
escoamento estacionário, invíscido, com massa volúmica constante e sujeito
à acção do campo gravítico.
Diversas aplicações elementares da Equação de Bernoulli, que traduz
o princípio de conservação de energia, nas condições das hipóteses, foram
ilustradas, nomeadamente:
16 3 1 / A g o sto / 2 0 0 7
medição de caudais;
17 3 1 / A g o sto / 2 0 0 7
Referências
[1] Bird, R. B., Stewart, W. E. & Lightfoot, E. N., Transport Phenomena,
Willey International Edition, New York, 1960.
[4] Kinsky, R., Applied Fluid Mechanics, McGraw-Hill Book Company, Syd-
ney, 1989.
[6] Middleman, S., An Introduction to Fluid Dynamics, John Wiley & Sons,
Inc.,1998.
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