conta, sob inspiração do Espírito Santo, os primeiros trinta anos da evangelização do
mundo por parte da Igreja.
- O livro de Atos dos Apóstolos é, na verdade, o segundo volume da obra de Lucas que , depois de ter ordenado as informações que obteve a respeito do ministério terreno de J esus Cristo (Lc.1:1-4), a fim de dar conhecimento mais profundo das informações que tinha Teófilo a respeito, decidiu, também, registrar os fatos concernentes à história dos cris tãos até aquele instante, a fim de mostrar a continuidade entre a obra de Jesus e o tra balho que era levado a efeito pelos Seus apóstolos, em especial, de Paulo, com quem Lucas es tava a trabalhar na obra de Deus. OBS: Muito se especula sobre a identidade de Teófilo, mas, ante as poucas informações constantes das Escrituras, tudo o que se diz não pode ser visto senão como conjectura. Não resta dúvida, porém, de que os escritos de Lucas buscava dar respaldo a uma pessoa importante a respeito da doutrina cristã, o que é relevante di ante da circunstância de que Paulo estava sendo julgado e com sua vida em risco precisamente em razão da sua fé. A eluc idação destes pontos, pois, poderia contribuir para um correto julgamento de sua causa pelas autoridades. - O introito de Atos (At.1:1) já nos mostra, claramente, que o seu autor é o mesmo L ucas, aquele que redigiu o Evangelho que levou o seu nome, um Evangelho voltado para o s gregos, um Evangelho que tinha, por objetivo, demonstrar que Jesus era o Filho d o Homem, o Homem perfeito. 4 - Como um cientista que era (Cl.4:14), Lucas, além de trazer as informações pormenorizadas e ordenadas, também deixa claro que este volume de sua obra tinha u m objetivo bem definido, qual seja, o de mostrar o aprendizado dos discípulos junto ao Senhor Jesus e como eles se tornaram Suas testemunhas desde Jerusalém até os confins da Ter ra (At.1:8). - Por isso, desde cedo, o livro acabou sendo denominado pela Igreja de Atos dos Apóstolos , ou seja, das atitudes, da prática do ensino do Senhor Jesus por parte dos apóstolos, aqueles que haviam sido enviados por Ele para pregar o Evangelho em tod as as nações, começando por Jerusalém (Lc.24:47). - Na verdade, a denominação primeira do livro, nos documentos mais antigos, era a de Atos de todos os apóstolos , visto que o livro passou a ser muito utilizado a partir da metade do século II, como uma reação à heresia liderada por Marcião de Sinope (110-160), que, entre outras ideias, passou a rejeitar o Antigo Testamento e a aceitar some nte o Evangelho de Lucas e algumas epístolas de Paulo. O livro de Atos, ao mostrar a per feita harmonia entre o trabalho dos primitivos apóstolos e o ministério posterior de Paulo era um vigoroso contra-argumento a esta heresia, ainda mais por ser da autoria do mesmo Lucas, o único evangelista reconhecido por Marcião. Por isso, era denominado de atos de todos os apóstolos , para contrariar a falsa doutrina de que só Paulo havia transmitido a corre ta doutrina de Cristo. OBS: A expressão Atos de todos os apóstolos aparece, pela vez primeira, no chamado cânon muratoriano , lista dos livros considerados inspirados pela igreja em Roma, redigido por volta de 200. R eferida lista foi descoberta em uma biblioteca pelo erudito italiano Ludovico Muratori, razão de ser do nome que lhe f oi dado. - Este seu papel de ponte entre os Evangelhos e as epístolas fez com que, cedo, desd e as primeiras listas surgidas, o livro de Atos figurasse no chamado cânon do Novo Testamento , ou seja, na relação dos escritos que foram considerados como tendo sido inspirados pelo Espírito Santo e que, ao lado do Antigo Testamento, deveriam compo r a Bíblia Sagrada. Também é a razão pela qual, no arranjo dos livros, foi posto imediatamen te após os Evangelhos e antes das epístolas. OBS: Eusébio de Cesareia, historiador da Igreja no século IV, mostra como, em sua époc a, dúvida alguma sobre a inspiração de Atos: Este também parece o devido lugar de apresentar uma declaração sumári livros do Novo Testamento já mencionados. E aqui, entre os primeiros, deve ser colocada a santa tét rade dos Evangelhos; esses são seguidos pelo Livro de Atos dos Apóstolos (História eclesiástica: os primeiros quatro séc los da história da Igreja Cristã. Trad. de Lucy Iamakami, p.103). - O livro de Atos apresenta a descrição de como se iniciou o cumprimento da palavra do Cristo ressurreto aos Seus discípulos pouco antes de ascender aos céus. Em Atos 1.8, o Cristo ressurreto declara o propósito do batismo com o Espírito Santo: mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis Minhas testemunhas tanto em Jerusalém, como em toda a Judeia e Samaria, e até os confins da terra . Por localização e ênfase, este versículo parece designar claramente o propósito deste livro de Atos dos Apóstolos. Trata-se de uma história especial sobre o estabelecimento e a extensão da I greja entre judeus e gentios pela localização gradual de centros de influência em pontos sal ientes do império romano, desde Jerusalém até Roma. (BÍBLIA SHEDD, p.1526). 5 - Lucas, após ter mostrado a Teófilo, no primeiro tratado , o que Jesus havia feito e ensinado, agora, neste segundo volume, mostra a prática deste ensinamento, prática e sta que somente foi bem sucedida porque contou, desde o seu início, com a atuação do Espírit o Santo. Já no seu introito, pois, o médico amado nos mostra que a Igreja é a cumpridora dos ensinos e ações de Jesus, cumprimento que só se torna possível mediante a atuação do Espírito Santo. - Se Lucas, que é o único gentio a redigir um texto das Escrituras, considerado um c ristão da Igreja de Antioquia (sua origem antioquita é afirmada em um dos mais antigos pr efácios de seu Evangelho e tem sua razão de ser, já que os primeiros gentios convertidos o f oram em Antioquia e isto explica o fato de Lucas ter sido companheiro de Paulo), vale u-se de provas precisas e idôneas para redigir o Evangelho, com relação a Atos, então, não só de provas precisas e idôneas, mas ele próprio testemunhou fatos que relata, o que aumen ta, ainda mais, a credibilidade de sua narrativa. - A propósito, cabe aqui reproduzir o que diz sobre a credibilidade de Atos o prof essor de Crítica e Exegese Bíblica da Universidade de Manchester (Inglaterra), F.F. Bruce: O valor histórico do relato de Lucas tem sido amplamente confirmado pelas descoberta s arqueológicas. Apesar de seus interesses apologéticos e teológicos, isso não diminui sua minuciosa exatidão, ainda que aqueles controlem sua seleção e apresentação dos fatos. Ele coloca sua narrativa dentro da moldura da história contemporânea; suas páginas estão repletas de referências aos magistrados das cidades, aos governadores provinciais, aos reis visitantes, e outros semelhantes, e essas referências provam vez após vez, que estão c orretas quanto ao lugar e ao tempo em questão. Com um mínimo de palavras, ele transmite a autêntica cor local das cidades extremamente diversas mencionadas em sua história. E sua descrição sobre a viagem de Paulo a Roma (27) até os nossos dias permanece como um dos mais importantes documentos sobre a antiga arte da navegação (Atos, Livro de. In: DOUGLAS, J.D. (org,).O novo dicionário da Bíblia. Trad. de João Bentes. v.1, p.169). - Se dúvidas não há quanto à autoria de Atos, maiores controvérsias surgem com relação à data de sua redação. Como o livro termina com a descrição da prisão domiciliar por dois anos em Roma, quando pregava o Evangelho em toda liberdade, tem-se como um fator indicativo de que o texto é anterior a 64, ano em que se deu a primeira grande per seguição romana contra os cristãos, no tempo do imperador Nero. O livro, pois, é tido como es crito por volta do ano 60, quando Paulo estaria sob a prisão domiciliar mencionada no térm ino da obra. - Surgiram alguns críticos bíblicos , que, como já temos dito ao longo destes estudos da EBD, devem ser analisados com muita cautela, desconfiança até, visto que, no fundo, são pessoas, no mais das vezes, querendo muito mais desafiar e desacreditar as Escri turas do que estudá-las, procuram pôr a data de Atos por volta do ano 90, o que deve ser cont estado, já que, como diz Russell Shedd, há o silêncio, em a narrativa, a respeito da morte de Paulo e a completa ausência de referências a outros escritos paulinos que nesse tempo estava m largamente difundidos (BÍBLIA SHEDD, p.1526). - Ademais, a teoria que procura datar o livro de Atos por volta do ano 90, basei a-se em dois fatores que são altamente improváveis. O primeiro é de que o texto de Atos dependeria, em 6 sua redação, das Antiguidades Judaicas, de Flávio Josefo, e de que teria sido um docum ento redigido para distinguir-se os judeus dos cristãos. Não há, porém, qualquer elemento mai s firme que permita relacionar ambos os textos. Muito pelo contrário, o texto mostra uma sensação de relativa confiança entre autoridades romanas e judaicas quando do episódio d o aprisionamento de Paulo que vai contra tudo o que se tem na obra de Josefo. - A segunda é de que o texto teria sido redigido para impedir-se ou amenizar-se a perseguição contra os cristãos nos tempos do imperador romano Domiciano (81-96), a segunda grande perseguição romana contra a Igreja. Tal circunstância, também, não faz sentido, diante da omissão da morte de Paulo no texto, ele, o protagonista da última parte do livro, ainda mais quando se sabe o trágico fim de Nero, o que seria mais do que natural constar de um texto que retratou o fim trágico de Herodes Agripa em decorrência do martírio de Tiago. O tom otimista com que termina o livro de Atos é totalmente adver so a uma circunstância como a aventada pelos defensores desta teoria. II ATOS DOS APÓSTOLOS É, TEOLOGICAMENTE, ATOS DO ESPÍRITO SANTO - Já vimos que o título adotado para este livro, Atos dos apóstolos , tem sua razão de ser histórica, mas não seria demasiado dizer que, na verdade, o livro de Atos bem poderi a ser chamado de Atos do Espírito Santo , visto que Lucas, em toda a sua narrativa, faz questão de mostrar que a Igreja age sob a direção do Espírito Santo. O Espírito Santo é mencionado mais de cinquenta vezes neste livro, particularmente em relação ao batismo com o Espírito Santo, a ser cheio do Espírito Santo e a ser guiado pelo Espíri to Santo. (BÍBLIA DE ESTUDO SCOFIELD, p.992). Quanto ao lado teológico, o tema dominante do livro de Atos é a atividade do Espírito Santo (BRUCE, F.F. op.cit.) - Lucas começa o seu livro mostrando que, sem o Pentecoste, não poderia a Igreja cum prir a sua missão sobre a face da Terra. Era indispensável o revestimento de poder para q ue os discípulos pudessem ser testemunhas de Cristo em todos os cantos da Terra. A igrej a, neste sentido, tem de ser pentecostal . Não é possível, é inimaginável que a Igreja atue a contento sem que o Espírito Santo a revista de poder e, por consequência, dirija a s ua ação. - Nos dias em que vivemos, esta condição sine qua non apresentada por Lucas logo no início de seu livro histórico sobre a Igreja tem sido perigosamente desprezada, incl usive pelos que se dizem pentecostais . Já não se considera necessário o batismo com o Espírito Santo, o revestimento de poder como um pré-requisito para a evangelização, muito menos para o exercício do ministério. Já há Assembleias de Deus que separam ministros e oficia is sem que se preencha este requisito, contrariando a própria determinação do Senhor Jesu s, pois foi quem disse que era necessário ficar em Jerusalém até do que alto houvesse o revestimento de poder (At.1:4,5). - Também, com muita clareza, Lucas nos mostra, já no limiar de seu livro, que esta experiência era distinta da conversão, pois Jesus estava a falar com os apóstolos, ou seja, com aqueles que havia escolhido para fazer a Sua obra e, como sabemos, sobre os quais já repousara o Espírito Santo, neles soprado pelo próprio Senhor em uma de Suas aparições (Jo.20:22). Sem o poder do Espírito Santo, não se poderia partir de Jerusalém e se ati ngir os 7 confins da Terra. Esta mesma realidade persiste ainda hoje e não podemos nos desvi ar daquilo que nos diz a Palavra de Deus. - Somente o Espírito Santo poderia conduzir a Igreja depois da partida do Senhor Jesus e, por isso, não poderiam eles sair e iniciar a pregação do Evangelho sem que fossem devidamente revestidos de poder, sem que o Espírito Santo viesse para inici ar o Seu ministério sobre a face da Terra. Por que, então, nos dias hodiernos, muitos não esperam pela direção, orientação e chegada do Espírito Santo para executar a obra de Deus? Por que, em nossos dias, os homens dominam e não dão lugar à ação do Espírito Santo? Pensemos nisto! - Durante todo o livro de Atos, o Espírito Santo é apresentado como sendo o diretor, o orientador, Aquele que dava as condições de tempo, espaço e modo para a pregação e expansão do Evangelho. Jesus foi claríssimo ao dizer que sem Ele nada pode ser feito (Jo.15:5 in fine ) e que Ele voltaria para nós, não nos deixando órfãos, enviando o Espíri Santo (Jo.14: 16,18,26). O Vigário de Cristo não é o Papa, como afirmam os romanistas, mas, sim, o Espírito Santo. Deste modo, como se pode pretender ter uma Igreja sem que o Espírito Santo assuma o Seu devido lugar? - Quando Lucas nos fala, por cinquenta vezes, a respeito do Espírito Santo em seu livro, não podemos deixar de observar que Atos é o segundo volume de sua obra. No primeiro volume, que é o Evangelho, o Espírito Santo aparece por dezesseis vezes, a saber: Lc.1:15, 35, 41, 67; 2:25-27; 3:16,22; 4:1,14,18; 10:21; 11:13; 12:10,12. - As primeiras menções ao Espírito Santo dizem respeito às pessoas que foram cheias pelo Espírito para profetizar, a saber, João Batista e seus pais (Isabel e Zacarias), com o também Simeão (Lc.1:15,41,67; 2:25-27). Em tais profecias e manifestações, tem-se a confirmação de que tanto os ministérios de João quanto de Jesus seriam diretamente orientados pe lo Espírito Santo. - Também foi dito que o Espírito Santo é quem haveria de gerar Jesus no ventre de Mari a, a indicar que a própria encarnação do Cristo seria obra do Espírito Santo, como, de rest o, toda a continuidade de Seu ministério (Lc.1:35). - Lucas faz questão, também, no Evangelho, de ressaltar que João Batista havia profeti zado a respeito do batismo com o Espírito Santo (Lc.3:16), profecia que o Cristo ressur reto relembra antes de subir aos céus no livro de Atos (At.1:4,5), como também faz questão de mostrar que Jesus, também, antes do início de Seu ministério, foi ungido pelo Espírito Santo (Lc.3:22), tendo tanto ido ao deserto por direção do Espírito como, após a tentação, iniciado a sua pregação na Galileia (Lc.4:1,14). - Durante a narrativa do ministério terreno de Cristo, por fim, Lucas volta a menc ionar o Espírito Santo por cinco vezes. Quando retornou a Nazaré, Ele próprio, na sinagoga do lugar onde fora criado, afirmou que havia sido ungido pelo Espírito Santo (Lc.4:18 ). Registra uma alegria de Jesus, no Espírito Santo, após o retorno dos setenta discípulo s (Lc.10:21), como também, três ensinos de Jesus mostrando que o Espírito Santo seria da do pelo Pai aos que lh O pedissem (Lc.11:13), que a blasfêmia contra o Espírito Santo não 8 teria perdão (Lc.12:10) e, por fim, que, no momento em que os discípulos fossem leva dos à presença de autoridades, o Espírito Santo lhes ministraria o que haveriam de falar (Lc.12:12). - Já no Evangelho, portanto, Lucas mostrava que o Espírito Santo era indispensável para a realização da obra de Deus, muito particularmente para a execução de tudo quanto Cristo haveria de fazer e ensinar. Desta forma, Lucas como que mostra, em Atos, o cumprimento de tudo quanto fora anunciado e mostrado quanto ao papel do Espírito S anto no ministério terreno de Jesus. - Ao longo do livro de Atos, também, Lucas mostra atitudes e ações de pessoas que não eram dirigidas pelo Espírito Santo e de como, apesar de serem até ações e atitudes dignas de nota, somente se tornaram relevantes diante de Deus depois que passara m a se fazer debaixo da ação do Espírito Santo. - Logo no limiar do livro, vemos a escolha do décimo segundo apóstolo no cenáculo (At.1:15-26). Nesta narrativa, o grande ausente é o Espírito Santo, que somente viri a dias depois deste episódio. Lucas faz questão de registrar que Matias foi o escolhido e q ue passou, desde então, a ser, por voto comum, contado com os onze apóstolos, mas, a pa rtir daí, Lucas nunca mais faz qualquer menção dele, a revelar a inocuidade de uma atitude despida da presença do Espírito Santo, nem mesmo o considerando como apóstolo. - É o que sucede, também, no que concerne a Cornélio, que, apesar de suas orações e esmolas, não conseguia ser salvo, algo que somente ocorreu quando, após ter trazido Pedro para ouvir o Evangelho, recebe, então, o Espírito Santo da mesma maneira que ocorreu em Pentecoste, o que confirmaria a sua salvação (At.10:44-48; 11:15-18). - Foi, também, a situação encontrada por Paulo em Éfeso, ao encontrar discípulos que nem sequer sabiam que havia Espírito Santo. Somente depois de saberem da existência do Espírito Santo e de se batizarem nas águas e, posteriormente, serem revestidos de po der, é que passaram a ser tidos como autênticos e genuínos cristãos (At.19:1-7). - Lucas, pois, não descuida de dar notícia de grupos e movimentos que agradavam a De us e que, mesmo, criam na chegada do Cristo, mas deixa claro que, sem a operação do Espírit o Santo, a direção desta Pessoa divina, independentemente de serem, ou não, revestidos d e poder, não se teria uma genuína comunidade cristã. Atos mostra, de forma sobressalente , que a Igreja somente existe sob a direção e orientação do Espírito Santo. Lembremos disto! - Esta continuidade entre Lucas e Atos é, assim, mais um indicativo de que os text os são de um mesmo autor, afastando especulações com relação à autoria do livro. Além disto, há textos no próprio livro de Atos em que Lucas se inclui como um dos companheiros de Paulo, as chamadas seções nós (Lc.16:10-17; 20:5-15; 21:1-18 e 27:1-28:16). Por isso, até, muitos eruditos preferem denominar os dois livros de Lucas como um só, chamando -o de Lucas-Atos . III UM ESBOÇO DO LIVRO DE ATOS DOS APÓSTOLOS 9 - Se, como disse Russell Shedd, o versículo-chave da narrativa de Atos é At.1:8, vem os que o livro procura mostrar, de forma esquemática e cronológica, como sói ocorrer nos escritos de Lucas, como o Evangelho, por meio dos apóstolos, partiu de Jerusalém, do cenáculo onde os discípulos se reuniram após a ascensão do Senhor, até chegada de Paulo, o apóstolo dos gentios, a Roma, num período de aproximadamente trinta anos. - A narrativa de Atos, pois, leva em conta esta expansão geográfica da evangelização, de Jerusalém a Roma, motivo por que o subtítulo deste trimestre é, precisamente, até os confins da Terra . - Lucas trata de mostrar, portanto, como que, sob direção do Espírito Santo, os apóstolo s partiram do cenáculo em Jerusalém e chegaram até Roma, através da pessoa de Paulo, o apóstolo dos gentios . OBS: A propósito, o fato de Paulo ser o apóstolo descrito por Lucas como sendo aquel e que chegou a Roma é um fator importante para que se recuse a ideia de que Pedro foi, algum dia, bispo de Roma . - Após uma introdução do livro, que relata as últimas instruções do Senhor e Sua ascensão aos céus (At.1:1-9), temos a primeira parte do livro, que nos fala da Igrej a em Jerusalém, que vai desde a reunião dos discípulos no cenáculo, no aguardo da descida do Espírito Santo até a perseguição que se seguiu à morte de Estevão, quando se inicia a dispersão dos crentes (At.1:10-8:1). - Nesta primeira parte do livro de Atos, temos a proeminência da figura do apóstolo Pedro que, por ser uma das colunas (juntamente com Tiago e João), assume uma posição destacada entre os apóstolos, sendo, aliás, o pregador do dia de Pentecostes. Nada p orém autoriza imaginar que se esteja aqui diante do primado de Pedro , que dá sustentáculo à falsa doutrina do Papado, pedra de toque da Igreja Católica Apostólica Romana. Em momento algum, durante este período da história da Igreja, vemos Pedro assumindo a chefia da Igreja, mas, bem ao contrário, notamos a atuação colegiada de todos os apóstol os, sob a direção do verdadeiro Vigário de Cristo: o Espírito Santo (At.4:13,23,24,37;5:18,29,40;6:2). A posição de Pedro, Tiago e João decorria já da intimidade que eles já usufruíam com o Senhor Jesus durante Seu ministério terreno. - A segunda parte do livro narra a história da Igreja da Judeia e Samaria . A perseguição impiedosa de Saulo à igreja em Jerusalém levou os crentes a se dispersarem pela Judeia e Filipe, um dos diáconos, acabou indo até Samaria, onde formou uma igre ja vigorosa que, com a visita dos apóstolos Pedro e João, acabou também recebendo o revestimento de poder. Ainda dentro desta expansão junto aos judeus e samaritanos, vemos Filipe sendo levado até Gaza, para evangelizar o tesoureiro etíope. - Tem-se, então, ainda nesta segunda parte do livro, a importante inflexão da história da Igreja primitiva, quando ela se desprende do judaísmo. Saulo, o perseguidor, converte-se ao Evangelho e Pedro é levado a pregar o Evangelho a Cornélio e aos seus , abrindo a porta do Evangelho a gentios totalmente desvinculados do judaísmo. A ida de Pedro a Cesareia e a conversão de Cornélio, que também é batizado com o Espírito Santo, faz a igreja em Jerusalém admitir que o Evangelho também era para os gentios (At.11:18). O resultado disto é que o Evangelho é pregado por anônimos em Antioquia, a 10 capital da província romana da Síria e se instala a primeira igreja gentílica naquela cidade, que é organizada por Barnabé, para lá enviada pelos apóstolos. Barnabé, inclusive, leva Saulo para lá. É com esta expansão que os discípulos passam a ser chamados de cristãos (At.11:26). - Ao mesmo tempo em que se instala a primeira igreja gentílica, tem-se que se inte nsifica a perseguição à igreja em Jerusalém. Tiago é preso e morto por Herodes Agripa e Pedro, depois de ser preso, obrigado a sair de Jerusalém. Herodes Agripa, porém, acaba morr endo comido de bichos, recebendo a justa retribuição pela sua atitude contrária à Igreja. Ass im termina a segunda parte deste livro (At.8:2-12:20). - Nesta segunda parte de Atos, três figuras se destacam: Pedro, Filipe e Saulo (Pa ulo). Saulo surge como o pior dos perseguidores até então, instante em que Filipe, em Sama ria, alcança apogeu em seu ministério evangelístico. Saulo, então, converte-se e começa paulatinamente a tomar a proeminência do livro, não antes de Pedro, que vai diminuin do sua importância no relato, abrir a porta do Evangelho também aos gentios em Cesareia . A saída de Pedro de Jerusalém e a ascensão da igreja de Antioquia como núcleo de propagação do Evangelho, por meio de Saulo e Barnabé, completa a mudança do protagonismo do livro que, de Pedro, passa para Paulo. - A terceira parte do livro retrata-nos a igreja entre os gentios, ou seja, a ig reja nos confins da Terra, o último estágio registrado em At.1:8. Inicia-se pela chamada do próprio Espírito Santo a Saulo e Barnabé na igreja em Antioquia, passando, então, a narr ar as três viagens missionárias de Paulo: a primeira, na Ásia, na companhia de Barnabé; a segunda, na Europa, na companhia de Silas; a terceira, na Ásia e na Europa, confir mando os irmãos. Depois destas três viagens missionárias, Paulo, certo de que o Espírito Santo o queria em Roma, volta a Jerusalém, onde é preso e mandado para Cesareia, quando queriam matá-lo. Depois de algum tempo em Cesareia, tendo apelado para César, é mandado para Roma, submetendo-se a um naufrágio e indo pregar em Malta. Depois, é mandado para Roma, onde fica em prisão domiciliar, com plena liberdade para pregar o Evangelho, durante dois anos (At.13:1-28:31). - Nesta terceira parte do livro de Atos, a figura proeminente é a do apóstolo Paulo, o apóstolo dos gentios. Através de suas viagens missionárias, o Evangelho alcança os gentios e os apóstolos, representados por Paulo, chegam até Roma. Esta expansão do Evangelho não deixa de criar tensões e controvérsias entre os discípulos e, por isso, ho uve o concílio de Jerusalém (At.15), realizado entre a primeira e a segunda viagem missi onária do apóstolo Paulo, quando, então, admite-se que não há mais qualquer relação entre a lei e a graça. A Igreja dissocia-se, então, do judaísmo, deixando de ser a seita dos nazareno s (At.24:5) para ser reconhecida como uma nova doutrina, uma doutrina que mudaria por completo a história da humanidade. - A narrativa de Lucas, assim, não só traz a perspectiva de continuidade entre o Ant igo e o Novo Testamento, o que seria crucial para que Atos servisse de principal instrum ento apologético contra as heresias de Marcião, mas também dá o devido lastro para o entendimento das epístolas, onde esta doutrina é explicitada e traz o necessário complemento aos ensinos diretamente dados pelo Senhor Jesus. 11 - Como faz questão de ressaltar em seus escritos o pastor Severino Pedro da Silva, da Assembleia de Deus Ministério do Belém São Paulo/SP, o livro de Atos dos Apóstolos não termina em At.28:31. Não há o amém finalizador daquela obra, como ocorre no final do evangelho de Lucas (Lc.24:53). Esta ausência é um silêncio eloquente: não há o amém porque o Espírito Santo continua atuando através da Igreja, Igreja que persiste perseverando na doutrina dos apóstolos (At.2:42). - O amém que porá fim à história da Igreja somente se dará por Aquele que é o Amém, a testemunha fiel e verdadeira, o princípio da criação de Deus (Ap.3:14), o mesmo, aliás, que pediu ao Pai que o Espírito Santo fosse enviado para ficar com a I greja e dar início ao trabalho de evangelização (Lc.24:49). - Jesus, no exato instante em que guardar da hora da tentação que há de vir sobre o mu ndo a igreja que guardou a palavra da Sua paciência (Ap.3:10), vomitará da Sua boca a igre ja morna, misturada com o mundo (Ap.3:15), e, por conseguinte, finalizará o trabalho do Espírito Santo através da Igreja sobre a face da Terra. Ter-se-á, então, o arrebatamento da Igreja e o fim da dispensação da graça. - O livro de Atos continua a ser escrito diariamente em páginas celestiais, páginas estas que serão reveladas no Tribunal de Cristo, quando se manifestarão as obras de cada u m (I Co.3:13), tudo o que tivermos feito por meio do corpo, ou bem, ou mal (II Co.5:1 0).