Quando alguém diz que pratica ou ensina Yôga ou ióga, pode estar se referindo a uma infinidade de
coisas diferentes e até mesmo antagônicas. Vamos garimpar a arqueologia filosófica do Yôga para
descobrir porque testemunhamos nos dias de hoje tantas discrepâncias entre instrutores e escolas de
linhas divergentes.
ORIGENS
O Yôga primitivo surgiu há mais de 5.000 anos numa civilização matriarcal, de etnia dravídica.
Cerca de 2.000 anos depois, foi assimilado pelos invasores patriarcais, de etnia ariana. A partir daí,
durante 3.000 anos, a Índia foi arianizada, persificada, helenizada, islamizada, mongolizada e
cristianizada por sucessivos colonizadores. Durante esses cinco mil anos de história surgiram mais
de cem modalidades de Yôga, pertencentes a quatro grandes grupos, com propostas diferentes e
divergentes, conforme mostra o quadro abaixo:
Vemos acima a divisão primária em Yôga Antigo e Yôga Moderno. Dali partem quatro grandes
grupos.
UPANISHADAS
No que tange à literatura de cada período, Shiva, ao que nos consta, não escreveu nada. Talvez a
escrita nem mesmo existisse. Mas fazemos constar na primeira coluna o tipo de Escritura
denominada Upanishad, pois é onde se encontram as mais antigas referências ao Yôga1.
YÔGA SÚTRA
No século III a.C., o grande mérito de Pátañjali foi o de perenizar o Yôga mediante sua tese Yôga
Sútra2. O grande demérito foi que oficializou-se como Yôga algo que propunha uma postura
comportamental contrária à proposta original. Deixa de ser tântrica para tornar-se brahmáchárya,
seu oposto diametral.
Sútra pode significar cordão ou aforismo. Aforismos são ensinamentos cifrados em resumidíssimas
palavras, somente inteligíveis para os iniciados naquela linha específica.
VIVÊKA CHUDAMANI
No século VIII d.C., Shankara escreve sua obra Vivêkachudamani, publicada no Brasil, na década
de 1960 pela FEEU (Fundação Editorial Educacional Universalista). Trata, obviamente, de Vêdánta.
MESTRES CONTEMPORÂNEOS
Nos séculos XIX e XX surge uma nova geração de Mestres, quase todos de linha Vêdánta. Citamos
vários, uma vez que não sabemos qual deles será considerado o mais expressivo Mestre do Yôga
Contemporâneo. Só o saberemos daqui a uns duzentos anos ou mais. Na sua época, nenhum dos
Mestres foi considerado a maior autoridade do respectivo período histórico. Pelo contrário. Em seu
próprio tempo, muitos foram atacados, difamados, perseguidos e torturados.
1
Yôgashára Up., Yôgatattwa Up., Yôgakundaliní Up., Swetaswatara Up., Maitrí Up., Katha Up., etc.
2
Leia o livro Yôga Sútra de Pátañjali, do Mestre DeRose.
CRONOLOGIA HISTÓRICA DO YÔGA
Divisão YÔGA ANTIGO YÔGA MODERNO
Tendência Sámkhya Vêdánta
Período Yôga Pré- Yôga Clássico Yôga Medieval Yôga Contemporâneo
Clássico
Época Mais de 5.000 séc. III a.C. séc. VIII séc. XI d.C. séculos XIX e XX
anos d.C.
Mestre Shiva Pátañjali Shankara Gôrakshanatha Aurobindo3
Literatura Upanishad Yôga Sútra Vivêka Hatha Yôga Rámakrishna
Chudamani Vivêkánanda
Shivánanda
Chidánanda
Krishnánanda
Yôgêndra
TRASH BOOKS
Quanto à literatura contemporânea, optamos por não mencionar nenhuma. Seria muito prematuro
citar algum livro como o principal deste período, pois a bibliografia editada nestes séculos costuma
deixar muito a desejar: erros primários são cometidos, a imagem do Yôga passa a ser muito mais
distorcida, e até caricaturizada, em livros popularescos escritos por autores que não são autoridade –
a maioria nem sequer é do ramo! É a era do “Yôga em 10 lições” e do “Cure a sua mazela com o
Yôga”.
CORRENTES INCOMPATÍVEIS
Portanto, primeira barreira é uma fronteira étnica, originada pela guerra entre os invasores arianos e
os donos da terra, os drávidas. Trata-se de uma fronteira mais séria que a existente entre Sámkhya e
Vêdánta, pois esta outra é apenas ideológica. A que divide o Yôga Pré-Clássico dos que surgiram
depois, é uma fronteira de sangue, que custou muita dor, torturas, mortes e escravidão. Foi tão
intensa que ficou profundamente impregnada no inconsciente coletivo da Humanidade. Tanto que
hoje, 3.500 anos depois, do outro lado do mundo, se um latino – que não é drávida nem ariano, que
não estava lá e não tem nada a ver com o conflito – ingressa no Yôga, inevitavelmente,
involuntariamente, agrega-se a uma das duas vertentes e torna-se opositor à outra! Se sua opção foi
pelo Yôga de raízes tântricas, vincula-se ao setor do inconsciente drávida; ou, ao contrário, se sua
opção foi pelo Yôga de raízes brahmácháryas, atrela-se ao do inconsciente ariano. Isso se nota
imediatamente pelo fato de que o praticante torna-se fortemente antipático à outra tradição e
começa a manifestar atitudes hostis com relação a ela.
3
Embora a tendência da maior parte dos Mestres e Escolas continue sendo brahmáchárya, no período contemporâneo começa a se
instalar uma tendência tântrica (dakshinachara) representada por Aurobindo e Rámakrishna.
A primeira reação que temos ao tomar contato com essa realidade é a de não aceitar o antagonismo
e querermos conciliar as duas correntes. Infelizmente, todos os que o intentaram foram execrados
por ambas, como se fossem duplos traidores. Quando o leitor estudar o tema egrégora, vai entender
o motivo pelo qual um indivíduo é sempre o elo mais fraco, que se rompe ao tentar interferir com
fenômenos grupais, especialmente se envolvem muitos seguidores, se a egrégora é antiga e já está
consolidada. Como este assunto é suficientemente explanado no nosso livro Encontro com o
Mestre, não vamos repetir aqui aquelas explicações, mas recomendamos veementemente a leitura
da obra mencionada.
RESUMO HISTÓRICO DOS EVENTOS QUE INFLUENCIARAM O YÔGA
Pré-história – aborígines australóides
Proto-história – drávidas
História – arianos, gregos, persas, mongóis e outros povos
Civilização do Vale do Indo, também denominada + de 3.000 Shiva cria o Yôga. Na mesma época surgem o
dravídica ou harappiana. a.C. Tantra e o Sámkhya.
Começo da invasão ariana. No mesmo período ±2.500 a.C. Os guerreiros nômades arianos destróem as
tem início a decadência da Civilização dravídica edificações da Civilização do Vale do Indo, mas,
do Vale do Indo, mas alguns historiadores como viviam em tendas, não sabiam construir
declaram que não teve nada a ver com a cidades. Isso fez da Índia o único país que, depois
ocupação ariana. Foi coincidência. de ter tido a arquitetura, ficou sem ela por vários
séculos.
Vaga final da ocupação ariana, após 1.000 anos ±1.500 a.C. O Yôga, o Tantra e o Sámkhya sofrem
de expedições militares e de colonização. discriminação, pois são considerados patrimônio
cultural do povo que perdeu a guerra.
Recrudescem as medidas arianas para evitar a ±Séc. X a.C. Surgem as castas (varnas).
miscegenação racial com os drávidas.
Depois das invasões persa e grega, os arianos ±Séc. III Pátañjali escreve o Yôga Sútra, formalizando a
atenuam suas restrições quanto ao Yôga. a.C. arianização do Yôga.
A islamização, discretamente iniciada com a Séc. XI Gôrakshanatha cria o Hatha Yôga Tem início o
invasão árabe, vai instalar-se efetivamente com costume de oferecer benefícios terapêuticos em
a próxima invasão. troca da dedicação ao Yôga.
A Índia passa a receber hordas de ocidentais 1970 Intensifica-se a deturpação do Yôga no Ocidente,
interessados no Yôga, mas que interpretam tudo sob o comando da Califórnia. As demais culturas
errado, de acordo com os seus paradigmas. acatam sua atitude utilitarista, mesclante e
mercantilista.
Apesar das descobertas históricas e 2.000 Como reação contra a deturpação do Yôga, DeRose
arqueológicas, os professores de Yôga insistem lança uma ofensiva internacional de resgate do
em ignorar que existiu um Yôga Pré-Clássico e Yôga Antigo, que está em extinção.
persistem em afirmar que o ariano Pátañjali é o
“pai do Yôga”.