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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS

CENTRO DE LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO

BÁRBARA MIDORI NOMURA


DAVID DA SILVA JUNIOR
OTÁVIO AUGUSTO ANTUNES DA SILVA
RAFAEL OLIVEIRA JORGE
REGINEI DOMINGOS DE MORAIS

Assembleia do Povo
O QUE IMPORTA É O QUE A GENTE É!

CAMPINAS
2009
BÁRBARA MIDORI NOMURA
DAVID DA SILVA JUNIOR
OTÁVIO AUGUSTO ANTUNES DA SILVA
RAFAEL OLIVEIRA JORGE
REGINEI DOMINGOS DE MORAIS

Assembleia do Povo
O QUE IMPORTA É O QUE A GENTE É!

Relatório de Fundamentação Teórica elaborado como


exigência parcial para aprovação na disciplina Projeto
Experimental, da Faculdade de Jornalismo, do Centro
de Linguagem e Comunicação, da Pontifícia
Universidade Católica de Campinas, sob a orientação
do Profª. Drª. Ivete Cardoso do Carmo Roldão.

Pontifícia Universidade Católica de Campinas


Campinas, 2009
Esta obra foi licenciada com uma Licença Creative Commons -
Attribution-NonCommercial-NoDerivs 3.0 Unported. Para ver
uma cópia desta licença, visite
http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/3.0/ ou envie um
pedido por escrito para Creative Commons, 171 Second Street,
Suite 300, San Francisco, California 94105, USA.

Ficha catalográfica
Elaborada pelo Sistema de Bibliotecas e Informação – SBI –
Pontifícia Universidade Católica de Campinas

m301.242098161 Nomura, Bárbara Midori.


N811a Assembléia do povo: o que importa é
o que a gente é./Bárbara Midori Nomura; David da Silva
Junior; Otávio Augusto Antunes da Silva; Rafael Oliveira
Jorge; Reginei Domingos de Morais. - Campinas: PUC
Campinas, 2009.
115 p.

Modalidade: vídeo documentário


Orientador (a): Ivete Cardoso do Carmo Roldão.
Monografia (Graduação) – Pontifícia Universidade Católica de
Campinas, Centro de Linguagem e Comunicação, Faculdade de
Jornalismo.

1. Movimentos sociais – Campinas (SP) 2. Campinas (SP) -


História 3. Urbanização – Campinas (SP) 4. Narrativas pessoais I.
Silva Junior, David da II.Silva, Otávio Augusto Antunes da III. IV.
Jorge, Rafael Oliveira V. Morais, Reginei Domingos de VI. Roldão,
Ivete Cardoso do Carmo. VII. Pontifícia Universidade Católica de
Campinas, Centro de Linguagem e Comunicação, Faculdade de
Jornalismo VIII. Título.
RESUMO

O documentário apresenta em narrativa fragmentos de memórias de militantes da Assembleia do


Povo, movimento social urbano campineiro, constituído sobretudo por favelados, que teve seu auge
de 1979 a 1982. O vídeo parte de relatos para contar a versão dos militantes sobre a história do
movimento e trabalha momentos importantes, como os atos em frente à Prefeitura, e conquistas,
como o direito à terra e à cidadania. Além do documentário, o DVD possui extras, como um vídeo
do reencontro, por nós organizado, dos ex-militantes do movimento, um vídeo com trechos de
entrevistas com os ex-assessores e um making-off. Este relatório de fundamentação teórica
apresenta um breve histórico da urbanização de Campinas e da Assembleia do Povo neste contexto,
uma breve discussão teórica sobre a relação entre documentário e produção jornalística e o relato
de como foi produzido este Projeto Experimental.

Palavras chave: Campinas. Assembleia do Povo. Documentário.


SUMÁRIO

Introdução ............................................................................................................................. 7
1. A Representação Jornalística do Tema .......................................................................... 10
1.1. Campinas e a Assembleia do Povo .............................................................................. 10
1.1.1. Início da urbanização em Campinas ......................................................................... 10
1.1.2. Década de 1950: surgem as favelas .......................................................................... 12
1.1.3. Década de 1970: cresce a população favelada e a efervescência social ................... 14
1.1.4. Assembleia do Povo ................................................................................................. 19
1.1.4.1. A Lei da Terra ....................................................................................................... 24
1.1.4.2. Seminário Nacional de Favelas ............................................................................. 26
1.1.4.3. Eleições e posicionamento político ....................................................................... 27
1.1.4.4. Mutirões pela urbanização ..................................................................................... 28
1.1.4.5. A Prefeitura e a urbanização ................................................................................. 31
1.1.4.6. A luta esfria ........................................................................................................... 33
1.1.4.7. A herança ............................................................................................................... 35
1.2. Concebendo um documentário sobre a Assembleia do Povo ...................................... 37
1.2.1. Limites entre documentário e telejornalismo ........................................................... 37
1.2.1.1. Documentário: cinema X jornalismo .................................................................... 39
1.2.1.2. Cinema direto e cinema verdade ........................................................................... 40
1.2.2. A opção pelo documentário ...................................................................................... 43
1.2.3. Concepção do vídeo: proposta ................................................................................. 44
1.2.3.1. Dispositivo ............................................................................................................ 44
1.2.3.2. Questões éticas consideradas ................................................................................. 45
2. Procedimentos para a execução do Projeto Experimental .............................................. 48
2.1. Processo de Pesquisa ................................................................................................... 48
2.1.1. Localização das fontes .............................................................................................. 50
2.2. As etapas da Produção jornalística .............................................................................. 52
2.2.1. Seleção de fontes ...................................................................................................... 52
2.2.1.1. Lideranças entrevistadas ........................................................................................ 53
2.2.1.2. Assessores entrevistadas ....................................................................................... 55
2.2.2. Pautas ou pré-roteiro ................................................................................................ 56
2.2.3. Trabalho de campo ................................................................................................... 57
2.2.4. Processo de edição ................................................................................................... 61
3. Apresentação do produto final ....................................................................................... 62
3.1. Justificativa .................................................................................................................. 62
3.2. Público alvo ................................................................................................................. 62
3.3. Custo/Gastos ................................................................................................................ 63
3.4. Viabilidade de divulgação ........................................................................................... 63
Considerações finais ........................................................................................................... 65
Referências ......................................................................................................................... 66
Anexos ................................................................................................................................ 71
Introdução

Assembleia do Povo: O QUE IMPORTA É O QUE A GENTE É! é um vídeo


documentário sobre a Assembleia do Povo, movimento social urbano, de Campinas,
composto por favelados que lutaram para ganharem a posse definitiva da terra e melhorias
nos bairros onde moravam. Semanalmente cada favela fazia uma reunião para levarem as
reivindicações no Centro Pastoral Pio XII, a fim de discutirem com as demais favelas e
assessores técnicos. Com as propostas em mãos, os favelados se dirigiam ao saguão da
prefeitura, e em assembleia, discutiam as propostas e cobravam as promessas da
administração municipal.
Os favelados tiveram a assessoria de arquitetos urbanistas, advogados, religiosos
entre outros profissionais e estudantes. Todos juntos conseguiram fazer com que os antes
favelados, se transformassem em cidadãos campineiros.
O documentário apresenta, em narrativa, fragmentos de memórias de militantes da
Assembleia do Povo, que teve seu auge de 1979 a 1982. O vídeo parte de relatos para
contar a versão dos militantes sobre a história do movimento e trabalha momentos
importantes, como os atos em frente à Prefeitura, e conquistas, como o direito à terra e à
cidadania.
Para complementar o documentário, decidimos produzir extras que ajudassem a
contar a história da Assembleia do Povo e até da produção do documentário. No DVD
estão um vídeo do reencontro (para que todos, mesmo os que não entraram no
documentário, tivessem suas histórias documentadas), trechos das entrevistas dos
assessores (que ajudam a contar melhor a história do movimento) e o making-off (que
mostra a nossa alegria em documentar as memórias dos militantes).
A ideia de trabalhar este tema no projeto experimental de conclusão de curso foi
dada por dois integrantes do grupo, Reginei Domingos de Morais e Otávio Augusto
Antunes da Silva, que ao ouvirem relatos sobre a Assembleia do Povo durante a militância
do Movimento Eclesial (o primeiro) e Estudantil (o segundo), tiveram sempre a vontade de
se aprofundarem no tema. Os outros três integrantes, vindos de outras localidades, ao ouvir
os primeiros relatos tiveram interesse em conhecer a história do movimento, para a
produção de um registro das memórias dos protagonistas, aqueles moradores das favelas
que o lideraram .

7
Muitos desses favelados não tiveram oportunidades de estudar, alguns são
analfabetos, outros tem pouca leitura e escrita, mas gostariam de ter registrado toda a luta.
Essa foi a motivação maior da escolha pelo documentário, já que o audiovisual não exige o
domínio da leitura. Assim, a opção pelo vídeo se deu pela possibilidade de fundir imagem
e som no local de moradia dos personagens, além de tornar o registro acessível a um dos
públicos alvo prioritários do trabalho: os próprios moradores das favelas.
Nosso objetivo, ao fazer o registro histórico do movimento Assembleia do Povo em
formato de documentário, é possibilitar que as experiências desse movimento possam ser
apropriadas pelas futuras gerações e suscitar o debate acerca de dilemas contemporâneos
das grandes metrópoles. E, assim, contribuir para os debates em torno dos movimentos
sociais urbanos, do direito à cidadania, da participação popular, da organização social e do
direito à terra, principais assuntos a permear o tema.
O trabalho tem importância como registro histórico e de memória para os
moradores dos bairros ou das favelas que ainda hoje lutam por condições mínimas de
saneamento e urbanização, além de outros movimentos por qualidade de vida, como saúde
e educação. As pesquisas já desenvolvidas sobre a Assembleia do Povo permanecem
dentro dos limites da academia, conforme será discriminado em outro momento deste
relatório, o que faz com que aos poucos uma parte da história seja perdida de vista pelos
moradores da periferia de Campinas. Desta forma, produzir um documentário a partir
dessas pesquisas já realizadas e dos depoimentos de quem viveu essa história se justifica
como uma opção desse grupo de futuros jornalistas, em atuar com e para um segmento da
sociedade, via de regra, excluído dos meios de comunicação.
Para a melhor compreensão desta história, no primeiro capítulo deste relatório
apresentamos uma cronologia com os principais aspectos da história da urbanização do
município. Passando rapidamente pelo início da urbanização, com ciclo do açúcar e do
café, seguindo pela contratação do engenheiro arquiteto Prestes Maia que elaborou o Plano
de Melhoramentos Urbanos de Campinas, o surgimento e o ápice das favelas, até
chegarmos ao que foi a Assembleia do Povo, suas lutas, conquistas e a herança deixada.
Na segunda parte do primeiro capítulo, nossa intenção foi demonstrar os limites
entre documentário e telejornalismo, nossa área de estudos. Procuramos apresentar a teoria
que dá bases de sustentação ao projeto e permite sua construção, estabelecimento de
linguagem e formato.

8
No segundo capítulo, traçamos uma espécie de diário de bordo da equipe que
mostra como caminhamos com o projeto, desde a etapa de pesquisa bibliográfica,
documental e entrevistas passando pelas etapas da produção (seleção de fontes, gravação
etc.) até a finalização do vídeo. Nesse diário, abordamos a importância de utilizar métodos
funcionais de entrevista ao conversar com idosos e por isso apresentamos resumidamente
os resultados de nossa breve pesquisa sobre algo fundamental em nossa produção, a
entrevista. Mostramos também em que momentos e os porque tomamos determinadas
decisões, para a chegarmos ao resultado esperado.
No terceiro e último capítulo, apresentamos com maior detalhamento o nosso
público alvo e nossa justificativa da importância de apresentar o documentário para esse
público. Além disso, apresentamos nossos custos e traçamos estratégias e metas de
divulgação e distribuição, para que possamos cumprir nosso objetivo e contribuir para os
debates no espaço público.
Acreditamos assim que a fundamentação de nosso trabalho, por meio deste
relatório, poderá dar ao estudante e/ou pesquisador que buscá-la, uma contribuição ao
estudo da produção de documentários no meio universitário.

9
1º Capítulo
A Representação Jornalística do Tema:

1.1. Campinas e a Assembleia do Povo

Para entender o movimento de favelados denominado Assembleia do Povo, é


necessário primeiro compreender as transformações ocorridas em Campinas durante todo o
período de urbanização do município.

1.1.1. Início da urbanização em Campinas

O desenvolvimento de Campinas, antes de sua industrialização e consequente


urbanização, se deu em dois períodos, o ciclo da cana e o ciclo do café. Não houve um
marco divisório entre eles. “Enquanto o café surgia paulatinamente, o açúcar ainda
prosperava” (PUPO, 1969 apud BAENINGER, 1992, p. 24). A cultura do café teve seu
auge por volta de 1870, momento em que surgiram as primeiras indústrias do município.
Para Badaró (1996), no período entre 1870 e 1888, quando crescia a instalação de
indústrias e o setor financeiro era estimulado, a população operária evitava as áreas
valorizadas, nas proximidades das industriais, seus locais de trabalho, buscando áreas
periféricas, próximas às saídas do município. Algumas indústrias, também se instalaram
longe do centro. “Santa Cruz, na saída para Mogi, se revigorou. Despontaram os bairros do
Fundão (Ponte Preta), saída para São Paulo e Valinhos, e Bonfim, saída para Rebouças,
Vila Americana e Limeira” (BADARÓ, 1996, p. 30).
Com a libertação dos escravos, a chegada de imigrantes europeus para suprir a
demanda de mão-de-obra e o inicio de uma industrialização ainda arcaica, o município
cresceu. “Em 1872 a população de Campinas era constituída por 33.000 habitantes, sendo
que destes, 14.202 estavam localizados na sede do município” (BADARÓ, 1996, p. 26). Já
em 1888, o município passou a ter 50 mil habitantes, 20 mil na área urbana e 30 mil na
área rural. Com três surtos de febre amarela, entre 1889 e 1897, o número total de
habitantes do município caiu para 5 mil.

10
Para controlar novos surtos, a Intendência Municipal se viu obrigada a criar
medidas de infra-estrutura e higiene em Campinas. As medidas cumpriram os objetivos
pensados e em 1900, a população urbana já era de 19 mil habitantes. Baeninger (1992, p.
38) afirma que com a chegada de novas pequenas indústrias, a população cresceu,
atingindo, em 1934, uma população de 132.819 habitantes.
Campinas não tinha estrutura para suportar tamanha população. Segundo
Carpintero (1991), com o fluxo migratório da década de 1920, surgiram os cortiços e os
bairros periféricos. Para controlar o crescimento, implantar o saneamento necessário e
padronizar o ambiente urbano, satisfazendo a elite campineira, a administração municipal
contratou o engenheiro arquiteto Prestes Maia, que traçou em 1934 o Plano de
Melhoramentos Urbanos de Campinas, conhecido como “Plano Prestes Maia”.
As primeiras providências tomadas pela administração municipal ao contratar o
engenheiro, foi instalar a Seção de Arquitetura e Urbanismo, reestruturar o Serviço de
Cadastro e de Estatística, e criar a Comissão de Urbanismo para dar suporte aos estudos.
Ainda em 1934, também foi criado o Código de Construção, que determinava regras sobre
as dimensões das vias, calçadas, altura de prédios e recuos. Com o código:

Foi instituída a censura estética dos edifícios, criaram-se normas


especiais para casas populares e operarias e os cortiços definitivamente
proibidos. As construções coletivas, públicas, privadas e institucionais
foram detalhadas. Permaneciam as quatro zonas concêntricas 1 e
estabelecia-se a hierarquia viária assumindo a articulação da rede
(PAOLI, 2000, p. 71).

Em 1936 foi criada a Comissão de Melhoramentos Urbanos. Todas as propostas do


trabalho de Prestes Maia com a comissão foram instituídas pelo Ato Municipal nº 118 de
23 de abril de 1938 que aprovou o Plano de Melhoramentos, “[...] sem que fossem
estipulados prazos para início e conclusão das obras propostas. Nas condições preliminares
do Ato nº 118, esta estratégia é justificada pelo fato de não impor ao município grandes
despesas e demolições precipitadas” (BADARÓ, 1996, p. 89).
As propostas do Ato nº 118 baseavam-se em: melhorar o sistema viário, canalizar o
tráfego interurbano ou rural, vias centrais de trânsito rápido, alargamento de ruas,
prolongação de avenidas, criar amplos parques com vegetação abundante, entre outros. Em
relação às unidades residenciais, seriam instaladas unidades escolares perto das moradias,
1
A cidade tinha um zoneamento compreendido em centro comercial, área já edificada, novos loteamentos e
área de expansão.
11
locais para lazer e práticas esportivas, comércio e sistema de transporte. Entre 1937 e 1945
Campinas, ganhou uma extensão em áreas construídas. “Na condição de bairros industriais
e proletários, desenvolveram-se a Vila Nova, o São Bernardo e a Vila Teixeira, a Vila
Marieta, houve a expansão e adensamento da Ponte Preta e da Vila Industrial”
(CARPINTERO, 1991, p. 50).
No início da década de 1940, a prefeitura pretendia implantar uma Política
Habitacional dirigida à classe trabalhadora. Paoli (2000) conta que tal fato criou uma
segregação sócioespacial no município. A Lei nº 19 de 23 de junho de 1948, que dispõe
sobre a construção de habitação proletária em determinadas zonas, proposta pelo vereador,
engenheiro e arquiteto Eduardo Badaró, reviu o decreto de Lei nº 82 de 26 de dezembro de
1940, que dispunha da estabilização de normas para facilitar a formação de núcleos de
habitação tipo mínimo e construção de habitações econômicas. Para Badaró (1996), com
esta medida, o vereador trouxe de volta as condições para construção das moradias de tipo
mínimo e de tipo econômico, atribuindo à Prefeitura a responsabilidade de fornecer aos
interessados o projeto arquitetônico e de prestar assistência técnica à obra gratuitamente,
contanto que a área de construção pretendida não ultrapassasse a área de 60 m² e que o
proprietário não possuísse outro prédio residencial no município (BADARÓ, 1996, 113-
114). A construção dos cortiços continuou proibida e o município ganhou novas
habitações.

1.1.2. Década de 1950: surgem as favelas

A década de 1950 foi marcada pelo surgimento de favelas, verticalização do


Centro, aumento da segregação socioeconômica da população carente e projeção do
município como importante centro industrial. Segundo Baeninger (1992), até então, a
inexistência das favelas mostrava competência administrativa municipal.

O baixo custo dos lotes, ofertados em grande quantidade nos primeiros


anos da década de 50, facilitou a construção de habitações operárias em
terrenos próprios, com amparo técnico da Prefeitura Municipal, segundo
a Lei nº 19 de 23/6 de 1948, registrando-se até 1965 nada menos que
18.790 habitações proletárias construídas por este processo (BADARÓ,
1996, p. 137).

12
Não se pode afirmar ao certo a data e o local em que se instalou a primeira favela
em Campinas. As primeiras reportagens2 a tratarem do assunto são da década de 1960, mas
apontam a década anterior como sendo a do surgimento das favelas. As reportagens
traziam manifestações e pedidos para que a administração municipal tomasse providências
em relação ao novo problema que se alojava em Campinas.
Como exemplo, há a reportagem “Necessária a erradicação das favelas – Prefeitura
tem meios para impedir construções clandestinas”, publicada no jornal Diário do Povo em
17 de janeiro de 1963. Segundo a reportagem, “as favelas que se instalaram na Vila
Olímpia, Vila Georgina e outros pontos, não podem ter tido suas plantas aprovadas nem
fornecidas pela Prefeitura. Logo, são clandestinas”.
A reportagem “Estas são as soluções para o desfavelamento”, do jornal Diário do
Povo, em 10 de setembro de 1969, mostra que um levantamento da Secretaria do Bem
Estar, registrou cerca de 400 famílias em terrenos da Prefeitura. Para tirar estas pessoas de
suas casas, a administração municipal, deslocou os favelados para residências transitórias
onde ficariam por seis meses, prazo dado para que comprassem uma casa.
Segundo Lopes (1997), as favelas surgiram em Campinas no momento em que o
país moldava sua infra-estrutura à maciça industrialização (fim da década de 1950), onda
que também atingiu o município. Os investimentos da prefeitura na época eram revertidos
quase que exclusivamente para a reforma das bases urbana e industrial, o que manteve a
economia campineira entre as mais representativas do país e deixou a população de baixa
renda no total abandono. Campinas tinha potencial para aumentar sua planta industrial
cada vez mais, pois possuía imóveis e mão-de-obra mais baratos que as capitais.
A partir de 1960, o município tornou-se eixo da expansão industrial do Estado.
Segundo Baeninger (1992, p. 12), a relativa descentralização da atividade industrial a partir
da Região Metropolitana de São Paulo conduziu Campinas ao crescimento econômico e
populacional acelerado. Além disso, a integração do mercado de trabalho e subordinação
da agricultura à indústria contribuiu para que novos incentivos estatais beneficiassem a
região.
Para resolver o problema da moradia popular, em 1960 a Prefeitura passou a
planejar as casas populares e em 1961 prorrogou o prazo de regularização das construções
clandestinas. Para Paoli (2000), em 1965 a medida adotada foi a construção de casas

2
Em pesquisa realizada no acervo da Rede Anhanguera de Comunicação, o grupo não conseguiu localizar
nenhum jornal da década de 1950 com informações sobre o assunto.
13
populares com a atuação da Companhia de Habitação Popular de Campinas (COHAB-
Campinas). Durante todo este período, o município sofreu transformações econômico-
sociais que reproduziram o padrão periférico urbano peculiar às grandes concentrações
metropolitanas, “tanto pelos baixos níveis de remuneração da classe trabalhadora,
reforçando a relação capital-trabalho, como pela carência de políticas sociais”
(PATARRA, 1989 apud BAENINGER, 1992, p. 15). A taxa de crescimento manteve ritmo
acelerado neste período. Segundo Barninger (1992, p. 69), Campinas passou de uma taxa
de crescimento de 3,7% ao ano, entre 1950 e 1960, para 5,5% ao ano, em 1960-70. A taxa
de crescimento anual chegou a 5,9% na década de 1970.

1.1.3. Década de 1970: cresce a população favelada e a efervescência social

Ainda na reportagem “Estas são as soluções para o desfavelamento”, do jornal


Diário do Povo, publicada em 10 de setembro de 1969, a Secretaria do Bem-Estar Social
mostra que as 400 famílias de favelados, já citadas, cerca de duas mil pessoas, viviam em
condições insalubridades (são citadas as favelas do Grameiro e do Jardim do Trevo).
Naquele período, para a Prefeitura, a solução era a construção de casas pela COHAB-
Campinas. Para remover os favelados dos barracos, a Secretaria em conjunto com a
COHAB lançou o projeto das casas transitórias, onde o favelado moraria por seis meses até
conseguir guardar dinheiro para comprar uma casa financiada pelo Banco Nacional de
Habitação (BNH). “Assim, a política predominante na cidade nas décadas de 60 e 70 foi a
do desfavelamento e da remoção, sob o controle irrestrito e arbitrário da Secretaria de
Bem-Estar Social, ou Promoção Social” (PAOLI, 2000, p. 116).
O Brasil viveu no período do governo do General Emílio Médici (1969 a 1974),
ainda sob a Ditadura Militar, o “Milagre Econômico”, crescimento econômico
acompanhado de concentração da renda e da pobreza. “Campinas, como tantos outros
municípios, procurou estabelecer diretrizes de planejamento, racionalizando seu
desempenho político-administrativo, para melhor se inserir no intenso processo de
modernização do país” (LOPES, 1997, p. 60). Para ter um crescimento organizado, foi
criado o Plano Diretor de Campinas. De 1971 a 1973, o plano direcionou dinheiro para as
casas transitórias e também para o plano habitacional a cargo da COHAB.
Segundo a reportagem “A promoção do favelado numa análise profunda”, do jornal
Correio Popular, no dia 31 de outubro de 1973, oito favelas de Campinas, localizadas nos
14
bairros Jardim Nossa Senhora Auxiliadora, Jardim do Trevo, Jardim Dom Vieira, Vila
Carminha, Jardim São Pedro e Parque da Figueira, tiveram destinos diferentes com o plano
das casas transitórias, sendo que quatro famílias foram encaminhadas a casas da COHAB e
199 foram encaminhadas para compra de terrenos. Segundo Lopes (1997), as casas
transitórias ajudaram na valorização imobiliária de alguns pontos da cidade, como
aconteceu perto da lagoa do Taquaral.

Exemplo disto é o loteamento de alto padrão em torno da lagoa do


Taquaral, onde ficam os bairros do parque Taquaral e Nossa Senhora
Auxiliadora. Próximo deste local, em direção à rodovia Dom Pedro I,
foram construídas as vilas da COHAB – Costa e Silva e Miguel Vicente
Cury – supostamente para abrigar favelados removidos da região do
Taquaral, com a extinta favela do Grameiro (LOPES, 1997, p. 64).

Para esta autora, o programa de casas transitórias não obteve resultado, pois a
maioria da população carente não conseguia em seis meses atender às exigências feitas
pelo BNH. Enquanto isso, novas famílias chegaram a Campinas ocupando áreas livres de
uso comum do povo, como praças e margens de mananciais.
Baeninger (1992, p. 75) aponta que no “período 1970-80, Campinas foi o principal
pólo receptor dos fluxos migratórios no interior do Estado de São Paulo”. As principais
origens dessas pessoas eram os estados de Minas Gerais e Paraná, e a Região
Metropolitana de São Paulo. A socióloga explica que a maioria das pessoas vindas dos
estados vizinhos tinha como destino as favelas, enquanto a maioria vinda da Região
Metropolitana de São Paulo representava mão de obra qualificada e recurso humano para
os centros de pesquisas e universidades campineiras.
Segundo a reportagem “A promoção do favelado numa análise profunda”, de 31 de
outubro de 1973, do jornal Correio Popular:

Das 35 favelas existentes em Campinas atualmente, num total de 1.359


famílias, 120 famílias são procedentes da região nordeste: 53 da Bahia,
22 de Alagoas, 221 de Pernambuco, 13 do Ceará, 5 do Sergipe, 3 da
Paraíba, 2 do Rio Grande do Norte e 1 do Piauí.
Da região centro-oeste do país, vieram para Campinas 41 famílias, sendo
vinte do Mato Grosso e 21 de Goiás. O maior índice migratório
registrado em Campinas é de pessoas provenientes da região sudeste;
num total de 971 famílias. Dessas, 125 vieram da capital para Campinas;
563 de outras cidades do Estado; 280 de Minas Gerais, 2 do Estado do
Rio de Janeiro e 1 da Guanabara.

15
Da região sul, vieram para Campinas 42 famílias do Paraná; 2 de Santa
Catarina; 12 do Rio Grande do Sul. Além de todos esses dados concretos,
a pesquisa realizada pela Promoção Social do Município acusou a vinda
de mais 181 famílias não identificada em relação a sua origem.

A população favelada campineira cresceu de maneira vertiginosa. Entre 1971 e


1980 a administração pública registrou uma taxa média de crescimento de 34,6% ao ano
(enquanto a população urbana cresceu 5,83% ao ano), passando de 600 barracos no início
do período para 8.700 em 1980. Baeninger (1992, p. 85) conta que em 1971, este segmento
não representava 1% da população urbana, em 1980 já representava 7,6%.

Diante desse contexto, a relação crescimento populacional e pobreza


passou a compor a pauta das discussões da administração municipal; o
intenso fluxo migratório aparece como fenômeno caótico e perigoso. No
final dos anos 60, e início dos 70, o migrante já aparece como bode
expiatório: causa do crescente surgimento de favelas, da desorganização
urbana e do aumento da mendicância na cidade (BAENINGER, 1992, p.
85).

Para Baeninger (1992), a gravidade do processo vivido na época se manifesta na


reprodução de fenômenos como o da “periferização”, do acentuado processo de rejeição ao
migrante da população mais pobre, e da formação de eixos de crescimento econômico-
populacionais que se diferenciam quanto ao tipo de população neles residentes.
Durante a Ditadura Militar, que durou de 1964 a 1985, todos os tipos de
organizações populares eram controlados, a fim de garantir ordem no país. Lopes (1997),
afirma que neste contexto surgiu em Campinas, antes da formação da Assembleia do Povo,
as Sociedades Amigos de Bairros (SABs). A administração municipal, por sua vez, criou
as Administrações Regionais (ARs), na década de 1970, para atender e controlar as
reivindicações das Sociedades. As ARs “[...]atuavam também em áreas mais específicas,
como saúde, educação, habitação e transporte” (LOPES, 1997, 75). As reivindicações das
SABs eram passada para as Administrações Regionais, que para atendê-los deveria passar
por processos de protocolos, preenchimento de formulários e espera.
Os moradores das favelas não tinham luz, água, rede de esgoto, creches e
assistência médica, como mostra a reportagem “Favela, bonita só no samba”, publicada no
jornal Diário do Povo, em 16 de maio de 1978. As famílias da favela do Jardim
Flamboyant, Vila Nogueira, Jardim Santa Lúcia e Jardim das Bandeiras, reclamavam da
falta dos mesmos recursos básicos.
16
Os problemas urbanos se agravavam cada vez mais, não só em Campinas, mas em
todo o Brasil. Segundo Doimo (1984), na década de 1970, principalmente depois de 1974,
quando teve fim o “milagre econômico”, as contradições urbanas se avolumaram. Face à
política econômica centralizada e adversa à reprodução ampliada da força de trabalho,
“começam a surgir, com certa intensidade, ao lado do ressurgimento do movimento
operário e de outras formas de manifestação da sociedade civil, os movimentos urbanos”
(DOIMO, 1984, p. 29).

Por movimento social urbano se entende um sistema de práticas que


resulta da articulação de uma conjuntura definida, a um tempo, pela
inserção de agentes-surportes na estrutura urbana e na estrutura social, e
de natureza tal que seu desenvolvimento tenda objetivamente para
transformação estrutural do sistema urbano, ou para uma modificação
substancial da correlação de forças na luta de classes, ou seja, em última
instância, no poder do Estado. (CASTELLS, 1974, apud DOIMO, 1984,
p. 25).

Os estudos já feitos sobre os movimentos urbanos até a década de 1970 deixam


evidentes a pouca capacidade de pressão frente ao Estado. Além disso, a debilidade
organizativa era uma de suas características marcantes. Segundo Doimo (1984), os novos
movimentos, sobretudo os que faziam frente ao arrocho salarial e às péssimas condições de
vida, não tinham base unicamente na representação do operário. Surgiam também
organizações nos locais de moradia, tais como associações de moradores, comissões de
ruas, assembleias nos bairros, mutirões e invasões de terrenos.

Como se observa, a busca de articulação entre o movimento operário e


sindical com movimentos urbanos – já enunciada como Triangulação
Sindicato/Fábrica/Bairro – não se resume a uma questão conceitual e
acadêmica, mas é parte integrante do movimento concreto e histórico da
luta de classes no Brasil (DOIMO, 1984, p. 32).

Estes movimentos lutavam contra a falta de bens e equipamentos públicos de uso


coletivo. Apesar de lutarem por causas pontuais, a importância política desses movimentos
se mostrou em acontecimentos maiores, pois ajudaram a forçar e acelerar o processo de
abertura política e articularam-se com setores da classe operária ganhando dimensões de
movimento social.
A Igreja Católica teve um papel fundamental na organização desses novos
movimentos sociais urbanos. Em qualquer localidade, era difícil apontar algo que ligasse a
17
identidade dos moradores para fortalecer entidades representativas. A única coisa que unia
a maioria das pessoas eram as religiões, com crenças muito parecidas com relação à
criação do mundo e noção da responsabilidade do homem sobre o que foi criado por Deus.
Segundo Jacobi (1989), as igrejas católicas nas periferias tornam-se espaços de
consolidação da organização popular, convertendo-se em porta de entrada e suporte
institucional para novas experiências mobilizadoras.
No entanto, é preciso relativizar o papel da Igreja Católica enquanto instituição
compromissada com transformações sociais. Segundo Jacobi (1989), onde a Igreja se
assumia apoiando alguma luta local, o fazia pela opção do pároco local e não por diretrizes
da igreja. As CEBs e as Pastorais Operárias são inegavelmente embriões da emergência
dos movimentos, mas não é possível firmar um compromisso da Igreja Católica com a luta
do povo mais pobre.
Os movimentos sociais das décadas de 1970 e 1980, para Costa (2006, p.14),
tornaram públicas para sociedade e Estado suas carências. Suas reivindicações vinham de
seus interesses e necessidades cotidianas. A partir do momento que ampliaram a noção de
política de seus militantes, deixaram de ser apenas alvo para ser “arena” da prática política.

A transformação das práticas sociais pelos movimentos sociais se deu


através da definição de quais eram seus direitos. Esses direitos não eram
mais limitados à noção de direito formal advindo das classes dominantes
e do Estado – uma concepção liberal do direito que se promove pela
incorporação política dos setores excluídos da sociedade para a
reprodução do capitalismo. O “direito de se ter direitos”, surgido com
esses movimentos sociais, colaborou para a constituição de uma nova
cidadania no Brasil [...] (COSTA, 2006, p. 14).

A periferização tornou visíveis as relações de classe que já se esboçavam na


sociedade. “[...] O espaço urbano expressa antes de tudo relações sociais contraditórias
constituindo-se num “locus” potencial para a emergência de conflitos que podem vir a ter
peso na mudança qualitativa nas relações entre as classes” (DOIMO, 1984, p. 24).
A falta de infraestrutura (água, luz, transporte coletivo e pavimentação), de serviços
sociais urbanos (posto de saúde, creche e educação) e o descaso dos órgãos públicos
(processo burocrático para reivindicarem nas Administrações Regionais), provocaram, em
1979, segundo Paoli (2000), a mobilização de favelados e a organização de movimentos
reivindicatórios congregados num espaço político autodenominado “Assembleia do Povo”.

18
1.1.4. Assembleia do Povo

Apesar do desenvolvimento de trabalhos de moradia popular, a Companhia de


Habitação Popular de Campinas (COHAB-Campinas) não conseguia combater as favelas
que não paravam de crescer. Na década de 1970, o município continuou recebendo
migrantes que estavam em busca de empregos. As favelas aumentavam e os problemas de
água, luz, asfalto, transporte público e acessibilidade também. De acordo com o padre
Benedito Ferraro3, em 1975 a comunidade religiosa de Campinas através da Pastoral da
Periferia, criou a Pastoral de Vilas Planejadas, para ajudar a cidade a encontrar soluções de
moradia para o trabalhador pobre. O surgimento deste trabalho aconteceu através das
comunidades religiosas que eram criadas dentro de cada favela para fins religiosos e que
perante as necessidades de cada bairro, viu a oportunidade de ajudar a trazer melhorias.
Segundo o Padre Benedito Ferraro, para a população o barraco era um espaço de
dignidade, partindo do pensamento que “morar debaixo da ponte é você não ter endereço,
estando em barraco você tem um endereço, mesmo sendo um barraco”. O padre conta
ainda, que a frase “para quem tem casa, favela é um problema, para quem não tem, favela é
uma solução”, do jurista brasileiro Dalmo Dallari, impulsionou o movimento da
comunidade religiosa. De acordo com o padre Ferraro, junto com os trabalhos da Pastoral
de Vilas Planejadas, ajudaram a construir o movimento dos favelados, as Comunidades
Eclesiais de Base, Pastoral Operária (fundada em 1975) e o início da oposição sindical. O
Padre Ferrado conta ainda que

neste período de 1978 a 1982 se iniciou o que chamamos lá de


Assembléia de Povo, que era todo o processo de reivindicação a partir
dos bairros, sobretudo os loteados, que não tinham asfalto, água, esgoto e
que se iniciou o processo de reuniões aqui no Centro de Pastoral, houve
inúmeras reuniões para aglutinar as inúmeras reivindicações para depois
em assembléias, a gente levar para a prefeitura.

As Sociedades Amigos de Bairros, na década de 1970, se organizaram para ampliar


as reivindicações, mas que só funcionavam bem em épocas de eleições. Segundo Lopes
(1997), a receita era simples, trocavam-se melhorias nos bairros por votos. Em 1979,
paralelamente as Sociedades de Bairros, os favelados cansados da ausência de respostas

3
Em entrevista concedida ao grupo. Campinas, setembro de 2009 ((Todas as citações com referência a este
nome são baseadas nesta entrevista).

19
das Administrações Regionais, se organizaram através de assembleias, para reivindicarem
“cerca de 70 itens: água, luz, escolas, transporte, passarelas, redução do preço do asfalto,
eliminação de focos de xistoses etc” (LOPES, 1997, p. 76). Os favelados só conseguiram
se organizar e ganhar força política com a criação da Assembleia Popular, que deu bases
para o movimento de favelados da Assembleia do Povo. E as SABs de Campinas,
“rearticularam-se sob a influência dos grupos locais de oposição, que atuavam também em
áreas mais especificas, como saúde, educação, habitação e transporte” (LOPES, 1997, p.
75).
O movimento operário e sindical em Campinas também passou por reformulações
neste período, as greves dos trabalhadores ocorridas no ABCD (Região industrial formada
por sete municípios da Região Metropolitana de São Paulo) influenciaram decisivamente
sua rearticulação em Campinas. Para Lopes (1997), nesse contexto, as SABs viram que os
bairros tinham direitos e não serviam somente de currais eleitorais.

A Assembléia do Povo era um movimento de favelados e associações de


moradores assessorados pela pastoral da Igreja Católica instalada em
Campinas a partir da década de 70, que excluídos do processo de
desenvolvimento e expansão urbana preconizados nos anos 60
reivindicavam melhores condições para vida urbana (ARAÚJO, 2007, p.
19).

Semanalmente, em cada favela, seminaristas, estudantes, profissionais como


arquitetos, advogados e assistentes sociais se reuniam com os moradores das favelas, para
discutirem os problemas do bairro. Essas pessoas que não eram faveladas, mas agentes
externos, formavam a assessoria do movimento, articuladores sociais que se dividiam em
dois grupos, um de agentes e outro de técnicos. Aos agentes cabia o trabalho de fazer
contato com os favelados e conscientizá-los da importância da luta. Aos técnicos cabia a
função de transformar as demandas dos favelados em reivindicações embasadas.

Os movimentos reivindicatórios urbanos no Brasil destacam, ao longo da


sua existência, a participação de um conjunto de atores com origens e
práticas políticas diferenciadas. O papel dos atores vinculados aos
movimentos sociais aqui analisados, definidos como membros da
comunidade e “assessores”, “articuladores sociais”, “mediadores”, ou
“agentes externos” (Igreja – agentes pastorais; profissionais – arquitetos,
médicos, advogados etc.; militantes e partidos políticos e organizações de
esquerda) assumem uma importância na articulação e desenvolvimento
das lutas. Destacam-se as representações que esses atores elaboram
acerca de sua interação, práticas e concepções em relação à mudança
20
social. Tal reflexão sobre a ação permite pensar não só como os
movimentos articulam sua mobilização a partir dos seus valores de
referência, mas também sobre a influência dos assessores na construção
das demandas do dia-a-dia (JACOBI, 1989, p. 13).

Mensalmente, todas as favelas se encontravam no Centro Pastoral Pio XII para


unirem as reivindicações, discutirem e trocarem experiências, para depois cobrarem do
prefeito Francisco Amaral as promessas feitas durante o período eleitoral, além de expor
novas reivindicações. Ou seja, a Assembleia do Povo levava as reivindicações da
população carente formatadas pelos assessores à Prefeitura, esfera de poder que até então
ignorava as demandas.
Assim, a primeira grande Assembleia Popular4 (que depois seria conhecida como
Assembleia do Povo) foi realizada em 8 de março de 1979, nas escadarias do Paço
Municipal (Palácio dos Jequitibás), mas sem a presença do prefeito. Lá, estavam presentes
militantes das favelas da Vila Georgina, Jardim Ipaussurama, Vila Formosa e Jardim
Campos Elíseos, com a reivindicação de loteamento dos terrenos para os favelados.
Segundo Paoli (2000), também estava na pauta o acesso à água e à luz.

No rol de reivindicações da primeira Assembléia do Povo havia a


proposta de parcelamento e compra das áreas públicas ocupadas por
favelas. Na véspera, havia sido promulgada a Lei Municipal nº 4.865, de
7 de março de 1979, “que proibia qualquer negociação em torno da
questão da posse da terra” (PAOLI, 2000, p. 117).

De acordo com a reportagem “Barraco vira casa?”, do jornal O Repórter da


Região5, de maio de 1979, neste ano havia em Campinas 63 favelas, sendo que somente
algumas possuíam água e luz e a maioria não tinha nenhum melhoramento. Para
reivindicar, “o pessoal se organiza em grupos [...]. Como por exemplo: O J.S. Marcos, J.S.
Vicente, J. Campos Elíseos, Novo J. Campos Elíseos, J. Londres e J. Santa Eudóxia;
passando todos eles a participar da Assembléia do Povo”. Aos poucos mais favelas
começaram a participar do movimento.

4
Segundo Ronaldo Simões, ex-assessor do movimento, não se sabe ao certo como o novo nome foi
escolhido. “Assembleia Popular” era um nome que soava bem tanto para assessores quanto para as lideranças
dos bairros. O mais provável é que o nome do movimento tenha mudado após, em discursos, Leobino
Francisco de Oliveira, uma das lideranças no Campo Elíseos, dizer que deixou a Assembleia de Deus (sua
igreja), para entrar na Assembleia do Povo, brincando com as palavras.
5
O jornal O Repórter da Região, segundo Ronaldo Simões, foi criado em 1978 por militantes de movimentos
sociais estudantes da UNICAMP, como veículo alternativo, para informar trabalhadores de Campinas sobre
assuntos relevantes, perante a omissão da imprensa local em relação às lutas sociais.
21
A população favelada ao ouvir falar das reuniões no Pio XII e incentivados pelos
assessores viram na Assembleia do Povo uma ferramenta de luta que daria mais força e
representatividade aos marginalizados.
Na segunda Assembleia do Povo, em 30 de março de 1979, o prefeito Francisco
Amaral, tentou derrubar a proposta de loteamentos para os favelados (apresentada na
primeira Assembleia), “com o argumento de impedimento legal, usando como álibi o
Código Florestal da União, o decreto estadual nº 13.069 (de 29.12.78)6 e a recém-publicada
lei municipal7” (LOPES, 1997, p. 81). Como contraproposta, Amaral apresentou o
Profilurb (Programa de Financiamento para Lotes Urbanos) e prometeu não promover
nenhuma remoção até o fim do mandato.
Mesmo com a promessa do prefeito, as remoções continuaram em Campinas, como
mostra a reportagem “A periferia cobra Amaral”, de 4 de maio de 1979 do jornal Diário
do Povo, quando os moradores do Jardim São Marcos foram despejados. A reportagem,
“As máquinas param e os favelados ganham a questão”, de 26 de outubro do mesmo ano,
também publicada no Diário do Povo, mostra novas tentativas de despejo dos favelados
para serem levados para as casas do Profilurb. Porém, os moradores do Jardim Santa
Mônica, resistiram e não deixaram as máquinas soterrar cinco barracos. A prática das
remoções “foi fortalecida e veio a ser o elo articulador do movimento dos favelados, que
passaram a resistir organizadamente às ações da Prefeitura nesse sentido. O PROFILURB
foi rejeitado e, em setembro de 1980, o Prefeito reconheceu o fracasso” (PAOLI, 2000, p.
117).
Lopes (1997) aponta que, experientes, os favelados perceberam que o ideal era lutar
para permanecerem nos bairros que estavam desde que chegaram a Campinas. O Profilurb,
por sua vez, tentou tirar as famílias pobres da área central, removendo-as para regiões
distantes, como as proximidades do aeroporto de Viracopos. “Neste clima de insegurança e
revolta, as reuniões da Assembleia do Povo foram ficando cada vez mais lotadas, e a
participação em debates e em concentrações públicas já não podia ser ignorada, muito
embora a imprensa tentasse” (LOPES, 1997, p. 84). Os favelados continuaram insistindo
na venda dos terrenos a preços acessíveis e ao mesmo tempo, cobravam as necessidades
dos bairros.

6
Decreto que estabelece normas relativas ao saneamento ambiental de loteamentos urbanos ou para fins
urbanos.
7
A Lei Municipal nº 4.865, de 7 de março de 1979, proíbe qualquer negociação em torno da questão da posse
da terra.
22
A AsP voltou à Prefeitura para a quinta manifestação pública em 12 de
novembro de 1979. Participaram desta vez cerca de três mil moradores da
periferia. As favelas representadas eram as seguintes: J. Ipaussurama, V.
Georgina, São Marcos, Santa Mônica, Bandeira I e II, V. Nogueira, V.
Ipê, J. Campineiro, J. Paranapanema, J. Campos Elíseos, J. Santa
Eudóxia, V. Brandina (LOPES, 1997, p.86).

Os favelados passaram a participar cada vez mais das assembleias mensais no Paço
Municipal e das articulações nas reuniões semanais no Centro de Pastoral Pio XII, com o
principal objetivo de entender políticas públicas e posicionamentos da Prefeitura.

Os acontecimentos das reuniões no PIO XII já são conhecidos por muita


gente da periferia de Campinas. Os moradores de mais de 20 vilas e
favelas (Jardim Ipaussurama, Jardim Sta Eudóxia, Jardim Londres, Vila
Formosa, Jardim São Marcos, Jardim Campineiro, Paranapanema, Vila
Brandina, J. Eulina, J. Conceição, Parque das Bandeiras 1 e 2, Taquaral,
Vila Georgina, J. Sta Mônica, J. Campos Elíseos, J. Sta Cruz, J.
Flamboyant, V. Guararapes, J. Sta Rita, J. São José) estão se reunindo
para conversar sobre suas necessidades. Muitas dessas necessidades,
como casa própria, água, luz, esgoto, escolas, existem, principalmente
nas favelas e bairros mais pobres (O REPÓRTER REGIÃO, outubro de
1979).

No final de 1979, o prefeito Francisco Amaral desgastado com os setores da


política local, viajou deixando o cargo ao vice José Roberto Magalhães Teixeira, voltando
apenas no início de 1980.
Apesar dos debates internos entre os assessores e as Comunidades Eclesiais de
Base, que aconteceram neste período, a Assembleia do Povo passou a ser conhecida com
movimento de favelados, época em que gerou mais polêmica. Segundo Lopes (1997), a
mídia e os vereadores representantes dos “grandes grupos imobiliários” passaram a atacar
o movimento, sobretudo acusando as favelas de expropriar a cidade de suas áreas verdes.
No início da década de 1980, os favelados partem para legalização de suas
entidades. “Em 1980, os favelados propõem, então, a fundação de associações de
moradores de favelas [...]” (LOPES, 1997, p.101). Pela primeira vez, os favelados
providenciaram, pela constituição jurídica, a eleição das diretorias de cada associação.

23
1.1.4.1. A Lei da Terra

Em 17 de agosto de 1980, aconteceu o primeiro Encontro de Moradores de


Barracos de Campinas, que resultou na continuidade da luta dos favelados baseada na Lei
Federal nº 4.132 de 1962 (que protege os posseiros em terrenos urbanos públicos e
privados), além do “Decreto Lei Nacional nº 271, de 1967, instituída a Concessão Do
Direito Real De Uso Por Interesse Social de terras públicas e privadas. O artigo 160/III da
Constituição Federal vigente na época reconhecia a Função Social da Propriedade”
(PAOLI, 2000, p. 143). Conhecendo e entendendo estas leis, com a ajuda dos assessores,
os favelados tiveram novos argumentos para lutarem por uma lei, que eles chamaram de
Lei da Terra, cuja finalidade era a posse definitiva da terra. O executivo apresentou projeto
de lei à Câmara, mas os vereadores foram contrários e não aprovaram, mesmo assim, os
favelados iniciaram a urbanização das favelas, por conta própria.
Em resposta aos vereadores, o prefeito Francisco Amaral criou o decreto de
Permissão de Uso da Terra por Dez anos, assinado em 29 de setembro de 1980. Os
favelados por sua vez, não desistiram do uso sobre a terra, como mostra a reportagem
“Favelados querem pleno direito sobre a terra”, do jornal Correio Popular, em 1º de
outubro de 1980. “Os favelados dos Jardins Campos Elíseos, Londres, São Marcos, Santa
Mônica e Campineiro não querem a permissão de uso, a título precário, das terras de
propriedade da prefeitura”.
Segundo Paoli (2000), no dia 14 de novembro de 1980, as escadarias do Paço
Municipal, acomodaram seis mil pessoas que, na sétima assembleia, entregaram ao prefeito
um documento elaborado a partir da Lei Federal nº 4.132 de 1962 e do Decreto Lei
Nacional nº 271, de 1967, para chegarem a Lei da Terra. Assim, em 30 de março de 1981
foi aprovada a Lei municipal nº 5.079, conhecida como a Lei da Terra, que dispunha sobre
a concessão do direito real de uso dos terrenos públicos, por interesse social e dava
providências. A Lei dizia:

O uso da terra seria exclusivamente residencial; em caráter gratuito; por


tempo indeterminado; como direito real resolúvel; com clausura de
impenhorabilidade e inalienabilidade, responsabilidade do concessionário
pelos tributos que venham a incidir sobre o imóvel; transferência por
sucessão legítima, por uma única vez assegurando-se igual direito à
concubina e filtros legítimos, desde que a situação seja comprovada por
três (3) testemunhas.

24
Mas a aprovação não foi fácil. Para chegar à Lei 5.079, houve muita discussão
entre o poder executivo e legislativo. Em 14 de janeiro de 1981, a Assembleia do Povo
enviou ao prefeito seu projeto da Lei da Terra. O executivo já tinha seu projeto, mas havia
uma diferença fundamental entre um e outro: o projeto dos favelados previa que, “a terra
deveria ser exclusivamente destinada à moradia” (LOPES, 1997, p. 112), para não gerar
especulação imobiliária. Segundo Ronaldo Simões8, ex-assessor do movimento, “o Chico
Amaral, recebe o projeto, se confraterniza com o movimento e encaminha o projeto para a
Câmara”.
Na Câmara Municipal, vereadores demoraram algum tempo para discutir o projeto
(da Lei da Terra). Segundo Lopes (1997) a votação deveria ter ocorrido no dia 26 de
fevereiro de 1981, mas foi feita só na madrugada do dia 27, pois os vereadores teriam se
incomodado com a presença de cerca de 120 favelados. Os favelados por sua vez, “sem
dormir desde a madrugada do dia anterior, agüentando de pé sete horas de palavrório, após
um penoso dia de trabalho, e sem jantar” (Jornal de Hoje, 1981, apud Lopes, 1997, p.
113), ficaram até o fim da votação; e mesmo com o projeto da Assembleia do Povo
substituído por um novo projeto, contrariando as previsões de que a Câmara Municipal iria
abaixo, os favelados cantaram o hino nacional como protesto à substituição. O novo
projeto concedia para os favelados apenas os chamados Bens Patrimoniais.
Dessa forma, em 4 de março de 1981, a assessoria jurídica e membros da
Assembleia do Povo apresentaram ao prefeito uma proposta para acabar com o problema
gerado pelo novo projeto. “Após várias consultas juristas da área de Direito
Administrativo, verificou-se que não havia impedimento legal em decretar a desafetação
das áreas onde estão as favelas, convertendo-as em Bens Patrimoniais” (LOPES, 1997,
p.116). Com isso, o prefeito promulga a Lei nº 5.079 em 30 de março de 1981 e o Decreto
6.449.

No dia 30.03.81, considerado o dia da vitória do movimento, o prefeito


promulgou a Lei da Terra (Lei nº 5.079) e o Decreto da Terra (Decreto nº
6.449), que continha um veto parcial ao substitutivo dos vereadores e
determinava a desafetação das terras apenas através de decreto. Quer
dizer, as favelas (antes Bens de Uso Comum do Povo) tornaram-se
propriedade da Prefeitura (Bens Patrimoniais), de forma que o Executivo
poderia atender à reivindicação dos favelados (LOPES, 116).
8
Em entrevista concedida ao grupo, Campinas, outubro de 2009 (Todas as citações com referência a
este nome são baseadas nesta entrevista).
25
A Lei da Terra causou reações em toda sociedade campineira. A imprensa acusava
Francisco Amaral de ser golpista e setores da população acreditavam que a lei era um ato
antidemocrático. Essa resposta da sociedade levou o prefeito a se afastar de maio a
setembro de 1981. A Assembleia do Povo lutou então, também pela permanência da nova
Lei e de Amaral, pois se falava há um certo tempo em deposição, como afirmado na
reportagem “Já é formal, o Prefeito pode ser deposto”, publicada no Diário do Povo em 7
de outubro de 1980.

1.1.4.2. Seminário Nacional de Favelas

Paralelamente às mobilizações contra a Lei da Terra, ainda em 1981, o grupo do


vice-prefeito, Magalhães Teixeira, organizou o Seminário Nacional de Favelas. Segundo
Lopes (1997), notava-se claramente os objetivos principais do evento: unir grupos
contrários à Assembleia do Povo para debaterem com membros do movimento, numa
tentativa de desmoralizar a AsP, e dar aval e representatividade a uma alternativa aos
projetos de posse da terra e urbanização apresentados pelos favelados da Assembleia do
Povo. Para garantir o controle do debate, sem margens de cobrança, a organização do
evento teria deixado de criar regras claras para o seminário e convidou apenas metade dos
poucos nomes indicados pela AsP para participar do debate. Mesmo diante disso, o
balanço foi positivo para o movimento. O Seminário Nacional começou no dia 15 de
agosto de 1981 e a primeira pauta de discussão foi “Aspectos Econômico, Social e Político
da Sub-Habitação” e “Caracterização das Favelas de Campinas” (LOPES, 1997). No
evento, intelectuais reconhecidos em todo o país, presentes a convite da Prefeitura,
defenderam as propostas da Assembleia do Povo. Um deles já defendia o movimento há
algum tempo, o jurista Dalmo Dallari.

O Dr. Dallari voltaria novamente a Campinas em 16.08.1981, desta vez


como convidado da Prefeitura de Campinas, que tentava sair do impasse
político criado pelo movimento de favelados da AsP. Estes defendiam a
Concessão do Direito Real de Uso da Terra, para permanecer e urbanizar
as áreas públicas que ocupavam há décadas. Mais uma vez o renomado
jurista defendeu a legalidade da reivindicação, ao lado de outros ilustres
defensores da justiça social, como o Professor e economista Paul Singer
no ‘Seminário Nacional de Favelas’ (LOPES, 2008, p. 4).

26
Ao termino do evento, a prefeitura não conseguiu obter o resultado desejado de
apresentar alternativa ao projeto da Assembleia do Povo, ao contrário, o documento final
tinha reivindicações e resoluções dos favelados. “Chegou a reconhecer a possibilidade de
viabilizar juridicamente a posse da terra e também a necessária participação dos favelados
em projetos de urbanização específicos” (LOPES, 1997, p. 128).

1.1.4.3. Eleições e posicionamento político

Em 1982, era chegada a hora das eleições municipais. O prefeito Francisco Amaral
deixou o cargo para se candidatar a deputado federal. O vice, Magalhães Teixeira se
candidatou a prefeito e era o favorito a ocupar a cadeira. Enquanto isso, quem assumiu a
Prefeitura foi o Presidente da Câmara de Vereadores, José Nassif Mokarzel.
Segundo Lopes (1997), o movimento também se organizou em torno das eleições
lançando pelo PT (Partido dos Trabalhadores) dois candidatos, Alcides Mamizuka
(sociólogo e assessor da AsP desde seu início) e Marlene Correia (presidente da
Associação dos Moradores da Favela do Jardim das Bandeiras e Região).
A organização dos favelados e o direcionamento de seus votos nos candidatos da
Assembleia do Povo começavam na base. Enxergava-se nas eleições um importante fator
de fortalecimento do movimento. Na busca por transformações sociais, acreditava-se que a
presença de militantes na máquina pública poderia voltar as atenções do Estado para
aquele povo marginalizado.

[...] O elemento de conscientização se dá no plano da organização de


base, através de assembléias nos bairros, onde os grupos de moradores
mais organizados gestam novos padrões de valores, configurando
freqüentemente uma vinculação ideológica e política entre a necessidade
e seus condicionantes estruturais [...] (JACOBI, 1989, p. 11).

Para Lopes (1997), a atuação de Mamizuka na Câmara de Vereadores e o


posicionamento do movimento em derrotas passadas proporcionaram “renovação
expressiva” na relação entre Assembleia do Povo e legislativo. O movimento manteria
firme sua posição política e ajudaria a eleger o petista Jacó Bittar, em 1988, substituindo
José Roberto Magalhães Teixeira. Jacó tinha como vice-prefeito um dos assessores do
movimento, Antonio da Costa Santos, que viria a se tornar prefeito em 2001.

27
1.1.4.4. Mutirões pela urbanização

A partir de 1981, o movimento optou pela via da urbanização, organizou mutirões


para construção de sedes para as associações e a construção de casas, e feitura de outras
obras de urbanização seguindo projetos elaborados pelos assessores em discussões com os
favelados e com o Poder Público, tudo com base no projeto da Lei da Terra. A partir do
ano seguinte, 1982, a urbanização passou a ser objetivo principal. O problema era
organizar os favelados e uní-los em torno da causa de construir as casas em terras das quais
não tinham posse definitiva, além da falta de dinheiro, problema constantemente
enfrentado.
De 12 a 15 de fevereiro de 1982, foi organizado em Campinas o 2º Encontro
Nacional de Favelados. O município foi escolhido pela força dos movimentos de favelados
locais e pela proximidade com o bairro de Itaici, em Indaiatuba (cidade vizinha), onde se
reunia no mesmo período a Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB), sob o tema
“Solo urbano e ação pastoral”.
O documento final, com síntese das discussões do 2º Encontro Nacional de
Favelados foi entregue à CNBB. A carta continha 13 questionamentos à política fundiária
adotada no país e proposta de alternativa à postura do Estado, que isentava moradores de
favelas dos direitos mais básicos. O conteúdo da carta, de acordo com Diário do Povo,
1983, (apud, Lopes, 1997) dizia:

Direito de moradia sempre e para todos, terra para moradia, terra para
sempre, terra não deve ser paga, terra para o inquilino, terra com todos os
melhoramentos urbanos, um terreno por família, impor limites ao Direito
de Propriedade, o terreno não pode ser vendido, o barraco ou casa pode
ser vendida, a terra para os herdeiros, impenhorabilidade e construção de
moradia, subsidiada pelo Estado.

O movimento continuou com os encontros no Centro de Pastoral Pio XII, com o


objetivo de urbanizar as favelas, seguindo os projetos elaborados pelos assessores desde
1981, todos com base no projeto da Lei da Terra. Para os projetos de casas, havia a
assessoria de moradia. “A Assessoria atuava em duas frentes: uma geral, que acompanhava
as associações de moradores nas Assembléias do Povo, audiências com o Prefeito,
instituição e órgãos públicos. Outra de caráter mais especifico e interno ao movimento”
(PAOLI, 2000, p. 155).

28
Segundo Paoli (2000), a elaboração dos projetos, até agosto de 1981, foi feita em
conjunto com os moradores e cada um podia desenhar a casa que desejava. A proposta
chamava-se “Casa dos Sonhos”. A partir do trabalho em conjunto, a Assessoria de
Moradia, optou por um método de trabalho na elaboração dos projetos e atuação nas áreas,
por uma interação entre a aspiração individual e coletiva dos favelados, o que reforçava o
caráter político da luta pela terra.
Ainda de acordo Paoli (2000), a assessoria do movimento, em 1981, possuía apenas
um Plano de Urbanização Específica (PUE), para a urbanização da primeira favela, a do
Campos Elíseos. Aos poucos, desenvolveram outros planos, de acordo com as
necessidades de cada favela, mas que tinham como base comum, as ações de divisão dos
terrenos entre os moradores, cuidados com o solo e córregos, instalação do sistema de
água, luz e esgoto, e marcação de ruas.
Para marcar o início da urbanização nas favelas era necessário abrir ruas e erguer
casas de alvenaria. Os favelados foram encorajados a iniciar a construção das moradias
pelos assessores do movimento. Como a Prefeitura não destinaria todo dinheiro para os
núcleos, era necessária a ajuda coletiva no trabalho de urbanização, fabricação de tijolos e
melhorias gerais. Crianças, adultos e idosos trabalhavam aos fins de semana para o
beneficio de todos os favelados. As mulheres também cooperavam e preparavam o almoço
para os trabalhadores do mutirão.
Os integrantes da comissão de moradia queriam que os favelados tivessem
participação ativa neste processo. Para isso, explicavam a cada morador, de forma simples,
a leitura técnica da arquitetura e urbanização. Os favelados tinham que ser construtores do
espaço pelo qual estavam batalhando desde as primeiras reivindicações da Assembleia do
Povo. “A assessoria dos arquitetos da AsP foi fundamental para organização dos favelados
no processo de urbanização do local de moradia” (LOPES, 1997, p. 137).
Tanto os planos como as obras executadas pelos favelados em seus bairros, eram
feitos em mutirão, que para Ermínia Maricato (1978), é um ajuda coletiva de
espontaneidade e solidariedade entre as pessoas que objetivam a melhoria de habitação no
país.

[...] como vantagem do mutirão a possibilidade de um maior contato do


morador produtor com a habitação produto, permitindo-lhe uma visão
integrada de processo produtivo e portanto um contato desalienante com

29
o produto, já que o morador acompanha, decide e executa os mínimos
detalhes da própria habitação [...] (MARICATO, 1979, p. 72).

Em 1981 foi criada uma cooperativa para a fabricação de tijolos. O Jardim Campos
Elíseos, sob o comando do então presidente Leobino Francisco de Oliveira, começou a
produção voltada a atender demandas dos próprios moradores e das favelas que
encomendassem os tijolos. Segundo Leobino9, ele chegou a produzir cerca de oito mil
tijolos.
A urbanização de favelas com a participação popular, segundo Lopes (1997), teve
início em junho de 1981. “Todas as associações e a assessoria participaram de um mutirão
na favela do jardim Campos Elíseos, inaugurando simbolicamente este nova etapa do
movimento” (LOPES, 1997, p. 138). Neste dia, os favelados abriram um caminho na
favela, orientados pelos assessores e pelo PUE. Os demais mutirões realizados, além de
objetivar a urbanização, mostravam à Prefeitura que “apesar da resistência à Lei da Terra,
eles não tinham nenhuma proposta que solucionasse o problema da moradia para essa
população” (PAOLI, 2000, p. 153). Ao mesmo tempo, os assessores do movimento
incentivavam os favelados a aprenderem as técnicas de obras na teoria e na prática. De
acordo com Maricato (1979) a autoconstrução (quando os moradores constroem a própria
moradia) e o sistema de mutirão, mostram um problema político habitacional de cada
município.

A importância quantitativa (e qualitativa) da autoconstrução junto ao


proletário das grandes cidades dos países capitalistas dependentes mostra
que os programas e políticas oficiais estatais de habitação são muito
menos importantes na produção da habitação popular do que querem
fazer crer os relatórios técnicos oficiais. É principalmente através da
autoconstrução que a maioria da população trabalhadora resolve o
problema da habitação, trabalhando nos fins de semana, ou nas horas de
folga, contando com ajuda de amigos ou parentes, ou contando apenas
com a própria força de trabalho (marido, mulher e filhos) (MARICATO,
1979, p. 72-73).

Neste contexto, os mutirões construíam a casa de cada favelado e decidiam os


próximos passos da Assembleia do Povo. A urbanização também enfrentou problemas
internos, pois as famílias tinham insegurança em construir sem a posse definitiva da terra.

9
Em entrevista concedida ao grupo. Campinas, setembro 2009.
30
A urbanização só seria viável mediante a adesão de todos os moradores
da favela, caso contrário poderiam ocorrer impasses nas tarefas coletivas
de abertura de caminhos, deslocamentos de barracos, obedecendo à
demarcação dos lotes, discutidos com os assessores arquitetos (LOPES,
1997, p. 141).

1.1.4.5. A Prefeitura e a urbanização

Em 1982, os favelados conseguiram novas conquistas. Segundo Lopes (1997),


Francisco Amaral destinou Cr$ 100 milhões do orçamento anual para urbanizar três favelas
com PUEs protocolados. “Parque D. Pedro II, jardins Novo Campos Elíseos e
Flamboyant” (LOPES, 1997, p. 142). No final do ano, a assessoria protocolou mais seis
PUEs, “para as favelas do parque Universitário (favela 73), jardins Campos Elíseos (favela
28), Londres (favelas 26 e 81), D. Pedro II (favela 72) e São Cristovão (favela 39)”
(LOPES, 1997, p. 142). Ainda neste ano, o parque Universitário ganhou a permissão de
uso por dez anos.
Em 1982, Francisco Amaral deixou o cargo de prefeito para se candidatar deputado
federal. Em seu lugar ficou o então presidente da Câmara, José Nassif Mokarzel, que
assinou o Decreto de Permissão de Uso por Dez Anos para as favelas Dom Pedro II, Vila
Lurdes e São Cristovão.
Ao assumir o cargo de prefeito, Magalhães Teixeira prometeu que sua
administração resolveria os problemas da moradia em Campinas. “Quanto aos Planos de
Urbanização Específica (PUEs) já protocolados, Magalhães Teixeira defendeu que os
técnicos da Prefeitura dessem seu parecer, pois o poder municipal não abriria mão de
administrar a urbanização” (LOPES, 1997, p. 146). Logo, a Administração Pública
aprovaria outro PUE, por discordar da maneira como o plano em vigor desde a gestão
anterior previa a urbanização e o impedia “de alterar o rumo dos trabalhos de urbanização
de parte das favelas” (LOPES, 1997, p. 147).
O prefeito Magalhães Teixeira também adotou uma medida jurídica, como explica
a reportagem “Decreto proíbe novos barracos nas favelas”, do dia 23 de agosto de 1983, do
jornal Correio Popular.

Em decreto assinado ontem, o prefeito José Roberto Magalhães Teixeira


proibiu a construção de novos barracos nas favelas em Campinas, além
da comercialização – seja venda, compra ou aluguel – das subabitações já
existentes em 84 núcleos na periferia da cidade.
31
Aos poucos, favelas mudaram de aparência, parecendo com bairros populares, mas
“desta fase em diante, as associações foram se frustrando, a organização se afrouxou e o
trabalho no interior das favelas tornou-se cada vez mais difícil, assim como a articulação
com as demais favelas” (LOPES, 1997, p. 149).
O início das obras foi demorado. Segundo a reportagem do Correio Popular, de 4
de agosto de 1985, “Apenas duas favelas já foram urbanizadas”:

Das 83 favelas de Campinas, apenas uma foi urbanizada pela Prefeitura


Municipal: a do Parque Dom Pedro II. Mas, uma outra, localizada no
Jardim Campos Elíseos, recebeu também urbanização, do governo
estadual através de um deputado da cidade, para quem os moradores
solicitaram ajuda há um mês atrás.

Segundo o gerente do Setor de Urbanismo de Favelas da Prefeitura, Carlos


Armando Conagin, ainda na mesma reportagem do Correio Popular, até o final de 1985,
25 PUEs estariam definidos para aplicação técnica. A Prefeitura teria capacidade para
urbanizar quatro favelas por mês.
As primeiras áreas urbanizadas foram as mais distantes do Centro, locais em que o
Prefeito anterior apoiara ocupação. À urbanização, se seguiu a concessão do Direito de
Uso Real da Terra, como mostra reportagem “Prefeitura entrega hoje títulos de posse da
terra” do jornal Correio Popular, publicada em 25 de abril de 1987.

[...], o prefeito Magalhães Teixeira concretizará as esperanças de 105


famílias, entregando os títulos de concessão de uso da terra, que se
estabelecerão no Novo Parque e no Parque D. Pedro II. Às 15h30, na
favela do Parque D. Pedro II, 2ª parte, 51 famílias receberão os títulos e,
às 17h30, 56 famílias se integrarão na posse para uso da área, em casas de
alvenaria, no Núcleo Residencial Novo Parque, de cujo total de
beneficiados, duas famílias deixarão de receber os seus títulos hoje, em
virtude de problemas na documentação.

De acordo com a reportagem, os terrenos das casas medem 10,7x18m, e abrigavam


na época residências já em fase final de conclusão, sem acabamento. A área foi cedida pela
Prefeitura e as moradias construídas com recursos dos próprios beneficiados, que residiram
em barracos nos fundos dos terrenos até conclusão das obras. As famílias não podem
vender, alugar ou efetuar qualquer transação com o imóvel.

32
Para Lopes (1997), os dados de setembro de 1998 da Gerência de Urbanização de
Favelas, subordinada à Secretaria de Promoção Social, revelaram que a Prefeitura
continuava cedendo títulos de posse definitiva da terra, mas sem obras de infra-estrutura
previstas no PUE.

De dezembro de 1984 a julho de 1988, foram entregues títulos a 17


favelas: Pq. D. Pedro II, Pq. Universitário, Jd. Santa Lúcia, Jd. Nova
Conceição, Jd. Nova América, Jd. Ipaussurama, Jd. Santana (favela 22),
Jd. Maria Rosa, Jd. Campos Elíseos, Descampado, Área Emergencial,
Santa Lúcia, Nossa Senhora de Lourdes, San Martin, Real Parque,
Souzas, Guararapes (LOPES, 1997, p. 153).

1.1.4.6. A luta esfria

Em todo o Brasil, durante a década de 1980, os movimentos sociais urbanos


tiveram lógicas muito parecidas. Segundo Jacobi (1989), eles não teriam agido com o
propósito de transformar a sociedade, mas, como grupos de pressão sobre o Estado, teriam
agido “para obter respostas concretas a suas demandas, através de dinâmicas diferenciadas,
porém pautadas por um maior ou menor enquadramento institucional” (JACOBI, 1989, p.
11). Ainda para Jacobi (1989), isso faria com que o ciclo de vida e o alcance dos
movimentos indicassem sua dimensão institucionalizada.

A maioria dos movimentos não apresenta desdobramentos mais amplos,


apesar das tentativas e do voluntarismo de militantes partidários que
atuam em diversos bairros. Estes apresentam um ciclo de vida bastante
preciso, passando por estágio de maior e menor mobilização, mas
configurando um processo onde a consecução das metas imediatas
representa geralmente o fim da mobilização. A sobrevivência de alguns
movimentos ao longo dos anos reflete sobretudo a capacidade das
lideranças em manter níveis significativos de participação, expressos na
contraposição às formas tradicionais de mobilização (JACOBI, 1989, p.
11).

A Assembleia do Povo, como outros movimentos sociais urbanos, seguia uma


lógica parecida. O movimento unia organizações locais para lutarem por causas pontuais,
como água encanada, tubulação de esgoto, energia elétrica e posse da terra em cada bairro.
Isso pode ter determinado seu fim. As lideranças das favelas não sabem precisar como o
movimento acabou, mas segundo o ex-assessor Ronaldo Simões, quando determinada

33
liderança de favela conseguia conquistar o que reivindicava, deixava de freqüentar as
reuniões. “Os presidentes se afastaram, o Leobino (Leobino Francisco de Oliveira, do
Campos Elíseos), os Alcides (Alcides de Lima e Alcides Vieira Pinho, do Parque Dom
Pedro II) e outros, se afastaram do movimento”, conta. A favela do Parque Dom Pedro II
foi a primeira a receber o título de concessão de direito real de uso. A entrega dos
documentos foi feita pelo então prefeito Magalhães Teixeira em 1985.
Para Simões, as favelas se redefiniram dentro delas mesmas “e se voltaram para si,
para a própria urbanização. Os locais tiveram benfeitorias, como postos de saúde, creches,
casas e assim as lideranças se voltaram para cada favela. Mas sem perder a noção da
origem da conquista”, lembra.
Para compreender como o movimento perdeu força, é preciso relativizar o
abandono das lideranças, pois elas não tinham necessariamente as mesmas reivindicações.
É preciso considerar a heterogeneidade de militantes e a relação diferenciada de cada um
com sua base e com o movimento.

A heterogeneidade das lideranças provoca diferenças inevitáveis. As mais


organizadas levam a luta numa relação corpo a corpo com o poder
público, implicando freqüentemente em manobras que nem sempre têm
aprovação da população. Por outro lado, várias lideranças, principalmente
aquelas com pouca experiência de luta, se desligam do movimento ou
acabam incorporadas ao poder público através da obtenção de empregos
em órgãos da prefeitura. As lideranças que permanecem até o fim são
aquelas com objetivos políticos mais amplos. Mas, à medida que
começam a se concretizar os resultados, muitos movimentos se esvaziam,
frustrando suas expectativas de transcender a luta específica. (JACOBI,
1989, p. 13-14).

Além disso, é necessário considerar o que mostra Jacobi (1989) ao afirmar que os
movimentos sociais urbanos tinham um ponto de convergência: a contestação de
legitimidade do poder do Estado na luta pelas suas necessidades básicas. Para ele, com a
ascensão dos governos democráticos em 1983, verifica-se que a possibilidade de mudança
não corresponde às expectativas no plano das realizações, o que provoca um refluxo nos
movimentos.

Este refluxo dos movimentos populares como mostra, GOHN, em


Campinas foi refletido com a minimização da ação política da
Assembléia do Povo, após 1986, que como todo processo, cíclico, de
mobilização popular e participativo no Brasil, sofreu temporária
estagnação (GOHN, 2005, apud ARAÚJO, 2007, p. 19).
34
1.1.4.7. A herança

A Assembleia do Povo se desarticulou enquanto movimento, mas deixou em cada


favelado um aprendizado social e político. Muitos deles ainda hoje, no ano de 2009,
participam de Associações de Moradores, Orçamento Participativo e Conselhos
Municipais. Alguns ainda não tiveram suas favelas urbanizadas, mas tem em comum com
os demais, o aprendizado político e o reconhecimento de ser um cidadão campineiro.
Os ex-assessores deixaram como legado fotos, atas, cadernos, jornais, livros,
pesquisas acadêmicas e diversos outros tipos de arquivos. Embora o movimento tenha se
extinguido, há como herança a história que as próximas gerações (principalmente no meio
acadêmico), podem interpretar de outra forma e a cada vez se fazer um novo
desdobramento do que foi a Assembleia do Povo, como diz a cientista social Doraci Alves
Lopes10. “Realmente existe essa herança do ponto de vista acadêmico. E registro de
memórias dos materiais. Depois de toda essa experiência, as pessoas foram participar de
outras coisas, todo movimento social tem seu auge e seu final”.
Segundo Doraci Alves Lopes, os ex-militantes do movimento participam ainda de
atividades nos bairros e no município. “A Fundap (Fundo de Apoio à População de Sub-
Habitação Urbana) tem muitos representantes (ex-participantes da Assembleia do Povo),
que sempre participam ativamente. Então você percebe a inserção dessas pessoas”. Muitos
também ajudam em novos grupos que foram formando em Campinas, como os das novas
ocupações.
Em cada bairro, a população pratica o que aprendeu durante o movimento. Luzia
Maria da Costa11, do Centro Comunitário Iporã (antiga favela do Parque Dom Pedro II),
por exemplo, aprendeu a fazer atas e reuniões enquanto participou da Assembleia do Povo.
Hoje, em 2009, usa o aprendizado para continuar atuando na associação do bairro. Além de
lutar para conseguir trazer as famílias para as reuniões, pois acredita na importância da
reunião, a exemplo do passado. “Somos em 56 famílias, às vezes vai (nas reuniões), vinte
ou trinta pessoas”. Da mesma forma, Francisco Lems do Bairro da Conquista (Núcleo Ipê),

10
Em entrevista concedida ao grupo, Campinas, outubro de 2009.
11
Em entrevista concedida ao grupo, Campinas outubro de 2009.
35
atua ainda na associação do bairro, tanto que entregadores, oficiais de justiça, dentre
outros, procuram a ele quando precisa achar algum morador, por saberem de sua atuação.
Cada bairro ganhou características novas de herança, como no Jardim das
Bandeiras II, com água e esgoto encanados, luz elétrica, escola e posto de saúde. Outras
favelas urbanizadas tiveram as mesmas conquistas. Outras favelas não foram urbanizadas
até hoje (2009) por estarem em posições geográficas desprivilegiadas, como em área de
mananciais. O Parque São Quirino é uma das favelas que ainda espera por urbanização,
como lembrado pelo morador e ex-militante, Sebastião Ferreira da Silva12, “[...] 36 anos
que to lá e não ta urbanizada ainda. Vejo que os outros foram urbanizados e a minha ainda
não”.
Mesmo quem não ganhou a posse da terra, tem como herança do movimento o
reconhecimento de ser um cidadão e ser respeitado pela cidade, como conta o ex-assessor,
Alcides Mamizuka13, que entende que todos deixaram de ser vistos como intrusos na
cidade. Se nos guiarmos pelos conceitos de cidadania levantados por Martins (2000), a
maior herança deixada pela Assembleia do Povo foi transformar o cidadão cliente que era
o favelado na época em um cidadão conhecedor de seus direitos e, em último estágio, em
cidadão sujeito de seu próprio destino histórico. Ou seja, a pessoa que antes era apenas um
“cliente” que “comprava” o discurso de políticos passa a lutar para ter suas demandas
atendidas e construir seu futuro, torna-se de fato um ser político que de alguma forma ao
mesmo tempo faz parte e interfere nas relações de poder.
Essa conquista da cidadania fica clara no documentário, no qual os ex-militantes
não se mostram como marginais, mas como construtores de sua própria história e
protagonistas de um movimento que de alguma forma mexeu com a vida dos moradores da
periferia de Campinas, talvez até com a vida de pessoas de outros lugares. No vídeo não
aparecem marginais, aparecem cidadãos.

1.2. Concebendo um documentário sobre a Assembleia do Povo

12
Em entrevista concedida ao grupo, Campinas outubro de 2009.
13
Alcides Mamizuka em entrevista concedida ao grupo, Campinas, outubro de 2009.
36
Para entender o vídeo, é importante discutir os limites entre documentário e
telejornalismo, nossa área de estudos. Antes de pensar no vídeo e na prática da produção, é
interessante conhecer a teoria que dá bases de sustentação ao projeto e permite sua
construção, estabelecimento de linguagem e formato, escolha do melhor plano e da melhor
fala.

1.2.1. Limites entre documentário e telejornalismo

Tanto as TVs quanto o cinema são meios de comunicação de massa e, como afirma
Marshall (2003), tem o poder de determinar o que é realidade no mundo de hoje. Isso
acontece porque os próprios receptores dão crédito e legitimidade, principalmente, ao que é
publicado na mídia. As coisas existem ou deixam de existir à medida que são publicadas.
“A realidade deixa assim de ser a expressão dos fatos, para se revelar como sua
apresentação midiática” (MARSHALL, 2003, p. 50). A mídia tende a transmitir a realidade
que lhe é conveniente.

Em geral, os espaços noticiosos são utilizados para expor e impor uma


versão, isto é, a versão da plutocracia. A Teoria Crítica tem demonstrado
que o jornalismo é palco do processo de dominação social e da luta de
classes. A classe capitalista, detentora do poder na sociedade, usa o
jornalismo como mais um recurso para seus interesses, utilizando as
massas como fonte de consumo, audiência, manipulação, sujeição e
exploração (MARSHALL, 2003, p. 50).

É importante ressaltar que existe uma diferença fundamental entre a pressão sofrida
pelo jornalismo televisivo e pelo cinema documentário. “O universo do jornalismo é um
campo, mas que está sob a pressão econômica por intermédio do índice de audiência”
(BOURDIEU, 1997, 77). Essa pressão não tem necessariamente a ver com a intervenção
direta de determinada pessoa no conteúdo, formato ou linguagem, mas é algo intrínseco a
uma cultura de gestão e produção televisiva. No cinema documentário brasileiro, isso
acontece em menor escala, pois, no país, o cinema é majoritariamente bancado por projetos
estatais de fomento que, com raras exceções, não dão conta de qualquer tipo de
questionamento quanto ao conteúdo, linguagem ou formato.
Admitindo a teoria do agendamento, o telejornalismo tem poder de agir e
influenciar outros campos, inclusive os pautando.

37
Em outras palavras, um campo, ele próprio cada vez mais dominado pela
lógica comercial, impõe cada vez mais suas limitações aos outros
universos. Através da pressão do índice de audiência, o peso da economia
se exerce sobre a televisão, e, através do peso da televisão sobre o
jornalismo, ele se exerce sobre os outros jornais, mesmo sobre os mais
“puros”, e sobre os jornalistas, que pouco a pouco deixam que problemas
de televisão se imponham a eles. E, da mesma maneira, através do peso
do conjunto do campo jornalístico, ele pesa sobre todos os campos de
produção cultural (BOURDIEU, 1997, p. 81).

A lógica comercial que influencia a TV poderia atingir também os vídeo


documentários, mas parece que até o momento isso não acontece. O que se nota é um
movimento inverso. Hamburger (2005) conta que durante as décadas de 1970 e 1980, com
a consolidação da televisão como veículo mais popular e lucrativo da indústria da
informação, os cenários urbanos de pobreza e a violência estiveram ausentes de sua
cobertura. Para a autora, o que imperava eram o glamour das novelas e o tom oficial dos
telejornais, que mostravam basicamente ações governamentais. Negros quase não
apareciam nos noticiários ou na ficção e o Brasil que aparecia na TV era pacífico. O que se
via eram cenários ricos, povoados de bens de consumo. “A formalidade do assunto
repercutia no estilo clean das imagens fixas, sem tremor, editadas de maneira limpa e
convencional” (HAMBURGER, 2005, p. 199). Mas esse quadro muda aos poucos na
década de 1990, com o lançamento de novos programas.

Se nos anos posteriores à ditadura as imagens televisivas continuaram


mostrando um Brasil harmonioso, rico, branco, saudável, higienizado, em
imagens estáveis, enquadradas, de boa qualidade, coube ao documentário
se voltar para grupos urbanos até então praticamente invisíveis nesta
produção audiovisual: a população carcerária, os moradores de rua e de
favelas, pivetes e mendigos, prostitutas, trabalhadores do lixo. Mas a
partir do final dos anos 80, um dado novo modifica o panorama
televisivo: temas como violência urbana, pobreza e exclusão ganham
visibilidade, passando a fazer parte de certa produção jornalística e a
interessar um público cada vez maior [...] (LINS; MESQUITA, 2008, p.
44).

Para entender em que ponto documentário e telejornalismo convergem e em que


ponto se distanciam, é necessário entender a lógica de produção de cada um, do
telejornalismo na estrutura própria da empresa de TV e do documentário, que no Brasil

38
tende a um mercado de exibição independente, embora venha ganhando força no ciclo
comercial de cinema nos últimos anos.

1.2.1.1. Documentário: cinema x jornalismo

Durante toda a graduação, ouvimos discussões sobre se o documentário seria um


campo próprio do cinema, ou se seria cabível também aos jornalistas. Para ajudar a
entender isso, decidimos traçar os limites de cada campo, para a partir daí tentar identificar
até que ponto o jornalismo e o cinema se distanciam ou se aproximam no documentário.
Ramos (2008) destaca quatro campos fronteiriços com os quais há interação na tradição
histórica da narrativa documentária: “a) o docudrama; b) o telejornalismo ou ‘atualidades’;
c) a publicidade; d) o cinema experimental/videoarte. São fronteiras que interagem de
modo denso com as articulações estruturais da narrativa documentária em sua configuração
histórica (RAMOS, 2008, p. 51)”. Aqui, nos ateremos ao estudo do telejornalismo nesse
contexto.
Ramos (2008) aponta que o documentário surge, historicamente, nas beiradas da
narrativa ficcional, da propaganda e do jornalismo. “O termo documentário foi utilizado
pela primeira vez nos anos 20 pelo sociólogo John Grierson no jornal The New York Sun ao
comentar os filmes de Robert Flaherty” (OLIVEIRA; ROLDÃO; BAZI, 2006, p. 7). No
mesmo texto, Grierson define o documentário como “tratamento criativo de atualidades”
(creative treatmentof actuality). O contexto era propício para conceituar o cinema
documentário, pois, naquele momento, o Estado passou a financiar o cinema inglês para
produzir asserções sobre as realizações do próprio Estado, sempre com cunho educativo
(educar para a democracia liberal e para o voto universal).
Posteriormente o verniz artístico dado pelo “tratamento criativo” dispensado às
atualidades pelo documentarismo inglês acaba o distanciando do conceito de atualidade,
pois mostra apenas “o transcorrer do mundo impresso na película na posição de recuo
completo do sujeito-câmera” (RAMOS, 2008, p. 57). As atualidades e travelogues (filmes
sobre lugares distantes e exóticos) perdem aos poucos suas forças no cinema. O que antes
chamavam de atualidade, hoje chamamos de reportagem. Mas quais as diferenças entre o
documentário e a reportagem?
Para Ramos (2008), no documentário as vozes pertencem a um conjunto discursivo
orgânico, a narrativa. A narrativa normalmente é fruída e tem sua unidade em algo muito
39
próximo do que chamamos de filme (unidade narrativa de duração variável, mas una). “O
documentário, portanto, é um filme no modo que possui de veicular suas asserções e no
modo pelo qual as asserções articulam-se enquanto narrativa com começo e fim em si
mesma” (RAMOS, 2008, p. 58). A reportagem, no telejornalismo, é uma forma narrativa
que se articula dentro de um formato enunciativo, o programa (que nada tem a ver com o
filme). Embora hajam exceções, as reportagens costumam ser apresentadas normalmente
eu um modelo de programa, o telejornal, unidade dividida em pequenos blocos. Outra
diferença fundamental é a presença da voz do âncora, apresentador ou repórter na
reportagem. Além disso, o documentário não sofre com a lógica da velocidade, já
abordada. Quanto aos formatos...

O programa telejornal é composto pela sucessão de notícias, sem haver


propriamente uma narrativa que articule sua unidade no todo. Ao
contrário da reportagem do programa telejornal, o documentário não está
vinculado a acontecimentos cotidianos de dimensão social que
denominamos notícia (RAMOS, 2008, p. 59).

1.2.1.2. Cinema direto e cinema verdade

É inegável que Robert Flaherty foi um dos documentaristas pioneiros, mas em seu
clássico Nanook do Norte (1922), o diretor juntou alguns atores esquimós e pediu para que
um deles representasse Nanook, atuando em ações que executava diariamente e em outras
que nunca tinha executado para serem filmadas. Tudo isso aconteceu porque Flaherty
perdeu os rolos de filmes do documentário que havia filmado sobre o verdadeiro Nanook,
anos antes.
Apesar de questionar os métodos de Flaherty e de outros documentaristas clássicos,
ainda no Cinema Direto a atuação existia. Se a tal “mosquinha na parede” não intervinha
diretamente nos acontecimentos, a presença da câmera produzia um tipo de intervenção e
os personagens, [...] no mínimo, precisavam fazer de conta que a câmera não estava ali (DI
TELLA, 2005, p. 75).
No cinema direto, os cineastas ressaltavam que o trabalho de seus documentários é
apenas evidência, mas para Winston (2005), esse conceito é ideologicamente poderoso,
mas com uma noção ingênua de objetividade que encoraja o público nessa ingenuidade.
Para o autor, ao assumir tal postura, os documentaristas colocam em risco o conceito de
40
“tratamento criativo”, exatamente o que torna os documentários diferentes de outras
formas audiovisuais de não-ficção. “O desaparecimento dos limites com o jornalismo
significou, de fato, o desaparecimento de todos os documentários, exceto os jornalísticos
[...]” (WINSTON, 2005, p. 24).
Para ele, o maior problema é que os documentaristas foram obrigados a tornarem-se
jornalistas. Apesar da força com que surge (e ainda existe) o cinema direto, logo depois de
sua concepção, já foram criadas formas de resistência, como o Cinéma Vértié (cinema
verdade) francês, que teve como maior ícone Jean Rouch. Apesar de muitas vezes
confundido com o cinema direto, o realizador do documentário no cinema direto não
simula sua ausência, pelo contrário, assume que o encontro entre o documentarista e seu
assunto é exatamente o que há a ser documentado. Nas palavras de Rouch, caso citado por
Di Tella (2005), deixa de ser mosca na parede (fly-on-the-wall) para ser a mosca na sopa
(fly-in-the-soup).
Documentários são asserções e, como tal, fazem afirmações sobre a realidade, não
são a realidade. “Não é possível colocar o mundo tal qual é num filme, num vídeo, nem no
papel Kodak. Todo formato da mídia é uma representação ou signo do real e não uma
transposição” (ANDACHT, 2004). O que vemos na tela não é o mundo, são apenas
imagens e sons que carregam consigo determinado discurso.

O que não quer dizer que a imagem não valha nada: ela pode mentir,
falsificar, simulando dizer a verdade, mas pode também ser associada a
outras imagens e outros sons para fabricar experiências inéditas,
complexificar nossa apreensão do mundo, abrir nossa percepção para
outros modos de ver e saber. As imagens são frágeis, impuras,
insuficientes para falar do real, mas é justamente com todas as
precariedades, a partir de todas as lacunas que é possível trabalhar com
elas (LINS; MESQUITA, 2008, p. 81-82).

É comum criar-se vínculo implícito entre o documentário e o “real”, segundo


Amado (2005), reforçado pelo recorte visual, privilégio da reflexão ou da informação
unidas em uma dimensão ética e em uma busca estética para expressá-la. Entretanto, as
exceções asseguram “uma liberdade de execução que permite a esse gênero fugir de
qualquer tentativa de categorização, ampliar sua lista de temas e preocupações e combinar
seus domínios com os da ficção” (AMADO, 2005, p. 217).
Diante disso, a diferença fundamental entre uma abordagem jornalística e uma
abordagem cinematográfica do cinema documentário está na crença na verdade. O
41
jornalismo se vende enquanto reprodução do real, sob os mitos da objetividade e
imparcialidade, enquanto o cinema se vende como arte, e como tal, no campo do cinema
documentário, como tratamento criativo dado a um olhar que interpreta o mundo a sua
volta, o olhar do sujeito-da-câmera. Sem a indexação, não teríamos como identificar se um
filme faz ou não asserções com o mundo real, pois vários filmes de ficção utilizam de
narrativa tradicionalmente documentária e vários documentários seguem o percurso
contrário e, até com elementos docudramáticos tendem a parecer ficção. O documentário
jornalístico tende a ficar no meio termo entre o cinema e o jornalismo.

Acreditar, não acreditar, não acreditar mais, acreditar apesar de tudo:


essas são as questões que agitam o cinema desde o início, lembra-nos o
crítico francês Jean-Louis Comolli, em oposição à produção televisiva
dominante que impõe ao telespectador a ilusão do lugar de controle, do
que sabe, julga e decide. Espetáculos de realismo, telejornais, telenovelas,
publicidade, programas de variedades respondem a todas as supostas
demandas da “audiência” com explicações, informações, reiterações
eliminando ambigüidades, paradoxos, contradições (LINS; MESQUITA,
2008, p. 81).

Um bom exemplo de como um documentário pode se aproveitar de uma abordagem


jornalística e de um formato cinematográfico é o documentário Ônibus 174 (2005), de José
Padilha. Lopes (2009)14 e Lima (2009)15 acreditam que filmes como esse sejam uma
espécie de uso do jornalismo literário no cinema. Para Lima (2009), o ser humano vem
sendo tratado superficialmente pelo jornalismo convencional, o autor afirma que a pessoa
humana é uma espécie de dado folclórico de ilustração de uma situação, apenas uma fonte
de informação, um arremedo de gente, algo estereotipado. O humano não é abordado em
sua complexidade. Segundo ele, na ausência do cumprimento desse papel pela mídia, essa
necessidade encontra cada vez mais espaço nos livros-reportagem e no cinema
documentário.

1.2.2. A opção pelo documentário

14
LOPES, Mariana Ferreira. Jornalismo Literário cinematográfico: uma leitura de “Ônibus 174”.
Disponível em: <http://www.abjl.org.br/detalhe.php?
conteudo=fl20070507194021&category=ensaios&lang=>. Acesso em: 9 nov. 2009.
15
LIMA, Edvaldo Pereira. Jornalismo Literário no cinema. Disponível em:
<http://www.abjl.org.br/detalhe.php?conteudo=fl20031110160922& category=ensaios&lang>. Acesso em: 9
nov. 2009.
42
Ao iniciarmos as pesquisas, notamos que a Assembleia do Povo foi notícia nos
jornais durantes quase uma década. Já existem também registros históricos sobre o
movimento na academia, em dissertações de mestrado e teses de doutorado. Então
pensamos que a melhor maneira de abordar o assunto sob uma perspectiva até então não
explorada seria o documentário. Para Lopes (2009), ao trabalhar temas que já foram
registrados, o cinema documentário busca, em sua forma, dar tratamento mais
interpretativo e contextualizado do que o dispensado pelos meios de comunicação de
massa, o que reafirma o documentário enquanto interpretação do real.
Quando pensamos no nosso documentário, não entendemos que ele seja apenas um
registro histórico, mas pode representar uma nova ferramenta para a melhor compreensão
desse momento de Campinas. Por isso entendemos que acima de tudo, nosso trabalho é
uma espécie de documentário social.

Hoje a política do documentário social [...] é atuar sobre a amnésia [...]


Contra o ocultamento consciente de um lado, ou a acumulação de atos
esquecidos em algum canto da indiferença dos indivíduos ou da
coletividade, o documentário tende a encontrar outros vínculos, uma nova
direção dos discursos e das imagens para ligá-los a um novo processo de
memória [...] (AMADO, 2005, p. 223-225).

1.2.3. Concepção do vídeo: proposta

Antes das filmagens, não tínhamos um argumento de documentário pronto,


fechado. Tínhamos uma idéia discutida do que queríamos e com isso deixamos que as
gravações fossem mais livres. Esse tipo de proposta – em que não há muito além de um
tema ou uma idéia – é comum no documentário contemporâneo e muito utilizada por
documentaristas brasileiros.
Decidimos por criar um dispositivo, uma situação a ser filmada, um reencontro dos
militantes da Assembleia do Povo quase três décadas depois e dali extraímos boa parte do
nosso material de vídeo. Não escondemos isso por motivos éticos, não queríamos criar
ilusões de verdades, pois sabemos do poder de imposição da imagem maquínica da
câmera. Segundo Ramos (2008), pode-se afirmar que a narrativa documentária é
basicamente composta por imagens-câmera, que podem ser acompanhadas de animação,
acompanhadas de sons, para as quais olhamos buscando asserções sobre o mundo que nos

43
é exterior, coisa ou pessoa. “[...] A natureza das imagens-câmera e, principalmente, a
dimensão da tomada através da qual as imagens são constituídas determinam a
singularidade da narrativa documentária em meio a outros enunciados assertivos, escritos
ou falados” (RAMOS, 2008, p. 22).
Pode-se definir um vídeo como documentário pela simples intenção do autor em
fazer um documentário, desde que caiba no nosso entendimento que isso foi proposto. Não
há exigência quanto ao conteúdo, apenas quanto à forma da narrativa e a indexação do
filme. Partimos desse dispositivo para definir todo o resto do vídeo. O reencontro dos
militantes foi o que nos deu material e fôlego para a finalização do documentário.

1.2.3.1. Dispositivo

Dispositivo no documentário contemporâneo é a criação pelo documentarista “de


um artifício ou protocolo produtor de situações a serem filmadas – o que nega diretamente
a idéia de documentário como obra que ‘apreende’ a essência de uma temática ou de uma
realidade fixa e preexistente” (LINS; MESQUITA, 2008, p. 56).
O reencontro, dispositivo por nós criado, foi a forma que encontramos de
conseguirmos relatos de um número enorme de pessoas, todos com a memória instigada
pela presença das pessoas que não viam desde a época em que militavam juntas, todas
emocionadas com a situação e com o local (o mesmo em que se reuniam 30 anos antes).
Aqui, o dispositivo “[...] não é a ‘forma’ de um filme, tampouco sua estética, mas impõe
determinadas linhas à captação do material” (LINS, 2007, p. 47).
O documentário Assembleia do Povo: O QUE IMPORTA É O QUE A GENTE É
não é um filme dispositivo, mas um filme que contém um dispositivo. Apesar de partirmos
do dispositivo, não nos atemos a ele, fizemos entrevistas fora do reencontro com os
personagens que consideramos “chaves” para relatarem aquilo que é muito mais a ligação
de suas histórias de vida com o movimento do que a história do próprio movimento. Cada
um conta o que (suas memórias dizem que) viveu. “Ao contrário dos roteiros que temem o
que neles provoca fissuras e afastam o que é acidental e aleatório, os dispositivos
documentais extraem da precariedade, da incerteza e do risco de não se realizar sua
vitalidade e condição de invenção” (LINS, 2007, p. 46).
Alguns fazem questionamentos éticos com relação à utilização de dispositivos.
Winston (2005) condena a retórica que diz que eventos documentados devem acontecer
44
sem intervenção, de preferência com o sujeito-da-câmera sendo totalmente ignorados. Para
ele isso não passa de um apelo simplista de verdade herdeiro do cinema direto.

1.2.3.2. Questões éticas consideradas

Procuramos seguir as convenções a cerca do campo ético no documentário. “[...] É


a verdade que cerca o campo ético. [...] A ela podemos chegar quando a narrativa
documentária aponta para si mesma e diz: sim, sou construída e eis o mapa do percurso
[...]” (RAMOS, 2008, p. 117). Para isso, logo no início do documentário, deixamos claro o
dispositivo. Uma das personagens, diz agradecer aos meninos que organizaram o
reencontro. Outra preocupação foi quanto a deixar clara a nossa proximidade com o
discurso dos militantes e distância com o discurso oficial, motivo que nos levou a escolher
uma frase de uma militante como título do documentário. Para assumirmos isso mais
claramente, colocamos a arte do título imediatamente depois da tomada em que a militante
formula a frase “o que importa é o que a gente é”.
Segundo Ramos (2008), o documentário que se dispõe a fazer asserções sobre o
mundo histórico lida diretamente com a reconstituição e a interpretação de fatos que, no
passado, tiveram a intensidade de presente. A interpretação pode ser positiva ou negativa.
É essa interpretação o que se tem como noção de verdade. Portanto, a noção de verdade
varia de acordo o conjunto de fatos que escolhemos para nos servir de base à interpretação.
Em toda a história do documentário, predominaram diversos contextos ético. Com
já vimos, de período para período, os valores que fundamentam a intervenção do
documentarista na realidade e sua articulação de tomadas em narrativa. Para Ramos
(2008), não se pode deixar de frisar a dimensão histórica que incide sobre a posição de
quem enuncia, o que flexiona a universalidade e a temporalidade das asserções. O autor
denomina os quatro principais sistemas de valores que sustentam a presença do
documentarista na tomada e as asserções do documentário sobre o mundo com educativo,
imparcial (em recuo), interativo/reflexivo e modesto.
O sistema de valores que nos guiou na produção do documentário foi o
interativo/reflexivo. Para sustentar nossa intervenção, tivemos que desenvolver uma visão
crítica à imparcialidade e distanciamento (como mostrado até aqui). Por reconhecermos
que a intervenção é inevitável, assumimos nossa construção do enunciar. Tentamos fazer

45
com que a construção do personagem coletivo (a soma de experiências individuais voltadas
para o todo, reconstitui a visão de um todo), ficasse clara para quem assiste.
Sobre esse sistema de valores, Ramos (2008) afirma que a reflexão teórica e a
produção imagética que o cerca são carregadas de preocupação com a posição da voz que
enuncia. “Se a intervenção articuladora do discurso é inevitável, a narrativa deve jogar
limpo e exponenciá-la, seja através de procedimentos interativos na tomada, seja na própria
articulação discursiva (montagem/mixagem)” (RAMOS, 2008, p. 37).
Seguir o sistema de valores éticos da interação e reflexão nos enquadra no que
Nichols (2005) chama de modo reflexivo. O autor classifica os documentários em seis
categorias que ele denomina “modos”, o poético, o expositivo, o participativo, o
observativo, o reflexivo e o performático. Os documentários reflexivos olham para si e
questionam sua própria estrutura, se posicionando com uma linguagem realista. A reflexão
acontece nas perspectivas formal e política.

De uma perspectiva formal, a reflexão desvia nossa atenção para nossas


suposições e expectativas sobre a forma do documentário em si. De uma
perspectiva política, a reflexão aponta para nossas suposições e
expectativas sobre o mundo que nos cerca [...] (NICHOLS, 2005, p. 166-
167).

A principal reflexão que o documentário Assembleia do Povo: O QUE IMPORTA


É O QUE A GENTE É não é formal (apesar de seu dispositivo), mas social e política. Não
é normal pessoas (favelados) serem tratados como subumanos, em sub-habitações de sub-
bairros. O documentário usa para discutir o assunto as memórias de pessoas que venceram
essa imposição que as pessoas que estão fora dessa realidade nem notam que existe. A
frase do início do documentário já introduz essa reflexão. O que essas pessoas lutaram para
conquistar não é luxo, mas cidadania e reconhecimento como humanos.
Assembleia do Povo: O QUE IMPORTA É O QUE AGENTE É vai na contramão da
cobertura jornalística da época que era abastecida com o discurso oficial e contava seu lado
da história. Assim, nos aproximamos mais do jornal alternativo O Repórter da Região, que
tinha um discurso mais próximo das bases dos movimentos sociais.
Embora não tenhamos trabalhado com a concepção da comunicação comunitária na
produção do documentário, acreditamos que ele pode cumprir um papel importante neste
sentido, pois de acordo com Peruzzo (2005):

46
Entre as principais características desse processo comunicacional estão:
opção política de colocar os meios de comunicação a serviço dos
interesses populares; transmissão de conteúdos a partir de novas fontes de
informações (do cidadão comum e de suas organizações comunitárias); a
comunicação é mais que meios e mensagens, pois se realiza como parte
de uma dinâmica de organização e mobilização social; está imbuído de
uma proposta de transformação social e, ao mesmo tempo, de construção
de uma sociedade mais justa; abre a possibilidade para a participação
ativa do cidadão comum como protagonista do processo16.

16
PERUZZO, Cicília M Krohling. Direito à Comunicação comunitária, participação popular e cidadania.
Artigo publicado na Revista Latinoamericana de Ciencias de la Comunicación, ano II, n.3, jul//dic. 2005.
São Paulo: ALAIC. p.18-41.Disponível em: http://74.125.47.132/search?
q=cache:XjR_8LU6HpMJ:www.metodista.br/poscom/cientifico/docentes/cicilia-peruzzo/artigos-de-cicilia-
peruzzo+comunica%C3%A7%C3%A3o+comunit%C3%A1ria+-+cicilia&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br.
Acesso 13.11.2009.

47
2º Capítulo
Procedimentos para a execução do Projeto Experimental:

2.1. Processo de Pesquisa

O processo de pesquisa foi iniciado ainda no mês de maio de 2009, quando o tema
do trabalho foi definido. Decidimos começar por uma pesquisa bibliográfica, pois isso
poderia abrir nossos horizontes com relação ao tema, que era pouco conhecido por dois
integrantes do grupo (que vivem em Campinas) e estranho aos três integrantes vindos de
outras localidades.
O primeiro livro consultado foi Marginais da História? de Doraci Alves Lopes. O
livro nos ajudou, pois além de discutir conceitos de marginalidade, conta a história do
movimento visto de dentro, por uma das assessoras. Este livro foi, desde então, nosso guia
nas pesquisas que daí seguiram-se. A autora citava vários trechos de jornais, motivo que
nos levou a assumir como segunda parte do processo de pesquisa a visita aos arquivos da
Rede Anhanguera de Comunicação (RAC), empresa proprietária dos dois principais jornais
de Campinas, Diário do Povo e Correio Popular. As pesquisas no arquivo da RAC foram
feitas de 14 de julho a 11 de agosto de 2009. Levantamos reportagens que foram
publicadas sobre o movimento e sobre os problemas de urbanização em Campinas
(pesquisamos os arquivos de jornais com datas entre 1962 a 1985). Mesmo diante de tanto
material, sentimos falta de outros jornais. O livro Marginais da História? citava em
determinado trecho um arquivo cuidadosamente montado pela ex-assessora do movimento
Maria Conceição Vieira. Em 14 de agosto de 2009 fizemos uma pré-entrevista com ela.
Na entrevista, descobrimos que todo o arquivo havia sido doado ao Centro de
Memória da Unicamp. Visitamos o CMU e encontramos jornais, atas, fotos e recortes de
jornais. Fotografamos os jornais, mas nosso acesso ao restante do arquivo foi restringido.
Ainda não estávamos contentes com o material que conseguimos, motivo que nos levou à
hemeroteca da Biblioteca Municipal de Campinas, onde encontramos vários recortes de
jornais sobre o movimento.
Pesquisando sobre nosso tema na Internet, encontramos um artigo, também da
cientista social Doraci Alves Lopes (Um momento único: aprender com Dalmo Dallari),

48
em que a autora prestava uma homenagem ao jurista Dalmo Dallari, que apoiou a luta da
Assembleia do Povo, e dava algumas informações sobre o movimento. Encontramos
também a dissertação de Mestrado do arquiteto Fábio Boretti Netto Araújo, Participação
popular e a construção do espaço público, que em determinado trecho estabelecia relações
entre nosso tema e outros movimentos sociais urbanos, indicando uma lógica de
funcionamento própria dos movimentos na época. Para aprofundar isso, encontramos um
artigo do cientista social Pedro Roberto Jacobi, intitulado Atores sociais e Estado:
Movimentos reivindicatórios urbanos e Estado – dimensões da ação coletiva e efeitos
político-institucionais no Brasil.
Tínhamos um déficit de informações sobre história da urbanização e migração. Para
saná-lo, consultamos os textos Campinas: o despontar da modernidade (Ricardo de Souza
Campos Badaró), Espaço e tempo em Campinas: Migrantes e a expansão do pólo
industrial paulista (Rosana Aparecida Baeninger), Momento de Ruptura: as
transformações no centro de Campinas na década dos cinqüenta (Antônio Carlos Cabral
Carpintero) e A produção capitalista da casa (e da cidade) no Brasil Industrial (Ermínia
Maricato).
Precisávamos entender o funcionamento das associações de moradores em
Campinas. Para isso utilizamos a dissertação de mestrado Associação de moradores em
debate no município de Campinas, de Olívia Salgado Costa. Como a Assembleia do Povo
se organizava em uma estrutura própria dos movimentos sociais vinculados às
organizações da igreja católica, precisávamos entender o contexto. Para isso, consultamos
o livro Movimento Social Urbano, Igreja e Participação Popular, de Ana Maria Doimo.
Não queríamos nos prender a um só livro para entender a história do movimento.
Ao procurar por mais obras bibliográficas, encontramos a dissertação de mestrado Favela
código Cidade: O muito falar e o não fazer é suar em vão, de Térsia Pilomia de Paoli, que
nos permitiu entender o movimento a partir de outro olhar.
A bibliografia nos deu o suporte teórico necessário para a segunda etapa da
pesquisa. A nossa proposta desde o início era ouvir as lideranças das favelas, as pessoas
que não tiveram oportunidade de mostrar seus olhares sobre a história. Por isso, nos
guiamos também pelo conteúdo das pré-entrevistas, o que nos ajudou a entender o
movimento por dentro, a partir de sua estrutura, a base.
Para entrevistar os idosos o grupo precisou estudar o assunto (Assembleia do Povo
e urbanização em Campinas). A partir desses conhecimentos adquiridos, foi possível
49
ajudar os idosos reconstituírem as suas memórias. Para não limitar as memórias, o grupo
não achou proveitoso ter um roteiro fixo de perguntas. Segundo Bosi (1999), o ideal é ter
algumas perguntas condutoras, com dados que auxiliem as lembranças do entrevistado,
como datas importantes da época em que viveu, acontecimentos políticos e econômicos,
entre outros. A partir disso, o grupo fez um roteiro como fio condutor, que foi utilizado nas
gravações, mas que sofreu alterações conforme o diálogo fluía.
Esperávamos muito da pré-entrevista de 10 de setembro, com Leobino Francisco de
Oliveira, liderança da região do Campos Elíseos. Considerado principal articulador da
Assembleia do Povo, pensávamos nele como chave para contar a história do movimento.
Ao chegarmos à casa de Leobino, nos deparamos com um senhor que mal consegue
completar frases. Seria impossível entrevista-lo.
Enquanto seguíamos com as entrevistas, percebemos que as fotos arquivadas no
Centro de Memória da Unicamp não eram suficientes para ilustrar o que era relatado pelos
entrevistados. Começamos a procurar por arquivos pessoais e encontramos fotos referentes
à urbanização do Núcleo Iporã (Parque Dom Pedro II) pertencente a uma das entrevistadas,
Luzia Maria da Costa. Ainda com o arquivo esse arquivo, sentíamos um certo vazio de
imagens, descobrimos então o arquivo de Ronaldo Simões, ex-assessor de comunicação do
movimento, em que estão guardadas centenas de fotos referentes ao movimento e seus
militantes em diferentes situações, como em reuniões, assembleias, mutirões de
urbanização e outras. Graças à pesquisa de fotos, conseguimos material suficiente para
produzir o vídeo.
Notamos que fizemos as melhores opções, pois conseguimos entender o
movimento indo além da sequência de fatos que compõem sua história. Compreendemos o
contexto em que a Assembleia do Povo se insere e a lógica que guiava os movimentos
sociais urbanos surgidos a partir do início do processo de reabertura, iniciado no governo
Geisel.

2.1.1. Localização das fontes

Alguns membros do nosso grupo participaram do movimento social de Campinas


na última década. Essa militância auxiliou no contato com as fontes do trabalho. Em Lopes
(1997) e Paoli (2000) encontramos elementos para escolha das fontes. A partir daí e com
os contatos anteriores, fomos a campo, em alguns casos, como Sebastião Rosa, Jovelina
50
Celi da Silva e Francisco Lems, já tínhamos os telefones e apenas agendamos as pré-
entrevistas. Em todos os outros casos fomos a campo no próprio bairro indicado na
bibliografia pesquisada ou por outras pessoas e pedimos informações, chegando a todas as
fontes que tínhamos interesse.
Localizamos Luzia Maria da Costa e Francisca Martins Pinho com a ajuda de Célio
Henrique Franco, ex-morador do Parque Dom Pedro II. Célio morava nas proximidades do
Núcleo Iporã e acompanhou de perto a luta dessas pessoas. Quando soube da nossa opção
pelo tema da Assembléia do Povo nos procurou e as indicou como possíveis fontes.
De todos que ouvimos, o mais fácil de encontrar foi o Padre Benedito Ferraro, com
quem falamos depois de alguns telefonemas para a Cúria Metropolitana de Campinas.
Padre Ferraro se mantém na Pastoral Operária até hoje.
Tércia Pilomia De Paoli foi localizada por indicação da entrevistada Luzia Maria da
Costa, do núcleo Iporã, que frequentava o escritório da arquiteta no Distrito de Barão
Geraldo, quando era ajudada no processo de urbanização da favela. Dona Luzia nos
indicou mais ou menos onde ficava o escritório. Procuramos pelo Distrito de Barão
Geraldo e encontramos a arquiteta.
A grande liderança da Assembleia do Povo, segundo todos os entrevistados, foi
Leobino Franciso de Oliveira. Nós tínhamos muitas citações de pessoas, reportagens e
livros que falavam dele e pensávamos nele como um personagem muito importante para
nosso trabalho. Sem sabermos como localizá-lo, perguntamos para todos que
entrevistávamos se sabiam do tal Leobino até que o ex-assessor Ronaldo Simões disse que
ele morava na favela 29, mais conhecida hoje como Nova Aliança, no Jardim Campos
Elíseos. Já tínhamos uma pista, mas tivemos que ir até a favela várias vezes. Ninguém
conhecia o tal Leobino, até que conseguimos localizar uma mulher que participou da
Associação de Moradores com Leobino. Por vários dias ela conversou com evangélicos de
varias igrejas que ele frequentou, até que em uma dessas igrejas conseguimos o telefone
dele e pudemos então localizá-lo, morando no Jardim Satélite Íris. A entrevista foi
emocionante, mas não pudemos aproveitar muito, pois Leobino já tem a saúde mental
abalada e não consegue se situar no tempo.
A advogada Maria Cecília Mazzoriol Volpe só foi localizada no final do trabalho,
quando o vídeo já estava sendo editado. Foi a entrevistada encontrada da maneira mais
inusitada. A mãe de um dos integrantes do grupo, Reginei Domingos de Morais, teve
câncer e passou por um tratamento no ano de 2005 com um remédio com custo muito alto.
51
Reginei recebeu orientação da assistente social para procurar uma advogada que depois de
se tratar desta mesma doença resolveu ajudar as vitimas desse mal. Reginei esteve no
escritório da advogada, na avenida Barão de Itapura, e foi atendido por ela e por seu
estagiário. Durante a pesquisa, Reginei já não ligava o nome à pessoa, até mesmo por a
advogada é conhecida pelos ex-militantes do movimento como Mariinha. Quando
descobrimos o endereço do escritório, Reginei foi checar e descobriu que já esteve lá. O
antigo estagiário da advogada que atendeu Reginei em 2005 hoje trabalha na Secretaria
Municipal de Assuntos Jurídicos da Prefeitura de Campinas. Reginei trabalha nove andares
abaixo, também na Prefeitura. Daí em diante foi fácil encontrar a advogada.

2.2. As etapas da Produção jornalística

2.2.1. Seleção de fontes

Resolvemos desde o início das pesquisas que usaríamos apenas depoimentos das
lideranças das favelas. Chegamos a cogitar a utilização de relatos de um dos assessores
como fio condutor da narrativa, mas desistimos, por fugir do objetivo inicial: apresentar
versões dos acontecimentos mais próximas dos militantes da base, pessoas que não tinham
como tornar público seu olhar sobre os acontecimentos, por não deter os meios de
produção de informação. Logo descobrimos que o “dar voz” é um mito. Não somos e nem
conseguiríamos ser porta voz desses ex-militantes.

A possibilidade de o outro de classe expressar-se está em relação direta


com a propriedade dos meios de produção. Pelos filmes e textos que
conheço da história do cinema brasileiro nunca se colocou este problema
antes dos anos 50, e depois só muito raramente. Falou-se sempre em
colocar o povo na tela, mas não se tratava tanto de questionar a
dominação dos meios de produção pelos cineastas. Estes preferiram
resolver a questão imaginando-se os porta-vozes ou os representantes do
povo ou até mesmo a expressão da “consciência nacional”
(BERNARDET, 1985, p. 189).

Pensamos em vários métodos que servissem de filtros, para a seleção de fontes.


Primeiro cogitamos selecionar as lideranças das favelas mais participativas. Depois
pensamos em selecionar as lideranças mais citadas em reportagens. Até que, por fim,

52
notamos que seria injusto excluir as pessoas com as quais conversamos por um método
imposto pela nossa noção do que foi o movimento.
Diante de tudo isso, optamos por reconstruir as memórias dos militantes do
movimento usando fragmentos, formando assim um personagem coletivo. Como em O
Cortiço, de Aluísio Azevedo, dentre outras obras, em que os personagens são
representações de todas as pessoas que vivem em situações parecidas.
Mas, segundo as lideranças do movimento, os assessores tiveram papel
fundamental na organização, e por isso decidimos não excluí-los do documentário.
Optamos por usá-los em determinados trechos do vídeo apresentando o pano de fundo do
que é narrado, informações que as lideranças não poderiam nos dar, pois os favelados não
tem a percepção de como o movimento caminhou para alguns acontecimentos que seriam
chave em sua história. Além disso, para quem tiver acesso ao DVD, os assessores tem seu
devido espaço nos extras, abordando assuntos que julgamos pertinentes para uma melhor
compreensão do que foi a Assembleia do Povo.
Só ficamos frustrados pela impossibilidade de entrevistar Maria Conceição Vieira,
que, mesmo pré-entrevistada, não pode nos conceder entrevista gravada, pois a ex-
assessora do movimento sofreu um acidente de carro no mesmo dia do reencontro.
Conceição foi apontada como uma das principais assessoras por todos os entrevistados.

2.2.1.1. Lideranças ouvidas

Alcides de Lima é morador do Parque Dom Pedro II, foi vice-presidente da


Associação de Moradores do Núcleo Iporã na época em que conquistaram o direito à terra
e à urbanização. Trabalhou com Alcides Vieira Pinho (grande liderança do bairro, já
falecido) em todas as reivindicações. Também foi presidente da Associação de Moradores
e participava de todas as reuniões no Centro Pastoral Pio XII. Alcides foi ouvido apenas no
reencontro, não pode nos ceder uma entrevista.
Francisca Martins Pinho é moradora do Parque Dom Pedro II e viúva da maior
liderança do Núcleo Iporã, primeira favela urbanizada, Alcides Vieira Pinho. Apoiou o
marido em diversas lutas. A força de seu marido em parceria com Alcides de Lima fez com
que na época o Núcleo Iporã ficasse conhecido como “Vila dos Alcides”. Francisca nos
cedeu uma entrevista e foi ouvida no reencontro.

53
Francisco Lems é morador do Bairro da Conquista, onde até hoje atua na
Associação de Moradores e é reconhecido como uma das grandes lideranças do Bairro.
Francisco foi, na época da Assembleia do Povo, a maior liderança da Favela da Vila Ipê,
onde mobilizou moradores que urbanizaram o bairro com as próprias mãos. Francisco nos
cedeu uma entrevista e foi ouvido no reencontro.
Geraldo Borges é morador do Jardim Londres e foi militante da associação de
moradores durante a Assembleia do Povo. Geraldo foi ouvido apenas no reencontro, não
pode nos ceder uma entrevista.
José Augusto de Morais é presidente da Associação do Bairro da Vitória, antes
conhecido como favela da Vila Georgina. Ao chegar em Campinas enfrentou o despejo e a
pressão dos fiscais da prefeitura. José Augusto foi ouvido apenas no reencontro, não pode
nos ceder uma entrevista.
José Duarte Costa Filho é morador do Jardim Ipaussurama, e ajudou na
urbanização de diversas favelas. José Duarte foi ouvido apenas no reencontro, não pode
nos ceder uma entrevista.
Jovelina Celi da Silva acompanhava o arquiteto Antonio da Costa Santos, ex-
assessor da Assembleia do Povo (posteriormente eleito prefeito de Campinas), nas
medições e no preparo para a urbanização do Jardim Santa Mônica. É da entrevista com
Jovelina que foi tirada a frase do título do documentário. Jovelina nos cedeu uma
entrevista, mas não pode participar do reencontro.
Leobino Francisco Oliveira foi presidente da Associação de Favelados do Jardim
Campos Elíseos. Abria todas as reuniões de lideranças no Centro Pastoral Pio XII.
Negociou diversas vezes com o prefeito Francisco Amaral. É reconhecido pelas lideranças
das favelas como grande liderança do movimento. Não o entrevistamos formalmente, por
limitações de saúde de Leobino, mas utilizamos uma de suas falas do reencontro em um
trecho do documentário. Leobino foi ouvido apenas no reencontro, não pode nos ceder
uma entrevista.
Luzia Maria da Costa é moradora do Parque Dom Pedro II. Atuou como uma das
lideranças do Núcleo Iporã, junto aos Alcides, principais lideranças do bairro. Luzia nos
cedeu uma entrevista e foi ouvida no reencontro.
Mariza de Lima Sousa é moradora do Jardim das Bandeiras II. Atuou na
Associação de Moradores do bairro junto a Marlene Teixeira de Abreu Correia, grande
liderança da luta na região. É Mariza quem aparece em uma das fotos no documentário
54
tomando o microfone do então vice-prefeito, Magalhães Teixeira. Mariza foi ouvida
apenas no reencontro, não pode nos ceder uma entrevista.
Marlene Teixeira Abreu Correia é moradora do Jardim das Bandeiras II. Foi a
principal liderança da favela a ponto de tomar uma dimensão maior que a própria favela.
Foi líder de bairro, liderança da região e uma das principais lideranças da Assembleia do
Povo. Marlene foi a primeira candidata mulher do PT de Campinas a uma cadeira na
Câmara Municipal, além de uma das principais lideranças do partido em na época de sua
fundação. Marlene nos cedeu uma entrevista e foi ouvida no reencontro.
Sebastião Ferreira da Silva é morador do Parque São Quirino e foi uma de suas
lideranças. Sebastião foi ouvido apenas no reencontro, não pode nos ceder uma entrevista.
Sebastião Rosa é morador da Vila Brandina e freqüentava as reuniões de lideranças
no Centro de Pastoral Pio XII. Sebastião foi ouvido apenas no reencontro, não pode nos
ceder uma entrevista.
Valdecir José da Silva é morador do Jardim São Marcos e foi militante da
associação de moradores durante a Assembleia do Povo. Valdecir nos cedeu uma
entrevista, mas não pode participar do reencontro.

2.2.1.2. Assessores entrevistados

Alcides Mamizuka participou do movimento estudantil no fim da década de 1960.


Foi preso político e vítima de tortura. Na Assembleia do Povo era um agente, ensinava aos
favelados as leis e seus direitos. Alcides nos cedeu uma entrevista e foi ouvido no
reencontro.
Alfredo Luiz Gomes é agente pastoral e participava das comunidades de base da
igreja católica, seu papel era ajudar na organização das entidades dos favelados. Alfredo
participou do reencontro, mas não pode nos ceder uma entrevista.
Benedito Ferraro é padre da Arquidiocese de Campinas, se ordenou em 1971 e
desde então trabalhou na periferia de Campinas, articuladamente com as Comunidades
Eclesiais de Base, Pastoral Operaria e também fazendo a ligação com movimentos
populares. Ferraro nos cedeu uma entrevista, mas não pode participar do reencontro.
Doraci Alves Lopes estudou geografia por dois anos na USP, e ao conseguir vaga
em ciências sociais na Unicamp, em 1973, mudou-se para Campinas. Colaborou no jornal
O Repórter da Região, elaborando pautas e escrevendo, e foi assessora de imprensa da
55
Assembleia do Povo. Fez Mestrado em Sociologia pela Unicamp em 1988, estudo do qual
surgiu o livro Marginais da História?, nossa primeira fonte bibliográfica. Doraci nos cedeu
uma entrevista e foi ouvida no reencontro.
Izalene Tiene participou na criação de Comunidades Eclesiais de Base. Foi uma
agente na Assembleia do Povo, ia às favelas tentar conscientizar os favelados da
importância da luta e integrá-los à Assembleia do Povo. Izalene nos cedeu uma entrevista e
foi ouvida no reencontro.
Maria Cecília Mazzariol Volpe foi advogada da Assembleia do Povo e ajudou a
encontrar leis e interpretar, e encontrar formas de interpelar judicialmente a administração
municipal, para que os favelados conseguissem que suas reivindicações fossem atendidas.
A advogada acompanhou os favelados nas reuniões com o prefeito Francisco Amaral.
Maria nos cedeu uma entrevista, mas ainda não havia sido encontrada na data do
reencontro. A advogada só aparece nos extras do DVD.
Ronaldo Simões mudou-se para Campinas em 1971, sendo filho de preso político
durante a Ditadura Militar. Fez parte do movimento estudantil e participou na Unicamp, na
década de 1970, de movimento estudantil. Foi colaborador do O Repórter da Região, no
qual atuou como fotografo. Posteriormente se tornou assessor de comunicação da
Assembleia do Povo. Ronaldo nos cedeu uma entrevista e foi ouvido no reencontro.
Tércia Pilomia De Paoli foi arquiteta da Assembleia do Povo. Junto com Antônio
da Costa Santos, Tércia elaborou o Plano de Urbanização Especifica (PUE). Freqüentava
as favelas para estudar e traçar traços da urbanização. Participou do projeto no qual os
favelados desenhavam a planta da própria casa. Tércia não foi encontrada a tempo de
participar do reencontro, mas nos cedeu uma entrevista. A arquiteta aparece apenas nos
extras do DVD.

2.2.2. Pautas ou pré-roteiro

Para elaborar as pautas de entrevistas, definimos alguns tópicos que julgávamos


mais importantes na história do movimento: chegada dos favelados a Campinas, vida e luta
nos bairro; chegada dos favelados ao movimento; grandes assembleias; Lei da Terra;
urbanização; e conquistas. A partir disso e com as informações que conhecíamos de cada
um, graças às pré-entrevistas, elaboramos um roteiro de perguntas geral, que servia para
todas as lideranças entrevistadas e incluíamos nele perguntas específicas sobre o que cada
56
um viveu. Apesar de haver um roteiro, as entrevistas eram abertas de modo a proporcionar
liberdade para que as lideranças contassem o que não estava no script. Assim foram
elaboradas as entrevistas com os ex-militantes do movimento.
Das entrevistas com lideranças, as únicas que fugiram ao padrão foram as
entrevistas com Jovelina Celi da Silva e Valdecir José da Silva, pois fizemos por conta
antes de começarmos a utilizar a estrutura da PUC-Campinas. Nas duas entrevistas, não
havia roteiro algum, pois na verdade foram pré-entrevistas gravadas.
Com os assessores da Assembleia do Povo, a lógica por trás do roteiro foi outra.
Focamos as entrevistas no que já tinha sido dito nas pré-entrevistas. Não havia um padrão,
a entrevista com cada assessor tratava especificamente do que fez ou presenciou no
movimento, além de pedirmos informações sobre o contexto, para que, se necessário,
tivéssemos material para criar um pano de fundo com dados, sem utilizarmos de narração
em voz over.
Elaboramos um roteiro para o reencontro, mas não conseguimos seguí-lo.

2.2.3. Trabalho de campo

Iniciamos nosso trabalho de gravação no dia 13 de agosto de 2009, com uma


entrevista com Jovelina Celi da Silva, liderança do Jardim Santa Mônica. Era para
acontecer uma pré-entrevista, mas resolvemos gravá-la, este foi o único motivo pelo qual
temos seus relatos, pois desde que iniciamos as gravações com o roteiro padrão de
entrevistas, até o fim das gravações, Dona Jove, como é conhecida, encontra-se
hospitalizada. Ainda no mesmo dia, gravamos uma entrevista com Valdecir José da Silva,
do Jardim São Marcos.
Em 10 de setembro, fomos até a Associação de Moradores da Bairro da Conquista,
para entrevistar seu presidente, Francisco Lems, ou Chiquinho. O Sr. Chiquinho está “na
luta” até hoje e atribui isso à Assembleia do Povo, que segundo ele, foi uma escola.
Personagem fantástico, foi o primeiro que entrevistamos seguindo o roteiro de entrevistas.
Fomos ao Núcleo Iporã (Parque Dom Pedro II) em 3 de outubro para entrevista
com Luzia Maria da Costa, uma das lideranças do bairro. Luzia ajudou na organização da
urbanização da favela. Em sua casa, na pré-entrevista, conhecemos Francisca Martins
Pinho, esposa do já falecido líder da favela, Alcides Vieira Pinho e no dia da gravação,

57
aproveitamos para entrevistá-la. No mesmo dia, gravamos com Marlene Teixeira Abreu
Correa, liderança do Jardim das Bandeiras e articuladora das passeatas no Paço Municipal.
Visitamos o Museu da Imagem e do Som de Campinas no dia 16 de outubro para
entrevistar Ronaldo Simões, mais conhecido como Batata. Ele foi fotografo d’O Repórter
da Região e membro da assessoria de comunicação da Assembleia do Povo. Fomos até a
Cúria Metropolitana de Campinas em 17 de outubro gravar uma entrevista com o Padre
Benedito Ferraro, que viu o movimento nascer, sob a ótica de um membro da igreja
católica.
Em 10 de outubro, organizamos um reencontro de lideranças e assessores da
Assembleia do Povo, na Cúria Metropolitana de Campinas. gravamos todo o evento, onde
os presentes, um a um, fizeram suas considerações sobre o movimento. Apresentando um
vídeo com recortes de jornais sobre a Assembléia do Povo para instigar as memórias dos
presentes. Conseguimos ótimos relatos de pessoas que ainda não havíamos entrevistado,
como Geraldo Borges (Jardim Londres); José Augusto de Morais (Bairro Vitória e
Georgina); José Duarte Costa Filho (Jardim Ipaussurama). Ao fim do evento,
entrevistamos o ex-assessor do movimento e vereador, Alcides Mamizuka e a ex-assessora
e prefeita de Campinas, Izalene Tiene. A cientista social e ex-assessora do movimento,
Doraci Alves Lopes, também estava presente. Agendamos sua entrevista para a semana
seguinte, 17 de outubro.
A ideia do reencontro com os favelados surgiu em um encontro de orientação com a
orientadora. Optamos por organizar o evento no local em que os favelados se encontravam
para discutirem as reivindicações de cada favela: o Centro Pastoral Pio XII (Cúria
Metropolitana de Campinas). A data agendada foi 10 de outubro, das 8h às 16h.
Estavam presentes 24 pessoas, sendo que cinco eram assessores. Apenas alguns dos
ex-militantes vieram sozinhos para o Centro Pastoral, como foi o caso da Marlene Teixeira
Abreu Correia e Francisco Lems. Combinamos com os demais que buscaríamos cada um
em suas casas, pois não queríamos que eles tivessem gasto financeiro para chegar ao Pio
XII e também, por preocupação com a saúde dos idosos.
Combinamos então, que um dos integrantes do grupo (Reginei Domingos de
Morais) buscaria alguns ex-militantes. Por uma questão de logística seria necessário dispor
de mais carros. Como não poderíamos ceder mais um integrante do grupo para buscar os
convidados, decidimos pedir ajuda a alguns amigos, que se dispuseram a buscar e a levar
os ex-militantes. Tivemos então, cinco carros a nossa disposição.
58
Os demais integrantes chegaram às 8h no Centro de Pastoral Pio XII para arrumar a
sala, a mesa de comida e esperar os cinegrafistas que foram contratados. Contratamos, com
ajuda de patrocinadores, contratar a produtora Ponto Z, de São Paulo, para gravar com três
câmeras, estrutura de iluminação e auxiliares na produção. Explicamos a eles como
pensamos o enquadramento e do que se tratava o documentário. Arrumamos a sala com
uma fila de cadeiras em forma de ferradura para poder filmar todos e fazer duas rodadas de
perguntas. Quando entravam no jardim, os ex-militantes tinha a sua direita um painel de
banners com fotos do movimento e a sua frente uma mesa de café da manhã.
Cerca de 30 minutos depois, chamamos os ex-militantes para entrarem na sala.
Uma de nossas preocupações era não deixar que o encontro passasse das 12 horas, pois os
idosos poderiam ficar cansados em demasia. Ao se acomodarem, nos apresentamos,
falamos do objetivo do documentário e em seguida exibimos um áudio visual, elaborado
por Rafael Oliveira Jorge. O produto tinha fotos de jornais, todos fotografados no Centro
de Memória da Unicamp, em minucioso trabalho de pesquisa e seleção de momentos
importantes da Assembleia do Povo. O audiovisual apresentando teve duração de dez
minutos. A ideia era despertar as memórias dos favelados.
Em seguida explicamos que faríamos duas rodadas. A primeira seria somente para
falarem o nome e o bairro onde moram; e a segunda seria para falarem das conquistas e
histórias da Assembleia do Povo. Nada aconteceu como programamos. Ao se
apresentarem, os ex-militantes já começavam a contar suas memórias, optamos por não
interromper. A segunda rodada então foi uma rodada aberta para quem quisesse fazer
complementações.
Ao final fizemos algumas tomadas pelo Pio XII e levamos cada um de volta para
casa. O reencontro do dia 10 de outubro superou nossas expectativas. Todos os convidados
participaram. Não tivemos problemas com os carros, cinegrafista e nem nas rodadas. O
único problema foi a extensão das rodadas até as 13h, o que pode ter cansado um pouco os
ex-militantes. Percebemos que todos ficaram emocionados, alguns choraram e até falaram
que esse reencontro seria uma possível volta da Assembleia do Povo, da qual eles
acreditam que todos ainda precisem, para promover a união, para novas conquistas.
Assim produzimos o vídeo, tentando representar uma parte das vidas das pessoas
que ali estavam, e por que não, das nossas vidas. Documentamos o momento de cada um
de nossos encontros formais com eles e utilizamos cenas de todos esses encontros no

59
vídeo. Cada cena, cada tomada, cada sequência foi cuidadosamente pensada para a
constituição do documentário.

Um documentário representa uma vida, como uma pintura representa


uma cadeira, e a cadeira, e a cadeira existe, tem vida real. A ficção é
sempre intermediada pela consciência de uma mimese, pelo acordo tácito
que envolve qualquer representação, qualquer jogo dramático. O
documentário, em oposto, sugere o registro da vida, como se ela
acontecesse independentemente da presença da câmera, o que é falso. A
presença da câmera sempre transforma a realidade. E essa transformação
segue para além do filme. Registrar uma vida real é uma grande
responsabilidade, compreende uma enorme quantidade de dilemas
morais, éticos, em cada etapa da filmagem: no enquadramento, na
iluminação, na edição de som e, principalmente, na montagem
(COUTINHO; XAVIER; FURTADO, 2005, p. 109).

Em todas as gravações, mantivemos um padrão de enquadramento. Fizemos


quadros que variam entre o plano médio e o plano americano. Optamos por esse padrão,
pois ele possibilita ao mesmo tempo a captação da imagem do rosto de quem fala de seus
gestos.
(…) A evidência – as coisas que nos convencem na tela – surge em
diferentes graus de credibilidade. A evidência da fala em geral é menos
digna de crédito do que a evidência comportamental. Podemos dizer ou
pensar qualquer coisa, mas não conseguimos escolher o que sentimos ou
como nos comportamos quando experimentando sentimentos fortes [...]
(RABIGER, 2005, p. 58-59).

Só fugimos à regra por nós mesmos imposta duas vezes: na entrevista com
Francisca Martins Pinho (Parque Dom Pedro II) e no reencontro dos militantes (na Cúria
Metropolitana). No primeiro caso, optamos por planos mais fechados para esconder o
cenário, pois já havíamos entrevistado Luzia Maria da Costa exatamente no mesmo lugar e
não queríamos repetir o quadro.
No reencontro, aproveitamos a estrutura que montamos (três câmeras e técnicos de
som e iluminação) e utilizamos duas câmeras voltadas para o personagem que fala e uma
capturando as reações dos outros participantes. Uma das câmeras que enquadrava o
entrevistado mantinha planos médios e americanos, enquanto a outra fazia quadros
fechados (primeiro plano e plano detalhe). Além disso, fizemos imagens da chegada dos
ex-militantes, tentamos documentar a emoção das pessoas ali presentes, algumas que já
não se viam há quase três décadas. Com exceção de fotos de arquivo, as únicas imagens
que usamos para cobrir trechos do vídeo vieram justamente das gravações feitas nos
60
jardins da Cúria Metropolitana de Campinas, na tentativa de mostrar com cada dos quadros
que mais que companheiros de luta, os militantes da Assembleia do Povo são uma família.

2.2.4. Processo de edição

Capturamos todo o material que gravamos em um disco rígido e fizemos boa parte
do trabalho fora do Laboratório de Imagem e Som da PUC-Campinas. Em casa, com o
auxílio de um editor de vídeo amigo, decupamos todo o material, cortamos, montamos na
ordem que pensamos o documentário, assistimos e a partir disso montamos o roteiro para
levar o projeto para os técnicos da Universidade.
Na ilha de edição da Universidade, tivemos que cortar boa parte do material, pois
nosso documentário tinha em torno de 30 minutos. Passamos dois dias cortando falas e
acertando os cortes entre tomadas. Passamos outros dois dias tratando fotos e áudio do
vídeo. Contratamos um editor para fazer as artes e finalizar o vídeo, pois já não havia
tempo de fazê-lo.
Os extras do DVD foram feitos depois de fechado o vídeo principal. Aproveitamos
para utilizar falas de assessores que ainda não haviam sido utilizadas, inclusive as falas da
arquiteta Tércia Pilomia De Paoli e as da advogada Maria Cecília Mazzoriol Volpe, que
não entraram no documentário porque foram captadas já em fins do processo de edição.

61
3º Capítulo
Apresentação do produto final:

3.1. Justificativa

Assembleia do Povo: O QUE IMPORTA É O QUE AGENTE É, é um


vídeodocumentário baseado em memórias que serve como registro histórico do
movimento. Escolhemos como meio o vídeo por possibilitar que os ex-militantes e outras
pessoas que vivem ou viveram na mesma condição de exclusão social pudessem ter acesso
ao material, pois muitos deles não tiveram a oportunidade de estudar, sendo alguns
analfabetos e outros minimamente alfabetizados. A linguagem e o formato adotados
permitem que mesmo quem não domina a faculdade da leitura possa ter o mesmo grau de
apreensão e síntese que uma pessoa letrada. De acordo com Lima (2009) precisamos contar
nossas histórias, gostamos de vê-las e ouvi-las, pois elas ajudam a dar sentido às nossas
vidas, nos mostram quem somos. Permitem que nos identifiquemos, ajudam a encontrar
quem nos inspira, quem nos mostra, através de suas histórias, iluminações para a realização
do nosso propósito maior, viver.

3.2. Público alvo

Nosso público alvo prioritário são os moradores das favelas de Campinas, pois eles
que vivenciaram e vivenciam em alguma medida a Assembleia do Povo. Eles construíram
as favelas ou bairros (antigas favelas) onde moram e brigaram pela conquista da cidadania.
Os mais jovens não vivenciaram o movimento, mas cresceram cercados pelas conquistas
da Assembleia do Povo, ou seja, de alguma forma vivem agraciados pelos frutos do
movimento.
Pensamos neles como nosso público alvo, por notarmos que a história do
movimento ainda não lhes foi contada, sobrevive apenas na academia. Nos bairros
restaram algumas lembranças que pretendemos instigar e, que sabe, ajudar algumas
pessoas na compreensão de sua própria história, pois compreendendo o passado fica mais
fácil construir o futuro.

62
Assim, o documentário pode ser utilizado também como material de ensino nas
escolas públicas da periferia, pois, além de contar uma parte da história de Campinas
ignorada pelo currículo escolar, pode gerar nos mais jovens certa consciência cidadã.
Talvez, nosso vídeo possa ser assistido por estudantes universitários de diversos cursos das
Ciências Sociais e Humanas, que tenham interesse em conhecer e estudar movimentos
sociais urbanos ou, especificamente, a Assembleia do Povo.

3.3. Custo/Gastos

Gastamos em torno de R$ 300,00 com transportes, R$ 200,00 com alimentação, R$


450,00 com diárias de cinegrafista, R$ 300,00 com as artes do documentário, R$ 200,00
com fitas mini-DV, R$ 50,00 com aluguel de um projetor, R$ 200,00 com impressões e
cópias, e R$ 300,00 com a finalização do documentário, totalizando aproximadamente R$
2.000,00.
Gastaríamos outros R$ 4.300,00 com a estrutura de três câmeras e equipe de
produção que montamos para o reencontro, mas conseguimos apoio cultural. A Companhia
de Desenvolvimento do Pólo de Alta Tecnologia de Campinas (Ciatec) pagou nossos
gastos com produção, o que nos ajudou muito para que atingíssemos o resultado esperado.

3.4. Viabilidade de divulgação

Nosso documentário não tem nenhuma pretensão comercial. Pode eventualmente


ser transmitido por alguma emissora de TV pública ou universitária ou ser exibido em
festivais. Mas, a ideia inicial é fazer exibições seguidas de debates nas associações de
moradores de bairros urbanizados graças a ações da Assembleia do Povo, em favelas ainda
não urbanizadas, em comunidades eclesiais de base, sindicatos, escolas públicas, no Museu
da Imagem e do Som e em mostras sobre algum dos assuntos direta ou indiretamente
tratados.
Pretendemos arquivar cópias do Projeto Experimental no Centro de Memória da
Unicamp, no arquivo Edgar Leuenroth, Biblioteca Municipal e nas Associações de
Moradores que nos ajudaram na pesquisa. Já estamos negociando datas de exibição no
Museu da Imagem e do Som, na Comunidade São Benedito (Jardim São Cristóvão), nas
associações de moradores do Jd. Das Bandeiras, Bairro da Conquista, Vila Brandina, São
63
Marcos, Campos Elíseos, Núcleo Iporã e em alguns sindicatos. Estamos também
elaborando um hotsite sobre o documentário, para disponibiliza-lo pela Internet e criarmos
um canal de debates online.
Nesse mesmo caminho, alguns cineclubes já demonstraram interesse, como o
Cineclube Brad Will, do município de Itu, interior de São Paulo. Estamos buscando apoio
para prensar em tiragem reduzida o DVD do documentário e distribuí-lo para as
associações de moradores, sindicatos e escolas interessadas. Com a finalização do
documentário, um trabalho acabou, mas outros estão por vir.
O objetivo com tudo isso é levar a história da Assembleia do Povo até pessoas que
talvez nunca tenham ouvido nada sobre o movimento e utilizar essa história para mostrar
que com luta é possível vencer o poder instituído e fazer com que o Estado faça valer
determinados direitos. Talvez o objetivo seja mostrar que quem luta nem sempre se dá mal
e que vale a pena lutar.

64
Considerações finais

Assistam ao vídeo que produzimos. Para aqueles 20 minutos de vídeo, gravamos


em torno de 15 horas. Passamos pelo menos mais de uma hora além da gravação com cada
pessoa envolvida, em pré-entrevistas. Mais de 50 horas de edição. Isso sem incluir o tempo
gasto com a pesquisa através de livros, documentos e entrevistas com pessoas que nos
imergiram na história de um movimento que talvez não consigamos apresentar com o
tamanho e importância que ele merece.
O que nos conforta é saber que mostramos pessoas que não tiveram espaço na
televisão e nunca foram apresentadas como as construtoras da história da cidade. E que
jamais se importaram com isso, pois suas lutas não tinham por finalidade fazer com que os
militantes aparecessem na televisão, que, diga-se de passagem, nunca foi do povo. A luta
dessas pessoas foi ignorada pelos meios de comunicação, que são controlados por
interesses econômicos que não desejam mostrar que é possível lutar por um mundo mais
justo e que podemos diminuir o abismo social repartindo a terra e respeitando a dignidade
alheia.
Mas dessa vez, essas pessoas, que conquistaram o direito de serem cidadãos,
contam um pouco da sua história. Agradecemos a todas as pessoas que pudemos conhecer
durante a produção desse vídeo. Exemplos de vida e de cidadania que nos motivam a
jamais desistirmos e a acreditarmos que um mundo novo é possível.
A luta dessas pessoas não acaba e nosso vídeo não termina aqui. Almejamos que
ele seja uma semente, que vá mostrar exemplos de vida e engajamento, e alastre a sede de
justiça e reivindicação pelo respeito aos direitos adquiridos.
Muitos dos protagonistas da história da Assembleia do Povo ainda estão na luta em
suas associações de moradores. Que o documentário possa de alguma forma ajudá-los a
mostrar aos mais jovens que muito já foi feito e que ainda há muito a fazer.
Que as pessoas que não lutaram no movimento possam hoje aderir à luta com a
ciência das conquistas do passado para a construção de um futuro melhor. Esse é nosso
maior desejo.

65
Referências

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<http://www.abjl.org.br/detalhe.php?
conteudo=fl20070507194021&category=ensaios&lang=>. Acesso em: 9 nov. 2009.

RUBLESCKI, Anelise. Jornalismo pós-moderno: uma discussão dos valores míticos na


sociedade hiper-espetacular. BOCC. Biblioteca On-line de Ciências da Comunicação, v.
2009. Disponível em: <http://bocc.ubi.pt/pag/anelise-jornalismo-pos-moderno.pdf>.
Acesso em: 9 nov. 2009.

Revistas científicas

JACOBI, Pedro. Atores sociais e Estado: Movimentos reivindicatórios urbanos e


Estado – dimensões da ação coletiva e efeitos político-institucionais no Brasil. Espaço
& Debates – Revista de Estudos Regionais e Urbanos, São Paulo, n. 26, p. 10-21, 1989.

MARTINS, Marcos F. Uma “catarsis” no conceito de cidadania: do cidadão cliente à


cidadania com valor-ético político. Phrónesis, Campinas, v. 2, n. 2, p. 106-118, jul/dez,
1989.

PERUZZO, Cicília M Krohling. Direito à Comunicação comunitária, participação popular


e cidadania. Artigo publicado na Revista Latinoamericana de Ciencias de la
Comunicación, ano II, n.3, jul//dic. 2005. São Paulo: ALAIC. p.18-41.Disponível em:
http://74.125.47.132/search?
q=cache:XjR_8LU6HpMJ:www.metodista.br/poscom/cientifico/docentes/cicilia-
peruzzo/artigos-de-ciciliaperuzzo+comunica%C3%A7%C3%A3o+com umit
%C3%A1ria+-+cicilia&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br. Acesso 13.11.2009.

Anais de congressos

68
ANDACHT, Fernando Torres. Formas documentárias da representação do real na
fotografia, no filme documentário e no reality show televisivo atuais. In: VI
LUSOCOM Ciências da Comunicação em Congresso na Convilhã, 2004. Disponível em:
<http://www.bocc.ubi.pt/_listas/tematica.php?codtema=75>. Acesso em: 9 nov. 2009.

OLIVEIRA, Ana Paula Silva; CARMO-ROLDÃO, Ivete Cardoso do; BAZI, Rogério
Eduardo Rodrigues. Documentário e vídeo-reportagem: uma contribuição ao ensino de
Telejornalismo. In: 9º Forum Nacional de Professores de Jornalismo, 2006, Campos de
Goytacazes-RJ. Disponível em: <http://www.fnpj.org.br/grupos.php?det=156>. Acesso
em: 9 nov. 2009.

Documentários assistidos

COUTINHO, Eduardo ; RAMOS, Maurício Andrade; SALLES, João Moreira. Edifício


Master. Filme. Produção de Maurício Andrade Ramos e João Moreira Salles, direção de
Eduardo Coutinho. Videofilmes e Riofilme, 2002.

FRANÇA, Pedro Henrique ; MANECHINI, Guilherme. Ecos. Filme. Produção de Pedro


Henrique França e Guilherme Manechini, direção de Pedro Henrique França e Guilherme
Manechini. PUC-SP, 2008.

LUND, Kátia ; SALLES, João Moreira. Notícias de Uma Guerra Particular. Filme.
Produção de Kátia Lund e João Moreira Salles, direção de Kátia Lund e João Moreira
Salles. Videofilmes, 1999.

MORAES, Tetê. Terra para Rose. Filme. Produção de Tetê Moraes, direção de Tetê
Moraes. Vemver Brasil, 1987.

MORAES, Tetê. O Sonho de Rose: 10 Anos Depois. Filme. Produção de Tetê Moraes,
direção de Tetê Moraes. Vemver Brasil e Riofilme, 2001.

PADILHA, José ; PRADO, Marcos. Ônibus 174. Filme. Produção de José Padilha e
Marcos Prado, direção de José Padilha. Riofilme, 2002.

PRADO, Marcos ; PADILHA, José. Estamira. Filme. Produção de Marcos Prado e José
Padilha, direção de Marcos Prado. Zazen Produções Audiovisuais e Riofilme, 2006.

SALLES, João Moreira ; RAMOS, Maurício Andrade. Santiago. Filme. Produção de


Maurício Andrade Ramos, direção de João Moreira Salles. Videofilmes, 2007.

Jornais

Diário do Povo
- 17 de janeiro de 1963 – “Necessária a erradicação das favelas – Prefeitura tem meios para
impedir construções clandestinas”
- 10 de setembro de 1969 – “Estas são as soluções para o desfavelamento”
- 16 de maio de 1978 – “Favela, bonita só no samba”
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- 4 de maio de 1979 – “A periferia cobra Amaral”
- 26 de outubro de 1979 – “As máquinas param e os favelados ganham a questão”
- 7 de outubro de 1980 – “Já é formal, o Prefeito pode ser deposto”

Correio Popular
- 31 de outubro de 1973 – “A promoção do favelado numa análise profunda”
- 1º de outubro de 1980 – “Favelados querem pleno direito sobre a terra”
- 23 de agosto de 1983 – “Decreto proíbe novos barracos nas favelas”
- 4 de agosto de 1985 – “Apenas duas favelas já foram urbanizadas”
- 25 de abril de 1987 – “Prefeitura entrega hoje títulos de posse da terra”

O Repórter da Região
- maio de 1979 – “Barraco vira casa?”

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ANEXOS

Anexo I - Roteiro de Edição

Anexo II - Pautas

Anexo III - Memoriais

Anexo IV - Cartas de cessão de imagem

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