ESPAÇOS | EDIFÍCIOS | EMPRESAS | 58
conceitos
CHRISTIAN NOLD
Arte, informação, cidadania
Por: Mário Caeiro | Designer e docente na ESAD.CR
Encontramo-nos num ponto em que as tecnolo-
gias de informação estão a alterar profundamen-
te as nossas relações económicas, políticas, cul-
turais e interpessoais. Decorrem actualmente
batalhas pelo acesso, a segurança e a autonomia
no seio desses fluxos, nem sempre, embora cada
vez mais, com a participação de um público infor-
mado. Se o desenho das cidades e dos ambientes
urbanos é ainda lento a plasmar esta poderosa
realidade, há porém uma nova geração de indiví-
duos e comunidades que se têm envolvido em
processos de refundação dos próprios quadros em
que o seu activismo surgiu. Com objectivos muito
diversos, nomeadamente cívicos, educacionais,
políticos, ecológicos ou artísticos, têm algo em
comum, a aspiração a... vida própria.
Também os governos e o campo empresarial se
apercebem da responsabilidade e do potencial
que este tipo de debate coloca em jogo. Torna-se
assim premente equacionar as tecnologias apro-
priadas para os mais diversos contextos locais e
inter-locais: novas ferramentas, metodologias e
provocações capazes de criar, desenvolver e de-
safiar estas emergentes comunidades mais dinâ-
micas. Se pensarmos que os cidadãos se organi-
zam em plataformas de acordo com motivações
tão distintas como a implantação de linhas de al-
ta tensão ou processos urbanísticos de realoja-
mento, o trabalho de certos activistas culturais é
não apenas reflexo de novas maneiras de enten-
der a tecnologia, mas sobretudo uma posição de
abertura a possibilidades outras de entender a ar-
I want to see you lead
a normal life.
PETER GABRIEL
te como ferramenta de civilização proactiva. No
real quotidiano.
TECNOLOGIA [E ARTE] PELA CIDADE
Christian Nold, de origem alemã mas vivendo em
Londres, é um criador – artista multimédia, inves-
tigador universitário – que se tem dedicado a pro-
mover ferramentas e metodologias inovadoras no
campo dos mapas participativos. Tem demonstra-
do o potencial dessas ferramentas organizando
workshops que até ao momento registaram a par-
ticipação de mais de 1.500 pessoas numa quinze-
na de países. É fácil – e plausível – confundir o
seu trabalho com o de um mero agitador pelos di-
reitos básicos de uma cidadania contemporânea;
como seria fácil integrá-lo numa genealogia de
artistas multimédia a quem a era da Internet dá fi-
nalmente condições efectivas para a construção
 ESPAÇOS | EDIFÍCIOS | EMPRESAS | 59

quotidiana de uma utopia comunicacional e infor-
macional. Mas Nold vê-se simplesmente como in-
vestigador e cidadão responsável, dotado de com-
petências científicas e técnicas que lhe permitem
ser o parceiro tecnológico de uma grande diversi-
dade de comunidades: grupos de pressão, insti-
tuições de ciência ou media, jovens, empresas
[nomeadamente na área da construção civil e do
urbanismo] ou ainda municípios.
Os projectos de Christian Nold não são arte em
sentido convencional [pintura, escultura, instala-
ção…]; são essencialmente processos em curso,
em constante avaliação e adaptação, envolvendo
habitualmente uma determinada articulação de
mitir às pessoas articularem por si próprias as
mais diversas preocupações. Até certo ponto, é
um aprofundar criativo, participado e envolvente
da sociologia enquanto investigação-acção, na
medida em que promove modelos de uma repre-
sentação verdadeiramente comunitária. E é uma
metodologia que se constitui igualmente como
quadro analítico em que outros investigadores po-
dem colaborar ou de que quaisquer comunidades
podem tirar partido, à medida do seu dinamismo e
proactividade.
A nível global, são evidentes vários sinais exterio-
res de consciência e crítica, independentes uns
dos outros, porém comungando de uma mesma
táveis e identificáveis do “artista”, do “pensa-
dor”, do “cientista” ou do “técnico” são agora re-
vistos e reinterpretados à luz de uma posição de
intervenção cívica caracterizada por uma trans-
disciplinaridade militante, como se a única ma-
neira de intervir na organização cada vez mais
obscura das sociedades fosse a de problematizar
as suas próprias matrizes tecnológicas, socio-po-
líticas e culturais, as quais surgem, aos olhos das
consciências menos autónomas, como modelos
abstractos, inatingíveis, mutantes e brutais, dos
quais emanam, ininterruptamente, os malefícios
do consumo e da impotência.
Reflectir profunda e demoradamente acerca das

Matrix vs. Consciência

QUARK: The Matrix is a

euphemism for the government.

SUPERASTIC: No, The Matrix is

the system controlling our lives.

TIMAXE: You mean MTV.

SUPERASTIC: I mean Sega.

FOS4: ALL HAIL SEGA!!!

DIÁLOGO RETIRADO DO FILME MATRIX, 1999

Pode um workshop de privação sensorial transformar-se numa inovadora ferramenta de desenho urbano?

tecnologias computacionais locativas1 e físicas,
as quais reúnem dados e criam visualizações, ela-
boradas colaborativamente por vários participan-
tes. Os projectos adquirem a forma de consultas,
investigação etnográfica, transferência de conhe-
cimento e, apenas lateralmente, exposições de
arte. Mas talvez a modalidade que atinge maior
impacto convivial seja a dos já referidos work-
shops, em que Nold reúne em atmosferas infor-
mais um grupo de pessoas, levando-as a ser
agentes activos dos eventos.
O resultado acumulado do trabalho de Nold tem
sido o desenvolvimento continuado de uma meto-
dologia etnográfica consensual que procura supe-
rar a distância entre as dimensões quantitativa e
qualitativa da reunião de dados, por forma a per-
radicalidade na análise de um mundo mediatizado
e subjugado pelos valores da comunicação, onde
as matrizes de organização social pressupõem va-
lores escamoteados pela generalidade dos indiví-
duos que alimentam a máquina do que José Luis
Brea define como capitalismo cultural2.
Ora, um dos factos socio-culturais fundamentais a
reter quando se reflecte sobre a contemporanei-
dade artística e tecnológica relaciona-se com a
existência de inúmeros focos de conhecimento e
experimentação, em que o próprio tema da com-
plexidade do social motiva estudos e interven-
ções – em certa medida, essencialmente culturais
– pela parte de protagonistas das mais variadas
origens geográficas e territórios disciplinares.
Frequentemente, os antigos papéis bastante es-
transformações sociais que nos envolvem quoti-
dianamente, de forma a explicitar desígnios de
ética e cidadania, é pensar em que medida somos
permeáveis ao peso de uma matrix [pensemos na
analogia com o filme homónimo] que determina a
nossa Vida. E se há certamente matrizes que nos
condicionam o comportamento, a percepção, a
própria construção da consciência, e se é eviden-
te que reconhecemos os seus traços na publicida-
de, na Lei e na Ordem, no discurso dos políticos,
na filosofia dos jogos de computador ou nos pa-
drões habitacionais, então que podemos fazer pa-
ra assumir um papel diferente do de meros espec-
tadores imersos no Espectáculo? Que acção
podemos empreender que nos afaste do adorme-
cimento ou da anestesia?
 ESPAÇOS | EDIFÍCIOS | EMPRESAS | 60
O conceito Biomapping assenta num inovador dispositivo tecnológico, em que os participantes são levados a reequacionar por completo a percepção que têm da cidade.
Da esquerda para direita: participantes em acção; logotipo do projecto; o equipamento; registo do percurso de Reg através de Nothingham
MAPEAR É PRECISO!
A tecnologia não é o instrumento neutro e racional
que usualmente se considera; pelo contrário, im-
plica, sob a forma do dispositivo, uma mistura ins-
tável de controlo autoritário e deriva anárquica. A
abordagem de Nold é a de quem se insere no in-
tervalo entre estes dois pólos e usa esse espaço
como meio de combinar a liberdade oferecida pe-
lo mundo da arte com o envolvimento que se con-
segue obter pela via do design e da tecnologia. O
seu objectivo é construir novas ferramentas que
possam desenvolver possibilidades ou propor
usos alternativos de recursos existentes. Normal-
mente, cada seu novo trabalho parte por isso de
uma cuidada investigação das ferramentas tecno-
lógicas disponíveis, para desvelar as suas cama-
das sociais e políticas. Segue-se a constituição de
práticas sociais participativas, com carácter bot-
tom up e que são no fundo formas híbridas de tec-
nologia, económica e socialmente sustentáveis.
Bio Mapping é talvez o projecto mais emblemático
da filosofia artística de Christian Nold. É um pro-
jecto de investigação que explora novas formas de
nós, enquanto indivíduos, podermos utilizar a infor-
mação que reunimos através dos nossos corpos.
Em contraste com as tecnologias de segurança,
desenhadas para controlar o nosso comportamen-
to, este projecto divisa novas ferramentas que per-
mitem às pessoas seleccionar e partilhar selectiva-
mente os seus próprios bio-dados.
O sistema Bio Mapping permite ao utilizador re-
gistar a sua Galvanic Skin Response (GSR), um in-
dicador simplificado da excitação emocional em
conjugação com a localização geográfica. Um
workshop Bio Mapping reúne duas dezenas de
participantes, convidados a dar um passeio nas
proximidades, com a duração de cerca de uma ho-
ra. Antes de partirem, é entregue a cada partici-
pante um equipamento Bio Mapping, e, pontual-
mente, uma câmara digital. As pessoas são
encorajadas a dar um passeio por onde lhes
aprouver, mas também levadas a pensar acerca
das escolhas que fazem durante o percurso, du-
rante o qual carregaram num determinado botão
sempre que se sentiram estimuladas pelo meio
ambiente. No regresso, procede-se ao download
dos dados recolhidos pelo equipamento, gerando-
se, com auxílio de software especial, o mapa
emocional de cada pessoa. Esse mapa regista os
locais e as situações em que as emoções – tanto
positivas como negativas, de desconforto como
 ESPAÇOS | EDIFÍCIOS | EMPRESAS | 62
de prazer – foram objecto de uma determinada
consciencialização. Após cada participante termi-
nar o debate em torno do seu passeio, todas as
faixas são combinadas para criar um mapa emo-
cional comum, relativo a toda a área em questão.
Este é usualmente o quadro de fundo para uma
sessão de debate de encerramento, em que é
levantada a questão mais ampla acerca do que
representa esse mapa comunal e de que forma
poderá vir mais tarde a ser utilizado pelos partici-
pantes.
Nos diferentes mapas dos diferentes eventos que
organiza, os passeios são representados de diver-
sas formas [por exemplo, linhas angulares evi-
denciando os “picos” emocionais, ou então man-
chas de cores com temperaturas diferentes,
sempre para evidenciar a localização geográfica
dos factos emotivos…]. Esta busca constante do
artista, à procura das melhores formas de visuali-
zação, faz evidentemente parte do processo…
No fundo, trata-se do desenvolvimento contínuo
de modelos conceptuais e interfaces técnicos
aplicados à comunicação que têm o maior inte-
resse não apenas para os participantes enquanto
indivíduos, mas também para disciplinas do saber
no campo das diversas ciências. Enquanto mapas
que descrevem uma enorme variedade de even-
tos e estímulos sensoriais em contexto urbano,
são obviamente apetecíveis instrumentos tam-
bém para quem procura na cidade o público-alvo
para as suas mensagens ou clientes para os seus
produtos3...
ARTE COMO COMUNICAÇÃO/INFORMAÇÃO
A original abordagem de Christian Nold dos cam-
pos da Arte, da Tecnologia e da Política, na con-
fluência de domínios de investigação como a In-
formática e as novas tecnologias em geral, o
Desenho Urbano e a Cultura, convida-nos a actua-
lizar ideias feitas sobre as capacidades dos indiví-
Mapa Emocional de Stockport, baseado no processo
de recolha de conversações de mais de 200 pessoas
e na análise dos seus desenhos
Mapa emocional agregado que resultou do workshop
Biomapping em Nottingham
duos e das organizações em gerarem a sua pró-
pria autonomia no Mundo em rede.
O princípio de desdiferenciação cultural e diluição
institucional que a mais estimulante arte no Espa-
ço Público promove já não corresponde necessa-
riamente a oportunidades estáticas de activar um
lugar, colocando arte num determinado espaço,
mas é acima de tudo o resultado da consideração
do sítio e do mundo4. É neste enquadramento que
os projectos de arte-investigação de Christian
Nold são exemplares de uma suspensão da cate-
goria “arte” em prol de uma acção directa e ime-
diata baseada na intersubjectividade. O resultado
‘final’ dos seus workshops é um mapear alternati-
vo da cidade, na era das tecnologias de informa-
ção e de um espaço público em acelerada muta-
ção. Repare-se, neste aspecto, a forma como a
evolução do próprio design gráfico dos projectos
reflecte a busca de um aperfeiçoamento da sua
componente emotiva, cerne dos interesses do ar-
tista britânico.
De resto Nold é de alguma forma um exemplo
claro das prácticas que o autor Nicolas
Bourriaud arruma sob a designação de “Estética
Relacional”, corrente artística ou modalidade
criativa em que as antigas utopias sociais e am-
biciosos programas políticos dão lugar a micro-
utopias quotidianas e estratégias miméticas. E
de facto, o ponto de partida de Nold é o conjun-
to das relações humanas no seu contexto social,
visando colocar em contacto diferentes níveis
de realidade, estabelecendo novos modos de
existência num real pré-existente mas que urge
reinventar. Nesta dimensão específica de uma
articulação emancipatória entre arte, informa-
ção e design de comunicação, três projectos são
exemplares...
O SENSORY DEPRAVATION MAP
DE NEWHAM
Normalmente percepcionamos o nosso meio
envolvente recorrendo aos cinco sentidos – visão,
som, olfacto, tacto e gosto. Que acontece
quando passeamos pelo nosso ambiente sem
visão nem som? O Sensory Deprivation Map de
Newham é o resultado de um workshop intensivo
em que participaram 36 estudantes do Segundo
Ciclo, organizados aos pares. A um dos estudan-
tes de cada par foi colocada uma venda nos olhos
e auscultadores nos ouvidos, de maneira a que
não pudesse ver ou ouvir absolutamente nada.
Ao outro foi entregue um sistema GPS [Global Po-
sitioning System], papel e caneta. Juntos, explo-
raram a área em volta da escola durante uma ho-
ra. Enquanto o estudante vendado e privado de
audição contava verbalmente a sua experiência
sensorial, o outro tomava notas e assegurava que
a viagem decorresse em segurança. No regresso,
os dados geográficos reunidos durante o passeio
foram descarregados do GPS e todas as observa-
ções sensoriais realizadas durante o passeio re-
gistadas num mapa. Um mapa global, combinan-
do as anotações de todos os participantes,
constituiu um inesperado mapa sensorial e alter-
nativo da localidade...
MAPA EMOCIONAL DE SÃO FRANCISCO
O Mapa de São Francisco foi o culminar de uma
residência de cinco semanas e de um projecto ar-
tístico participativo que envolveu 98 colaborado-
res, levados a explorar o Bairro de Mission por
meio do dispositivo Bio Mapping. Durante a resi-
dência na Southern Exposure5, Nold encorajou os
visitantes da galeria a entrarem no projecto, sen-
do para tal necessário utilizar os aparelhos quer
durante a semana, quer durante o fim-de-semana
[altura em que se realizavam os momentos de
workshop mais intensos]. O projecto convidava o
público a dar um passeio, com o dispositivo a re-
gistar a sua reacção ao meio envolvente e, num
segundo momento, a partilhar os seus comentá-
rios. O resultado final: um projecto de arte públi-
ca – foi esse o contexto institucional em que o
projecto se inseriu – que procedeu a um retrato
colectivo de todo o bairro e em particular do seu
espaço público. Evidentemente, estratégias deste
tipo ecoam a dérive dos Situacionistas, uma
práctica de passeio aleatório pelo espaço urbano,
ou a psicogeografia, o estudo dos efeitos do am-
biente geográfico nas emoções e no comporta-
mento dos indivíduos. Mas são acima de tudo
formas de reunir e tratar informação urbana em
que os “visados” são parte do processo.
 ESPAÇOS | EDIFÍCIOS | EMPRESAS | 64

Graças a Christian Nold, é possível visitar
uma outra Londres, a descobrir a partir dos dados
biométricos e das opiniões de 50 residentes
da zona de Greenwich…
DESENHANDO PROVOCAÇÕES
EM STOCKPORT
Enquanto os mapas convencionais mostram uma
arquitectura estética e excluem os humanos,
este projecto artístico apresenta uma visão de
Stockport que representa as emoções, opiniões e
desejos dos habitantes locais. No Verão de 2007,
durante um período de dois meses, cerca de 200
pessoas participaram em vários eventos parcela-
res, de que se destaca aqui a acção “Drawing
Provocations”.
Nesse evento, foi pedido às pessoas que fizessem
um esboço das suas respostas a uma variedade de
provocações – entre sérias e cómicas – relaciona-
das com a sua vida quotidiana diária: por exemplo,
“O que o/a incomoda mais em Stockport?”, “Onde
encontra os seus amigos?”, “Quais são as pes-
soas mais importantes na cidade?”, “Quais as
pessoas mais perigosas?”… Outras provocações
focaram a cidade e a sua história, o rio e os mar-
cos urbanos. As pessoas reagiram entusiastica-
mente e criaram uma enorme pilha de desenhos
que foram depois digitalizados e usados para criar
o mapa. No documento de síntese, tanto quanto
possível, todos os desenhos foram colocados na
sua posição geográfica correcta ou onde as pesso-
as os mencionavam. O resultado, na sua versão
em papel, é um delicioso programa alternativo pa-
ra um passeio por Stockport.
Todos os dias, entramos em discussões com pes-
soas pelas mais diversas razões. Por vezes, temos
um objectivo específico quando comunicamos,
mas frequentemente apenas queremos falar aos
amigos e aos desconhecidos, ouvir as suas ideias
e exprimirmo-nos. A grande maioria destas con-
versações desaparece rapidamente da nossa
mente e nunca são registadas porque achamos
que são triviais. No entanto, vivemos numa época
em que as nossas opiniões são extremamente va-
lorizadas. Todos, dos políticos aos prospectores
de mercado, passando pelos publicitários, estão
fascinados com a forma como reagimos emocio-
nalmente perante assuntos concretos. Curiosa-
mente, quando entramos em discussões nesses
contextos, tendemos a usar uma linguagem alie-
nada e estranhamente emproada, que como que
nos “empacota” as ideias. Por outro lado, estas
discussões tendem a focar-se num único assunto,
em vez de colocar questões mais vastas.
O Mapa Emocional de Stockport sugere um modelo
de registo de conversações aparentemente triviais
e eventos quotidianos, permitindo-nos vê-los em si-
multâneo, sem nos sentirmos restringidos a um tó-
pico definido. Quando é possível contactar com a
imagem global, estas conversações aparentemente
desconexas mostram o seu verdadeiro valor e for-
mam um aglomerado de assuntos e preocupações.
Particularmente interessante foi o facto de, apesar
de os participantes referirem um conjunto de pro-
blemas, a palavra “simpático” surgir com muita
frequência para descrever a zona; eis um mote pos-
sível – e devidamente fundamentado – para esti-
mular futuros projectos e visões para a área...
Christian Nold é portanto um artista de novo tipo,
mas também um investigador de novo tipo. Se ho-
je como nunca a arte procura legitimar a sua in-
terventividade a partir de uma inserção no social,
Nold leva esse desígnio ao extremo e torna a pró-
pria vida social uma forma de arte, pelo menos
enquanto sinalização da verdadeira vida que
acontece entre os edifícios. ■

Christian Nold
Christian Nold é artista, designer, formador e investigador. Interes-
sa-se particularmente pela importância que os mapas participati-
vos podem ter enquanto ferramentas de mobilidade urbana.
O seu primeiro livro, Mobile Vulgus [2001] é dedicado à história
das movimentações de massas com carácter político, dando o
mote para uma investigação continuada que recentemente está
expressa na sua contribuição para a compilação Making things
Public6, o artigo «Legible Mob».
Mestre em Interaction Design pelo Royal College of Art em 2004,
e actualmente docente na Bartlett University College London,
Nold tem coordenado inúmeros projectos realizados por equipas
interdisciplinares, não apenas ao nível académico mas propria-
mente social.
Em Portugal, registe-se a realização de um workshop Biomap-
ping nas Caldas da Rainha, em 2005, com a colaboração da
ESAD.CR, na sequência do qual apresentaria, na Galeria Zé dos
Bois, a conferência “How did we loose sight of each other?” [Co-
mo é que nos perdemos uns dos outros?], uma palestra que apre- Christian Nold, artista e investigador
sentou uma série de modelos mentais e ferramentas práticas que de tecnologias de informação
lidam com o problema da representação política no nosso mundo
saturado pelos media. Traçando uma ligação entre os protestos de rua no Séc. XIX até ao activismo tec-
nológico do Séc. XXI, Christian Nold sugeriu nessa conferência o tema implícito no seu plano de traba-
lho: um futuro radical de ferramentas bio-políticas que reestruturam a nossa relação com o meio-ambien-
te e uns com os outros.
www.softhook.com • www.biomapping.net
NOTAS
1 No sentido de locative media: meios de comunicação digitais,
relacionados com verdadeiros locais, capazes de despoletar
interacções sociais reais, tais como as decorrentes de tecnolo-
gias móveis como o GPS ou computadores e telefones portáteis.
2 Cf. El Tercer Umbral – Estatuto de las prácticas artísticas en la
era del capitalismo cultural. Numa obra incontornável enquanto
diagnóstico das prácticas culturais contemporâneas, o autor re-
fere, como estádios anteriores do capitalismo, o capitalismo in-
dustrial e o capitalismo de consumo. Brea define, nesse quadro,
o estatuto da arte contemporânea mais crítica: basándola no
tanto en la localización de cortes estilísticos o formales cuanto
en su relación a las transformaciones de le esfera del trabajo y
la producción, y como ellas determinam alguns demarcaciones
significativas en la del campo de las prácticas culturales, por un
lado, y en su relación con los modos y figuras del imaginario so-
cial, con las expectativas emancipatorias de la ciudadania y la
construcción colectiva de las formas del ‘espíritu objectivo’, por
otro.
3 A empresa de publicidade Saatchi & Saatchi revela há muito
interesse pelo projecto, não tendo porém o artista cedido, até
hoje, à venda do mesmo.
4 Cf. Catherine Millet, L’art Contemporain – Histoire et Géogra-
phie, Flammarion, Paris, 2006.
5 A Southern Exposure é uma organização sem fins lucrativos di-
rigida por artistas, funcionando como centro de exposições, de-
bates e documentação.
6 Making Things Public: Atmospheres of Democracy, Bruno
Latour e Peter Weibel [Eds.], MIT Press, 2005.