Os anos 80 e 90 pareciam ter decretado o fim das utopias, examinou-se muito o conceito,
criaram-se outros, como heterotopia e distopia.
Mas, em 2001, Nicolas Bourriaud aponta para as "utopias de aproximação", práticas
artísticas que se estendem num vasto território de experimentações sociais, e que
pretendem agir, gerando novas percepções e novas relações de afeto, num mundo
regulado pela divisão do trabalho, a ultra-especialização e o isolamento individual.
Para o filósofo francês, a arte contemporânea desenvolve um projeto político entanto se
esforça em investigar e problematizar a esfera relacional. Para ele, a exposição é um
lugar privilegiado onde se instalam coletividades instantâneas, regidas por princípios
diversos de acordo com o grau de participação do espectador exigido pelo artista, a
natureza das obras, os modelos de sociabilidade propostos ou representados, que gera
um território de intercâmbios específico.
A arte contemporânea se propõe modelar mais que representar, pretende inserir-se e agir
dentro do tecido social mas do que se inspirar nele. De esse ponto de vista, a obra de arte
se constitui como um interstício social, um espaço de relações humanas que, ao se
integrar mais ou menos harmoniosa e abertamente no sistema global, sugere outras
possibilidades de intercâmbios que aqueles que vigentes nesse sistema.
De acordo com Bourriaud, a tarefa da arte contemporânea no campo do intercambio das
representações é criar espaços livres, propor temporalidades cujo ritmo atravesse àqueles
que organizam a vida cotidiana, é favorecer relacionamentos intrapessoais diferentes
daqueles que nos impõe a sociedade da comunicação.
Não o fim da arte, não o fim do jogo, mas o fim da rodada. È necessário lembrar com
Duchamp que A arte é um jogo entre todos os homens de todas as épocas.
As reflexões da artista se abrem para uma série de questões sobre arte e sistema de arte,
e seria muito simples apontar, apenas, a potencia da sociedade global para se apropriar e
espetacularizar até a mais ferozes críticas.
Acredito, porém, que o importante, neste caso é a experiência múltipla e compartilhada
das ações e as sinalizações dos artistas que ao serem desmembradas do continente e da
cidade em que operam, provocam nos centros do sistema a emergência, nem que seja
momentânea, do subalterno, do marginal.
Essa aparição súbita poderia servir para constatar o quanto de suburbano ainda persiste
nos interstícios das metrópoles, no interior dos centros, para lembrar, com uma consigna
de maio de 68, que sob os paralelepípedos- ainda - permanece a praia.
O rótulo "coletivo" não tem definição mais específica do que um grupo de colaboradores
que se unem para realizar algo em conjunto. E é justamente essa dificuldade de
classificá-los que os torna uma opção tão viável para quem quiser se expressar
artisticamente: junte os amigos e descubra algo que todos estejam a fim de fazer. Se der
certo, dá até mesmo para pagar as contas com um coletivo --o que, quando acontece, é
uma consequência, e não uma motivação.
"O principal é o fato de você estar trabalhando com mais pessoas", conta Rica Amabis, do
coletivo Instituto, que reúne diferentes pontas da nova safra da música brasileira graças à
flexibilidade do formato.
"É a arte como pretexto para encontrar pessoas", sintetiza o paulistano Fábio Tremonte,
mediador, catalisador e o único a conhecer todos os integrantes do grupo Los
Valderramas.
Sem líderes e de hierarquia horizontal, coletivos não são, nem de longe, uma novidade.
"O coletivo sempre esteve em voga", continua Daniel Seda, do grupo de vídeo e cinema
Neo Tao, "a diferença hoje é que os artistas estão pondo mais ênfase na ação e na
colaboração criativa do que no ego". "É uma tradição na história da contracultura e arte
alternativa", lembra Daniel Gonzalez, da T.E.M.P.. Na genealogia estão escolas
modernistas, ativistas dos anos 60, "artivistas" dos 80 e a cultura eletrônica. A nova safra
de coletivos nasce justamente sob o signo da internet: "O nosso coletivo é baseado na
premissa do fim da geografia trazida pela rede", explica Mabuse.
"A mudança de cima para baixo, do centro para a periferia, já não é mais possível, como
alertavam os anarquistas clássicos no século 19", explicam os integrantes da
Universidade Invisível. "A idéia de coletivo surge de uma questão de sobrevivência",
responde o grupo A Revolução Não Será Televisionada. "Há uma sensação de que algo
precisa ser feito", sintetiza Seda.
Diferentes ângulos de uma mesma transformação: para o grupo Formigueiro, "o coletivo é
parte da sociedade da informação, em que todos se comunicam o tempo todo"; enquanto
o coletivo de e-music Soononmoon, de Salvador, fala da presença "de um sentimento
chamado de "pronóia", que é quando as coisas tendem a dar certo"; e o Expressão
Sarcástica sintetiza tudo ao dizer que "o coletivo tem uma dinâmica muito maior que o
indivíduo".
... muitos artistas, ..., procuram ambientes que demandam uma interpretação, um esforço
aplicativo, uma vontade de estabelecer
relações.
Tópicos em desenvolvimento:
2. Lugar é espaço ocupado. O lugar cria sentido à idéia de espaço. Definições como
dentro e fora são apenas convenções que tanto podem facilitar uma compreensão prática
de localização, quanto servir de ideologia, para justificar segregações.
A. Monumentos precários – Retomada da idéia do grafite dos anos 80, que ficou parado
na técnica do spray. Precariedade formal e material. Não há mais necessidade de obra de
arte como algo durável;
E. Ação política – Uma arte fundamentada em atitudes. Formas novas exigem novos
modos de operação com a realidade. Não há como evitar o confronto;
F. Vínculos -– Cultura como manifestação artística também fora dos circuitos de galerias e
museus; cultura como capacitadora de inclusões e incorporações de contrastes; cultura
como processo de contaminação;
I. Diluição da noção de autoria. A idéia de autoria é recente e seu caráter não condiz com
novos modos de produção como os operados hoje, seja na música, com o hip hop, ou na
internet, onde cada um adiciona o que quiser à informação, ou mesmo nas questões
sociais comunitárias, diante das exigências de mercados globais, como associações,
cooperativas, etc.. A idéia de participação e a
possibilidade de interferência no processo da criação artística, faz com que a interação se
torne a chave do trabalho.
Uma nova força humana, que a estrutura existente não poderá dominar, cresce dia a dia
com o irresistível desenvolvimento técnico e a insatisfação de seus usos possíveis em
nossa vida social carente de sentido.
A alienação e a opressão nesta sociedade não podem ser mantidas sob qualquer uma de
suas variantes, mas somente rejeitadas em bloco com esta mesma sociedade. Todo
progresso real fica evidentemente em suspenso até a solução revolucionária da crise
multiforme do presente.
Que é isso, de fato, mais que a situação? Se trata da realização de um jogo superior, que
mais exatamente é provocada pela presença humana. Os jogadores revolucionários de
todos os países podem reunir-se na Internacional Situacionista para começar a sair da
pré-história da vida quotidiana.
A partir de agora, propomos uma organização autônoma dos produtores da nova cultura,
independentes das organizações políticas e sindicais que existem neste momento, pois
questionamos a capacidade delas de organizar outra coisa que a manutenção do que
existe.
O objetivo mais urgente que estabelecemos a tal organização, no momento em que deixa
o estágio inicial experimental para uma primeira campanha pública, é a tomada da
UNESCO. A burocratização, unificada em escala mundial, da arte e de toda a cultura é um
fenômeno novo que expressa o profundo parentesco dos sistemas sociais coexistentes no
mundo, sobre a base da conservação eclética e a reprodução do passado. A resposta dos
artistas revolucionários a estas novas condições deve ser um novo tipo de ação. Como a
existência mesma desta concentração administrativa da cultura, localizada em uma
construção única, favorece o roubo por meio do golpe e como a instituição é
completamente destituída de qualquer senso de uso fora de nossa perspectiva
subversiva, nos achamos justificados diante de nossos contemporâneos para tomarmos
tal aparato. E o faremos .
Estamos decididos a nos apossarmos da UNESCO, mesmo que por pouco, já que
estamos seguros de fazer disso rapidamente uma obra que permanecerá, para esclarecer
uma longa série de perguntas, como a mais significativa.
Quais deverão ser os principais caracteres da nova cultura e como ela se compararia com
a arte antiga?
Contra a arte parcelar, será uma prática global que se dirija ao mesmo tempo sobre todos
os elementos utilizados. Tende naturalmente a uma produção coletiva e, sem dúvida,
anônima (pelo menos na medida em que, ao não estar as obras armazenadas como
mercadorias, tal cultura não estará dominada pela necessidade de deixar traços). Suas
experiências se propõem, como mínimo, uma revolução do comportamento e um
urbanismo unitário, dinâmico, suscetível de estender-se ao planeta inteiro; e de ser
prolongado seguidamente a todos os planetas habitáveis.
Contra a arte unilateral, a cultura situacionista será uma arte do diálogo, uma arte da
interação. Os artistas – com toda a cultura visível – chegaram a estar completamente
separados da sociedade, do mesmo modo que estão separados entre si pela
concorrência. Mas antes inclusive deste corredor sem saída do capitalismo, a arte era
essencialmente unilateral, sem resposta. Superará esta era fechada do primitivismo por
uma comunicação completa.
Aos que não nos compreenderam bem dizemos com um irredutível desprezo: os
situacionistas, de quem vocês acreditam serem os juízes, vos julgarão um dia ou outro.
Esperamos vocês no momento crucial que é a inevitável liquidação do mundo da
escassez, sob todas as suas formas. Estes são nossos fins e serão os fins futuros da
humanidade.