08 sábado, 12 de fevereiro de 2011
capa
corumbataí
Apicultor comenta sobre produção de mel
Em entrevista exclusiva proprietário rural revela os segredos e cuidados no cultivo do mel e conta como se transformou no maior produtor do município
O corumbataiense Devanir
Antonio Buscariol é des-
ses apaixonados pelos peque-
nos insetos sociais. Não é dou-
tor em biologia nem nunca fez
curso algum para entender o
comportamento das abelhas,
mas a prática de 27 anos de
trabalho lhe deu bagagem
suficiente para compreender
como vivem e como devem
ser respeitados esses peque-
nos seres.
Tudo começou em 1983
quando o pai, João Busca-
riol, comprou duas colmeias
para que ele iniciasse uma
produção doméstica. À época
Devanir estava em São Paulo
trabalhando como metalúrgi-
co na GM, assim como cente-
nas de rapazes do interior. Ele
havia migrado em 1969 para
a capital, levado por outro
colega.
Em 1985 foi dispensado e
retornou às origens de cam-
ponês. Aquilo que era um
hobby passou a ser fonte de
renda. Investiu em caixaria e
equipamentos e ampliou o
número de colmeias. As duas
que o falecido pai lhe confiou
se multiplicaram e, hoje, so-
mam 180.
Devanir tem criações no
sítio de sua propriedade –
localizado no pé da serra do
Monte Alegre, em Corumbataí
–, em sítios de conhecidos no
próprio município, em Brotas
e em Analândia, mas houve
tempo em que possuía col-
meias até na região de Bebe-
douro por conta dos pomares
de laranja.
região
Analista do Sebrae fala sobre apicultura
O misterioso desapareci-
mento de abelhas observado
em vários países, inclusive no
Brasil, tem deixado especialis-
tas, produtores, distribuidores
e consumidores em alerta. Se-
gundo estudo do Laboratório
de Pesquisa sobre Abelhas do
Departamento de Agricultura
dos Estados Unidos, divulgado
no jornal britânico “Indepen-
dent“, o problema pode estar
associado ao uso de novos pes-
ticidas. Os venenos estão ma-
tando esses insetos. A extinção
das abelhas traz grande prejuí-
zo à apicultura e contribui para
a fome no planeta, pois 80% da
produção de alimentos depen-
de da polinização por abelhas
e outros insetos. Mesmo em
dose muito baixa, os insetici-
das, especialmente os neonico-
tinoides (como o imidacloprida)
que imitam as propriedades da
nicotina, matam as abelhas”,
afirmam pesquisadores dos la-
boratórios.
De acordo com Luciane Gi-
rasolo, Analista de Projetos do
Sebrae SP, nos  últimos meses
identificaram-se focos em San-
ta Catarina. “Os estudos sobre
este fenômeno estão apenas
começando e os motivos ain-
da são desconhecidos, mas
entre eles podem estar fatores
ligados a preservação  ambien-
tal,  predominância de  mono-
culturas nas quais são utilizados
intensamente agroquímicos
(herbicidas, inseticidas, fungici-
das; água de origem contami-
nada; e alimentos transgênicos
que pela modificação genética,
podem  acarretar em alterações
comportamentais deste inseto
social.
 ABELHAS
A especialista em gestão e
desenvolvimento de projetos
que visam boas práticas agrí-
colas, gestão das propriedades
e acesso a mercados, Luciane,
explica que o Brasil apresenta
ainda características especiais
de flora e clima que, aliados à
presença da abelha africani-
zada, mais resistente, lhe con-
ferem um potencial fabuloso
para a atividade  apícola, quan-
do comparado aos seus países
Jornal Regional
Ele extrai vários tipos de
mel: de eucalipto, de laranja e
silvestre, sendo que ainda há
variação de tonalidade devido
à época de abertura de cada
florada. A abelha é do tipo
“Europa africanizada”. Busca-
riol explica que o termo “afri-
canizada” é pelo motivo de
na década de 60 a Unesp de
Rio Claro ter trazido abelhas
africanas para o país. Segun-
do ele, por falta de cuidado a
espécie se expandiu e tomou
conta de todo o Brasil.
BOM NEGÓCIO
Desde que começou no
ramo Devanir só expandiu
os negócios. Em seu sítio,
aos 65 anos de idade, é ele
mesmo quem faz todo o tra-
balho, desde o preparo das
madeiras para a caixaria até
o processamento final do
mel para a comercialização,
que se dá em baldes de 25
quilos cada. O único mo-
mento em que ele contrata
serviço de terceiros é na
hora da coleta e transporte
do mel.
A cera extraída das
colmeias é derretida e en-
viada para uma empresa
de Amparo, que lhe devol-
ve em formato de lâminas
para nova aplicação. No
ano passado Buscariol ba-
teu recorde de produção,
com mais de 10 toneladas
de mel puro vendido. Seu
produto é enviado para São
Paulo, segue para Botucatu
e depois é exportado para
Estados Unidos e União
Luciane Girasolo, Analista de
Projetos do Sebrae SP
concorrentes. Isso proporcio-
na um elevado potencial para
produção e exportação do mel
orgânico, procurado por impor-
tadores europeus, japoneses e
americanos. “Os estudos sobre
os problemas encontrados nas
colméias estão apenas come-
çando e não existe um diagnós-
tico preciso das causas, e sim
hipóteses, embasadas no nível
crescente de contaminação das
flores, pelo uso intensivo de
agrotóxicos; das águas, pelos
resíduos despejados nos cor-
pos d`água e da atmosfera, com
emissões de gases e partículas
muitas vezes acima do tolerado
por estes sensíveis insetos”, diz
a especialista.  A analista acre-
dita que a alternativa é apostar
na regularização dos apiários
através do Serviço de Inspeção
Federal (SIF), monitoramente
e mapeamento dos apiários,
programas de qualidade e
rastreabilidade dos produtos
apícolas por meio das certifica-
ções internacionais e análises
laboratoriais do mel por órgãos
fiscalizados, visando identificar
compostos indesejáveis no pro-
duto nacional.
Devanir Antonio Buscariol trabalha na extração da cera e do mel
Mel puro de abelhas passa por diversas etapas para retirada de
resíduos
Europeia. Hoje, cada balde
é vendido a R$ 100, mas,
conforme conta, chegou a
R$ 160 quando o dólar es-
tava mais elevado. No vare-
REGIÃO
Com a intenção de desen-
volver a apicultura na região
Centro-Paulista como uma ati-
vidade econômica viável e auto-
sustentável o Sebrae desenvolve
um trabalho nos municípios de
Rio Claro, Araras, Descalvado e
Pirassununga, com associações
de produtores de mel denomi-
nado - O Projeto Regional de
Apicultura. “Em Rio Claro tra-
balhamos com a Associação de
Apicultores de Rio Claro, com
21 apicultores. O Projeto reúne
60 apicultores dos quatro muni-
cípios e arredores e trabalha as
boas práticas agrícolas, novas
técnicas de manejo, novas tec-
nologias, gestão e acesso à mer-
cados”, destaca Luciane.
Ela comenta que, Isley Gia-
netti Napolitano, consultora do
Sebrae SP e gestora do Projeto,
“através da união das quatro
Associações está sendo possível
a viabilidade da construção do
projeto com foco nos mercados
interno e externo. Outro fator
importante é a inserção da fa-
mília neste processo”. A ana-
lista diz que segundo Degmar
Lopes de Oliveira, presidente
da Associação dos Apicultores
de Rio Claro, a região enfrentou
um problema com o sumiço das
abelhas há três anos, mas assim
como o problema surgiu, desa-
pareceu sem nenhum tipo de
prognóstico.
ATIVIDADE ECONÔMICA
Segundo informações do
Engenheiro Agrônomo, Hugo
Cesar Ravagnani Venturelli,
Analista de Projetos no Sebrae e
produtor rural explica a apicul-
tura é uma atividade econômi-
jo o apicultor comercializa
embalagens de ½ litro, a R$
7 reais cada. “De agosto até
agora já vendi mais de 250
baldes”, comemora.
ca de baixo impacto ambiental
que possibilita a utilização per-
manente dos recursos naturais,
preservando o meio ambiente e
agregando esse “marketing eco-
lógico” aos produtos obtidos.
“Pela sua natureza a apicultura é
uma atividade conservadora das
espécies. Não é destrutiva como
a maioria das atividades rurais
e é uma das poucas atividades
agropecuárias que preenche
todos os requisitos do tripé da
sustentabilidade: o econômico
porque gera renda para os agri-
cultores; o social porque utiliza a
mão-de-obra familiar no campo,
diminuindo o êxodo rural; e o
ecológico porque não se desma-
ta para criar abelhas”, explica.
O produtor rural comple-
menta dizendo que outro bene-
fício oriundo do incremento da
apicultura é o aumento da po-
linização, em culturas agrícolas,
com conseqüentes ganhos de
produtividade e de qualidade,
e a sua importância para as de-
“Se o mel fosse mais
divulgado as farmá-
cias venderiam bem
menos remédios”
A afirmação é de Devanir
Buscariol, que garante não
existir remédio melhor. “O mel
cria anticorpos”, acrescenta,
tomando como exemplo ele
próprio. Conforme diz, du-
rante os 15 anos em que tra-
balhou na capital sofreu com
faringite, depois que passou
a manipular e ingerir o pro-
duto não teve mais problema
algum.
Outro alerta de Buscariol
é que o mel puro cristaliza, ao
contrário do que muitos acre-
ditam. De acordo com ele até
em tumbas de faraós foi en-
contrado mel cristalizado.
CUIDADOS
O apicultor conta que
para uma boa produção al-
guns cuidados são neces-
sários: Primeiro, as caixas
devem estar protegidas da
chuva e em mata fechada,
mas o mais importante é o
manejo das colmeias. Con-
forme explica, a abelha co-
leta o néctar das flores e o
transforma em mel para se
alimentar. Em apenas 15 dias
já se tem uma caixa cheia,
mas se houver pouca dis-
ponibilidade de néctar e a
caixa for esvaziada a própria
colônia reduz a produção de
novos indivíduos e pode até
se extinguir. Sendo assim é
mais espécies vegetais, contri-
buindo para a preservação de
muitas plantas que poderiam
entrar em processo de extinção,
pois em muitas regiões há uma
sensível redução no número
de animais polinizadores. “Esta
atividade permite o  consórcio
com qualquer outra atividade
agropecuária, pois não concor-
re com nenhum animal no pas-
tejo, pois as abelhas não conso-
mem a forragem, o que mostra
mais uma vantagem. Pode- se
dizer mesmo que, sem abelhas,
não há agricultura”, afirma.
Luciane completa infor-
importante não coletar todo
o produto. Por outro lado,
se o mel não for retirado a
colmeia irá desenvolver no-
vas rainhas que migrarão
para formar novas colônias.
Assim é possível dispor cai-
xas vazias para multiplicar a
produção com novas famí-
lias. Um enxame, conforme
aponta, deve ter cerca de
100 mil indivíduos para uma
boa produtividade.
Devanir conta ainda que
no ano passado uma empre-
sa sediada em Ajapi desen-
volveu um alimento em pó
para a criação de abelhas
que está se mostrando bas-
tante eficiente.
O tempo de vida de uma
abelha operária, segundo
o apicultor, é entre 50 e 60
dias; de um zangão entre 90
e 100 dias; e da rainha en-
tre dois anos e dois anos e
meio.
Com relação à redução
de indivíduos verificada em
alguns países do mundo, in-
clusive no sul do Brasil, Bus-
cariol é pronto na resposta:
agrotóxicos. Ele mesmo foi
vítima há alguns anos, quan-
do houve uma pulverização
em lavouras próximas de sua
criação. De acordo com ele
aconteceu queda abrupta na
produção de mel.
Interessados no produto
ou na experiência de Devanir
Buscariol podem fazer con-
tato pelo telefone (19) 3577-
7204 e agendar uma visita.
Sua produção é no sítio Bela
Vista, em Corumbataí.
Foto: Marco Mugnatto - Flick
mando que até o presente mo-
mento na apicultura é explora-
do, quase que exclusivamente,
a produção convencional de
mel sendo limitado ou até mes-
mo ausente o aproveitamento
dos outros produtos apíco-
las diretos (geléia real, pólen,
própolis, apitoxina e cera) que
agregariam valor a toda a ca-
deia produtiva.
“Qualquer tipo de prog-
nóstico referente a diminuição
das abelhas deve ser estudado
minusiosamente para evitar
conclusões errôneas”, finalizam
os especialistas.