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• fevereiro de 2001

editorial

A todos os amigos
nº 1
Pressionado por reivindicações da sociedade civil, o Estado brasi-
leiro, a partir dos anos 1970, vem ampliando os recursos legais
que reconhecem direitos até então negados à população negra.
Parte dessa ampliação significou o reconhecimento da legiti-
midade da posse sobre espaços físicos onde a população afro-
brasileira inscreveu, e por meio dos quais continua escrevendo,
sua memória, sua cultura e sua religiosidade. São a esses espa-
• Publicação de KOINONIA

ços que chamamos Territórios Negros.


A proteção oficial, por meio do tombamento, da garantia de
propriedade da terra ou ainda por meio de políticas públicas es-
peciais dirigidas aos terreiros de candomblé e aos remanescen-
tes das comunidades de quilombos são marcos privilegiados des-
sa conquista de direitos históricos e culturais. Com base nesses
novos direitos, uma série de comunidades negras rurais até en-
tão acuadas, estão se organizando, assim como buscando uma
articulação entre si.
Informativo de apoio às Comunidades Negras Rurais do Rio de Janeiro e Espírito Santo

As comunidades mais conhecidas são aquelas que já foram


oficialmente reconhecidas como “remanescentes e quilombos”,
mas além delas existem muitas outras. Umas ainda reivindicam
esse reconhecimento, outras nem sabem dessa possibilidade le-
gal e outras, ainda, conhecendo o artigo 68, preferem encami-
nhar sua luta por outros
meios legais.
O boletim Territórios Ne-
gros é destinado a toda
essa variedade de comuni-
dades, tendo por objetivo
colaborar na sua organiza-
ção e na sua articulação.
Ele trará informações sobre
a legislação, sobre os acon-
tecimentos que têm atingi-
do essas comunidades e
promoverá a troca de infor-
mações e experiências en-
Ellen Monteiro

tre elas. Ele será entregue


gratuitamente em todas as
comunidades às quais te-
mos acesso e às pessoas
interessadas no tema.
Com o espírito de cooperação e parceria oferecemos esse pri-
meiro número do boletim a todos os amigos da causa, esperan-
do que ele sirva de instrumento à articulação de uma rede regio-
nal de apoio às comunidades negras rurais dos estados do Rio
de Janeiro e do Espírito Santo.
notícias O artigo 68, da Constituição
Federal de 1988, Atos das
em épocas de crise econômica; da
ocupação e administração das ter-
ras doadas aos santos padroeiros,
Disposições Transitórias, diz o
◗ NOS DIAS 16, 17 e 18 de março etc. Assim, o nome “remanescente
seguinte:
acontece em Magé o XXIX Con- de quilombos” descreve diversos
gresso do Conselho das Entidades “Aos remanescentes das grupos de negros rurais que, em
Negras do Interior do Estado do comunidades dos todo o país, estão mobilizados
Rio de Janeiro – CENIERJ. Haverá quilombos que estejam pela legalização de diferentes ti-
um ciclo de palestras com os se- pos de uso comum da terraterra.
ocupando suas terras, é
guintes temas: Eleições Municipais,
Educação Multicultural, Conferên- reconhecida a propriedade QUEM AS RECONHECE?
cia Internacional Contra o Racismo, definitiva, devendo o A Fundação Cultural Palmares
Mulher Negra e As Comunidades Estado emitir -lhes os títulos
emitir-lhes (FCP), vinculada ao Ministério da
Quilombolas. Maiores informações respectivos ”.
respectivos”. Cultura, tem assumido em todo o
com o Centro Afro da Comunidade país a responsabilidade pela reali-
Brasileira – CACEB, no telefone zação ou simples aprovação dos
633-2407. processo da III Conferência Mun- laudos de identificação das co-
dial contra o racismo, entre outros munidades negras rurais como
◗ COM EXIBIÇÃO prevista na rede assuntos. O encontro foi organiza- remanescentes de quilombos. Ao
de televisões educativas a partir de do pela Comissão Nacional de Arti- aprovar o laudo e publicá-lo no
abril, o curta-metragem “Morre culação das Comunidades Negras Diário Oficial da União, a FCP está
Congo, fica congo”, fala do Jongo, Rurais Quilombolas. reconhecendo oficialmente, em
dança que os escravos realizavam nome do Estado brasileiro, a exis-
e seus descendentes realizam. A ◗ A COMUNIDADE Remanescente tência de tais comunidades e de
comunidade jongueira do Morro de Quilombo São José da Serra, do seu direito a terra. Há um debate,
do Carmo, em Angra dos Reis (RJ), município de Valença, aproveitou no entanto, em torno da possibili-
serve de base para o filme que o V Encontro de Jongueiros de dade de outras instituições, como
mistura dramaturgia e realidade agosto de 2000, realizado em An- o INCRA, assumirem função seme-
para contar, em 15 minutos, a his- gra dos Reis, para se manifestar lhante, ao encaminharem a regula-
tória que começa no início dos contra a postura omissa da Funda- rização de terras de remanescentes
anos 70, na ditadura militar. Por ção Cultural Palmares que desde de quilombos sem a necessidade
causa da especulação imobiliária, que reconheceu a comunidade a do parecer da FCP. Em outros casos
os jongueiros, que eram pequenos abandonou a própria sorte. Os mo- ainda, como o do Instituto de Terras
proprietários rurais em bairros radores pediram um minuto de si- de São Paulo, a existência de uma
como Frade, Mambucaba e Belém, lêncio contra a fundação como for- legislação estadual nova, tem permi-
perderam as terras e migraram ma de protesto. Além disso, mostra- tido que esse reconhecimento se dê
para o morro, onde permanecem ram uma faixa na qual pediam ur- no nível estadual, com resultados
até hoje. O filme registra depoi- gência na titulação de suas terras. ainda mais rápidos que os da FCP.
mentos de mestres do Jongo Rural:
Carmo Moraes, 84 anos; Zé Adria- O QUE É UM LAUDO?
no, 78; Dona Luíza, 76; Zady Rita, O laudo é um relatório feito por
61 e Rosalvo Bernardo, 57 anos. saiba que um especialista (antropólogo ou
historiador) que registra um pouco
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◗ DE 29 DE NOVEMBRO a 3 de de- O QUE SÃO COMUNIDADES da história da comunidade, sua


zembro de 2000 realizou-se em REMANESCENTES DE organização social, sua relação
Salvador/BA o 2º Encontro Nacio- QUILOMBO? com a terra e dos usos dos recur-
nal de Comunidades Negras Rurais O conceito de quilombo foi bas- sos naturais, das formas de organi-
Quilombolas, com o tema Territó- tante modificado em relação a seu zação do trabalho e das formas de
rio e Cidadania para o povo ne- significado original. Hoje são reco- resistência e conflitos enfrentados
gro! Foram discutidos temas varia- nhecidas como comunidades re- pelo grupo. Um laudo deve identi-
dos como a participação ativa dos manescentes de quilombos não ficar (ou não) a referida comunida-
jovens e das mulheres nos destinos apenas as comunidades que tive- de como remanescente de quilom-
dos quilombos; o meio ambiente; ram origem, de fato, em antigos bo, no sentido atualmente atribuí-
os conflitos agrários; a organização quilombos. Também são contem- do ao termo. Caso o laudo seja
estadual e nacional dos quilombos; pladas aquelas que resultaram da aprovado, um resumo dele deve
os impactos das políticas neolibe- compra de terras por negros liber- ser publicado no Diário Oficial da
rais e de globalização sobre a vida tos; da posse pacífica de terras União, tornando público o “reco-
dos quilombos, a participação no abandonadas pelos proprietários nhecimento” e suas razões.
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um pouco de história

Terras de uso comum: “terras de preto”


Na década de 1980 a Campanha pela Reforma são controladas livre e individualmente por um
Agrária ganhou grande impulso e foi acompa- determinado grupo doméstico de pequenos
nhada de uma série de lutas por terras especí- produtores diretos ou por um de seus mem-
ficas, diferente da luta dos pequenos proprie- bros. São “ocupações especiais” aquelas co-
tários ou dos trabalhadores assalariados. Esse nhecidas como Terras de Santo, Terras de Índio,
foi um momento de avanço dos movimentos Terras de Herança, Terras Soltas ou Abertas e,
camponês, indígena e de categorias de traba- finalmente, as Terras de Preto.
lhadores até então com pouca representação, As chamadas Terras de Preto compreendem
como os “atingidos por barragens”, seringuei- propriedades adquiridas ou doadas a familiares
ros e garimpeiros. de ex-escravos, com ou sem formalização jurí-
dica. Tais propriedades podem ter tido origem
em antigos quilombos; em áreas de alforria-
dos; ou em concessões do Estado usadas como
pagamento à prestação de serviços guerreiros.
Podem ter tido origem também em proprieda-
des economicamente decadentes, cujos pro-
prietários perderam seu poder de coerção, pas-
sando a adotar o arrendamento apenas formal
das terras a seus antigos escravos, que podem
utilizá-las de forma coletiva, em troca de paga-
mento simbólico, mantido apenas para demar-
car seu caráter de propriedade privada. Os des-
cendentes dessas famílias permanecem nessas
Ellen Monteiro

terras há várias gerações sem desmembrá-las e


sem delas se apoderarem individualmente. Em
alguns casos registrou-se a existência de gru-
pos em relativo isolamento, mantendo regras e
No IV Congresso Nacional de Trabalhadores uma concepção de direito baseados na apro-
Rurais (1985), no qual foi apresentado o I Pla- priação comum dos recursos.
no Nacional de Reforma Agrária da Nova Repú- Em 1987, porém, tais iniciativas de registro
blica, os trabalhadores solicitaram ao Estado sistemático dessas situações não vingaram em
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pela primeira vez o reconhecimento de situa- função do fracasso da reforma agrária da Nova
ções de posse e uso da terra desprezado du- República. Elas só seriam retomadas, parcial-
rante os períodos anteriores. Em resposta a es- mente, em meados da década de 1990, em
sas reivindicações, os órgãos fundiários come- função das discussões abertas pelas demandas
çaram a elaborar novos instrumentos técnicos, de regularização das terras como “comunida-
que deveriam ser capazes de registrar e cadas- des remanescentes de quilombos”.
trar sistematicamente tais áreas de uso co-
mum. As “terras de uso comum”, que os ór-
gãos fundiários passaram a designar como PARA SABER MAIS
Leia o artigo “Na Trilha dos Grandes Projetos”, escrito
“ocupações especiais”, incluem inúmeras situ-
por Alfredo Wagner B. Almeida que se encontra no
ações de posse e uso da terra que não se en- livro “Terras de Preto, Terras de Santo, Terra de Índio”,
caixavam nas categorias até então utilizadas organizado por J. Hábette e Edna Castro e editado
pelos órgãos governamentais, isto é, que não pela NAEA/UFPA, Belém, em 1989.
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um território

Campinho da Independência
No dia 21 de março de 1999, Dia Internacional apresenta fortes potenciais turísticos. Paraty,
pela Eliminação da Discriminação Racial, o Ins- além de ser tombada pelo Patrimônio Histórico
tituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio Nacional, possui uma área de preservação am-
de Janeiro (ITERJ) e a Fundação Cultural Palma- biental e belas praias, o que despertou a aten-
res entregaram o título definitivo à Comunida- ção de empresários interessados na especula-
de Remanescente de Quilombo de Campinho ção imobiliária possibilitada pela abertura da
da Independência, localizada na zona litorânea rodovia Rio-Santos.
ao Sul do Estado do Rio de Janeiro no municí- Diante da ameaça de grileiros que começam
pio de Paraty. Trata-se da primeira titulação de a aparecer na área tentando expulsá-los de
terras do Estado baseada no artigo 68 da Cons- suas terras, os moradores de Campinho reagi-
tituição Federal (ADCT) que assegura às comu- ram e se organizaram. Em 1975, os negros de
nidades negras rurais a propriedade definitiva Campinho foram à Justiça em busca de seus
das terras que ocupam. A titulação foi feita de direitos antes daqueles que os ameaçavam.
forma coletiva em nome da Associação de Mo- Nesse processo de organização fundaram a As-
radores de Campinho. sociação de Moradores, pediram ajuda à Igreja
A área total da comunidade é de 287 hecta- Católica (através da Comissão Pastoral da Ter-
res ocupados por mais de 80 famílias negras ra) e associaram-se ao Sindicato de Trabalha-
divididas em diversos sítios familiares usados dores Rurais de Paraty. Chegaram a entrar com
como área de moradia e/ou trabalho. Todos o pedido de usucapião para garantirem a pos-
que moram em Campinho da Independência, se da terra e conseguiram sua desapropriação
conhecido na região como um “bairro de pre- pelo Estado. Mas, apesar disso, as terras não
tos”, são descendentes das irmãs Antonica, foram repassadas legalmente à comunidade.
Marcelina e Luíza, consideradas por todos as No período que vai de 1975 a 1990 a vida dos
fundadoras da comunidade. moradores de Campinho foi marcada pela re-
As terras de Campinho da Independência sistência e pela luta em se manter nas terras
foram doadas pelo “senhor” a essas três irmãs, herdadas de seus ancestrais. Passados quase
escravas da Casa Grande, sede da antiga Fa- trinta anos de empenho, a comunidade de
zenda Independência. Elas ganharam as terras Campinho da Independência finalmente tem a
e transmitiram os direitos de uso aos seus fi- propriedade de suas terras reconhecida.
lhos e netos. De lá para cá são mais ou menos
seis gerações ocupando a área.
Até a década de 1970 não havia disputa pe-
las terras da comunidade de Campinho. Os ha-
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bitantes cultivavam principalmente a mandio-


ca, fabricavam farinha e produziam artesana- Este boletim é produzido pelo projeto EGBÉ –
TERRITÓRIOS NEGROS de KOINONIA Presença
tos como meios de sobrevivência. Até que em Ecumênica e Serviço. Sua periodicidade é bimestral
1973 a construção da rodovia Rio-Santos mu- com tiragem de 500 exemplares dirigido às
comunidades negras rurais do Rio de Janeiro e
dou drasticamente a vida da população. Além Espírito Santo. Colabore com notícias e manifeste
da rodovia, uma série de obras e investimentos sua opinião.
de interesses particulares e públicos (como a Coordenador para o Rio de Janeiro e Espírito Santo
José Maurício Arruti
construção das usinas nucleares e de empreen-
Pesquisadores Ellen Monteiro e Alessandra Tosta
dimentos turísticos) supervalorizaram as terras
Programação visual Anita Slade
de Paraty fazendo aparecer diversas pessoas Apoio editorial Helena Costa e Mara Martins
que passaram a se intitular proprietários das KOINONIA Presença Ecumênica e Serviço
terras da comunidade. Rua Santo Amaro, 129 Glória
22211-230 Rio de Janeiro RJ
A comunidade de Campinho encontra-se às Telefone (21) 224-6713 Fax (21) 221-3016
margens da rodovia Rio-Santos e essa área E-mail koinos@ax.apc.org www.koinonia.org.br
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