SUELI BRITTO 1
Qual o dia do seu aniversário? Em que dia você nasceu? Quantos anos você tem? Quanto
você me deve? Quantos quilos de carne devo comprar para o churrasco? Quantos litros de
água devemos levar para a caminhada? Que horas são? Qual a sua altura? Em que lugar
ele está na fila? Quantos convidados para a festa? Estas e muitas outras questões estão
presentes em nosso contexto sociocultural, fazendo parte das relações entre as pessoas.
Para responder a todas essas perguntas, necessitamos recorrer aos números, seja para
representar a idéia de uma quantidade discreta (contagem de elementos) ou contínua
(medida).
A idéia de número é muito antiga. Não existe um inventor, mas as situações vividas pelo
homem, participante da construção de sua própria história, em diversos lugares do
mundo, promoveram o desenvolvimento da numeração falada ou escrita.
A História nos mostra que o homem inventou várias maneiras para realizar contagens e
representá-las, e todas elas associadas às necessidades de sua época. Todo seu processo
de construção fez parte do seu próprio contexto histórico-cultural. A relação biunívoca
(exemplo: para cada ovelha, uma pedra) esteve presente neste processo. Usando os
dedos, contas, pedras, marcas (conjunto comparador), entre outros, o homem ia
garantindo o conhecimento e a memória das quantidades já relacionadas. No entanto, a
dificuldade de trabalhar com grandes quantidades foi exigindo mudança nas formas de
registros.
O registro escrito vai sendo construído para facilitar a própria vida humana. Imaginemos,
por exemplo, o trabalho que tinham os homens ditos primitivos para registrar, com
pedrinhas ou riscos, a quantidade de mil quatrocentos e vinte e seis ovelhas. Para nós
basta escrever 1.426!
A idéia de número foi sendo construída desde os primórdios da humanidade e passou por
muitas mudanças até os dias de hoje.
Com seu sistema de nove sinais (o zero surge depois), o povo hindu contribuiu de forma
significativa para o sistema de numeração decimal que usamos hoje. O sistema indo-
arábico utilizado em quase todo o mundo apresenta alguns princípios básicos:
Possuir base decimal, ou seja, a cada dez, formo um novo grupo da ordem
posterior.
Ser um sistema de valor posicional, ou seja, o algarismo 2 pode valer 2, 20, 200...
dependendo da ordem em que se encontre no número representado.
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nos colocarmos como observadores das estratégias apresentadas pelas crianças, veremos
que algumas delas estão em comunhão com as estratégias utilizadas pelo homem ao
longo da invenção dos números. A contagem utilizando os dedos é uma das heranças de
que até hoje fazemos uso.
A alfabetização matemática
A alfabetização, no entanto não pode ocupar tão somente o campo das letras. É preciso
alfabetizar numericamente as pessoas. Desde pequenas, as crianças mergulham no
mundo dos números, muitas vezes sem compreendê-lo. É comum a repetição de
seqüências numéricas sem o estabelecimento de relações entre quantidades e símbolos.
Quantos de nós, adultos, não temos controle sobre situações dos dia-a-dia como juros de
cheque especial, compras a prazo com taxas, entre outras, pela falta de habilidade com os
números? Nossa alfabetização numérica passa pela alfabetização financeira num mundo
capitalista e globalizado.
A construção da idéia de número abordada por Kamii (1995, p. 13) mostra que “o
número é construído por cada criança a partir de todos os tipos de relações que ela cria
entre os objetos”. Neste sentido, a idéia de número é uma construção interna do sujeito.
Esta construção acontece nas inúmeras relações que ele estabelece na sua leitura de
mundo. Quanto mais diversificadas as experiências, melhores as possibilidades de
compreensão desta idéia. Como as relações estabelecidas são próprias de cada sujeito,
porque surgem a partir de suas experiências pregressas e as vividas no presente,
podemos dizer que número é uma construção mental, portanto interna e individual do
sujeito diante de uma dada realidade presente.
Quando digo que vou comer metade do chocolate, ou gastar cinqüenta por cento da
minha mesada, ou ainda, que vou precisar de dois quartos do tanque de gasolina para ir a
tal lugar, não estaria falando de uma mesma idéia numérica, porém com diferentes
registros?
Considerando que as crianças desde muito cedo têm contato com números, mas que este
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contato não garante a aprendizagem significativa desta idéia, vamos enumerar alguns
itens importantes para serem pensados na alfabetização numérica:
Conhecimento prévio: toda criança adentra o espaço escolar com alguma idéia
sobre número. Compete ao professor procurar saber o conhecimento que a criança traz, a
partir de diferentes situações promovidas em sala, seja com jogos, brincadeiras, desafios,
etc.
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a enumeração, portanto recursos para a execução desta atividade são indispensáveis. Os
primeiros recursos podem ser o próprio corpo e objetos como tampinhas, palitos,
sementes... O uso da sapateira também é um bom instrumento para a formação de
números maiores que exigem agrupamento. O material dourado pode ser introduzido em
uma fase posterior, quando as crianças já compreendem a base de troca, ou seja, 10
unidades são o mesmo que 1 dezena. O QVL e o ábaco são instrumentos que trabalham
com valor posicional, portanto, é necessário que as crianças estabeleçam relações de
troca em nível mental, pois uma bolinha pode valer 1, 10, 100 ou 1.000 dependendo da
casa que ocupar. Neste caso, não estaremos trabalhando com quantidades, mas com
representações simbólicas.
No jogo de dados, Guilherme tirou 4 e 6. Ele disse que a soma era 12. Foi pedido
para que ele mostrasse usando os dedos.
Guilherme mostrou seis dedos e, na hora de colocar quatro, utilizou a mão que
tinha um dedo levantado, portanto, levantou mais três dedos formando quatro. Uma mão
ficou com cinco dedos levantados e a outra com quatro dedos levantados. Então, ele
disse: nove.
Ao ser indagado sobre sua resposta, ele refez a contagem da mesma maneira. A
seguir, a proposta foi de que usasse palitos. Com os palitos, ele encontrou 10 como
resultado.
Foi pedido que ele refizesse a contagem usando as mãos, e ele fez da mesma
maneira. Nesse ponto, a pesquisadora (autora deste texto) fez uma intervenção,
segurando o dedo que fazia parte do 6 e pediu que ele colocasse mais 4. Então, ele coloca
os 4 dedos e chega no 10.
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A pesquisadora pôde perceber que Guilherme apresentou compreensão da adição, mas
centrou-se na representação dos números, portanto, aquilo que apareceu no dado deveria
ser visto na mão. Ao invés de levantar quatro dedos, porque naquela situação pedia-se
que juntasse quatro, ele levantou três e juntou com o dedo já levantado para completar
quatro. Então, sua atenção direcionou-se para cada momento. Primeiro representou seis e
o fez corretamente, depois representou quatro esquecendo-se do seis. Ao contar os dedos
levantados, chegou ao nove e não a dez.
Guilherme: “Treze.”
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Os procedimentos apresentados pela criança, quando em situação de resolução de um
problema, referem-se aos conceitos construídos e que podem ser colocados em prova a
partir de uma intervenção. Para que essa intervenção aconteça, no sentido de fazer
avançar os conceitos de que a criança já dispõe para dar conta de resolver novos desafios,
é preciso que, antes de qualquer coisa, professor e criança estejam interagindo de forma
a possibilitar a compreensão dos processos de elaboração do conhecimento por parte da
criança, para que o professor seja capaz de procurar as melhores situações para desafiar
o aluno diante do conhecimento, que diz respeito à natureza das trocas, da interação
entre os participantes do processo.
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(Marcos começou a contagem e quando chegou ao 59 juntou os que
sobravam e colocou no pote.)
Pesquisadora: “Não tem outro jeito de representar o 59?”
Marcos: “Tem, mas eu não quero.”
A pesquisadora mostrou 5 dezenas e perguntou o que era.
Marcos: “É 50”. (Foi pegando e devolvendo todos os cubinhos para o pote.)
Pesquisadora: “Mas você vai colocar todos no pote?”
Marcos: “Vou trocar.”
Pesquisadora: “Mas aqui tem 50 e aí tem 59.”
Marcos: “Ah! Vai sobrar nove”. Pegou as nove unidades.
Pesquisadora: “E agora, como ficou?”
Marcos: “759.”
Bibliografia:
Notas:
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