Você pretende prestar um concurso público em que se é exigido redação, sabe a importância de
escrever bem. Isto implica não só conhecer a matéria de que se trata, mas também as normas do
nosso idioma. O Português está sendo cada vez mais valorizado, e não é por menos, afinal,
expressar-se com clareza é fundamental para o bom entendimento das idéias. E aprendê-lo não é tão
difícil como muitos pensam pois esta é a língua que você fala desde que nasceu. Você já sabe
Português, o problema é a norma, suas regras e exceções. Se um brasileiro não sabe português,
quem sabe? Um russo? Os concursos, entretanto, exigem a norma culta do nosso bom português.
Nada vai sair de um texto confuso e mal estruturado. Lembre-se que um texto escrito sem esforço é
geralmente lido sem prazer, já dizia Samuel Jhonson. Por isso, não deixe o estudo de gramática e
redação para a última hora: ele é mais importante do que você imagina.
Gramática
A gramática do português não é a matéria preferida dos alunos, o que é perfeitamente
compreensível. Com tantas exceções e muitas regras que os alunos não fazem a mínima idéia de por
que aprender, eles ficam desmotivados. O meu interesse está justamente em fazer vocês aprenderem
a gramática para usá-la como ferramenta na escrita e saber a sua utilidade, além de acertar os testes
em que ela é cobrada diretamente – exigidos na maioria dos bons concursos públicos.
Redação
Não adianta querer escrever sem o conhecimento da gramática. Mas só ela também não é suficiente,
pois, se assim fosse, eu mesma, ou os grandes gramáticos do nosso país seriam os maiores
escritores. Clarice Lispector ou Mário de Andrade não eram gramáticos, eram? Sabia que Machado
de Assis se assustou ao abrir a gramática do sobrinho e não entender nada? Ignorante? Creio que
não. Por isso, não pense que com ela você vai escrever qualquer texto: conteúdo é fundamental. A
gramática simplesmente ajuda a não "travar" quando você quer expressar uma idéia e sente
dificuldade por não saber como. Aliás, a gramática é decorrência da língua, e não o contrário - por
isso, não se deixe limitar por ela.
Seguem abaixo algumas dicas de como ter bom desempenho em provas de redação.
1. Quem quer escrever bem deve ler muito. E entenda este ler não como passar os olhos, mas
realmente compreender o assunto lido. Grife, faça anotações na página de que assunto está
sendo abordado naquele trecho que você leu. Faça fichamentos sempre que puder e não vá
para o parágrafo seguinte antes de entender tudo que está dito no anterior. Um bom leitor
com certeza é um bom redator.
2. Torne-se crítico, relacione o texto lido com outros textos e assuntos que você conhece. Faça
o intercâmbio entre as matérias, de modo a relacionar um determinado tópico com outras
disciplinas como história, geografia, economia, direito, arte. Isso mostra a sua versatilidade e
passa uma boa impressão ao leitor.
3. Falando em leitor, lembre-se de que trata-se justamente disso: um texto escrito. As maiores
dificuldades da redação é passar as idéias para o papel de forma clara, coesa e coerente.
Sempre digo aos meus alunos que eles não vão estar ao lado do corretor na hora para falar o
que eles estavam querendo dizer naquele trecho confuso. O que ele vai ler é exatamente o
que está escrito, por isso, sempre leia o que você escreveu antes de entregar e certifique-se
de que você conseguiu passar para o papel a idéia que pensava. Nada vai sair de um texto
confuso e mal estruturado, a não ser uma má impressão do autor deste.
4. Cuidado com a coloquialidade! Quando pensamos em um determinado argumento temos a
tendência de escrevê-lo no papel exatamente como foi pensado e muitas vezes "escapam"
expressões do dia-a-dia que não ficam bem em um texto escrito. Mas também não vá para o
oposto: não seja pedante, usando expressões que o corretor deverá procurar no dicionário a
cada linha. Isso prejudicará muito seu texto. Quanto mais clareza melhor; se o argumento for
bom você não precisa dificultar o seu entendimento com expressões eruditas demais.
5. Na maioria dos casos o que se pede em concursos são dissertações. Por isso, escreva sempre
de forma impessoal, como se fosse uma notícia de jornal, em 3º pessoa. Nada de
sentimentalismos, exclamações, apelações ou radicalismos. Você deve apresentar o assunto,
introduzi-lo, mostrar um problema, uma dúvida, algo que revele o porquê de valer a leitura
de seu texto. Não esgote o assunto na introdução, ela apenas apresenta, define o tema a ser
tratado.
6. Sempre é possível tratar o tema por vários viés distintos. Escolha um que dê margem para
uma boa extensão de argumentos ao longo da sua dissertação. Adaptando o discurso de
Padre A. Vieira (um dos maiores oradores portugueses), imagine seu texto como uma árvore:
ele apresenta vários argumentos, várias ramificações, mas o tronco é único, ele deve
apresentar unidade sempre.
7. E não se esqueça de escrever aquilo em que você acredita. Dificilmente você conseguirá
sustentar um ponto de vista em que não creia até o fim de seu texto sem entrar em
contradição ou usando argumentos fracos. Escrevendo o que você defende é muito mais fácil
de pensar em bons argumentos e ter um texto coeso. O corretor pode até não ser da mesma
opinião que a sua, mas que vai admitir que o seu texto está coerente e coeso de acordo com
suas idéias, ele vai. E isso lhe garante ótimos resultados.
Os concursos estão aí e cada vez mais exigindo redação e interpretação de texto em suas provas.
Dizem que agora cobram dos profissionais um “português fluente”. Exageros à parte, vamos ao que
interessa. Para começar bem o ano veremos nesta aula alguns conceitos que podem ajudar a
desenvolver uma boa redação.
É comum encontrarmos questões sobre um texto usar uma linguagem predominantemente
conotativa ou denotativa. Qual a diferença? A linguagem denotativa está diretamente ligada à
significação, ou seja, ao seu sentido real, o sentido do dicionário (lembre-se: denotativo de
dicionário). Já a linguagem conotativa, em oposição, trabalha com figurações, com uma extensão
do sentido literal, denotativo. Veja os exemplos:
1) Colhi uma flor do jardim. ( denotativo)
2) Sua filha é mesmo uma flor! (conotativo)
Havia uma antiga propaganda de chantilly que dizia: “O sonho de toda sobremesa é casar de
branco”. Aí está um bom exemplo de palavras empregadas conotativamente: “sonho”/ “casar de
branco” . Aliás, esta linguagem é muito usada em textos publicitários por ampliar o sentido literal e
fazer um jogo de palavras muito apreciado.
Sempre que uma questão abordar uma pergunta sobre o uso da linguagem denotativa, observe se o
texto ou a palavra está no seu sentido literal ou figurado – no caso do texto, veja o que predomina.
Já na redação, você deve sempre privilegiar a linguagem denotativa: a linguagem figurada não é
bem-vinda em um texto referencial, como é o caso de uma dissertação.
Agora você deve ter se perguntado, o que é um texto referencial? Para isso, você deve se lembrar
dos componentes da comunicação humana: emissor, receptor, mensagem, código, canal e referente.
Cada um destes componentes é trabalhado por uma função de linguagem. Vejamos sucintamente:
1) Função emotiva: é a do emissor, centrada na 1ª pessoa do singular, no “eu”, subjetivamente.
2) Função conativa: é a do receptor, centrada na 2º pessoa, no “tu”; busca atuar sobre a imagem do
receptor, persuadindo-o mediante o uso das palavras e de verbos no imperativo.
3) Função fática: é a do canal, serve apenas para manter o contato e ver se o receptor está realmente
entendendo o emissor.
4) Função metalingüística: é a do código (no nosso caso, a língua portuguesa brasileira); usada
quando temos de explicar a própria linguagem, como estou fazendo agora.
5) Função poética: é a da mensagem; privilegia o significante e o significado e depende dos
recursos usados pelo autor do texto (envolvendo muito a conotação).
6) Função referencial: é a do referente, centrada na 3ª pessoa, no assunto; a intenção é apenas
transmitir a informação, objetivamente (envolvendo a denotação).
Claro que em um texto pode haver mais de uma função pois elas não são excludentes. A linguagem
referencial ocorre quando o referente, ou seja, o assunto, é posto em destaque. Se o assunto é posto
em destaque, o texto há de ser objetivo e claro, sem margem a duplas interpretações (como ocorre
com a linguagem conotativa). Como o principal é passar a informação, o texto será escrito em 3ª
pessoa – como vemos na maioria das teses científicas e textos jornalísticos. Por isso em uma
dissertação o que predomina é a função referencial, aquela que visa passar o assunto da forma mais
precisa possível.
Aproveitando o último tema de redação, vejam um bom exemplo desse tipo de linguagem:
O ideal de uma educação que se empenhe em formar e aprimorar a conduta dos jovens, de
forma que esta venha a ser fundada no respeito a certos princípios fundamentais da vida
pública e da dignidade do ser humano, - ou seja, o ideal de uma formação para o exercício da
cidadania e para a conduta ética -, está entre os objetivos mais amplos e ao mesmo tempo mais
consensuais da ação educativa escolar. A lei 9394/96, que estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional, a ele consagra um lugar de destaque ao afirmar, logo em seu artigo 2º que
"A educação ..., inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem
por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da
cidadania ... ". Também em outros importantes documentos educacionais, como as Diretrizes e
os Parâmetros Curriculares Nacionais, essa meta da ação educativa recebe um tratamento
privilegiado. Mas não é só nos discursos educacionais oficiais que o ideal de uma formação
ética e para a cidadania é considerado como uma meta prioritária. As propostas pedagógicas
das mais diversas instituições escolares - públicas ou privadas -, os discursos dos professores e
demais profissionais da educação, os livros didáticos e até mesmo a mídia e os pais parecem
insistir na necessidade de que as instituições escolares se voltem com grande ênfase e empenho
para essa tarefa, já que dela parecem depender a solidificação e a continuidade de um modo
de vida ao qual, pelo menos discursivamente, atribuímos um valor especial.
( José Sérgio Carvalho, in: Podem a ética e a cidadania serem
ensinadas? )
Belo texto, não?
Abraço.
Recebi um e-mail de um aluno que me motivou para esta aula. A certa altura, dizia o seguinte:
Esquematizo, pois, como sendo dois os meus problemas: eu não tenho a sensibilidade de saber
quando eu devo mudar de parágrafo e, ainda que mude - no desespero de evitar um texto de um só
parágrafo -, eu não sei qual dos inícios enumerados utilizar - nunca! Se eu fosse escolher um eu
estaria tentando a sorte, também desesperadamente, não conseguindo fazer sumir a sensação de
"será que vão perceber que não faz parte de mim usar inícios assim mais rebuscados?"
Achei muito gracioso o modo como ele expressou a sua dúvida, pois, apesar de afirmar
categoricamente que não sabia usar os parágrafos, ou quando fazê-los, e usar os conectivos
adequados, este texto em que se expressou era muito bem estruturado e coeso. Mas esta dúvida é
muito comum e fundamentada em um grande mito: escrever bem é escrever difícil.
Muita gente acha que para escrever bem precisa usar uma linguagem rebuscada, empolada e no fim
só vai fazer um texto pernóstico (uso de termos pouco usuais), quando não, pedante. Contudo,
escrever bem não é escrever difícil: pelo contrário, se você tem argumentos fortes e, portanto,
sustentáveis, quanto mais claro você expressá-los melhor será para o interlocutor compreendê-lo!
Afinal, qual o objetivo do seu texto? A impressão que tenho de quem quer falar difícil é a de que, na
verdade, essa pessoa não tem nada ou pouco a dizer. Haja vista os discursos de alguns dos nossos
políticos...
Claro que por se tratar de um texto escrito, você deve escrever usando a norma culta e com um
vocabulário acadêmico, mas isto não quer dizer que ninguém deve entender seu texto. Não fique
buscando no dicionário um sinônimo para cada palavra se você já tem uma suficientemente clara se
usada na função referencial (e denotativa, lembram?). Isto só é válido quando você quer buscar
sinônimos que evitem a repetição de um termo. Resumindo: cuidado com a coloquialidade, mas não
peque pelo oposto; lembrem-se também de que "gramatiquês" não é sinônimo de bom português.
Outra coisa comum é o uso exagerado de adjetivos que nada mudam seu texto. Observem este
trecho de uma redação que recebi:
Fanáticos religiosos, terroristas, ultra-nacionalistas de esquerda e nações dominantes se fecham
em blocos de grupos reacionários que impingem aos dominados uma abissal escravidão humana.
Enquanto isso ao sul do equador assistimos perplexos a toda essa bombástica realidade cotidiana
pelos meios de comunicação sem contudo nos darmos conta que uma outra categoria de
escravidão de uma forma bastante velada é travada cotidianamente por milhares de
trabalhadores pelos rincões do Brasil. Atraídos pelas promessas de salários dignos, moradia
gratuita e alimentação _ em busca do eldorado perdido milhares de bóias-frias deixam para trás
suas famílias e a promessa de regressarem com os louros do seu trabalho. Mas os grandes
arrebanhadores dessa farta mão-de-obra por fim dão o golpe final escravizando esses laboriosos
sonhadores com um sutil endividamento do mesmo, de credor a devedor serão obrigados a
trabalhar além mesmo do limite físico humano ao olhar atento de capangas fortemente armados.
Poderíamos entender a sua idéia de forma mais clara e menos emotiva com o uso contido dos
adjetivos, não acham? Só usem adjetivos quando fazem diferença para a compreensão de alguma
idéia (por exemplo, é fundamental eu dizer que a mesa é branca e não marrom), caso contrário,
centrem-se nos substantivos que, como o próprio nome diz, é a substância da sua frase.
Mas voltando agora à questão dos parágrafos e conectivos. Vocês sabem que a manutenção do tema
em uma redação é fundamental para a progressão textual. Os conhecimentos de certos termos de
transição, que chamamos de conectivos, ajudam a fazer esta progressão de forma clara, coesa e
coerente. Entretanto, há um meio termo para o uso destes articuladores : não se deve iniciar cada
frase com um mas também não se deve ignorá-los. O redator deve ter bom senso para perceber
quando é necessário usá-los e estabelecer as relações textuais, sem deixar o texto cansativo – ou
seja, exige uma certa sutileza que só com leitura e treino se adquire. E lembre-se de que não se
escreve um texto bem articulado e uno sem os termos de transição.
De qualquer forma, se vocês não souberem a idéia que cada um destes conectores quer passar fica
difícil mesmo empregá-los. Alguns são para somar uma informação, outros para dar ênfase, outros
são para opor idéias... Segue abaixo uma lista de alguns destes termos mais importantes e suas
funções:
1. afetividade: felizmente, pudera, ainda bem (que).
2. afirmação: certamente, com certeza, indubitavelmente, de fato, por certo.
3. conclusão: em suma, em síntese, em resumo.
4. conseqüência: com efeito, assim, conseqüentemente.
5. continuidade: além de, ainda por cima, bem como, outrossim, também.
6. dúvida: talvez, provavelmente, quiçá.
7. ênfase: até, até mesmo, no mínimo, no máximo, só.
8. exclusão: apenas, exceto, menos, salvo, só, somente, senão
9. explicação: a saber, isto é, por exemplo.
10.inclusão: inclusive, também, mesmo, até.
11.oposição: pelo contrário, ao contrário.
12.prioridade: inicialmente, antes de tudo, acima de tudo, em primeiro lugar.
13.restrição: apenas, só, somente, unicamente.
14.retificação: aliás, isto é, ou seja.
15.tempo: antes, depois, já, posteriormente.
Principais conectivos:
1. adição: e, nem, também, não só... mas também.
2. alternância: ou...ou, quer...quer, seja...seja.
3. causa: porque, já que, visto que, graças a, em virtude de, por (+ infinitivo).
4. conclusão: logo, portanto, pois.
5. condição: se, caso, desde que, a não ser que, a menos que.
6. comparação: como, assim como.
7. conseqüência: tão...que, tanto...que , de modo que, de sorte que, de forma que, de maneira
que.
8. explicação: pois, porque, porquanto.
9. finalidade: para que, a fim de que, para (+ infinitivo)
10.oposição: mas, porém, contudo, entretanto, todavia, mesmo que, apesar de (+ infinitivo)
11.proporção: à medida que, à proporção que, quanto mais, quanto menos,
12.tempo: quando, logo que, assim que, toda vez que, enquanto.
Viana, Antonio Carlos. Ed. SCIPIONE
Mas enquanto os concursos não mudam o modo arcaico de pensar ao fazer a correção de suas
redações, vamos continuar seguindo a norma padrão. Conforme prometido, nesta aula vou fazer
comentários de alguns trechos de redações que os leitores enviaram. Recebi muitas redações, li
todas e, apesar da grande heterogeneidade, há alguns pontos comuns que valem ser comentados.
Observem o trecho abaixo:
...as pessoas não são mais escolhidas pela cor e sim pelo que possam oferecer através do seu
trabalho, as mesmas são enganadas com falsas promessas de ganhos e acabam vivendo muitos
pesadelos, suas condições de vida torna-se sub humana, perde toda dignidade, seus valores morais
e financeiros são tirados, adquirem donos e senhores vivendo sob ameaça de violência e morte a
cada segundo de seus miseráveis dias.
Vamos comentar primeiro a estrutura do parágrafo acima. Tentem ler em voz alta. Fora os erros de
concordância, notaram que acabou o fôlego e nem se chegou ao final? Isto ocorre principalmente
por dois fatores: o primeiro, por uma provável falta de revisão (isso mesmo, ‘ver de novo’) ao
término da escrita; o segundo, por estarmos tão presos à coloquialidade ao escrever (e isso é
natural). Se metade dos meus alunos se dessem ao trabalho de ler o texto quando terminam de
escrever com certeza me poupariam boa parte do trabalho. Eu sei que pode dar preguiça ler tudo de
novo após passar tanto tempo escrevendo, mas acreditem, é fundamental. Quanto ao segundo fator,
é necessário mais que uma leitura para corrigi-lo: é preciso atenção e um pouco de policiamento.
Quando refletimos sobre um tema é natural termos várias idéias ao mesmo tempo pois o nosso
pensamento é assim. Contudo, não podemos passá-las exatamente do mesmo modo que nos veio à
mente, com vírgulas após vírgulas, pois o leitor nada entenderá. Lembrem-se de que o parágrafo
não é um amontoado de idéias. A característica de um bom texto escrito é a adequação ao leitor,
afinal é para este que você escreve, e um texto sem organização e clareza torna-se de difícil
compreensão.
Uma possível redação do trecho acima, mantendo as idéias, seria:
...as pessoas não são mais escolhidas pela cor e sim pelo que possam oferecer mediante o seu
trabalho. Elas são enganadas com falsas promessas de ganhos e acabam vivendo muitos pesadelos.
Assim, suas condições de vida tornam-se subumanas, perdendo a dignidade com a retirada de seus
valores morais e financeiro; passam a ter donos e senhores, e vivem sob constante ameaça de
violência e morte.
Como o tema era escravidão, a escolha lexical (ou seja, do vocabulário) permanecia dentro do
mesmo campo semântico e por isso quero ressaltar certos desvios ortográficos recorrentes . Percebi
que há muita dúvida em relação ao emprego do hífen (observaram o sub humana do texto
original?). Subumano, mão-de-obra, entre outras, são a grafia correta para estas palavras. Mas
querem saber por que as pessoas têm tanta dúvida sobre o emprego de hífens ? Observe as regras:
• Usa-se hífen com:
1. Nas palavras compostas que formem, através do conjunto, uma nova significação.
Ex. couve – flor, pára – choque, pé – de – meia
2. Nas palavras formados por prefixos que representem adjetivos
Ex. luso, latino, greco, anglo, lusitano
3. Nas palavras formados por sufixos que representem adjetivos
Ex. mirim (cobra – mirim), açu (capim – açu)
4. Ante, anti, arqui, sobre, diante de palavras que comecem por h, r, ou s.
Ex. sobre – humano, arqui – rabino, anti – higiênico, sobre - saia
5. Super, hiper, inter, diante de palavras que comecem por h ou r:
Ex. super – homem, hiper – racional, inter - regional
6. Supra, ultra, pseudo, auto, semi, neo, extra, contra diante de palavras que comecem por h, r,
ou s, ou vogais.
Ex. supra – sensível, auto – escola, extra – hipermercados, contra – raiva,
7. Ab, ad, ob, sob, sub diante de palavras que comecem por r e b.
Ex. sub – reino, ab – rogar, sob – roda, sub – bibliotecário, sub- biólogo
8. Pós, pré, pró diante de qualquer palavra.
Ex. pró – reitor, pré – escola, pós – graduação.
9. Bem, quando a palavra que se segue tem autonomia própria.
Ex. bem – aventurança, bem - ditoso
10.Sem, sota(o),vice, além, recém, aquém, sem, ex (com o sentido de estado anterior) diante de
qualquer palavra.
Ex. ex – presidente, recém – nascido, sem - cerimônia
11.Pan, mal, circum diante de palavras que comecem por h ou vogais.
Ex. mal – humorado, pan – americana, circum - esfera
Exceções: extraordinário, sobressair, sobressalente, sobressaltar, predefinir, predeterminado,
predispor, predizer, preexistir.
Haja memória para tanta regra! Para ajudá-los, lembrem-se de que a maioria dos prefixos têm hífen
diante de palavras que comecem por h, r, s ou vogal. Super só recebe hífen diante de h ou r, anti
diante de h, r ou s, mas ao menos você já fica limitado neste grupo de h, r, s ou vogal dentre as
letras do nosso alfabeto (atenção à regra 7, que aceita a letra b também, além das que recebem hífen
diante de qualquer palavra – 8 e 10).
Observem agora os trechos de outra redação:
Seria muito bom se pudéssemos dizer sim aos questionamentos apresentados. Entretanto, a Lei
Áurea, infelizmente, trouxe aos negros apenas uma liberdade formal. Essas pessoas de pele
fortemente pigmentadas, já não são mais escravos de grandes colonizadores, fazendeiros ou
latifundiários, mas trazem(,) até hoje, as marcas do passado. Continuam marginalizadas. Como
podemos perceber, o maior índice de criminosos está entre as pessoas de cor negra, assim como o
maior índice de analfabetismo, desemprego e outras misérias sociais. A história continua e essas
pessoas permanecem escravas de um regime capitalista, agora globalizado; escravas de uma
economia que divide as pessoas em ricas e miseráveis, onde esses trabalham cada vez mais para
que aqueles possam desfrutar de suas grandes fortunas.
(...)
O que percebemos diante de tudo isso, é que a sociedade se divide em dois pólos: de um lado estão
aqueles que estão cada vez mais ricos, e que, não contentes com sua situação, querem aumentar
ainda mais suas fortunas, mesmo que(,) para isso, firam os direitos primordiais das demais
pessoas; de outro lado, estão os pobres e miseráveis, os quais, para atenderem suas necessidades
básicas, entregam-se cada vez mais a trabalhos e atividades subumanas, não tendo a menor
perspectiva de subir um degrau para saírem da base da pirâmide social, onde se encontram os
marginalizados. Algumas destas pessoas percebem que a maneira mais fácil de sair dali é entrar
no mundo do crime, traficar drogas, usar armas de fogo e assaltar pessoas. Esses, também, como
as pessoas do outro pólo, acabam por perder o respeito aos seus semelhantes, ameaçando-os e até
mesmo ceifando-lhes a vida por razões banais. Tudo isso é fruto de uma sociedade que não está
interessada na igualdade entre seus cidadãos, onde alguns preferem viver no seu mundo de
comodismo e facilidades a dividir seus bens com os menos favorecidos. Agindo dessa forma,
apenas contribuem para que tais diferenças sociais aumentem cada vez mais e(,)
consequentemente, nunca cheguemos ao fim de um regime onde os pobres são escravos dos ricos e
os ricos são escravos da ganância e toda a sociedade escrava de uma violência preocupante. Com
o advento da democracia, das Constituições com a participação popular, com a defesa dos Direitos
Humanos, temos a ligeira impressão de que a escravidão não mais existe, mas ela continua a
existir de forma cada vez mais arraigada e forte nos dias atuais.
As vírgulas entre parênteses são alterações minhas, assim como os grifos que indicam os trechos
com problemas gramaticais. Além da falta do trema em conseqüentemente (não, o trema não caiu),
vale lembrar o uso do pronome relativo onde: este é usado quando refere-se à lugar. Portanto,
segundo a norma culta padrão, não se pode escrever "a lógica onde eu me baseio", "a economia
onde vivo" ou "de um regime onde sou escravo" , afinal, lógica, economia e regime não são lugares.
Um exemplo segundo a norma culta seria: "o país onde vivo", ou, "os argumentos em que me
baseio".
Além disso, sempre que você usar pronomes demonstrativos para retomar algo que foi dito, ou seja,
com função anafórica, use ‘este e aquele’ em vez de ‘esse e aquele’ – e faça a correta concordância:
...escravas de uma economia que divide as pessoas em ricas e miseráveis, na qual estas trabalham
cada vez mais para que aquelas possam desfrutar de suas grandes fortunas.
Tomem cuidado com os simplismos. Este tema da escravidão deu margem a um imaginário comum
sobre o tópico do preconceito que nem sempre corresponde à realidade. Fugir dos lugares-comuns
exige reflexão e um conhecimento além dos divulgados pela mídia. Dizer, por exemplo, que os
pobres continuam mais pobres e os ricos mais ricos, ou, que a nossa sociedade está dividida entre os
dominados e os dominadores, apesar de triste e real, não traz nada de novo ao seu leitor. Pense
sempre se o que você escreve acrescenta algo que o seu leitor já não saiba. Lembre-se de que o
processo da escrita começa muito antes do momento de sentar e pegar a caneta na mão – aliás, este
é um dos últimos passos.
Viram como apenas dois trechos destacados rendem muitos comentários? Se eu falasse de todas as
redações não sobraria espaço para mais ninguém no sítio. Para quem teve paciência de ler até aqui,
segue abaixo um bom exemplo de redação, enviada por Antonio Carlos Fernandez, tanto em
relação ao viés adotado quanto à estrutura do texto. Logo após seu texto, segue o tema para o
próximo mês. Boa sorte!
A escravidão contemporânea pode ser identificada, em vários aspectos, com a escravidão em
outros períodos da história da humanidade. Entretanto, a forma com a qual o homem é subjugado
hoje pode se dar de outras formas que só pela violência ou sua ameaça.
O escravo hoje continua sendo explorado economicamente, não recebe pagamento ou o que recebe
não representa o mínimo suficiente para sua subsistência e para manutenção de sua dignidade. O
que ocorre de diferente hoje é que, na maioria dos casos, o escravo é controlado sem saber que o é.
O vínculo não é estabelecido só pela força física, mas também pela psicológica.
Já foram noticiados casos em que empregados de fazendas do interior do Brasil trabalhavam muito
mais de oito horas diárias. Esses indivíduos eram obrigados a adquirir alimentos em pequenas
mercearias da própria fazenda em que trabalhavam e, além disso, tinham que pagar algum tipo de
aluguel por sua moradia. No final, eles trabalhavam só pela comida e, ao invés de receber um
salário, contraíam dívidas que só aumentavam. Eles não podiam abandonar a fazenda enquanto
não quitassem essas dívidas.
O escravo contemporâneo é explorado através da sua ignorância. Ele é escravo, mas não se vê
como tal. Ele é convencido que está dentro de uma relação de trabalho "justa" e que, na verdade,
ele é que tem a culpa por estar preso a essa situação.
A escravidão, velada ou não, deve ser banida de nossa sociedade. Uma das formas de atingir esse
objetivo é disseminando informação, educando essas pessoas que acabam permitindo que as
escravizem por pura ignorância, por não ter conhecimento dos seus direitos como cidadão e
trabalhador.