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INTRODUÇÃO

O Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) é considerado uma psicopatologia que se desenvolve como
forma de respostas a eventos repletos de medo e pânico aos quais uma pessoa pode ser submetida. Esses eventos são
denominados conceitualmente de trauma, que, por sua vez, é tudo aquilo que foge da esfera comum (da rotina) dos
acontecimentos, eventos ou situações reais ou presumidas, que normalmente seriam traumáticas a qualquer pessoa.
Dessa forma, o TEPT assume uma característica bastante diversa dos demais transtornos psicológicos - é
causado por um agente causador externo e identificável, ou seja, o evento traumático.
O TEPT é classificado no DSM-IV-TR (American Psychiatric Association, 2002) como um dos tipos de
transtornos de ansiedade, justamente por ser um evento que tem como uma das principais manifestações
sintomatológicas a ansiedade manifesta fisiologicamente.
Historicamente, o conceito de trauma psíquico foi introduzido pelo médico alemão Eulenberg, em 1878.
Assim ele designou a "reação a gritos e medo que ocorre após um grande trauma". Os efeitos adversos decorrentes de
experiências traumáticas foram descritos inicialmente em indivíduos que haviam participado de guerras.
Sobreviventes da Guerra Civil Americana relatavam sensação de fraqueza, palpitações e dor no peito, uma condição
supostamente biológica, que ficou conhecida como coração irritável, síndrome do esforço ou síndrome de Da Costa
(Ito e Roso, 1998).
Em seus estudos sobre o estresse traumático, Van der Kolk afirma que Charcot teria sido o primeiro a
descrever os problemas de sugestionabilidade em pacientes e a concluir que os ataques histéricos são dissociativos por
representarem experiências insuportáveis. Ressalta, ainda, que a psiquiatria como uma disciplina médica, ao seguir
Freud em suas explorações sobre o funcionamento do psiquismo, passou a focalizar a realidade intrapsíquica e a
experiência subjetiva em detrimento da realidade externa, ignorando, com isso, os traumas da vida real e relegando-os
a um segundo plano.
Embora as conseqüências emocionais da exposição a traumas sejam descritas há muitos anos na literatura
popular e técnica, foi somente em 1980, na terceira edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos
Mentais (DSM-III), da Associação Psiquiátrica Americana (APA, 1980), que o conceito de transtorno de estresse pós-
traumático (TEPT) foi introduzido, sistematizando uma variedade de conceitos como a "fadiga de batalha", o "trauma
emocional", a "neurose traumática" ou, ainda, o "choque nervoso" (Rangée Masci, 200 1).
A quarta edição do DSM (DSM-IV - APA, 1994) acrescentou um novo diagnóstico relacionado com
experiências traumáticas, o transtorno de estresse agudo, que é aplicável de modo precoce (até um mês) ao evento
traumático. Ao mesmo tempo, o DSM-IV retirou a exigência de que o estressor estivesse "fora do espectro usual da
experiência humana", reconhecendo que as experiências traumáticas são bastante usuais no transcorrer da vida de
qualquer pessoa, enquanto passou a exigir que a resposta individual envolva medo intenso, impotência ou horror
(Rangé -e Masci, 2001).
O transtorno de estresse agudo, 'definido como uma reação aguda de ansiedade de curta duração, é diferente
do estressepós-traumático apenas quanto à freqüência dos sintomas dissociativos e ao tempo de duração, que não deve
exceder quatro semanas. O transtorno de estresse agudo é considerado um fator de riscá, é o primeiro passo para o
desenvolvimento de TEPT~ geralmente ele é um diagnóstico primário, e o reconhecimento de tal diagnóstico facilita a
intervenção precoce e a recuperação dos indivíduos acometidos (Ito e Roso, 1998).

O grande problema que ocorre na formação do TEPT é que a pessoa não consegue controlar ou interferir no
curso do evento traumático; por exemplo, num acidente de trânsito, em uma situação de assalto, de seqüestro ou de
estupro, a pessoa perde o controle físico e psicológico da situação. Assim, a ansiedade experimenta níveis exacerbados
de manifestação, como se rompesse uma espécie "lacre" neuropsicológico, alterando os. padrões normais da
neuroquímica e, conseqüentemente, das cognições, dos afetos e dos comportamentos, se manifestando fora do nível
controlável e suportável para o sujeito.
Obviamente muitas pessoas passam por situações traumáticas e não desenvolvem TEPT~ entretanto, é normal
que qualquer pessoa exposta a um evento estressante desenvolva respostas características de transtorno de estresse
agudo. Por exemplo, dormir mal a noite após um grave acidente, sonhar com o fato, ter intrusão de memórias
involuntárias. Entretanto, se estas manifestações se mantiverem passadas quatro semanas, podemos considerar que
está se encaminhando uma situação de TEPT. Normalmente, a curva é descendente no que tange às manifestações de
estresse. À medida que o tempo passa, os sintomas tendem a diminuir se persistirem ou se agravarem, estamos diante
de um quadro de TEPT.

Caminha (2002), em estudos com meninas vítimas de abuso sexual infantil, demonstra que nem todas as
pessoas que passam pela situação de trauma desenvolvem TEPT~ entretanto, há uma relação diretamente proporcional
entre manter a pessoa freqüentemente exposta ao evento estressante e as manifestações de TEPT. Sendo o abuso
sexual geralmente intrafamiliar, as crianças ficam em média 1,5 anos expostas a ele até ocorrer alguma forma de
denúncia, tempo suficiente para que sutjam as respostas características de TEPT.

Numa escala de O a 10 para classificarmos a intensidade da manifestação traumática, por exemplo, não
podemos dizer que um sujeito que sofre exposição a um evento de impacto 10 venha a desenvolver necessariamente
um nível 10 de estresse, entretanto, continuamente exposto ao trauma algum nível de estresse irá despontar na medida
escalar proposta para avaliação.

Em 1997, o Jornal da Associação Médica Americana (JAMA) elaborou um ranking, a partir da medida do
componente dissociativo da personalidade, dos eventos mais estressantes aos quais as pessoas poderiam estar
submetidas. Em primeiro lugar, ficou submeter alguém a uma reclusão em campo de concentração, ficando em
segundo lugar abuso sexual infantil~ levando-se em conta que situações de campo de concentração são raras em países
com regime democrático, podemos considerar que o abuso sexual infantil é definitivamente a pior forma de trauma à
qual uma pessoa pode ser exposta (Dancu e Foa, 1998~ Calhoun e Resick, 1999~ Perry, 1998).

Yehuda & Davidson (2000) referem que estudos recentes da prevalência do TEPT têm demonstrado que este
é o quarto distúrbio psiquiátrico mais comum, afligindo em média 10,3% dos homens e 18,3% de mulheres em algum
momento de suas vidas. A alta prevalência na população norte-americana, atualmente, relatam os autores, é
primariamente causada pelas estarrecedoras taxas de violência interpessoal naquela sociedade. O transtorno tam-
bém pode ser desenvolvido após desastres naturais e acidentes. Estimativas citadas por Davidson et aI. (1991)
sugerem que a maioria da população experienciará ao menos um evento extremamente traumático durante o curso de
suas vidas, e aproximadamente, 25% dos sobreviventes de trauma irão desenvolver TEPT.

CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS

O transtorno de estresse pós-traumático (DSM-IV-TR, 2002) é referido quando: .


A. Exposição a um evento traumático no qual os seguintes quesitos estiverem presentes:
(1) a pessoa vivenciou, testemunhou ou foi confrontada com um ou mais eventos que envolveram morte ou
grave ferimento, reais ou ameaçadores, ou uma ameaça à integridade física, própria ou de outros~
(2) a resposta da pessoa envolveu intenso medo, impotência ou horror.
B. O evento traumático é persistentemente revivido em uma ou mais das seguintes maneiras:

(1) recordações aflitivas, recorrentes e intrusivas do evento, incluindo imagens, pensamentos ou percepções;
(2) sonhos aflitivos e recorrentes do evento;
(3) agir ou sentir como se o evento traumático estivesse ocorrendo novamente (inclui um sentimento de
revivência da experiência, ilusões, alucinações e episódios de flashbacks dissociativos, inclusive aqueles que ocorrem
ao despertar ou quando intoxicado);
(4) sofrimento psicológico intenso quando da exposição a indícios internos ou externos que simbolizam ou
lembram algum aspecto do evento traumático;
(5) reatividade fisiológica na exposição a indícios intemos ou extemos que simbolizam ou lembram algum
aspecto do evento traumático.
C. Esquiva persistente de estímulos associados com o trauma e entorpecimento da reatividade geral
(não presénte antes do trauma), indicados por três (ou mais) dos seguintes quesitos:
(1) esforços no sentido de evitar pensamentos, sentimentos ou conversas associadas com o trauma; (2)
esforços no sentido de evitar atividades, locais ou pessoas que ativem recordações do trauma; (3) incapacidade de
recordar algum aspecto importante do trauma;
(4) redução acentuada do interesse ou da participação em atividades significativas; (5) sensação de
distanciamento ou afastamento em relação às outras pessoas;
(6) faixa de afeto restrita (p. ex., incapacidade de ter sentimentos de carinho);
(7) sentimento de um futuro abreviado (p. ex., não espera ter uma carreira profissional, casamento, filhos ou
um período normal de vida).
D. Sintomas persistentes de excitabilidade aumentada (não presentes antes do trauma), indicados por
dois (ou mais) dos seguintes quesitos:
(1) dificuldade de conciliar ou manter o sono; (2) irritabilidade ou surtos de raiva;
(3) dificuldade em concentrar-se;
(4) hipervigilância;
(5) resposta de sobressalto exagerada.
E. A duração da perturbação (sintomas dos critérios B, C e D) é superior a 1 mês:
F. A perturbação causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou
ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
Especificar se é:
AGUDO: se a duração dos sintomas é inferior a 3 meses.
CRÔNICO: se a duração dos sintomas é superior a 3 meses.
Especificar se:
COM INÍCIO TARDIO: se o início dos sintomas ocorre pelo menos 6 meses após o estressor.
Há ainda algumas características relativas à compreensão do diagnóstico de TEPT. Diante das mudanças
drásticas, imprevisíveis, ameaçadoras ocorridas no ambiente, isto é, quando ocorrem eventos que quebram a
homeostase interna, dos processos neurocognitivos, os mecanismos de respostas ao estresse são ativados. Entre os
mecanismos ativados temos o sistema nervoso central, o sistema nervoso periférico, o sistema neuroendócrino e, por
fim, o sistema imunológico, sendo que os sistemas ativados agem a fim de promover a adaptação das funções básicas
de sobrevivência. Ao ocorrer a redução do nível de estresse, os sistemas ativados pelo trauma tendem a voltar ao
antigo estado de equilíbrio (Perry e Pollard, 1998). Assim, o diagnóstico de TEPT é realizado após a pessoa
experienciar um ou mais eventos traumáticos avassaladores e reagir com medo ou comportamento de esquiva de um
modo contínuo.
Cabe destacarmos que o transtomo de estresse pós-traumático é formado, ainda, por três dos critérios das
seguintes categorias de sintomas, presentes por no mínimo um mês após o evento traumático: "1) reexperiência
intrusiva do trauma; 2) evitação persistente dos estímulos associados com o trauma e 3) sintomas persistentes de aUf!
1ento da estimulação fisiológica?' (De Bellis et aI. 1999). Autores como Post & Weiss (1998) sugerem que o TEPT,
por definição, envolve um estressor traumático .Sendo este estressor de magnitude traumática suficiente e, por
defmição, de intensa emoção, desencadeará uma cascata de eventos psicológicos e neurobiológicos ligados após o
estímulo desencadeante. A fase inicial aguda do impacto pode estar associada com dor, horror, medo e terror e talvez
levar para elementos dissociativos, os quais são prognósticos para o desenvolvimento do TEPT.
Passando a fase aguda, há tendências a períodos de paralisação/entorpecimento, embotamento ou descrença.
Há ainda, o agravamento da memória inicial (registro primário) de um lado, por meio das memórias visuais, ou de
outro lado, pelo fenômeno de reexperiência da situação traumática na via cognitiva e comportamentais

MODELOS

Para que possamos ter uma dimensão ampla a respeito da formação e manutenção dos esquemas
cognitivocomportamentais desadaptativos de TEPT, temos de nos remeter aos modelos explicativos, desde o
comportamentalismo até os atuais modelos explicativos neuropsicológicos e cognitivos.
A primeira teorização comportamental surge a partir dos trabalhos de Mowrer (1947), com a chamada "Teoria
dos dois fatores" que aborda dois princípios básicos na formação do comportamento reativo ao trauma, o
condicionamento clássico, pavloviano, ou de Tipo I, e o condicionamento skineriano, operante, ou de Tipo 11.
A ansiedade é um padrão de resposta incondicionado; não precisamos ensinar ninguém a tê-Ia. Ela é um
conjunto de reações fisiológicas referentes à emissão de comportamentos de luta ou fuga, diante da situações
perigosas. Sob a ótica darwiniana, são respostas adaptativas que evitam que o organismo não reconheça e se exponha
a situações potencialmente perigosas. Em última instância, a ansiedade está ligada à preservação da vida.
É absolutamente natural, portanto, que haja uma forma de condicionamento pavloviano através de
pareamentos de estímulos neutros e condicionados. Diante da intensa manifestação de ansiedade que uma pessoa
experimenta quando é assaltada em uma rua escura, à noite é natural que ocorra o emparelhamento de estímulos, ou
seja, estímulos neutros para gerar ansiedade como a rua escura (EN) passam, pelo pareamento na lógica pavloviana a
serem estímulos condicionados (EC) capazes de gerar respostas condicionadas (RC) de ansiedade. Desse modo, seria
natural que uma pessoa sentisse seu nível de ansiedade aumentar quando estivesse novamente em uma rua escura.
Na lógica do modelo de condicionamento clássico, seria correto esperarmos que houvesse a extinção das
respostas condicionadas com o passar do tempo, se não houvesse nova exposição ao evento traumático. Para
compreendermos o motivo da permanência dos padrões de respostas de ansiedade, temos de apelar ao
condicionamento operante de Skinner.
O modelo operante skinneriano nos proporciona fatores para uma compreensão um pouco mais além do
esquema pavloviano. É através dele que conseguimos entender como se mantém o esquema de respostas de esquiva
geradas pelo aumento de ansiedade para a pessoa. Quando a pessoa evita sair à rua pela ansiedade sentida ao estar
exposta novamente à situação originária do trauma, ela está reforçando negativamente o esquema de esquiva, fazendo
com que a resposta de esquiva aumente de freqüência, ou seja, não sair à rua supostamente permite o controle ou a
redução da ansiedade para a pessoa.
Seligmann (apud Caballo, 2003) contribui para a compreensão da formação de respostas de TEPT através da
teoria do desamparo aprendido. A equação proposta pelo autor sugere que, diante de um estímulo aversivo surgem
reações (respostas) de desamparo, tendo como produto final a dificuldade de aprendizagem e a emissão de novos
padrões de respostas. O modelo explicaria o comportamento depressivo inerente aos pa~ientes que desenvolvem
TEPT, bem como a perceptível redução do padrão de respostas nos mais diversos níveis de interação com o ambiente
(social e afetivo).
Os modelos comportamentais possuem parcial capacidade de explicação do fenômeno. Parcial, porém
indispensável para uma compreensão e entendimentos amplos do TEPT.
Os modelos comportamentais deixam de fora os processos cognitivos, entre eles uma das principais funções
cognitivas, que possui papel fundamental tanto na formação quanto no tratamento de TEPT - a memória.
Na segunda metade dos anos 70 surge o modelo psicodinâmico que se propõe a explicar a formação de
respostas traumáticas - o modelo de Horowitz (apud Caballo, 2002).
Conforme o autor, a capacidade de adaptação do sujeito ao evento traumático requer e depende de sua
incorporação nos esquemas pré-existentes no repertório do sujeito ou o subseqüente desenvolvimento de novos
esquemas.
A novidade que modelos corno o de Horowitz (2003) começam a trazer à tona é de que a formação dos
esquemas geradores de ansiedade e esquiva no TEPf seria resultante da incapacidade do sujeito de processar a
informação adequadamente, ou seja, os processos cognitivos estariam agindo corno se não conseguissem fazer a
"digestão mental" da situação traumática.
Para Horowitz (apud Caballo, 2002), há dois pontos fundamentais na formação dos sintomas:
• Sintomas de revivência: tentativa de processar e integrar o evento traumático, tendo corno produto
a ativação da emoção.
• Sintomas de esquiva e diminuição da responsividade: que agiriam na tentativa de controlar a
emoção e regular o processamento da informação.
Na mesma lógica do modelo cognitivo de Horowitz (apud Caballo, 2002), surge a proposta desenvolvida por
Lang (1979), chamada de Teoria do Processamento Emocional.
Conforme Lang (1979), o processamento emocional se dá a partir da rede de informações que o sujeito possui
na memória sobre a situação temida, sobre respostas comportamentais emitidas normalmente nessas situações e sobre
os significados (semânticos; afetivos) atribuídos à situação temida e aos comportamentos emitidos.
Creamer et aI. (1992) desenvolvem, já na década de 90, um modelo cognitivo-comportamental explicativo da
formação de TEPf. A base do modelo sugere que o sucesso na recuperação da exposição a um evento traumático
depende do processamento e da integração do ocorrido nos esquemas cognitivo-comportarnentais já existentes.
São descritas cinco etapas para que ocorra a formação de respostas consideradas patológicas:
Exposição objetiva: requer que ocorra um evento traumático;
Acionamento de rede de informações pré-existentes, incluindo percepções subjetivas e significados atribuídos
ao evento ocorrido;
Revivência: seria um tentativa de resolver e integrar o ocorrido, gerando o processamento da informação;
Esquiva: surge corno tentativa de reduzir a ansiedade provocada pelos sintomas de revivência e situações
condicionadas ao trauma;
Sucesso ou fracasso na formação de TEPT: depende da capacidade de ocorrência do processamento da
informação, ou seja, se o processamento foi completado e assimilado.
O modelo de Jones e Barlow (1990) possibilita que haja urna compreensão na formação de TEPT, incluindo-
se no processo, desta vez, a vulnerabilidade biológica. Segundo os autores, algumas pessoas teriam urna
predisponibilidade a responder ao estresse com hiperexcitabilidade autonômica (relativa ao Sistema Nervoso Central
Autônomo, envolvendo, portanto, respostas simpáticas).
Conforme o modelo, é necessário que haja:
• Evento traumático que seja imprevisível e incontrolável;
• Predisponibilidade autonômica;
• Hipervigilância (respostas hiperativas naturais pós-trauma);
• Foco seletivo de atenção às informações ameaçadoras, reais ou presumidas;
• Esquema condicionado de revivência do trauma.
Numa óptica mais ampla ainda, em termos de fatores ligados ao surgimento do transtorno, Keane et aI. (apud
Ito e Rosso, 1998) apontam para a importância de um novo fator implicado tanto no surgimento quanto na reabilitação
de pacientes com TEPT - o amparo social.
Amparo social pode ser considerado corno a situação de pertencimento a diversos grupos dos arranjos sociais;
por exemplo, pertencer a urna farru1ia, a urna escola, urna igreja, um grupo de amigos, um clube, ter a quem recorrer
quando necessita de apoio afetivo, financeiro, de saúde, enfim, ter referências simbólicas e concretas.
Quanto maior a "plasticidade .social" de um sujeito, maior sua condição de reparar os efeitos de estresses
ambientais circunstanciais. A afirmação é válida tanto para os efeitos da violência doméstica sofrida por crianças e
adolescentes quanto para uma doença psiquiátrica, como a depressão na vida adulta. Pacientes em tratamento
psicológico por transtornos de humor ou de ansiedade apresentam melhores resultados em terapia quando possuem
amparo social do que os pacientes que não o possuem ou o possuem num nível pouco amplo. Amparo social,
conforme Caminha (2003), é não apenas significativo para a remissão de sintomas de estresse como também
preventivo, ou seja, quanto maiores a plasticidade e as habilidades sociais do sujeito, menor a probabilidade de sofrer
os impactos do estresse.
Atualmente, nos Estados l.Tnidos e no Canadá, existem grupos de adultos chamados de "sobreviventes" da
violência doméstica. Quando essas pessoas eram crianças, não havia em seus países a mesma estrutura de proteção à
infância que há nos dias de hoje.
Muitos desses adultos formam grupos de auto-ajuda para falar de suas experiências na infância e os efeitos
dessas memórias em suas vidas atuais.
Os componentes desses grupos são as vítimas da violência doméstica que não sucumbiram à transgressão
social, portanto, não estão em presídios, nem desenvolveram psicopatologias que os impossibilitaram de levar a vida,
nem estão internados em instituições psiquiátricas como pacientes crônicos, embora possam ter tidos internações ou
passagens pela polícia ao longo de suas vidas.
Essas pessoas apontam que conseguiram manter a saúde mental graças ao amparo, a rede social de que
dispunham na época, e entre os entrevistados muitos apontam o papel da escola e particularmente do professor como
um amparo, uma mão amiga, num momento muito estressante e complicado de suas vidas.
A sociedade, em virtude dessa plasticidade, gera mecanismos facilitadores da organização social menos
estressante e caótica, conseqüentemente, favorece tanto a reabilitação de paciente com o quadro de TEPT quanto a
evitação do desenvolvimento do quadro.
Sempre foi evidente ao pesquisador que atua junto a pacientes que desenvolvem TEPT que essa patologia é
deveras debilitante para o sujeito submetido ao trauma; entretanto, antes do início dos anos 90 ninguém havia
encontrado os resultados descritivos do efeito de TEPT na estrutura neuropsicológica dos pacientes.
Os exames clínicos, os testes neuropsicológicos, os checklists, nos deixavam claro que algo de muito grave
deveria ocorrer nas estruturas relacionadas às funções psíquicas superiores dos pacientes examinados. A pergunta que
pairava sem resposta era a seguinte: o trauma psíquico é capaz de gerar alteração na arquitetura neural dos pacientes
com TEPT?
Perry (1997), num artigo intitulado "Encubados no Terror", demonstrou que crianças vítimas de violência
doméstica possuíam um impacto negativo sob seus desenvolvimentos neurológicos. O autor demonstrou que o cérebro
é capaz de alterar sua arquitetura neural em resposta às alterações hormonais motivadas pelo estresse, sendo que,
numa amostra de doze crianças severamente maltratadas, sete delas apresentaram atrofia corticaI.
Os resultados do autor apontam ainda para diminuição da capacidade de modulação da impulsividade nas
áreas subcortical e cortical, com diminuição das áreas nas crianças severamente vitimadas.
Conforme os trabalhos de Perry (] 997), sabemos que o cérebro modula sua estrutura; entretanto, são os
trabalhos de Edelman (2000) que nos dão pistas mais contundentes do motivo pelo qual ocorrem essas modulações.
Há tendências, pela plasticidade neural, do estabelecimento de "homeostases urgentes", ou seja, uma
reorganização cerebral que permita a adaptação à nova ordem do meio ambiente.
O cérebro humano funciona pela lógica do darwinismo neural, o que quer dizer que todá modulação
decorrente do trauma nada mais é do que uma tentativa de resposta adaptativa à nova ordem imposta por eventos que
quebram os esquemas rotinas, até então, gerenciadores cognitivo-comportamentais.
A repercussão é sentida não apenas na estrutura neural, mas também em seus efeitos funçionais, como nas
cognições formadas a partir do evento traumático, nas impressões afetivas, nos comportamentos e nas reações
fisiológicas.
Podemos evidenciar dois importantes tipos de processos de reação ao estresse, os chamados SRPs: um
relacionado ao estresse controlado (SRP-controlável), ou seja, o sujeito consegue por si mesmo "dar conta" do
estresse, o qual não causa maiores danos a ele; e outro relacionado ao estresse incontrolável (SRP-incontrolável), no
qual a demanda das experiências estressantes provoca prejuízos ao sujeito, uma vez que sozinho ele não possui
estratégias de coping adequadas para terminar com o estresse (Huether et aI. 1999) .
Adultos do sexo feminino e masculino com TEPT que sobreviveram ao Holocausto quando eram crianças e
adolescentes apresentaram baixo nível de cortisol liberado na urina, se comparados a sobreviventes de outros traumas
severos. Em outros dois estudos, concentrações de 24h - UFC eram mais altas em homens (veteranos de guerra) com
TEPT, comparados a veteranos sem TEPT, e em mulheres com esse transtorno sobreviventes de abuso sexual durante
a infância, comparadas com mulheres abusadas na infância sem o transtorno e com mulheres não-abusadas do grupo
controle.
Um grande número de comorbidades são decorrentes clinicamente de TEPT na infância, sendo elas:
depressão, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, transtorno dissociativo e demais transtornos de ansiedade
(Perry, 1999).
O transtorno de hiperatividade com déficit de atenção (THDA) costuma ser uma das comorbidades mais
comuns em TEPT originado pela violência doméstica. O THDA, por sua vez, é capaz de desencadear, ainda,
comportamentos de dificuldades de limites e cumprimento de regras sociais, agressividade, crises de raiva, mentiras,
furtos e outras manifestações de transtorno desafiador opositivo (IDO), transtornos de conduta, flashbacks autônomos,
pesadelos, hiperestimulação, intenso sobressalto e sensação de entorpecimento (Post e Weiss, 1998).

TÉCNICAS COGNITIVAS E COMPORTAMENTAIS


Algumas técnicas presentes na literatura sobre TEPT já podem ser consideradas clássicas na abordagem do
transtorno, entretanto, não há tratamento que funcione se o sujeito continuar exposto ao evento estressante. Para que
haja tratamento é necessário, antes de qualquer coisa, cessarmos a exposição do sujeito ao evento gerador de estresse.
O segundo grande passo a ser dado no tratamento do TEPT é uma sólida aliança terapêutica, já que os
pacientes que foram expostos a situações traumáticas possuem a sensação de controlar as memórias traumáticas não
falando sobre elas. Havendo a necessidade de falar sobre elas, há sempre um grande sofrimento psíquico, com forte
componente emocional associado.
O modelo utilizado tem início justamente na abordagem das fortes emoções que as memórias produzem
quando acionadas. Para que o paciente consiga aderir ao modelo e estabelecer uma relação terapêutica de confiança,
são utilizados elementos da "entrevista motivacional", conforme o modelo de Miller e Rollnick (2001).
Entre as técnicas utilizadas em TEPf, encontramos: o treinamento de inoculação do eStresse, derivado da
Teoria da Aprendizagem comportamental, desenvolvido originariamente por Meichenbaum (1974), adaptado ao
formato individual ou grupal (Kilpatrick et al., 1982); a teoria do processamento emocional de Lang (1979) sugere que
a exposição repetida à lembrança traumática num ambiente controlado, terapêutico, irá gerar a habituação ao medo e
posterior modificação do esquema disfuncional de esquiva; as técnicas de exposição através da dessensibilização
sistemática, desenvolvida originariamente por Wolpe (1958); Foa & Kozac (1986) se utilizam bastante da exposição,
sugerindo que por meio dela a memória poderia alterar sua estrutura semântica, gerando um registro mnêmico mais
preciso e atual e integrando o trauma aos esquemas cognitivos pré-existentes; técnicas derivadas da terapia de
processamento cognitivo (Astin e Resick, 2002), tendo como princípio básico a idéia de que as emoções não surgem
apenas do trauma, mas das interpretações que os indivíduos fazem do fato ocorrido e do modo como se perceberam
diante da ocorrência do trauma.
Nesta lógica, o forte afeto gerado pela lembrança do fato é algo a ser evitado pelos pacientes expostos ao
trauma. O não processamento dessa experiência traumática dar-se-ia justamente pela evitação de lembranças e reações
afetivas decorrentes do trauma; finalmente, Shapiro (1995) desenvolveu a teoria do reprocessamento e a
dessensibilização por meio de movimentos oculares - EMDR (Eye Movement Desensitization and Reprocessing
therapy), tendo como foco central a idéia de que os movimentos oculares laterais facilitavam a iniciação do
processamento cognitivo do trauma por parte do paciente. Entretanto, Astin e Resick (2002) sugerem que a EMDR
carece de maiores estudos empíricos e muitos de seus resultados positivos se devem mais à exposição à lembrança
traumática e aos estímulos geradores de ansiedade, à facilitação do processamento da informação, do que aos
movimentos oculares propriamente ditos.
Caminha e Habigzang (2003) desenvolveram um modelo de tratamento para TEPT com crianças vítimas de
violência doméstica (abusos físicos e sexuais) e adultos vítimas de violência que têm por base o início do tratamento
focado no afeto (sentimentos) gerado a partir do trauma, conforme o esquema abaixo:
Os sentimentos são aquilo que há de mais intenso no TEPT, mais perceptível para o paciente, por isso, o
modelo que desenvolvemos tem como porta de acesso para o tratamento à reação afetiva que o paciente apresenta
frente aos estímulos emparelhados.
As demais funções a serem trabalhadas, as cognições, o comportamento e as reações fisiológicas são
introduzido s no decorrer da conceitualização e educação do paciente quanto ao modelo e quanto à patologia.
O tratamento desenvolvido por Caminha e Habigzang (2003) apresentou os seguintes resultados no tratamento
grupo terápico com crianças vítimas de abuso sexual: 83% de eficácia na redução clínica dos sintomas de TEPT,
controle de memórias traumáticas, melhor rendimento escolar, sociabilidade em família e núcleos externos, redução da
raiva e comportamentos agressivos, hipersexualizados e culpabilidade pelos abusos, sendo que os paciente que não
obtiveram resultados positivos com o tratamento tinham baixíssimo amparo social, por exemplo, crianças abrigadas,
sem referências familiares, afetivas e com forte história de abandono.
O modelo de Caminha (2002) utiliza tanto no tratamento grupal quanto individual o seguinte conjunto de
técnicas integradas:
• Técnicas de Entrevista Motivacional na Aliança Terapêutica
• Automonitoramento (RPDs; afetivogramas)
• Treino de Inoculação Estresse (TIE)
• Treinos de Auto-Instrução (TAl)
• Treinamento de Habilidades Sociais (THS)
• Técnicas de Relaxamento Muscular Progressivo e Respiração
• Dessensibilização Sistemática (pareando memórias)
• Aliança Terapêutica com Amparo Social
• Técnicas de Prevenção à Recaída
O automonitoramento é feito através dos registros de pensamentos Diários (RPDs), os "afetivogramas"
(monitoramento da alteração de humor), objetivando obter quando e onde o paciente sente fortes alterações em
seus sentimentos, ponto de partida do tratamento. ,
Entre as possíveis técnicas utilizadas para o tratamento a literatura aponta eficácia do treino de
inoculação do estresse como importante instrumento para a ressignificação da memória traumática e
aquisição de habilidades de manejo.A técnica pretende dar ao paciente uma sensação de domínio sobre seus
medos através do ensino de habilidades de manejo, a abordagem deve ser talhada para os problemas
individuais e as necessidades de cada paciente. Esta flexibilidade possibilita sua aplicabilidade tanto em
âmbito individual quanto grupal.
O TIE enfatiza as complexas relações interdependentes entre os fatores afetivos, cognitivos,
comportamentais, fisiológicos , e sócias / ambientais.

O TIE desenvolve-se em fases. Calhoun e Resick (1999) dividem o tratamento em duas fases. A primeira
prepara o paciente para o tratamento, incluindo assim um enfoque educativo que permite a compreensão da natureza e
origem do seu medo e ansiedade. Os autores utilizam uma explicação I"mbasada na teoria da aprendizagem social.
Juntamente com esta, é fornecida uma explicação quanto o modelo cognitivo-comportamental, na qual as reações de
ansiedade são compreendidas a partir de três canais (Lang, 1977): 1) o canal físico ou autônomo, 2) o canal
comportamental ou motor e 3) o canal cognitivo. A segunda fase é o treinamento de habilidades de manejo, na qual são
ensinadas pelo menos duas delas para cada um dos três canais. Ela inclui, em seqüência, uma defmição da habilidade de
manejo, uma base racional, uma explicação do mecanismo pelo qual a habilidade funciona, uma demonstração da
habilidade, a aplicação da habilidade pelo paciente em uma área problemática que não esteja relacionada com os
comportamentos visados, uma revisão de como funcionou e, finalmente, a aplicação e a prática da habilidade com um
dos medos focalizados.
O modelo proposto por Deffenbacher (1996) também implica fases sobrepostas: 1) Reconceitualização, 2)
"AquIsição e ensaio de habilidades, e 3) Aplicação e consolidação.

Na fase da reconceitualização, o terapeuta deve desenvolver uma relação colaborativa com o paciente para que
juntos possam realizar uma detalhada avaliação clínica para compreender conjuntamente as preocupações do paciente.
Nesta fase, é importante conhecer a percepção e a defmição do problema pelo paciente. Em seguida, deve ser realizado
um mapeamento da gravidade e impacto do problema, considerando a freqüência da resposta, sua magnitude, duração,
amplitude, conseqüências e resultados. Também é necessária uma compreensão situacional do problema, assim como
dos aspectos comuns e padrões envolvidos. O auto-registro e a recordação através da imaginação são importantes
instrumentos que viabilizam a reconceitualização. Neste processo, o paciente recorda a experiência relevante,
delineando os detalhes da cena de forma gradual. A segunda fase desenvolve habilidades de afrontamento necessárias.
As intervenções podem incluir a reestruturação cognitiva para o diálogo disfuncional consigo mesmo, o treinamento em
relaxamento para ativação emocional e fisiológica, o treinamento comportamental para os déficits em habilidades, o
treinamento em resolução de problemas, o treinamento em autoeficácia e auto-reforço, entre outros. As habilidades e as
estratégias são ensaiadas, revisadas e aperfeiçoadas. A última fase garante a aplicação às situações-problema e sua
transferência ao mundo externo. À medida que a atuação em vivo desenvolve-se satisfatoriamente, o esforço é dirigido à
manutenção e à prevenção das recaídas.
No tratamento de crianças vítimas de abuso sexual que apresentam TEPT em decorrência dessa experiência
traumática, o TIE utilizado como dispositivo para ativar a memória traumática e detalhar os estímulos desencadeantes de
lembranças intrusivas, sendo esta fase da técnica a mais importante e com maior eficácia terapêutica, conforme Caminha
(2002) em seu modelo de técnicas integradas.
Neste processo, o paciente apresenta de forma gradual as situações abusivasexperienciadas e o terapeuta faz uma
mediação, para que a memória possa ser alterada semanticamente, ou seja, a memória é reinterpretada, resignificada;
busca-se desativar o sistema de replay anteriormente estabelecido. Essa mediação é realizada por meio de técnicas
cognitivas, tais como a reestruturação cognitiva e o ensaio cognitivo, treino de autoinstrução (metacognição), que
possibilitam que o paciente elabore uma releitura sobre o ocorrido, gerando uma explicação mais funcional e adequada
para o evento traumático.
O tratamento busca a reestruturação cognitiva, comportamental, afetiva e fisiológica. As habilidades de manejo
ensinadas e as estratégias construídas para lidar com as lembranças intrusivas do trauma proporcionam ao paciente
respostas mais funcionais, estabelecendo relações intra e interpessoais mais adaptativas.
O TEI é a base do tratamento, visto que por meio dele acessamos a memória traumática e os estímulos
emparelhados através das qualidades associativas e de generalização que a memória humana possui.
No modelo integrado, os terapeutas criam junto aos pacientes repertórios multisensorias relativos a memória
traumática, mas o fazem igualmente para memórias com valência positiva (boas lembranças). O paciente aprende a
evocar voluntariamente as memórias com diferentes valências, com razão intercalada, gerando uma forma de
dessensibilização sistemática .
A memória funciona na lógica didática trabalhada com as crianças como se fossem gavetas: a gaveta vermelha é
a memória traumática que abre involuntariamente e traz à tona todos os efeitos relativos ao trauma, há ainda gavetas de
outras cores pontuadas de lembranças positivas, que podem ser evocadas voluntariamente (metacognitivamente) para
contrapor a gaveta vermelha. Há ainda um chamado "Botão de Emergência", utilizado como estratégia metacognitiva de
percebermos que a gaveta vermelha está aberta e que é necessário intervirmos no processo voluntariamente.
O início do trabalho se dá através do ato de colher os dados que compõem multisensorialmente a memória
traumática, bem como as memórias positivas.
No sistema de avaliação terapêutico desenvolvido por Caminha (2002), usando as técnicas integradas adaptadas,
que avaliou crianças vítimas de abuso sexual, bem como mulheres adultas que haviam sido abusadas na infância, foram
encontradas amostras de emparelhamentos de estímulos em níveis diversos.
O autor desenvolveu um sistema de intervenção na memória chamado de "Mapa da Memória Traumática", que,
baseado na Teoria do Processamento Emocional de Lang (1977), nos estudos de Foa e Kozac (1986) e nos recentes
achados da neuropsicologia do trauma, remete o paciente a avaliações e descrições multisensoriais da memória.
As descrições multisensoriais recorrentes do trauma envolvem relatos de pacientes, avaliando-se os mais
diversos níveis de percepções: sentimentos, comportamentos, pensamentos, reações fisiológicas, percepções visuais,
táteis, gustativas, olfativas, sonoras e auditivas (imagens, cheiros, texturas, sabores, temperatura, sons).
Caminha e Habigzang (2003) apresentam o seguinte relato relativo à técnica descrita:
Paciente 1 (menina de 11 anos, vítima de abuso sexual): "Uma das lembranças 'mais ruins' que tenho era
quando ele me pegava e me jogava na cama. Ele começava a tirar minha roupa, e, como eu me debatia muito, não
querendo aquilo ele começava a me bater na cara; sempre ele me machucava muito e, principalmente não tendo como
me defender, ai que ele me machucava ainda mais. Isso acontecia em minha casa e na cama de minha mãe; geralmente
acontecia isso quando minha mãe não estava em casa e quase sempre em dias chuvosos, porque aí a porta ficava
fechada e ninguém desconfiava. O único barulho que eu escutava era a voz dele me xingando. Talvez seja por isso que
não gosto muito de ficar em casa e principalmente sozinha" (sic).
Paciente 2 (menina de 12 anos, vítima de abuso sexual): "Aconteceu na garagem encostada no carro.
Não tinha barulho, estávamos sozinhos. Tinha cheiro de gasolina. Ele estava passando a mão no meu corpo e,
quando ele me segurava, dizia que o que ele fazia não era para eu contar para ninguém, porque senão ele faria coisa
pior. Eu sempre dizia que nunca iria contar, porque eu sempre ficava com medo que ele prejudicasse a minha família".
(sic).
Numa outra situação, um paciente adulto masculino (32 anos), vítima de assalto com seqüestro, foi posto no
porta-malas do carro após ser agredido com socos e pontapés. O paciente, ao reviver suas memórias
multisensorialmente, relata que o assalto ocorreu à noite, após uma abordagem numa rua tranqüila e pouco iluminada da
cidade, depois de ter saído da casa de sua namorada.
Relata que os assaltantes eram dois homens fortes e altos, um negro e outro branco; que quando foi colocado no
porta-malas do carro sentia cheiro de óleo queimado do escapamento de seu carro; que o som estava muito alto, a ponto
de não conseguir ouvir nada do que os assaltantes falavam; que sentia a textura de forração do porta-malas lhe
machucando pela fricção quando se mexia; que o carro era conduzido em alta velocidade; que estava frio, embora o
paciente suasse muito; que sentiu sintomas típicos de c1austrofobia, embora nunca houvesse manifestado tal
sintomatologia anteriormente. Pela descrição dos sintomas, ele teve reações semelhantes a um episódio de pânico,
manifestações que voltou a experimentar após a situação traumática, quando acionado por estímulos que não era capaz
de relacionar voluntariamente com o fator desencadeante.
Estas informações foram obtidas depois de repetidos relatos do paciente sobre a memória traumática. Em cada
situação de relato, o terapeuta monitorava constantemente todas as reações relativas a afetos e, posteriormente,
cognições, comportamentos e reações fisiológicas esboçadas pelo paciente.
~ O objetivo desses relatos além da inoculação do estresse e do processamento emocional , (Lang, 1 9 7 "1 é;
)
conforme Caminha (2002), o desenvolvimento de estratégias metacognitivas através de treinos de autoinstrução.
O objetivo da atitude metacognitiva de autoinstrução é o de desassociar as generalizações que a memória produziu e
emparelhou pelo estresse. Funciona como se estivéssemos, através da atitude metacognitiva, corrigindo "erros de linhas
de programa" emitidas no processamento de informação.
Desse modo, trabalhamos com o "Mapa de Memória" do trauma, obtido através dos relatos multisensoriais.
Assim, dividimos a capacidade associativa da memória em três níveis diversos, que chamaremos: estímulos
emparelhados em nívell (EEI); estímulos emparelhados em nível 2 (EE2); e, por fim, é possível que se formem ainda
estímulos emparelhados em nível 3 (EE3), conforme o exemplo abaixo.

Memória
EEl EE2

(fluxo do
emparelh amento) Noite
Lugares fechados (el evador)

I
Rua Carro em velocidade
elevada
Evento Cheiro de

Traum ático óleo

(assa lto)
Replay
O exemplo acima demonstra as características associativas e a tendência à
generalização que a memória possui. Os EEI são situações geradoras de ansiedade, que
o processamento central de informação é capaz de relacionar os estímulos
desencadeantes de ansiedade diretamente com o evento traumático, ou seja, o sujeito é
capaz de identificar que, quando ele está na rua ou sente cheiro de óleo, lembrar-se da
situação do assalto com seqüestro e isso lhe gera grande ansiedade.

Entretanto, há os EE2; por exemplo, quando o paciente está num elevador,


começa a sentir ansiedade; quando anda de carro com algum amigo ou parente e o carro
desenvolve uma velocidade um pouco acima do normal há manifestações claras de
ansiedade. Nestes casos de EE2, se formaram esquemas, processamentos em paralelo,
procedurais, em que o sujeito não relaciona os estímulos desencadeantes da ansiedade
com o fato traumático. Em suma, o cérebro não é capaz de relacionar conscientemente
(processamento central) que sente medo, em razão de ter estado em contato com esses
estímulos durante o assalto, que os estímulos revivem o assalto.
Rá, ainda, a possibilidade de encontrarmos na montagem do "Mapa da
Memória Traumática" EE3, que, por sua vez, seriam derivados de emparelhamentos
ocorridos a partir dos EE2, ou seja, completamente alheio ao processamento central de
informação. Por exemplo, o sujeito no elevador experimenta forte ansiedade; esse fato é
procedural, não o remete à situação temida diretamente; em certa ocasião, ele toma um
elevador cheio de pessoas sentindo forte ansiedade; a partir de então, começa a sentir
ansiedade quando está diante de situações em quem há concentração de pessoas.
Esses exemplos deixam claro o caráter gravemente debilitante do TEPT, o
quanto o sujeito tende a aumentar seus comportamentos de esquiva a partir do aumento,
identificável ou não, da ansiedade.
Numa lógica darwiniana, a memória traumática tende a um replay, conforme o
esquema acima. Ele ocorre com o propósito de deixar o esquema hipervalente (trauma)
em destaque, se comparado às outras memórias e aos demais esquemas, visando
exclusivamente à adaptação e à preservação da vida do organismo. É como se o cérebro
ficasse emitindo mensagens do tipo "não esqueça, não esqueça", para não
subestimarmos situações de potencial perigo.
Quando o esquema hipervalente está acionado, dificulta o acesso a.outros
arquivos de memória, bem como a mediação metacognitiva. O sujeito, sozinho, não
consegue identificar que, embora ele esteja ansioso por estar numa rua, a situação atual
é diferente do dia do assalto e, portanto, não há nada a temer no momento.
Identificadas multisensorialmente as memórias traumáticas, entram em ação as
técnicas de formação de repertório relativas às memórias de valência positiva, a criação
de novas "gavetas" que se contraponham à "gaveta vermelha", o replay, que abre
involuntariamente.
Os RPDs facilitam a identificação pelo paciente e pelo terapeuta dos níveis e
das modulações, da freqüência e intensidade do humor; a partir daí somos capazes de
criar no paciente o chamado "Botão de Emergência". Ele possibilita que o paciente
identifique quando a "gaveta vermelha" abriu e motivada por qual estímulo. Desse
modo, ele deixa de ter uma posição passiva diante da memória traumática e passa a
mediar cognitivamente o conteúdo semântico da memória através da abertura de outras
gavetas de valência positiva e da reinterpretação da memória traumática (gaveta
vermelha).
O paciente varia o repertório de memórias e atualiza, através do uso da
metacognição, o sentido e a validade da memória traumática, tendo como produtos
finais a reestruturação cognitiva e a dessensibilização sistemática de estímulos pareados
..
Relaxamento e respiração são técnicas auxiliares quando o paciente
experimenta fortes aumentos de ansiedade; entretanto, são técnicas que, sem a
autoinstrução e a variação do repertório (abertura das gavetas), não garantem por si só a
eficácia terapêutica.
O referido paciente que sofreu assalto com seqüestro, a partir da sexta sessão,
após abordagem da raiva e culpa inerente aos pacientes que passam por situações
traumáticas, das crenças que possuía sobre o ocorrido antes e depois da exposição ao
fato, bem como da educação quanto ao diagnóstico e modelo cognitivo, começou
gradativamente a se dar conta do esquema hipervalente negativo ativado e iniciou a
responder aos pensamentos automáticos através do uso do "Botão de Emergência", ou
seja, um dispositivo mental interno que permite a identificação do acionamento do
esquema disfuncional e o uso da mediação cognitiva.
Após a identificação do acionamento do esquema através do uso do dispositivo
interno "botas de emergência", foram largamente utilizadas as estratégias de
autoinstrução, que servem como correções de distorções cognitivas. Por exemplo,
quando o paciente experimentava ansiedade em elevadores ou locais fechados, acionava
a identificação do motivo da ansiedade, corrigia os pensamentos automáticos com
\evidências atuais do tipo "estou sentindo ansiedade no elevador; isto me lembra o dia
em que fui colocado no porta-malas; neste momento não estou em perigo, não há
nenhuma evidência que comprove estar em alerta ... " (sic).
Neste momento, o paciente aciona voluntariamente memórias substitutivas com
valência positiva, sendo que a respiração e o relaxamento muscular podem auxiliar
como técnicas de redução da ansiedade e de favorecimento do adequado processamento
da informação.
No caso citado, o paciente assim descreveu sua intervenção "quando me dei
conta, no elevador, que estava começando a sentir ansiedade, respirei fundo e
pausadamente, no intervalo de três inspirações, conforme você me instruiu; acionei o
'botão' em minha cabeça, corrigi distorções (vide relato acima) e imediatamente me dei
conta de que precisaria pensar em algo diferente. Pensei no jantar de sábado passado
onde reencontrei amigos que vejo pouco, mas que sempre que os vejo, rimos a valer. ..
bebemos um bocado também; foi divertido ... quando me dei conta, saí do elevador
com um sorrisinho na boca ... funcionou"!
As situações de enfrentamento gradual e sistemático foram propostas pelo
terapeuta através de um cronograma de situações outrora evitadas num sistema
progressivo de aumento de dificuldade, conforme a ansiedade gerada no paciente.
Neste momento, são retomadas e reforçadas as habilidades sociais que o
paciente possuía e geradas novas situações, afim de que sejam desenvolvidas novas
habilidades; também são feitas alianças com o sistema de amparo social que o paciente
possui, bu"cando-se ampliar situações de convívio social, familiar e de relações
profissionais.
Desde o momento em que o paciente começa a apresentar significativas
melhoras, o terapeuta deve introduzir os elementos de prevenção da recaída, para que
não se percam os progressos conseguidos até então e se prepare o paciente para
potenciais situações futuras .
Roteiro Sumarizado do Processo de Intervenção em TEPT Aplicável de 18
a 20 Sessões

• Certificar-se de que o paciente não está mais diretamente exposto


ao agente
estressor .
Sessões • Aliança terapêutica com elementos de entrevista motivacional:
como eu Como
era? estou agora? O que perdi? O que ganhei? Como posso e
Iniciais
quero estar no
futuro ?
• Educação quanto ao TEPT e quanto ao modelo cognitivo.
• Avaliação por instrumentos psicométricos: escalas de ansiedade,
de estresse,
inventários de saúde geral etc., que possam servir de fator de
. reavalição
liOpós-teste
final do tratamento.
.. • Uso de RPDs , de " afetivogramas ", visando à conexão entre
lembranças traumát icas
diretas e indiretas com a variação das emoções.
• Abordagens das crenças que o paciente possuía e possui após o
ocorrido
(quantificando de O a 10 os sentimentos e de 00/0 a 100% o nível
de crença no
relatado ):
- Antes: "a pior coisa que poderia acontecer a alguém"; "algo
insuportável de
se conviver".
- \ Depois: "nada poderia ter sido pior"; "nunca mais serei o
Sessões
Intermedi ári • mesmo".Abordagem da culpa e da raiva inerentes ao TEPT (quantificando
as de O a 10 os
sentimentos e de 0% a 100% o nível de crença no relatado):
- Raiva de si: "fui descuidado"; "por que fui sair justo naquela
hora"; " eu
sequer reagi .•• tentei fugir".
- Dos outros: "aquele desgraçado quase me matou"; "sinto muito
• ódio dele".
Abordagem da(s) memória(s) traumática(s):
- Elaborar o "Mapa de Memória Traumática", evidenciando os
EEI, EEII e
possíveis EElII
- Aplicar o TIE, TAl , Técnicas de Respiração e Relaxamento,
Dessensibilização Sistemática (pareando memórias de diferentes
- Experimentos de exposição a situações ansiogênicas juntamente
com o THS.

Sessões Aliança com amparo social.

Finais • Prevenção à recaída.

CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS FUTURAS

Notamos, na prática clínica de profissionais e estudantes que estão iniciando


seus treinamentos em terapia cognitiva, que o TEPT é uma patologia que passa
freqüentemente despercebida nas avaliações diagnósticas.
O TEPT pode ser considerado uma patologia primária, tendo-se em vista seus
efeitos patológicos subseqüentes ao longo da história dos pacientes. É comum que
pacientes com TEPT sejam tratados apenas em seus efeitos secundários, transtornos de
humor ou outras formas de transtornos de ansiedade, em vez de serem tratados
diretamente na matriz originária dos problemas. Muitas vezes , os terapeutas
apresentam-se pouco familiarizados com os critérios e com os efeitos secundários de
TEPT.
Na avaliação infantil de pacientes, a situação costuma ser mais comum ainda.
Recomendamos que todo e qualquer diagnóstico importante que seja feito na infância -
TDAH, depressão, transtorno de conduta, transtorno desafiador oposicionista etc. -
possa ter como diagnóstico diferencial o TEPT. Saber se ocorreu ou está ocorrendo
algum evento estressante que possa ser gerador de trauma na criança, por exemplo,
negligência ou demais formas de abuso infantil.
Com adultos, por sua vez, em muitos casos de depressão em mulheres de meia-
idade, depois de acurada avaliação diagnóstica, nos deparamos com abuso sexual
infantil, situação que raramente ocorre a terapeutas pouco familiarizados com TEPT.
Muitas dessas dificuldades estão relacionadas ao pouco conhecimento científico
que se produz com relação à TEPT, se comparado com transtornos de humor e demais
transtornos de ansiedade, ao pouco tempo de formalização diagnóstica do transtorno e
do desconhecimento de seus efeitos secundários e da dificuldade de acesso aos
pacientes com TEPT. Em muitos casos, tudo o que o paciente quer é esquecer. Passado
o evento traumático, em casos de violência principalmente, os pacientes se sentem
culpados, com raiva, humilhados e evitam expor o problema ou buscar ajuda, pois têm
a sensação de que relembrar e falar sobre o assunto irá gerar mais ansiedade ainda.
As possibilidades de tratamento vão desde o individual ao tratamento grupal.
Algumas situações devem ser tratadas individualmente, conforme a experiência vivida
pelo paciente; entretanto, Koss e Harvey (1999) apresentam as vantagens do tratamento
em grupo para a vítima de TEPT, tais como diminuir a sensação de isolamento,
fornecer apoio social, ajudar a confirrmar e normalizar sentimentos ao trauma,
compartilhar técnicas de manejo, proporcionar um ambiente seguro para o
desenvolvimento da vinculação e poder ajudar as vítimas a atribuir significado
diferenciado ao evento traumático.
Ito e Roso (1998) apontam, ainda, como vantagens de se trabalhar a grupo de
terapia, a reintegração social, a substituição da atitude passiva, de vitimização, para
uma atitude ativa, de sobrevivente, facilitando o modo de lidar com o problema.
Independente da modalidade grupal ou individual de tratamento, a terapia
cognitiva tem apresentado, na literatura, modelos com elevado índices de eficácia,
facilitando uma atitude científica, replicável e ética para com os pacientes acometidos
deste que é um dos distúrbios primários mais debilitantes dos processos cognitivos e
comportamentais dos sujeitos.

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