PRODUÇÃO DE MONOACILGLICERÓIS POR GLICERÓLISE

DO ÓLEO DE CANOLA

C.I. BENITES, P. SBAITE, P.F. MARTINS e M.R.WOLF MACIEL

Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Engenharia Química, Laboratório de

Desenvolvimento de Processos de Separação (LDPS)
e-mail: bele_benites@yahoo.com.br

RESUMO – A substituição de insumos artificiais na indústria farmacêutica e alimentícia

vem crescendo. Neste caso, os Monoacilgliceróis (MAG) destacam-se como
emulsificantes extremamente utilizados. Assim, a produção de MAG de origem natural é
de grande interesse. Uma das formas de produção é a glicerólise, onde os triacilgliceróis
reagem com moléculas de glicerol na presença de um catalisador. Quanto maior a
concentração de MAG no produto da reação, mais simples a separação e melhor a
qualidade do produto. Neste trabalho, o estudo da glicerólise do óleo de canola foi
realizado através de um planejamento fatorial 23 (estrela), variando a temperatura, a
quantidade de catalisador (NaOH) e a razão molar entre glicerol e óleo. O teor de
acilgliceróis foi quantificado por cromatografia de exclusão por tamanho (HPSEC).
Obtendo-se uma mistura rica em MAG, pode-se facilitar o processo de separação e
purificação, gerando um produto de grande apelo industrial devido a alta concentração de
MAG.

PALAVRAS-CHAVE: óleos vegetais; monoacilgliceróis; produtos naturais.

1. INTRODUÇÃO. representam cerca de 70% de todos os

Atualmente, vem ganhando forte
destaque mundial, a busca por produtos
naturais em diferentes setores. Dentro deste
panorama, este trabalho propõe estudar a
obtenção de emulsificantes naturais (MAG) a
partir da glicerólise do óleo de canola, os
quais serão posteriormente concentrados pelo
processo de destilação molecular.
Os monoacilgliceróis (MAG) são
constituídos por uma molécula de glicerol
ligada a uma molécula de ácido graxo. Por
apresentarem um balanço hidrofílico-
hidrofóbico em suas estruturas
(glicerol/ácido graxo), possuem importantes
aplicações industriais. Nas indústrias
alimentícia, farmacêutica e de cosméticos,
emulsificantes sintéticos utilizados (Ferreira-
Dias et al., 2001). Dentre suas aplicações, os
MAG destacam-se por seu uso direto em
formulações de produtos de panificação,
bolos, massas e margarinas. Além disso,
também são utilizados como matéria-prima
para a produção de diversos outros tipos de
emulsificantes, em que grupos hidroxila do
glicerol são substituídos por diferentes tipos
de moléculas como ácido acético, lático,
cítrico, tartárico, etc (Danisco, 2005).
A síntese de MAG pode ser conduzida
de diversas formas como, por exemplo:
esterificação direta de glicerol (GL) com
ácidos graxos, transesterificação de ésteres
de ácidos graxos com GL e glicerólise de

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 triacilgliceróis (TAG) (Bancquart et al.,
2001).
Como na natureza, os lipídeos mais
abundantes são os TAG, industrialmente,
MAG são produzidos normalmente através
da reação de glicerólise (UIC-GmbH, 2005),
que é um caso particular de alcoólise,
consistindo na reação entre moléculas de
glicerol (álcool) e moléculas de TAG. Esta
reação normalmente é conduzida a
temperaturas acima de 200ºC, na presença de
catalisadores homogêneos. Nestas condições,
normalmente obtém-se, no equilíbrio
químico, uma mistura que contém em torno
de 50% de MAG, 40% de diacilgliceróis
(DAG) e 10% de TAG, sendo que para a
produção de 3 mols de MAG é necessário 2
mols de GL para cada mol de TAG.
As misturas contendo cerca de 50% de
MAG industriais possuem concentração
inadequada a certas aplicações como
coberturas, recheios e sorvetes, onde o
comportamento de derretimento destes
alimentos na boca é um ponto crítico. Isso
porque, como monoacilgliceróis são
produzidos a partir de gorduras parcialmente
ou completamente hidrogenadas, os TAG e
DAG residuais apresentam um alto ponto de
fusão, comprometendo a sensação de
derretimento na boca (Martinello et al.,
2005).
Destaca-se que atualmente, há no
Brasil uma grande demanda por MAG de alta
concentração, devido a suas excelentes
propriedades emulsificantes. Apesar do
grande número de indústrias consumidoras
deste tipo de produto no país, são poucos os
fabricantes nacionais, sendo ainda mais
restrito o fornecimento de MAG naturais. Os
resultados obtidos no presente trabalho
representam uma contribuição importante, do
ponto de vista tecnológico, para as indústrias
produtoras de emulsificantes que têm
interesse na produção de MAG de alta
concentração.
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2. MATERIAL E MÉTODOS
O óleo de canola (Brassica campestris)
foi analisado quanto a composição de ácidos
graxos (AG) com metilação de acordo com
Hartman e Lago (1973). O método de
injeção utilizado foi o Ce 1-62 (AOCS,
1998). O cromatógrafo utilizado foi o Gasoso
Capilar – CGC AGILENT 6850 SERIES GC
SYSTEM, com coluna capilar: DB-23
AGILENT (50% cyanopropyl –
methylpolysiloxane, dimensões 60m,
diâmetro interno de 0,25 mm, 0,25 µm
filme). As condições de operação foram:
fluxo coluna = 1,00 mL/min.; Velocidade
linear = 24 cm/seg; temperatura do detector:
280ºC; temperatura do injetor: 250ºC;
temperatura do forno: 110°C – 5 minutos,
110 – 215°C (5°C/min), 215°C – 24 minutos;
Gás de arraste: Hélio; Volume injetado: 1L.
A identificação dos compostos foi feita
por padronização externa, através da
comparação com o tempo de retenção dos
compostos.
Com a composição de AG do óleo de
canola foi possível a verificação da massa
molar (MM) média dos AG e a partir deste
dado obteve-se a MM do óleo em estudo,
conforme descrito em Vargas (1996).
Conhecendo a MM do óleo pode-se
calcular a razão molar entre glicerol e TAG
(GL/TAG). Fator este de grande importância
para a reação de glicerólise, juntamente com
a concentração de catalisador e temperatura
de reação.
Assim, para a otimização das condições
experimentais da glicerólise, foi utilizado um
planejamento experimental do tipo 23 com 3
pontos centrais e 2 axiais (Statistica 7.0 ®),
cuja matriz está representada na Tabela 1.
A reação de glicerólise foi realizada em
reatores de vidro (com capacidade para
100mL), encamisados para melhor controle
de temperatura, com agitação magnética e
7196
 durante 90 minutos segundo a recomendação
de Fregolente et al. (2006), utilizando-se
80% do volume do reator e seguindo as
condições estabelecidas no planejamento.
Tabela 1 – Matriz do planejamento fatorial 2 3
Níveis
Fatores -α -1 0 1
NaOH (%)* 0,30 0,50 0,80 1,10
GL/TAG 2,03 4,00 6,90 9,80 11,77
T (°C) 96,4 115 145 175 195,4
* baseado no peso dos reagentes.
As amostras foram coletadas e após a
separação de fases, a fração oleosa (superior)
foi diluída em tetrahidrofurano para a análise
dos acilgliceróis por cromatografia de
exclusão de tamanho (HPSEC), utilizando 2
colunas em série de Phenogel com dimensões
de 300 x 7,8mm e tamanho de partícula de
5µm, sendo que a primeira coluna com
capacidade de separação de moléculas de
massa molar 100-3000 Da (50 Å) e a
segunda de 500-6000 Da (100Å), com as
seguintes condições: 40°C, 30 min,
tetrahidrofurano como fase móvel com fluxo
de 0,8mL/min (Schoenfelder, 2003;
Arzamendi et al., 2006).
Esta análise separa e fornece a
proporção de cada acilglicerol por
normalização de área, sendo que apenas a
resposta Teor de MAG (%) foi empregada no
planejamento para otimização da reação.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na Figura 1 observa-se a proporção de
cada AG do óleo de canola. A partir destes
valores calculou-se a MM média dos AG
(280,5g/gmol) e a MM do óleo
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(837,5g/gmol). Essa proporção é coerente
com a literatura (Reda e Carneiro, 2007).
α
1,30
Figura 1 – Composição de AG (%) do óleo
de canola
Após a glicerólise, a fração oleosa foi
analisada cromatograficamente. Os
resultados do teor de cada acilglicerol, bem
como de ácido graxos livres (AGL) e GL
encontram-se na Tabela 2.
É importante salientar que apenas o
teor de MAG foi levado em consideração
para o planejamento experimental, visto que
é a resposta de maior interesse. Os ensaios
que apresentaram maiores concentrações de
MAG (acima de 30%) foram os do intervalo
5 a 8, 14 e pontos centrais. Salientando-se
que estes ensaios ocorreram com
temperaturas mais elevadas.
Um detalhe importante é que nos
ensaios 4 e 8, ou seja, teor de catalisador e
razão GL/TAG nos maiores níveis,
independentemente da temperatura, a
quantidade de AGL gerados foi muito alta
(40-50%), o que pode ser um inconveniente
durante o processo de concentração dos
MAG, já que estes compostos possuem MM
bem próxima aos AGL, saindo praticamente
juntos na destilação molecular, o que
diminuiria a eficiência da separação.
7197
 Tabela 2 – Composição de acilgliceróis, Tabela 3 – Efeitos dos fatores na resposta
ácidos graxos livres e glicerol (%) para cada Concentração de MAG (%)
condição do planejamento fatorial 2 3 Efeito Erro Puro p
Exp. TAG DAG MAG AGL GL
Média * 23,60 2,23 0,0088
1 92,2 4,8 1,8 0,0 1,3
NaOH 7,73 4,99 0,2613
2 68,0 22,3 8,9 0,0 0,9
GL/TAG -5,39 4,99 0,3930
3 95,5 3,1 0,3 0,4 0,6 Temperatura* 33,56 4,99 0,0214
4 19,7 10,0 18,2 50,9 1,2 * fatores estatisticamente significativos (p<0,05)
5 9,8 32,7 45,9 10,4 1,1
6 3,9 24,4 52,2 18,2 1,4
Resposta: Teor de MAG (%)

7 12,2 25,4 38,8 22,3 1,2

8 2,0 13,9 40,0 42,7 1,4 Temperatura (°C)(L) 6,7291

9 88,6 3,8 1,4 5,3 0,9

10 56,7 26,1 13,5 2,6 1,1 NaOH (%)(L) 1,5500

11 47,3 19,4 20,9 11,1 1,3

12 80,1 12,9 5,9 0,3 0,9 GL/T AG(L) -1,0802

13 56,6 3,7 2,3 35,9 1,4

p=0,05

14 3,6 24,1 50,6 19,7 2,0 Efeito Estimado Padronizado (valores absolutos)

Figura 2 – Gráfico de Pareto das variáveis

PC* 24,3 25,8 33,5 14,0 2,3
TAG – triacilgliceróis; DAG – diacilgliceróis;
MAG – monoacilgliceróis; AGL – ácidos graxos
livres; GL – glicerol.
* PC=ponto central, média de 3 experimentos.
Tanto a Tabela 3 quanto a Figura 2
apresentam a influência estatística das
variáveis estudadas na concentração de
MAG, dentro da faixa determinada. Ressalta-
se que a influência das variáveis de forma
quadrática, bem como as interações entre as
variáveis foram ignoradas por não serem
estatisticamente significativas, sendo assim,
o modelo gerado será simplificado.
O Erro puro foi dado pelos ensaios em
triplicata no ponto central, já o p (também
chamado p-value) indica a probabilidade de
significância, com nível de confiança de
95%. Observando-se os valores absolutos
dos efeitos estimados, percebe-se a grande
influência da temperatura na glicerólise.
estudadas
Para esta resposta a Equação 1
apresenta o modelo proposto, retirando-se os
fatores sem significância estatística para fins
de simplificação.
(%) = −61,39 + (12,88 × ) (1)
− (0,93 × / )
+ (0,56 × )
O modelo apresenta R2 = 0,7341, ou
seja, a variação explicada pela regressão é
73,41%, sendo que a máxima variação
explicada com este modelo é de 96,9%. Para
validar o modelo, verifica-se a relação entre
o Fcalculado e Ftabelado apresentados na Tabela 4
juntamente com o restante da análise de
variância (ANOVA). De acordo com Barros
Neto et al. (2001) uma regra prática para
considerar uma regressão útil com a
finalidade de previsão é: se o valor de

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 Fcalculado for acima de 3 vezes o valor de
Ftabulado, o modelo é considerado aceitável.
Portanto neste caso, o modelo obtido é
aceitável.

Tabela 4 – Análise de Variância (ANOVA)

da glicerólise do óleo de Canola
Exp. SQ gl MQ Fcalc
Regressão 4143,75 3 1381,25 11,96
Resíduo 1501,15 13 115,47
Falta de Ajuste 1331,50 11 121,05 Figura 4 – Teor de MAG (%) considerando
os fatores razão GL/TAG e Temperatura (°C)
Erro Puro 169,65 2 84,83 na glicerólise
Total 5644,90 16
SQ – soma dos quadrados; gl – graus de liberdade;
MQ – média quadrática; Fcalc – Teste de Fischer Em relação a obtenção de MAG em
calculado; Ftabelado (0,95; 3; 13) = 3,41 função dos fatores razão GL/TAG e
quantidade de catalisador, observa-se que
esta resposta é intensificada com razões
GL/TAG intermediárias a mais baixas
As superfícies de resposta apresentadas (levando em conta a quantidade mínima
nas Figuras 3 e 4, mostram que maiores estequiométrica necessária) e NaOH em
quantidades de MAG são obtidas em maiores quantidades (Figura 5).
elevadas temperaturas de glicerólise,
independente da quantidade de catalisador e
da razão GL/TAG.

Figura 5 – Teor de MAG (%) considerando

os fatores razão GL/TAG e a quantidade de
NaOH (%) na glicerólise
Figura 3 – Teor de MAG (%) considerando
os fatores Temperatura (°C) e a quantidade
de NaOH (%) na glicerólise

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 Através da função desirability do
software Statistica® 7.0 verifica-se a relação
entre as respostas preditas pela variável
dependente (teor de MAG) e o desejável pelo
pesquisador. Assim, é possível quantificar o
interesse em cada nível de resposta (com
valores de 0 a 1), ou seja, pode-se atribuir
valores que indicam o quanto cada nível da
resposta (alto, médio ou baixo) é esperado.
Neste caso, atribuiu-se o valor de 1 para os
níveis mais altos de MAG, valor de 0,5 para
os níveis médios de MAG e valor de 0
(indesejável) para as baixas quantidades de
MAG.
Com esta indicação o software cruza os
dados, fornecendo os valores ótimos das
condições para obter este resultado esperado.
Neste caso, as condições foram: NaOH =
1,052%, razão GL/TAG = 6,9 e temperatura
de 195,4°C.
4. CONCLUSÕES
Para a obtenção de um produto com
elevado teor de MAG, as melhores condições
de glicerólise encontradas foram:
temperatura maior de 145°C, porcentagem de
catalisador em torno de 1% e razão molar
GL/TAG com valores intermediários.
Visando uma futura concentração
destes MAG pelo processo de destilação
molecular, a reação de glicerólise ainda
necessita uma melhor avaliação, uma vez que
além da quantidade de MAG é importante
verificar-se o grau de oxidação dos mesmos.
Agradecimentos: Os autores agradecem
à FAPESP (2007/00263-0, 2009/09728-1 e
2009/09836-9) e à CAPES (PNPD 02625/09-
1) pelo apoio financeiro.
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