1.1 – Impostos sobre o rendimento e oferta de trabalho.
Bibliografia : Stiglitz (1986) : Cap 19
Pontos a abordar :
1 – A função oferta de trabalho;
2 – Efeito rendimento e efeito substituição; 3 – Incidência de um imposto proporcional sobre a oferta de trabalho; 4 – Incidência de um imposto progressivo sobre a oferta de trabalho; 5 – Comparação entre os vários tipos de imposto.
1 – A função oferta de trabalho;
A oferta de trabalho é tradicionalmente modelizada como sendo função do lazer e
do consumo de bens e serviços. O imposto altera o comportamento do indivíduo, que ajustará a quantidade de trabalho fornecida (trabalhará mais ou terá de reduzir o consumo dos bens e serviços). Se ajustar a quantidade de trabalho, o indivíduo trabalhará mais e reduzirá o seu tempo de lazer, pelo que neste caso não necessitará de reduzir o seu consumo ou reduzi-lo-á numa menor proporção. No gráfico abaixo, o imposto sobre o trabalho faz rodar a restrição orçamental para baixo no eixo do consumo, por forma que o indivíduo mantenha o tempo de lazer e como não trabalha mais, reduz o seu consumo de E para E’.
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2 – Efeito rendimento e efeito substituição nos impostos
O imposto sobre o trabalho reduz o consumo individual por duas razões :
(i) Porque retira dinheiro ao indivíduo (efeito rendimento);
(ii) Porque altera os preços relativos tornando o consumo mais caro (efeito substituição).
Na figura acima desagrega-se o efeito rendimento do efeito substituição. O
movimento de E para E’ e a correspondente redução no consumo representa a redução devido à diminuição da riqueza, sendo o efeito rendimento. O movimento de E’ para E* representa a redução no consumo devido à alteração dos preços relativos, sendo o efeito substituição. Neste exemplo o efeito rendimento e o efeito substituição trabalham na mesma direcção, reduzindo o consumo, mas na realidade o efeito rendimento pode compensar o
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efeito substituição. O efeito total depende da elasticidade de substituição entre o
consumo e lazer. As curvas de indiferença do gráfico correspondem a uma situação de elasticidade intermédia, entre a elasticidade zero (curvas de indiferença em L, que não possuem efeitos substituição) e a elasticidade infinito (curvas de indiferença lineares).
3 – Oferta de trabalho com imposto proporcional
Em geral no contexto do mercado de trabalho o efeito de substituição e o efeito
rendimento trabalham de forma contrária. Com o efeito rendimento o indivíduo trabalha mais, com o efeito substituição o indivíduo trabalha menos.
O imposto muda a restrição orçamental e o efeito rendimento faz o consumo
passar de E para E’, enquanto a alteração nos preços relativos faz o consumo passar de E’ para E*. Os dois efeitos trabalham em oposição. Devido ao efeito rendimento o consumo de lazer e o consumo de bens diminuem, mas devido ao efeito substituição entre lazer e consumo, o resultado final pode ser uma das duas: (i) o individuo trabalha menos e consome mais lazer. Nesta situação o efeito substituição e o efeito rendimento trabalham no mesmo sentido reforçando-se mutuamente e dando origem a uma diminuição na oferta de trabalho. (ii) o individuo trabalha mais para compensar o
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rendimento perdido. Nesta situação o efeito rendimento e o efeito compensação
compensam-se. Esta é considerada a situação de referência na economia, sendo ilustrada no gráfico abaixo. Se o efeito rendimento compensar o efeito substituição, a curva da oferta terá uma inclinação para trás.
O aumento de salário induz uma redução na oferta de trabalho. Se a curva de
oferta de trabalho tiver esta forma um imposto que reduz o salário induz o aumento da oferta de trabalho. Conclui-se que um imposto proporcional sobre o rendimento reduz o rendimento após imposto. Nesta nova situação o indivíduo altera a sua afectação do tempo a rendimento e lazer. Passará a trabalhar mais e a dispender menos tempo em lazer para compensar a diminuição do rendimento devido ao imposto.
4 – Incidência de um imposto progressivo sobre a oferta de trabalho
Se o imposto sobre o trabalho for um imposto progressivo, como de facto acontece
com o IRS, a restrição orçamental não é linear. Os indivíduos com rendimento baixo tendem a receber um subsídio (ex: rendimento mínimo garantido) até a um determinado nível e a partir desse nível pagam um imposto. Ilustremos graficamente esta situação.
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No gráfico acima temos a restrição orçamental dos indivíduos com baixo
rendimento. A restrição orçamental LL é a de pré-imposto e a LD a de pós imposto. Note-se que no pôs-imposto a restrição orçamental aumenta com exclusão do intervalo CD. (i) Para um indivíduo que trabalhe pouco no intervalo LA a nova restrição orçamental é mais inclinada. O efeito rendimento faz o indivíduo trabalhar menos porque está em melhor situação, mas o efeito substituição faz o indivíduo trabalhar mais porque a rendibilidade do trabalho aumentou. Assim o efeito rendimento e efeito substituição funcionam em direcções opostas. (ii) Para um indivíduo que trabalhe moderadamente no intervalo BA só existe efeito rendimento porque os preços relativos mantém-se constantes. A nova restrição orçamental tem inclinação idêntica à anterior. O efeito redimento faz o indivíduo trabalhar menos do que antes do imposto, porque está em melhor situação.
(iii) Para um indivíduo que trabalhe duramente no intervalo BC o efeito
rendimento e o efeito preço trabalham no mesmo sentido, reforçando-se. Ele possui um rendimento superior e a rendibilidade do trabalho aumenta, pelo que trabalhará mais.
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(iv) No intervalo CD o indivíduo já não recebe o rendimento mínimo, que se
esgota, e o imposto faz com que a nova restrição orçamental seja mais baixa após impostos. O efeito rendimento e o efeito substituição funcionam em sentidos opostos, de acordo com a situação analisada no capítulo anterior. O rendimento diminui fazendo o indivíduo trabalhar menos e o efeito substituição fá-lo tarabalhar mais para compensar a diminuição do rendimento.
Rendimento mínimo garantido com trabalho e sem trabalho
Será que o rendimento mínimo garantido constitui um incentivo ao lazer?
Considere-se um indivíduo que receba o subsídio usufruindo completamente do lazer no ponto W, no grafico acima. Considerando a curva de indiferença é claro que o indivíduo em W prefere trabalhar, porque com o rendimento mínimo garantido o seu rendimento aumenta. O efeito substituição trabalhará no mesmo sentido se a rendibilidade do trabalho aumentar, mas se a elasticidade de subsituição entre trabalho e lazer for positiva ele trabalhará menos. Os economistas consideram que a participação no mercado de trabalho é fundamental para uma política de redistribuição porque induz educação, treino, sentido de pertencer à sociedade pelo que contribui para a estabilidade social. Pode acontecer que o indivíduo não consiga trabalhar porque não existe divisibilidade perfeita nas horas de trabalho. Nestas condições a substituição entre lazer e trabalho não é tão flexível como a nossa análise pretende.
Indivíduo com elevado rendimento
Considerem-se os indivíduos que pagam um imposto progressivo. Alguns estarão
no escalão 0%, outros acima, no escalão 28%, e ainda alguns estarão no escalão dos 40%.
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Um aumento no limite superior da taxa corresponde a uma rotação da restrição
orçamental no ponto que passa de BA para BG . Na situação de equilíbrio inicial o indivíduo estava no ponto E (tangência da restrição orçamental antes do imposto e as curvas de indiferença). Após o aumento da taxa o indivíduo passa ao ponto E’. O efeito rendimento é pequeno mas o efeito de substituição é elevado em relação ao efeito rendimento pelo que o indivíduo trabalhará menos e terá mais lazer.
Participantes secundários no mercado de trabalho
Para famílias em que o marido e a mulher trabalham, o indivíduo que ganha
menos assume o estatuto de ganhador secundário. A existência de uma criança em casa é um factor explicativo deste papel secundário. O elemento secundário embora receba pouco rendimento paga um imposto elevado, porque o seu rendimento é adicionado ao rendimento do marido, pelo que o seu incentivo para participar no mercado de trabalho é bastante reduzido. Os trabalhadores secundários tendem assim a ser mais sensíveis às variações fiscais.
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5 – Comparação entre os vários tipos de imposto
Como o efeito rendimento e o efeito substituição não são sempre os mesmos, os
estudos para analisar o impacto dos impostos sobre o mercado de trabalho têm sido de dois tipos : (i) análise estatística ; (ii) experimentações. Na análise estatística utilizam-se os dados agregados para estimar a elasticidade da oferta de trabalho que relaciona os salários em função das horas de trabalho. Os resultados permitem-nos tirar as seguintes conclusões: ¾ A oferta de trabalho de homens casados não responde a variações na taxa de salário, e a elasticidade compensada da oferta de trabalho é baixa; ¾ A oferta de trabalho de mulheres casadas é superior, mas mais difícil de estimar; ¾ A oferta de trabalho de mulheres que sejam chefes de família possui um valor para a elasticidade que é intermédio entre o dos homens casados e o das mulheres casadas; ¾ A decisão de participação é mais sensível à taxa de salário do que o número de horas de trabalho; ¾ Os parâmetros estimados pelos métodos estatísticos tendem a ser superiores aos obtidos na experimentação.