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SENTENÇA

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL propôs a presente AÇÃO


CIVIL PÚBLICA contra o ESTADO DA PARAÍBA, C.R.E. ENGENHARIA
LTDA., ANDRADE E GALVÃO ENGENHARIA LTDA. e HOLANDA
ENGENHARIA LTDA., em razão do rompimento da Barragem Camará,
construída no Município de Alagoa Nova, neste Estado, com aporte de
recursos dos Governos Federal e Estadual.
Narra, em apertada síntese, que no dia 22 de junho de 2004,
instaurou-se no âmbito do Ministério Público Federal e Estadual um
procedimento denominado de Inquérito Civil Público - ICP, para
averiguar as causas do rompimento da mencionada Barragem,
ocorrido em 17 de junho de 2004, causando morte de várias pessoas
e inundações nos municípios localizados a jusante da barragem.
Segundo o autor, o relatório final do ICP, concluiu que
problemas havidos durante a construção da obra, a cargo das rés,
pessoas jurídicas de direito privado - construção pelas empresas CRE
Engenharia e Galvão Engenharia e o detalhamento do projeto
executivo e controle de qualidade do concreto pela Holanda
Engenharia -, associados à omissão do Estado da Paraíba, no tocante
à fiscalização, monitoramento e manutenção da referida barragem,
causaram o rompimento daquela represa.
Expõe que estudo geotecnológico realizado em 1997 pela
Associação Técnico-Científica Ernesto Luiz de Oliveira Júnior -
ATECEL, no local onde seria edificada a citada obra, concluiu que se
poderia construir uma barragem de enrocamento ou de concreto
compactado com rolo, condicionado, em qualquer caso, à remoção
dos blocos soltos para estabilidade das ombreiras.
Naquele mesmo estudo geotecnológico, alertou-se que valores
elevados de perda d'água haviam sido verificados na ombreira
esquerda, carecendo tal local de maior atenção quando da realização
de estudos mais aprofundados e na execução da obra.
Revela que quando da execução da Barragem, o primeiro
registro referente ao problema na obreira esquerda foi feito no dia 1º
de fevereiro de 2001. Em face disso, no dia 14.02.2001, o geólogo
Alexandre Sagnori, contratado pelo consórcio construtor, para auxiliar
na solução do problema, compareceu ao canteiro de obra para uma
inspeção e elaboração de procedimento para tratamento da falha,
emitindo esse profissional, em março de 2001, relatório
contemplando as impressões e cinco soluções de engenharia e
geologia, que acabaram sendo sugeridas pela Holanda Engenharia
para a supressão do problema.
Das cinco sugestões daquele geólogo, houve a adoção das
sugestões de itens 'b" e "c", pois a solução mais objetiva, que seria a
retirada do material complementada pelo desmonte da cunha instável
acima desta zona, já indicada no estudo geotecnológico da ATECEL,
apresentaria riscos operacionais e de segurança, comprometendo,
ainda, o cronograma da obra.
De acordo com o parquet, em virtude daquela opção, a obra foi
assentada em blocos praticamente soltos não removidos, fator
determinante para o colapso da barragem. A ausência de
manutenção da referida barragem, por parte do proprietário, o
Estado da Paraíba, consistiu também causa de seu rompimento.
Alega que a Secretaria Estadual de Recursos Hídricos e Meio
Ambiente - SEMARH tinha conhecimento dos defeitos ocorridos
anteriormente ao rompimento da barragem, entretanto, deixou de
monitorar o primeiro enchimento daquela empresa, conforme
recomendado.
Requereu em antecipação da tutela o seguinte:
" 1) Compelir as rés C.R.E. ENGENHARIA LTDA, ANDRADE
GALVÃO ENGENHARIA LTDA e HOLANDA ENGENHARIA LTDA. em
obrigação de fazer consistente na reconstrução da Barragem Camará,
cujos estudos devem começar imediatamente após a concessão da
tutela antecipada, e conclusão no prazo de um ano após esta data,
sob pena de aplicação de multa diária no valor de R$ 100.000,00
(cem mil reais), por cada dia de atraso.
2) Compelir o ESTADO DA PARAÍBA a:
a) concluir o pagamento das indenizações de valores iguais ou
inferiores a R$ 20.000,00 (vinte mil reais) no prazo máximo de
sessenta dias da concessão da liminar, informando ao juízo os
pagamentos realizados e beneficiários;
b) Apresentar ao juízo informação completa sobre os
pagamentos já efetuados e beneficiários, bem como indenizações
pendentes, independentemente do valor;
c) Apresentar ao juízo, no prazo máximo de 30 (trinta) dias,
critérios objetivos para o pagamento das indenizações pendentes
(incluindo negócios informais e ressarcimento de reparos
emergenciais realizados pelos próprios moradores, às suas expensas,
com vistas à reconstrução de suas vivendas ou negócios), bem como
para a destinação das casas que no momento estão sendo
reconstruídas;
d) Apresentar ao juízo, no prazo máximo de trinta dias contados
da concessão da liminar, cronograma de atividades contemplando as
necessidades das famílias atingidas, em especial a capacitação da
comunidade, recriação de atividades produtivas que venha gerar
emprego e renda, e reimplantação dos serviços públicos destruídos;
e) Assegurar a participação de representantes legitimamente
escolhidos pela população atingida em todas as etapas do processo
de indenização e de reconstrução, no prazo máximo de 30 (trinta)
dias após a concessão da liminar, informando ao juízo, no mesmo
prazo, as providências adotadas para tanto;
f) abster-se de contratar as empresas CRE ENGENHARIA LTDA,
ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA e HOLANDA ENGENHARIA
LTDA enquanto não concluída a reconstrução da barragem Camará
por estas, nos termos do item '1'.
Tocante ao pedido definitivo, requereu nos seguintes termos:
a) que sejam mantidos os provimentos de cognição sumária
especificados nos itens 1 e 2, condenando-se os réus, em caráter
solidário, à obrigação de reconstruir a Barragem de Câmara e de
indenizar todos os danos materiais e morais, de natureza coletiva ou
individuais homogêneos das vítimas, causados pelo rompimento; na
hipótese de não reconstrução, por qualquer motivo, sejam as rés
construtoras obrigadas a devolver aos cofres públicos estadual e
federal todo o valor repassado para a construção da obra,
devidamente corrigido e com juros;
b) que sejam todos os réus condenados, em caráter solidário,
ao pagamento de indenização no valor de R$ 10.000.000,00 (dez
milhões de reais), ou maior valor, se vier a ser apurado, pelos danos
materiais coletivos de natureza difusa, consistindo em danos
emergentes, representado pelo prejuízo causado à infra-estrutura da
região (estradas, pontes, etc.), e que deve ser aplicado em obras de
melhoramentos estruturais na área afetada pelo desastre (Alagoa
Nova, Alagoa Grande, Areia, Guarabira e Mulungu); e
c) que sejam todos os réus condenados, em caráter solidário,
ao pagamento de indenização no valor de R$ 10.000.000,00 (dez
milhões de reais), em razão do dano material coletivo de natureza
difusa, consistente em lucros cessantes, isso é, os benefícios
econômicos que adviriam para a região da existência do reservatório,
pois este é um equipamento social que foi construído para
incrementar a qualidade de vida e a economia da região (adutoras,
irrigação, psicultura, etc.), indenização a ser aplicada em projetos de
desenvolvimento sustentável em todos os municípios afetados pelo
desastre;
d) a condenação dos réus, em caráter solidário, ao pagamento
de indenização por danos morais coletivos, sendo tal valor arbitrado
por este Juízo, e encaminhado ao fundo de reconstituição dos
interesses supraindividuais lesados, criado pelo art. 13, da Lei
7.347/85.
Pede, ainda, a aplicação do art. 28, do Código de Defesa do
Consumidor, para que seja desconsiderada a personalidade jurídica,
no momento de aplicação da condenação, se houver necessidade.
Instruiu a petição inicial com os documentos de fls. 66/2.435
(9º Volume).
Despacho ordenando a intimação dos réus para se
manifestarem sobre o pedido de liminar, como também, da União,
esta para dizer de seu interesse em integrar a lide (fl. 2.438).
Em sua manifestação (fls. 2.489/2.540), o Estado da Paraíba
manifestou-se pelo indeferimento do pedido de antecipação da tutela.
Sustentou, preliminarmente: a) incompetência da Justiça Federal,
uma vez que, com a conclusão da Barragem Camará, houve
incorporação ao seu patrimônio; b) a ilegitimidade do Ministério
Público para promover ação onde se discute tutela de interesses
individuais disponíveis e diversos da relação de consumo; c) a
inadequação da via da ação civil pública para compelir o Poder
Executivo a praticar ato sujeito a exame de conveniência de
oportunidade.
No que tange às providências adotadas, diz que vem
desenvolvendo ações efetivas em benefício da população atingida, em
conjunto as próprias vítimas, o Ministério Público Estadual, mediante
a disponibilização, dentro de suas condições, de recursos necessários
às indenizações cabíveis e à reconstrução dos imóveis danificados.
A Holanda Engenharia Ltda no que tange à antecipação da
tutela, defendeu sua incompatibilidade, in casu, com o princípio do
contraditório, posto que implica em pré-julgamento do feito e
irreversibilidade da medida, a inexistência de prova inequívoca e de
perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, pugnando, ao final,
pela denegação do pedido antecipatório (fls. 2542/2553).
A C.R.E. Engenharia Ltda, por sua vez, afirmou, em suma, não
haver prova inequívoca nem verossimilhança da alegação de culpa
das construtoras pelo rompimento da mencionada barragem,
necessitando de novos estudos mediante perícia judicial, eis que "os
elementos coligados, até esta data, não permitem aferir qual ou quais
fatores determinantes e exclusivos do rompimento da ombreira
esquerda da Barragem Barra de Câmara". Concluiu sustentando a
impossibilidade de reconstrução imediata da Barragem Câmara, como
pretendido pelo MPF, em virtude de dependência de novos estudos e
elaboração de projeto básico/executivo. Daí o descabimento do
pedido de antecipação da tutela (fls. 2.576/3.024 - 10º/11º
Volumes).
Intimada, a UNIÃO requereu o ingresso na lide, na qualidade de
assistente simples do autor (fls. 3.030/3.031 - 11º Volume).
Por último, a empresa Andrade Galvão Engenharia também
revelou seu inconformismo contra o pedido de antecipação da tutela,
porque entendeu descaracterizados os seus requisitos ensejadores:
prova inequívoca e verossimilhança das alegações do MPF, bem como
o fundado receio de dano irreparável, na medida em que a questão é
complexa, havendo contradições entre as alegações das partes. De
outro lado, não anteviu a inexistência de reversibilidade do pedido
formulado, de tal sorte a justificar o indeferimento do pedido de
antecipação da tutela (fls. 3.040/3.068 - 12 º Volume).
Despacho do então MM. Juiz Federal Substituto desta Vara,
determinando a realização de audiência de conciliação - fls.
3.072/3.073. Iniciada esta, restou acertada a formação de comissão
multidisciplinar, com representantes de cada um dos litigantes, a fim
de definir a viabilidade ou não de reconstrução da Barragem de
Camará, no mesmo local e com a mesma técnica inicialmente
empregada - Concreto Compactado com Rolo - CCR, com
apresentação posterior de relatório a este Juízo, inclusive, quanto à
solução técnica possível e seu respectivo custo.
Apresentado o relatório da Comissão (fls. 3.285/3.384 - 13º
Volume), que contou com a participação de representante do
Ministério da Integração Nacional, no sentido da viabilidade da
reconstrução da citada barragem, pela mesma técnica e no mesmo
local, com total segurança.
Referindo-se à citada peça, o MPF solicitou a intimação do
Estado da Paraíba para se manifestar sobre a solução proposta pela
Comissão ou apresentar outra solução (fls. 3.386/3.387).
As empresas rés peticionaram às fls. 3.397/3.399 e
3.417/3.418, concordando com a conclusão do mencionado Relatório,
solicitando a continuidade da audiência de conciliação, para que fosse
concluído o acordo acenado na audiência de 30.08.2005 e, em caso
contrário, o indeferimento da liminar, diante das evidências técnicas
constantes nos autos, demonstrando que as promovidas não
concorreram para o rompimento da barragem.
O Estado da Paraíba alegou que a construção de barragem de
terra, a montante da barragem atual, revela-se mais adequada,
devido ao custo inferior (35%) ao da reconstrução de uma barragem
em concreto convencional, com envelopamento parcial, solução
proposta pelas empresas rés.
Com sua petição, o Estado da Paraíba trouxe cópia do relatório
enviado por técnicos da Agência Executiva de Gestão de Águas do
Estado da Paraíba - AESA ao Exmº. Governador do Estado, sugerindo
a construção de tal barragem de terra, ao invés daquela apontada
pela Comissão Interdisciplinar (fls. 3.401/3.413).
A União anuiu com o teor do relatório da Comissão
Multidisciplinar (fl. 3.445).
Em face de terem sido apresentadas duas soluções técnicas
possíveis para a reconstrução da represa em apreço, designou-se
data para continuação da audiência de conciliação iniciada em
30.08.2005, entretanto, as partes não chegaram a um consenso,
diante do que, esta julgadora proferiu a decisão de fls. 3.498/3.515
(14º Volume), rejeitando a preliminar de incompetência da Justiça
Federal suscitada pelo Estado da Paraíba, indeferindo o pedido de
antecipação dos efeitos da tutela formulado em face das rés privadas
e os constantes nas alíneas "a", "b", primeira parte da alínea "c", "e"e
"f", declinados contra o Estado da Paraíba.
Contestação do ESTADO DA PARAIBA suscitando, mais uma
vez, a incompetência do Juízo; a ilegitimidade ativa do MPF, no
tocante ao pedido de indenização; inépcia da inicial, eis que não
demonstrado o dano material (lucros cessantes e danos emergentes)
a qualquer bem de natureza difusa, mas tão-somente a sujeitos
perfeitamente identificados, nem tampouco, o dano moral coletivo,
pugnando, no mérito, pela improcedência da ação (fls. 3.538/3.589).
O MPF agravou da decisão que indeferiu o pedido de tutela (fls.
3.614/3.630).
Na decisão de fls. 3.639/3.640, esta julgadora julgou
prejudicado o pedido de tutela formulado contra o ente público na
parte final do item "d".
Contestação da ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA (fls.
3.694/3.739 - 15º Volume), acompanhada de cinco volumes apensos
aos presentes autos, argüindo a inepcia do pedido; impossibilidade
jurídica do pedido de devolução das quantias recebidas pela obra e do
pedido de indenização de lucros cessantes de dano material difuso; a
ilegitimidade ativa do MPF, eis que o patrimônio lesado, a Barragem
de Câmara, pertence ao Estado, situação que não se modifica com o
fato da União ter aportado recurso financeiro para sua construção,
por meio de convênio.
No mérito, pugna pela improcedência da ação, alegando, em
suma, que não tem responsabilidade alguma pelo evento danoso, que
atribui a fato da natureza e falha da Administração Estadual, que não
fez o monitoramento do primeiro enchimento da barragem, mesmo
tendo sido advertida em diversas oportunidades sobre o descaso,
abandono e do comportamento anômalo dos drenos da galeria, que
estavam a revelar uma situação geológica imprevista e imprevisível,
além da feição geológica no momento da construção.
A C.R.E. ENGENHARIA LTDA apresentou defesa às fls.
3.740/3.792, suscitando a preliminar de ilegitimidade ativa,
alegando, quanto ao mérito, que a falha geológica da ombreira
esquerda, motivadora do rompimento da barragem, era do
conhecimento das partes envolvidas (Estado, construtoras e
projetista) desde o início, já que fora detectada nos estudos
preliminares realizados pela ATECEL, ainda no ano de 1997, para
elaboração do Projeto Básico da barragem.
Aduz que a falha ocorreu em cota abaixo da cota da sondagem
rotativa efetuada pela ATECEL, logo, é incorreta a afirmação do autor
de que tal falha já teria sido indicada no trabalho da ATECEL.
Rechaça a alegação do MPF no sentido de que a obra foi
assentada em blocos praticamente soltos não removidos, pois todas
as sugestões do relatório elaborado pelo geólogo Alexandre Sagnori e
pela empresa Holanda Engenharia para tratamento da falha da
ombreira esquerda foram executadas, conforme registrado às fls. 556
e 557 dos autos, sustentando que a solução adotada era compatível
com a boa engenharia e com os melhores tratamentos técnicos.
Por fim, assevera que se tivesse havido, por parte do Estado da
Paraíba, a devida manutenção da barragem, nos termos de regras
nacionais de prevenção, conforme orientação do Manual de
Segurança e Inspeção de Barragem do Ministério da Integração
Regional, e o rebaixamento do lago, sugerida antes do rompimento,
com promoção de estudos sobre o problema e adoção de solução de
engenharia, o rompimento teria sido evitado.
A HOLANDA ENGENHARIA LTDA apresentou contestação às fls.
3.793/3.869, argüindo a decadência do direito de ação com relação a
si; ilegitimidade passiva; inépcia dos pedidos de devolução do valor
pago e quanto aos pedidos de indenização por danos morais e
materiais coletivos, estes porque o autor não explicitou de onde
surgiram os valores requeridos.
No que concerne ao mérito da causa, afirma que lhe coube o
Detalhamento do Projeto Executivo e a Proposta de Execução do
Controle e Qualidade de Concreto (CCR e CCV), e não a fiscalização
da obra da Barragem de Câmara; que a ATECEL se responsabilizou
pela realização dos estudos geológicos, dos estudos geotécnicos e
topográficos, dentre outros, consistindo os estudos geotécnicos em
levantamento feito no local onde seria construída a barragem, com a
finalidade de identificar a constituição geológica dos eixos, boqueirão,
sangradouro do barramento projetado, em todos os seus aspectos,
principalmente da litologia e tectônica que são os fatores que mais
influenciam na resistência dos maciços rochosos aos esforços de
tração e de cisalhamento exercidos pelo corpo da barragem e pelo
peso do volume d'água retido, sendo também analisadas as
condições de estabilidade e estanqueidade do futuro barramento.
Comenta que apesar dos estudos realizados pela ATECEL terem
sido dirigidos à construção de uma barragem de terra,
expressamente se fez menção ao seu aproveitamento mesmo em
caso de construção de barragem de enrocamento ou concreto
compactado a rolo, e que como os dados e conclusões apresentados
pela referida empresa eram absolutamente verossímeis, não se fez
necessária a repetição daqueles estudos.
Quanto às observações lançadas pela ATECEL naquele estudo,
diz que o trecho correspondente aos quatro primeiros metros de
maior permeabilidade foi completamente removido, consistindo de
solos de cobertura e de rocha alterada, sem condição de suporte com
material de fundação para CCR.
No que respeita à ombreira esquerda, a ATECEL já havia
identificado problemas nela, fazendo recomendações acerca das
soluções para corrigi-la, as quais foram devidamente observadas,
inclusive, com a contratação do geólogo Alexandre Sagnori, que após
inspeção local, elaborou um plano que continha soluções possíveis
para sanar o defeito daquela ombreira.
Sobre a alegação do MPF de que a solução mais objetiva e
aconselhável não foi realizada, ou seja, a retirada do material
complementada pelo desmonte da cunha instável acima desta zona,
já indicado no trabalho realizado pela ATECEL, assevera que tal
solução foi descartada em razão dos altos índices operacionais e de
segurança.
Sustenta que o rompimento da barragem ocorreu por culpa
exclusiva do Estado da Paraíba, pois caso tivesse procedido ao
correto monitoramento das cheias e das condições daquela barragem,
seria possível tomar atitudes para reduzir a pressão exercida pela
água acumulada, evitando o acidente. Além de evitar o acidente,
também seria possível fazer as intervenções necessárias na represa,
preservando a obra e o patrimônio público.
Por fim, aduz que as atividades de projeto executivo e controle
de qualidade de materiais não representam risco potencial, assim não
pode ser considerada para embasar a hipótese de responsabilidade
objetiva.
O e. TRF da 5ª Região negou efeito suspensivo ativo ao AGTR
interposto pelo autor (fls. 3.877/3.879 deste volume).
Observada a impugnação às contestações (fls. 3.880/3.890).
Intimadas as partes para especificarem as provas que
pretendiam produzir, o MPF, a União, o Estado da Paraíba, a C.R.E.
Engenharia Ltda e a Andrade Galvão Engenharia Ltda se deram por
satisfeitas com as provas já produzidas (fls. 3.912, 3.914, 3.917,
3.920/3.923, 3.924/3.930, respectivamente), requerendo a última,
caso esta julgadora entenda necessária, a realização de perícia. A
Holanda Engenharia Ltda manteve-se silente (certidão de fl. 3.931).

Em decisão às fls. 3.936/3.942 (16º Volume), esta julgadora


ordenou a realização de perícia, a cargo de Geólogo, a fim de
esclarecer se a falha geológica que ocasionou o rompimento era
imprevista e imprevisível, como sustentam as empresas rés, ou se
estudos complementares poderiam levar à sua correta interpretação
e/ou à adoção de medidas adequadas para tratamento da falha e/ou
à certeza da eficácia dos tratamentos realizados na ombreira
esquerda.
Na audiência realizada em 14 de agosto de 2009 (vide ata de
fls. 4.032/4,035), esta magistrada determinou que se oficiasse ao
Ministério da Integração Nacional e ao Instituto de Pesquisas
Tecnológicas - IPT, para que indicassem expert nas áreas de Geologia
e Geotécnica.

O Estado da Paraíba formulou quesitos e indicou assistente


técnico às fls. 4.068/4.072 (16º Volume).
A Andrade Galvão Engenharia Ltda, a CRE Engenharia Ltda e a
Holanda Engenharia Ltda indicaram assistentes técnicos e formularam
quesitos às fls. 4.076/4.087 (17º Volume).
A União, ante a possibilidade de a perícia vir a ser realizada por
servidor pertencente aos quadros do Ministério da Integração,
reservou-se a apresentar quesitos e indicar assistente técnico em
momento posterior à nomeação do perito (fls. 4.329).

O ministério da Integração Nacional e o Instituto de Pesquisas


Tecnológicas informaram que não possuíam, em seus quadros,
profissional apto a realizar a perícia (fls. 4.333/4334 e 4.337,
respectivamente)
Certificado à fl. 4.339 que o MPF não indicou assistente técnico
nem formulou quesitos.

Em decisão às fls. 4.340/4.345, esta julgadora indeferiu os


quesitos de nºs. 01, 02, 03, 09 e 101, apresentados pelo Estado da
Paraíba, e os de nºs. 05 a 152, formulados pelas rés ANDRADE
GALVÃO ENGENHARIA LTDA, CRE ENGENHARIA LTDA e HOLANDA
ENGENHARIA LTDA, nomeando o Geólogo AKIRA USSAMI, para atuar
como perito judicial.

Inconformado, o Estado da Paraíba interpôs agravo retido


contra a decisão que indeferiu seus quesitos (fls. 4.354/4364). A
ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA e a C.R.E ENGENHARIA LTDA
agravaram de instrumento (fls. 4.366/4390 e 4.399/4.425,
respectivamente), tendo o e. TRF da 5ª Região improvido ambos
recursos, conforme consulta formulada por esta no site do TRF/5º
Região, quanto a recurso da empresa Andrade Galvão (AGTR 101719-
PB) e decisões juntadas às fls. 4.585/4.691, relativo ao recurso da
C.R.E. (AGTR 101991-PB).

O MPF e a UNIÃO indicaram NORMANDO PERAZZO BARBOSA e


SARITA DE PAULA PEREIRA CAVALCANTE, respectivamente, como
assistentes técnicos, abstendo-se de formular quesitos (fls.
4.393/4.394 e 4.437/4.438).
Quesitos deste Juízo às fls. 4.440/447. Antes, porém, de
formulá-los esta Magistrada fez um breve resumo dos fatos.
Às fls. 4507/4508, deferi a participação do Geólogo Marcelo
Ferreira da Silva na realização da perícia conjuntamente do
Geotécnico Akira Ussami já nomeado por este Juízo, intimando as
partes desse fato.

Entrega do laudo, o qual se encontra às fls. 4599/4559,


contendo uma via por meio digital (CD-ROON).

Manifestação das partes sobre o laudo: ANDRADE GALVÃO


ENGENHARIA LTDA, acompanhado do laudo do assistente técnico (fls.
4610/4625 e 4627/4635), CRE ENGENHARIA LTDA (laudo do
assistente técnico às fls. 4638/4643), ESTADO DA PARAÍBA (laudo do
assistente técnico às fls. 4703/4727), MPF (fl. 4731) e UNIÃO (fl.
4736).

Alegações finais: MPF (fls. 4739/4760), UNIÃO (fl. 4757),


HOLANDA ENGENHARIA LTDA (fls. 4765/4781), ESTADO DA PARAÍBA
(fls. 4782/4806), ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA (fls.
4807/4830) e C R E ENGENHARIA LTDA (fls. 4833/4856).

Vieram-me conclusos os autos para julgamento.


É o que importa relatar. Decido.

FUNDAMENTAÇÃO

1. Das preliminares suscitadas pelos contestantes


O Estado da Paraíba levantou as preliminares de incompetência
absoluta do Juízo; inadequação da via eleita; ilegitimidade ativa
quanto ao pedido de indenização dos prejuízos causados aos
particulares; inépcia da inicial, quanto ao pedido de indenização de
dano moral coletivo e dano material a bem de natureza difusa.
As preliminares de incompetência do juízo, inadequação da via
eleita e ilegitimidade ativa já foram objeto de apreciação e rejeição
por ocasião da decisão às fls. 3.498/3.515, revelando-se
desnecessário novo pronunciamento sobre elas.

A respeito da aventada decadência, sem maiores digressões


sobre o tema, deve ser aplicada a regra do art. 1.245, do anterior
Código Civil, devendo o construtor garantir a obra por cinco anos,
"pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais,
como do solo".
As rés privadas também suscitaram preliminares, que por
economia processual e para resolver de uma vez a questão,
acelerando o julgamento da lide (elencada dentre os processos da
Meta 2 do CNJ), somente serão apreciadas, se necessário, após a
análise da causa ou causas que levaram ao rompimento do maciço
rochoso que compunha a fundação da ombreira esquerda da
Barragem de Camará, até porque se confundem com o próprio
meritum causae. Passo, de logo, as provas
2. Do rompimento da Barragem de Camará

A Barragem de Camará rompeu no dia 17 de junho de 2004,


causando inundações em municípios próximos e a morte de várias
pessoas.
O MPF responsabiliza o Estado da Paraíba, proprietário da
represa, e as empresas construtoras pelo desastre ocorrido.
Cada parte apresentou laudo/parecer técnico, objetivando
explicar o(s) motivo (s) que levou (aram) à ruptura daquela
barragem, dando-se por satisfeitas com o material ofertado,
informando a este Juízo não ter outras provas a produzir. Diante
disso, à luz da prova produzida, passemos à análise do pedido.
A pedido do MPF, o Prof. Milton Assis Kanji, Consultor em
Geologia, Geotecnia e Mecânica das Rochas, emitiu o parecer técnico
de fls. 2.216/2.258 - 8º Volume, concluindo o seguinte:
"Dos dados e considerações acima apresentadas, chega-se às
conclusões a seguir apresentadas:
O histórico da barragem apresenta uma sucessão de julgamentos
inadequados, que superpostos uns ao outros causaram a ruptura da
barragem. Não se pode imputar o lamentável evento da ruptura a
uma só causa.
8.1 Não houve qualquer tipo de seguimento e observação sistemática
do comportamento da barragem durante o enchimento da represa,
exceto por algumas visitas de inspeção esporádicas, a despeito das
solicitações da Projetista para que fosse realizado monitoramento das
vazões dos drenos de alívio, verificação por corantes da comunicação
com o reservatório de infiltrações por trincas na galeria da barragem,
verificação do carreamento de solo pelos drenos e ocorrência de
artesianismo por vários dos drenos de alívio, dentre outras
observações.
8.2. Entendemos que a monitoração e a observação do
comportamento da barragem é de responsabilidade direta da
Proprietária ou da parte a quem seja delegada essa função,
delegação essa que não houve. Trata-se de atividade corrente em
engenharia e manutenção de barragens.
8.3 Não houve atitudes e decisões da Proprietária ou de seus
delegados sobre providências para investigação das causas e
condições das observações de ocorrências, nem quanto às
recomendações para o rebaixamento do nível d'água da represa.
8.4 Caso em maio de 2004 tivesse sido tomada a decisão de
rebaixamento da represa, o que ocorreria em cerca de 1 mês, a
ruptura não teria ocorrido. Ainda que a decisão tivesse sido tomada
em início de junho, o rebaixamento teria sido suficiente para
determinar as causas das anomalias observadas, caso em que
certamente as deficiências teriam sido identificadas e sanadas,
salvando a barragem. (grifo nosso)
8.5. A laje da rocha remanescente na ombreira esquerda a jusante da
barragem, apresenta-se sem fraturas em larga extensão, fato
incomum em tal rocha metamórfica com vários eventos tectônicos.
Esse fato, aparentemente favorável geologicamente, contribuiu para
a ruptura da barragem.
8.6 É também aspecto incomum o solo de preenchimento da falha
apresentar-se com tal teor de mica biotita, auferindo baixa
resistência ao cisalhamento. Essa resistência teria sido ainda mais
diminuída por pequenos deslocamentos (imperceptíveis a olho nu e
na escala da obra) devidos ao alívio de tensões pelas escavações,
aproximando-se ou atingindo valores de resistência residual.
(...)
8.13. Houve julgamento inadequado da interpretação geológica da
extensão da falha. Pelas investigações por furos de roto-percussão se
concluiu que o "bolsão" de solo se estendia apenas cerca de 3m para
o interior do maciço. O julgamento inadequado pode ser explicado no
aspecto que agora se conhece, pela exposição ampla da superfície de
ruptura, de que a mesma apresenta ondulações ("amêndoas)",
fazendo com que o preenchimento apresente grande variação na sua
espessura, inclusive com espessura não detectável por algumas das
perfurações feitas. Isso levou a crer que haviam removido todo o solo
de preenchimento e que a fratura não se estendia mais para o
interior do maciço. Foram realizados tratamentos consistindo de
remoção do solo, substituição por concreto, injeções de contacto com
caldas de cimento, e construção de muro de gravidade".
O Prof. Carlos Manoel Nieble, também por iniciativa do MPF,
emitiu o parecer de fls. 2261/2339 do 8º Volume, chegando à
seguinte conclusão:
"A barragem de Camará rompeu, na ombreira esquerda, devido a:
* não ter sido observada e monitorada após a construção, conforme
recomendado pelos diversos organismos internacionais e pelo Manual
de Segurança e Inspeção de Barragem do Ministério de Integração
Nacional. A barragem emitiu, após a construção, vários sinais das
deficiências de sua fundação que, devido à inexistência dessa
monitoração e observação sistemática, não puderam ser
interpretados corretamente e, assim, tomadas as medidas
necessárias para sanear ou minimizar o problema.
* ter sido apoiada em maciço rochoso que, após a ruptura, se
mostrou de qualidade questionável, evidenciando uma interpretação
geológica deficiente das condições de sua fundação. O modelo
geológico-geomecânico é bastante complexo, conforme interpretado
à luz do conhecimento atual, e difere bastante daquele assumido na
época do projeto e construção.
Em conseqüência, os tratamentos recomendados e aplicação na
fundação (injeção, drenagem e outros) não foram adequados para as
reais condições geológicas do maciço, nas zonas onde compareciam
os solos residuais nas camadas/lentes de materiais alterados".
Ainda por iniciativa do MPF, professores da UFPB emitiram o
Relatório de fls. 2.120/2.214- 8º Volume, cujo preâmbulo menciona:
"...
Os Ministérios Públicos Federal e Estadual promoveram uma
investigação. Um grupo de Engenheiros da Universidade Federal da
Paraíba foi encarregado de analisar o projeto e verificar o que se
passou durante a construção da obra, como também calcular o tempo
de esvaziamento do lago. Dois outros Geólogos de São Paulo, Drs.
Milton Kanji e Carlos Nieble, encarregaram-se de analisar e geologia e
como aconteceu o acidente.
A análise da documentação mostrou: que o acidente ocorreu por
conta de uma má interpretação de um problema geológico que se
tentou sem sucesso corrigir; que a barragem foi construída por firmas
consorciadas que, pela legislação não poderiam fazê-lo; que houve
indefinição de responsabilidades com o Proprietário omitindo-se
completamente da fiscalização; que mais de 8 mil metros cúbicos de
concretos lançados foram dosados com pá carregadeira; que ao final
da construção não se tinha ensaios suficientes para uma análise
estatística consistente das resistências dos concretos; que o
paramento de montante apresentou-se muito permeável; que a
barragem antes mesmo de ser entregue já apresentou defeitos; que
com a subida da água no lago evidenciou-se o mal (sic)
funcionamento da barragem; que o Proprietário não se mobilizou
para acompanhar o primeiro enchimento e foi muito lento em tomar
as providências para correção das patologias; que se a tubulação de
800 mm tivesse sido aberta a tempo a água poderia não ter atingido
o nível que provocou a ruptura.
Por tudo isto e pelo que é apresentado nos relatórios técnicos que
fazem parte do inquérito do Ministério Público, pode-se dizer que a
Barragem de Camará não foi construída segundo os bons princípios
da engenharia, tão pouco foi considerada após sua entrega como
uma obra importante que deveria ser acompanhada no seu primeiro
enchimento".
Os Professores da UFPB teceram as seguintes considerações
finais:
"Considerando que a Barragem de Camará foi construída:
* Pelas empresas CRE e Andrade Galvão, que oficialmente não
poderiam fazê-lo, a primeira sem acervo técnico para construir em
CCR, a segunda por não ter participado da licitação e sendo vedada a
formação de consórcio;
* Com preços de projeto e de controle tecnológico aviltados;
* Com uma absurda indefinição de responsabilidades;
* Com ausência completa de fiscalização por parte do proprietário;
* Com engenheiro do Estado designado para fiscalizar a construção
sendo engenheiro residente em outras obras;
* Com avaliação errônea de um problema geológico;
* Com oito mil e quinhentos m de concreto dosados com pá
carregadeira e sem aditivos;
* Com ausência de engenheiro oficial da consultoria na obra;
* Com as funções de projeto e consultoria de controle dos materiais
(e fiscalização) exercida pela mesma empresa;
* Com concreto de face de montante de baixa resistência, de
pequena e variável espessura, com defeitos localizados e permeável;
* Com inúmeros concretos ao final da construção com resultados de
ensaios insuficientes para uma avaliação estatística consistente;
* Com visitas esporádicas do responsável pelo controle dos materiais
que terminou sendo realizado à distancia, sem correção das não
conformidades quanto detectadas;
* Com "enxugamento" excessivo de parâmetros de resistência e
espessura do parâmetro do montante já apresentou defeitos antes
mesmo de ser entregue, pode-se afirmar que a Barragem de Camará
não foi construída conforme os bons princípios da Engenharia.
O desprezo a ela dedicado após a construção vai de encontro aos
princípios básicos daquela ciência" (g.n.)

O Estado da Paraíba, proprietário do bem em pauta, trouxe o


Relatório Técnico de fls. 869/965 (4º Volume), emitido por membros
da Comissão constituída por ele com o fito de apurar as causas
daquele rompimento, a qual teceu as seguintes considerações finais:

"O tratamento das fundações, previsto no projeto executivo e


relatórios, bem como suas modificações, foram insuficientes e não
atenderam aos requisitos básicos mínimos que poderiam oferecer a
esperada segurança da obra.
Nas condições geoestruturais encontradas na área, a remoção pura e
simplesmente da camada superficial da rocha alterada e fraturada
não seria suficiente para oferecer a segurança do maciço.
A avaliação correta dos problemas detectados na fundação e seu
devido tratamento teriam evitado o acidente."

O consórcio construtor contratou uma Comissão de


especialistas, que chegou ao seguinte diagnóstico (10º Volume, fls.
2597/3024):

"A Barragem de Camará se situa em área de geologia complexa e


relativamente controversa. O nível de exposição do substrato
conforme hoje se apresenta demonstra esta complexidade; é
importante ressaltar que tal nível de exposição não existia durante as
investigações de projeto e as decisões de obra.
Os dados disponíveis, incluindo relatórios e fotografias, indicam que a
barragem foi assente em maciço compatível com os requisitos e
especificações de projeto, tratados segundo rotinas estabelecidas, e
complementadas durante as obras visando adequá-lo às condições
geológicas e respectivas peculiaridades típicas de cada obra.
A ruptura da fundação da barragem de Camará se deu em função da
desarticulação e erosão hidráulica do maciço rochoso ao longo da
ombreira esquerda, decorrente dos efeitos do longo período de
chuvas associados ao fluxo sob a barragem. Iniciou-se a jusante do
barramento, evoluindo retrogressiva e rapidamente para a região sob
a barragem.
Inspeções à barragem durante o 1º semestre de 2004 detectaram
sinais do comportamento adverso e relacionado com a ocorrência de
erosão hidráulica; o agravamento do acidente está relacionado à falta
de ações remediadoras e mitigadoras em tempo hábil.
Não houve ruptura do maciço de concreto no dia 17 de junho de
2004. Somente 11 dias depois, em 28 de junho, ocorreu o
desabamento do arco de concreto formado quando do deslizamento
do maciço rochoso, decorrente da falta de apoio e da conseqüente
instalação de esforços que não são previstos para este tipo de
estrutura.
Os dados e relatórios existentes permitem considerar que o controle
tecnológico, as especificações, os equipamentos e os processos
construtivos estão em conformidade com as boas técnicas da
engenharia. A resistência do maciço de concreto é compatível com o
projeto, caso contrário o desabamento do arco remanescente
ocorreria instantaneamente ou em questão de horas após a ruptura
do maciço rochoso.
Os ensaios de laboratório realizados em testemunhos extraídos do
corpo da barragem, atestam sua compatibilidade com aqueles obtidos
no controle tecnológico da obra, estando de acordo com as
especificações de projeto.
Não houve equipe de operação e monitoramento, devidamente
treinada e experiente para o acompanhamento do primeiro
enchimento e da vida útil da Barragem de Camará.
As anomalias detectadas a partir de fevereiro de 2004 indicavam à
Proprietária a necessidade de conduzir investigações e intervenções
abrangentes.
A simulação cronológica de diversos cenários mostrou que seria
possível obter rebaixamentos significativos da carga hidrostática do
reservatório em tempo hábil. Com a adoção destes procedimentos em
um primeiro momento seria evitado o acidente e, naturalmente, suas
conseqüências; caso adotados em momentos posteriores levariam à
redução considerável do risco e de seus efeitos.
O acompanhamento e o monitoramento cuidadoso de barragens
possibilitam a tomada de medidas que podem evitar ou minimizar os
riscos de acidentes. Na Barragem de Camará, o pronto atendimento
às recomendações da Projetista, emitidas em julho/2002 e ratificadas
em março de 2004 permitiriam à Proprietária identificar a gravidade
das anomalias durante o primeiro enchimento e orientar as ações
necessárias (g.n).

À idêntica conclusão chegaram os Professores Francisco J.


Sarmento e Pedro A. Molinas, ambos Mestres em Recursos Hídricos,
em artigo técnico-científico apresentado no VII Simpósio de Recursos
Hídricos do Nordeste, o qual encontra-se encartado às fls.
1.823/1.834 (7º Volume), verbis:
"CONCLUSÕES
No presente artigo, com base na cronologia documental, englobando
o período desde a constatação do problema na ombreira esquerda da
barragem Camará em Alagoa Nova - PB, através da galeria de
inspeção e drenagem em 10/02/2004 até o desastre ocorrido em
17/06/2004, fica demonstrado tecnicamente que uma simples
manobra de desmonte da válvula dispersora e a utilização da
tubulação de descarga da própria barragem para esgotar a mesma,
poderia ter reduzido o nível de armazenamento evitando, certamente,
além da perda de vidas humanas e grandes prejuízos econômicos em
Alagoa Grande e Mulungu, a preservação da própria ombreira e,
consequentemente, da barragem, permitindo assim um estudo, em
condições não emergenciais, para orientar correções ou reforços na
zona geológica vulnerável, detectável durante o monitoramento do
enchimento da barragem.
(...)"

Como se vê, os laudos emitidos pelos Profs. Milton Assis Kanji e


Carlos Manoel Nieble e o apresentado pelo consórcio construtor
reconhecem que a Barragem de Camará apresentava problemas em
sua estrutura, salientando, porém, que tais defeitos poderiam ser
sanados se o Estado tivesse procedido ao rebaixamento do nível do
reservatório.
Registre-se que o Relatório Técnico emitido pela Comissão
Estadual (fls. 869/965 - 4º Volume) detém-se unicamente a analisar
aspectos técnicos da construção da barragem, passando ao largo da
questão relativa ao não acompanhamento do primeiro enchimento do
reservatório.
Documentos constantes nos autos demonstram que os
problemas da Barragem de Camará se tornaram aparentes no início
de 2004, em face do aumento do volume de chuvas na região.
Acompanhemos os eventos:
A mencionada obra foi recebida no dia 20 dezembro de 2002
(fl. 245 - 1º Volume), por Comissão Especial composta pelos
seguintes Engenheiros Civis Estaduais: Gilmar Ferreira da Silva, ex-
Coordenador de Obras da Secretaria Extraordinária do Meio
Ambiente, dos Recursos Hídricos e Minerais, Antônio Soares da Silva,
com atuação na mesma Secretaria por aproximadamente vinte anos,
conforme revelado no depoimento de fls. 440/448 (2º Volume);
Josivaldo Brasileiro de Figueiredo e Haroldo Sobreira Vanderlei.
Antes disso, em julho/2002, a HOLANDA ENGENHARIA LTDA,
após realizar visita de inspeção da qual também participaram
diversos engenheiros da COGERH/SEMARH, emitiu o relatório de
Consultoria - Inspeção da Estrutura de Concreto (CCR e CCV), com as
seguintes conclusões e recomendações (fls. 253/258 - 1º Volume):

"Inicialmente vale ressaltar que a estrutura poderá ter o seu aceite


final com base nas inspeções efetuadas.
Apenas deve ser considerado que nova inspeção mais definitiva
deverá ser feita após o próximo período de chuva na região quando
muito provavelmente a altura do reservatório indicará um real
comportamento da barragem.
No interior da galeria da tomada d'água e descarregador de fundo, os
pontos de percolação de água deverão ser injetados. O trecho a ser
injetado na colagem do tampão conforme orientação de Projeto tem
prioridade na orientação para injeções, sendo mais conveniente nesta
etapa, em que a altura da lâmina d'água de montante ainda é
pequena.
Recomenda-se que se realize a medição do quadro de vazões dos
drenos para a condição atual de funcionamento dos drenos,
anotando-se a cota do reservatório correspondente a data das
medições. No futuro, considerando o período chuvoso e o ganho de
água no reservatório, novas medidas de vazão deverão ser
conduzidas, de modo a permitir estudos comparativos de
comportamento".

FRANCISCO LEUNAM HOLANDA LINS, engenheiro civil da


SEMARH, afirmou que as recomendações acima foram cumpridas (fls.
779/785 - 3º Volume):
"... que tem conhecimento de um relatório feito pela Holanda
Engenharia, no mês de julho de 2002; que esse relatório foi redigido
pelo Consultor Francisco Holanda, sob visita de inspeção realizada na
obra, com a participação do depoente, da engenheira Chelen Alonso,
do engenheiro Flávio Cota, do engenheiro Ovídio, do engenheiro
Gilmar e do engenheiro Antonio Soares; que tem conhecimento dos
problemas relatados pela Holanda Engenharia, em julho de 2002,
constantes às f. 191/192 do volume inicial, afirmando o depoente
que, com relação à colocação do pó xadrez, tal serviço foi realizado;
que apesar das recomendações indicadas pela Holanda Engenharia no
referido relatório terem sido feitas, o depoente não acompanhou a
execução dessas recomendações; "

Durante o ano de 2003, a barragem permaneceu vazia (vide


depoimento de FRANCISCO JÁCOME SARMENTO, ex-Secretário
Estadual de Recursos Hídricos - fls. 430/438 - 2º Volume).
A partir de janeiro de 2004, porém, passou a chover forte na
região, elevando o nível de água do reservatório. No dia 09 de março
de 2004, o engenheiro FRANCISCO LEUNAM HOLANDA LINS
comunicou ao Coordenador da COGERH que a galeria de drenagem
da Barragem de Camará apresentava uma lâmina d'água de 0,60 cm
de altura e que os drenos não estavam dando vencimento para dar
vazão à água acumulada. No mesmo expediente, aquele engenheiro
informou que o açude já acumulara cerca de 60% da sua capacidade
total (fl. 786 - 3º Volume).
Em 26 de março de 2004, a CRE Engenharia Ltda encaminhou à
COGERH, relatório de duas visitas que realizou naquela represa,
acompanhada de equipe daquela Coordenação (fls. 1.417/1.435 - 5º
Volume).
Segundo consta no citado relatório, as visitas à barragem foram
realizadas nos dias 10 de fevereiro de 2004, quando a represa estava
com aproximadamente 36% de seu volume, e no dia 10 de março de
2004, quando o volume se aproximava dos 50% . Em ambas as
visitas, foram tiradas fotografias, sobre as quais o Engenheiro Ovídio
Trindade, da CRE Engenharia Ltda/Andrade Galvão, emitiu
comentários, enviando-as ao Engenheiro Francisco Gladston Holanda,
da Holanda Engenharia, responsável pelo projeto e acompanhamento
da barragem, que expôs suas impressões acerca do conteúdo de cada
foto, em itálico.
Ressalto que o citado relatório foi recebido pelo Engenheiro
Antônio Soares da Silva, da COGERH, no dia 29 de março de 2004 (fl.
1.417).
Na fotografia realizada nº 06, de 10.02.2004 (fl. 1.421), os
Engenheiros Ovídio Trindade e Francisco Gladston Holanda trocam as
seguintes considerações:
"Vista do vertedouro, mais para a ombreira esquerda, aparecendo um
pequeno pedaço do bloco de ancoragem sobreposta a falha
Junto ao pé do muro esquerdo, a mancha de umidade é importante
de ser verificada por estar na região da falha na fundação naquela
região".

Quanto à foto nº 07, também tirada no dia 10.02.2004, aqueles


Engenheiros consignaram:
"Vista interna do teto da galeria de drenagem, ombreira direita, em
gotejamento. (na vista posterior este lugar permanece molhado,
porém sem mais este gotejamento).
O fato significa que a origem da percolação está ativa e em função da
elevação do reservatório. Seria desejável monitorar a atividade em
função do enchimento do lago".

Foto nº 10, tirada no dia 10.02.2004 (fl. 1.423):


"Vista interna da galeria de drenagem na ombreira direita, com
infiltrações provocando gotejamento. (na visita posterior este lugar
permanecia molhado, porém sem mais o gotejamento)
O fato significa que a origem da percolação está ativa e em função da
elevação do reservatório. Seria desejável monitorar a atividade em
função do enchimento do lago".

Foto nº 12, também tirada naquele dia (fl. 1.424):


"Vista da parte plana da galeria, em sua cota mais baixa, com
acúmulo de material sobre a laje
É importante determinar a origem deste matéria".

Foto nº 13, idem (fl. 1.425):


"Vista da junção do bloco de ancoragem, na ombreira esquerda com
o maciço natural (área da falha existente)
Aparentemente a atividade de percolação nesta área não é
expressiva".
Foto nº 14, idem (fl. 1.425):
"Vista das tubulações de esgotamento da galeria de drenagem,
percebendo-se o funcionamento irregular da tubulação de cota
inferior;
Duas coisas chamam a atenção nesta foto:
- A coloração da água (turva) do dreno à esquerda;
- A pouca eficiência do dreno da direita que certamente está
parcialmente obstruído. É primordial que os drenos sejam mantidos
livres para o escoamento da água".

Foto nº 15, idem (fl. 1.426):


"Vista de morador da região tentando desobstruir a tubulação
Considera-se que o proprietário da barragem deveria estar fazendo
rotineiramente este serviço, sempre que necessário".

Foto nº 16, tirada em 10 de março de 2004 (fl. 1.426):


"Vista do lago em formação
Sem comentários. Observa-se que seria interessante fazer as
anotações de mudanças de comportamento da percolação da galeria
em função do enchimento gradual do reservatório. Observo que a
barragem do Camará é uma barragem de grande porte e que carece,
dentro dos padrões internacionais que seja feito um monitoramento
de seu primeiro enchimento" (g.n.).

Foto nº 27, tirada no mesmo dia (fl. 1.432):


"Vista da galeria de drenagem da ombreira esquerda com destaque
para o dreno vertical de fundação e o dreno da junta de dilatação. O
dreno da junta de dilatação esta em funcional normal (na minha
impressão). Porém a um funcionamento do dreno vertical com vazão
diferente e a maior dos demais drenos (na minha impressão);
De fato este dreno vertical tem funcionamento fora dos padrões
usuais. Há de se pensar em fazer algum tipo de intervenção. Na
minha opinião este é o ponto de maior atenção dentre todos
levantados anteriormente".

Foto nº 28, idem (fl. 1.432):


Vista frontal do local anterior destacando que não há contribuição de
furos de drenagens superiores e este furo (furo de drenagem D 05)
está surgindo com vazão diferente dos demais furos. Pela localização
e revendo o "as built" acredito que este furo não se encontra sobre a
falha inferior e sim sobre a falha superior na mesma ombreira (na
minha impressão).
Idem comentário anterior.

Foto nº 14, idem (fl. 1.433):


Vista das tubulações de esgotamento da galeria de drenagem,
percebendo-se que o funcionamento da tubulação de cota inferior
continua deficiente
Como já sugerido anteriormente, seria muito importante fazer o
controle de vazões por estas saídas.

No dia 03 de maio de 2004, ANTONIO SOARES DA SILVA


expediu ofício ao Secretário da SEMARH, solicitando-lhe que enviasse
correspondência à CRE ENGENHARIA, para que esta solicitasse, com
a maior brevidade possível, à HOLANDA ENGENHARIA LTDA, a
elaboração de relatório técnico específico do primeiro enchimento da
barragem, diante dos problemas ocorridos (fl. 1.532 - 6º Volume).
Naquele mesmo dia, o ofício foi expedido (fl. 1.531 - 6º Volume).
No dia 21 de maio de 2004, o engenheiro Francisco Leunam
Holanda Lins, da COGERH, encaminhou o memorando nº 083/2004
ao Engenheiro Antônio Soares da Silva, noticiando-lhe o seguinte (fl.
452 - fl. 2º Volume):

"Faço ciência a V. Sa. que a BARRAGEM CAMARÁ, localizada no


município de Alagoa Nova, está apresentando sérios problemas no
seu maciço, detectados a partir do primeiro enchimento do lago e,
portanto, necessitando urgentemente de serviços de correção.
Ao fazermos visita de inspeção na Galeria de Drenagem, constatamos
a existência de um vazamento com surgência a partir do paramento
montante com vazão preocupante, além de infiltrações nas paredes e
teto da galeria. Verificamos também, que mais da metade dos drenos
de alívio estão obstruídos e há incidência de altas vazões nos poucos
drenos que estão funcionando, contribuindo, dessa forma, para
aumentar o acúmulo de grande quantidade de água no interior da
galeria, uma vez que, dos dois drenos de saída da galeria, apenas um
está funcionando de maneira satisfatória enquanto que o segundo
está parcialmente obstruído. O nível da água acumulada na galeria já
está no cota 430 (com altura de 5 m) inundando toda a parte plana
sob o vertedouro e atingindo os primeiros degraus. O volume de água
armazenada no açude já supera 15.000.000 m³ - cerca de 60% da
capacidade total - e a tendência é aumentar ainda mais o seu volume
pois continua chovendo forte na região, aumentando também a
gravidade dos problemas se não foram tomadas providências
imediatas.

No dia 24 de maio de 2004, o Coordenador da COGERH, Antônio


Soares da Silva, realizou inspeção técnica na aludida Barragem,
produzindo o Relatório de fls. 453/467 (2º Volume), o qual
encaminhou em 28 de maio de 2004 ao Secretário da SEMARH, junto
com o Memorando nº 083/2004, solicitando fosse remetida
correspondência à Construtora CRE Engenharia, requerendo a
correção dos problemas surgidos (fl. 451). Naquele relatório, o
Coordenador ANTONIO SOARES DA SILVA recomenda o seguinte:

2 - RECOMENDAÇÕES E SUGESTÕES PARA CORREÇÕES DAS


ANOMALIAS

2.1 - Para os casos onde existe percolação do maciço para a galeria,


pelo contrato maciço rocha e pela rocha de apoio da ombreira direita,
recomendamos:
* A desobstrução dos drenos de saída da Galeria e verificar se esta
medida é suficiente para o esgotamento da galeria;
* Abrir uma janela de 1,00 m x 1,00m na parede de interligação da
Galeria de Drenagem e a Galeria da tomada d'água para facilitar
acesso e auxiliar no esgotamento da Galeria de Drenagem;
* Após o esgotamento da Galeria de Drenagem, contratar empresa
especializada para reforço das injeções de consolidação.

O Relatório de Consultoria em Tecnologia do Concreto assinado


por SEBASTIÃO BATISTA DOS SANTOS em maio de 2004 sobre o
estado físico das obras do açude Barra de Camará (fls. 612/616 - 3º
Volume):
2.2 - OMBREIRA ESQUERDA
A foto-07 mostra um ponto de percolação no contato do maciço com
a rocha, localizado a uma altura de 21 metros em relação ao nível da
bacia de dissipação distante de 32 metros do murro (sic) do
vertedouro nesta mesma cota e, a foto-08 mostra o escoamento
superficial da água oriundo do domesmo (sic).

2.3 - OMBREIRA DIREITA


A foto-09 mostra um ponto de percolação pela rocha fora do OFF-
SET, localizado a uma altura de 21 metros em relação ao nível da
bacia de dissipação e distante de 32 metros a partir do corrimão de
subida que dá acesso a entrada da galeria de drenagem.
Esta percolação pode ser proveniente de uma possível fendilação
ocorrida no interior do maciço rochoso que apóia esta ombreira, a
qual pode não ter sido observada quando no ato da execução dos
serviços de consolidação desta ombreira. A foto-10 mostra o
escoamento superficial oriundo deste ponto de percolação.
2.4 - GALERIA DE DRENAGEM
2.4.1 - Parede de Montante
Observou-se ao longo desta parede, que entre as camadas de sua
estrutura, tanto na ombreira direito quanto na esquerda, existe um
certo grau de saturação e de carbonatação, como mostram as fotos
11 e 12, o que é normal para este tipo de obra.
Na cota 434 da ombreira direita detectou-se um ponto de percolação
muito acentuada, como mostra a foto 16. Este fato nos deixa muito
preocupado. Na ombreira esquerda, na cota 442, foi observado um
outro ponto de percolação porém de menor intensidade como mostra
a foto-17. Isto também é preocupante, pois este pequeno fluxo pode
se transformar em pouco tempo, no mesmo fluxo detectado na cota
434, da ombreira direita.
2.4.2 - Teto
O teto desta galeria foi executado com blocos pré-moldados de
concreto, que pode dificultar a percolação da água do maciço, quando
da sua saturação, para a galeria, pois não foram projetados nenhum
dreno que ultrapassagem os mesmos. Esta afirmativa é nitidamente
observada nas fotos 13 e 14m as quais mostram percolações
acentuadas devido o descolamento horizontal e vertical destes pré-
moldados.
3 - RECOMENDAÇÕES E SUGESTÕES PARA CORREÇÕES DAS
ANOMALIAS
3.1 - Para os casos onde existem percolação do maciço para a
galeria, pelo contato maciço rocha e pela rocha de apoio da ombreira
direita, recomendamos contratar os serviços de uma empresa
especializada em tal assunto, de preferência aquele que for munida
de equipamentos do tipo TPR, para executar os mageamentos
necessários.
(...)".
No dia 31 de maio de 2004, a Procuradoria da SEMARH expediu
ofícios para a CRE Engenharia Ltda e para a Andrade Galvão
Engenharia Ltda, instando-as a comparecerem àquela Procuradoria,
para esclarecimentos escritos sobre as providências tomadas para
corrigir os defeitos técnicos constatados nas obras da barragem de
Camará (fls. 469/470).
Colhe-se dos autos que a CRE e a Andrade Galvão acusaram o
recebimento da citada convocação, esclarecendo à Procuradoria da
SEMARH quanto à necessidade do comparecimento do geólogo
ALEXANDRE SAGNORI ao local, para elaborar relatório conclusivo
sobre as providências a serem tomadas (fl. 1.627-6º Volume).
O citado geólogo chegou à barragem no dia 07 de junho de
2004, reunindo-se no dia seguinte com o engenheiro Antônio Soares
da Silva, da COGERH, oportunidade em que lhe sugeriu que
procedesse ao rebaixamento do nível da água do reservatório,
enquanto se definia quais os procedimentos a serem adotados.
Disse o citado geólogo ALEXANDRE SAGNORI no depoimento de
fls. 805/811 - 3º Volume:
"...que a ação do depoente limitou-se a dar sugestões para o
tratamento das falhas surgidas na ombreira esquerda, sendo que, na
sua segunda visita, em setembro, esses procedimentos ainda
estavam sendo implementados, razão pela qual não poderia, em
hipótese alguma, atestar, àquele momento, a plena execução das
medidas sugeridas; que com o retorno do depoente à Goiânia,
apenas ficou recebendo, por e-mail, os resultados das injeções nas
fundações, o que, aparentemente, demonstrava a execução dos
trabalhos, pelo depoente sugeridos, executados com critério e
qualidade; que dentre esses e-mails, recebeu informações sobre
alguns resultados com ensaios de perda d'água, que requereram a
sua complementação; que em nenhum momento foi o depoente
chamado para novamente visitar a obra e atestar a completa
execução por ele realizadas; que mostradas ao depoente fotografias
sobre a situação do maciço rochoso na ombreira esquerda, tiradas
após a tragédia do dia 17 de junho, entende o depoente que não é
possível, com base em fotografias, dar qualquer resposta definitiva
sobre a persistência de camadas intempéricas; que foi chamado
especificamente para analisar a situação da zona de preenchimento
na ombreira esquerda, embora tenha sido consultado, no local da
obra, sobre outras considerações de ordem geológica, incluindo as
injeções na formação; que o depoente não teve nenhuma
participação no projeto executivo da HOLANDA, sabendo que foi da
responsabilidade dessa empresa a apresentação desse projeto, não
podendo entrar em considerações sobre eventuais reduções no
número de furos para injeção nas fundações; ...que não foi levado ao
conhecimento do depoente a detecção, em 02/10/2001, consoante
indica um boletim de ocorrência elaborado, de que haveria sido
detectada na região da bacia de dissipação, próximo à ombreira
esquerda, um trecho onde a rocha estava fraturada e, em seguida,
após a remoção desse material fraturado, sido verificado a ocorrência
de um "bolsão" de rocha decomposta; que esse "bolsão" de rocha
decomposta tem feição óbvia geológica; que, observando a
mensagem eletrônica datada de 16/10/2001, dirigida pela Holanda
Engenharia à Barragem de Camará, com cópia para o depoente, o
que consta do Anexo 20, pode informar que trata-se de e-mail que
menciona atividades próximas da conclusão para a substituição do
material escavado na zona de preenchimento da ombreira esquerda;
que o depoente não teve qualquer participação na confecção do
"relatório da instrução de campo, datado de 29/10/2001, que trata
do muro esquerdo da bacia de dissipação, também acostado ao
Anexo 20; que em nenhum momento foi o depoente consultado sobre
a projeção e conformação do muro esquerdo da bacia de dissipação;
... que em razão dessa visita do dia 07, houve uma reunião no dia
subseqüente, na SEMARH, que contou com a presença do depoente,
do engenheiro Ovídio, do engenheiro Antonio Soares; que foi uma
reunião relativamente rápida, onde o depoente expôs que havia
observado, manifestando a sua opinião quanto a importância de
reduzir a pressão de água do reservatório, tendo em vista as
surgências que haviam sido detectadas na barragem de Camará; que
a sua sugestão foi no sentido da abertura ou desmonte da válvula
dispersora; que foi comentado por Antônio Soares que ele teria
alguma dificuldade para cumprir essa medida, não tendo alegado
nada entretanto; que ouviu falar que essa mesma medida já havia
sido sugerida pelo projetista Francisco Holanda, em visita realizada
anteriormente à visita do depoente;..."
FRANCISCO GLADSTON HOLANDA, responsável pelo
detalhamento do projeto de execução da Barragem de Camará,
também revelou ter sugerido ao Coordenador da COGERH, Antonio
Soares da Silva, rebaixar o nível da barragem (fls. 401/410 - 2º
volume):
"... que o depoente apresentou sim, por ocasião da conclusão da
obra, em julho de 2002, um relatório datado do dia 19 daquele mês;
... que nesse relatório de julho de 2002, cuja íntegra apresenta neste
ato, gostaria de destacar que houve recomendação para o
monitoramento da barragem, em especial a medição dos quadros de
vazão dos drenos e a evolução da cota do reservatório; que o
depoente entendeu que por se tratar a SEMARH um órgão que tinha
sob sua operação diversas barragens, seria natural que viesse a
adotar os procedimentos necessários para o bom acompanhamento
do enchimento do lago de qualquer barragem; que apesar da obra
haver sido entregue por volta de junho de 2002 e não configurar sob
responsabilidade da Holanda o acompanhamento do enchimento do
lago do reservatório, orientou à SEMARH, em comentários realizados
sob fotografias que lhes foram enviadas pelo consórcio construtor,
que monitorasse essas ocorrências; que no início de 2004, recebeu
solicitação das construtoras para participar de uma inspeção naquela
barragem, juntamente com técnicos da SEMARH; que desde julho de
2002, quando apresentou o relatório referido, não tinha ido mais ao
local da barragem, apenas tendo lá comparecido, consoante já
afirmado, em maio de 2004; que pode constatar que o aspecto da
barragem era de completo abandono, sendo que a inspeção ficou
bastante prejudicada, uma vez que os dados que deveriam ser
monitorados pela SEMARH, durante o enchimento, conforme
recomendações constantes do relatório final da obra (BAR-012), não
haviam sido colhidos; que nessa inspeção constatou que a galeria de
drenagem estava inundada em seu trecho central, com
aproximadamente seis metros de lâmina d'água, decorrente do
entupimento dos tubos de escoamento das águas provenientes dos
furos de alívio; que apenas no intuito de orientar, o depoente
recomendou ao preposto da SEMARH que se esgotasse a galeria,
desobstruindo os drenos; que orientou, ainda, que se convocasse o
geólogo para análise do problema e, por último, sugeriu que fosse
controlado o nível do reservatório, com a abertura dos dispositivos de
tomada d´água; que foi ao local da obra no dia 17 de maio e no dia
subseqüente, 18, houve uma reunião na CRE, que contou com a
presença do depoente, do Sr Ovídio e do engenheiro Antonio Soares,
da SEMARH, para tratar do assunto, ocasião em que foi sugerido pelo
depoente que a SEMARH controlasse o nível do reservatório,
mediante abertura dos dispositivos da tomada d'água; que essa
recomendação foi verbal; que pela sugestão do depoente, a válvula
dispersora poderia ser, inclusive, desmontada para aumentar a vazão
da água do reservatório; que não houve resposta na hora por parte
de Antônio Soares, tendo o depoente, entretanto, sentido a sua
preocupação de que a adoção das medidas sugeridas pelo depoente
poderiam causar perda significativa de água no reservatório, além de
aumento do quadro de vazão da jusante da barragem, agravado pelo
período chuvoso se atravessava;...

O próprio ANTONIO SOARES DA SILVA, ex-Coordenador da


COGERH, admitiu ter recebido sugestão para esvaziar a represa em
pauta (fls. 440/448 - 2º Volume):

"... que, visando a acompanhar o primeiro enchimento da barragem


de Camará, em razão das chuvas que caíram no início de 2004, a
SEMARH procedeu, desde janeiro de 2004, ao monitoramento desse
enchimento, caracterizado pela presença de engenheiros de seus
quadros, de uma a duas vezes por mês no local da obra; que essas
visitas foram sempre acompanhadas por um representante da
empresa CRE, sendo que tais dados de monitoramento eram
repassados à Holanda Engenharia, via e-mail, para análise e
pronunciamento; que nessas visitas iniciais nos primeiros meses de
2004, não houve confecção de relatórios, apenas tendo sido tiradas
fotografias que eram posteriormente encaminhadas, conforme já
noticiado, ao Dr. Francisco Holanda; que a partir do mês de março
do corrente ano, pôde constatar a existência de problemas nos
drenos de saída da galeria de inspeção, que estava inundada na parte
de fundo; que nos meses de março e abril começaram, em razão
dessa constatação, a ser adotadas providências que visassem à
correção desses problemas, no caso, o desentupimento dos referidos
drenos; que, a partir de maio de 2004, foram constatados problemas
de ordem mais grave, os quais se encontram narrados no ofício que
foi dirigido ao depoente, em 21/05/2004, pelo engenheiro Francisco
Leunam; que, em razão do teor desse ofício, levou o fato
formalmente ao conhecimento do Secretário de Recursos Hídricos;
que a intenção desse ofício de Francisco Leunam foi a de formalizar a
constatação dos referidos problemas, o que já havia sido presenciado
pelo depoente, pessoalmente, no dia 03/05/2004, quando esteve na
barragem acompanhado do Dr. Francisco Holanda e do engenheiro
Ovídio, da CRE; que dessa visita realizada surgiu o relatório subscrito
pelo depoente, em 24/05/2004, cuja íntegra apresenta neste ato,
acompanhado de registros fotográficos e de anotações abaixo dessas
fotografias de autoria do próprio depoente; que no dia 18/05/2004 o
depoente foi chamado para comparecer à CRE, onde já se
encontravam os engenheiros Francisco Holanda e Ovídio, além de
Flávio Cota, ao que se lembra, ocasião em que trataram desses
problemas surgidos na barragem; que naquela ocasião ficou decidido
que a CRE traria alguém para realizar a abertura do concreto em uma
janela de um metro por um metro, visando a esgotar a água no fundo
da galeria, o que foi feito sem acompanhamento da SEMARH naquele
momento; que nessa reunião não houve sugestão, por parte de quem
quer que seja, da abertura da válvula dispersora para, a partir do
controle de vazão do reservatório, poderem ser realizados os
tratamentos devidos na fundação, caso fosse necessário; que essa
hipótese de abertura da válvula dispersora, incluindo o seu demonste
(sic), foi aventada pelo Dr. Francisco Holanda, como uma
possibilidade, tendo o depoente dito na ocasião que estaria
aguardando o relatório que seria elaborado pela Holanda Engenharia
para que pudesse analisar o assunto, o que se daria a partir da
inspeção in loco por parte do geólogo Alexandre Sagnori; que quando
Alexandre Sagnori esteve na barragem, em 07 ou 08 de junho, foi
acompanhado apenas pelo engenheiro da CRE de nome Ovídio Catão,
visita que não teve o acompanhamento de qualquer técnico da
SEMARH; que na volta dessa visita Alexandre Sagnori e Ovídio
passaram na COGERH, ocasião em que conversaram com o depoente,
tendo o geólogo referido indagado ao depoente por que não se podia,
desde aquele momento, fazer o controle do nível da barragem para
facilitar o tratamento de fundação, no que respondeu que a barragem
estava apenas com 64% (sessenta e quatro por cento) da sua
capacidade, o inverno estava no fim e que para perder a água
preferia perdê-la utilizando-a (grifei); que tomou conhecimento que,
no dia 31/05/2004, a Procuradoria da SEMARH cobrou das empresas
uma solução urgente para os problemas detectados, no que houve
resposta que deu entrada na SEMARH no dia 07/06/2004; que
quando ocorreu a tragédia do dia 17/06/2004, o depoente e demais
engenheiros da SEMARH estavam no aguardo do relatório da Holanda
Engenharia sobre as providências que seriam adotadas;... que a
responsabilidade pela manutenção das barragens paraibanas é da
SEMARH; ...que a função dos drenos de alívio é colher água que, por
excesso, pode entrar por entre as rochas de fundação, as quais são
coletadas através do dreno para dar alívio às supressões existentes
na fundação; que isso tudo é dimensionado pelo projetista de acordo
com os parâmetros por ele definidos; que o excesso de captação de
água pelos drenos de alívio poderia sinalizar, em tese, que o
tratamento adotado nas fundações não surtira o efeito desejado,
razão pela qual o depoente repassou o problema para o projetista
analisar o assunto e opinar a respeito; ... que o depoente reconhece
ter recebido, em 29/03/2004, da CRE Engenharia, fotografias
remetidas pela Holanda com anotações a respeito dos registros ali
mencionados; que dentre essas anotações, há uma que evidencia
que, junto ao pé do muro esquerdo, haveria a presença de mancha
de umidade que precisaria ser verificada por estar na região da falha
detectada na ombreira esquerda; que o depoente não detectou maior
relevância nesse registro uma vez que houve presença sua pessoal
no local da obra, além de outros engenheiros da SEMARH, bem como
do próprio Francisco Holanda, e nenhum registro adicional a respeito
foi feito; que não saberia dizer, neste ato, quantos drenos de alívio
existem na barragem de Camará; que haviam em torno de quatro
drenos de alívio obstruídos na barragem, segundo constatado in loco,
apesar do engenheiro Francisco Leunam ter feito, no memorando nº
083/2004, menção de que mais da metade dos drenos de alívio
estariam obstruídos, apenas tendo sido constatado posteriormente,
quando do esvaziamento da galeria, aquele número inicial de quatro
sem funcionamento; que apenas uma parte dos drenos de alívio
estava coberta por água nas galerias; que esses drenos de alívio
submersos não permitiam a visualização de existência de obstrução,
por parte de quem quer que seja, sendo exatamente essa a razão
pela qual o Dr. Francisco Leunam considerou como em não
funcionamento, já que ele perde a sua eficiência; que, supõe, em
razão do nível do reservatório, que esses drenos submersos seriam
um pouco superiores à metade do total; que com a inundação não
havia possibilidade de desobstrução dos drenos de alívio; ..."

GILMAR FERREIRA DA SILVA, ex-Coordenador de Obras da


SEMARH, afirmou o seguinte (fls. 602/607 - 3º Volume):

"... que não tem lembrança de ter recebido das empresas o manual
de monitoramento do primeiro enchimento, considerando ser de
conhecimento público como se deve fazê-lo; que apresenta a esta
Comissão, neste ato, cópia do manual de segurança e inspeção de
barragens, elaborado pelos técnicos do Ministério de Integração
Nacional, datado de julho de 2002; que, dentre outros pontos, há
informações nesse relatório sobre como deve ser monitorado o
primeiro enchimento das barragens, bem como subseqüentes; que a
SEMARH recebeu, à época, cópia desse manual, ainda quando o
depoente se encontrava como coordenador da COGERH; ..." (g.n.).

O descaso do Estado da Paraíba com a manutenção da


Barragem de Camará está sobejamente provado, conforme visto
acima.
Os elementos de convicção, até agora colhidos, leva-me a
proclamar a responsabilidade do Estado da Paraíba pelo evento
danoso.
O Estado da Paraíba quando firmou o Convênio 199/2000, para
receber parte considerável de recursos federais destinados à
construção da barragem se responsabilizou perante a União pela boa
execução da obra e fiscalização e objeto do contrato, nos termos art.
112 da Lei nº 8.666/93, de seguinte teor:
"Art. 112. Quando o objeto do contrato interessar a mais de uma
entidade pública, caberá ao órgão contratante, perante a entidade
interessada, responder por sua boa execução, fiscalização e
pagamento.

O Manual de Segurança e Inspeção de Barragens expedido em


julho/2002 pela Secretaria de Infra-Estrutura Hídrica do Ministério da
Integração Regional (fls. 634/772 - 3º Volume), diz, no que
interessa:
"[...]
3. DEFINIÇÕES, CONCEITOS E RESPONSABILIDADES.
O presente trabalho descreve os principais desafios que se
apresentam para as equipes de operação e manutenção de segurança
de barragens e estrutura associadas. Pouco adianta a leitura e análise
de dados na instrumentação, à exceção de inspeções periódicas e à
manutenção de arquivos com dados históricos de cada estrutura, se
as medidas corretivas que se fizeram necessárias para restabelecer
as condições de segurança não forem implementadas.
3.1. Geral
O proprietário (e o concessionário, quando designado) é o
responsável pela segurança da barragem em todas as fases, isto é,
construção, comissionamento, operação e eventual abandono,
respondendo pela consequências de eventuais incidentes e acidentes.
Todas as barragens devem ser classificadas quanto às consequências
de uma ruptura ou dano em potencial, em que devem ser
considerados, entre outros, os seguintes fatores:
* Aspectos Sociais
* Aspectos Ambientais
* Aspectos Estruturais
* Aspectos Econômicos
Todas as barragens devem ser inspecionadas periodicamente para
detectar eventuais deteriorações e recomendar ações remendiáveis:
* Inspeções de Rotina
* Inspeções Formais
* Inspeções de Especialistas
* Inspeções de Emergência
Toda barragem deve ser instrumentada de acordo com seu porte e
riscos associados e ter os dados analisados periodicamente com a
realização de leituras. Todos os instrumentos devem ser dotados de
valores de controle ou limites.
Todas as barragens devem ser submetidas periodicamente a uma
reavaliação de suas condições de segurança, segundo sua
classificação quanto às consequências de ruptura.
As eventuais obras de reparo ou de manutenção a recomendadas nas
inspeções, deverão ser implementadas com a máxima brevidade
possível, bem como, as providências e recomendações devem ser
registradas.

As equipes de operação e manutenção das barragens devem ser


treinadas e dispor de um plano de procedimentos de emergência para
orientação em casos extremos - tais como a passagem de cheias
excepcionais - que contemple, pelo menos:

- Como proceder em resposta aos alertas da instrumentação;


- O que fazer para manter a população mobilizada;
- Quais as providências a serem tomadas contra danos patrimoniais e
ambientais.

As barragens deverão ser dotadas de um plano de emergência,


objetivando a segurança das pessoas residentes a jusante, em caso
de acidente.

Este Manual não pretende substituir especificações, projetos de


reabilitação ou construção, ele não deve compartilhar
responsabilidade com as designações de
projeto, dos construtores e montadores, e nem deve ser
utilizado como manual de instrução para pessoas não atuantes no
ramo da Engenharia Civil.

O uso de critérios diferentes dos aqui indicados podem


eventualmente ser apropriados ou mesmo necessários,
conforme condições específicas de alguns empreendimentos e
visando, muitas vezes, à aplicação de novos conhecimentos, de
técnicas melhoradas de projeto, construção e de avaliação da
segurança de barragens.

A responsabilidade quanto à interpretação apropriada, à verificação e


aplicação deste Manual é dos engenheiros empenhados no
gerenciamento de segurança de barragens e das organizações ou
empresas que os empregam ou contratam.
E, continua:

4. GENERALIDADES

4.1 Introdução

Uma barragem segura é aquela cujo desempenho satisfaça as


exigências de comportamento necessárias para evitar incidentes e
acidentes que se referem a aspectos estruturais, econômicos,
ambientais e sociais.

A segurança das barragens existentes deve ser avaliada


regularmente pelas reavaliações de segurança de todas as estruturas
e instalações. A segurança de uma barragem pode ser garantida por:

l Correção de qualquer deficiência prevista ou constatada;


l Operação segura, continuada, manutenção e inspeção (item 6);
l Preparação adequada para emergências (item 7).
4.2 Aplicabilidade do Manual de Segurança de Barragens

Os requisitos técnicos e as diretrizes aqui apresentadas são


direcionados para barragens em que as conseqüências da ruptura
incluem a possível perda de vidas ou danos adicionais aos domínios
do proprietário. Deve-se prever reavaliações regulares das
conseqüências de uma ruptura de barragem, na medida em que as
conseqüências da ruptura possam mudar, por exemplo, devido a
alterações no uso de terras a jusante.

Este Manual deve ser utilizado obrigatoriamente para barragens


destinadas a reter e/ou represar água ou rejeitos,
independentemente do material com que foram ou serão construídas,
e que tenham:

l Altura superior a 15 (quinze) metros, do ponto mais baixo da


fundação à crista; ou
l capacidade total de acumulação do reservatório igual ou maior que
1 (um) milhão de metros cúbicos.

Este Manual pode também ser aplicado em barragens que não se


enquadrem na definição acima, mas que possam provocar danos em
caso de ruptura ou acidente.

Ainda sobre a responsabilidade pela segurança da barragem o


referido manual dispõe:

4.3 Responsabilidade pela Segurança da Barragem


CONDIÇÃO RELEVANTE: A responsabilidade por todos os aspectos
relacionados à segurança de barragens deve ser claramente definida.

O proprietário da barragem tem, em última instância, a


responsabilidade por todos os aspectos relacionados a
sua segurança. O proprietário deve assegurar que a operação da
barragem e a sua manutenção sejam executadas por pessoas que
tenham conhecimento e habilitação para tal. Iniciativas apropriadas
devem ser tomadas com relação ao treinamento do quadro de
pessoal.

O proprietário da barragem deve assegurar que as reavaliações de


segurança da barragem, bem como os aperfeiçoamentos, sejam
conduzidos sob a direção de engenheiros qualificados para tal. Todas
as reavaliações de segurança da barragem, investigações, análises e
melhorias devem utilizar métodos que sejam compatíveis com os
requisitos exigidos por este Manual.

CONDIÇÃO RELEVANTE: Quando a posse de uma barragem for


transferida, as partes devem coletar e reunir toda a documentação
técnica existente, especialmente aquela contendo os dados e
eventuais preocupações concernentes à sua segurança. A
responsabilidade pela continuidade ou criação da supervisão das
condições de segurança da barragem deve ser claramente definida.

A transferência de documentação deve incluir as seguintes


informações, caso disponíveis:

* l Resultados de investigações das fundações;


* l Detalhes de projeto e plantas de "como construído";
* l Registros da fase construtiva;
* l Manuais de operação;
* l Registros da instrumentação;
* Relatórios de inspeção;
* l Relatórios de segurança;
* l Relatórios ambientais;
* l Estudos de inundação e planos para situações de emergência.

Quanto aos procedimentos de emergência, preconiza o


mencionado manual:

7. PROCEDIMENTOS DE EMERGÊNCIA

7.1 Geral

CONDIÇÕES RELEVANTES: Emergências potenciais em uma


barragem devem ser identificadas e avaliadas, levando em
consideração as conseqüências da ruptura, de modo que ações
apropriadas, corretivas ou preventivas possam ser empreendidas.
O Plano de Ação Emergencial (PAE) deve ser preparado, verificado,
divulgado e mantido para qualquer barragem, cuja ruptura possa
ensejar como resultado a perda de vidas, bem como para qualquer
barragem para a qual um alerta antecipado possa reduzir os danos a
montante ou jusante.
Um processo notificativo deve ser iniciado, imediatamente, ao se
encontrar uma condição insegura, que poderia conduzir a uma brecha
na barragem, ou quando se descubrir uma erosão em progresso,
como especificado no PAE.
O proprietário da barragem ou o operador deve avaliar se a
população das áreas imediatamente à jusante da barragem deve ser
avisada da condição de brecha na barragem, devido ao curto espaço
de tempo antes da chegada antecipada da onda de cheia provocada
pela ruptura.
Ações preventivas devem ser iniciadas de maneira apropriada, para
evitar a ruptura ou para limitar danos onde a ruptura for inevitável.

O proprietário da barragem tem a responsabilidade de prevenir a


população quanto a uma situação perigosa, porém esses alertas
devem basear-se nas informações prestadas pelo proprietário ou pelo
operador da barragem. Esses últimos são responsáveis pela conexão
apropriada da observação da barragem (ver item 6.4 do capítulo 6)
com os procedimentos de resposta a situações de emergência.

A falta de regulamentos não isenta o proprietário da barragem da


responsabilidade em elaborar, atualizar e seguir o Plano de Ação
Emergencial (PAE).
[...]".

No entanto, à toda evidência, nem um mínino do que o Manual


prevê foi seguido pelo proprietário da obra. Não consta que o Estado
da Paraíba manteve equipe de monitoração e observação do
comportamento da reservatório durante o seu enchimento, pelo
contrário, abandonou à sua própria sorte o destino da represa, em
que pese a constatação de anomalias que sinalizavam uma ruptura.
Para se ter uma idéia do total abandono da Barragem Camará por
parte proprietário cito as declarações de Eugênio Parceli Quirino,
simples morador de Lagoa Nova/PB, prestadas ao MPF (fls. 159/160):

"...que verificou pessoalmente a três meses atrás, que havia


vazamento generalizado de água, por entre as rochas localizadas na
Barragem; que antes disso já havia comentários dos moradores da
Região a respeito desses vazamentos; que pelo que sabe, a única
pessoa "que tomava conta da Barragem era o conhecido por ZÉ
PREÁ, havendo comentários que ele recebia R$ 100,00 por mês para
prestar esse serviço, não sabendo o DECLARANTE dizer se isso era
verdade e quem pagava esse dinheiro, mas que ele estava todos os
dias na Barragem o DECLARANTE pode comprovar; que em razão
desse constantes vazamentos ZÉ PREÁ já tinha alertado a população
local que "a Barragem iria embora...".

No mesmo sentido as declarações do morador local, Rivelino de


Lima Carneiro (fls.163/164):

"...que todos na região sabiam desse vazamento, inclusive um


prestador de serviços da CAGEPA conhecido por ZÉ PREÁ, que ZÉ
PREÁ visitava a Barragem diariamente e anunciava a todos em
Alagoa Nova que se não fossem tomadas providências "a Barragem
iria embora... que ao ver o constante vazamento o DECLARANTE
sempre pensou que deveriam abrir as comportas para que se
pudessem tapar os vazamento...".

Do depoimento dado pelo Engenheiro Flávio José Cota Silva,


lider da obra de janeiro/2001 a julho/2002, lê-se:

"...que nas duas visitas que realizou a barragem Camará neste ano,
não encontrou nenhum funcionário da SEMARH lá na barragem; que
quem possuía as chaves da barragem era um morador vizinho a
barragem; que o estado geral da barragem era de completo
abandono; que "José Preá" era o morador vizinho da barragem, que
guardava as chaves das galerias"

Finalmente, o depoimento de José Avelino, o referido "ZÉ


PREÁ", prestado à Promotoria de Justiça de Alagoa Grande/PB:

"...que desde janeiro do corrente ano a água da barragem estava


minando em drenos da galeria; que informou à Secretaria de
Recursos Hídricos do Estado da Paraíba, da irregularidade por ele
constatada; que ora informava ao Dr. Soares, cujo telefone é
2185048, ora avisa ao Senhor conhecido como Leonan, com esta
contatando pelo telefone 93031016; que ambos, Dr. Soares e
Leonan, foram até o local, mas não tomaram nenhuma providência;
que em fevereiro ou março do corrente ano um representante da
Cagepa esteve na barragem, verificou que minava água dos drenos
da galeria, mas não tomou nenhuma providência...;que não fazia
trabalho de vigilância, que nunca houve vigilante na barragem, que
nunca falou para a população local que "a barragem iria embora"...;
que, antes da parede da barragem romper, ligou às 16:00 h para o
Sr Leonan, avisando que estava tudo normal e que os drenos
estavam funcionando. Que furtaram todos os fios que margeavam a
escada da parede da barragem; que a SAELPA interrompeu o
fornecimento de energia elétrica da barragem em janeiro; que os fios
foram furtados nessa ocasião; que qualquer pessoa entrava e saía a
hora que quisesse da barragem ".

Disso decorre que nunca houve o monitoramento do primeiro


enchimento do reservatório.

3. Da responsabilidade das construtoras

Visando justamente aferir a acusação dirigida às construtoras -


de que a Barragem Camará foi assentada em blocos praticamente
soltos, existentes ao longo da ombreira esquerda, os quais não
teriam sido removidos durante a construção, e outras dúvidas,
sobretudo se a dita "falha" que provocou o rompimento da ombreira
esquerda era imprevista e imprevisível, foi determinada a realização
de perícia geológica, qual veio aos autos em fls. 4559/4583.
Quanto a esses pontos, mister se faz transcrever trechos do
laudo pericial, primeiramente, em relação aos quesitos formulados
pela construtoras rés, no que pertine, a saber:
"PERGUNTA 01: A feição (falha) geológica considerada no acidente da
barragem é a relatada no relatório técnico mensal da obra, datado de
dezembro de 2000 bem como no Diário de Obras de 18 de janeiro de
2001 (página 349 do 1° volume do processo), ou é o bolsão de rocha
decomposta na região da bacia de dissipação, de que trata o Diário
de Obra de 02 de outubro de 2001 (página 312 do 1° volume do
processo)?

Resposta:

Sim, a feição geológica considerada no acidente da barragem é a


relatada no relatório técnico mensal da obra, datado de dezembro de
2000 e em cota abaixo da cota da sondagem da ATECEL bem como
no Diário de Obras de 18 de janeiro de 2001 (folhas 349 do 1°
volume do processo), conforme transcrito:

'As escavações da fundação da galeria deverão continuar. Após


definição de projeto pela Holanda Consultoria, e aprovado pela
COGERH. Com o surgimento da camada de rocha decomposta, em
cota abaixo do perfil de sondagem executado pela ATECEL, solicito'

Esta feição geológica da ombreira esquerda, não tem nenhuma


relação com o bolsão de rocha decomposta encontrado na bacia de
dissipação, de que trata o Diário de Obras de 02 de outubro de 2001
(página 312 do 1° volume do processo), conforme transcrito:

'Nesta data foi detectada na região da bacia de dissipação, próximo à


ombreira esquerda, um trecho onde a rocha estava fraturada. Após a
remoção deste material fraturado verificou-se a ocorrência de um
bolsão de rocha decomposta. O material decomposto será totalmente
removido até encontrar rocha sã.
Posteriormente o 'bolsão' será preenchido com concreto de
regularização'.

Este bolsão nada tem com o comportamento da ombreira esquerda,


situava-se no fundo do vale e somente foi feita uma referência a sua
proximidade com a ombreira esquerda para fins de localização. Ou
seja, situava-se no fundo do vale, não no centro ou à direita, mas à
esquerda. Este foi limpo e concretado conforme Relatório Técnico de
Obra do mês de outubro de 2001.

De acordo com os estudos realizados e apresentados nos autos a


feição geológica na ombreira esquerda é a correlacionada com o
acidente e não atinge a estrutura da laje da bacia de dissipação, onde
estava situado este bolsão citado acima".

"PERGUNTA 04: Após as escavações efetuadas, pelas empresas, na


ombreira esquerda, em cota abaixo da cota da sondagem rotativa da
ATECEL, foi identificada a presença de rocha decomposta, conforme
descrito no Diário de Obra do Dia 18 de janeiro de 2001 (página 349
do 1º volume do processo). O comportamento da ombreira, após o
tratamento efetuado, era previsível?

Resposta:

Não. Após o tratamento efetuado na ombreira não havia previsão de


que pudesse ocorrer o mecanismo do acidente sendo que interpreta-
se que este não tem origem na região específica da fundação da
barragem, e que possivelmente poderia ter sido evitado caso ações
tivessem sido tomadas pela operação do reservatório.
Tendo sido tomadas todas as providências indicadas pelo geólogo
Alexandre Sagnori não havia como prever o comportamento da
ombreira que levou ao acidente. Cabe ressaltar que na ocasião o
geólogo Alexandre Sagnori, além de ter acesso visual a toda
superfície da rocha da fundação, acompanhou a execução de quatro
furos com perfuratriz ("rock drill") na região do tratamento para
orientação de suas recomendações, sendo posteriormente executados
mais três furos de rotativa (conforme Relatório BARC 010 -R0
elaborado pela Holanda Engenharia sobre as ponderações técnicas da
visita do geólogo Alexandre Sagnori - folhas 832 a 845 do 3° volume
do processo (mesmo relatório presente no Relatório Técnico da Obra
do mês de marco de 2001);
Também em sua segunda visita à obra em 19 de setembro de 2001
foi determinado um furo com 60° de inclinação com a horizontal
sobre a zona de preenchimento próximo ao contato onde foi
executado um ensaio de injeção de calda de cimento para simular o
comportamento da injeção do material alterado. Determinou também
a injeção de 8 furos de consolidação, denominados F1 a F8
procurando aumentar a resistência e a estanqueidade da zona de
preenchimento próximo ao paramento (conforme Relatório Geológico
Geotécnico Segunda Visita presente no relatório técnico da Obra de
Novembro de 2001 e de Outubro de 2001 - fotos dos furos F1 a F8).
Conclui-se, portanto, a favor das boas condições de suporte do local.
Conseqüentemente o comportamento verificado alguns anos depois
foi considerado imprevisto e, perante os dados coligidos,
imprevisível".

"PERGUNTA 17: O andamento da obra, com a escavação para


limpeza da fundação e assentamento da barragem na ombreira
esquerda da Barragem de Camará, restringiu-se ao recomendado no
projeto da ATECEL, ou foi além, mais específicas e profundas do que
o previsto em projeto, se cercando de cuidados especiais conforme a
boa prática da engenharia?

Resposta:

Os dados disponibilizados e tratados permitem colocar que as


escavações da limpeza da fundação foram realizadas além dos limites
previstos no projeto da ATECEL, resultando inclusive no acréscimo da
extensão da barragem de 59,990m (passou de 236,00m para
295,99m). Conforme folhas 4086 a 4327 do 17° e 18° volumes do
processo, projeto ATECEL 02/09 e projeto as built BC-HOL-E-001
respectivamente.
A comprovação de que esta escavação se deu em cota abaixo do
limite da sondagem rotativa da ATECEL pode ser feita através do
cotejamento entre o perfil da sondagem furo n° 03 na estaca 4, com
o projeto as built acima.
O acompanhamento das escavações teria levado os profissionais que
a acompanhavam a definir seu aprofundamento até o material
considerado aceitável. (conforme Projeto "as built" Projeto de
escavação - planta e perfil longitudinal, Documentos do Projeto
Executivo, Apenso IV do Processo)".

PERGUNTA 22: Qual era a função do geólogo Alexandre Sagnori na


construção da Barragem? Foram por ele adotadas técnicas de
protocolos convencionais para barragens em questão nas pesquisas
realizadas para investigar a descontinuidade da feição geológica
(maciço rochoso) que se apresentou na Ombreira Esquerda? A
adoção de tais técnicas de investigação permitiria propor soluções
para a mitigação do problema que veio a ocorrer? Esta solução foi
adequadamente executada?
Resposta:

"A função desempenhada pelo geólogo Alexandre Sagnori na


construção da barragem foi de consultor, conforme relatório BAR 01 -
R0 Março 01 da Holanda Engenharia sobre ponderações técnicas
elaboradas pelo próprio engenheiro geotécnico Alexandre Sagnori;
seu objetivo seria de analisar a zona de preenchimento com solo
residual na ombreira esquerda, avaliar os riscos e propor sugestões
para o tratamento (folhas 832 a 845 do 3° volume do processo e
mesmo relatório presente no Relatório Técnico de Obra do mês de
março de 2001).
Segundo o Relatório da Segunda Visita (conforme Relatório Geológico
Geotécnico Segunda Visita presente no Relatório Técnico da Obra de
novembro de 2001) o próprio Alexandre Sagnori descreve:
'Este relatório inclui ainda o período posterior à visita, até o
final de outubro, durante o qual foram executadas injeções
complementares e ensaios de perda d'água, tanto no eixo como na
zona de preenchimento da ombreira esquerda.
Estão abordados aqui os seguintes assuntos:
* Resultados parciais e finais das injeções da fundação;
* Material instável próximo ao paramento de montante na ombreira
esquerda;
* Segunda avaliação e sugestões para o tratamento da zona de
preenchimento da ombreira esquerda.'

Segundo o Termo de Depoimento prestado junto ao Ministério Público


Federal (folhas 805 a 811 do 3° volume do processo) o geólogo
Alexandre Sagnori afirma que 'foi convidado para fazer uma avaliação
do problema da descontinuidade do maciço rochoso e, em seguida,
apontar sugestões para a sua correção; que exerceu, para assim
dizer, trabalhos de consultoria.'
Em resumo a função desempenhada pelo geólogo Alexandre Sagnori
foi como consultor responsável por fazer uma análise, avaliar os
riscos e propor sugestões para o tratamento.

Sim. Foram adotadas pelo geólogo técnicas de protocolos


convencionais para barragens em questão. Os serviços por ele
executados ao fazer um levantamento geológico da superfície,
examinar as investigações já disponíveis e acompanhar a realização
de novos furos são os procedimentos usuais, adotados correntemente
pelos profissionais da sua área, em sintonia com a boa prática
brasileira.

Sim. As técnica de investigação são as usualmente utilizadas e


permitiriam propor soluções para a mitigação do problema.
As técnicas de investigação empregadas incluíram quatro furos de
investigação por roto-percussão, acompanhadas durante a perfuração
por um geólogo, de três furos complementares de sondagem rotativa,
ensaios de perda d'água e injeções experimentais juntamente com o
mapeamento de toda a superfície da rocha de fundação exposta pela
escavação de trincheira, que, conjuntamente com a análise das
investigações realizadas por ocasião do projeto da ATECEL,
orientaram as medidas de correção do problema detectado.
O geólogo no seu depoimento ao Ministério Público Federal (folha 805
a 811 do 3° volume do processo) afima que:
'que o depoente entendeu suficiente/adequadas essas cinco medidas
indicadas para tratar de forma eficaz aquela descontinuidade e,
portanto, dar seguimento à execução da obra; que o depoente
entendeu, de acordo com os dados disponíveis, que as três
sondagens adicionais foram suficientes para basear as sugestões
técnicas apresentadas em março de 2000; que além dessas três
sondagens, nenhuma outra, ou estudo complementar, foi feito a
respeito para basear as sugestões técnicas apresentadas.'

Sim. As ações sugeridas para solução teriam sido adequadamente


executadas, conforme Relatório Técnico de Obra de abril de 2001
(furos de sondagens rotativas sendo executadas); Relatório de maio
de 2001 (execução do muro de contenção); Relatório de
setembro/2001 (limpeza da feição geológica da ombreira esquerda);
Relatório de outubro/2001 (Furos adicionais para injeções F1 a F8,
concretagem da falha, tubos para injeção da feição geológica).

"PERGUNTA 23: É verdade que, segundo o perito do Ministério


Público Federal, Milton Assis Kanji, o julgamento inadequado pode ser
explicado, após exposição ampla da superfície de ruptura ondulada,
permitindo constatar tardiamente que o preenchimento de solo
apresentava-se intermitente, anastomasado e localmente ausente,
com espessuras locais não detectáveis por sondagem ou pela
perfuração executada?

Resposta:

Em todos os relatórios examinados é consenso dos profissionais


envolvidos a caracterização da geologia do local como complexa.
Considerando este aspecto, está correta a análise do Professor Kanji.
A inspeção a posteriori deve ser diferenciada do julgamento feito em
obra, sem o conhecimento do comportamento adverso ocorrido".

"PERGUNTA 26: Por ocasião da elaboração do projeto e no decorrer


da execução da obra, houve algum indício da necessidade de estudos
complementares, além dos já efetuados e disponíveis que nortearam
os trabalhos? Os estudos realizados foram além daqueles previstos no
projeto básico da ATECEL?

Resposta:
O modelo geológico assumido no projeto básico, foi baseado na
premissa de uma geologia relativamente simples, não tendo induzido
a necessidade de maiores investigações além das que foram
programadas e executadas.
Com a identificação da feição geológica, durante a escavação da
ombreira esquerda, foram executados quatro furos com perfuratriz
('rock drill'), indicados e acompanhados pelo geólogo Alexandre
Sagnori, posteriormente mais três furos de sondagem rotativa, ensaio
de injeção de cimento e ensaio de perda d'água, que foram
considerados suficientes para orientar as medidas de correção do
problema detectado. Estes estudos complementaram aqueles
constantes no projeto básico da ATECEL. (folhas 4089 a 4273 do 17°
volume do processo)".

"PERGUNTA 31: Durante a fase de projeto ou no decorrer da obra,


tendo em conta a prática corrente de engenharia de barragens,
poderiam ter sido identificadas as condições do maciço de fundação e
previsto o desenvolvimento dos possíveis processos que levaram a
ruptura da barragem?

Resposta:

Conforme exposto ao longo das respostas às outras perguntas, a boa


prática da engenharia de barragens brasileiras prevaleceu durante
todo o projeto e andamento da obra. A particular feição geológica da
obra foi identificada e tratada durante as escavações de obra.
Levando-se em conta a boa prática corrente, a melhor fase para
identificação e mitigação dos processos que levaram à ruptura da
fundação da barragem seria durante o seu primeiro enchimento, com
um criterioso acompanhamento e monitoramento, conforme previsto
no Manual de Segurança e Inspeção de Barragens, da Secretaria de
Infra Estrutura Hídrica do Ministério da Integração Nacional e
também das conclusões dos Relatórios dos peritos do Ministério
Público Federal". (realcei)

"PERGUNTA 32: Há registro que o bolsão de rocha decomposta na


região da bacia de dissipação, a que se refere a anotação do Diário de
Obra do dia 02 de outubro (folha 312 do 1° volume do processo), foi
retirado e preenchido com concreto de regularização?

Resposta:
Sim. No Relatório Técnico da Obra referente ao mês de outubro de
2001, constam duas fotos com as legendas:
'Escavações do bloco de rocha decomposta a Jusante" e
"Concretagem do Bolsão de rocha de jusante'.
Estes serviços estão coerentes com a recomendação contida na
anotação do Diário de Obra do dia 02 de outubro, de que este fosse
totalmente removido até encontrar rocha sã e depois preenchido com
concreto de regularização.
Como já mencionado em perguntas acima, este bolsão não tem
relação com a feição geológica (zona de cisalhamento dúctil/rúptil) da
ombreira esquerda". (realcei)

PERGUNTA 37: Nas causas do acidente da barragem de Camará,


apresentadas nos três trabalhos anexos ao processo, consta
afirmação, ou mesmo comentário que a barragem foi assentada em
blocos praticamente soltos e que este foi fato determinante para o
colapso da barragem?

Resposta:

Não, nas causas do acidente da barragem de Camará, apresentadas


nos três trabalhos anexos ao processo, cujos profissionais detêm
conhecimento específico da disciplina de geologia/geotecnia, não
constam afirmação, ou mesmo comentário que a barragem foi
assentada em blocos praticamente soltos e que este foi fato
determinante para o colapso da barragem.
Trabalho 01 - Parecer Técnico sobre as Causas da Ruptura da
Barragem de Camará", nas folhas 2.216 a 2.258 do 8° volume do
Processo, de autoria do Perito do Ministério Público Federal Milton
Assis Kanji;
Trabalho 02 - Relatório de Diagnóstico do Sinistro da Barragem de
Camará CAM 141104, de autoria do Perito do Ministério Público
Federal Eng. Carlos Manuel Nieble, nas folhas 2.259 a 2.339 do 8º
volume do Processo;
Trabalho 03 - Relatório de investigação e diagnóstico das causas que
levaram à ruptura da fundação da barragem de Camará (Apenso
Volume I de IV do processo) de autoria dos profissionais Professor
Doutor Georg Robert Sadowski e Luiz Guilherme Francisco Soares de
Mello - item II.2 Modelo geológico. (realcei)

Respostas aos quesitos formulados pelo ESTADO DA PARAÍBA:

"QUESITO Nº 05

Que outro profissional, além daqueles que estavam diretamente na


obra, foi chamado para analisar a falha geológica e oferecer solução
técnica demandada pela fiscalização do Estado? Que investigação foi
promovida por este profissional? As providências adotadas pelo
profissional podem ser enquadradas como "boa prática" da
engenharia, para a obra e a situação encontrada?

Resposta:

Foi contratado o Geólogo Alexandre Sagnori para, como consultor,


fazer uma avaliação do problema da feição exposta no maciço
rochoso, avaliar os riscos e apontar sugestões para sua correção.
As investigações promovidas por este profissional e as providências
adotadas foram apresentadas na resposta ao Quesito nº 04 do
Governo do Estado da Paraíba.
Sim, as providências adotadas pelo profissional podem ser
enquadradas como 'boa prática' da engenharia'".

"QUESITO Nº 06

Segundo o relatório BARC 010 - R0 elaborado pela Holanda


Engenharia sobre as ponderações técnicas da visita do geólogo
Alexandre Sagnori (folhas 832 a 845, 3º volume) qual a solução
apresentada para tratar a falha geológica encontrada na obreira
esquerda?

Resposta:
As medidas recomendadas pelo Geólogo Alexandre Sagnori para
tratamento da feição geológica detectada na ombreira esquerda
durante a obra foram:
A. Limpeza e proteção da superfície da OE com ênfase para os planos
de xistosidade perpendiculares ao eixo da barragem com
preenchimento de +/- 30 cm. Sugere-se concreto varrido ou similar.
B. Proteção da zona de preenchimento da OE para posterior execução
do plano de injeções adensado e com controle específicos. Sugere-se
muro de concreto ou concreto projetado.
C. Retirada do material de preenchimento e sua substituição por
concreto. Sugere-se a retirada de seções de 3 de comprimento por
desmonte hidráulico e preenchimento com concreto projetado em
trechos sucessivos ou alternados.
D. Ênfase em todo plano de injeções e drenagem ao longo do eixo da
barragem, com adensamento da malha na zona de preenchimento.
Complementação com linha perpendicular à primária, ao longo do
preenchimento no sentido de jusante, com controle rigoroso e teste
de permeabilidade. Sugere-se diferentes traços de calda.
E. Proteção à montante da barragem na intersecção da zona de
preenchimento com apoio do maciço em CCR. Sugere-se solo ou
concreto projetado. (Relatório BAR 010 R0 as folhas 832 a 845 do 3°
volume do processo)

Em seu depoimento o Geólogo Alexandre Sagnori confirma que estas


medidas foram executadas. (depoimento as folhas 805 a 811 do 3°
volume do processo)".

"QUESITO Nº 07

O Sr. Perito concorda com a afirmação contida no trabalho do perito


do Ministério Público Federal, Milton Assis Kanji, no item 8.13 do seu
resumo executivo, segundo o qual houve julgamento inadequado da
equipe da obra (das construtoras e de seus consultores, contratados
para dar solução ao problema), mas que, somente é possível
constatar tal inadequabilidade após a exposição ampla da superfície
de ruptura?

Resposta:

Sim. O Prof. Kanji posiciona o que é amplamente sabido na prática


profissional: após a ocorrência de algum comportamento adverso
parece fácil tê-lo identificado anteriormente, o que não o é, com os
dados disponíveis no momento em que as decisões tem que ser
tomadas. O conhecimento da ocorrência de comportamento adverso
leva a interpretações já focadas e dirigidas para o próprio evento.
Porém cabe posicionar que este julgamento inadequado não levaria
ao acidente. Todos os trabalhos técnicos apresentados no processo
comprovaram que havia possibilidade real do proprietário deplecionar
o reservatório, investigar as causas do processo que se apresentou
desde fevereiro de 2004 (correspondência da CRE Engenharia com
comentários do projetista Francisco Holanda sobre fotos realizadas
em fevereiro e março de 2004, as folhas 1393 a 1412 do 5° volume
do processo), e promover a sua correção.
Esta afirmação é também compartilhada pelo próprio perito do
Ministério Público Federal Milton Assis Kanji, onde afirma em suas
conclusões (página 2216 a 2258 do 8° volume do processo):

' PARECER TÉCNICO SOBRE AS CAUSAS DA RUPTURA DA


BARRAGEM CAMARÁ RESUMO EXECUTIVO
8.1 Não houve qualquer tipo de segmento e observação sistemática
do comportamento da barragem durante o enchimento da represa,
exceto por algumas visitas de inspeção esporádicas, a despeito das
solicitações da Projetista para que fosse realizado monitoramento das
vazões dos drenos de alívio,verificação por corantes da comunicação
com o reservatório de infiltração por trincas na galeria da barragem,
verificação do carreamento de solo pelos drenos e ocorrência de
artesianismo por vários dos drenos de alívio, entre outras
observações.
8.2 Entendemos que as monitorações e a observação do
comportamento da barragem é de responsabilidade direta da
Proprietária ou de parte a quem seja delegada essa função,
delegação essa que não houve. Trata-se de atividade corrente em
engenharia e manutenção de barragens.
8.3 Não houve atitudes e decisões da Proprietária ou de seus
delegados sobre providencias para investigação das causas e
condições das observações de ocorrências, nem quanto às
recomendações para o rebaixamento do nível d'água da represa.
8.4 Caso em maio de 2004 tivesse sido tomada a decisão de
rebaixamento da represa, o que ocorreria em cerca de 1 mês, a
ruptura não teria ocorrido. Ainda que a decisão tivesse sido tomada
em início de junho, o rebaixamento teria sido suficiente para evitar a
ruptura. Haveria então oportunidade para investigações detalhadas
para determinar as causas das anomalias observadas, caso em que
certamente as deficiências teriam sido identificadas e sanadas,
salvando a barragem.'" (realcei)

"QUESITO N° 08

O Sr. Perito concorda com a afirmação contida no trabalho do


Ministério Público Federal através do seu perito, Carlos Manoel Nieble,
segundo o qual, o modelo geológico-geomecânico do local é bastante
complexo, e que, tal complexidade somente revela-se à luz do
conhecimento atual (pós-ruptura)?

Resposta:

Sim, a interpretação das informações coletadas pós-ruptura permite


concluir pela complexidade da geologia local, estando correta opinião
do perito do Ministério Público Federal, Carlos Nieble, que afirma em
seu relatório: 'O modelo geológico-geomecânico é bastante
complexo, conforme interpretado à luz do conhecimento atual, e
difere bastante daquele assumido na época do projeto e construção'.
Este perito do Ministério Público Federal, Carlos Manoel Nieble
também afirma que a causa do acidente foi provocada pelo fato do
enchimento inicial não ter sido observado e monitorado pelo
proprietário, conforme resumo das conclusões do Relatório deste
perito, as folhas 2259 a 2339 do 8° do volume do processo).

'BARRAGEM DE CAMARÁ

RELATÓRIO DE DIAGNÓSTICO DO SINISTRO


DA BARRAGEM DE CAMARÁ
CAM141104

Resumo das Conclusões

A barragem de Camará rompeu, na ombreira esquerda,


devido a:

* ter sido apoiado em maciço rochoso que se mostrou de má


qualidade, após a ruptura, evidenciando uma interpretação geológica
deficiente das condições de sua fundação. O modelo geológico-
geomecânico é bastante complexo, conforme interpretado à luz do
conhecimento atual, e difere bastante daquele assumido na época do
projeto e construção.
Em conseqüência, os tratamentos aplicados na fundação (injeção,
drenagem e outros) não foram adequados para as reais condições
geológicas do maciço.

* não ter sido observada e monitorada após a construção, conforme


recomendado pelos diversos organismos internacionais e pelo Manual
de Segurança e Inspeção de Barragem do Ministério de Integração
Nacional. A barragem emitiu, após a construção, vários sinais das
deficiências de sua fundação que, devido à inexistência dessa
monitoração e observação sistemática, não puderam ser
interpretados corretamente e, assim, tomadas as medidas
necessárias para sanear ou minimizar o problema.'"

Quanto aos quesitos formulados por este Juízo, assim se


pronunciou o expert:

"QUESITO JUIZA

QUESTÃO 01 - A fratura e o "bolsão" de rocha decomposta


detectados na ombreira esquerda, em cota abaixo do perfil de
sondagem executado pela ATECEL, já não indicavam que os estudos
realizados por esta não eram suficientes para garantir a segurança da
barragem, havendo necessidade de completá-los, ao menos na área
que não fora abrangida naquele estudo prévio? Justificar.

Resposta:

Inicialmente é preciso esclarecer que "a fratura e o bolsão" de rocha


decomposta conforme descrito nos textos constantes do processo são
elementos distintos e independentes, citados no processo como tendo
sido detectados em locais e em momentos diferentes no decorrer da
construção.
A fratura que deve ser referida como zona de cisalhamento
rúptil/dúctil e apresentou-se parcialmente decomposta na face
rochosa exposta pela escavação da ombreira esquerda. O
descobrimento desta feição geológica referida no Diário de Obra do
dia 18 de janeiro de 2001, abaixo do nível investigado no decorrer do
projeto pela ATECEL levou à contratação do geólogo Alexandre
Sagnori para, como consultor, fazer uma avaliação do problema da
descontinuidade do maciço rochoso e apontar sugestões para sua
correção. (Diário de Obras 18 de janeiro de 2001 - página 349 do 1°
volume do processo).
Por outro lado, "bolsão" de rocha decomposta citado no processo foi
localizado na região da bacia de dissipação, conforme a anotação do
diário de obra do dia 02 de outubro (folha 312 do 1° volume do
processo), ou seja, no fundo do vale. Este bolsão que situava-se no
fundo do vale e somente foi feita um referência a sua proximidade
com a ombreira esquerda para fins de localização. Ou seja, situava-se
no fundo do vale, não no centro ou à direita, mas à esquerda. (Diário
de Obras de 02 de outubro de 2001 - página 312 do 1° volume do
processo).
Ainda, conforme este registro, o bolsão de rocha decomposta na
região da bacia de dissipação, foi retirado e preenchido com concreto
de regularização, conforme recomendado nas especificações e
indicado no Desenho BC-HOL-E-003 do projeto. Esta é uma prática
comum na engenharia de barragens, nada tendo de extraordinário. O
encontro de situações como esta e as providencias tomadas são
rotineiras, e pode-se notar no desenho citado acima, esquemas
mostrando a solução a ser adotada. Finalmente, cabe ressaltar que o
"bolsão", devidamente tratado, não contribuiu com o acidente e está
até hoje sob a laje da bacia de dissipação, que por sua vez nada
sofreu com a ruptura da barragem. (Relatório Técnico da Obra do
Mês de Outubro de 2001).
Agora, voltando à referida "fratura" que tecnicamente é referida como
uma zona de cisalhamento dúctil/rúptil. O encontro desta feição
geológica caracterizou uma situação excepcional e como tal foi
tratada, levando, como já foi dito, à contratação do geólogo
Alexandre Sagnori para, como consultor, fazer uma avaliação do
problema e apontar sugestões para sua correção.
O mesmo compareceu à obra onde realizou um levantamento
geológico de superfície, examinou as investigações já disponíveis,
acompanhou a execução de quatro furos com perfuratriz ("rock drill")
e solicitou a execução de mais três furos de rotativa. O exame da
rocha exposta pelas escavações mais esta quantidade de furos em
uma área relativamente pequena, complementaram as investigações
realizadas por ocasião do projeto e foram suficientes para obtenção
do conhecimento necessário às recomendações de tratamento do
problema detectado, conforme informou em seu depoimento.
(depoimento página 805 a 811 do 3° volume do processo).
Como conclusão, concordamos que a presença de uma zona de
cisalhamento dúctil/rúptil, na face rochosa exposta pela escavação da
ombreira esquerda, não tem correlação com o bolsão de rocha
decomposta mencionado no Diário de Obras, e que tal condição
encontrada na obra em outubro de 2001, aparentemente não tem
também correlação com o acidente ocorrido". (realcei)

"QUESTÃO 02 - O geólogo Alexandre Sagnori afirmou não ter sido


informado sobre as ocorrências mencionadas na parte inicial do inciso
anterior. Essa omissão por parte das construtoras foi relevante ou
irrelevante? Em tendo sido relevante, contribui de algum modo para o
sinistro? Justificar.

Resposta:

De fato, o geólogo Alexandre Sagnori afirmou não ter sido informado


sobre a ocorrência do bolsão de rocha decomposta na região da bacia
de dissipação, que foi retirado e preenchido com concreto de
regularização. No entanto, cabe reafirmar o constante na resposta do
quesito anterior. O encontro de situações como esta e as providências
tomadas são rotineiras, não havendo na época nada que justificasse
a comunicação do fato e não se caracteriza uma omissão. De todo
modo, a não comunicação foi irrelevante, uma vez que o "bolsão",
devidamente tratado, parece não ter contribuído com o acidente e
está até hoje sob a laje da bacia de dissipação, que por sua vez não
sofreu com a ruptura da barragem. (realcei)
Conforme se pode verificar através do projeto "as built" BC-HOL-E-
003 - Limpeza e tratamento de fundação (constante do Apenso IV do
Processo), especificamente onde trata de "TRATAMENTO DE
FUNDAÇÃO MUITO IRREGULAR EM ROCHA" que já era previsto o
tratamento de "Buracos e depressões com profundidade de 15cm ou
mais são preenchidos com concreto dental".
O fato foi anotado no Diário de obras de 02 de outubro de 2001
(página 312 do 1° volume do processo): "Nesta data foi detectado na
região da bacia de dissipação, próximo à ombreira esquerda, um
trecho onde a rocha estava fraturada. Após a remoção deste material
fraturado, verificou-se a ocorrência de um "bolsão" de rocha
decomposta. O material decomposto será totalmente removido até
encontrar rocha sã. Posteriormente o "bolsão" será preenchido com
concreto de regularização".
A execução deste procedimento está documentado no Relatório
Técnico da Obra de Outubro de 2001.
No entanto, a falta de previsão da feição geológica da ombreira
esquerda, no projeto da ATECEL, por estar abaixo da cota investigada
nos relatórios de sondagem, torna-se irrelevante a partir do momento
que, após as escavações, tal feição foi visualizada, registrada no
Diário de Obras, estudada, propostas soluções e estas executadas. A
escavação se deu até as cotas abaixo da perfurada pela sondagem
rotativa (conforme anotação no Diário de Obra do dia 18 de janeiro
de 2001-folhas 349 do volume 01 do processo e projeto "As Built"
Projeto de escavação - planta e perfil longitudinal, Documentos do
Projeto Executivo, Apenso IV do Processo.); adicionalmente as
sondagens rotativas FURO 03, FURO 04 e FURO 05 do projeto da
ATECEL demonstravam rocha sã na sua porção final.
Em face do pronunciamento da Juíza Federal da 3º Vara do Estado da
Paraíba, Dra. Cristina Maria Costa Garcez, é de suma importância no
contexto do processo de Camará conceituar as diferenças contidas na
definição do significado das palavras "imprevisível" e "imprevisto".

"É o que importa relatar. Decido. [...] Paira dúvida, porém, se a falha
geológica era imprevista e imprevisível, como sustentam as empresas
rés, ou se estudos complementares poderiam levar à sua correta
interpretação e/ou à adoção de medidas adequadas para tratamento
da falha e/ou à certeza da eficácia dos tratamentos realizados na
ombreira esquerda. ...[...]."(grifos nossos)

A juíza em sua última decisão coloca esta questão como crucial para
emissão de seu pronunciamento e decisão final.
Acreditamos que se faz necessária a análise cronológica a partir do
momento zero (elaboração do Projeto Básico / Projeto Executivo
ATECEL), até os estudos elaborados pelas varias comissões (pós
acidente).
Na fase do Projeto Básico e do desenvolvimento inicial do Projeto
Executivo as informações disponíveis através dos estudos realizados
eram suficientes e não havia naquele cenário nenhum indicativo que
merecesse maior aprofundamento dos estudos e a ocorrência de
qualquer problema era imprevisível.
Durante a execução da obra foi encontrada na Ombreira Esquerda,
numa cota inferior ao limite da sondagem mais próxima, uma camada
de rocha decomposta, demonstrando, deste modo, que até então
todos os estudos realizados indicavam um modelo geológico cuja
interpretação era difícil, a respaldar sua característica como
imprevisível.
A questão foi discutida. O projetista juntamente com o geólogo
contratado, apresentaram soluções.
'[...] a) Limpeza e proteção da OE com ênfase para os planos de
xistosidade perpendiculares ao eixo da barragem com preenchimento
de +- 30cm. Sugere-se concreto varrido ou similar.; b) Proteção da
zona de preenchimento da OE para posterior execução do plano de
injeções adensado e com controle especifico.; c) Retirada do material
de preenchimento e substituição por concreto. Sugere-se a retirada
de seções de 3 m de comprimento por desmonte hidráulico e
preenchimento com concreto projetado em trechos sucessivos ou
alternados.; d) Ênfase em todo plano de injeções e drenagem ao
longo do eixo da barragem, com adensamento da malha da zona de
preenchimento. Complementação com linha perpendicular à primaria,
ao longo do preenchimento no sentido jusante, com controle rigoroso
e testes de permeabilidade. Sugere-se diferentes traços de calda.; e)
Proteção à montante da barragem na interseção da zona de
preenchimento com apoio no maciço em CCR. Sugere-se solo ou
concreto projetado [...]'

Concluída aquela fase da obra, onde tudo o que foi proposto foi
implementado, o cenário era de imprevisibilidade de que algum
evento pudesse ocorrer a partir do que foi detectado e devidamente
tratado.
Claramente, a situação até então existente era afeita ao imprevisível,
pois o modelo geológico encontrado no decorrer da obra que
demandava correções só foi devidamente verificado após o inicio das
escavações, devidamente tratado pela técnica recomendada para
esta situação, e, ainda assim, no demonstrava que outros problemas
poderiam surgir.
Vale sublinhar que apesar da constatação ter ocorrido em cota
inferior ao limite da sondagem, a partir daí a questão da localização
perde relevância porque qualquer que seja a avaliação, o que ficou
evidente é o modelo complexo do terreno que até então se mostrava
rígido. Neste sentido, até então não era possível a detecção da
possível ocorrência de outros problemas.
Até a ocorrência das anomalias de comportamento da fundação pós
entrega da barragem, não havia situação de previsibilidade de outra
feição geológica problemática e seu possível comportamento, de
modo que não há que se falar que esta nova situação geológica seria
imprevista, já que todos os cuidados necessários para a verificação
geológica e tratamento do que fora encontrado parecem devidamente
tomados e executados pelos construtores.
A obra foi concluída e entregue em 2002. Em 2004, a projetista, a
partir de constatações verificadas em relatórios de fevereiro e março
daquele mesmo ano, notificou o proprietário sobre o abandono da
obra, sobre a falta de monitoramento do enchimento da barragem e o
comportamento anormal de determinados dreno e da detecção das
águas turvas oriundas dos referidos drenos e da deposição de
materiais no fundo da galeria.
Desde então, fica caracterizada a necessidade da intervenção do
proprietário que deveria promover as verificações necessárias para
identificar e mitigar as ações e soluções do problema, até então
desconhecido, imprevisível.
Assim, a situação do imprevisto começa a se caracterizar a partir
deste alerta e aí sim, o proprietário não insere na sua avaliação o
risco de um acidente potencial e nem sequer promoveu o
esvaziamento do reservatório, que seria em qualquer situação, a
única alternativa que evitaria a ruptura das fundações da barragem e
suas danosas conseqüências, conforme o MM. Juízo Federal já deixou
consignado na r.. Decisão saneadora.
Vale dizer, até a ocorrência dos problemas verificados após a entrega
da barragem, o modelo geológico e seu comportamento eram
imprevisíveis, pois não apareceram nas sondagens no local que fora
localizado, e em escavações em profundidade inferior à cota de tais
sondagens, de sorte que o que foi possível ser detectado teve as
correções necessárias devidamente realizadas, sendo que não havia,
até então, nenhum indicativo da necessidade de outras investigações,
justamente pelo complicado modelo geológico ali presente,
imprevisível.
A partir do momento em que os problemas com a barragem se
mostraram existentes, a situação "de imprevisível" tornou-se "de
imprevista", pois o proprietário da obra, sabendo de anomalias
existentes na fundação e possivelmente de novos problemas no
modelo geológico até então imprevisível, na opinião dos peritos
houve negligência dos proprietários da obra em verificar o problema
que se mostrou possivelmente detectável.
Após o acidente, agora já com as fundações expostas, é que os
técnicos consultores em geologia e geotecnia que atuaram pelo
Ministério Público e pelas construtoras, puderam avaliar a
complexibilidade da geologia local e constataram a partir daquela
exposição que houvera uma interpretação equivocada do modelo
geológico adotado, não foi o mais apropriado para aquela situação
especial.
Vejamos que estas avaliações foram possíveis a partir do acidente
com a exposição total da superfície, o que equivale a uma "autópsia",
situação que antes, durante a fase construtiva da obra, não era
possível de ser avaliada em sua extensão" (grifei).

Cediço que as conclusões do expert oficial, como terceiro


auxiliar do juiz e com posição equidistante das partes em litígio,
gozam da presunção de veracidade.
Efetivamente, a prova pericial, digna de louvor, demonstra a
saciedade, o fato de que a ruptura da Barragem de Camará foi
ocasionada pela omissão injustificada do proprietário da obra, que
não adotou as medidas emergenciais necessárias, quando ela
apresentou sinais de graves anomalias, não possuindo nenhuma
relação com o assentamento da barragem em blocos soltos e com
falta de tratamento adequados e suficientes, nem com a não
implementação de tudo o que foi proposto pelo Geólogo consultor
para tratamento da ombreira esquerda ou da não observação das
boas técnicas de engenharia, como queria fazer crer o MPF.
A propósito, não compartilho da ótica do MPF ao vislumbrar
ocorrência de tamanho descalabro.
Não havia outra forma de se avaliar e adotar a medida corretiva
pelo proprietário da obra, senão através do rebaixamento do nível da
barragem. Trata-se de fator a ser constatado posteriormente ao
recebimento da obra, quando a barragem já tivesse recebido água
suficiente. O princípio da prevenção impunha a adoção de tal
medida.
Não é possível, portanto, atribuir a responsabilidade às
construtoras conjuntamente com o proprietário, eis que o abandono
da obra pelo Estado da Paraíba possuiu aptidão para, por si só,
causar a ruína desta.

Não bastassem todas essas razões, a decisão de seguir os


procedimentos técnicos recomendados pelo geólogo Alexandre
Sagnori partiu da fiscalização da SEMARH, contratante da obra, por
força da cláusula VII, letra "c", do instrumento contratual, a qual
estabelece:

"Cláusula VII - A FISCALIZAÇÃO terá poderes para supervisionar a


execução dos serviços e especialmente para:
[...]
c) Decidir, por parte da CONTRATANTE, todas as questões que se
levantarem no campo durante o andamento das obras;
[...]"

A propósito, no Diário da Obra do dia 14/02/01, consta a


seguinte determinação, assinada pela Fiscalização da obra:

"- Foi aprovado o procedimento já discutido anteriormente em obra, e


será emitido parecer técnico pelo geólogo Alexandre Sagnori".

Deveras, voltando novamente a atenção ao depoimento de Flávio


José Cota Silva, engenheiro líder da obra, acerca do poder decisório
da SEMARH sobre os fatos relevantes desta - fls. 552/559 - destaco
o seguinte trecho:

"... que era consenso a existência de feição geológica da ombreira


esquerda; que também, havia necessidade de uma análise
especializada para determinação dos procedimentos; que na reunião
do dia 1º de fevereiro onde participaram os engenheiros Antonio
Soares, Gilmar Ferreira, Francisco Holanda, Ovídio Catão, Silmar
Paiva, Flávio Cota Shelen Alonso, que nesta Reunião ficou acertado
que seria da Holanda Engenharia Ltda que iria indicar um geólogo
para analisar a feição geológica da ombreira esquerda; que não sabe
informar se o geólogo Alexandre Signori já havia trabalhado para
Andrade Galvão, nem para Construtora Holanda Engenharia; que, se
houvessem explosões no período de 15 de fevereiro, poderia
comprometer a concretagem já realizada, mas as quantidades
aplicadas não eram significativas; que o relatório conclusivo de
Alexandre Signori fazia duas opções: a primeira seria o desmonte da
rocha com o uso de explosivos; e a outra opção, envolvia cinco
procedimentos técnicos, consignados em seu relatório; que a solução
escolhida pela SEMARH foi a utilização de cinco procedimentos, ou
seja a opção dois do geólogo; Que a decisão foi tomada pela
SEMARH; que está escrito no relatório de ocorrência da obra que a
decisão foi tomada por Antonio Soares; que se a decisão partiu
apenas dele, não sabe informar; que, fica claro, que a consultoria
emitiu sugestão dos cinco procedimentos, a SEMARH aprovou, e o
consórcio executou; que a decisão de atender ao procedimento aceito
dentro do parecer do geólogo Alexandre Signori foi da SEMARH; que
não sabe informar, o depoente, qual essa razão, uma vez que as
decisões tomadas pela SEMARH e consórcio, todas foram com base
contratual; que é previsto contratualmente que as decisões da obra
ser da SEMARH; que a CRE/ANDRADE GALVÃO, não tiveram
nenhuma participação nesta decisão porque as empresas trabalham
por preço unitário, e qualquer que fosse a decisão, economicamente,
não haveria nenhuma repercussão financeira; que, se fosse sugerido
alguma proposta que contrariasse as boas normas de engenharia, é
obrigação de qualquer um contestar; que a CRE/ANDRADE GALVÃO,
considerou a proposta sugerida pelo Geólogo como correta, por isso
operacionalizou, que a segunda proposta apresentada pelo geólogo,
não contraria a boa norma de engenharia;..."

Nesse ponto, releva observar que, muito embora o Ministério


Público Federal tenha sido enfático sobre a responsabilidade objetiva
do construtor; no presente caso, contudo, essa regra não se aplica às
construtoras, que apenas operacionalizaram as ordens do dono da
obra, e não executaram o serviço em desacordo com os padrões da
engenharia.
Nesse passo, o Estado da Paraíba, enquanto proprietário da
obra, responde objetivamente pelos danos que resultaram do
desabamento da construção. Nesse sentido, dispõe o Código Civil
atual:
"Art. 937. O dono de edifício ou construção responde pelos danos
que resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja
necessidade fosse manifesta".
Desta forma, deve ser julgada improcedente a pretensão inicial,
com a apreciação da lide com resolução do mérito (art. 269, inciso I,
do CPC), em relação às rés C.R.E. Engenharia Ltda, Andrade Galvão
Engenharia Ltda e Holanda Engenharia Ltda.
Firmada a responsabilidade do Estado da Paraíba pelo
rompimento da Barragem de Camará, em virtude de ter se omitido
injustificadamente em baixar o nível do reservatório, permitindo a
realização dos serviços necessários, emerge daí sua responsabilidade
pela reconstrução da represa e pelos prejuízos causados a terceiros,
ressalvado o direito de regresso contra o responsável nos casos de
culpa ou dolo (artigo 37, §6º1, , da CF/88).

Analisando o aludido artigo da Constituição Federal, vê-se que o


Constituinte adotou a teoria da responsabilidade civil objetiva,
determinando que o Estado se responsabiliza pelos danos causados
pelos seus agentes.
Diferentemente da responsabilidade civil subjetiva, a
responsabilidade objetiva torna irrelevante a análise do elemento
volitivo na conduta do ofensor, debruçando-se unicamente sobre a
relação causa-efeito existente entre a conduta e o dano. É dizer: A
responsabilidade estatal pode advir tanto de ato lícito, quanto de ato
ilícito, bastando, para tanto, a ocorrência de um dano provocado pelo
Estado e suportado pelo particular.
Dessa maneira, para a configuração da responsabilidade objetiva
do Estado a presença de três requisitos torna-se obrigatória, quais
sejam: conduta de agente público, no uso de suas atribuições,
vinculado à Administração direta ou à Administração indireta, desde
que prestadora de serviço público; dano e nexo de causalidade entre
aquela e este.
É preciso, contudo, ressaltar que, nos casos referentes à
omissão do Estado, a jurisprudência vem se posicionando no sentido
de não se aplicar a responsabilidade objetiva do Estado mediante a
teoria do risco administrativo, mas sim a teoria da culpa no serviço,
necessitando, portanto, a vítima do dano demonstrar que o serviço
não fora prestado ou fora mal prestado. Neste sentido, precedente do
STF:
"EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO OMISSIVO DO PODER
PÚBLICO: DETENTO FERIDO POR OUTRO DETENTO.
RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FALTA DO
SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º. I. - Tratando-se de ato omissivo do
poder público, a responsabilidade civil por esse ato é subjetiva, pelo
que exige dolo ou culpa, em sentido estrito, esta numa de suas três
vertentes -- a negligência, a imperícia ou a imprudência -- não sendo,
entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída
ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço. II. - A falta
do serviço -- faute du service dos franceses -- não dispensa o
requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre
ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro.
III. - Detento ferido por outro detento: responsabilidade civil do
Estado: ocorrência da falta do serviço, com a culpa genérica do
serviço público, por isso que o Estado deve zelar pela integridade
física do preso. IV. - RE conhecido e provido" (RE 382054, Rel. Min.
Carlos Velloso, p. 01/10/2004).
Sobre o tema, assim pontua Celso Antônio Bandeira de Mello
(Curso de Direito Administrativo, págs. 895/896):
"Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do
Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou
ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade
subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente,
ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-
lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido
responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar
ao evento lesivo".
Entretanto, a questão ainda não é pacífica, colhendo-se recentes
julgados do STF que imputam responsabilidade ao Estado,
objetivamente, mesmo nos casos de atos omissivos:
"O Tribunal, por maioria, deu provimento a agravo regimental
interposto em suspensão de tutela antecipada para manter decisão
interlocutória proferida por desembargador do Tribunal de Justiça do
Estado de Pernambuco, que concedera parcialmente pedido
formulado em ação de indenização por perdas e danos morais e
materiais para determinar que o mencionado Estado-membro
pagasse todas as despesas necessárias à realização de cirurgia de
implante de Marcapasso Diafragmático Muscular - MDM no agravante,
com o profissional por este requerido. Na espécie, o agravante, que
teria ficado tetraplégico em decorrência de assalto ocorrido em via
pública, ajuizara a ação indenizatória, em que objetiva a
responsabilização do Estado de Pernambuco pelo custo decorrente da
referida cirurgia, 'que devolverá ao autor a condição de respirar sem
a dependência do respirador mecânico'. Entendeu-se que restaria
configurada uma grave omissão, permanente e reiterada, por parte
do Estado de Pernambuco, por intermédio de suas corporações
militares, notadamente por parte da polícia militar, em prestar o
adequado serviço de policiamento ostensivo, nos locais notoriamente
passíveis de práticas criminosas violentas, o que também ocorreria
em diversos outros Estados da Federação. Em razão disso, o cidadão
teria o direito de exigir do Estado, o qual não poderia se demitir das
conseqüências que resultariam do cumprimento do seu dever
constitucional de prover segurança pública, a contraprestação da falta
desse serviço. Ressaltou-se que situações configuradoras de falta de
serviço podem acarretar a responsabilidade civil objetiva do Poder
Público, considerado o dever de prestação pelo Estado, a necessária
existência de causa e efeito, ou seja, a omissão administrativa e o
dano sofrido pela vítima, e que, no caso, estariam presentes todos os
elementos que compõem a estrutura dessa responsabilidade. (...)"
(STF 223-AgR, Rel. p/ o ac. Min. Celso de Mello, julgamento em 14-4-
08, Informativo 502).
"Responsabilidade civil do Estado. Artigo 37, § 6º, da Constituição do
Brasil. Latrocínio cometido por foragido. Nexo de causalidade
configurado. Precedente. A negligência estatal na vigilância do
criminoso, a inércia das autoridades policiais diante da terceira fuga e
o curto espaço de tempo que se seguiu antes do crime são suficientes
para caracterizar o nexo de causalidade. Ato omissivo do Estado que
enseja a responsabilidade objetiva nos termos do disposto no artigo
37, § 6º, da Constituição do Brasil" (RE 573.595-AgR, Rel. Min. Eros
Grau, julgamento em 24-6-08, DJE de 15-8-08).
Seguindo a linha de orientação mais recente do STF - ou seja,
uma vez fixado o caráter objetivo da responsabilidade civil do Estado,
mesmo em casos de falha do serviço - para resultar no dever de
indenizar, é necessária e suficiente a comprovação do dano e do nexo
de causalidade entre a conduta da ré e o dano sofrido pelo autor. Nos
casos de culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior
rompe-se o nexo causal entre conduta/omissão estatal e dano, não
havendo, portanto, dever de indenizar.
Mesmo que se admita a subjetivação no caso de conduta
omissiva, não é necessária imputação de culpa estrito senso - nas
modalidades imperícia, imprudência ou negligência - a um agente em
especial, bastando a demonstração do mau funcionamento do serviço
prestado pelo Estado, propiciando o surgimento de dano em
detrimento de outrem.
Do apanhado probatório, portanto, emerge que o fato danoso
ocorreu. Isso é incontroverso.
Nexo Causal - falha do serviço - falta de monitoramento do
primeiro enchimento do reservatório, que, como já vimos, era
obrigação do proprietário da obra.

4. Dos demais pedidos.

Quanto a tornar definitivos os pedidos formulados em sede de


antecipação dos efeitos da tutela constantes nas alíneas "a", "b'" "c"
e 'd", todos relacionados com o pagamento das indenizações devidas
em face do rompimento da Barragem de Camará; entendo que , de
fato, falece legitimidade ao MPF para propor a presente ação civil
pública.
Os lesados pelo rompimento da aludida Barragem
(contribuintes, agricultores e moradores das cidades circunvizinhas)
são perfeitamente identificáveis, a maioria, aliás, já o foi, inclusive,
com definição do valor das indenizações devidas, várias delas
saldadas desde antes do ajuizamento desta ação (9º volume, págs.
2.496/2520).
O direito às indenizações não atinge a coletividade como um
todo. Apesar de seu aspecto de interesse social, cuida-se de direito
individual, disponível e divisível, e não difuso insusceptível de ser
defendido por meio de ação civil pública, cabendo àquele que ainda
não recebeu a respectiva indenização ou não concordar com o valor
oferecido pelo Estado da Paraíba ajuizar, de forma individual ou
coletiva, ação visando ao ressarcimento do dano. É o que dizem os
precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de
Justiça, assim ementados:

"EMENTA: MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO CIVIL PUBLICA. TAXA DE


ILUMINAÇÃO PÚBLICA NO MUNICIPIO DE RIO NOVO-MG.
EXIGIBILIDADE IMPUGNADA POR MEIO DE AÇÃO PÚBLICA, SOB
ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ACÓRDÃO QUE CONCLUIU
PELO SEU NÃO-CABIMENTO, SOB INVOCAÇÃO DOS ARTS. 12, I, a, E
125, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO.
Ausência de legitimação do Ministério Público para ações da espécie,
por não configurada, no caso, a hipótese de interesses difusos, como
tais considerados os pertencentes concomitantemente a todos e a
cada um dos membros da sociedade, como um bem não
individualizável ou divisível, mas, ao revés, interesses de grupo ou
classe de pessoas, sujeitos passivos de uma exigência tributária cuja
impugnação, por isso, só pode ser promovida por eles próprios, de
forma individual ou coletiva. Recurso não conhecido" (RE
213.631/MG. STF, rel. Min. Ilmar Galvão, DJU 07.04.2000).

"EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE


DIVERGENCIA EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA,
BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL.
INEXISTENCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. MINISTÉRIO PÚBLICO.
ILEGITIMIDADE AD CAUSAM.
1. Tratando-se de benefício previdenciário, em que não há interesse
individual indisponível, mas sim, direito patrimonial disponível,
suscetível de renúncia pelo respectivo titular, bem como não sendo
relação de consumo, o Ministério Público não detém legitimidade
ativa ad causam para propor ação civil pública em defesa de tal
direito. Precedentes das Turmas que compõem esta Terceira Seção.
2. Embargos rejeitados"(EREsp 448.684/RS. STJ, rel. Min. Laurita
Vaz, j. 28.06.2006, DJU 02.08.2006).

'EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA


INDENIZATÓRIA. ILEGITIMIDADE ATIVA. COMPROMISSOS DE
COMPRO E VENDA DE IMÓVEIS. ATRASO NA ENTREGA DE
APARTAMENTOS EM CONSTRUÇÃO. INICIAL INDEFERIDA. PROCESSO
EXTINTO.
1. A falta de configuração de real interesse coletivo afasta a
legitimidade do Ministério Público para promover ação civil pública
objetivando o recebimento de indenização pelo atraso na entrega da
obra de imóveis compromissados à venda, mormente quando se
identifica verdadeira hipótese de invasão da seara da advocacia
particular e, inobstante o limitado grupo de possíveis interessados, de
fácil identificação, a instrução da inicial traz à colação apenas dois
contratos, sem esforço prévio relevante para a congregação do todo
ou de um número mais expressivo, ensejando interpretação de que,
na espécie, a lide foi proposta para atender alguns descontentes.
2. Recurso especial não conhecido "(REsp 236.161/DF. STJ, rel. Min.
Aldir Passarinho Júnior, j. 06.04.2006, DJU 02.05.2006.).
Também pede o MPF que o Estado da Paraíba apresente a este
Juízo, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, critérios objetivos para a
destinação das casas que no momento estão sendo reconstruídas,
além de cronograma de atividades contemplando as necessidades das
famílias atingidas; em especial, a capacitação da comunidade e
recriação de atividades produtivas que venham gerar emprego e
renda.
O Estado da Paraíba conta com diversos programas na área de
agricultura e desenvolvimento, a exemplo do Empreender-Pb e
Cooperar, de sorte que está aberta a possibilidade de inserção das
famílias atingidas dentro das políticas públicas já existentes, inclusive
aquelas em parceria com o Governo Federal, sem que isso configure
ingerência indevida do Poder Judiciário na atuação do Executivo
Estadual, razão pela qual procede o pedido.
O MPF sustenta serem devidos danos materiais coletivos de
natureza difusa, consistentes em danos emergentes e lucros
cessantes no valor de 10.000.000,00 (dez milhões de reais) para
cada um. O primeiro, em razão do prejuízo causado à infra-estrutura
da região. O segundo, em razão dos benefícios que adviriam para a
região pela existência do reservatório. Pede que a indenização seja
revertida para aplicação em projetos de desenvolvimento
sustentáveis em todos os municípios afetados pelo desastre. Postula,
também, a condenação ao pagamento de danos morais coletivos, a
serem arbitrados por este Juízo.
Conforme ressaltado anteriormente, os danos verificados são
mais individuais do que propriamente sociais, não sendo razoável
impingir mais ônus ao pobre Estado da Paraiba, mediante mais uma
condenação tão vultosa, desta feita em dano emergente, lucro
cessante e dano moral coletivos, reparações civis impropriamente
importadas do direito ambiental e consumerista para o direito de
natureza administrativa, como é o caso em apreço.
Assim, caberá a qualquer lesionado, inclusive aos municípios
atingidos pelo rompimento da barragem, propor ações individuais ou
coletivas, com individualização e comprovação dos danos
emergentes, lucros cessantes e danos morais passíveis de reparação.
Dessa feita, improcede o pleito de reparação civil coletiva.
No tocante ao pedido para que o Estado da Paraíba apresente
cronograma de reimplantação dos serviços públicos, constata-se do
documento de fls. 2496/2498 (9º volume) que o desmoronamento da
Barragem em tela passou a exigir a realização dos seguintes
serviços:
I) Reconstrução da ponte sobre o rio Mamanguape;
II) Restauração da PB -079;
III) Restauração da PB -075;
IV) Recuperação das estradas vicinais de Alagoa Grande;
V) Reconstrução da passagem molhada de São José do
Miranda;
VI) Recuperação das casas semi-destruídas na zona urbana de
Alagoa Grande;
VII) Reconstrução de uma escola na zona rural de Alagoa Nova;
VIII) Reconstrução de muros, calçadas e pavimentação de ruas
e,
IX) reconstrução das casas destruídas na zona urbana de
Alagoa Grande e na zona rural de Alagoa Nova, Areia e Mulungu.
O mesmo documento de fls. 2.496/2.498 informa que desde 09
de abril de 2005, a grande maioria dos serviços afetados já estava
em fase de reconstrução/restauração/recuperação, restando dar
início apenas à reconstrução de muros, calçadas e pavimentação de
ruas, já licitados à época, pelo que o cumprimento desse pedido de
reimplantação dos serviços públicos deverá ser objeto de liquidação
de sentença.

Fica o Estado da Paraíba, desde já, autorizado a dar início ao


processo de reconstrução da Barragem Camará.

DISPOSITIVO

Ante o exposto:
a) JULGO IMPROCEDENTES os pedidos, em relação às rés C R E
Engenharia Ltda, Andrade Galvão Engenharia Ltda e Holanda
Engenharia Ltda;
b) JULGO PROCEDENTES, EM PARTE, os pedidos iniciais, para
condenar o Estado da Paraíba nas seguintes obrigações:
1) reconstrução da Barragem Barra de Camará;
2) inserção das famílias atingidas dentro das políticas públicas já
existentes, em especial naquelas voltadas à capacitação das
comunidades e recriação de atividades produtivas que venham gerar
emprego e renda;
3) reimplantação dos serviços públicos afetados pelo
desmoronamento da barragem, listados no documento acostado à fl.
2.498, quais sejam:
I) Reconstrução da ponte sobre o rio Mamanguape;
II) Restauração da PB -079;
III) Restauração da PB -075;
IV) Recuperação das estradas vicinais de Alagoa Grande;
V) Reconstrução da passagem molhada de São José do Miranda;
VI) Recuperação das casas semi-destruídas na zona urbana de Alagoa
Grande;
VII) Reconstrução de uma escola na zona rural de Alagoa Nova;
VIII) Reconstrução de muros, calçadas e pavimentação de ruas e,
IX) reconstrução das casas destruídas na zona urbana de Alagoa
Grande e na zona rural de Alagoa Nova, Areia e Mulungu
O cumprimento das obrigações acima (I a IX) deverá ser
demonstrado em liquidação de sentença.
Diante da sucumbência, caberá ao Estado da Paraíba ressarcir as
construtoras rés dos honorários periciais por estas adiantados.
Pelo mesmo motivo acima exposto, condeno o Estado da Paraíba
a pagar honorários advocatícios, em favor das construtoras rés, que
arbitro em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), para cada uma,
considerando que a causa, diante de sua complexidade, exigiu um
maior esforço dos advogados, em especial, durante a dilação
probatória e nos incidentes processuais verificados.
Sem condenação da União (MPF) em honorários em favor das
construtoras, nem do Estado da Paraíba em favor da MPF; seja
porque não diviso má-fé do MPF no ajuizamento da ação; seja porque
os membros do MPF são impedidos de perceberem honorários de
sucumbência.
Oficie-se à MM. Juíza de Direito da Comarca de Alagoa Grande,
instruindo o expediente com cópia desta sentença.
Expeça-se alvará para levantamento dos honorários periciais.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

João Pessoa, 13 de maio de 2011.

CRISTINA MARIA COSTA GARCEZ


Juíza Federal da 3ª Vara

1 "§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras


de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade,
causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos
casos de dolo ou culpa."

PODER JUDICIÁRIO/ JUSTIÇA FEDERAL DE 1º GRAU / SEÇÃO


JUDICIÁRIA DA PARAÍBA /3ª VARA
Processo nº 0007725-29.2005.4.05.8200

Cristina Maria Costa Garcez


Juíza Federal da 3ª Vara

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